Cabo Frio, Itapemirim, Macaé, São Francisco de Itabapoana e São João da Barra na memória e vida de seus moradores
Depoimento de José Carlos Alberto Almeida de Souza
Entrevistado por Fernanda Peregrina
São João da Barra, 20/03/2013
Realização Museu da Pessoa
AECOM_SJB_HV03 José Carlos Alberto Almeida de Souza
Transcrito por Karina Medici Barrella (MW Transcrições)
P/1 – Seu Carlos, pra começar o senhor fala o seu nome completo, o local e data de nascimento?
R – Meu nome é José Carlos Alberto Almeida de Souza. Eu moro na Atafona, Cehab, Rua Seis, casa oito. Eu nasci em quatro do doze de 1955.
P/1 – E o senhor nasceu aqui em Atafona mesmo?
R – Eu nasci na Ilha de Convivência.
P/1 – Seu Carlos, como era o nome dos seus pais?
R – O nome do meu pai Florentino de Souza, a minha mãe Maria da Conceição de Almeida.
P/1 – E o que seus pais faziam?
R – Meus pais sempre foram pescadores e também trabalhavam na lavoura. A gente morava lá em Gargaú porque quando eu estava com quatro anos de idade meus pais saíram de Convivência por melhora, condições de trabalho. Nós estivemos lá no sertão do São Francisco do Itabapoana, que na época era São Francisco de Paula, que também pertencia a São João da Barra. Então, eu trabalhava lá com meus pais nos mangues apanhando caranguejo, era dentro dos brejos tirando taboa. Taboa. É uma palha, que se fazia palhão e também esteirinha, essas esteirinhas que ainda encontra por aí. Palhão hoje já não se fala mais, né? Sabe o que é palhão?
P/1 – Não, explica pra mim.
R – Palhão é uma palha que é um trabalho que a gente fazia pra vestir nos litros e nas garrafas, que antigamente não existiam os engradados que têm hoje. Aquilo ali eram uns caixotes grandes pra indústria aqui em Joaquim Thomaz de Aquino, que comprava da gente. A gente pedia produtos pra eles e vendia pra eles. É pra produção dos litros e das garrafas, era um trabalho...
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Depoimento de José Carlos Alberto Almeida de Souza
Entrevistado por Fernanda Peregrina
São João da Barra, 20/03/2013
Realização Museu da Pessoa
AECOM_SJB_HV03 José Carlos Alberto Almeida de Souza
Transcrito por Karina Medici Barrella (MW Transcrições)
P/1 – Seu Carlos, pra começar o senhor fala o seu nome completo, o local e data de nascimento?
R – Meu nome é José Carlos Alberto Almeida de Souza. Eu moro na Atafona, Cehab, Rua Seis, casa oito. Eu nasci em quatro do doze de 1955.
P/1 – E o senhor nasceu aqui em Atafona mesmo?
R – Eu nasci na Ilha de Convivência.
P/1 – Seu Carlos, como era o nome dos seus pais?
R – O nome do meu pai Florentino de Souza, a minha mãe Maria da Conceição de Almeida.
P/1 – E o que seus pais faziam?
R – Meus pais sempre foram pescadores e também trabalhavam na lavoura. A gente morava lá em Gargaú porque quando eu estava com quatro anos de idade meus pais saíram de Convivência por melhora, condições de trabalho. Nós estivemos lá no sertão do São Francisco do Itabapoana, que na época era São Francisco de Paula, que também pertencia a São João da Barra. Então, eu trabalhava lá com meus pais nos mangues apanhando caranguejo, era dentro dos brejos tirando taboa. Taboa. É uma palha, que se fazia palhão e também esteirinha, essas esteirinhas que ainda encontra por aí. Palhão hoje já não se fala mais, né? Sabe o que é palhão?
P/1 – Não, explica pra mim.
R – Palhão é uma palha que é um trabalho que a gente fazia pra vestir nos litros e nas garrafas, que antigamente não existiam os engradados que têm hoje. Aquilo ali eram uns caixotes grandes pra indústria aqui em Joaquim Thomaz de Aquino, que comprava da gente. A gente pedia produtos pra eles e vendia pra eles. É pra produção dos litros e das garrafas, era um trabalho que a gente fazia com a palha do brejo, que a gente falava taboa. O palhão vestia em cada garrafa e ali iam nos caixotes grandes com cem litros, cem garrafas, pra ser transportado. Então, era o trabalho da gente desde essa época. Uma vez eu dei uma entrevista também pra Eco Anzol falando nisso, eu não tenho saudades de infância porque eu não tive. Minha infância foi trabalho, eu não tinha outra opção, meus pais com muitos filhos, nós éramos em 11 irmãos, e tinha que todos trabalharem.
P/1 – Como que era essa rotina de trabalho, do dia a dia da família?
R – Eu posso até dizer que era legal, hoje falando, porque foi uma maneira que nós aprendemos a trabalhar desde cedo, e trabalho é bom, trabalho é vida, faz com que a gente tenha um bom desempenho. Então e a gente, na época que era de verão, que é a época que dá o caranguejo, a gente ia pros mangues, às vezes ficava lá até um quarto. O que é um quarto? São quinze dias, tem o quarto crescente e tem o minguante. Então, meus pais iam pra lá e já levavam a família toda, e a gente ficava lá nesse período todo só pescando, pescava no dia, pescava à noite, de acordo com a maré, maré que sobe e desce, então, a gente ficava lá nesse período até 15 dias. Quando não era isso, a gente estava fazendo palhão, estava fazendo a esteirinha porque esse caranguejo tem a época, né, deles andar, é no verão que eles andam e a gente pega com facilidade. Então, a gente tinha esses trabalhos. E meu pai também cuidava de peixe, salgava na época, não existia gelo assim, salgava, e meu pai vendia, levava pra muitos lugares do estado do Rio pra vender.
P/1 – O senhor lembra quais eram os peixes que seu pai pegava?
R – Ele comprava peixe de paraíba, que a gente fala, peixe de brejo também, que era a traíra, acará, morobá, saiuru, xingó, comatã. Naquela época tinha dourado também, que é um peixe que eu levei 30 anos pra ver, só vi agora em 2008, quando houve aquele desastre ecológico, que apareceram aqui mortos.
P/1 – Como era a pesca na época do seu pai?
R – Meu pai pescava muito de juquiá, pescava muito de rede, mas não era esse material que tem hoje, esse plástico. Nylon, é de um determinado tempo pra cá, né? Mas na época era nylon seda, era um outro tipo de material. Mas aí armava lá nos brejos, apanhava, quando não era de juquiá. Juquiá é tipo um balaio, uma coisa assim, que é feito de bambu, que tem uns pés, e a gente sai pescando jogando assim, jogando pra lá, quando o peixe bate, que a gente consegui cercar um, aí o peixe já fazia barulho. Ele tinha por cima dele uma abertura que a gente enfiava o braço pra segurar o peixe.
P/1 – O senhor fazia esse material com seu pai?
R – Não, esse material a gente já comprava. Meu pai comprava, e até passava para os pescadores, e ele comprava os pescados dos pescadores.
P/1 – O senhor falou que alguns dos materiais que usavam, a rede, ele fazia. Como ele aprendeu a fazer, o senhor sabe?
R – Não, meu pai não tinha esse tempo pra fazer rede, ele só tinha tempo mesmo pra comercializar e também pra salgar. A gente também ajudava ele na plantação, nós tínhamos uma chácara lá em Gargaú, e a gente também tinha plantações, alface, couve, hortaliça, né?
P/1 – Porque só da pesca não dava?
R – Não dava, não dava. Eu lembro quando meu pai comprou essa chácara foi por 500 cruzeiros, falava na época. Meu pai pagava dez cruzeiros por mês de mensalidade. E a gente dava duro, tinha mês que meu pai não tinha, aí ele pegava com um senhor amigo dele, o nome de Antonio Picotê, que era quem comprava também os nossos trabalhos de palhão, de esteirinha.
P/1 – E como que era a casa que vocês moravam?
R – A nossa casa era de sapê, tipo essa aqui assim, porém era de estuque. Estuque a gente tirava varas no mangue pra fazer de pé e fazer atravessado, pra depois barrear com barro. Aí a gente falava estuque, casa de estuque, casa de sapê.
P/1 – E nessa vida de trabalhar, o senhor falou que não tinha lazer. Mas quando vocês não estavam trabalhando, o que você e seus irmãos faziam?
R – Olha, meu pai não gostava que a gente soltava pipa porque ele dizia que a gente estava trazendo infecção, coisas do ar. Ele também não gostava de ver a gente jogando bola de gude, mas a gente sempre tinha aquelas bolinhas de gude escondidas dele (risos). Não era que meu pai era bravo, mas ele via necessidade, ele preservava a gente de estar em certos lugares. Ele não gostava de ver a gente trepado nas árvores, a gente até subia nas árvores, ficava lá igual a um macaquinho, mas quando ele não estava, né? Quando ele viajava a gente ficava mais à vontade porque a mãe sempre dá mais uma cobertura.
P/1 – E essas artes que o senhor fazia, o senhor fazia com quem?
R – Com meus irmãos (risos).
P/1 – Tinha outras crianças com vocês?
R – Também.
P/1 – Quem eram essas crianças?
R – Eram os vizinhos da redondeza, da região.
P/1 – O senhor sabe se o seu avô também trabalhou com pesca?
R – Meu avô foi mais de comprar. Meu avô pai do meu pai, e também o pai da minha mãe. Eles compravam. Já o meu pai aprendeu também com essa venda de peixe com o sogro e o pai, né?
P/1 – E como era essa relação de comércio aqui na época deles, mais antiga?
R – O meu pai levava de caminhão, inclusive uma época ele comprou um caminhão, uma F1600, eu lembro como hoje. Até porque, como eu disse, eu não tive infância, então, eu tenho muitas coisas guardadas até hoje com cinco anos de idade, eu lembro o que aconteceu, a rotina do nosso dia a dia. Então, ele salgava e levava pra esses lugares ali do Rio de Janeiro, levava 15 dias, às vezes até mais vendendo esse peixe, quando ele chegava cá já tinha mais um tanto que minha mãe tinha. Ela tava descansando, de repente chegava lá um peixeiro: “Olha o peixeiro, olha o peixeiro”, pra minha mãe ir lá levantar e pesar. Era uma vida abençoada, mas com sacrifício, né?
P/1 – O senhor falou que lembra bem dessa época, né? Descreve um pouquinho esse dia a dia mesmo, algum momento desse período que eles trabalhavam, como era vocês como crianças?
R – Quando eu tinha seis anos eu já tinha mais oportunidade de brincar, ficar mais à vontade, mas eu já estava começando. Então, eu tinha mais assim, porque eu já era um dos mais nascidos, depois vieram outros, mais irmãos. Eu ainda brincava, saía um pouco assim, mas eu aprendi ali fazendo dez, 15, mas sem compromisso. Tinha dias que eu fazia até 25 palhões sem compromisso. Mas quando eu completei sete anos de idade eu já tive tarefa. Veja bem, a tarefa era de 70 palhões. Eu tinha sete anos completados, então meu pai: “Olha filho, você sabe o presente que hoje papai te dá, né?”. Eu disse: “Sei”, porque eu já vi o exemplo dos mais velhos, né? Eram 70, já comecei com 70 palhões. Só que eu não dava conta daquilo, mas os mais velhos, com a minha mãe, me ajudavam. Oitenta era 80, eu cheguei a fazer até 110, com 11 anos de idade. Com 11 anos nós retornamos à ilha de novo. Foi onde eu fiquei na ilha e estudei até os 13 anos. Mas lá meu pai não deixava a gente faltar à aula, meu pai não queria, mas quando a gente vinha cansado, muitas das vezes eu ia pra aula, chegava lá e dormia, não tinha nem como estudar. A professora também, ela dava uma oportunidade pra gente descansar porque ela sabia a luta da gente no mangue, no brejo. Então, com isso, até os 13 anos eu saí de Gargaú já praticamente na quarta série, mas viemos aqui pra Atafona, Convivência, retornamos. Aí, o estudo já ficou difícil pra mim porque eu não estava entendendo mais. Então eu preferi sair, meus pais não queriam deixar, faziam tudo para eu não sair, queriam que eu estudasse, mas aos 13 anos eu não tive mais como estudar, não, eu já queria ter algumas coisas, meu calçado, minha roupa, e meus pais não tinham condições ainda. Aqui foi bem melhor porque a gente já tinha peixe, começamos a pescar de novo, o comércio aqui ser melhor pra venda, porque lá é no interiorzinho, é bem básico, sacrificado. Aí as coisas foram indo. Com 13 anos eu me dediquei ao mar, trabalhei até os 48, vai fazer dez anos agora que eu estou afastado do mar, problema de saúde.
TROCA DE AUDIO
P/1 – O senhor falou que com 13 anos começou a trabalhar.
R – Profissionalmente.
P/1 – Profissionalmente, que o senhor começou com sete já fazendo os 70, né? Mas profissionalmente com 13. Que trabalho o senhor fazia?
R – Pesca.
P/1 – Pesca. Como que o senhor aprendeu a pescar?
R – Meu pai, meu pai me levava no mar pra ir e voltar, né? Aí eu me enjoava muito, é muito ruim a gente estar enjoado no mar. Meu pai fumava, naquela época era motor a gasolina, aquele cheiro muito forte, então, eu levei uma semana assim, espaçado, que ele não me levava no outro dia porque ele viu que eu não me senti bem no dia que ele me levou anteriormente. Então ele falava: “Não, meu filho, hoje tu não vai, não” “Vai sim, pai, deixa eu ir. Eu to legal” (risos). “Vai não”. E passavam dois dias e ele me levava de novo. E com isso eu fiquei um mês pra eu ficar legal. E depois eu já comecei a pescar mesmo com um senhor, com o nome de Assis, no camarão, indo e voltando. Então, ele dizia: “Carlinhos, você quer pescar mesmo?”. Eu disse: “Quero rapaz, eu to querendo pescar, me dá uma ajuda” (risos). Aí, ele pediu autorização ao papai, o papai falou: “Olha rapaz, eu sei que o senhor é um homem responsável, o senhor é pai, é meu amigo, meu filho vai com você, mas se o mar não estiver legal, não deixa meu filho não, traz o meu filho” (risos). Então, com 17 anos eu já passei a ter a licença pela Capitania, o comandante da Capitania dos Portos com a assinatura do meu pai, com a permissão do meu pai. Foi quando eu tive minha caderneta com 17 anos, como menor ainda, na época. Mas meu pai autorizou e o comandante fazia isso na época. Eu me alistei no exército, aí a gente já não tinha um direito que dava para o filho do pescador de até não servir, entendeu?
P/1 – Como era esse direito?
R – Era porque o pescador precisava dos filhos. Hoje eu nem sei te dizer muito assim porque eu não me liguei tanto, mas eles davam esse direito porque sabiam que o pescador tinha que trabalhar. Foi um direito que foi concedido.
P/1 – Seus irmãos chegaram a ter esse direito ou também não?
R – Tiveram porque eles também pescaram, né, e tiveram o mesmo direito, sim, porque tiraram a caderneta desde novo, a partir dos 17.
P/1 – Dos seus irmãos, quantos são pescadores?
R – Olha, eu tenho o Ivanilson que hoje não trabalhava mais, ele é plataformista. Tenho o Nevio, que é o mais velho, também mora em Rio das Ostras, ele hoje tem um comerciozinho lá, ele não toca mais a pesca também. E tem um outro meu irmão que é falecido, dois são falecidos, o Agildo e o Sidnei. E eu, no caso, eu estou afastado da pesca por causa desse problema de saúde, estou ainda em tratamento e hoje eu não estou pescando. Vou assim, um sábado, ou vou um domingo, vou feriado com os amigos. Hoje, atualmente, eu estou nesse resíduo do óleo, estou dando uma assistência aí porque há uma necessidade. Então, eu estou aí nesse resíduo, naquele tambor que está aí, eu que organizo, lá na frente tem um outro que daqui não dá pra ver. Lá em frente da minha casa acho que vocês puderam ver, tem dois, aqueles dois lá, e tem um que já está cheio de óleo. Óleo queimado que sai desses motores, dessas embarcações. Porque antes estava tudo sendo jogado aí e estava dando problema, sabe? Então, em 2005 eu vi que colocaram aqui um latão, o Meio Ambiente e a Secretaria de Pesca colocaram outro latão aí, só que os latões enchiam, são esses galões, a gente fala galão, mas tem outro nome, transbordava aquilo ali e não tinha quem vinha pra remover. Eu comecei a fazer isso aí, de forma que não tinha conhecimento também, peguei dois latões daquele e joguei lá do outro lado, lá no mato, quando foi um dia um senhor disse pra mim: “Olha Carlinhos, tu tá fazendo bem, mas você não sabe que você pode ser processado porque é você que está fazendo isso”. Eu falei: “Rapaz, então eu vou parar com isso porque a minha intenção não é fazer bem lá e vir fazer mal aqui”. Mas eu não desisti, eu procurei me informar e procuro sempre estar em reuniões com o Meio Ambiente, e por isso eu estou hoje dando essa assistência. Comecei desde agosto pra cá, agora, de novo, porque eu fiquei sete anos dando assistência nisso aí. Eu levei pra minha casa e deixei armazenado três mil litros de óleo. Depois que os carroceiros ficaram informados que eu tinha esse óleo em casa, eles vieram e quando chegavam pra me pedir uns cinco, dez litros pra eles lubrificarem a carroça, aquelas ferragens, eu já dava 60 litros (risos): “Não, Carlinhos” “Não rapaz, leva”. Eu tinha uns latões desses de 60 litros e alguns de 22 litros que a vizinha me deu, o marido dela faleceu e ela tinha lá: “Ah Carlinhos, você tá mexendo com esses óleos aí, tenho aqui uns 30 quase”. Tinha uns 20 e tantos, foi onde eu armazenei, mas depois não deu. Foi até 2012, três de janeiro de 2012, mas também eu não estava sendo remunerado nada. Eu trabalhei seis anos aqui pela firma União Norte Fluminense nessa limpeza aqui de gari, a pedido dos amigos porque eles viam eu fazendo isso e eles: “Não, então você vai cuidar disso aqui pra nós”. Eu fiquei seis anos e oito meses, foi onde o senhor lá que é da indústria, da companhia União Norte Fluminense me falou que não era para eu me envolver com esse óleo porque isso pertencia ao Meio Ambiente. Eu disse: “Olha, então tá, eu não vou me envolver no período do trabalho que eu vou prestar pela União”, que foi no dia 30 de dezembro de 2005 que eu entrei. Então eu disse: “Eu não vou fazer esse serviço aí, dar essa assistência no período do horário que eu estiver pela firma. Mas depois eu vou ter que dar senão o valão, tudo aí vai acontecer, e meus amigos estão gostando, estão abraçando a causa”. Mesmo que ainda tem uns dez que não se deixam levar, mas é minoria.
P/1 – Seu Carlinhos, até falando dessa questão de meio ambiente, como era aqui antigamente? Como era a região em termos de peixe, de vegetação? Como era antigamente aqui?
R – Olha, isso aqui antigamente, aqui era um valãozinho só, aqui tinha, vamos dizer, um riacho, como a gente fala aqui. É um riacho que vinha de lá até aqui assim. Isso aqui ainda que tem 36 anos, por aí, essas casas que construíram. Há 38 anos, ali na frente mais ali era um peral muito fundo. Tem a casa de um amigo meu ali com o nome de Zezé Cravo, aquilo ali, quando a gente vinha lá de Convivência pra brincar com eles aqui, ou até mesmo vir andar de bicicleta alugada aqui. Depois que a gente fazia uma pesca de camarão, de siri, ou mesmo caranguejo, a gente vinha vender aqui e já ficava alugando bicicleta pra ficar andando por aí. A gente agrupava com eles aqui, e ele subia lá no alto de uma árvore que tinha ali, que era um pé de jamelão, e eles pulavam lá do lugar mais alto, faziam um trampolim assim. Eles pulavam! E era tão fundo que ele subia e pulava e não acontecia nada. Só que depois, devido ao tempo, foi ficando seco, seco, os peixes também foram afastando, os matos vieram formando ilha, formando ilha, tudo ficou mais difícil. Conforme hoje nós temos o nosso Paraíba aí numa situação precária. Se hoje a gente quer sair pro mar, por exemplo, a maré agora ainda tem água, mas às três horas da manhã se tem água pra gente sair daqui, a gente tem que aproveitar e sair porque daqui pra frente é seco. Embora a gente ainda não sai pro mar, tem que esperar lá na Ilha da Convivência porque se ficar aqui a maré vai secar e ninguém vai conseguir sair pro mar.
P/1 – Aqui a gente está no encontro do rio com o mar. Como é pro pescador essa questão de ter água doce e salgada?
R – A coisa pra nós aqui não atinge muito a nossa pesca, não atrapalha em nada a maré encher, o rio encher. Agora o rio mesmo tomando água até facilita pra gente entrada e saída tendo água de rio aí. Agora, o pescado nosso é mais mesmo no mar, porque aqui pra cima tem aqui quem pesca tainha, pesca robalo aí no Paraíba, pesca o camarão pitu. Mas essa parte fica mais aqui pra São João da Barra, pra eles lá pode, o rio dá uma diferença, não poder estar com cheia pescando, mas em compensação quando seca também, que vaza o rio, tem peixe com bonança, à vontade.
P/1 – Seu Carlos, voltando um pouquinho à questão da pesca em si, quando você falou que com 17 anos já assinou e tudo o mais. Como era? De quem era o equipamento, barco, de quem era que o senhor trabalhava?
R – Olha, na época eu trabalhei muito pra família do pai do Willian, Willian Pereira, que é o presidente da colônia. Nós, eu e o meu irmão mais velho, o Névio, ele era já mestre de barco, trabalhou muito mestrando barco pra essa família do seu João, que a gente falava João de Nonô. Mas aí a gente trabalhava pra eles, material deles, o barco era deles. A gente tinha só a parte no pescado que a gente capturava. Por exemplo, nós saíamos em três, a gente fazia lá mil reais, vamos dizer, na época de hoje. Mil reais, era livre a despesa do óleo, do mantimento que a gente leva, aí é dividido, metade pro barco e metade pros três ou quatro tripulantes. Mas a gente pescava, na época era bom, a gente ganhava mais dinheiro com mais facilidade, hoje a pesca está muito mais difícil do que antes, era muita quantidade de peixe na época, né? Mas hoje já está mais longe pra gente ir. É muita embarcação hoje, hoje os barcos evoluíram muito, hoje você vê barcão, mas naquela época a gente trabalhava em barquinho pequenininho. Era inclusive motor a gasolina, depois que passou aos primeiros motores que a gente falava B10, V10, Yamaha B10. Aí, as embarcações foram crescendo, hoje nós temos barco que pode se dizer rebocador, de bom tamanho, de ficar em plataforma uma semana,15 dias, 20 dias. Mas na época os barquinhos eram todos pequenos.
P/1 – E quanto tempo vocês ficavam no mar?
R – Olha, quando a gente saía pra pescar, a gente pescava de acordo com a quadra. O que é quadra? É de acordo com o tempo. Onde o vento ia a gente estava, ou parado, ou pescando. Por exemplo, aqui o vento que mais atinge nós aqui é o Nordeste. Nordeste quando bate forte aqui, a gente não tem condições de trabalhar na nossa costa, então a gente já atravessava nessa época Farol de São Tomé, que a gente fala Farol de São Tomé, conhece?
P/1 – Não.
R – É depois de Campos, 55 quilômetros da praia de Campos, a única praia que Campos tem. Esse Farol de São Tomé, em carta náutica fala Cabo de São Tomé, entendeu? Mas todos nós aqui usamos chamar, conhecemos como Farol de São Tomé. A gente ia pra lá, aí não tinha condição de vir porque o barco era de pequeno porte e os motores também, então a gente ficava lá até dar o Sudoeste, se tivesse 15 dias de Nordeste, a gente estaria lá 15 dias. Lá tem condição de pescar. Se ficasse um mês a gente também ficava um mês lá. Se demorasse muito e a gente quisesse ir, a gente tocava pra Macaé, pra Rio das Ostras, Barra do São João. Aí, vamos ter que ir em casa, estamos já 18 dias no mar, vamos tocar, vamos lá pra Macaé. Aí, a gente ia pra Macaé, o barco ficava lá, a gente vinha em casa, e no período de dois, três dias a gente retornava de novo. Se tivesse Nordeste, lá a gente continuava a pescar de novo, mas se desse uma mudança, conforme hoje, está aí o Sudoeste, aí a gente também tinha que atravessar rápido porque Cabo de São Tomé é uma das costas mais respeitadas do Brasil, o mar aí é agitado, quando quebra não tem muita diferença quando o Havaí tá bem brando, o havaí (risos).
P/1 – Seu Carlos, como que era a rotina quando vocês estavam no mar por um período tão longo? Como que era o dia de vocês no barco?
R – É como eu já disse, a gente trabalhava em uns barquinhos muito pequenos, né, não tinha nem fogão. A gente descia pra comprar em terra, no Farol de São Tomé. Muitas das vezes a gente ficava sem comer nada porque o que a gente tava levando de terra pro mar, o batelão que tirava o nosso pescado, o indicador que é chamado batelão, ele tombava com a gente, muitas vezes era com o pescado e a gente perdia, e muitas das vezes a gente ficava sem comer no mar porque anoiteceu, à vezes tinha alguém por perto que sabia que a gente perdeu tudo: “Não, eu tenho aqui, vamos dividir, que eu comprei pra hoje e pra amanhã durante o dia nos momentos que estiver pescando”. Aí, a gente retornava à tarde e vinha de novo pra praia comprar e trazer o pescado, que os caminhões saíam daqui pra ir lá buscar, os donos dos frigoríficos, a Odineia, era também a Cooperativa Mista dos Pescadores que tinha na época, e outros mais compradores, que não existiam muitos na época, né?
P/1 – E como é que era, pros pescadores, irem pescar em região que já tem os pescadores locais? Como é essa relação entre os pescadores?
R – Olha, era uma coisa muito legal (risos), vamos dizer assim. Eles lá não tinham esse desenvolvimento que hoje tem lá também, que era só nós, que existiam esses pequenos barcos. E eles lá pescavam de baitelão mesmo, eles cercavam com a rede lá, fazia o cerco lá no mar e puxavam, por exemplo, seis homens de um lado, seis de outro, puxando aquilo. Eles viam que num arraste só que davam a gente apanhava 500, 600 quilos de camarão. E eles cercavam lá e puxavam aquele monte de homem que até tirava 50, 60 quilos, depois voltava a cercar de novo. Então, quando eles viam a gente passar, que era bem o rolo da praia, que assim que fala, eles viam que a gente tava arrastando, o barco arrastando a rede, ele não desenvolve muito, né? Eles corriam, cercavam a gente, cercava, lançavam a gente pra puxar com barco e tudo, eles estavam irados com a gente (risos).
P/1 – Então eles não gostavam, não (risos).
R – Então, o que a gente fazia quando eles lançavam aquele monte lá? E vinha mais quem vinha pra ajudar de outro lanço lá. É, eles vinham! “Vamos puxar pra praia”. Eles queriam ver a gente quebrado, o barco desmanchando na praia. Mas aí a gente usa a inteligência que é mais do que a força, né? (risos). A gente jogava a âncora, a gente já tinha âncora preparada com amarração, tinha separado espia. A gente tinha já preparado. “Se eles caso lançarem a gente não tem problema não, a gente joga a âncora”. A gente jogava a âncora e dizia: “Aí, ó, pode puxar” (risos) “Puxa, puxa mais” (risos). A gente dava sinal pra eles puxarem à vontade. Aí, a gente via que não tinha como, eles mesmos vinham de lá pr tirar a rede que eles mesmo lançaram lá. E depois ficou tudo amigo, né, era pescador mesmo, a gente se entende (risos). Mas eles eram bravos com a gente.
P/1 – E como era quando os pescadores se encontravam, o que vocês faziam?
R – A gente pagava eles ainda: “Olha rapaz, agora nós vamos pagar você hoje pra tirar o nosso pescado daqui pro caminhão”. Aí eles já ficavam: “Então tá, hoje é quem?” “Hoje é Luiz” “Luiz, tira dois”. Eram muitos barcos que saíam daqui. Um outro lá, da área mais próxima aí, “Então vamos acertar aí cada um pra não ter só um ou dois, e vamos fazer”. Mas sempre tinha aquele mais safo pra lidar com lá. Daí a gente: “Eu não quero aquele lá, eu não quero”, vamos dizer o Rui, “eu não quero o Rui, não. O Rui não entende desse mar, não. Vamos pegar o Luiz”. Aí ficava entra nós também no mar. “Ó, você vai esperar Luiz, então vai anoitecer o seu camarão aí”, e aí a gente não queria: “Não, vem você mesmo tirar esse pescado nosso aqui” (risos). Porque a gente já estava até com fome, né? (risos)
P/1 – E como era o lazer de vocês? Tinha algum tempinho que dava pra relaxar um pouquinho?
R – Dava. Quando a gente chegava lá, por exemplo, naquela época a gente botava umas redes dessa, que não existia, como eu disse na época não tinha essas redes, eram redes diferentes dessas daí, porém também, de menor capacidade de segurar o peixe. Então aí, a gente botava em alto mar quatro, cinco embarcações. Aí, quando um achava a rede, que a gente não tem essa mentalidade que nós temos hoje, nós não tínhamos na época, então a gente usava, nem era boia de isopor porque também não existia isopor na época, não existia esse isopor. A gente tirava boia de ninga. O que é boia de ninga? Boia de ninga é um mato que dá por ali, do outro lado tem, daqui eu não estou avistando nenhum para eu mostrar a vocês, então a gente fazia essas boias de ninguém. A gente chegava lá em alto mar duas, três horas fora da costa, no Farol de São Tomé, a gente lançava nossas redes lá. O outro ia mais pra frente e lançava a dele, o outro lançava a dele. Quando um encontrava a rede, por aquele todos se achavam, entendeu? Às vezes a gente não via, hoje, por exemplo, um tempo desse aí, aconteceu muitas vezes com a gente, a gente só vê o encoberto assim, não se vê a marca, a gente faz a marca, é um prédio, ou uma palmeira, uma montanha com a outra, aí no outro dia era a bússola da gente. A gente não tinha nem bússola, na época.
P/1 – Nem bússola.
R – Não tinha. Não tinha nada disso, a gente navegava a moda dos antigos marinheiros, pelas estrelas, né? (risos) Pelo vento. E a gente se perdia no mar, e se perdia mesmo porque o mar é muito grande.
P/1 – E mudou um pouco a tecnologia, né? Como foi, pra vocês pescadores, essa mudança de tecnologia, de GPS. Vocês conseguem ter acesso a esse tipo de tecnologia?
TROCA DE AUDIO
P/1 – Seu Carlos, o senhor estava descrevendo uma pesca extremamente artesanal, até da localização, né? Teve alguma mudança com relação a tecnologia, né? Que mudanças foram essas?
R – Olha, essas mudanças aí, a gente pode dizer que hoje não tem mais distância que nos separa da família. Porque hoje a gente sabe onde está em alto mar, a gente sabe onde a gente vai chegar, deu um problema com o motor a gente tem socorro porque tem meio de comunicação. Ih, isso hoje, estamos em casa, por mais longe que esteja em alto mar, mas ainda podemos dizer, hoje estamos em casa. Foi muito bom.
P/1 – E com relação a técnica da pesca em si? Teve alguma mudança?
R – Teve, até uma coisa que muitas das vezes, nessa parte aí já não foi muito assim porque hoje o peixe não consegue nem mais fugir das redes porque o GPS, o sonar, eles já indicam o cardume. Antigamente a gente até passava por cima porque só via quando ele estava velado na traineira. Hoje a nossa área tem muito barco traineira, essa traineira cerca tudo. Na época a gente cercava porque tinha também a sonda, em alguns barcos lá de Cabo Frio, Rio de Janeiro, Macaé pra lá. Mas hoje não, hoje eles estão lançando as redes em cima das pedras, estão sabendo onde está. Porque até a tecnologia pra eles, pros pescadores mesmo, eles estudaram a maneira de fazer um cerco até em cima das pedras rasas, não daquelas pedras altas, que tem pedreira também no fundo do mar, com altura, né? Então, por exemplo, hoje solta lá nos cascalhos onde ainda tem algumas pedras soltas porque o estilo que hoje tem, o sistema de hoje, eles cercam o cardume lá, a pedra já fica por lá mesmo, não vai trazer, e se trouxe são algumas pequenas, soltas. Mas consegue trazer o cardume através desses aparelhos que têm hoje aí. Eu não gostei muito desse, não (risos).
P/1 – E com relação ao volume de peixes? Isso interferiu?
R – Muito. Muito. Porque hoje as traineiras cercam aí uma pescaria que a gente leva três, quatro meses num período de verão pra capturar. É onde muitos amigos apanhavam mil, outro apanhava 500, outro 800, 2 mil em uma semana, então eles vinham e cercavam 60, 70 toneladas, cento e tantas toneladas, aquele pescado era o que ia estar na nossa região em um período de três, quatro meses para cada qual estar capturando de acordo com a sua sorte.
P/1 – E o tipo de peixe? Teve alguma alteração?
R – O tipo de peixe. O cardume que a gente tinha muito aqui era pescada mesmo, a pescada se acertou muito aí. Ela vem no verão aqui pra gente aqui, no período de três, quatro meses, onde a gente apanhava 200 pescadas, 300, 150, variava de pescador pra pescador, de cardume pra cerca de cada qual pescador acertava. Essas traineiras aqui são uma devassa.
P/1 – Teve alguma outra coisa que também causou alguma mudança com relação ao volume de peixe, tipo de peixe?
R – Olha, hoje nós temos ali um Porto do Açu que pra nós foi uma perda muito grande em relação à pesca. Porque aí é o berçário, ali é onde a gente põe a corvina, o cação, a pescada, o camarão que é uma coisa que dá direto, inverno e verão. Aquilo ali, hoje, não foi bom, foi uma perda que nós tivemos aí, de um pesqueiro muito importante pra nós. Mas fazer o quê? A gente está ali aguardando porque futuramente também poderá nos facilitar, né? Porque a pesca hoje, por muitos que dizem: “Ah, pescaria vai acabar”. Não é também assim não, eu não concordo, eu discordo de qualquer um. Porque um dia eu até falei em uma outra reportagem que a dois mil anos atrás precisou Jesus vir pra ensinar o pescador a pescar, né? Então, se a dois mil anos atrás, antes de ser já era, que é a pescada, antes de sermos pescadores já era peixe, então atrapalhou bastante, muito, mas tudo é a mando de Deus, nada acontece sem a permissão de Deus.
P/1 – E com relação à exploração de petróleo na região? O senhor observou alguma alteração?
R – Sobre o petróleo?
P/1 – É, com relação à exploração do petróleo, os pescadores, o senhor percebeu alguma alteração na região desde que começou a exploração de petróle por aqui?
R – Olha, houve sim, está havendo e não é de agora. Isso aí foi desde quando começou em Macaé. Em Macaé nós tivemos muita perda de material, nós tivemos a perda de amigos que navios bateram, um morreu, alguns deles. Catamarã já passou por cima de barco de amigo. Então, causou sim um impacto muito grande na pesca. Inclusive também, o tráfico marítimo, né? Hoje, é como eu disse anteriormente, a gente hoje não pode estar tranquilo, mesmo estando amarrado num barco e a gente está ali, a gente não está só vigiando os aparelhos, não, a gente está vigiando nossa vida. Porque o tráfico marítimo hoje, Petrobrás, plataforma é como se fosse táxi, então isso atrapalhou bastante pra gente, atrapalhou muito.
P/1 – Alterou, o senhor já falou a questão do porto, também de Macaé. Mas alterou as áreas que vocês costumavam pescar e que hoje em dia não podem mais pescar?
R – Muito. Tem lugares que não dá mais pra gente lançar a rede porque é esse problema do porto. E em muitos lugares não dá pra gente lançar a nossa rede porque o Porto do Açu, por exemplo, isso aí, daqui mais um tempo quando começar mesmo a funcionar, que ainda não está em funcionamento, né? Mas isso vai ser um caos muito sério pra nós, nós vamos ter que estar muito atentos porque podem acontecer coisas fatais. Então, isso é uma prevenção que a gente tem que tomar agora pra frente. E os pesqueiros, às vezes, continuam os mesmos, mas não podemos dizer que vamos estar ali tranquilos porque a gente tem que ter hora pra vir, a gente vai ter que estudar, notar o horário de movimentos de maior frequência de tráfego marítimo ali pra gente poder ter horas, pra poucas horas levar ali naquele determinado ponto de pesqueiro.
P/1 – O senhor falou dos perigos, né? O senhor já passou por situação de perigo no mar, pescando?
R – Eu já passei muitas vezes no mar, inclusive uma vez peguei um tempo muito, vários temporais, eu já passei pelo mar. Muitos amigos, inclusive eu tinha um, Carliel, hoje ele já não é mais existente entre nós. Uma vez nós pegamos um tempo muito forte, ele num barco e eu no outro. Eu, inclusive estava sem parceiro, eu estava só. E ele estava com outro no barco. Nós ficamos esperando porque deu um tempo lá no Farol onde nós estávamos ancorados, então, era de costume, naquele tempo, não vingar, no outro dia quem ficava lá fazia uma boa pesca. E nesse um dia aconteceu que isso nós fizemos, deu um contratempo e nós ficamos lá. Mas só que lá pelas três horas da manhã o mar no Farol de São Tomé ficou feio, nós tivemos que sair, e o mar estava quebrando pelas coroas, estava quebrando, que são 22 milhas seco de quebra-mar. Então ali o seguinte, eu navegando só, o meu barco andava mais do que o dele, ele ficava andando com a mão pra mim, apavorado, eu já diminuía o motor, esperava ele. E eu dizia: “Dá força nesse motor aí! É um momento de não poupar o motor” “É que não tem mais, está no volume todo!”. E ele nervoso, chorando, “Carlinhos, eu vou morrer! Eu não vejo mais meu filho!”. Ele tinha um filho só na época, morava ali na outra rua ali, agora a família dele está em Barra do Itabapoã, que ele já era de lá mesmo. Então ele disse: “Eu vou morrer, Carlinhos!”. Eu disse: “Não morre, não, rapaz! A gente não vai morrer, não, vamos com Deus”. Então o outro companheiro dele entrou pra dentro do porão do barco e disse que ele ia, ele chegou aqui e disse: “Eu entrei pra dentro do porão do barco pra morrer sem eu ver” (risos). Então, depois disso aí era um percurso que a gente fazia com três horas, nós saímos de lá três horas da manhã, nós só chegamos aqui quatro horas da tarde.
TROCA DE AUDIO
P/1 – Desculpa. O senhor estava falando que ele estava com medo, que foi pro porão pra não ver...
R – Foi. Ele entrou no porão do barco e disse que já entrou pra morrer sem ver. Eu disse: “Você vai ver o mar ainda”. Porque o mar estava muito bravo, o mar estava bravio demais. Era cada onda da altura de um poste desse aí. Mas só que a gente pegava costeando porque pelas coroas quebrava tudo. A gente pegou, costeando, pra chegar na primeira linha dos navios. Nós temos aqui três linhas de navio, né? Falaram isso pra vocês?
P/1 – Não. Pode falar.
R – Nós temos três linhas de navios. Tem a primeira, a segunda e a terceira. Então essa primeira são os naviozinhos que vão mais aqui pra perto, que vai pro Rio, Vitória. E depois tem outros mais que já vão pra Santos. Já tem uma outra que vão pro exterior. Então, a primeira aqui dá uma base de Cabo de São Tomé da costa pra fora dá isso aí, 20 a 22 milhas. A gente tinha que chegar lá porque lá já era o canal, já atravessava as coroas, lá a gente já estava fora do perigo. Mas foi uma volta muito grande que nós tivemos que dar, e a sorte nossa que Deus mandou uma tempestade com muita chuva, muito pesada, e aquilo ali foi pra dar um tempo pro mar arriar um pouco, um peso de chuva. Mas nós já estávamos chegando em profundidade elevada também porque mais pra costa é seco. Então, isso aí não foi só essa vez, foram várias outras vezes que aconteceu. Eu já caí na água, eu tombei um barco duas vezes aqui na barra. Uma eu tinha 17 anos, foi assim que eu tirei meus documentos, eu já passei a mestrar banco, eu com 17 anos já mestrava barco. Então, foi aqui na barra onde tinha um mar muito bravo, né, aí os companheiros que não saíram: “Olha, vamos voltar”. Muitos voltaram, eu também voltei nesse dia porque não estava dando pra sair a barra. Foi quando passou um outro amigo que mora ali na frente, de nome Manuel, ele disse: “Carlinhos, vamos nós! O mar tá abrandando, a maré encheu. A maré vai encher, o vento vai acalmar e o mar também!”. Aí, ele me animando eu disse: “Então, vamos, né?” (risos). Nós pegamos e saímos, conseguimos sair no mar. Então, veja bem, era um motor Stol, era um motor a gasolina na época. Então, tinha um companheiro com o nome de Carlinho também, meu xará. Terceiro dia que ele tinha saído ao mar, eu estava treinando ele, tinha sido o terceiro dia, quando esse barco tombou. Então, esses motores, como é hoje também, esses motores à gasolina, a gente tem que abrir um pouco a regulagem. Ele não entendia muito bem, na vinda que nós viemos o mar não abrandou, não. Não achamos camarão porque com o mar bravo não dá camarão, fica difícil, então nós escolhemos o arrasto, viemos embora antes que a maré secasse, então ali o que aconteceu? O motor na hora, eu abri a regulagem e falei pro meu xará: “Carlinho, na hora tu acelera que a regulagem já está aberta que é pra mais saída da gasolina”. Aí, não sei o que houve lá, ele foi acelerar o motor, na hora que veio uma onda grande, eu disse: “Acelera o motor!”. Aí, a gente ia atravessar bem, mas aí ele mexeu lá o dedo dele, a mão dele, pegou por baixo, fechou a regulagem, o motor não aceitou e parou. Foi quando veio aquele caixotão de mar assim, aquela onda, né? Aí pegou assim, eu governei assim um barco pra mais de uns 150 metros, tentando equilibrar, mas quando o mar veio, que ele despejou, o barco atravessou. Eu disse: “Pula!”. Ele pulou, eu pulei. O barco deu três tombos. E outra vez foi em agosto, dia 15 de agosto de 94, quando meu filho também, 14 anos não quis mais estudar. Não quis mais estudar, eu disse: “Meu filho, estuda. Papai não aprendeu estudar, não dá trabalho pra sua mãe, não. Seu pai tá no mar, ajuda sua mãe aí, você vai estudar”. Aí quando chegava aqui a mãe: “Olha, não tem jeito, não. Nosso filho, eu não tenho condições, ele não está me obedecendo, não vai pra aula, não tá fazendo dever, não quer estudar”. Aí, ele chegou pra mim e disse: “Olha pai, eu quero pescar”. Eu disse: “Não, meu filho, vai estudar, vai. Papai não quer ver você pescar agora, não”. Aí não teve mais como, eu disse: “Então tá, não vou mais te poupar, não, porque hoje eu to te dando essa chance que eu não tive. Agora o seguinte, você então quer pescar, você vai pescar, não vai ficar por aí jogando bola também, soltando pipa, não”. Ele começou a pescar comigo com 14 anos. Quando ele completou 15 anos eu tombei um barco e quase que eu perdi meu filho, eu não gosto de lembrar disso não, sabe? Eu não gosto de lembrar disso, não. Então, ele ficou preso debaixo do barco (emocionado). Aí, foi quando eu, desesperado: “Cadê Deus, meu filho? Cadê, Deus, meu filho?”. Eu não gosto, sinceramente. Ele tinha 15 anos. Hoje ele está com 34 (emocionado).
P/1 – A gente vai mudar de fita e dar um tempinho pro senhor, tá bem?
R – Mas é a vida. Hoje eu glorifico a Deus porque ele tá aí, né?
TROCA DE AUDIO
P/1 – Seu Carlos, vamos falar agora um pouquinho, o senhor falou das suas estadas no mar, vamos agora falar um pouquinho sobre a questão da venda. O senhor já falou que era o frigorífico. Como é essa relação do pescador com o atravessador, a pessoa que compra esse peixe?
R – Olha, nós sempre tivemos uma desigualdade de parte, né, de comprador, atravessador, pra pescador. O pescador sempre foi aquele que chega, é pescado fresco, então se a gente não tem como congelar, armazenar, hoje até tem as urnas, mas vamos dizer assim, o comprador, o atravessador quer sempre ganhar 3x, ele quer pagar um e quer ganhar mais, e isso não é de agora, isso foi sempre assim, desde a minha época aos 13 anos. Esse convívio é até hoje. O comprador vem comprar da gente por um x e, às vezes, até vende na frente da gente por dois x, dois x e meio, então isso é uma desigualdade muito grande de comprador para o pescador.
P/1 – E com relação a essa questão, também, como os pescadores se organizam? Tem uma associação, tem uma colônia, como é que funciona?
R – Olha, até formaram uma associação de pescadores, mas não foi a frente. Hoje, a associação que nós podemos dizer é a Colônia de Pesca. A Colônia de Pesca tem umas coisas que, sempre houve esperto, se é pra falar, vamos falar a real. Isso não é de agora, isso é de desde há muito tempo. Quando alguém consegue tudo no nome do pescador, o pescador é aquele que está sempre ali, mas muitas das vezes o pescador, ou toda vez os pescadores são os culpados. Até porque eu vou dizer, os pescadores não têm muita informação, não somos culturais, nós não temos estudos, nós nos dedicamos à pesca, mas sempre tem um ou outro que tem menos conhecimento que muitos. Então, o que acontece? Chega lá, eles fazem lá, pedem uma assinatura nossa, isso desde 85 tem casos acontecendo, que eu tenho e falo. Eles pedem lá assinatura da gente, hoje o pessoal está acordado, como nós aqui usamos falar: “Olha, você tá acordado agora, não está?” “Agora estou, acordei” “Então tá bom”. Eu uso dizer que eu já dei luz, eu já fui vagalume muitas das vezes, então hoje eu não estou mais querendo, eu até incentivo meus amigos, eu sou um reivindicador, eu reivindico com eles: “Rapaz, não vamos entrar em tal coisa, não, porque nós sempre demos luz pra sapos, sempre fomos vagalumes”. Agora, você dá a assinatura, você tá sabendo o que tu tá assinando aí? E a gente não tinha nada, um cabeçalho, não tinha nada pra gente saber. A ata tava ali, mas a gente não estava sabendo. Eu digo porque eu fiz muito, eu assinei vários. Então, aquilo ali depois eles faziam o que era o pedido pro governo, o pescador, mas só que lá entre eles ficava, na presidência da colônia. Eu vou contar, eu vou contar um caso aqui que houve em 85, quando o José Sarney era presidente. Vieram de lá, de onde não sei, são nortistas, mas de onde eles chegaram aqui na época eu não sei de onde vieram, que era o Paulo da Emater, que hoje está de volta. Era a senhora Maria de Lourdes, essa Maria de Lourdes e o Paulo, eles trabalhavam a serviço da LBA. Eles chegaram pra gente, eu uso esse termo porque realmente foi. Eles chegaram aqui, vamos dizer assim, comendo pão com mortadela e refrigerante. Mas aí, eles viram que era um movimento bom, o pescador já tinha o seu crédito, a sua credibilidade para com os governos, mas só que aqui ninguém tinha informação de nada, aqui era tudo apagado. Nós aqui éramos como o filme que foi aqui, na boca do mundo. Nós aqui estávamos a mercê de tudo. Então, eles que já vinham com grandes estudos, conhecedores de muitas organizações, então, o que aconteceu? Eles se entrosaram com o pescador. A Maria de Lourdes arrumou ali um canto pra ela ficar pelo serviço prestado, prestando serviço à LBA. Depois ela já se entrosou com a colônia de pesca, que na época era o senhor Eleilton que já foi secretário de 2005-2008 aqui da Secretária de Pesca. Então, era Sônia, irmã do Willian que trabalhava na Sudepe, que hoje é Ibama, é Ibama e outra entidade, Enea, né? Então o seguinte, na época, eles chegaram e se entrosaram aí, Maria de Lourdes. Foi na época de 75 que o mar já começou a invadir a Convivência, nós lá perdemos três casas, meus pais perderam, e outros perderam duas, porque fazia, construía, o mar vinha. Foi quando ela se aproximou ali, apoderou também da colônia, já ficou agrupada. Então, o que aconteceu? Ela pega, escreve uma carta pro presidente José Sarney usando o nome do tesoureiro que era o Serafim, faleceu agora há pouco tempo. O Eleilton Meireles, ele era o presidente na época, o Eleilton, com eles lá, fizeram um combinado, e então a Maria de Lourdes, não é existente mais hoje, faleceu, ela escreveu essa carta pro presidente José Sarney reivindicando uma verba pra obra de saneamento na Ilha de Convivência. Mas era onde eu disse pra vocês aqui, anteriormente, que pescador assinada. Então, ela botou todo mundo pra assinar tudinho, depois fazia lá o que eles bem entendiam. Usou o nome do Serafim, que era o tesoureiro, e mandou a carta pro José Sarney sem que o Serafim tomasse conhecimento. Quando, em 85, o prefeito que era o João Francisco de Almeida, veio um dinheiro pra prefeitura, se fala 120 mil cruzados, que foi no primeiro Plano Cruzado. Então, veio esse dinheiro. O senhor prefeito da época, João Francisco de Almeida, ele escreve pro Serafim, que morava lá na Ilha de Convivência. “Serafim, o senhor compareça aqui na prefeitura porque a sua reivindicação foi atendida pelo presidente da república”. Ele pega aquilo, ele não sabia de nada, onde que ele veio? Porque a informática, a Sete Informática, era a Maria de Lourdes, ela bem estudiosa, pegou e falou: “Não Serafim, vem aqui, tal, que eu vou. Isso aqui eu escrevi, botei no seu nome”. E ele nem tal coisa sabia. E esses 120 mil cruzados foram lá pra Convivência, botaram 500 tijolos ali, botaram 250 lá, botaram mais 200 lá na outra casinha. Bomba manual, que nem o diamante levaram, instalação, nada. Então foram na casa desse Serafim, fizeram um banheiro bem arrumado, um banheiro de primeiro e sabia que vinha fiscalização. A fiscalização veio lá dos homens de Brasília, chegaram lá, ela já agrupou a todos, levaram pra casa do Serafim, chegou lá mostrou o banheiro. Aquele lá tá o mesmo padrão, aquele lá tá o mesmo padrão, começou apontando as casas onde tinha os tijolos e acabou em nada, foi só esse banheiro mesmo que fez. Então, o que aconteceu? Ali, oras, quem vem lá de Brasília, um sufoco, dentro do Palácio do Planalto, em seus escritórios, vem praqui, vem pra Ilha de Convivência, uma brisa dessa, eles fizeram lá peixada. Pode ter rolado lá, quem sabe, um coquetel, um vinhozinho. Então o cidadão bate naquilo lá, na Ilha de Convivência e diz: “Estou no paraíso”. Você está anotando tudo, está anotado, anotado, apresentou. Apresentou o quê? Que ali, a Maria de Lourdes, o marido fez quatro barcas, eles só tinham um barquinho. Eu falo mesmo! Eu quero falar pro mundo todo ouvir mesmo, se permite botar, pode botar, deixe porque isso aí eu faço questão, entendeu? Então, o que aconteceu? O marido dela fez quatro barcos, que na época tinha um barquinho com o nome de Fusquinha, e tinha um carro que era um fusquinha também, e morava numa casa de aluguel. Se disse que compraram essa casa, ele fez ali um prédio, comprou uma pampa e fez quatro barcos. Quatro barcos, ele vendeu dois e ficou com dois, que ainda tem o filho que hoje tá por aí a serviço da firma no Porto do Açu. Então, há quem diga que compraram uma casa em Campos. Eu sei dizer que eles subiram, ficaram bem. O Eleilton, que era o presidente, foi ali naquele prédio, depois daquele ali, fez um frigorífico, que não tinha cais, isso aqui era um valão como eu disse anteriormente, não era afundado pelas dragas. Fez ali o frigorífico Mínimo, que hoje é de seu Ivan. Então, é assim que acontece essas coisas com o pescador aqui, entendeu? A colônia de pesca, você vai falar de colônia de pesca, tem que falar. A colônia de pesca já era presidente o Eleilton na época. Mas anteriormente também já houve outros, quando era época da Cooperativa Mista dos Pescadores, tinha um senhor com o nome de Benedito, mas não é esse, é outro Benedito que se falava Benedito da Colônia. Também era a maior falcatrua, eram os maiores desvios de tudo. E isso tem até hoje. Hoje, o Willian, meu amigo, se ele chegar aí, ele vai ter que sair porque eu vou continuar, se ele não gostar ele pode se retirar. Mas que é verdade, é verdade. Então hoje, o Willian tá ali, eu acho que ele pensa que ele está lá em Cuba, ele já é um Fidel Castro, um Raul Castro, nosso lá partiu, né? O venezuelano. Eu acho que ele está lá na Venezuela. Por que? Porque quando o pescador já não quer ir mais lá votar em ninguém, vem um benefício da Petrobrás, vem um benefício de outra entidade aí. Aí, tem lá 90 pescadores inscritos aqui, mas moram em Gargaú, moram mais além um pouco, mas são registrados aqui. O pessoal aqui não vem, então ele faz um projeto, faz um projeto conforme nós fizemos muito aqui pra ver luz sísmica, por exemplo, o que a gente chama chupa cabra, aquilo ali foi 460, 470 mil. Ficou no projeto de Willian. Ganhou por quê? Porque ele trouxe lá do Açu, reinou lá o pessoal do Açu, porque ele faz uma média e quando vem um benefício pros pescadores ele escolhe a quem levar, ele lá levou o pessoal de lá vem cá, ele prepara um ônibus, vem cá e vota nele, sem que a gente saiba que tem reunião pra presidência. Ele esquematiza tudinho que não dá tempo pra nós formarmos uma chapa pra concorrer. Aí, ele bota lá: Chapa 1, Chapa 2. Sendo ele concorrendo, ele e ele, entendeu? Por isso ele já virou um ditador, virou um ditador ali na Colônia de Pesca e muitas coisas que não condizem com a verdade. Aí ficam tudo: “É o pescador” “Ah, eu luto, vou lá e luto”. Pescador até inscrito em tudo, mas as verbas que vêm, nós não temos nada. Adoece um pescador ali, cadê uma colônia pra chegar junto num período de manter por determinado tempo, cinco meses, seis meses, até que a pessoa melhore. Não, não temos isso não, não temos. São coisas que hoje estamos à mercê. Eu não trouxe meus documentos, eu até disse que ia falar. Hoje eu estou ganhando 750 reais de seis de agosto pra cá, nesse trabalho aí, no resíduo do óleo. Poxa, eu fiz isso sete anos de graça, eu faço com prazer à minha comunidade. O pescador aqui já foi falado aí, a nossa prefeita falou que os pescadores são porcos. Eu não estou afirmando isso, eu também não acredito que ela venha a ter dito uma coisa dessas, mas disseram que houve uma filmagem que roda por aí, que a ex-prefeita Carla, na época prefeita, falou que os pescadores são os porcos que sujam os mananciais, os manguezais, rios, mar. Olha gente, pelo amor de Deus, eu estou dando essa assistência aí, mas se eu não bato de frente não tem nem quem venha aqui pra remover o óleo. Eu estive com o seu Marcos Sá falando que eu fui demitido porque fizeram uma pressão ali contra os garis, e na época eu tomava conta, porque eu estava de gari também, isso foi em 25 de julho de 2012. Então, o que aconteceu? Fizeram uma pressão aí porque estavam numa demanda com a câmara, com a prefeitura, virou uma politicagem muito desorganizada, então o que aconteceu? Botaram os garis pra conseguir uma suplementação de 51 milhões, botaram os garis todos como se nós, como que a cidade parou, que a cidade ia ficar parada e nem tanto. Já tinham conseguido 209 milhões pra quatro, cinco meses pra findar o ano de 2012. Então, esses 209 milhões, que já antes era pra 51 milhões. Tiveram 209 milhões, aí foi onde botaram os garis pra fazer aquela pressão pra dizer que a cidade parou, deu férias coletivas por três dias. Foi onde eu não aceitei aquilo, eu lá dentro da casa da prefeita mesmo, foi lá na casa dela essa reunião que eles chegaram: “Não, vamos agrupar todo mundo, pescador, o gari está aí três dias de férias coletivas, ninguém vai fazer nada”. Mas não havia aquela necessidade. Então, quando colocaram os garis de frente, eu achei aquilo uma absurdo. Eu, como gari, que trabalhei nessa época, eu não aceitei, dentro da casa da prefeita, eu estava com a filmadora, não deixaram eu filmar. Também eles estavam no direito deles porque foi lá na casa dela, né, foi lá dentro da residência dela. Depois eu até apaguei, desmanchei. Foi onde o seu Marcos saiu e me demitiram. Isso foi no dia 25 de julho, quando foi em agosto ainda foram lá no dia três de agosto, o encarregado agradecendo os garis: “Olha, muito obrigado a vocês pela atitude que vocês tiveram”. Agradecendo como se fossemos nós que quisemos fazer aquilo. E nem todos. Todos fizeram obrigados. Foi onde eu disse assim, cheguei lá: “Carlinho o quê? Você tá filmando o quê?”. Eu disse assim: “Eu estou filmando”. E uns dez se manifestaram a favor de mim também, outros ficaram mais pra lá, mas teve uns: “Não Carlinhos, filma mesmo, filma mesmo e fala mesmo”. Aí disseram: “Carlinhos, você não pode filmar aqui”. Eu disse assim: “Se eu não posso filmar aqui porque eu estou ali dentro”. Então, foi onde eu afastei um pouco assim e disse: “Eu não posso ali, mas aqui eu posso, né?”. Eu tava com um Nextel que era do meu filho. Mas eu também não sabia mexer naquele negócio, acabou, não filmei nada (risos). Eu disse: “Meu filho, vamos lá, por que eu” “Ah, tem que observar”. Olha gente, desmancha isso, isso aí dá pra depois (risos)
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P/1 – O senhor pode continuar contando com relação a essa greve.
R – Sim. Foi onde no dia três de agosto aconteceu isso aí que estava lá o encarregado agradecendo aos garis: “Olha, muito obrigado por tudo isso aí, essa decisão de vocês”. Aí, ficamos nos olhando: “Quem que disse que nós quisemos isso?”. Eu disse: “Que nada! Isso foram vocês que obrigaram todos a fazer isso, não fomos nós que quisemos isso, não”. Aí ele disse: “Carlinho, você está demitido!”. Eu disse: “Parabéns, to mesmo”. Eu fui demitido e fiquei até setembro, com direito a um mês. Então, eu fiquei, não parei de dar assistência nesse óleo ali. Eu fiquei de agosto, setembro, outubro, novembro, dezembro e janeiro, dia três de janeiro. Mas nesse período de seis meses eu ainda dando assistência, coletando o óleo que os companheiros botavam nos tamborzinhos, os outros botavam lá, e eu fiquei dando essa assistência, mas nesse período de quatro meses, seis meses, mas com quatro meses eu levei falando com o secretário do Meio Ambiente. “Senhor, eu não posso ficar sem nenhuma remuneração, não. Eu estou desempregado, eu estou dando assistência aí, estou fazendo o bem-estar da vida pra todos, pra toda minha comunidade lá. O senhor não vai me dar ali?” “Olha, vamos sim, vamos ver o que podemos fazer”. Mas com aquilo ele me levou quatro meses cozinhando, entendeu? Então, quando foi um dia eu fui lá na colônia, pedi ao Joelson pra ele fazer um documento pra eu chegar lá na Secretaria de Meio Ambiente e apresentar lá como eu estava prestando aquele serviço, ele fez pra mim. “O seu José Carlos presta esse serviço voluntariamente desde 2005, ele está desempregado, não está podendo exercer a sua profissão que é a pesca, mas está dando assistência e tal”. Chegou lá, nada. Foi quando um dia eu virei e disse assim: “Olha senhor, eu vou fazer o seguinte, eu vou pegar um tambor desse aqui de 200 litros, eu vou levar ali no calçadão em frente à secretaria, eu vou despejar esse latão de óleo aí pra chamar a atenção mesmo das autoridades porque eu estou dando assistência ao senhor” “Olha rapaz, você faz isso que eu te levo preso”. Ele falou pra mim, o secretário. Eu falei: “Não, depois que eu fizer o senhor manda me prender, que aí quero ir preso mesmo. Porque só assim vai ter que vir o Fantástico, Datena”. Eu falei pra ele. Então depois começou esse calçamento aqui, que era capim, era barro, então começou esse calçamento aqui. Eu estava com a aquela batera minha lá, aquele distorço, aquelas tábuas, estava ali que ele mesmo com o outro secretário, o auxiliar dele lá, me concederam a botar ali para eu vender um peixinho ali. Mas sabe o peixe que eu vendi? Nenhum. Eu botei foi um tambor de óleo desse aí, botei lá dentro da batera e comecei pegando aqui, pegando ali, o tambor já estava cheio. Isso foi com quatro meses. Aí começou essa obra aqui, disseram que eu estava embarreirando ali, que eu não queria que fizesse, me indenizasse aquele ponto ali. Não foi nada disso. Eu disse assim, mas eu fui lá e falei com ele: “Seu Mário, o que está havendo aí que estão dizendo que eu estou embarreirando a obra?” “É, você libera aquilo lá, deixa a obra continuar lá que eu vou ver um lugarzinho melhor pra você, vou ver um ponto pra você trabalhar e a gente vai te remunerar nisso aí”. Foi onde eu fiquei mais dois meses. Foi até o dia três de janeiro de 2013, mas aí cheguei lá e disse assim: “Pode levar essa madeira aqui que eu não vou fazer mais essa batera aqui pra não dizer que eu estou aqui embarreirando nada. Porque quem sou eu pra embairrerar uma obra dessa aí, uma coisa que nós já esperávamos há um bom tempo? Uma obra que está sendo feita pra nós aqui, quem sou eu pra barreirar isso aí? Eu sou mais colaborar. Então, faz o seguinte, leva isso que está aqui”. Foi onde veio o sargento Urbano, falo logo o nome do sargento assim que foi isso mesmo, ele vai vir. Veio ali e um outro senhor. “Carlinho, o secretário mandou te pedir que é pra você liberar isso aí, que ele vai ver um lugar pra você”. Eu disse assim: “Mas rapaz, eu já estive com ele, eu já disse que não estou barreirando nada aqui. E olha só o que eu faço, já estou há quatro meses fazendo, depois que eu fui demitido. Venha cá pro senhor ver”. Ele chegou e todos os companheiros: “É, porque se não é ele aqui vira um caos aqui, ele ainda dá assistência". Aí o sargento Urbano chamou o outro companheiro dele: “Venha cá! Olha só a qualidade do homem aqui, quatro meses que está demitido, ele ainda está fazendo isso de graça como sempre fez, sem ganhar nada, e ainda vão pra lá dizer que o senhor tá embarreirando isso aqui! Olha a qualidade do homem!”. Aí, me trouxeram, e os pescadores: “Não, nós queremos ele pra dar assistência aqui porque sem ele aqui nós não somos nada, nós viramos um caos, nossos barcos não ficam limpos, a gente não pode pintar um barco porque são jogados no valão”. Lá no outro lado, se nós formos fazer uma filmagem, vocês vão ficar apavorados pelo tanto de óleo que tem lá. Dia 12 agora eu botei um tambor lá do outro lado, ali tem um, lá tem outro e em casa tem dois, que ontem eu peguei e trouxe de Pontal pra cá, 200 litros de óleo. Então, se há uma possibilidade de vir a Petrobrás, a firma aí, a Soma, pra ajudar a gente aqui é o que eu espero. Pelo menos nesse resíduo do óleo. Em 2010 eu já comecei a lutar porque lá em Macaé tem uma máquina num bairro chamado Brasília, que tem uma máquina que ela é adaptada e vai lá no cárter do motor, suga o óleo todinho lá do motor. Suga o óleo todinho lá do motor. Então...
TROCA DE AUDIO
P/1 – O senhor estava falando de trazer uma máquina pra coletar óleo de Macaé.
R – Isso. Então foi onde eu comecei a fazer, participar das reuniões de Meio Ambiente, eu não desisti dessa luta. Então, eu passei a me ligar lá com a Secretaria de Meio Ambiente de Macaé e tomei umas informações lá, como fazer pra conseguir essa máquina. Então, eu encontrei lá com a menina que é a sobrinha do ex-vice prefeito aqui, que já foi prefeito por dois mandatos, o senhor Dodozinho, Genecy Mendonça. Então, a Carla, sobrinha dele, me deu lá os dados todinhos: “Seu Carlinho, que bacana! O senhor é uma pessoa que se interessa pela sua comunidade”. Eu disse: “Sim, porque lá é um caos, um problema muito sério. E aqui vocês têm esse procedimento que o pessoal todo já abraçou e está gostando. Eu gostaria de saber como fazer pra ter uma máquina dessas lá, para eu levar pras autoridades de lá porque os amigos já me pediram de novo para eu retornar com esses trabalhos. Essa máquina é importante”. Aí, ela me informou o senhor Maurício. O Maurício trabalha com resíduo de petróleo lá. E o que aconteceu? Ele me deu os dados todinhos, eu tenho o telefone dele em casa, eles me deram lá um folheto com tudo. Eu já peguei, já botei na mão do secretário, já botei na mão do Aluízio Siqueira agora. Essa máquina, inclusive o Maurício falou pra mim: “Seu Carlinho, o senhor pode dizer lá pros seus amigos, pode dizer pras autoridades, que eu tenho em vista uma máquina melhor do que aquela que está lá na Brasília. Porque aquela lá ainda deixa um pouco de resíduo no carter do motor e nós não estamos gostando. Essa outra que já tenho em vista, ela tem um aspirador, ela suga o resíduo todinho, não deixa um nada no cárter do motor. Pode dizer lá pros governantes e pros seus amigos lá. Então, essa máquina que eu estou pedindo a Deus, que eles tomem... O seu Aluizio falou, o presidente da câmara. Ele falou que vai fazer um projeto, vai botar em votação. Isso não é coisa pra projeto, pra nada depois de tudo isso, isso já é logo pra prefeito e secretário do Meio Ambiente já procurar logo ver que tem essa máquina, que tem esse senhor que ainda vem aqui: “Seu Carlinho, lá dá pra tirar quantos litros de óleo?”. Eu disse: “Rapaz, se a gente tivesse a máquina lá, vai ter mil litros de óleo em um mês, botando por baixo” “Aqueles mil litros de óleo dá para eu ir lá buscar e ainda pago 20 centavos o litro”. Eu disse: “Que legal, rapaz! Então eu vou levar esses conhecimentos”, já levei isso ao secretário do Meio Ambiente, já levei isso ao seu Aluízio Siqueira, que é o presidente da câmara. Então, estamos aí, esperando que algo possa ser feito para beneficiar a nós, nossa classe. Porque se há uma condição, lá eles fazem o reaproveitamento. E nós vamos ter um óleo puro, sem estar com água. Porque ali, olha só o trabalho que eu faço, eu vedo tudinho com plástico pra não encher de água, entendeu? Então, hoje estão me dando 750 reais. Eu posso dizer que me deram até o mês passado 750 reais. Por que eu posso dizer isso? Porque no dia 15 agora, que foi sábado, o rapaz que sempre me traz aqui os meus 750 reais, ele me ligou dizendo: “Olha, o chefe do outro chefe ligou pra ele, ele ligou pra mim, para eu ligar pro senhor que é pro senhor parar aí, parar com esse serviço por causa dos royalties do petróleo, está parado”. Eu disse assim: “Mas que situação, né rapaz, você levou tanto tempo ali o royalties do petróleo, nunca ninguém me deu nada, só porque agora de agosto pra cá estão me dando 750 reais eu vou parar? Olha, eu não paro, pode dizer pra ele aí, por que não me chamou pra ir até aí? Eu não paro porque se eu parar a coisa vai complicar. Ou vocês não querem eu no governo? Vocês não querem, eu estou saindo fora, mas vou chamar o Fantástico, vou chamar notícia, vou pro programa do Barbosa Lemos, na Difusora, vou botar no ar pra ver se tem alguém que nos socorre. Porque se eu estou fazendo uma parte, ganhando 750 reais, porque se eu não vou trabalhar nisso que está aqui, para eu ter uma ocupação para eu fazer. Então, eu vou fazer perícia que eu tenho direito pra nela estar, porque em 2005 quando eu entrei eu tinha o meu benefício na perícia, auxílio doença, eu parei porque isso ajudou a recuperar o meu problema”. Veja bem, como eu falei anteriormente, eu sou de trabalho, se eu não trabalhar eu fico em casa vazio, eu quero trabalhar. E isso aqui faz parte da minha pesca, eu to cuidando do nosso meio ambiente. Porque ali tem um companheiro que está hoje na mesma posição que eu estava, de 2005 até agosto de 2012, mas ele não tem conhecimento, aquele amigo que está remendando a rede ali, eu sei ali o pano de rede que é pra ser tirado dali, eu tenho conhecimento porque ele tá ali remendando a rede e eu sei: “Esse aqui ele não quer, esse aqui eu vou tirar”. Mas o companheiro que está ali não sabe. Eles jogam pneu de lá pra cá, por exemplo, ali tem um. Aquele ali eu posso já pegar e jogar ali na caçamba, mas o rapaz que está aqui não faz isso porque ele acha que o pescador vai precisar. Um cabo de aço, aqueles ali estão bons, mas ali na frente já tem um pedaço. Ele não sabe se aquilo é pra tirar, mas eu sei que é pra tirar, que aquilo ali é reciclagem. Eu vou em algum lugar, conforme, eu tenho um bocado lá empilhado, e quando chega as quintas-feiras eu chego pros companheiros do mutirão da União ali, eu digo: “Aquele tanto lá é pra tirar também”. Tem um pau, tem um pneu, tem uma coisa: “Esse aqui também vai”. Eu faço isso aí, entendeu? Então, se eles estão mandando eu parar. Isso foi na sexta-feira, se não me engano dia 15, quando foi no sábado dia 16 eu liguei pro Mateus, um dos encarregados. Eu digo: “Mateus, diga aí alguma coisa para eu entender porque eu não entendi nada o que o Cafu falou pra mim. Cafu disse que o chefe lá falou pro outro chefe, e o chefe lá falou pra você, e você já falou pra Cafu. Que situação é essa, rapaz? Porque está muito, o que eu estou fazendo não?. Olha, vocês não estão me valorizando, eu estou fazendo uma parte até pra colaborar com o governo porque o Meio Ambiente não está sendo correto pra nós aqui. Vamos passar, vamos filmar isso que está aqui, vamos passar aqui na mara secae vamos filmar isso que está aqui que vocês vão ver, que caos, que descaso tem o nosso valão aqui. Meio ambiente não faz nada pra nós”. Ali nós temos as esposas dos pescadores, muitas delas ali, descascam o camarãozinho que o próprio marido pesca, ou os filhos pescam, conforme dona Geni, lá na frente é outra família lá de Jaime. O Jaime aqui mesmo. Descasca o camarãozinho, vai aqui, joga, o peixe vem aqui e come. São poucas, o peixe vem aqui e come, porque entra peixe, entra muito bagre aqui, eles vão comer aquilo ali. Mas ali tem o nosso amigo Paulo ali, ele tem dia de descascar mil quilos, agora não porque a pesca tá proibida, do camarão tá no defeso. Mas aí tem dia dele descascar mil quilos de camarão, sabe onde são jogadas aquelas cascas, cabeças, tudo? São jogadas no nosso valão. E por quê? Porque a prefeitura não tem aqui, conforme, precisou Gargaú ficar em estado de calamidade, pobre mesmo, a água ficou verde, pra depois eles tomarem iniciativa. Farol de São Tomé tem dois barcos disponíveis só pra isso, pega todo o camarão que é descascado, vai lá em alto mar e joga. Macaé é a mesma coisa, tem lá o barco, um ou dois barcos pra fazer isso aí, pra pegar aquele do mercado de peixe, pegar todos aqueles, isso tudo aí, porque é descartável, vai lá em alto mar e jogar. E nós aqui não podíamos ter pelo menos uma bateira, uma canoa, ou um barquinho pra estar fazendo isso e estar limpando isso aqui? Mas cadê? Cadê o Meio Ambiente? Mas sabe quanto foi pra 2012, foi 46, quase 47 milhões do ano de 2012 para o Meio Ambiente. Este ano eu estou lá pra apanhar com o funcionário da câmara, o seu Satiro, Zé Satiro, eu já pedi a ele, Seu Satiro, eu sei que ouvi em uma das reuniões da câmara, 411 milhões é a verba de São João da Barra pra 2013. 411,600 milhões de reais pra 2013, a verba de São João da Barra. E então, o Meio Ambiente falou lá no dia primeiro lá, mas eu não peguei pra estar até mostrando a vocês pra melhor a gente estar informado, mas o seu Satiro ainda está tirando e vai passar pra mim. Teve uma queda, a saúde teve mais um aumento. Saúde nossa aqui está precária. Minha esposa está há três meses esperando um remédio que ela é cadastrada, é um remédio que custa caro pra eu comprar, 70 reais, e ela gasta com 20 dias. Então, minha gente, é um caso. Ver o que podemos, diante de tudo isso que vocês estão fazendo, esse trabalho, se tem alguém, alguma entidade que pode vir diretamente fazer com nós pescadores, porque o pescador hoje não quer nem mais falar porque ele não acredita em mais nada.
P/1 – Seu Carlos, só pra gente ir caminhando pro final. Qual a importância da pesca na sua vida?
R – Olha, a importância da pesca na minha vida, eu fico feliz quando eu vou lá no mar e eu capturo bem. Porque isso aí não vou ser só eu favorecido e nem a minha família. Eu sei que vai ter condições de pessoas terem seu peixinho em casa, na sua família, e tendo bonança a gente também não quer vender caro, a gente quer que tenha condição de chegar na mesa daqueles que estão muito distantes, que quando chega lá pra eles, só rico pra comer. Então, se há uma condição de fazer isso, pra que seja mais aproveitável o nosso trabalho, favorecendo a todos. Porque, se nós gostamos de comer um peixinho, quantos por aí não têm condições de comer porque aqui é barato pra nós, mas chega pra eles lá muito claro. Essa é uma importância que, pra mim, se puder ter como se comercializar pras pessoas de baixa renda comer sempre seu peixinho fresco, que nós temos época de escassez, mas temos época que apanhamos muito isso aí, aí fica preço de banana. Nem se pode dizer preço de banana hoje porque banana tem bom preço (risos). É, nem se pode dizer isso. Abacaxi está em um bom preço. Mas aqui, pra nós. Vai pro sertão ali, não tá jorrando. A mesma coisa é pesca, safra, bastante e safra, pouco. Mas quando nós capturamos muito é melhor do que capturar pouco. Ou se nós viermos a capturar bastante, mas que chegue então com um bom preço a muitos que estão querendo comer, dar pros seus filhos e não estão tendo condições por causa dos atravessadores, então essa é a maior importância que eu acho.
P/1 – E se o senhor pensar hoje em dia, aqui em São João, qual é a importância da pesca pros jovens?
R – A importância da pesca pros jovens. Olha, quem é da água é da água, filho de peixe, peixinho é. Aquele que não tem conhecimento com a pesca, que não tem envolvimento com seus familiares, seus pais, eu acho que pra eles começarem na pesca é melhor eles pensarem no Porto do Açu, se envolver lá com estudo, porque hoje eu to estudando. Eu estudei ali seis meses, já passei pra quinta fase, hoje eu estou estudando e estou gostando, estou abraçando essa causa, eu quero estudar. Jovens, vocês estudem. Se não é da pesca. Mas quem é da pesca não enjooa, quem é do mar não enjooa, não se adianta não, porque hoje o pescador pode ir pro Porto de Açu, mas amanhã ou depois ele vai querer estar de volta na pesca. Então, o jovem hoje se puder estudar, estuda porque a melhor coisa é o estudo.
P/1 – Seu Carlos, o senhor falou do seu filho. Ele também é pescador?
R – Ele é pescador, sim. Só que agora ele está de marinheiro, ele mudou a categoria, que era POP, veio pra MAC, agora ele está com outra categoria, não sei se é POP, não, é MOC. Eu, por exemplo, não tive porque não quis, mas bem que o sargento lá em Macaé, quando eu fui fazer a nova matrícula, mudança de caderneta ele pediu: “Você não quer transferir igual o Carlos Magno? Vamos transferir a sua pra mac”. Eu disse: “Olha meu amigo, eu to com 56 anos, eu to com a saúde debilitada, estou afastado do mar por problema de saúde. Sessenta anos me dá o direito de aposentar, eu to com 56, tá próximo”. E ele: “Então tá, é isso mesmo, porque o porto lá pode durar cinco anos, também pode não durar mais”. Então, o meu filho está mestrando, ele é marinheiro, está lá em Regentes, Rio Doce, Espírito Santo, está além de Vitória. Ele está desembarcando hoje, são 14 dias lá e 14 dias aqui. Ele trabalha levando os mergulhadores a serviço da Geodrill, num barco de um senhor daqui do Farol de São Tomé, com o nome de Marcos Gato.
P/1 – Seu Carlos, o senhor é casado, né?
R – Sou casado.
P/1 – Como que o senhor conheceu a sua esposa?
R – Indo lá pra São João da Barra, porque eu já morava aqui. Nós viemos primeiro, moramos no Pontal, quando viemos de Convivência, depois moramos no Cassino, quando o mar também comeu uma outra casa que meus pais tinham, foi até o meu irmão mais velho que comprou. Aí, foi quando nós viemos pro Cassino antigo, estava lá abandonado, então todos se apoderaram dali, muitas família, no qual nós ficamos e foi o período que saíram essas casas aqui, há 36 anos, 36 pra 37 anos. Essas casas aqui foi onde meu pai obteve uma ali, a qual eu hoje estou naquela onde vocês estiveram lá hoje em frente, né? Então, daqui eu indo pra São João, vinha da pesca, aí fui pra São João da Barra, ia pra lá pros bailes, que eu gostava de ir nos bailes. Festa também, carnaval, eu gostava também. Hoje eu não ligo mais pra essas coisas. Foi onde eu conheci a Noelina (risos). Então ali a gente namorou, noivou. Aqui a gente, é tradição, casa, às vezes noiva, mas depois você casa fugindo (risos), roubando. Roubando a noiva (risos).
P/1 – Ela foi roubada?
R – No caso ela não foi roubada, não, ela que veio por conta dela (risos). Ela que veio por conta dela e disse: “Olha, você decide, ou vamos logo porque é o seguinte não tá dando pra esperar mais não, porque meu pai tá meio impertinente, tá dizendo que você tá com namorada” (risos). Eu disse: “Mas seu pai acredita no que os outros dizm, você sabe disso”. Ela: “Não, eu não sei, mas eu também não vejo, não sei, você decide logo”. Eu disse: “Então, já que você veio você quer ficar mesmo? Então fica logo aí” (risos). Já saiu pra despesa de casa, comprar, né? (risos).
P/1 – Seu Carlos, se tivesse alguma coisa que o senhor pudesse fazer diferente na vida, mudar, alguma coisa que o senhor mudaria, o que seria?
R – Que eu pudesse mudar? Ah, meu Deus, são tantas coisas que às vezes a gente... Olha, muitas mudanças assim, uma delas, por exemplo, se eu pudesse mudar, fazer um entreposto digno, todos nós aqui. Um mercadão do governo, que seja feito pelo governo, se eu tivesse uma condição de me aproximar do senhor Eike Batista. Eu tenho muitos outros planos, ideias de ganhar dinheiro e fazer mover muitos empregados, funcionários. Isso, hoje se bate política com política, falando do senhor Eike Batista que estão acabando com isso. Seu Eike Batista é um homem invejado por muitos, mas todos têm que admitir que é um homem abençoado por Deus, não importa a religião, ninguém se fala religião, religião tem que ser respeitada, religião não é pra se discutir, cada um tem a sua, eu to livre e Deus tá. Eu não me importo em saber de religião de ninguém, religião não leva ninguém a nada, não salva ninguém, quem salva é Deus, quem salva é Jesus. Mas quando eu vi ali aquele senhor ali, eu faço questão de você anotar o nome dele, o Jacuí, com oito empregados, oito funcionários. Eu ia lá pro outro lado, que eu tinha uma égua que eu comprei pro meu Carlos Magno quando ele, com 15 anos, ele queria ter um cavalo e eu comprei um cavalo, uma égua pra ele. E quando vinha do mar eu ia lá pro outro lado botar ela pra pastar ali, e eu ouvia os pássaros cantarem porque eu ficava no mar nesse tempo. Então, eu quero ouvir os pássaros, eu quero estar no mato, eu quero espairecer. Eu tinha informação quando nós ficamos aí com os grandes profissionais, meus amigos aí ficaram na escassez de barco e o governo parou, não deu mais recurso, financiamento pra ninguém. Então, o senhor Jacuí chegou ali, eu vi meus amigos profissionais, bons profissionais ali trabalhando. O Jacuí começou com cinco, chegou a oito, a doze, a quinze e eu to vendo e agradecendo a Deus. Eu estou indo pra lá, cada viagem que eu vinha eu to vendo mais pessoas diferentes. Então, eu estou agradecendo a Deus, quando foi muitas vezes eu lembro que eu pedi a Deus: “Senhor, em nome do seu teu filho amado Jesus, pro bem estar do nosso povo, traz dez Jacuís pra Atafona, pra São João da Barra”. Eu ficava lá do outro lado só falando com Deus. “Traz, Deus, dez Jacuís pra São João da Barra porque eu vi, chegou a 80, chegou a 85, to acompanhando, to vendo. Então hoje ele pode ter aí uns 150, não sei quantos empregados, funcionários. Então, eu disse, e digo, “Deus, muito obrigado, porque eu pedi dez, mas o senhor trouxe dez mil ou mais de dez mil Jacuis pra São João da Barra, que é o senhor Eike Batista e todas essas firmas que ali se encontram”. Então, se eu pudesse chegar ao senhor Eike Batista, dizer: “Vamos movimentar, vamos trabalhar, vamos botar o povo pra trabalhar, mas com a área da pesca porque há condição!” Nós temos muitos pescados que deixam de ser capturados porque não há um meio de conservar, adubos, conforme a Rubi, eu trabalhei com 18, 21 anos, eu trabalhei lá pra Cabo Frio, Niteróis em traineira, a qual eles faziam tudo para eu trazer eles pra nós pescarmos aqui e eu não trazia. E no entando hoje tem um monte delas aí. Eu não trazia porque os barquinhos aqui na época eram pequenos, a gente chegava no grosso e pegava 500, 600 quilos de saco, de linha. Se eu trouxesse eles. Eles me chamavam de Atafona. “Mas Atafona, só vai a gente”. Eu disse: “Não, pescador é o seguinte, não adianta dizer que vai esconder não porque eles vigiam a gente e a gente não vigia a eles”. Se eles veem a gente ir, daqui a pouco eles estão vindo no rastro da gente, nós vamos em um, daqui a pouco tem dois, daqui a pouco tem dez, e meus amigos lá, meu povo lá, como é que fica?”. Então, hoje nós temos aí pescaria que atrapalha a gente, jamanta, uma arraia gigante, hoje nós temos barco aí com guincho, com rolo, que embarca ela de duas toneladas. Mas embarcar pra quê? Mas vamos fazer, Hoje o senhor Eike Batista está aí, se querem desenvolver uma pesca, um desenvolvimento conforme a Rubi, a fábrica de sardinha, Rubi, a 88, a Jangada, que eu descarreguei lá muitas vezes toneladas, 40, 50, 60 toneladas de cavalinha, de sardinha, de xerelete, nessa época em que eu trabalhei lá com 20 anos de idade, isso há 38 anos. Então, aqui tem condições de fazer uma indústria dessa, aqui tem. Se eu pudesse, eu abraçaria, ou se tivesse alguém que viesse abraçar. E existem pessoas de bem, abençoadas de Deus.
P/1 – Seu Carlos, como o senhor se sentiu ao contar um pouquinho da sua história?
R – Eu me senti bem, e todas as vezes que eu puder falar um pouquinho, não só de mim, mas do meu povo. E eu espero que entre essa minha fala, e de tantos outros companheiros, que venham esses homens e mulheres de boa vontade, que eu sempre peço a Deus. Portanto, eu agradeço a Deus por vocês, que já são pessoas de boa vontade. Eu agradeço a Deus por vocês estarem aqui. Pra mim é maravilhoso, é ótimo. Porque a gente tem que pensar no amanhã. Hoje nós temos que plantar pros que nasceram ontem e pros que estão nascendo agora, mas amanhã outros já vão plantar pros que vão nascer depois do amanhã. E assim é o circo da vida.
P/1 – Obrigada, senhor Carlos.
FINAL DA ENTREVISTA
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