Meu nome é José Rocha Martins Freitas, nasci na Serra do Baturité, no Ceará, no dia 6 de novembro de 1943. Meu pai, José Martins de Freitas era de lá, e minha mãe, Maria Amélia Caetano era do Sertão do Canindé. Desde pequeno me chamavam de Rochinha. Aí, vim embora aqui pro sertão, ai fi...Continuar leitura
Meu nome é José Rocha Martins Freitas, nasci na Serra do Baturité, no Ceará, no dia
6 de novembro de 1943. Meu pai, José Martins de Freitas era de lá, e minha mãe, Maria Amélia Caetano era do Sertão do Canindé. Desde pequeno me chamavam de Rochinha. Aí, vim embora aqui pro sertão, ai ficavam me chamando de Rocha. Aqui na praia também.
Lá no Baturité era bom pra umas coisa e ruim pra outras porque tempo não tinha dinheiro nenhum, comecei a trabalhar mais o meu pai, bem novinho, com oito anos. Com 16 anos eu vim pro Sertão. Lá, eu era gabado no serviço, na portaria, eu trabalho na enxada, na moagem, no negócio de carregar cana pra ir pra engenho, tudo eu fiz. E eu achava bom. Adorei muito a minha arte. Eu fui nascido dentro daquilo com meu pai, que era agricultor. Ajudei a criar meus irmãos, somos oito; agora são seis, morreu dois.
No Sertão em Canindé, na Fazenda São Paulo, lá era terra boa. Dava milho, feijão, mandioca. Tudo dava. Jerimum, melancia, tudo dava. O que plantasse, dava. Eu cheguei lá com 16 anos, passei mais de 30 anos lá, depois eu vim embora aqui pra praia. E eu tive meus fios tudinho, lá no Canindé.
Era muita fartura do tempo que eu trabalhava lá. Aí, num tempo que eu me casei, eu fiquei morando na casa do meu pai. Fazia muito legume, muito feno, muito feijão, muito milho. Todos ano tinha minha farinhada duma semana. Tinha um caixãozão, enchia de farinha. Toda vida tive fartura na minha casa.
Joguei muito futebol. Nós tinha um campo lá dentro da fazenda, era bom.
Quando desisti de jogar aí, fui tomar de conta do time. Foi no tempo que viemos embora pra cá. A brincadeira que eu mais gostei mais foi futebol e forró que tinha todo final de semana. A gente até na semana aqueles pessoal inventava um forrozinho, toca um violão mesmo. Tinha muita moça, muito rapaz. E o jeito que eu entrava eu saía, sem beber, sem prova nada de álcool, nem nada. Não gostava não. Quando era fim de semana nós ia pra festa passava a noite todinha. O dono da casa tinha que tirar a licença em Paramoti, uma autorização da polícia, a pessoa vai no delegado, vai e tira uma folha de licença,
aquele que errasse ou brigasse na festa era intimado a ir preso e o dono da festa não teria nada a ver.
Todos anos tinha festa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, a padroeira de Mulungu, era uma data de novembro. Eu ia, eu tinha meu dinheirinho, ia e comprava suco com pão, era queijo, era essas coisa assim. Ia mais meus amigo, mas toda a vida eu fui cabreiro, quando eu queria comer, eu na minha cabeça, coisa de gente novo mesmo, eu disse “Olha, não arrumo”. Eu vou mais comer com esses menino tudinho. Pra que eles quiserem, trabalhe como eu trabalho. Aí, eu ficava pro lado deles e escapulia, me escondia deles, saía e ia comer. Mas, nesse tempo era uma pobreza, assim, agora não.
Tinha leilão de tirar prenda. Aquelas noite era pra dar dinheiro de novena. Mata as galinha, tira de prenda, bota nas mesas lá e assa pra leilão.
Bingo tinha lá na Fazenda São Paulo onde eu morava que tinha festa. A festa de Nossa Senhora. Nove novena, o mês todinho. Novena toda noite. Mês de maio. Lá tem bingo toda noite. Lá sempre eu ganhava. Ganhava lata de doce, ganhava queijo, ganhava frango.
Não fui à escola. A minha mãe, a vez pegava a cartilha do ABC, me ensinava, mas não entrava nada na minha cabeça, eu não sei porquê. Ela mandava eu assinar meu nome, eu assinava, sem conhecer a letra. A minha mãe disse: “Rocha, tua identidade dá pra tu tirar”. Aí, pronto, fiquei assinando meu nome. Eu faço tudo, assino cartório, em tudo, eu nunca errei. Depois que eu já sabia meu nome foi que eu comecei a ir à escola, mas também não aprendi nada. Não aprendi nem a ler, nem escrever, nem nada.
Eu me casei com Maria de Fátima, passei 43 anos junto com ela. Deu derrame na cabeça dela e levamos pro hospital. Ela não resistiu não e morreu. Era nova ainda, ela tava com 57 anos. Tivemos onze filhos. Era pra ser doze, mas morreu um. Nós “casemo” no Canindé, foi eu e outro colega meu com uma prima dela. Foi dois casamentos num dia só de uma família só. Muita comida lá.
Quando foi de noite teve a festa. Festa de dança. Um sanfoneiro lá e tinha muita coisa. A noite todinha. Foi. Neste tempo gostava muito de festa, fui demais de brincar. Mas depois que eu me casei, abandonei. Aí, não quis mais ir de jeito nenhum.
Eu passava o dia todinho na roça, aí, eu saía de manhãzinha, chegava meio-dia, almoçava, me deitava. Toda vida gostei de me deitar meio-dia. Quando é uma hora eu saía, chegava em casa e via com as luz acesa, ela tava na janela olhando se eu já vinha. Chegava de noite, eu gostava muito de trabalhar. Aí, eu e ela tomando conta da meninada. Criamos tudinho graças a Deus. Sem problema.
Plantava milho, feijão, mandioca, jerimum. Tudo eu plantava. E dava com fartura, dava pra sobrar mesmo. Eu, toda a vida, gostei de ajudar quem precisa, sempre eu peço a Deus, eu ter pra mim e pro meus irmãos que precisar. Aí, vinha gente atrás, eu arrumava, dava. E agora mesmo é a mesma coisa. E nisso eu fiz muito feijão, por aqui só quem fez feijão fui eu. Com esses bocados de gente que mora aqui, são 21 morador, mas eles não gosta de trabalhar. Aí, eles tem até raiva de mim ou inveja ou ambição que, porque eu trabalho e faço. Porque o Governo botou nós aqui, fez as casa, deixou a terra solta pra quem quisesse trabalhar. Aí, eu trabalho. Eu trabalho e eles tem raiva, sou nem o dono da terra. Eu não sou o dono não, porque eu gosto de trabalhar. E faço meu leguminho, quem pra chegar na minha casa: “Ó, tem um feijão com arroz, que me arruma um litro aí, ou cozinhado?” “Tem”.
Eu já vendi algodão. Neste tempo, eu fazia muito, pegava muito dinheiro na safra de algodão, depois apareceu um tal de besouro aí, esculhambou. Num deu mais.
Eu vendia pras fábrica de Canindé. Tinha uma fábrica de carroçar algodão em Canindé. Fui sócio da Cooperativa de Canindé. O que a pessoa quiser, levava pra lá. Quisesse, mesmo guardar 200 litro de feijão lá na cooperativa, levava pra lá pra guardar lá. Tinha um deposito pra guardar. Eu tenho até a minha carteira com retrato e tudo da cooperativa de Canindé.
Eu criava porco, criava criação de bode, criação de ovelha, criava gado. Tudo eu tinha assim pouquinho, mas tudo eu tinha sementezinha. É, tinha umas vaquinhas que era boa de leite, não faltava leite na minha casa. Meus filhos foi criado tudo com leite de cabra, foi, que é o leite mais forte que tem. Aí, eu dava muito leite lá pras criança, elas vinham buscar lá em casa. Eu tinha leite de gado, aí, eu arrumava pros que comia de fora. Pros meus eu dava de criação. Eu tinha umas cabra boa, eu tinha umas cabra que dava dois litros de leite, só uma.
Minha merenda era rapadura com farinha, a melhor que tem, era forte. Porque a de hoje, graças a Deus hoje tem saúde e não sinto cansaço nem nada. Eu fui criado assim: com rapadura, com feijão, com pão de milho, umas comida assim grosseira. Agora, esses pessoal hoje em dia, a maioria deles são doente. Porque essas comida aí, tudo que vem, tudo é enfeita. É salsicha, é linguiça, é leite daquilo, é não sei o quê, eu não gosto de nada disso. Às vezes, quando eu tiro meu dinheiro vou pro mercado, eu compro mais ela (a atual esposa), aí, ela compra aquelas coisa. Agora vai fazer o quê com isso daí? Por mim, você leva, mas eu não gosto. Ela compra pra ela e o filho dela. Agora eu falo em rapadura com farinha, feijão, pão de milho, carne de gado ou o de porco, isso eu acho bom.
Nesse tempo a coisa não é mais que nem como é agora. Coisa difícil. Eu não tinha emprego fixo, não era aposentado, aí, eu comprava aquelas comprinha feita. Eu ia pro Canindé, comprava, fim de semana comprava carne e, mas e não tinha tempero suficiente pra eu comer a semana todinha. Agora tem. Graças a Deus não falta não. Minha comida era feijão com rapadura, cuscuz. E achava bom e era forte.
Gostei muito de rádio. Dormia com o rádio no pé do ouvido no tempo que morava no sertão. Aí, quando era de noite, era oito hora, já era hora de eu ir me deitar, aí, botava um deles pra me lembrar de botar o rádio e acordar pro esporte, eu não perdia um, que eu sou torcedor do Ceará, aí, não perdia não. Agora não, agora tô assistindo mais pouco. Mas, de primeiro não, não perdia não.
Toda vida eu fui “escarracador”, esse negócio de “percurar” coisa pros meus filho. Nunca deixei eles passarem fome não. O Governo mesmo, fez pra gente repiquete. Fincava cacimbão ou fazia açude, aqueles homem mais rico. Fazia açude na fazenda, eu me alistava, eu ia trabalhar pra ganhar. Eu ia trabalhava no sítio do Governo e trabalhava pra mim. Veio inverninho fraco, mas eu tinha muito cuidado, eu plantava. Às vezes acontecia de só eu fazia legume. Muito feijão, milho. Eu trabalhava numa terra muito fresca, que é lá e dava feijão, milho. A gente fazia. E ganhando dinheiro do Governo, trabalhava todo dia, mas não deixava faltar nada. Eu toda a vida fui cuidadoso, nunca gostei de tá parado não.
Tomei conta dum sítio lá dum Lustrosa. Esse homem, ele era da mesma fazenda que eu morei, fomo criado junto, mas ele quando ficou grande lá em Fortaleza, enricou. Era rico que só a peste. Ele tinha essa fazenda, esse sítio lá e tinha outro ali no Gregório. O cara que tomava conta do sítio dele no Gregório, tava roubando dele. Ele foi e botou ele pra fora, e queria arrumar alguém pra tomar conta do sítio dele. Aí, nós fomos. Viemos. Eu tomava de conta de uma pocilga que a gente tinha. Limpava o sítio e ajeitava tudo, deixava tudo limpinho. Aí, ganhava o meu salário, eu ficava trabalhando pra mim, plantando e assim era. Plantando uma batata que eu tinha lá. E macaxeira, essas coisa. Na época que eu me vim embora pra cá, eu tava ganhando 120 reais por mês. Tinha direito o sítio tudo que tinha lá, era o mesmo que ser o dono meu, só não tinha o direito de vender. Ficava bem pertinho de Pecém. Dez minuto da fazenda que foi o primeiro que foi nós, de lá. A estar no primeiro assentamento fui nós.
Um dia nós tava lá bem tranquilo, cada qual no seu lugarzinho lá, bem sossegado. Aí, chegou uma equipe lá do IDACE. Começou a conversar. Foi logo lá pra casa, sempre toda a vida eu fui assim, gostava de ver todo mundo. Eles começaram a fazer reunião e aí, pronto. Abriu esse negócio lá da “sideluz” (siderúrgica). Aí, nós comecemos a trabalhar mais eles. Eles convidou eu e a minha mulher pra nós trabalhar, andar mais eles, fazendo reunião. Desde o começo era nós. Aí, eles contando, fazia reunião no Pecém, tinha um, não sei como é o nome do coisa lá, tinha só doutor lá que vinha de fora, sobre esse negócio de acender a luz do posto. Aí, nós ia e só escutando mesmo as conversa dele. Aí, foi e aí, pronto. Aí, teve um bocado lá que era contra, não queria aceitar não, viu. Dado, deu questão lá, teve gente lá, que deu até bala lá um tempo. Tinha lá o Vicente, o Vicente Gilberto, que não aceitava não. Ele era da polícia, ele morava no Mato Grosso, ele tinha uma fazenda lá. Aí, ele veio, não aceitava não.
Quando o IDACE começou a fazer essa reunião com nós, aí, contando como é que ia pra ser, nós tinha é que escolher uma equipe pra ir andar mais pra “percurar” uma fazenda, um lugar pro Governo comprar pra nós fazer o assentamento pra poder morar. Aí, um dos escolhido fui eu. Aí, depois já tava já bem começado, aí, foi, ele, nós saímos. Ele chamou nós pra nós ir “percurar” terra. Achamos:“Ai, nós quer aqui, aqui é bom”. Central, perto de Siupé, perto de tudo. Aí, só sei que balançaram, foi o Governo e comprou. Contrataram a firma pra fazer 21 casa. Eu fui o primeiro que saí, de lá, justamente da siderúrgica, de onde tão fazendo agora. Aí, fizeram as casas. Quando fizeram as casas nos veio morar aqui. Achei ruim porque quando cheguei não tinha nada, era tudo pelado. Bem dois ano, todo mês vinha pra nós, aquela bolsa [cesta básica]. Vinha tudo arroz, feijão, açúcar, macarrão, café, era tudo, tudo. De tudo vinha um bocadinho.
Antes era mais unido assim, porque nós trabalhava, nós trabalhava junto, de comunidade, hoje agora não tem mais. Vai pagar uma associação, todo mês era um real que nós pagava, todo mês, agora não tem mais, acabou-se. Nós se reunia de dia de sábado, ia trabalhar tudo junto, parece que era dez ou era onze pessoa, pra ter direito no sítio. O que o IDACE botou aqui dentro pra ser, não foi cumprido. Por que no tempo que ele fazia, tinha reunião toda semana, do IDACE. Eu era, tinha que estar toda semana com eles. Eles [o IDACE] prometeram umas coisa, a praça, nossa praça aí, foi prometida pra botar aí, frente, sabe? Onde tem a caixa d’água aí. Foi feito o fio de pedra todinho, que nem na rua. Arredou todinho, botado decibal vermelho, por trás de fora, aterraram pra fazer a praça. Era uma aqui, outra do outro lado. Aí, quem tinha de conta dessa aí, era a doutora, não tô “alembrado” como é que é o nome dela, comeu o dinheiro. Esse dinheiro, essa praça não foi feita.
Eu era muito gastador de fumo. Eu mascava fumo desde criança que eu trabalhava mais meu pai na agricultura. Aí, quando era no final do verão pra entrada do inverno na Serra, sempre quando é em dezembro começa a dar aquelas neblinazinha, aquela garoazinha. Aí, nós tava queimando aquele que papai fazia. Eu botava aquela coisa na boca, me alegrava. É droga, é que nem se fosse uma droga, era, mascar fumo. Aí, eu tinha muita vontade de deixar, fazia promessa, botava pacote de fumo no mato, mas nunca fui atingido. Aí, quando foi um dia que a minha mulher já tinha falecido, eu trabalhando lá nos cajuzeiro lá, me lembrando, dela e lembrando do negócio do fumo, sabe? Eu pedi a Deus que me ajudasse que eu deixasse de mascar fumo. Eu pedi a Deus com aquela fé, chega deu vontade de chorar mesmo, disse que se eu deixasse eu ia ser evangélico. Aí, que sei que quando foi no outro dia já não me lembrava de fumo mais. Deixei de uma hora pra outra.
Meu sonho é viver bem do jeito que eu tô vivendo, graças a Deus. O meu sonho é esse, Deus me dar muitos anos de vida, pra eu viver trabalhando na vida que eu vivo. Pra emprego eu não tenho mais idade, pra me empregar. E eu viver, Deus me dando minha saúde pra eu viver trabalhando na minha vida que eu vivo, tô satisfeito demais.
Achei bom [contar a sua história de vida], e é bom que a gente renova as coisa que a gente passou num tempo da vida da gente.Recolher