Mais um aniversário, Mais um ano de vida e de contos. Com a minha idade, histórias eu as tenho, e muitas, para contar. Detenho-me em um passado distante, então a saudade de um tempo incrível me vem à memória, um tempo que se foi, muito diferente do atual. Minha meninice foi incrível. Saíamo...Continuar leitura
Mais um aniversário, Mais um ano de vida e de contos. Com a minha idade, histórias eu as tenho, e muitas, para contar.
Detenho-me em um passado distante, então a saudade de um tempo incrível me vem à memória, um tempo que se foi, muito diferente do atual. Minha meninice foi incrível. Saíamos à rua e as crianças da redondeza lá estavam para formarmos as turmas. Brincar de boneca, papai e mamãe, comidinha, bola, corda, roda com canto, pedrinhas e na falta destas, confeccionávamos
saquinhos com areia ou arroz. Recitar versos em roda, cabra-cega, passa-anel, esconde-esconde, amarelinha, queimada, pular corda e outros tantos jogos infantis, perdidos no tempo. Subíamos em arvores de rua, a porta de casa permanecia aberta para quem chegasse, sem preocupações, sem medos. Sinto um vazio nas crianças de hoje, a falta de companheiros, me dá pena saber que não viverão um tempo igual, as mudanças são inexoráveis que vêm com a chamada civilização.
Vestidos, a mamãe escolhia, o laço de fita colorido e armado no cabelo também. Mangas bufantes, saia franzida, os clássicos sapatos de pulseira em verniz preto ou, quando eram brancos, nos achávamos chiques, prontas para sair em visita a parentes. Na escola, o uniforme bem passado, saia azul marinho com pregas, blusa branca, o emblema da escola no bolso, gola engomada, mangas compridas, uma pasta de couro que carregava todo o material disponível sem grande peso. Na escola, o uso da caneta com vidro de tinta que algumas vezes derramávamos, provocando estragos. Mais tarde, na 5ª série, a admissão, o uso da famosa tinta nanquim para letras e desenhos elaborados, que eu achava o máximo. Caderno de caligrafia, fazendo a escrita se tornar arte. Os de desenho com as gregas desenhadas em quadriculados muito pequenos, que serviam para o enquadramento da página desenhada.
No começo da aula cantávamos o Hino Nacional ou o Hino à Bandeira. Tínhamos aula de religião, OSPB (Organização Social e Política Brasileira). Sabíamos a tabuada de cor, que nos era tomada, formando parelhas que se defrontavam para ver quem respondia mais depressa e certo. Um debate sadio que perdurou para sempre.
Fazíamos mapas do Brasil e outros. Contavam como pontos para a nota. As provas eram respondidas à medida que o professor perguntava e sabíamos ou não, pois tínhamos um tempo para escrever e não tínhamos consulta de perguntas escritas Esse estudo antigo me valeu uma faculdade, que cursei depois de casada e com filhos. Só fiz até o ginásio, que já era o máximo para uma mulher, que poderia escolher entre trabalhar como secretária ou optar por mais estudo, o colegial, para ser professora, uma carreira promissora e de muito respeito. Sinto que os governantes tenham se desleixado tanto com a parte de educação, vejo crianças com grandes dificuldades de seguir um curso importante por falta de estrutura no conhecimento. Os costumes na adolescência de então, teria que escrever páginas e mais páginas...
Não sou uma puritana, passei por todas as discriminações que a mulher teve,
acho, e acompanhei a sua evolução, me sinto atual, mas vi com tristeza a falta de responsabilidade nessa evolução. Sexo antes do casamento nem pensar, guardávamos a virgindade para aquele que seria o marido, aliás, os homens jamais pensariam em se casar com quem não o fosse. Hoje, se a mulher quer, tem a opção de fazer sexo antes do casamento, acho certo, desde que tenham a devida responsabilidade de cuidar-se
e da cria que possivelmente podem ter, e não fazê-lo de forma banal. Digo isto porque também passei por essa fase de querer e não poder ter. Os tempos realmente mudaram, algumas coisas foram para melhor, outras, entretanto, não, pois vejo muitas senhoras amigas que hoje cuidam de filhos fora do casamento, de seus própios filhos ou netos, não é justo.
Nossas roupas eram lindas. Calcinhas acertada ao corpo, ou com perninhas, combinação, soutien, uma anágua para avolumar as saias que, em geral eram amplas, como godês, de pano enviesado, pregas fartas, franzidos bem distribuídos, plissês, recortes interessantes que formavam e completavam a vestimenta. O famoso tomara-que-caia apareceu em minha adolescência, e usava-se com boleros de renda, veludo ou tecidos, que complementavam o visual, sempre com amplas saias Os maiôs de perninhas e saias na frente, cheguei a usá-los, e também os tomara-que-caia Completando, a touca de borracha para proteger os cabelos e chapéus de abas largas para o sol. O primeiro tailleur foi inesquecível. A saia godê, o paletó ajustado, com ampla gola que vinha até a cintura. Usávamos luvas, indispensável em ocasiões importantes. A roupagem era linda e elegante, mas
trabalhosa para lavar e passar, hoje a simplicidade de material e confecção melhorou e muito, confesso que gostei. Vi o nascimento de novos tecidos, como o tafetá, que foi muito usado, banlon, teflon, percal, tergal, nycron, tecidos sanfonizados, o organdi. Depois começaram as mudanças da moda, veio o tubinho, o mais famoso, pois deixava o corpo solto, insinuando formas, muito sexy, o comprimento sempre diminuindo ou se alongando, uma revolução para as donas de casa que tinham metros e metros de panos para passar a ferro, diga-se, maravilhas da modernidade.
As primeiras regras chamávamos de “ficar moça” e o constrangimento tomava conta quando tínhamos que abastecer nossa gaveta com os famosos paninhos. Não se tem dúvidas de que o modess revolucionou a época. As primeiras propagandas do material que aparecia na TV, que também vi nascer, coravam nossas faces. E relembrando os "reclames", como eram ditos, quantos foram inesquecíveis e são interessantes até hoje. O Repórter Esso, já na Globo, com uma marca do indiozinho dentro da esfera. Uma frase que se achava estampada nos bondes e que dizia: “Veja, ilustre passageiro, o belo tipo faceiro, que o senhor tem ao seu lado, entretanto acredite, quase morreu de bronquite, salvou-o o Rum Creosotado”. Outros da pomada Minancora, AguaVelva, outro que dizia: “Tosse, bronquite, rouquidão, Xarope São João.” O remédio da mulher: “Regulador Xavier”. A do tecido tergal foi diferente: uma mulher com calças de tergal, sentava e levantava várias vezes e se dizia: "Senta, levanta e não amassa”. O uso do pó de arroz da Cashemere Bouquet, o rouge para corar as faces, o laquê para segurar as ondas do cabelo no lugar, a brilhantina Coty, que foi muito usada pelos rapazes, o talco, indispensável após o banho, o sabonete Lyfeboy, a chiquerrima English Lavanda Atkinsons e outras tantas marcas que serão eternizadas. O poder da propaganda perdurando Os cabelos lavados com sabão de coco, os penteados de época, insinuantes com suas ondas que formávamos através dos “bigudins”, que ficavam presos por longo tempo, só o tirávamos na hora de sair... As permanentes demoradas que também davam forma e volume, os penteados rebuscados por ocasiões festivas como os bailes.
Ai, os bailes! Os bailes de 15 anos principalmente, que eram esperados, as debutantes com longos vestidos enfeitavam os salões e os rapazes, com terno, o cheiro da lavanda no ar, brilhantina nos cabelos, desfilavam nos olhando intensa e disfarçadamente. Esperávamos o momento da dança que era o orgasmo que não podíamos ter. Ansiávamos por sermos tiradas, levadas a dançar, e os rapazes contavam que esperavam não levar “tábua”, termo usado para quando a mulher negava sair a rodopiar com ele. A dança era o namoro velado, falas ao pé do ouvido, o toque sutil, o abraço comportado, sem receios, estávamos em público Realmente dá saudade desse tempo O romantismo que se foi. O próprio casamento era um conto de fadas Acreditávamos que se casássemos, seriamos felizes para sempre.
Através do tempo verifiquei com amargura que não era assim, por isso não sou contra os modernos tempos, mudei em função deles, segui o ritmo dos mesmos, muita coisa melhorou, a tecnologia, a praticidade, principalmente para a mulher, eu que o diga, passei por todas as discriminações, para evoluir e me tornar moderna, atualizando-me nos estudos, roupas etc. Vim do tempo em que éramos posse de papai e mamãe, para sermos posse do marido. Namorávamos sempre com algum familiar "fazendo ronda, ou melhor, segurando vela" Saudosismo, sim, de algumas coisas que foram realmente boas, seguir em frente é meta prioritária para qualquer pessoa,
cidade ou nação, o tempo é inexorável, não para, as transformações
seguem seu curso mas, se pudesse, o teria detido dentro do que considero necessário para o desenvolvimento da personalidade, do conhecimento, de maior romantismo de maneira a nos levar a uma vida sexual saudável e com amor, e não banalizar o ser humano como um objeto a ser usado. O cinema era o lugar dos namorados, podíamos acariciar e ser acariciadas, no escurinho Mesmo vindo com familiares, escolhíamos lugares retirados, para o tocar das faces, o passar dos braços pelas nossas costas, o beijo roubado, sussurrando frases de amor.
Foi um tempo muito bom, o desejo e devaneios faziam parte do namoro. O olhar falava mais do que as próprias palavras. Muito romantismo e nenhum sexo. Hoje pelo que observo, há mais sexo do que romantismo Ambos os extremos não são saudáveis, o meio termo para tudo na vida é o melhor remédio. A sexualidade reprimida de então, era uma barreira para maior conhecimento do outro, mas a banalidade de hoje
caiu no vulgar e promiscuo. Saudade do passado, sim, uma saudade do que passei e não volta, fico feliz pelo passado e o presente. Evoluí.Recolher