IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Sérgio Carvalho Bandeira de Mello. Nasci no Rio de Janeiro, em Botafogo – apesar de ser Flamengo – no dia seis de novembro de1955, de manhã cedinho. Mas pode me chamar de Gico mesmo, é meu apelido, vem de Sergico, todo mundo sabe. É ape...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Sérgio Carvalho Bandeira de Mello. Nasci no Rio de Janeiro, em Botafogo – apesar de ser Flamengo – no dia seis de novembro de1955, de manhã cedinho. Mas pode me chamar de Gico mesmo, é meu apelido, vem de Sergico, todo mundo sabe. É apelido de família. Se falam Sérgio, eu nem sei quem é.
FAMÍLIA Meu pai se chama Jorge Foutié Bandeira de Mello e minha mãe, Maria Ilza Carvalho Bandeira de Mello. Meu avô paterno é Raul Leite Bandeira de Mello e minha avó, Aurora Foutié Bandeira de Mello. Do lado da minha mãe, o meu avô se chama Adriano Batista de Carvalho e a minha avó, Anna Reis Carvalho. Foutier é de origem libanesa, dos franceses que andaram por lá.
Meu pai era engenheiro. Minha mãe se formou em piano, fez curso de aperfeiçoamento em piano, o que me levou a tocar também. Mas ela teve um filho atrás do outro, então, ela nunca pôde realmente exercer a profissão. Nós somos cinco irmãos. Eu sou o terceiro, sou o do meio. É uma escadinha, um de 1953, outro de 1954, eu de 1955, a menina de 1959 e o temporão, de 1962. Temporão não, hoje em dia não seria temporão.
MÚSICA / INFLUÊNCIA DA MÃE Minha mãe passou o gosto por música para os filhos. Quer dizer, atrás do piano só eu fui. A minha irmã também começou com o piano, mas não seguiu adiante. Mas eu tenho um irmão que toca violão também. Então, a música sempre esteve muito presente lá em casa, a música clássica. Eu ainda toco, mas eu toco só popular. Hoje em dia, larguei o estudo de piano. Estudei cinco anos piano clássico, mas eu larguei já faz mais de 30 anos. Mas eu continuo tocando até hoje. Toquei na sexta-feira, toquei no sábado.
INFÂNCIA Nasci na Casa de Saúde São José, que existe até hoje. Está reformada, mas ela é velhinha. Eu achei [minha infância] muito legal porque, apesar de ter nascido em Botafogo, eu fui morar na Tijuca. Sou tijucano mesmo, aquele de raiz, morei lá até os 25 anos de idade, quando eu me casei e fui morar na Lagoa. Mas eu sou tijucano mesmo. Morava debaixo do [Morro do] Borel. Naquela época, na Rua São Miguel – onde hoje fica o Morro do Borel, que todo mundo acha violento – a gente brincava na rua, a turma do Borel brincava lá em casa, a gente jogava bola junto. Joguei bola com o Carlos Aberto Pintinho, que jogou no Fluminense muito tempo. A gente jogava na Souza Cruz, uma fábrica de cigarro que ficava em frente. Minha casa dava tanto para a São Miguel quanto para a Conde de Bonfim, era uma casa grande. E eu morei lá esse tempo todo. Então, com esse monte de irmão e esse monte de vizinho, eu acho que foi uma infância bem legal.
Isso aí foi o início. Depois eu fui estudar no Colégio de Aplicação da UERJ – da Tijuca, ali na rua Barão de Itapagipe, na época – e aí já tirava um pouco do tempo livre, porque era de manhã e de tarde. Era um colégio experimental, excelente colégio, por sinal. No momento em que eu fui estudar lá, eu tive que abandonar algumas coisas. Uma das coisas que eu abandonei foi o piano clássico, não dava para levar, porque eu tinha aula de manhã e de tarde, gostava de jogar bola e não dava para fazer tudo ao mesmo tempo. Fazia judô na época e também tive que largar o judô. Para vocês terem uma idéia, eu só tinha um dia livre na semana. Então, eram quatro dias, a gente tinha aula de manhã e de tarde. Entrava às 7h e saía às 17h40. Então, não tinha tempo. A gente ainda tinha que fazer outras coisas, dentista, médico etc. Então não dava. O tempo livre que a gente tinha era muito pequeno então eu acabei ficando com o piano popular só, que era de ouvido e era mais fácil.
PAIS O meu pai levava a gente para a escola. Ele era engenheiro, trabalhava no serviço público, primeiro foi engenheiro do antigo Distrito Federal, depois do Estado da Guanabara e depois passou para o Município. Ele foi do Instituto de Geotécnica, da SURSAN – Superintendência de Urbanização e Saneamento, do antigo
Estado da Guanabara –, e teve alguns cargos de direção dentro do Município e do Estado. Depois de uma certa época, ele abriu também uma firma de engenharia, a Contest. Então, meu pai estava sempre ocupado, vamos dizer assim. Quem tocava o barco dentro de casa era a minha mãe, mas eu só acompanhei isso de perto até eu fazer 11 anos, quando eu entrei para o Aplicação. Porque depois disso, eu mesmo não estava dentro de casa, eu ficava o tempo todo fora. Todos os meus irmãos foram para o Aplicação, os cinco. Acho que é um caso único dos cinco irmãos terem passado para o Aplicação. Então, a gente mesmo começou a ficar de fora. Mas a minha mãe tinha sempre alguém de fora [para trabalhar em casa]. Ela é que tocava o barco dentro de casa.
AVÔ A gente morava junto com o meu avô – o pai da minha mãe – no mesmo terreno, não na mesma casa. Ele tinha uma casa no mesmo terreno e a gente vivia muito lá na casa do meu avô, que se chamava Vô Diano – vovô Adriano. E, debaixo dele, morava também o seu filho mais velho. Então também tinha primo, era uma grande confusão quando a gente estava em casa. E a gente gostava muito dessa bagunça.
CASA A casa era enorme, porque era um antigo colégio de freiras, pertencia a uma ordem das Irmãs Oblatas lá da Espanha. O meu avô comprou a casa para derrubar e fazer um prédio. O meu avô era construtor. Quem conhece a Tijuca vê que tem alguns prédios na Almirante Cochrane e na Conde de Bonfim, que são exatamente iguais – ele que fez. Ele tinha uma empresa chamada Empresa Proprietária e Construtora. Ele não fazia incorporação, ele dizia que só vendia o que era dele e que o resto era roubo. Então, ele comprava o terreno, construía, depois vendia apartamento por apartamento. E ele comprou esse terreno onde funcionava o colégio de freiras justamente para fazer um prédio desse tipo. Mas com o problema da inflação – isso foi mais ou menos em 1958, o Juscelino [Kubitschek] nessa época já tinha começado a construir Brasília, a inflação já tinha começado a disparar aqui –-, a ordem das freiras entrou na justiça contra o meu avô.
Tinha uma clausula no contrato que dizia que ele podia atrasar duas prestações e as prestações eram semestrais. O meu avô atrasou a prestação e pagou a segunda, conforme rezava o contrato, mas as freiras, que tinham muita influência em Brasília – como até hoje têm, a Igreja é fortíssima, naquela época era muito mais –, se recusaram a receber esse valor. O meu avô continuou pagando em juízo, só que a obra ficou embargada. Com isso, o meu avô perdeu um tempo enorme e nós ganhamos uma casa para morar, porque o meu avô ia derrubar aquilo e ia construir um prédio. Com isso, nós fomos ficando, ficando – a justiça aqui é super morosa – e o assunto só se resolveu em 1972, quando eu já tinha 17 anos de idade.
Ou seja, nessa brincadeira, eu fui crescendo, crescendo, num casarão enorme. Tanto que eu falei que o pessoal do Borel ia jogar bola lá em casa, porque aquilo era um colégio. E era sempre tudo muito improvisado porque a qualquer hora podia ser derrubado para construir um prédio. Então, teve um aspecto ruim, porque o meu avô acabou perdendo isso na justiça. Foi um caso que foi até para o Supremo Tribunal Federal, o que é um absurdo. Você vê a influência que a Igreja tem. Foi um caso que o meu avô perdeu no Supremo Tribunal Federal, que trata de assuntos constitucionais
Por isso a nossa aversão: todo mundo largou a Igreja. Bom, já tinha largado antes. Então, essa casa era um grande colégio que a gente foi ocupando, improvisando aqui e ali. Meu pai, que era engenheiro também, construiu a casa dele numa parte do terreno. Essa casa, a gente não perdeu e hoje em dia é uma casa de festas lá na Conde de Bonfim, que é a Festejar. De vez em quando, a gente vai matar as saudades e aluga a casa.
AMIZADES Era muito boa [a relação com as pessoas do Borel]. Sempre existia aquele negócio de menino do morro, aquele pessoal que falava: “ah, está andando com menino do morro”. Mas eu acho que o futebol acaba com isso. Nós começamos a jogar bola juntos e ficamos amigos, íamos para o Maracanã juntos. Naquela época, menor de 14 anos não pagava, não existia violência nenhuma, a gente ia para o Maracanã em tudo quanto era jogo. Eu comecei a jogar futebol com eles na Souza Cruz, na fábrica de cigarros que ficava em frente, onde é hoje o Carrefour da Tijuca. O morro vivia lá em casa e a gente vivia lá embaixo também. Tem o Beira Rio, que todo mundo conhece, que é o campo do Internacional de Porto Alegre. Nós lá também tínhamos o Beira Rio, mas era o “Beira Rio Maracanã”. O rio Maracanã passava ali e a gente chamava de Beira Rio.
Acho que o futebol não vê discriminação. Outro dia, eu estava comentando com uma amiga minha que eu tinha a maior inveja dos garotos que tomavam banho no chafariz da Praça Saens Peña, porque era uma coisa de liberdade, um sol danado e a gente de sapato e eles descalços, tomando banho de chafariz. Era uma coisa que a gente não podia fazer de jeito nenhum, porque diziam que a água ia passar doença. Então, de uma certa forma, eles tinham uma liberdade que a gente invejava.
BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA Naquela época, as brincadeiras eram pião, bolinha de gude, bafo-bafo. Os programas na televisão eram muito poucos. Eu estou falando de quando a gente tinha sete, oito anos de idade. A televisão começava, praticamente, às seis horas da tarde, era praticamente de noite. Não tinha esse negócio de programa infantil. Eu me lembro que quando o meu irmão menor era moleque, começou esse negócio de Tia Fernanda, Abelhinha. Então a gente implicava muito com ele com esse negócio.
Na nossa época não tinha disso não, a gente ficava na rua mesmo, ou dentro da minha casa. Carrinho de rolimã, pião, pipa, que eu nunca soube soltar e é uma das minhas frustrações – nunca consegui botar uma pipa a mais de dois metros no alto. As brincadeiras eram mais desse tipo: bolinha de gude, que era triângulo, búlica. Muito bafo-bafo com figurinhas. Sempre a figurinha era sobre futebol. Não tinha esse negócio de figurinha de Disney, nada disso. Era figurinha dos jogadores. Então tinha aquele negócio de figura carimbada, carimbo de ouro, e aí você juntava uma página e trocava por um prêmio. Eu me lembro que uma vez eu ganhei uma panela de pressão A gente deu para a empregada da minha avó, para Nair, porque, realmente, o que a gente ia fazer com uma panela de pressão? O pessoal não tinha a menor idéia do que era marketing naquela época. Eles faziam “à Bangu” mesmo, porque sabiam que quem consumia era criança e botava como prêmio uma panela de pressão. É uma imbecilidade.
ENSINO FUNDAMENTAL Eu não fui para o Aplicação logo. Primeiro eu fui para a Escola Barão de Itacurussá, que ficava na rua Andrade Neves, na Tijuca. Era colégio público também, onde eu estudei com esse povo do Morro da Formiga, do Morro do Borel. Por isso que eu digo que sempre fui acostumado a viver no meio, sempre estudei em colégio público, desde o início, do primário até a faculdade na UFRJ. Quando eu pago escola para os meus filhos agora, eu fico pensando assim: “poxa, o meu pai se deu bem”, porque todo mundo lá nunca pagou escola, nenhum dos cinco.
Eu acho que o ensino público naquela época era muito melhor. Não tenho dúvida. Hoje em dia não dá. Antigamente dava. A escola era muito boa. Inegavelmente, por mais que falem do Lacerda por causa dos problemas políticos dele, por ser de direita, de querer a qualquer preço chegar à presidência, naquela época o ensino público era muito bom. Lá no Barão de Itacurussá, eu também tive uma preparação muito boa, o que até me permitiu fazer prova para o Aplicação e passar. [Lembro da] Dona Wanda sempre. Dona Wanda Marion. A minha primeira professora se chamava Dona Zélia. Eu já sabia ler, porque eu aprendi em casa, porque eu tinha dois irmãos mais velhos. Mas sabia ler sem ser com letra de mão, era aquela letra de imprensa. Isso era o que eu já sabia. E já sabia também fazer contas de somar e subtrair. Eu não fiz Jardim de Infância. Quando eu entrei, no primeiro ano, foi a Dona Zélia. Depois, no segundo ano – naquela época o primeiro ano era o CA – foi Dona Wanda, que acompanhou a turma até o final. Fiz o primário todo nessa escola. Depois fiz um cursinho de admissão preparatório para fazer prova para o Aplicação. Eu me lembro que, nesse cursinho, queriam que eu fizesse prova para um monte de escolas. Eu falei assim: “não. Eu quero ir para o Aplicação.” E, para garantir, eu fiz teste para um estadual também, que foi o Luís de Camões. Eu não queria ir para o Colégio Militar, não queria ir para outro lugar, então não tinha porquê fazer prova. Eles queriam porque, naquela época, os cursinhos disputavam muito. Aí, eu passei no Aplicação e fui embora, fui até o terceiro ano. Não fiz curso pré-vestibular, fiz prova para o Fundão, em engenharia, e fui.
ESCOLHA DA PROFISSÃO Mas desde cedo eu não queria ser engenheiro. Eu fui ser engenheiro por pressões. Eu não sei... não pensava nisso. Primeiro, como todo garoto, eu queria ser jogador de futebol mesmo, eu levava jeito. Quem jogava comigo chegou ao Fluminense, chegou ao América. Então, eu conheci alguns amigos meus que seguiram carreira profissional. Eu queria ter seguido isso, mas, para o meu pa,i “nem pensar” Naquela época, era coisa de bandido ou então de quem não tinha oportunidade. Eles admitiam o Pintinho, que vivia lá em casa, o papai conhecia, mas porque ele não tinha condições de fazer uma faculdade, de ser médico...
Depois, eu tentei ir para a área de humanas, mas aí tinha dois problemas. Na minha época, a turma estava toda presa, os professores, o IFCS [Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ] estava fechado. Justamente na época em que eu fui fazer vestibular, em 1973, a gente estava vivendo o auge da ditadura: era a passagem do Médici para o Geisel. Então, a gente não tinha muita opção do que fazer. Eu fui fazer engenharia, mas não foi por aquela pressão: “você vai fazer”, não. Fui porque os meus amigos todos foram fazer engenharia. Medicina eu não ia fazer de jeito nenhum. Eu sempre tive medo de doença.
CASAMENTO Para você ter idéia, eu já casei duas vezes no papel, com duas médicas, entendeu? Eu gosto de atendimento 24 horas A primeira fez medicina social, na época que a gente era meio comunista. A segunda é reumatologista, para tratar do meu joelho, e ainda vou casar pela terceira vez com uma geriatra.
AMIZADES DE COLÉGIO Eu vou almoçar com eles daqui a pouco. Eu almoço com o pessoal do Aplicação toda sexta-feira e muitos inclusive estão na Petrobras. Do pessoal do primário que entrou no Aplicação, só teve uma menina que foi junto, mas não chegou a ser [do grupo], porque era menina, é a filha do Zagalo, A Maria Emília Zagalo, que fez a Barão de Itacurussá comigo e depois foi para o Aplicação. Mas ela não fazia parte do grupo. Naquela época, o grupo mesmo era só de garotos. Tinha uma menina, mas que eu já conheci no Aplicação, que chegou até lá e é da Petrobras também, almoça com a gente, a Cláudia. E esse grupo que começou a estudar junto, e que passava o dia inteiro junto, namorava as mesmas meninas, trocava, ficava namorando uma, depois pega a namorada do outro. É meio uma “suruba”.
JUVENTUDE A gente ia para festa toda sexta, sábado e domingo. O Aplicação tinha essa vantagem: apesar de exigir muito, ele não tinha dever de casa, porque como passávamos o tempo todo lá, quando muito tínhamos um trabalho de grupo para fazer. Isso aproximava muito. E a noite, a noite era nossa. A gente tinha prova em grupo também, quando a gente sempre podia deitar um pouco na sopa do que estivesse melhor, porque dividia a nota. O Aplicação foi muito revolucionário nesse ponto. Só me atrapalhou quando eu entrei para a faculdade, porque aí eu vi que era cada um por si. Mas durante o Aplicação foi muito bom. O primeiro ano de faculdade foi uma porcaria, porque eu deixei de estudar em grupo. [No colégio] a gente sentava em carteira, fazia um grupo, é como a gente trabalha hoje, a gente trabalha em equipe. Só que na faculdade não, era cada um por si. Então, eu tive um gap, que foi justamente a faculdade. Depois eu voltei, continuei trabalhando.
MODA Naquela época a moda era calça prega dupla e bolsa envelope. Era a época do “Tremendão”, calça tremendão, mas eu não usava esses negócios não. Mas estava na moda. Bolsa envelope eu usei. Tinha calça boca de sino. No início, era calça saint tropez, depois passou para toureiro. Era o contrário, passou daqui de baixo para cá pra cima. Depois, pantalona. Já vivi muito isso. Já vi calça subir, descer, pescar siri e não pescar. Eu já me perdi.
JUVENTUDE
/ MÚSICA O que eu gostava de ouvir? Bom, com 15 anos, eu ouvia Led Zeppelin para caramba. Era o que eu mais gostava. Então, era muito Led Zeppelin, era rock, era música americana mesmo, era Woodstock – 1969, 70,71 foram anos em que a gente foi bem influenciado pela turma de Woodstock. Mas a gente gostava mesmo era de Led Zeppelin. A gente botava o disco deles uma, duas, três vezes, até arranhar o disco, rodava, rodava... até furar.
Na música brasileira, nessa época, os bons letristas ou não conseguiam gravar porque a censura não deixava, ou então tinham que fazer aquelas letras tão distantes, que o pessoal que era moleque não entendia. A gente aprendia música MPB naquela época em aula de interpretação de texto. Mas tinha que ser uma coisa meio clandestina, porque senão o professor dançava. O que a gente escutava mesmo nessa época, na década de 70, era rock. Depois que a gente começou a crescer, com 16, 17 anos, é que a gente começou a escutar um Chico, um Milton, Edu Lobo, Francis Hime. Aí, a gente começou a ter essa evolução. Mas Led Zeppelin eu escuto até hoje, não tenho nada contra e o meu filho também adora.
JUVENTUDE / BAILES A gente ia à domingueira do Montanha, na Estrada Velha da Tijuca, onde eu jogava futebol de salão também. Depois do Souza Crus, eu fui sócio-atleta do Montanha e tinha três amigos que jogavam futebol de salão lá comigo. Então, a gente tinha essa facilidade porque era sócio-atleta, não pagava e rebocava os outros. Mas a Tijuca toda ia para lá no domingo. Tinha a domingueira do Tijuca Tênis Clube, mas isso era mais cedo. Era mais do Montanha e festinha. Festinha de quinze anos na casa de um e de outro. Naquela época, volta e meia, tinha botar smoking para ir à festa de 15 anos. Teve uma vez que eu fui até de casaca. Acabaram os smokings todos e só tinha uma casaca. Eu falei: “me dá”. Depois tirava mesmo, não tinha problema.
DITADURA MILITAR A gente entendia pouco, muito pouco [do que estava acontecendo no país]. Primeiro, porque não saía em jornal, a censura era violentíssima. A gente via que todo mundo odiava militar. O pessoal que tinha pai militar, tio militar, tinha até vergonha. Já existia esse negócio, mas a gente não tinha condição de chegar e saber realmente o que estava acontecendo.
Eu me lembro que na época brava no DOI-CODI, eu fui disputar o campeonato dentro da PE [Polícia do Exército], onde o pessoal estava torturando, ali na Barão de Mesquita. Tinha um campeonato de futebol de salão ali e eu fui jogar o campeonato pelo Montanha. Em 1973. Ou seja, para todos os efeitos, o milagre brasileiro estava ocorrendo, estava todo mundo empregado. Não saía nada no jornal e a gente ficava naquele disse-me-disse. A gente teve uma grande decepção no Aplicação, porque eu entrei em 1967, e em 1968 o Grêmio foi fechado. O presidente do Grêmio do Aplicação, inclusive, era o Chico Alencar. Ele foi expulso do Colégio e pegou, se não me engano, a lei 477. Ele não pegou, mas ele pegou ameaça. Então, ele foi expulso do Colégio. Soubemos a razão porque ele era presidente do Grêmio.
A gente ficava sabendo de alguma coisa porque foi a época dos seqüestros, do seqüestro do embaixador, do alemão, do americano. Então, a gente tinha algum acesso à informação quando existia algum fato que eles não podiam encobrir. Acho que foi por isso que começaram a seqüestrar embaixador, porque aí a imprensa estrangeira noticiava lá. Nessa época não tinha internet, mas dessa forma eles conseguiam ser pautados mesmo. Não tinha como o Globo – se estava saindo alguma coisa no New York Times, uma manchete dizendo que o embaixador americano tinha sido seqüestrado no Brasil – fingir que não estava acontecendo nada. E ninguém podia acusar também o New York Times de ser um jornal a soldo de Moscou. Então, era a maneira de você ver que as coisas não estavam indo lá tão bem como o Amaral Neto sempre dizia na televisão – tinha o Amaral Neto Repórter. A coisa era “braba”. Então, a gente era alienado, mas era porque as informações realmente não chegavam. E garoto nessa época gosta de ir para festa, de segurar uma menina, de jogar bola. Eu vejo pelos meus filhos. Meus filhos têm completo acesso à informação e são completamente alienados. Meu filho está com 17 e minha filha está com 14. Eles gostam é de futebol e de festinha. Então, de uma certa forma, eu vivi a época da altíssima ditadura ainda nessa fase.
ENSINO SUPERIOR Quando eu fui para a faculdade, a coisa estava começando a melhorar, mas ainda era barra pesada. A gente tinha medo. O centro acadêmico estava fechado, a gente criou a Atlética justamente para disfarçar, para a gente ter alguma atividade. Foi quando a gente começou com esporte, com cooperativa. E tinha um e outro que ia lá e aí começava: “O Partido Comunista...” Aí já começava a cisão, um era do Partido Comunista e o outro era do PC do B, PCB, AMN, aquelas siglas todas, aquela “mistureba” danada que foi ficando naquela época. Mas a gente não era alienado por opção. A gente era alienado porque só saía alguma coisa na época de seqüestro de embaixador, se não, não saía nada. A faculdade foi um baque para mim primeiro porque, como eu falei, eu perdi os meus amigos. Os meus amigos passaram para a turma da tarde e eu passei para a turma da manhã. Teve um que não passou para a UFRJ, acabou se formando na UERJ, que é desses com quem eu almoço até hoje. O Cláudio Nunes, que é chefe da área de SMS [Segurança, Meio Ambiente e Saúde] da Petrobrás, passou para a tarde. O Gustavo, que é chefe da Engenharia Naval da Petrobras, também passou para a tarde. São todos do Aplicação. Todos amigos. A gente viajou junto agora. É amigo de família. Os filhos dele me chamam de tio, meus filhos chamam ele de tio, como se fosse meu irmão hoje. Mas eles passaram para a turma “D” e eu passei para a turma “C”. Eu passei em ducentésimo décimo primeiro. Eles passaram em ducentésimo vigésimo. Nessa brincadeira, eu fiquei de manhã e eles ficaram à tarde. Eles se deram bem e eu me dei mal. Eu fui reprovado em quatro matérias, logo no primeiro semestre, por conta disso e por conta do Exército, porque, curiosamente, eu fui chamado para servir.
SERVIÇO MILITAR Eu fui para o CPOR [Centro de Preparação de Oficiais da Reserva], porque eu tinha o terceiro ano científico completo e estava fazendo faculdade. Aí, pedi, como meu irmão pediu e como meu outro irmão pediu, para sair do CPOR, porque tinha um monte de gente querendo servir. Assim como tinha muita gente que tinha vergonha de ser militar, também tinha muita gente que queria ser militar porque, naquela época, ganhava-se muito bem. Então, o cara podia ser tenente da reserva, ficava cinco anos e pegava uma graninha boa. Tinha muito mais gente querendo servir do que gente querendo ir embora. Eu pedi para sair. Quando eu pedi para sair, eles me mandaram para a tropa. Em vez de dar ”excesso de contingente”, como deram para o meu irmão, me mandaram para o Forte São João e eu fiquei um mês.
Lembro que, quando eu fui para lá me apresentar, às sete horas tocava o Hino Nacional. Aí ficou todo mundo conversando, todo mundo cabeludo para caramba naquela época. Todo mundo apavorado, porque eram todos universitários e tinham ido para a tropa, todo o excesso do CPOR. Aí, começou a tocar o Hino Nacional e a gente ficou conversando. Daí a pouco, chegou o cara assim: “para vocês aprenderem a ficar de pé na hora do Hino Nacional, vocês vão ficar de pé até o meio-dia e voltam amanhã”. Para você ver o que era milico. Era uma coisa terrível e aquele pânico. Aí, eu recorri ao meu pai. Meu pai, nessa época, conhecia o João Lira Filho, que foi reitor da UERJ e era irmão do Lira Tavares, que era Ministro do Exército. Meu pai conseguiu me tirar e a todos os universitários da tropa, depois de um mês de conversa. Eu cheguei até a tirar a medida do capacete. Eu fiquei em pânico. Não cheguei a cortar o cabelo não. Tirei só a medida do capacete. Mas deu para sofrer. Seria uma coisa horrível para mim. Se eu tivesse cortado o cabelo era garantia, naquela época, de que eu ia ficar sem mulher, porque “reco” naquela época podia contar que não ganhava ninguém. Nesse mês deu para eu freqüentar a faculdade muito pouco. E eu perdi também por vagabundagem, porque, primeiro, eu não gostava de engenharia, e porque eu perdi os meus amigos também, porque eu não estudava com eles. Então, na hora de estudar, eles estavam na faculdade, era o contrário. Então, eu acabei sendo reprovado logo em Cálculo, em Física, e em alguma outra coisa. Só passei em Desenho e não sei o que mais. E aí, fui fazer três anos de básico. A gente brinca aqui que todos nós -- menos o Gustavo que é chefe da Naval na E&P [Exploração e Produção] e fez em cinco anos – fizemos em seis. A gente sempre perdeu. Por um motivo ou por outro, a gente fez o curso básico em três anos mas a gente entrou antes do que ele na Petrobras. A gente diz: “quem mandou fazer em cinco anos?” Porque ele foi para o Arsenal de Marinha primeiro, depois é que ele fez prova para a Petrobras. A gente fez direto. Eu sei é que nós estamos aí, é muito tempo. Fui levando. Eu não gostava mesmo de engenharia. O curso profissional é muito mais fácil do que o curso básico, não tem nem comparação. O curso básico é terrível, principalmente na UFRJ. Para você ter uma idéia tem um capítulo no meu livro de cálculo – que era o Michael Spivak, só tinha em espanhol e inglês – com dezessete páginas sobre “pi é irracional”. Só isso: só demonstrando que pi é um número irracional. Então, isso é uma coisa absolutamente irracional.
NAMOROS A minha primeira mulher é bem mais nova. Eu era amigo de todas as irmãs dela. Eu acabei namorando ela porque eu era amigo da mais velha, da segunda e da terceira. Acabei casando com a quarta. Tanto que eu me separei dela mas continuei amigo da família toda. Mas isso foi depois. Eu namorava mais ou menos. Como eu falei: mais as meninas do Aplicação, porque a gente passava o tempo todo lá, então não tinha jeito. Essa menina era do Aplicação também, mas eu levava a irmã dela nas festas sempre. Ela era dois anos abaixo de mim. E a que eu casei era quatro anos abaixo de mim, então nunca chegou a ser da minha turma mesmo, não. Depois acabou que casei com ela mesmo.
CASAMENTO Eu casei um ano depois de me formar. Eu me formei, vai fazer 25 anos agora. Então, eu casei um ano e três meses depois. Eu já estava na Petrobras.
PRIMEIRO TRABALHO O meu primeiro trabalho de verdade foi com 16 anos. Eu queria ir para a Bahia e com o meu pai não tinha esse negócio não. Ele já tinha essa firma de engenharia e eu queria passar as férias na Bahia. Dezesseis anos não, eu já tinha 17. Eu já tinha passado direto na escola e fiquei 45 dias – novembro e dezembro – trabalhando para ter dinheiro para ir para a Bahia em janeiro. Foi o meu primeiro trabalho. Foi no lote do Metrô que hoje vai da Igreja da Glória até a Cinelândia. Eu trabalhava na parte de controle de concreto. Era concreto nessa época que a gente fazia, só. Depois a gente começou com aço e depois acabou com solo. Mas nessa época era só concreto. Era muito fácil. Era mais um serviço de peão mesmo. Foi só para não me dar dinheiro mole que o meu pai fez isso. Era tranqüilo, qualquer um podia fazer esse negócio sabendo fazer as quatro operações e tendo disposição, conseguindo subir em caminhão.
CONTEST CONTROLE TECNOLÓGICO DE MATERIAIS Depois eu parei, fui para a Bahia e voltei. Mas eu comecei a trabalhar sem parar em setembro de 1974. Aí, eu já estava na faculdade. Quando eu tomei logo essas quatro reprovações, no início de 1974, eu fiquei meio que perdido no básico. Então, em vez de fazer todas as cadeiras, fazia três, quatro cadeiras, e fiquei com um tempo livre. Aí, fui trabalhar lá com o meu pai, na firma dele, a Contest Controle Tecnológico de Materiais. Gostei e não parei mais. Eu fui trabalhar no laboratório. O laboratório era móvel, nessa época. Meu pai ainda não tinha uma base fixa porque ele trabalhava basicamente para o Metrô. Ele trabalhava para a Servenco que era a empresa de engenharia que fazia esse lote da Glória até a Cinelândia, e trabalhava para a Ecisa, que fazia o lote da Central. Então, ele tinha dois laboratórios que ficavam na obra. Eu detesto cheiro de cimento, até hoje. Eu detesto obra. Eu não sei como que eu fui fazer engenharia. Meu pai adora. Para você ter uma idéia, minha irmã ia casar e meu pai falou assim: “vou dar uma ajeitada na casa, fazer uma obrinha para fazer a festa dela aqui”. A casa era grande, dava para fazer. Minha irmã casou, eu casei três anos depois e, quando eu saí de casa, a obra ainda não estava pronta. Então, eu tenho uma aversão a obra. Minha mulher quer fazer obra no apartamento, eu falo: “troca de apartamento, mas obra eu não quero”. Eu já ficava respirando cimento o dia inteiro e ainda em casa...Poxa Deus me livre Por isso vocês vão entender porque eu larguei a engenharia, já, já.
INGRESSO NA PETROBRAS Trabalhei com meu pai até passar na Petrobras. Não, desculpe. Eu trabalhei até entrar na Coppe [Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia]. Eu me formei em dezembro e em novembro eu tinha feito prova para a Petrobras e para a Coppe. Aí, eu passei no concurso de bolsa para a Coppe e começava em janeiro. Tinha aquele negócio de nivelamento, como eles chamavam. Eu comecei a fazer o nivelamento e a Petrobras me chamou, justamente nessa época. Aí, eu larguei a Coppe e fui para a Petrobras. Já tinha largado a firma do meu pai para fazer a Coppe um pouquinho antes. Mas isso foi coisa de duas semanas, foi muito perto. Eu não queria ir para a Petrobras. Eu fui mais uma vez por causa dos meus amigos. Então, eu fui muito levado pelas minhas amizades para os lugares onde eu estava, por falta de opção. Na verdade, eu não queria fazer engenharia. Então, já que eu não queria fazer engenharia, ir ou não para a Petrobras não fazia diferença, eu ia para qualquer lugar. Aí, eu fui. Meus amigos estavam super animados de ir para a Petrobrás, eu não. Porque, de qualquer maneira, eu já tinha uma colocação. Eu acho que, primeiro, eles não tinham a perspectiva que eu tinha. Se eu quisesse, eu tinha uma empresa para tocar. Dos cinco, eu era o único que era engenheiro. Eu tenho um irmão que é economista do BNDES, que é o mais velho. Minha irmã é historiadora, é PHD, professora da PUC e da UERJ. Tenho um irmão que fez Direito, quer dizer, o único engenheiro era eu. Então, eu tinha uma perspectiva de fazer uma pós-graduação, sair como mestre em mecânica de solos e tocar a firma. Eles não, eles não tinham nada. Nenhum ali tinha pai que tivesse firma de engenharia.
Então, eu estava naquela: “vou fazer.” “Não vou fazer.” “Vou continuar com meu pai, vou dar uma força para ele. Não vou...” Até que o meu pai falou assim: “A perspectiva agora é de que o milagre deve acabar, então, se eu fosse você, eu ia para a Petrobras mesmo”. O meu pai falou isso comigo. E com o pessoal também falando isso, eu falei: “ah, vou entrar, vou ver como é que fica.” Aí, fui entrando, fui gostando. Eu gostei de algumas coisas lá dentro, de outras coisas não, mas principalmente, o que me prendeu lá foi o ambiente de trabalho, que eu gostei muito. Mas as coisas que eu fazia lá eram muito ruins. Como a gente foi para lá para fazer primeiro um curso, o Curso de Engenharia de Petróleo, era como se eu tivesse continuado na faculdade, era a mesma coisa.
CURSO DE ENGENHARIA DE PETRÓLEO O curso era no Rio. O CEP, que é o Curso de Engenharia de Petróleo, era feito na Bahia, porque é um convênio com a Universidade Federal da Bahia, a UFBA. Mas eles estavam precisando de gente no Rio naquele momento, para trabalhar em avaliação de formações e engenharia de reservatórios. A Bacia de Campos, que estava começando, estava levando praticamente legiões de engenheiros para lá. Então, eles organizaram um curso exclusivamente para o Rio.
Foi por isso que eu fiz prova para a Petrobras. Se fosse para a Bahia, eu não teria feito. Se fosse para sair do Rio, se eu soubesse que o curso era para fazer no CEP, eu nem teria feito prova para a Petrobras, porque eu não ia sair do Rio de jeito nenhum. Eu já estava quase casando, então seria um transtorno. A minha mulher já fazia Faculdade de Ciências Médicas na UERJ, eu não ia tirá-la da UERJ para levar para a Bahia. Então, eu ia continuar aqui na Coppe. Como ia ter esse curso no Rio, eu falei: “bom, eu faço a prova. Se passar, passei, se não passar, não passei”. Tanto que eu fui ver o show do Moraes Moreira antes da prova. Eu cheguei lá meio de porre ainda para fazer a prova. O show foi na PUC. O Moraes Moreira fazia muito sucesso. Hoje em dia, é o Davi, o filho dele, que faz sucesso, que é casado com a Ivete Sangalo. Mas aí fiz. Passei e fui indo, fui indo e acabei gostando do ambiente, mas do que eu fazia lá eu não gostava não.
COTIDIANO DE TRABALHO O ambiente era o mesmo pessoal que eu via desde o Aplicação. Eram os meus amigos. Todo mundo passou e passou na Petrobras também. Continuamos juntos. Então, essa turma, que eu almoço toda sexta-feira, é isso.
DIVISÃO DE RESERVATÓRIOS Eu trabalhava na Divisão de Reservatórios, que faz o estudo de otimização de produção, vamos dizer assim. Dado um campo, qual é a vazão ótima de se tirar desse campo, entendeu? Isso é fluxo em meio poroso. O estudo de fluxo dentro de cano de tubulação já é complicado. Em meio poroso, imagina você estudando o fluxo dentro de uma esponja. Imagina isso a dois mil e setecentos metros Imagina a água Eu estou imaginando óleo viscoso, gás saindo e a água junto. É um desastre Então, eu dizia que era motorista de simulador, você compra simulador multifásico. Você vê que o computador da Petrobras no décimo quinto andar, que pega aquele prédio inteiro, era para isso, para processar ali a sísmica para a geologia e para fazer modelo de fluxo em meio poroso para nós. São milhares de variáveis para a gente trabalhar. Então, era muito difícil.
A turma que ficou nisso e que gostava tinha que fazer mestrado, tinha que fazer um doutorado para se aprofundar. Eu não tinha a menor vontade de voltar a estudar aquilo. Então eu fui levando. Eu tocava o meu barco. Eu tinha alguns campos para cuidar. No início, eu fui tratar dos campos do Espírito Santo, que eram meio vagabundos em relação à Bacia de Campos, todo mundo falava. Eu cuidava de uns campinhos vagabundos lá.
DIVISÃO DE CAMPOS A Direv – Divisão de Reservatórios – determinava quanto cada campo deveria produzir. A divisão era regional. Então, tinha a divisão de reservatórios e os setores eram regionais. Eu peguei o setor da Bahia e do Espírito Santo, que era o Sebae. Quando entrei, a Bahia era a maior produtora do país. A Bacia de Campos ainda estava começando. Então, a Bahia tinha vida própria e existia uma área de reservatório lá na Bahia que fazia isso e a gente era fiscal deles. Mas quem era eu para ser fiscal de gente que era muito mais velha que eu e já trabalhava nisso há um tempão? Então, o meu chefe era o fiscal deles. O meu chefe vivia viajando para a Bahia e a gente ficava lá, eu, o Armando, que é gerente do ativo de Marlim Sul hoje, o Paiva, que trabalha com relacionamento com a ANP [Agência Nacional de Petróleo], e a Ana Dulce, que trabalhava comigo. Eu a levei para o patrocínio porque ela era “estranha no ninho” como eu. Eu cuidava dos campos de Cação, que era no mar, cuidava dos campos de São Mateus, Rio Itaúnas. Era tudo campo vagabundo. O de Cação era melhorzinho. Então, a gente não era muito solicitado não. Dava para ir levando, ninguém me importunava, eu não importunava ninguém, ia fazendo as minhas coisas por aí.
ATIVIDADES PARALELAS Eu sempre fiz festa de final de ano para todo mundo, sempre fiz roteiro, fui videomaker, paralelamente. Porque ser motorista de simulador tinha uma vantagem: você botava um programa para rodar, depois você esperava para caramba. Então, você tinha um tempo livre. Quem queria estudava. Eu não queria estudar, então ficava fazendo outras coisas. Foi uma época em que eu comecei realmente a enveredar para essa área de comunicação, ainda na engenharia. Hoje eu sou Gerente Executivo de Comunicação por causa disso, porque eu comecei a escrever lá mesmo, para a Petrobras ou particular, qualquer coisa. Não coisas minhas particulares, mas sempre para o grupo. Ou eu organizava uma festa de final de ano no Depro [Departamento de Produção], ou outras coisas. Tudo de brincadeira mesmo. Era iniciativa minha, mas no final já me encomendavam. No final, já existia uma área disso. O Wilson Santarosa me conheceu assim. Eu fui me direcionando. Mas eu fiquei seis anos no Sebae – naquele setor da Bahia e do Espírito Santo.
BACIA DE CAMPOS Depois, eu fui trabalhar na área da Bacia de Campos. Aí, já era diferente, todo mundo olhava. Nessa época o trabalho na Bacia de Campos ainda era feito aqui no Rio de Janeiro. Eu fui para lá por causa disso. Na Bacia de Campos, já era diferente, eu fui trabalhar em implantação de projetos. Deixei um pouco essa parte de fluxos multifásicos, que eu odiava, e comecei a trabalhar na parte de implantação de projeto. Eu continuava como motorista de simulador, mas, pelo menos, o pessoal já olhava o que eu fazia. Porque na época em que eu trabalhava no Espírito Santo, ninguém queria saber. Então, eles não queriam saber, eu também não queria mostrar, era um acordo tácito, eu digo: “vocês não me aborrecem e nem eu aborreço vocês”.
Mas quando eu fui trabalhar na Bacia de Campos, não. Me deram o campo de Albacora para tocar. Foi em 1986. Aí o negócio estava brabo, me deram o campo de Vermelho, que era no Pólo Nordeste, para tocar. Aí, era o contrário, eu vivia sendo solicitado para ir em Diretoria, para ir em Superintendência, para apresentar coisas. Eu tive que começar realmente a trabalhar um pouquinho. Isso aconteceu porque eu quis sair. O César Lucchesi era chefe da Bacia de Campos. Quando eu falei: “eu vou embora, não agüento mais isso”, o César falou assim: “Você não vai embora não. Você é um talento, só está precisando de serviço”. Mas no Depro, o pessoal contava o tamanho do departamento pelo número de empregados que tinha debaixo. Então, você dizer que queria sair era um crime. O Sérgio Baron, que é um amigo nosso gerente-executivo da Unidade de Negócio – são todos gerentes-executivos hoje –, quando ele disse que queria sair, foi um caos. Atualmente, ele é gerente da área de Bunker (combustível para navios), trabalha na área de abastecimento. Ele trabalhava com a gente. Tomava sol todo dia. Era uma zona aquilo ali. Mas era por isso que eu gostava. O ambiente era muito bom, mas a gente queria sair e não deixavam. Era um absurdo. Eu falei que ia sair, que tinham me oferecido uma vaga para trabalhar na parte de viabilidade de projeto que, pelo menos, era uma coisa mais palpável – eu conheço bem matemática financeira, trabalhei com essa parte de organização de indústria. Pelo menos era uma coisa que eu via mais rápido do que fluxo em meio poroso, que achava uma coisa horrorosa. Então eu falei: “vou sair”, mas o César falou: “Não, Gico. Antes de sair, você vai passar um tempo aqui na Bacia de Campos e vai ver como é diferente”. E, realmente, foi diferente. Aí, me deram ali uma sobrevida, eu consegui respirar um pouquinho.
O César me deu campos importantes para tratar. Eu fiquei com o Campo de Vermelho, que é um dos três campos que integram o Pólo Nordeste – que tem Carapeba e Pargo, que também são três –, me deu o Campo de Malhado, um campo vagabundo, e me deu o Campo de Albacora, que estava no início. Foi muito bom, eu vi o Campo de Albacora começar a crescer. Foi bom porque aí eu não fazia só essa parte de estudo, eu fazia uma série de outras coisas. Aí que eu fui conhecer um EVTE, fui trabalhar com Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica lá dentro mesmo. O Flávio Santos Tojal trabalhava comigo. O Tojal, que hoje é gerente da Abast [Abastecimento, Marketing e Comercialização], e o Pedro Augusto Bonésio, que é o cara do financiamento e da produção, da ASFIP [atual FINPROJ], trabalhavam comigo direto, dentro do Campo de Albacora. Aí, eu comecei a gostar mais do que eu fazia, mas continua fazendo essas bobagens todas que o pessoal me contratava para fazer.
GREVES Eu fazia festas. Quando implantaram roleta eletrônica, eu fiz uma peça – Alcatras, fuga impossível. Eu fazia sempre alguma coisa. O Wilson Santarosa me conheceu justamente por causa disso. Foi numa greve de 1991, quando eu fiz shows lá embaixo para animar o povo. Eu tocava piano, cantava, fazia as letras, fazia tudo. Mas isso foi mais tarde, em 1991. Eu trouxe até aqui para mostrar para vocês, botei aqui no bolso.
O Santarosa me conheceu assim, ele me convidou, na época da greve de 1991, porque eu saía tocando piano no Edihb [sede do Maracanã], no Edise [sede do Centro]. Eu botava o meu teclado, subia no caminhão e fazia show lá embaixo. Porque, o que acontecia? O pessoal reclamava muito que a greve dispersava. Ou o pessoal não entrava ou não ia, voltava para casa – mas o bom era fotografar gente embaixo mesmo, fazendo pressão. Então, ficava aquela meia dúzia lá embaixo, ou seja, a gente não mostrava que tinha gente contra as coisas. Ou então, a turma simplesmente – depois daquela hora que o sindicato fazia pressão para o pessoal não entrar – acabava entrando pela garagem.
A gente viu que precisava movimentar aquele troço. Era muito chato. Então, a gente jogou bola naquela passarela para o BNDES, a gente armou trave, nós jogamos pelada ali em cima. Eu fazia show, trazia o meu teclado, botava em cima do caminhão de som, fiz umas letrinhas aqui, fiz umas paródias das músicas. Ficaram tão boas que aí a AEPET [Associação dos Engenheiros da Petrobras], inclusive, pagou o estúdio para eu gravar. Eu fui gravar esse negócio. Ainda tenho gravado. A gravação é fita K7 vagabunda, mas sei de alguém que passou para CD, o Guilherme, que trabalha em Macaé, até hoje ele tem. A minha está toda arrebentada. Depois que eu pegar o piano, eu toco.
Mas eu vou cantar depois um pedacinho aqui porque teve um caso interessante que foi o do Alfeu Valença, que foi presidente da Petrobras na época e é primo do Alceu Valença, não sei se vocês sabem. Ele é amigo de um cara que trabalhava com a gente lá, que era mais velho, o Vilane. Eu fiz uma música mexendo com ele porque ele foi demitido no meio da greve, não sei se vocês lembram. Porque o Governo – era o governo Collor– estava oferecendo 30 por cento e a gente queria trezentos.
GOVERNO COLLOR Era época de inflação, vocês nem imaginam o que é 300 por cento de reposição para 30. A inflação chegou a 84 por cento ao mês. A disparidade era enorme entre o que um estava pedindo e o que o outro estava oferecendo. Eu sei é que no meio dessa celeuma, dessa briga do sindicato – do sindicato não, porque estava todo mundo realmente mobilizado – o Alfeu dançou. Não existia nem o Ministério das Minas e Energia, tinha acabado, virou Ministério de Infra-estrutura, e era o João – que o pessoal chamava de João Grandão –o Ministro da Infra-estrutura. E no meio dessa brincadeira, o Alfeu saiu. Foi na mesma época que o Mikhail Gorbatchov foi para a Criméia. A gente brincava que Macaé era a Criméia do Alfeu.
No início, o Alfeu Valença era gerente do Disud – Distrito do Sudeste – depois virou RPSE – Região de Produção do Sudeste, que hoje em dia é UNBC. Então, eu fiz uma música mexendo com ele, mas ele ainda era presidente. Lógico, eu sacaneio enquanto ele é presidente, depois não. Daqui a pouco, entra o Vilane, esse amigo nosso, com o Alfeu dentro da nossa sala. Ele falou assim: “Gico, o Alfeu quer falar com você”. Pensei “Hi, já era...” Ele falou: “ele quer o seu autógrafo na musiquinha.”
MÚSICA DA GREVE - PARÓDIA Quer que eu cante um pouquinho? Eu canto. É com a Manga Rosa, do Alceu Valença, lembra? Ela foi feita em homenagem ao nosso ex-presidente Alfeu:
“Mamãe tá prosa com o meu novo rumo Eu não aturo ver o Alceu cantar, Sua voz melosa a ouvir costumo Ficar nervoso porque fui estudar Engenharia, morar em Aracaju Alceu do Rio, fazendo show, venceu no sul. Não vale a pena estudar fim de semana Vou mudar vou ser bacana Alfeu vai aturar Na Arena – partido político – tá a grana, Eu quero um protetor Oi, oi, oi, oi Vertiginosa a carreira assumo Na posse, eu juro, Mando o Alceu cantar A Manga Rosa, pois agora arrumo Sou poderoso, posso contratar. E autonomia total para Aracaju, Pra Macaé, para Natal, pra Urucu. Telefonema é o Gabinete do Santana, A proposta é insana, pedi para melhorar. E ao velho tema de gestão, uma banana O ministro, bem sacana, pediu o meu lugar. Alfeu, me arranja a grana Eu sei tocar Bongôôôôô Ôôôôôôôõ Coloque em sua banda, Um diploma de Doutoôôôôr... Foi um sucesso geral. Essa era uma das músicas. Da outra, o pessoal gostava também porque fala do trinta contra trezentos, que eu cantava em dupla, com aquela música da dupla caipira, que chama Nuvem de Lágrimas. Um cantava pela Empresa e outro cantava pelo Sindicato e fazia um dueto. Isso tudo lá embaixo. Mas o negócio cresceu tanto que eu tive que gravar para distribuir para o Brasil, foi uma coisa É, eu fui fazer show na Reduc [Refinaria Duque de Caixas], no Edihb. Foi uma coisa muito engraçada mesmo. Por isso que eu estou falando, o Santarosa me conheceu nessa época.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL [Mudança para Macaé] Foi uma coisa interessante. Isso foi em 1991. Eu estava aqui no Rio, trabalhando na Bacia de Campos. Por que eu fui para a região da Bacia de Campos? Justamente porque eu estava trabalhando com a Bacia de Campos. Começou um negócio chamado descentralização. O pessoal estava reclamando que tudo era centralizado na sede, então todos os campos teriam que ser passados para as unidades e aí começou aquela movimentação. Eu estava com Albacora. Albacora seria passado para a unidade. Meus amigos começaram a ir para Macaé – eu estou falando dos meus amigos porque eles sempre me influenciaram muito. Um foi, o outro foi. Aí, o pessoal ia passar o final de semana lá, via a molecada, todo mundo morando em casa, todo mundo estava com filho pequeno. E, realmente, Macaé é uma cidade interessante para criar filho. Eu fiquei naquela: “vou? Não vou?” Estava naquela de “Albacora vai ser descentralizado, não vai”. Eu falei com a minha mulher.
Aí, teve um tiroteio na porta da creche das crianças, que ficava aqui na Martins Ferreira, em Botafogo – eu morava na Lagoa. Minha mulher foi pegar as crianças lá e teve um tiroteio. Eu falei assim: “sabe de uma coisa? Eu vou para lá.” Fui para lá, mas na mudança, não fui trabalhar com Albacora. Eu falei: “já que eu vou para lá, eu vou mudar de área”. Aí, fui trabalhar na área de planejamento. Foi a minha primeira saída realmente do reservatório, quando eu cheguei em Macaé. Em Macaé eu fui trabalhar com planejamento, mas a minha mulher não gostou. Eu já estava na segunda mulher nessa época. A primeira mulher durou pouco. Eu namorei seis anos, fiquei casado dois. A outra não, namorei seis meses e estou casado até hoje, já tem 21 anos. Os filhos são do segundo casamento.
Então fomos para Macaé, mas a minha mulher não se adaptou por dois motivos: primeiro porque ela era a única reumatologista do local. Ela disse que ela não tinha com quem conversar. As condições de trabalho do Posto de Saúde onde ela trabalhava lá eram horrorosas. O outro motivo foi que o irmão dela – que era o mais próximo – teve um câncer e ela queria vir todo final de semana para cá. Então eu perdia a oportunidade que era quando todo mundo ia para lá, porque a gente morava numa casa na beira da praia, uma casa gostosa, mas a gente ficava sempre fazendo o caminho inverso.
Acabou que ficou um negócio realmente chato. O irmão dela está curado. Foi aquele câncer que o Dílson Funaro teve e que, hoje em dia, é curável, mas naquela época não era. Ele está aí, está trabalhando tranqüilo, mas durante esse tempo, a gente ficou vindo muito por causa dele para cá e acabou que ela não gostou.
COLUNA DO GICO Foi quando houve essa possibilidade de eu mudar de área para a Comunicação. Por quê? Porque quando eu cheguei em Macaé, eu continuei fazendo a mesma coisa. E lá, eu comecei a escrever no jornal da Bacia de Campos. Eu peguei uma coluna de humor. O pessoal já me conhecia, por causa da greve, que já tinha chegado lá. Tanto que eu falei que esse amigo meu lá de Macaé tem o CD das musiquinhas da greve. Eu cheguei lá já mais ou menos conhecido pelo pessoal. O jornal da Bacia de Campos era aquele jornal chapa branca, chato para caramba. Eu falei assim: “ah, vou botar um molho nisso aí.” E aí comecei a escrever na coluna, a Coluna do Gico. Escrevi por quatro anos essa coluna. Eu fiquei dois anos em Macaé e escrevi por quatro anos. Mesmo depois que eu voltei para o Rio, eu continuei a escrever a coluna para o jornal. O jornal era mensal e, por causa dessa coluna, eu fui chamado para trabalhar na Comunicação aqui.
GERÊNCIA DE COMUNICAÇÃO Foi essa coluna que determinou a minha vinda para o Rio, porque a Fátima Franca, que era a editora da Revista Petrobras na época, gostou do meu texto e soube que eu estava querendo vir para o Rio. Ela me recomendou para o Milton Costa Filho, que era o chefe da área de patrocínio na época, dizendo que eu tinha um bom texto. Fiz a entrevista com ele, passei e estou aqui até hoje. Eu sempre quis trabalhar na Comunicação. Então, o que aconteceu? Nessa época, a Petrobras já estava começando o período de revisão constitucional e a Empresa estava tendo que se preparar para a quebra do monopólio. Ela teria que começar a falar com outros públicos, não só com o público interno, como o público de cima. Por outro lado, os concursos estavam proibidos. Desde a época do Collor, não estava saindo concurso para ninguém, então a gente não tinha profissional de comunicação para contratar. Quer dizer, a Petrobras tinha que tirar do próprio corpo dela alguém que gostasse da área. Perguntaram quem queria ir para a Área de Comunicação e eu fui o primeiro a levantar o dedo. Surgiu essa oportunidade de voltar para o Rio. Então juntou a fome com a vontade de comer. Tanto que os primeiros assessores de comunicação da região são todos geólogos e engenheiros: o Zé Francisco, que era lá de Macaé e que me chamou para trabalhar no Jornal da Bacia de Campos, era engenheiro também; o Franklin, lá de Natal, era geólogo. Realmente, não tinha jornalista, não tinha publicitário, que hoje em dia tem. Os concursos voltaram, mas naquela época não tinha. Isso até, de certa forma, me favoreceu.
RESISTÊNCIA Existia uma resistência muito grande dos profissionais de comunicação em relação aos outros profissionais, aos engenheiros de uma maneira geral. Eu senti isso. Mas eu não sofri tanto. Eu não sei se é porque quando eu vim, alguns já me conheciam lá debaixo – alguns poucos que lembravam da greve já sabiam que eu sabia fazer alguma coisa em termos de comunicação, porque eu conseguia segurar algumas pessoas lá embaixo. Então eu não sofri tanto. A Fátima também, que me convidou, era a editora da revista e é jornalista, então ela tinha uma voz ativa ali dentro do grupo, do Sercom.
Então, eu sofri isso mas muito pouco. Eu sei dos outros, que me contavam, do próprio Milton, que era o meu chefe, que é engenheiro também, do Pimentel, que trabalhava comigo, que era engenheiro e estava lá há mais tempo. Quando eu entrei, já sofri menos, mas existia lá uma pressão muito grande. A gente teve que conquistar realmente o nosso espaço. Hoje em dia não existe mais isso não. Hoje em dia, eu acho até que o pessoal acha que os engenheiros têm, vamos dizer assim, uma grande função lá dentro, que é justamente de explicar um pouco o que é a Empresa para a área de comunicação, porque a gente, de uma certa forma, tem trânsito em todas as outras áreas. E um conhecimento mais técnico também.
EXPOSIÇÃO RODIN A primeira coisa que eu fiz foi a Exposição Rodin. Peguei logo um mega acontecimento, já ligado a Patrocínio. Foi meu primeiro projeto. Eu entrei em janeiro de 1995, a Exposição Rodin aconteceu em março de 1995, no Museu Nacional de Belas Artes. Foi o meu batismo de fogo. E foi uma coisa monumental de público. Foram batidos todos os recordes na época, tanto no Rio, quanto na Pinacoteca, em São Paulo. Depois dessa exposição, eu vi que eu tinha encontrado realmente o meu lugar na Petrobras, que essa era a minha praia. Comecei a trabalhar satisfeito. Comprei um relógio porque eu não tinha relógio. Ganhei um relógio no Dia dos Pais e depois ficava reclamando: “poxa, usar relógio para quê? Não serve para nada...” Aí, dessa vez eu comecei a ter realmente o que fazer e tive que comprar um relógio.
COORDENADORIA DE PATROCÍNIO Naquela época existia um setor que cuidava de publicidade e outro que cuidava de patrocínio e promoções – feiras, exposições e patrocínios. Os patrocínios não tinham um setor definido. Aí, na primeira reformulação que eu peguei lá, a área de publicidade se juntou com a área de patrocínio e virou a Coordenadoria de Patrocínio – COPAT. Eu comecei a ter uma supervisão, era uma coisa informal, sob a Área de Patrocínio. Não era remunerado. Eu era substituto do chefe, que era o Milton. Naquela época, o substituto ganhava se o chefe viajasse. Hoje em dia não ganha mais. Mas, de qualquer maneira, era uma graninha que entrava. O Milton viajava muito, eu ainda conseguia pegar um extrazinho. A gente ganhava muito pouco na época. Eu entrei em 1995 e a COPAT, se não me engano, foi criada em 1996, quando juntou com publicidade. Quando houve essa junção, eu estava mais ou menos com essa chefia entre aspas da parte de patrocínio – que não existia de direito, mas existia de fato. Existia um outro que estava na parte de publicidade, que era o Carlos Vitor. O Carlos Vitor foi convidado para ir para o Abast, largou e o Milton me colocou lá, na Publicidade, que foi onde eu sempre quis trabalhar, desde moleque. Eu descobri que aquela era a minha vocação, eu queria trabalhar em criação publicitária. Aí, eu vi que era isso. Então, eu gostei muito de ter ido para a Área de Publicidade também. Eu já tinha encontrado o lugar, “é aqui que eu quero ficar”, em comunicação. Quando eu fui para a publicidade, eu falei assim: “eu não saio daqui nunca mais”. Então, Publicidade e Patrocínio são coisas muito próximas para mim. E fui tocando esse barco.
GERÊNCIA DE PATROCÍNIO BR Realmente, o salário estava muito aviltado. Eu estava ganhando muito pouco e a minha mulher é funcionária pública, é médica do Inamps. Eu estava comprando apartamento, meus filhos estavam na escola, e escola tem que ser particular, morando na Barra – contra minha vontade porque minha mulher trabalhava em Jacarepaguá – tudo era longe, tudo era caro, tinha que ter dois carros, dois seguros, dois isso, dois aquilo e não estava dando. Até que eu fui convidado para uma gerência fora da Comunicação – não sei nem como era o nome – para ser chefe da comunicação do E&P [Exploração e Produção] ou algo parecido. Eu ia ganhar uma graninha a mais que dava, pelo menos, para pagar a escola das crianças. Aí, eu falei para o Ricardo, que já era o chefe: “olha, bye,bye. Gosto muito daqui, mas tchau Lá estão me pagando mais umas oitocentas pratas para eu ir embora e isso está pesando no bolso.” Na hora que eu disse que ia sair, me ofereceram a Gerência de Patrocínio lá. Aí, eu falei: “então, eu fico”. Me ofereceram a Gerência de Patrocínio e eu fiquei lá.
POLÍTICA DE PATROCÍNIO BR A política de patrocínio, quando eu entrei lá, não existia. Só existiam algumas definições. A gente não podia patrocinar carnaval – eu até estranhei a história da Mangueira esse ano – nem nenhum evento religioso, como por exemplo o Círio de Nazaré. Todo ano, o pessoal de Belém pedia, mas tinha uma norma que a gente não podia fazer. As definições eram sempre “não pode”, nunca eram do tipo “nós temos que fazer”. Não tinha uma diretriz positiva. Tinha as orientações para não fazer. A verba de patrocínio era muito inferior ao que existe hoje. Ainda não existia Lei de Incentivo. A Lei Rouanet veio depois. Existia a Lei Sarney, que deu origem à Lei Rouanet, mas era uma coisa com que pouquíssimas empresas sabiam lidar. A área tributária da Petrobras desconhecia completamente isso, nós tivemos que explicar tudo, nós tivemos que aprender tudo, botar especialista na área para poder conversar com o pessoal do tributário da Petrobras. E foi justamente uma menina que saiu do tributário, a Claira Floret – que veio de lá para a Comunicação – que conseguiu ser a interlocutora desse público e conseguiu organizar a parte do incentivo fiscal.
Com isso – com a Petrobras dando lucros absurdos e com a Lei Rouanet, que permite usar quatro por cento do Imposto de Renda devido –, quanto maior o lucro, maior o imposto de renda, conseqüentemente, maior a possibilidade de utilização do incentivo. Também com a Lei do ICMS nos estados, a Claira foi lá e participou da implantação de alguns projetos. A Lei do Ceará, por exemplo, foi ela quem implantou nos moldes do “Faz Cultura” da Bahia.
Então, a parte de cultura da Petrobras, particularmente cultura dentro do patrocínio, foi crescendo muito. E a Petrobras ajudou muita gente, inclusive com o knowhow que ela adquiriu ao longo do tempo, principalmente da Claira, que foi abrindo esses espaços em vários lugares.
PROJETOS PATROCINADOS Eu tenho grandes amigos que fiz no Patrocínio. O Rodrigo Pederneiras e a turma dos Pederneiras são ótimos. O pessoal do Grupo Corpo é maravilhoso. Eu até hoje vou para Minas e fico sempre na casa de um deles lá, do Pedro, que é diretor de palco, ou do Paulinho Pederneiras, que é o geral, que ilumina, ou do Fernando Veloso, que não é Pederneiras, mas podia ser, da Mirinha. Eles são ótimos. Além do pessoal do Grupo Corpo tem o pessoal do Grupo Galpão.
Eu sempre falo que eu devo ter algum pé em Minas. A família da minha mulher é mineira, mas eu mesmo deveria ser. Acho que Minas é meio a cara do Brasil, meio a média do Brasil inteiro, então eu me sinto muito bem lá. A comida mineira é maravilhosa e a hospitalidade mineira também.
Então, tem o Grupo Corpo, o Grupo Galpão, o Ivaldo Bertazzo – o projeto que ele fez com a Maré foi espetacular. Foi um projeto que começou em São Paulo. O Ivaldo era amigo do Henri Philippe Reichstul que foi presidente da Petrobras. O Philippe, inclusive, participava do grupo dele lá em São Paulo. Quando eu fui ver o espetáculo que ele tinha feito com a Marília Pêra e com o Quinteto Violado, na época, eu fiquei particularmente impressionado. E ele queria vir para o Rio fazer uma outra coisa. Ele queria trazer o Grupo do Belenzinho, que é um bairro da periferia de São Paulo, com a turma da população de baixa renda. Ele queria vir para o Rio. Eu falei assim: “Ivaldo, por que você não trabalha com a turma da Maré, já que a Petrobras trabalha com a Maré por causa do Cenpes – Centro de Pesquisa da Petrobrás?” Ele pegou aquilo do nada, do zero, levantou e fez um espetáculo maravilhoso, o primeiro dele, que foi o “Mãe Gentil” ou “Folias Guanabaras” – eu troco o nome do primeiro e do segundo. Mas ele fez esses dois espetáculos com a Maré. Esses projetos aconteceram enquanto eu estava lá, eu era Gerente de Patrocínio nessa época. Assim como o contrato com o Grupo Corpo foi assinado quando eu estava lá, o contrato do Galpão também. Eu guardo essas lembranças com muito carinho e é muito bom saber que eu saí de lá mas eles continuam. A Flautista da Proarte também foi da minha época, não de quando eu era gerente, mas quando eu ainda trabalhava como gerente informal, entre aspas, do patrocínio. Foi uma época muito boa trabalhar no Patrocínio. Sempre foi a minha praia, tanto o patrocínio quanto a publicidade. Mas aí, por conta de incentivo fiscal, eu acabei brigando com o Alexandre Machado, que foi o homem do “Petrobrax”. Tive uma briga com ele. Eu brigo bem também Teve uma complicação que eu acho que não cabe contar aqui porque a história é longa para caramba.
PUBLICIDADE Eu fiquei dois anos e meio na Gerência de Patrocínio. Acabei saindo do Patrocínio e fui para a Publicidade. Fui tocar a conta da DPZ. A DPZ era uma das agências que trabalhavam com a Petrobras na época. Era a Propeg, que virou, a DPZ e a Contemporânea. Hoje em dia na Petrobras está o Duda Mendonça, a F/Nazca e QAQ. A DPZ está comigo na BR. Lá na BR está a Fischer e a DPZ. Mas nessa época eu fui tocar a conta da DPZ. E foi ótimo. A DPZ fazia publicidade regional. Eu deixei de ser gerente, mas foi ótimo.
A minha alma é de peão mesmo, eu não tenho muito jeito de chefe. Então, eu voltei a ser peão, conheci um pessoal ótimo lá da publicidade também. É a área que realmente eu mais gosto. Se eu tivesse que começar a minha vida, se eu tivesse 17 anos para escolher uma faculdade, sem dúvida, eu ia ser publicitário, ia trabalhar na parte de criação publicitária. Eu tenho que me policiar para não dar palpite, porque o pessoal da criação é fogo. O cliente criativo é um problema para eles. Eu sempre fico me policiando, porque eu sempre acho que eu faço melhor do que eles. Mas eu me dou bem com todo mundo da criação, porque eu respeito isso. Justamente porque eu faço as minhas, eu respeito as deles.
ÓPERA Atualmente eu resolvi parar um pouco com essas minhas produções. A última coisa que eu fiz pela Empresa foi uma ópera. Eu fiz a Ópera do Fantasma da Monarquia, que era baseado um pouco no Fantasma da Ópera. Foi na época que o E&P [Exploração e Produção] se juntou. Porque era um absurdo a gente ter departamento de perfuração, departamento de produção, departamento de exploração, todo mundo disputando a mesma sonda. Era um absurdo Eu escrevi sobre esse negócio. Teve um “paper” que eu escrevi – criticando isso aí – que rodou o Brasil inteiro. Chegou até o João Carlos, o diretor. Eu falei: “um dia ainda vou ser demitido por causa dessas bobagens”
LIVROS / O RABO DO BOOKMAKER Aí eu escrevi uma ópera. Foi a última coisa que eu fiz de brincadeira corporativamente. Depois fui trabalhar por minha conta. Quando eu estava ganhando pouco, eu me reuni com a minha mulher na varanda – estava tomando um uísque e ela tomando cerveja, porque ela não gosta de uísque – e eu falei assim: “a gente precisa fazer mais”. Porque meu pai estava começando a pagar a escola de um dos filhos. Eu falei: “poxa, eu só sei escrever. Então,
vou escrever.” Aí, escrevi um livro. Escrevi o “Rabo do Bookmaker”, que foi a minha primeira produção, de1998. Eu sempre brinco que eu vendi mais do que o Nelson Motta. Eu lancei esse meu livro no espaço Unibanco de Cinema – o Ademar ainda estava junto com o pessoal da Estação, nessa época – e eu vendi 217 livros no lançamento. Então, eu paguei a minha parte. Eu investi quatro mil reais no livro. A editora entrou com quatro mil e eu com quatro mil. Eu paguei tudo no dia do lançamento. Eu ainda ganho um dinheirinho com ele de vez em quando.
LIVROS / OURO E ESTRELAS: O ITINERÁRIO DE BRITO Em 2000, lancei outro e, em 2002, outro livro. O de 2002 eu já recebi também. Em 2000, eu lancei o “Assassinato sem memória”. E em 2002 já foi diferente. Uma pessoa – o Waltinho, que trabalha no Centro Cultural do Banco do Brasil, é meu chapa – leu o meu livro e ele tinha um argumento dele. Ele trabalhou numa época como fotógrafo numa pesquisa sobre o caminho do ouro do século dezoito. A historiadora morreu e ele queria retomar aquilo porque ele tinha um material bom e tinha conseguido alguns documentos. Ele queria fazer uma coisa romanceada. Ele tinha gostado do meu texto então me passou o argumento e eu o desenvolvi. Então, com esse aí, eu consegui ganhar uma graninha. Ele queria que transformasse em filme. Chama-se “Ouro e estrelas: o Itinerário de Brito” que é o nome do documento. O Brito é um cartógrafo. Por isso que tem estrelas, por causa de posicionamento.
Então eu escrevi o roteiro para cinema e depois ele quis que eu lançasse um livro. O Mauro Farias se interessou pelo filme, mas é um filme caro – seis milhões – é muito dinheiro. Filme de época é sempre mais caro. Está em fase de captação ainda. E então eu escrevi o livro. Eu fiz o inverso: escrevi primeiro o roteiro, depois eu escrevi o livro para ficar mais fácil do pessoal vender a história. Então, com esse aí eu já ganhei um dinheirinho para fazer.
LIVROS / AMOR ISÓSCELES Eu tenho uma propriedade que é a seguinte: eu sempre fecho as editoras que publicam os meus livros. Eu tenho três livros, em três editoras diferentes, e elas sempre fecham as portas. Acho que é por isso que eu estou tendo alguma dificuldade em conseguir a quarta editora. O livro é o “Amores Isósceles”. Eu queria botar “Triângulos Isósceles”, mas assim ele ia parar numa prateleira de geometria Está prontinho, eu estou em negociação com algumas editoras. Vamos ver se sai no ano que vem [2005].
Então agora eu passei a escrever mesmo. Eu tenho um detetive, o Amilcar Mesquita, que participou do “Rabo do Bookmaker”, que é passado em 1956. Depois, no “Assassinato sem memória”, ele tem 58 anos e a história se passa em 1983. Ele já está aposentado e vai ajudar uma neta. Ele já é meio um detetive particular e não da polícia, antes ele era da Delegacia de Homicídios. E agora, no “Amores isósceles”, é uma volta dele, a entrada dele na Polícia. A história se passa entre 1922 e 1931. Eu gosto muito de ir para a seção de periódicos da Biblioteca Nacional e ficar lendo Última Hora, Correio da Manhã, Jornal do Brasil. Ler jornal velho é uma delícia. Eu fiz a pesquisa antes de ir para a BR. Agora não tenho tempo.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL No momento, eu estou trabalhando demais. Estou precisando de um tempinho realmente para fazer essas coisas. As brincadeiras, agora, são mais de improviso. Desde que eu comecei a escrever, estou canalizando a minha parte criativa para os meus livros mesmo, porque eu acho que eu ainda vou viver disso. Eu cumpri a minha parte, que era de lançar um livro a cada dois anos. Quando eu me aposentar, eu sei que eu vou virar escritor. Escritor eu já sou, não é? Agora tenho que viver disso. Eu digo sempre que, pelo menos, eu vou economizar a passagem. Posso escrever em casa, então eu vou ganhar o dinheiro da passagem, da gasolina, vou almoçar em casa, vou economizar, então esse vai ser o meu salário de escritor. Vou fazer uma excursão, uma vez ou outra, ao centro da cidade, na Biblioteca, uma vez por semana, entro de manhã e saio de noite, vejo os amigos... Mas ninguém me pega. Quando eu puder me aposentar, eu vou embora, vou virar escritor
PETROBRAS DISTRIBUIDORA Eu fui para a BR por dois motivos: primeiro, porque eu sou amigo do Wilson Santarosa e depois porque eu sou amigo do Rodolfo [Luiz Rodolfo Landim Machado], o Presidente. O Santarosa me conhecia da época das músicas. Ele negociava com as pessoas e eu ficava lá embaixo. Então, ele já me conhecia dessa época. Quando ele virou Gerente de Comunicação, entrou e me viu, falou assim: “pô Você aqui?” E o Rodolfo é da minha turma, fez engenharia comigo, entrou na Divisão de Reservatório. O Rodolfo estava entrando na área também.
A gente estava na época em que se buscava a unificação. Porque no tempo do Presidente da BR Luis Antonio Viana, a BR partiu para a carreira solo. Eles saíram, quiseram a independência, começaram, inclusive, a assinar como BR Distribuidora, a mudar a marca e tudo. E como a gente estava promovendo justamente a integração, a Petrobras estava no momento de fechar o capital da BR mesmo, como fechou depois. Então, o Santarosa apresentou para o Rodolfo três nomes. O meu era o primeiro. Ele falou assim: “eu fico logo com o primeiro porque esse é meu amigo, fez engenharia comigo”.
Eu conheci o Rodolfo no terceiro ano da faculdade, ele se formou comigo. A gente entrou junto na empresa, fez esse curso da Petrobras no Rio, o CERAF – Curso de Engenharia de Reservatórios e Avaliação de Formações – , e foi trabalhar na mesma Divisão que eu. Só que eu trabalhava no Sebae, que era Bahia e Espírito Santo, e ele trabalhava no Senord, que era Norte e Nordeste, mas era no mesmo corredor, uma sala do lado. Então eu fui convidado para ser Gerente Executivo de Comunicação. Na época, chamava-se Gerente Nacional de Comunicação e Marketing, quando o marketing estava dentro da Comunicação e eu achava que não tinha nada a ver. A Comunicação é uma das pernas do Marketing. O marketing fixa preço, dá posicionamento de produto, o que a gente não faz lá dentro. A gente faz comunicação. Então, tinha parte da comunicação que estava fora, aí eu trouxe, e tinha a parte do marketing que estava lá dentro e eu entreguei. Quando o Rodolfo foi para lá, ele já promoveu uma reestruturação e nós ficamos só com comunicação. Mas a comunicação está fazendo tudo o que é comunicação: está fazendo marca, está fazendo pesquisa. Tudo o que serve para a comunicação hoje está sob o guarda-chuva da Comunicação. A parte de marketing foi toda para fora. Hoje em dia, o meu título lá é de Gerente Executivo de Comunicação.
PATROCÍNIO / PETROBRAS DISTRIBUIDORA A BR tem vida própria só na parte comercial. Tanto que, quando o Rodolfo me chamou para ir para lá, falou assim: “olha, Gico, nós vamos trabalhar aqui dentro dos limites da ‘Lei Rouanet’, que a gente pode usar, mas o institucional tem que ficar ligado à holding. Nós aqui vamos vender gasolina, vender lubrificante, isso é que nós vamos fazer”. Isso também já tinha sido combinado com o Santarosa, tanto que a Petrobras Distribuidora entrou junto com a Petrobras no primeiro Programa Petrobras Cultural. Eu faço parte do Conselho do Programa Petrobras Cultural, a Ana Dulce também. A gente tem uma área de patrocínio lá dentro, mas o orçamento é muito inferior ao da Petrobras e muitíssimo inferior também ao que ela fazia até 2002. Porque não tinha sentido, a mesma marca ficar competindo uma com a outra. Desde que eu entrei lá está assim. Por exemplo, quando a gente passa e vê aquele “Café Odeon BR” é porque isso é um contrato antigo da BR que vai até 2007. Porque a marca é a mesma, então não tem por que.
O que a gente faz lá, hoje em dia, é utilizar a mão-de-obra da Petrobras Distribuidora para tocar projetos feitos com recursos da Petrobras. A gente entra como interveniente, a gente dá até um pouquinho de recursos – para a gente poder ter alguma rédea em cima do projeto – mas é um projeto bancado pela Petrobras. Porque a Petrobras tem condições de dar 97 milhões de reais de Lei Rouanet. Nós temos direito – devemos ter agora nesse ano – a cerca de cinco milhões, seis milhões. Então, é uma disparidade absurda. A Petrobras Distribuidora trabalha com uma margenzinha desse tamanho. Enquanto a Petrobras tem um lucro enorme – você viu o preço do petróleo e quanto é o preço de produção. Então, a margem deles é desse tamanho e a nossa margem é pequenininha. Porque o lucro que a Petrobras tem é absurdo e o que nós temos é muito pequeno.
A gente está trabalhando junto e estamos usando os nossos recursos prioritariamente para fazer propaganda, para trabalhar óleo, para trabalhar gasolina, para trabalhar diesel. Então, nós estamos usando o dinheiro da comunicação para isso. E usando aquela nossa pequena verba de “Rouanet” – temos mão-de-obra especializada que nós formamos porque ajudamos o cinema nacional por muito tempo, chegamos a investir 40 milhões de reais em cinema no ano sem poder, podendo usar só quatro milhões de dinheiro vivo. Isso só a BR - naquela época que eu falei que a BR saiu sozinha, a época do Luis Antonio Viana.
Na época do Júlio Bueno, a gente já começou a voltar – inclusive o Júlio Viana é do quadro da Petrobras –, reunificaram as marcas, mas, vamos dizer assim, o casamento total mesmo foi quando eu fui para lá. Eu não, foi quando o Rodolfo foi para lá. O Rodolfo já veio com esse discurso, já combinado com o Santarosa e, a partir disso, desde o primeiro Programa Petrobras Cultural que nós estamos lá juntos. Não tinha a menor razão de ter essa divisão. Aos olhos do consumidor – estive agora fazendo uma pesquisa, olhando um grupo de pesquisa no Rio Grande do Sul – ele não vê a menor diferença. É você gastar um dinheiro à toa, à toa.
COTIDIANO DE TRABALHO Eu tenho pouquíssimo tempo. Primeiro por causa desse inferno que se chama e-mail. Todo mundo manda e-mail para você e acha que você não viaja ou que você tem que levar o laptop para tudo quanto é canto. Então, já é uma desgraça peneirar o e-mail. Você tem que dar uma peneirada para ver em quais que você vai entrar. Tem uns que você nem entra, já deleta direto, tem outros que você deixa para depois e quando você vai ver, tem e-mail de seis meses que você nem abriu e que você não jogou fora quando devia. Mas, a primeira coisa que eu faço lá é ler o clipping.
O meu clipping chega e eu tenho que olhar tudo o que acontece com a BR, se a BR saiu bem ou se saiu mal. Eu dou aquela minha peneirada e já começa aquela batida de reunião aqui, reunião ali.
Eu tenho lá a Área de Propaganda. Na Área de Propaganda eu tenho a Área de Pesquisa e uma Área de Marca, debaixo da Área de Propaganda, como coordenadoria. Eu tenho a área que a gente chama de Planejamento de Comunicação, tem a parte de Esporte que está ali por um casuísmo, porque o menu que cuida do Esporte é do Planejamento também e ficava mais fácil, porque o nosso patrocínio está muito voltado para a cultura. Então, a gente deixou, provisoriamente, o Esporte dentro da Área de Planejamento. Tem a Área de Comunicação Interna e a Área de Imprensa. A Área de Responsabilidade Social é pendurada diretamente na Gerência de Comunicação também.
Depois que eu acabo de dar a minha peneirada no e-mail e ler o clipping, eu começo realmente a ter uma reunião atrás da outra e não pára mais. É todo mundo querendo fazer uma coisa, outros fazendo outra. A comunicação, hoje, realmente tem que trabalhar para toda a Empresa, não tem jeito. Hoje em dia a gente é prestador de serviço mesmo. Pouquíssimas coisas saem da nossa cabeça lá. Então, a gente trabalha para as áreas comerciais principalmente. Então, a Área de Propaganda e a Área de Patrocínio estão atrás da Área Comercial, mesmo a de patrocínio, para a gente fazer uma promoção aqui, uma promoção ali. Mas lá a gente trabalha basicamente para Área Comercial e depois para as áreas meio. A gente está ali para prestar serviço hoje, só. Só, não, mas durante 95 por cento do nosso tempo, estamos ali para prestar serviço para as outras gerências. E para a Petrobras também. A gente troca muita figurinha. Estou muito contente. É o meu exílio dourado. Eu até demoro menos tempo para chegar em casa.
TROTE Agora mesmo, teve um encontro da Comunicação que eu dei um trote na turma de lá. Um trote, mas foi “do bem”. É porque eu detesto consultor de RH. Não sei, acho que por causa desse negócio de mandar esticar, gritar, essas coisas assim. Nunca viu esses consultores de Rh, não? Eles acham que toda turma é igual, então falam: “ah, eu estou sentindo que vocês têm que, de vez em quando, fazer alguma coisa, se soltar, estão muito tensos...” Só que o pessoal de comunicação é muito mais arejado e brinca mesmo, eu, particularmente. Eu sempre vejo que eles estão repetindo o mesmo discurso para todo mundo. Eles pegam um público, pegam outro e não vêem a diferença realmente. E, aí, repetem. Então eu disse que tinham me chamado a atenção porque eu estava mexendo muito com o pessoal, então, tinham me dado uma tarefa que era a de representar o papel deles. Botei o pessoal para recortar figurinha, fazer colagem, essas coisas. Depois eles viram que era um trote mesmo. Foi bom.
PROJETOS MARCANTES Eu vou falar de dois projetos. Eu vou falar do Lecuona, esse ano, do Grupo Corpo, que eu achei espetacular. Não sei se vocês viram. E eu vou falar do Ivaldo também, do Dança das Marés. Foram dois projetos realmente emocionantes. O Lecuona, porque eu já conhecia o trabalho do Grupo Corpo, até fiz a maior força para a gente patrocinar justamente porque eu conhecia o trabalho, desde a época em que a Shell patrocinava eles. O Grupo Corpo é fantástico. Mas o Lecuona é completamente diferente de tudo que o Grupo Corpo já fez. E foi legal porque eu já conhecia, eu ganhei o CD antes, eu fui à fazenda do Rodrigo no ano passado. Na época, eles estavam fazendo a coreografia do Lecuona. Então, o Rodrigo foi me explicando e eu fui ver o iniciozinho, quando ele estava começando a fazer os pas-de-deux. Eu fui lá, saí da fazenda dele e fomos para o ensaio, direto da fazenda lá para a sede. Ou seja, eu vi o Lecuona nascer. E, realmente, quando eu vi primeiro em São Paulo, no Teatro Alfa, já achei “desbundante”. Quando eu vi no Municipal, então... É lindo e aquelas bailarinas são maravilhosas. Eu brinco muito com a Paulinha, aquela hora que ela sai chutando o cara, que ela sai rolando, eu brinco muito com ela. O pessoal do grupo é muito legal.
E o pessoal baba com o que o Ivaldo conseguiu fazer com aquela molecada da Maré Não é “bonitinho”, não, é altamente profissional. Ele bota aquela molecada para dançar que é uma coisa impressionante. Tanto que o pessoal do Grupo Corpo trabalha com ele, com o Ivaldo. Mesmo porque o Ivaldo já escreveu coreografias para eles, no início do Grupo Corpo. E também porque a ensaiadora do Corpo, a Macau – Maria Carmem Purri - trabalha sempre com o Ivaldo, o Paulinho Pederneiras sempre iluminou para o Ivaldo, o Pedro Pederneiras sempre fez a iluminação também. Ou seja, a qualidade dos grupos é muito boa e eles são muito exigentes. Eu só fico com pena de não ter falado do Grupo Galpão.
LAZER Eu adoro jogar bola, até hoje. Eu estou completamente acima do peso justamente porque eu estou com o joelho prejudicado pelo futebol. E cada vez mais. Cada vez demora mais para voltar, cada vez eu engordo mais, cada vez o joelho fica pior. Então, agora é um círculo vicioso mesmo. Mas eu adoro jogar bola. Quando eu ficar bom... Ontem mesmo, eu fui ao ortopedista, ele pediu uma ressonância magnética. Eu estou com um problema no ligamento colateral. Ele disse que eu vou demorar umas oito semanas para voltar. Mas eu vou voltar, em oito semanas. É isso que eu faço, quando eu posso.
Meu filho joga futebol muito bem e minha filha também joga bem. Ela tem 14 anos, joga tudo bem, ela nasceu para fazer esporte. Então, eu gosto muito de brincar com eles, desde cedo, adoro ficar com eles – com o Tomás, de 17 anos, e a Clarinha, a Clara, que tem 14. A minha mulher é a Bebel, Maria Izabel. Estou casado há 21 anos. Eu me dou muito bem com meus pais também. Eu vou muito na casa deles. Meu pai tem um ótimo papo.
Eu adoro política. Eu sempre falo que a minha novela é a página três do Globo, eu adoro ler coluna, eu adoro a Dora Kramer, Franklin Martins. A minha novela é isso: PMDB entra no Governo, não entra... Acho muito bom. Acho que a Suíça não ia ter graça nenhuma, se eu fosse ler um jornal suíço. Você pega um jornal brasileiro e vê aquelas caras, o Michel Temer... Não dá para levar a sério. Então, eu acho uma coisa maravilhosa. Política no Brasil é muito divertido, entendeu? Tem problema de corrupção, tem um monte de problemas, mas que é divertido é. Eu não sei como as pessoas vêem novela. É muito melhor esse teatro que as pessoas fazem por aí. Mas eu gosto de ver esse negócio com o espírito crítico, participei ativamente para a derrubada do Collor, dei a minha contribuição. Eu acho que a gente tem que zelar, realmente, por um comportamento ético muito grande, mas com bom humor. Eu adoro ler o jornal Eu sempre disse que eu me sinto analfabeto sem óculos por causa disso, porque eu olho para o jornal, fico doido para ler aquilo tudo e não consigo, só consigo ver as manchetes.
LEITURAS Então, o que eu gosto de fazer é ler, eu leio muito, tudo, romance, jornal principalmente. Eu não gosto muito é de poesia. Eu não tenho nada contra, não, é que eu acho que quando a gente começa a gostar, acaba. Livro de contos me confunde um pouco, eu tenho que ler um por dia. Tinha uma época que eu levava conto para o avião, para ler um aqui, outro lá. Mas eu gosto de ler corrido, tanto que o meu autor predileto é o Érico Veríssimo, que escrevia livros enormes. “O Tempo e o Vento”, adorei esse livro, é daqueles que levam duzentos anos para gente ler e não acabava nunca, acho muito bom. Eu li também Guerra e Paz. Adorei. Por isso que eu não gosto muito de conto. Mas eu gosto de escrever. Eu ainda vou fazer um livro grandão quando eu tiver tempo. Eu sou meio ansioso para acabar logo. Mas meus livros têm sido de duzentos e cinqüenta páginas, por aí. Eu ainda vou fazer um de mil, quando eu tiver tempo.
SONHOS Já realizei dois sonhos, porque eu fiz um golaço no Maracanã. Eu já joguei no Maracanã duas vezes. Joguei no ano passado, quando eu ganhei do Rodrigo Santoro. Eu até brinco com a minha filha, porque o Rodrigo Santoro é magrinho, tem um abdômen bem definido. O meu também é bem definido: para frente, eu defini com ele que ele seria para frente. Mas então teve um jogo de artistas, por causa do Festival de Cinema – jogo de artista contra patrocinador –, eu entrei e ganhei dele. Mas nesse ano, eu fiz um golaço no Maracanã. E está gravado, depois se você quiser eu te mando. Foi quatro a quatro e eu fiz três gols. Então, esse foi um sonho.
Agora, um sonho pessoal – lógico que todo pai sonha que os filhos sejam felizes, que tenham netos muito sadios, bonitos e que gostem muito do avô – é realmente viver de literatura. Isso, para mim, já um é sonho enorme, sabe? Conseguir viver de literatura num país em que oito por cento das editoras fecharam no ano passado e ninguém vê. Eu acho que isso já é um sonho, em termos profissionais, muito grande.
Mas além disso, eu tenho um monte de sonhos, mas muito voltados para o país, para a distribuição de renda, aquele sonho como cidadão. Eu acho que se eu consegui realmente me manter é porque eu nunca liguei muito para dinheiro, porque o que eu gosto mesmo é de futebol, de ler. Eu não quero ter Ferrari nem quero ter coisa nenhuma. Eu me divirto muito com os meus amigos, com a minha família, com a minha mulher, então, eu me divirto com muito pouco dinheiro. O que eu gostaria de desejar para o país era uma distribuição de renda, pelo menos, aceitável e, para os meus filhos, que eles fossem felizes. E o meu sonho particular, que eu acho que já é muita coisa se eu conseguir atingir, é viver de literatura.
PARÓDIA AO FLAMENGO Eu vou cantar a música do Flamengo porque é do meu time. Sobre a música – eu estava falando aqui enquanto trocavam a fita –, o Ciro Garcia não me pagou direitos autorais e estava cantando na greve do Banco do Brasil a mesma música. Mas tem tempo, ele já saiu do Sindicato dos Bancários. A do Flamengo é rápida. O Flamengo me aborrece agora. Antigamente só me aborrecia quarta e domingo. Hoje em dia, ele me aborrece todos os dias porque agora eu sou gerente do contrato do Flamengo. Bom, essa é a paródia do Hino do Flamengo:
Pelego, pelego, coloca o crachá. Pelego, pelego, vai logo trabalhar. Não vou ser pelego, nunca pelego, pelego tem que obedecer.
O seu maior prazer é o saco puxar, o ovo lamber, o chefe agradar. Você, você, você não vai ser pelego e nós vamos vencer. Burocrata de gravata quer mamata, sempre acata a decisão do seu patrão. Dedicado, apegado é convocado pro outro lado que conduz, que não produz. Eu teria um desgosto profundo se passasse outro cheque sem fundo. Tenho filho, tenho filha, a família reclamou: Pelego com você, não vou.
Faço sempre música por encomenda. Hoje em dia, eu não sento para fazer. Isso aqui é tudo encomendado: “faz uma música para isso aí...” Eu faço. Eu sento e faço, mas por encomenda. Precisando, eu faço.
PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS Gostei muito [de participar do projeto]. Eu soube pela Miriam Figueiredo – inclusive o Luciano Figueiredo, o marido da Miriam, foi o meu consultor para o livro do século dezoito, o “Ouro e Estrelas”. Então, quando eu soube que ia ter isso, eu falei: “olha, eu tenho um monte de coisa para falar, se quiser...” Ela disse: “eu vou te procurar.” Mas eu gostei muito. Essa foi uma iniciativa que eu reputo como uma das melhores dos últimos tempos da Petrobras. Vocês estão de parabéns. Eu quero ver agora o resultado disso aí, como vocês vão conseguir divulgar isso tudo, se vai ser uma coisa que vai ficar escondida ou se vão conseguir realmente levar esses depoimentos todos para o grande público.Recolher