Depoimento de Ângela Cristina Cancian de Jesus de Andrade
Entrevistada por Marcia Trezza
Sorocaba, 13 de dezembro de 2018
Entrevista número PCSH_HV670
Realização: Museu da Pessoa
Revisado e editado por Bruno Pinho
P/1 - Ângela para a gente começar vai pedir para você falar de novo seu nome completo, a cidade que você nasceu e a data de nascimento.
R - Eu sou Ângela Cristina Cancian de Jesus Andrade, um nomão, eu nasci em Campo Grande, Mato Grosso do sul, sou mato-grossense, nasci no dia 05 de maio de 1978.
P/1 - Você pode me falar um pouquinho dos seus pais, dos seus avós, como era, de onde vieram à origem da sua família.
R - Por parte da minha mãe a minha família é de origem italiana, meu avô veio da Itália, veio pequenininho, e chegando aqui o pai do meu avô, acabou se distribuindo com os irmãos dele. Então, o pai do meu avô e o meu avô foram para a região de Mato Grosso, por antes era Mato Grosso, depois que ficou Mato Grosso do Sul. E meu avô conheceu a minha avó que era filha de italianos, mas nascida no Brasil e se casaram e tiveram vários filhos doa quais seis vivos, hoje já não mais, e seis viveram, e teve a minha mãe. A minha mãe, das mulheres ela era a filha mais nova. A minha mãe é uma mulher linda por dentro e por fora, sempre foi, ela sempre foi muito linda. Ela era uma pessoa super tímida, e assim, como na sua época, ela não teve muita oportunidade de estudar, então, ela estudou só até o 4º ano ou 4ª série e meu avô colocou ela para fazer costura, ela ajudavam em casa, eles tinham uma vida bem difícil, mandava minha avó lavar roupas para fora.
P/1 - Seu avô era alfaiate?
R - Não, meu avô trabalhava em uma fábrica com máquinas de fazer macarrão, ele trabalhava com massa italiana e ele perdeu um dedo na máquina, na época. E minha mãe nasceu em Campo Grande, morou sempre em Campo Grande. E meu pai não, meu pai nasceu em Cuiabá, e sua família depois de um tempo foi para Campo Grande, meus avós e lá eles se conheceram.
P/1 - E a família do seu pai, veio de algum outro lugar? Fora Cuiabá?
R - A família do meu pai, tem uma origem indígena, uma parte da família, mas todos eram do Brasil, mesmos, de, sei lá, acho que bisa, ou tataravô, tinha alguém lá que era indígena que a gente sabe. E eles foram de uma parte da família, até hoje tem, as tias, tem uma tia avó viva, em Cuiabá, mas eles saíram de Cuiabá, minha avó e meu vô já casados e foram morar em Campo Grande. E lá meu pai conheceu a minha mãe. E é um barato assim, por que minha mãe era tímida, quieta, uma menina super tranquila, e meu pai eram bravo, super ciumento, e hoje é completamente a contrário. Meu pai hoje é um sossego em pessoa, meu pai tem 73 anos hoje, e minha mãe tem 67, e minha mãe é super assim, uma mulher muito firme, muito guerreira, com a gente ela é brava, muito amorosa, mas assim, muito firme. É um barato por que quando eles contam, “nossa que inversão.” E eles se casaram, eles se casaram no ano de 1970, moravam em Campo Grande Mato Grosso do Sul, meu pai é militar, hoje ele é da reserva já faz um bom tempo, e minha mãe ela é do lar, eles tiveram a minha irmã, que nasceu, a primeira filha, em 1970, minha irmã que se chama Alessandra. E em 1972 eles tiveram a segunda filha deles que é a minha irmã que se chama Marcia e depois eles achavam que não teriam mais filhos, até que eu nasci em 1978.
P/1 - E sua mãe, qual o nome dela?
R - Minha mãe se chama Norma.
P/1 - Norma? E sobrenome?
R - Norma Cancian de Jesus.
P/1 - E seu pai?
R - Ismael Rodrigues de Jesus.
P/1 - Você pode contar para gente um pouco da sua convivência com seu pai, com sua mãe, que memórias você tem de quando eram crianças com eles?
R - Acho, que assim, a convivência sempre foi maravilhosa, meu pai é um poço infinito de amor, eu sempre digo assim, que Deus deixou alguns representantes especiais aqui na terra, algumas pessoas diferenciadas para ainda lembrar que Deus está aqui, para mim meu pai é uma dessas pessoas.
P/1 - Eu perguntei, você descreveu seu pai um poço de amor, uma pessoa muito... E perguntei assim, como que isso aparecia para você? Que situações, o que ele fazia, para você concluir isso?
R - Na verdade os dois sempre foram, mas meu pai ele é diferenciado, assim, no que fazia, por que, quando você me perguntou o que fazia. Eu fui uma criança muito doente, assim, eu nasci um bebê mega saudável, e todo mundo falava que eu era um bebê lindo, eu nasci com 4,550 quilos e 53 cm, eu cresci um metro na minha vida, desde que eu nasci até quando eu cresci, cresci um metro. E com um ano e meio comecei a ficar doente, e fui um bebe bem doente, uma criança bem doente. E meus pais não tinham uma situação financeira boa. Quando eu nasci eles tinham até uma situação estável e com a minha doença isso foi se agravando muito. Meu pai e minha mãe abriram mão de terrenos que eles tinham, e chegou uma situação da minha mãe tirar os brincos que ela tinha na orelha para poder comprar medicação, que eu fui uma criança muito doentinha mesmo.
P/1 - O que você tinha?
R - Com 1 ano e meio eu comecei a apresentar algumas alterações de comportamento, então, foi assim, imagine, 40 anos atrás tudo era mais difícil, eu convulsionava, eu tinha convulsões, mas convulsões diferenciadas. Hoje a gente sabe que é de pequeno mal. Então, eu convulsionava, eu tinha uma irritabilidade super grande quando eu não estava bem, eu me mordia, eu mordia as pessoas, então assim, foi uma infância muito difícil, meu pai trabalhava minha mãe ficavam em casa, e a partir do momento que eu comecei a adoecer, minhas irmãs meio que foram, ficando assim, minha mãe presente, mas meio que ausente, eu fui uma criança que eu vivi muito tempo internada, muito tempo. Então primeiro foi o quadro (analógico) [00:08:04] que eu convulsionava, e depois o quadro respiratório gravíssimo que eu tinha, eu tinha na época, não se falava nem asma, se falava em bronquite, às vezes eu tinha complicações gravíssimas da bronquite. Então assim, eu vivia muito mais internada do que na minha casa. Eu fui duas vezes, o médico falou para minha mãe “leva sua filha para morrer em casa, pelo menos você fica com ela em casa umas horas e ela vai morrer”, e minha mãe nunca desistiu, meu pai nunca desistiu, mesmo sem recurso, não se tinha uma medicina tão aprimorada e nem financeira, que quando tinha era super custoso, mas meus pais nunca desistiram, minha mãe fez de tudo que você imagina. Ela me levou em medico, eles venderam carro, eles venderam o terreno, chegou uma época na vida da minha mãe, que ela tinha uma calça jeans e duas blusas. Então assim, mas eles nunca desistiram de mim, então, por isso, que falo para você, que os dois são um poço de amor. E depois da misericórdia de Deus, eu acho que estou vivo a graças a meus pais, minhas irmãs falam que é por que sou bicho ruim mesmo, elas falam “se não morreu, não morre mais, só vai matando todo mundo, mas morre não morre” e eu fui muito doente, até 5 para 6 anos eu parei um pouco de andar, por que, eu tomava tanta benzetacil, eu tinha tanta pneumonia, recorrente dos meus quadros respiratórios, e eu já não tinha como tomar benseta, no bumbum, e eles começaram a aplicar na coxa, e eu era uma criança extremamente emagrecida e frágil pela doença, e eu perdi um pouco da movimentação, da musculatura, por excesso de injetáveis. Eu morava em uma cidade nessa época, Chamada de Dourados, que é interior do Mato Grosso do Sul, a gente morava do lado de uma aldeia, então muita coisa tinha que ir para Campo Grande, que não tinha em Dourados então, foi uma vida bem difícil e meus pais nunca desistiram de mim, eu sempre fui muito amada, nos sempre fomos muito amadas. Mas, em especial eu sempre recebi mais cuidado por conta do meu, de todo meu quadro de saúde.
P/1 - E você foi melhorando depois? Você sabe disso, em que época você melhorou?
R - Mais ou menos, eu fui melhorando quando eu vim para cá, a gente veio para cá eu tinha 7 anos, como meu pai é militar ele foi transferido para Sorocaba, nós viemos morar em Sorocaba nós tínhamos duas opções de cidade, não me lembro da outra, mas nos viemos por que falaram para ele que o clima era bom, e isso ia ser benéfico para o meu quadro, que até então o quadro neurológico melhorou, por volta de uns 5, 6 anos, usei medicação até os 10.
P/1 - E você não sabia, por que ninguém sabia o porquê você tinha essas convulsões?
R - Não, ninguém sabia, mas também assim, foi um período de infância. E o quadro respiratório não, o quadro respiratório foi bem complicado, a gente veio para cá, e eu tinha crises, mas aqui pelo que me lembro de eu não cheguei a ficar de internação de longa permanência como eu ficava em Dourados quando eu era menor, e que eu fui melhorar mesmo, que eu me lembro da asma, foi depois dos 18 anos, e eu descobri também, como depois eu descobri que (inint) [00:11:08] que o meu emocional controla muito, não só, claro que tenho que controlar os alergenos, mas o emocional também.
P/1 - Você diz que vocês diz que vocês vieram para Sorocaba, e mesmo lá, ainda criança, passando por essa situação, vocês tinham brincadeiras, você convivia com suas irmãs, como eram?
R - Eu sempre fui uma criança muito adulta, por viver muito no hospital, então assim, eu brincava pouco com as crianças, não ficava muito tempo em casa. Tinha as minhas amiguinhas, eu frequentava escola, mas eu ficava mais internada do que na escola, mas eu fui uma criança muito adulta por que quando eu nasci a minha irmã tinha, a minha irmã mais nova tinha 6 e minha irmã mais velha 8, e eu queria acompanha minhas irmãs, então, eu comecei a ler cedo, a escrever muito cedo, e uma coisa que eu lembro, eu sempre fui muito marota, apesar de minhas irmãs falarem, ela é doente, mas ela é marota, então, eu comecei a aprender a escrever na parede. Meu pai tinha uns lápis, que uma ponta era azul e outra ponta era vermelha, sabe, os lápis de grifa livros e eu pegava os lápis e escrevia nas paredes, minha mãe falava “quem que escreveu?” “minhas irmãs” “nem precisa perguntar” para minha mãe, eu falava” eu não fui” e minha mãe morria de dar. “Não se ela falou que não foi ela, por que não foi ela” me lembro muito disso, e nas paredes era escrito (gelail) [00:12:42]. Assim de brincadeira eu me lembro, eu sempre gostei muito de ler e de cantar, sempre gostei muito de ler e cantar, aprendi a ler muito cedo, e nato assim, a minha brincadeira era mais ler livrinhos, e sempre gostei, sempre gostei de cantar.
P/1 - E onde você cantava?
R - Cantava em casa, cantava na igreja, cantava na escola, atormentava a vida de todo mundo.
P/1 - Você juntava as pessoas ou você fazia o que?
R - é que a gente sempre foi muito católico então, eu sempre ouvi na minha casa as músicas do padre Zezinho, então eu cantava as músicas do Padre Zezinho, era o que eu conhecia, acho que era a galinha pitadinha da época, as músicas do padre Zezinho, e eu gostava de cantar. De brincar, eu me lembro de que eu escrevia muito, mas não de brincadeira poucas vezes me lembro de brincar de boneca, brincava de casinha, mas não era uma coisa assim, que eu brinquei mais do que eu fiz outras coisas, eu acho que eu lia mais, cantava mais do que eu brincava.
P/1 - E quando vocês vieram para Sorocaba, como você percebeu essa mudança? Qual foi sua sensação, impressão de estar morando em outro lugar?
R - A gente veio foi interessante, eu vejo que são coisas muito simbólicas, para facilitar a mudança minha mãe vendeu tudo lá, e também falaram que aqui eram super barato as coisas, a minha mãe vendeu tudo, a gente só trouxe a máquina de costura da minha mãe, a máquina de lavar roupas e a televisão, resto vendeu tudo, a gente veio, meio que, veio sem história. A gente começou a fazer uma história aqui, então, nós moramos em uma casa de aluguel, lá na Rua da Penha , uma rua bem no centro da cidade, e a gente passou uns momentos bem difíceis, mas nossa família sempre foi muito fortalecida na fé, e sempre apesar de tudo, dos meus problemas de saúde, mas pelo amor que eu recebi, sempre fui muito feliz, eu sempre fui muito risonha, sempre fui muito falante, muito alegre, e acho que assim, a dificuldade que a gente passou aqui acabou deixando a gente mais forte ainda, no começo a gente não tinha casa, não tinha carro, a gente alugou uma casa de uma mulher que perturbava a vida do meu pai e da minha mãe, sabe? Não podia nem respirar, que era um sobrado então assim, a gente passou assim, dificuldades, mas tudo foi entrando nos eixos, e a gente foi construindo uma história nessa cidade, então, eu falo que assim, apesar de ser sul mato-grossense me sinto muito de Sorocaba por que, Sorocaba acolheu minha família então, a gente tem, minha mãe diz que não gosta muito daqui, mas acho que todos nós gostamos sim, por que a gente fez a nossa história aqui.
P/1 - E você dia que sempre foi muito risonha.
R - Sempre.
P/1 - E tem situações que assim, apesar de todas as dificuldades você continua sorrindo? Alguma situação história, que alguém comentou com você?
R - Como eu falei para você, eu sempre fui muito marota, fui muito marota, então, eu era muito magra, muito, muito, muito magra, muito abaixo do peso, até uma vez, isso ainda em Dourados, a gente foi no medico, o médico falou “nossa, mas essa menina não come, mãe olha a situação dessa menina.” E brigando com minha mãe, eu não comia, não comia nada, não comia, e se você quisesse arruma inimizade comigo você me convidava para comer. Então, se alguém falava para mim “come” eu não quero nem ir a casa dessa pessoa, ficava, essa pessoa é muito chata fica me mandando comer, e eu não comia e o médico falou “nossa, mãe, você tem que fazer coisas diferentes para ela comer por que olha, ela precisa comer, olha a situação dela, e não sei o que...” eu falei “sabe por que eu não como, eu não como por que eu não aguento mais todo dia minha mãe faz tang. e ovo” a minha mãe queria morrer, a minha mãe nunca fazia nem ovo e tang. Então, eu fui muito assim, sabe? Sempre fui muito teatral, umas coisas assim, e eu lembro que minha mãe ficou muito brava, minha mãe ficou louca, mas “é claro que ela não vai comer, como que ela vai engordar comendo tang e ovo” “da onde você tirou isso.” Então assim, eu achava graça, eu achava muita graça, (sinto as minhas mas notícias) [00:17:11] eu me lembro de uma vez, a minha mãe tinha, não sei se vocês se recordam u, umas colchas de casal que tinha uns pingadinhos assim em volta da colcha, antigamente era muito comum, era uma colcha que era Chimil o nome, tinha uns pingadinhos assim, umas trancinhas. E minha mãe saiu, e me deixou com as minhas irmãs, minhas irmãs eram maiores, e eu sentei no chão e eu trancei de 3 em 3, eu tinha visto minha tia fazer tranças no cabelo da gente, e peguei aqueles trequinhos e fui trançando, trancei todos, todos, inteirinhos, da colcha, quando minha mãe chegou, minha mãe ficou louca da vida, minha fala ou “quem fez isso?” “ué, não precisa perguntar quem fez né? Você acha que a gente si fazer isso?” “mas claro que não foi ela” “é mãe, eu não fui, nem vi quem foi” minha mãe falava “claro que não foi ela, então podem mostrar a mão quem estiver com a mão mais vermelha vai apanhar” e eu nunca apanhei, por que eu era muito doente, então, morria de rir disso. Minhas irmãs apanhavam e eu não.
P/1 - Sua mãe dizia que não era você, e você achava que era por que ela falava “não, não pode ter sido ela”?
R - Ah, por que eles morriam de dó, então, achavam que eu era muito boazinha mesmo, tadinha, coitadinha dela, imagina que ela vai fazer uma coisa marota dessas. E minha irmã mostrava a mão, minha mão: “foi você, como sua mãe está vermelha, foi você que fez, está mentindo” e pá na mão da minha irmã, eu morria de rir. Eu me divertia com essa marotice, acho que talvez por que eu não brincava, então, esses eram um dos raros momentos da minha esperteza que eu achava muita graça.
P/1 - E suas irmãs com você?
R - Eram super protetoras também, eram, eram, hoje elas falam “é bicho ruim, tal”, mas sempre cuidaram muito. Essa minha irmã mais velha, minha mãe sempre fala assim, que ela sempre de tudo para me divertir, para me acalmar, elas sempre cuidaram muito de mim.
P/1 - E aqui em Sorocaba, você, as brincadeiras continuaram desse jeito, assim? Mais em casa ou foi diferente?
R - Não, aqui, acho que assim, depois de 7, 8 anos, que eu melhorei um pouco, tinhas as crises mais bem menos não ficava mais internada, aqui eu frequentava escola, aí comecei a frequentar escola mesmo a ir à escola de verdade. E tinha amiguinhos, aqui eu tinha amiguinhos, a gente começou a frequentar a igreja daqui, tinha amigos da igreja, aqui assim, já foi outro momento, eu podia viver um pouco mais, não viver só internada no hospital, então aqui não, aqui foi diferente, foi bem diferente.
P/1 - A igreja você falou que frequentava com seus pais, desde que você nasceu ou eles são? E qual a igreja que eles frequentam?
R - nos, somos católicos, eu nasci praticamente dentro da igreja, minha mãe estava em um encontro de casal e ela saiu para ir para o hospital para eu nascer, então, eu praticamente nasci, e fui criada nessa fé, e é um dos meus pilares é minha fé.
P/1 - E sempre na igreja católica?
R - Sempre, na igreja católica. Eu tenho uma irmã que acabou mudando de religião, mas depois voltou, todos nós somos, e somo envolvidos com a igreja não só de nome, mas somos envolvidos com a igreja até hoje.
P/1 - E você para a escola, agora, pensando na escola. Você fez, conta um pouco como foi, a primeira fase, depois o segundo grau, como foi essa estada na escola? Se foi sempre a mesma?
R - Eu comecei lá, o pré, em Dourados, sempre fui uma criança de facilidade para aprender, e eu sempre gostei muito de aprender então, quando eu fui para pré eu já sabia ler, já sabia calcular, já sabia multiplicar, e eu sempre gostei de procurar essas coisas, quando eu cheguei aqui, os meus pais não tinham condições de pagar, eu estudava em uma escola paga lá, meus pais não tinham condições de pagar uma escola, eu fui a uma escola, e a professora pedia para minha mãe às vezes e deixar um pouco em casa, por que e acabava atrapalhando um pouco as outras crianças.
P/1 - Por que você já sabia tudo.
R - Sim, e isso me deixou bem chateada, no começo eu ficava bastante frustrada de não ir, por que agora que eu podia ir, ai que eu estava começando a ir para a escola, começando a brincar na hora do intervalo, aquelas coisas que crianças fazem, e isso foi bem assim, eu me lembro disso com um impacto bem grande, não gostava de ter que ir à escola , por que era como, agora que eu posso ir, eu não posso ir, depois disso a minha mãe me trocou de escola, mas eu continuei estudando na escola pública, e sempre dai é engraçado por que, tinha fases da vida, então, eu era uma menina bem quieta, lembro me do 2º até o 5º ano e também acho que até a 8ª serie que eu mudei o meu jeito de ser, mas eu era quieta, era falante, mas em casa, eu sempre gostei de falar em público, de fazer teatro, mas na classe eu era quieta, sempre fui uma criança que nunca dei trabalho para professora.
P/1 - A não ser nesse primeiro ano que ela pediu para você ficar em casa.
R - É eu ficava em casa, mas assim, eu também era quieta, me pediu para ficar por que aquilo na verdade me incomodava, não conseguia, não saia de determinadas lições eu queria aprender coisas novas, que tudo aquilo eu já sabia.
P/1 - Mas, eu estou querendo saber se foi por conta disso que você se tornou mais quieta ou não, você já entrou um pouco mais silenciosa?
R - eu não sei, por que na escola eu era quieta, não sei te responder.
P/1 - Eu só perguntei, para você me dizer se teve relação de quando ela pediu para você ficar em casa, se isso teve alguma...
R - Talvez, talvez, eu lembro assim, que até hoje isso me causou uma frustração muito grande, que foi quando eu comecei poder ir para a escola, eu tinha saúde para ir para escola, quando eu não precisava ficar internada e eu não podia ir para escola, e ficava em casa, então, me lembro de bastante disso, foi uma coisa que guardei bem, foi no primeiro ano. Depois minha mãe me mudou de escola, fiz amizades, aprendi, sempre gostei de aprender, sempre gostei muito de escrever, sempre adorei escrever desde criança. Meu pai chegava a casa depois do trabalho, a gente ficava com a minha mãe, e a minha brincadeira com meu pai, era passar tema de redação, sempre gostei muito de escrever.
P/1 - Tem alguma redação que você se lembra de que ele gostou muito que você escreveu?
R - Eu lembro que eu li um dos primeiros livros que eu li, depois do pré, era um livro chamado, da Anjinha Terezinha, nome já nem sei se existe mais, era uma das maiores citações da anjinha Teresinha, e eu me lembro de que eu fiz uma continuidade, mas que não tinha nada a ver, eu criei um enredo para Anjinha Teresinha que não tinha nada a ver, meu pai achou super genial, ele gostava muito ele se divertia muito com as coisas que eu escrevia, era engraçado, por que eu acho, que eu sempre estive muito presente meu pai e minha mãe de forma muito, sabe quando você consegue organizar papeis, então, a minha mãe ela não teve a possibilidade de estudo, mas minha mãe sempre sentou para fazer lição com a gente, ela era sempre rígida, exigia assim, até as frases que a gente brinca hoje, a gente está velho e brinca, “mãe, tirei nove e mio” “não fez mais que sua obrigação” era bem assim. Minha mãe sempre super rígida e com a educação, com tudo, aprendizado das coisas. Minha mãe sempre falou que a gente tem que aprender fazer tudo na vida, cuidar da casa, ajudar na casa, ser bom com as pessoas, tal. E meu pai sempre muito tranquilo, muito amoroso, e assim, a gente se divertia muito meu pai escrevendo, eu escrevia, ele lia, ele ajudava a escrever, ele me corrigia, eu gostava de falar, ele falava “não, então, vamos treinar, essa entonação não é legal” então, eu lembro muito disso de visão de papeis, são amores bem diferentes, acho que é um amor muito intenso mas de forma diferenciada.
P/1 - E teve alguma redação que você fez, que você gostou muito?
R - Ah, eu acho que sim, eu sempre gostei muito das coisas que eu escrevo.
P/1 - Mas, alguma em especial?
R - Eu me lembro de uma vez que eu escrevi uma redação para um jornal, aqui da cidade, que era assim o que era ser criança, e foi uma redação premiada, tal, e era uma... E eu sempre gostei, e eu me expresso até hoje, muito, às vezes eu consigo me expressar melhor escrevendo o que eu sinto.
P/1 - E você mesmo silenciosa na escola, continua marota? Continua risonha? Em casa?
R - Sim, é, sim. Sempre meio, nunca perder as oportunidades que eu tinha de aprontar, assim, mas era um aprontar super saudável, mas eu me diverti muito.
P/1 - Mas, você falou, na 8ª serie eu mudei, o que aconteceu?
R - Interessante na 5º serie, eu estudei todo o tempo na escola pública, na 5ª serie teve uma grande greve, e acho que a gente ficou quase 3 meses de greve. E eu morria de medo de repetir o ano, e falavam que a gente ia repetir o ano, por que, já se fazia 3 meses, e meu pai coitado, sem poder me colocou em uma escola paga, só para eu não perder a escola e eu estudei a 5º, 6ª e 7ª e na 8ª me mudei para uma escola pública de novo. Aqui na escola municipal.
P/1 - Suas irmãs também?
R - É acho, que nessa época uamás das irmãs já tinha até terminado o segundo grau do colegial, e na escola municipal, parece que minha vida mudou, mudou minha vida, conheci, foi uma classe que ela fim formada naquele ano, então todo mundo estava chegando à escola. Foi legal por que todo mundo se uniu, virou como uma família grandona.
P/1 - na escola municipal?
R - Isso, escola municipal daqui. E eu fiz grandes amizades, eu tenho uma amiga da escola, tenho duas amigas, assim, até hoje tenho contato com 4, mas com duas a gente é super grudadas até hoje. Então eu fiz grandes amizades, acho que, eu cresci muito nessa escola, eu me soltei, comecei ficar meio assim, “ah, não tenho mais vergonha, agora eu falo o que dá na cabeça” comecei a me soltar mais. Acho que antes eu só estudava e era muito quieta, muito presa, e lá eu me soltei.
P/1 - Era uma escola de meninas e meninos?
R - Escola mista, normal.
P/1 - E a bronquite ou asma, ela foi melhorando?
R - Foi melhorando. Eu sempre, desde a época em que cheguei aqui, seria com 7 anos até mais ou menos uns 15 anos eu fiz uso das vacinas, então, semanalmente eu tinha responsabilidade de tomar as vacinas, no começo era minha mãe que levava e quando eu fiz 12 anos eu ia sozinha. Isso me ajudou a controlar bem, não que desapareceu ainda tinha as crises, quando chegava inverno, sempre fui alérgica a lã, não podia ter contato com a lã, aquelas coisas, mas melhorei bem, melhorei bem, em vista do que foi a minha infância, a minha primeira infância, melhorei bem.
P/1 - E não adolescência, você já estava chegando na 8ª serie, começou a ficar mais solta. E o que vocês faziam na adolescência? Você, o que você fazia na adolescência ou para se divertir, ou outra atividade?
R - O que eu fazia na adolescência? Eu sempre fui muito na igreja, eu adorava ir, para mim era uma diversão, fazer parte do grupo de jovem, sair com as meninas da igreja, então tinha as minhas amigas da escola e também tinha minhas amiguinhas da igreja, mas sempre foi tudo muito saudável e minha mãe sempre foi muito controladora então, diferente do que a gente vê hoje, assim, eram saídas super saudáveis, era ir à sorveteria, era ir ao cinema, sempre gostei muito de dançar então assim, com 14 anos mais ou menos começou a época de pagode, e a gente ia para os pagodes à tarde, mas tudo muito saudável, muito tranquilo.
P/1 - Você dançava bem?
R - Sempre gostei de dançar, se era bem eu não sei. Eu adoro dançar até hoje, eu adoro dançar, sempre gostei, sempre gostei muito de samba, de pagode, e foi à época de axé, então, eu adorava dançar, sempre gostei muito de cantar que sou um desastre, mas eu gosto, é problema dos outros, não é meu se eu não sei cantar, e de dançar e me divertir , e ir à igreja, a igreja sempre fui muito ativa, então lá na igreja eu tinha papeis diferenciados, então , eu era líder de grupo de jovens, e eu me apaixonei por uma parte especifica do catolicismo que é a parte do catolicismo. Eu comecei a estudar muito cedo, eu fui catequista muito cedo aquilo sempre me deu muita alegria, por que eu me deslumbrava, não era uma coisa que eu ia por obrigação, por que meu pai ia, por que minha mãe ia. Eu sempre gostava de estar lá.
P/1 - Por que, você acha que gostava, o que te fazia sentir tanta satisfação na igreja? Participava das atividades, mas tinha alguma coisa além disso?
R - Ah, Marcia, acho que sempre foi minha relação com Deus, eu falo que eu tenho uma relação muito diferente com Deus, a minha relação com Deus é diferente do que as pessoas normalmente veem, para mim é uma relação física, eu fico brava com ele, eu converso com ele, ele sempre andou do meu lado, e assim, eu falo que eu sou muito guerreira, estou aqui por insistência dele.
P/1 - Você fala? Ou você acha que ele fala para você?
R - Acho que nos dois falamos, eu acho que cheguei a essa conclusão junto cm ele. Então, eu tenho uma relação assim, eu sempre gostei muito dessas coisas, tanto da parte social da igreja, que é o convivo, essas coisas, eu participava do grupo de liturgia e arte da igreja, então eu fazia teatro, fazia dança, acabava unindo tudo que eu gostava, mas assim, a minha relação com Deus é o que explica. E eu fui me desenvolvendo muito na igreja, até que por volta de 20 anos, 22 anos eu ganhei um ministério bem especial, que era o ministério da palavra, eu era a única ministra da palavra mulher, eu deixei de ser ministra quando eu engravidei do meu menino.
P/1 - Por que não pode mais?
R - Porque eu casei gravida também, para a igreja eu aprontei, mas quando eu tive meu menino, eu casei tudo, acabei regularizando minha situação, mas a questão é que eu me afastei um pouco com o nascimento do Gabriel, eu até tentei voltar, mas eu não consegui acompanhar a maternidade e as exigências da agenda da igreja. Então, assim, hoje eu participo da igreja, mas de uma forma mais leve e eu não tenho aquela quantidade de compromissos que eu tinha, por que hoje o meu compromisso maior é o Gabriel, e como eu trabalho fora tudo, isso acaba tomando tempo grande, partilhar o trabalho, partilhar ele, eu acabei saindo um pouco do ministério por isso.
P/1 - Desde quando você sente essa relação com ele que você falou? Você lembra assim desde que época da sua vida?
R - Acho que desde pequena, desde muito pequena, por que, eu me lembro dos terços na casa da minha mãe, lá e, Dourados, eu tinha 4 ou 5 anos eu me lembro dos terços, em família que era muito comum naquela época, à gente ainda tenta resgatar, segunda feira teve uma aqui em casa. Sempre, sempre, assim, e é estranho, por que eu nunca tive uma relação de peso, como eu vejo assim, tipo “ah, eu ia à igreja por que minha mãe mandava, por que eu tinha que ir” não, para mim nunca teve essa relação, para mim ele sempre foi meu amigão, bem físico mesmo.
P/1 - Como é, a gente faz com o tempo, um pouquinho da hora aqui também. Como é essa relação física que você diz? É de...
R - É uma relação presente, eu não vejo uma coisa do tipo “ah, Deus está tão distante de mim” ele caminha comigo todo dia, ele me ajuda em tudo, até em dificuldades emocionais, que eu tenho, às vezes eu falo, por exemplo na D.A. teve um momento que eu falei, “eu não aguento mais, não dá mais, eu não sei qual é o seu proposito para isso, você tem o seu propósito, só que eu não estou entendendo e não estou aguentando, então você me dá um jeito, ou você me mostra para que seja, e você me ensina a lhe dar, com essa porcaria ou você faz alguma coisa ai, eu não dou mais conta” é uma coisa muito física.
P/1 - Muito próxima?
R - Muito próxima, eu falo com ele fisicamente, falo mesmo, tenho certeza que ele (inint) [00:34:44]
P/1 - ngela, e namorados? Qual foi seu primeiro amor, paixão?
R - Meu primeiro amor, foi um menino da igreja, tinha que ser, era o que mais frequentava, só que esse menino ele era o amor de todas as meninas da igreja. Por que tinha assim, acho que de menino novinho só, o resto era tudo homem, velho, casado, e ele tinha um monte de meninas, e todo mundo gostava dele.
P/1 - E você teve alguma chance?
R - Não, não por que na verdade ele nunca quis namorar com nenhuma menina da igreja, ele acabou namorando, 4 hoje a gente convive junto, a esposa dele é muito amiga, ele acabou namorando uma menina da escola, mas era uma coisa platônica sabe? E não sei, eu sempre fui muito palhaça, outra falava assim, “não, por que eu vou casar com ele, ele vai ser prefeito da cidade, eu vou ser primeira dama”, mas era bem legal, uma coisa bem platônica.
P/1 - Que idade você tinha?
R - Começou com 13 ou 14 anos, bem platônico, mas era aquelas coisas, platônico de escola também.
P/1 - E o primeiro beijo você se lembra? Por que começa a ficar menos platônico.
R - Meu primeiro beijo? Foi com, agora eu vou, é, acho que foi com 13 para 14 anos e foi em um passeio na casa da minha avó, em Campo Grande. Nas férias às vezes minha mãe ia, e eu ia com minha mãe, e tinha muito menino por que lá na casa, lê em Campo Grande, ainda hoje você acha muitas casas, terrenos muitos grandes e tem mais de uma casa no terreno da mesma família , então, era minha avó no meio, meu tio em uma ponta e meu outro tio na outra ponta, e o meu tio na frente tem 3 filhos homens, então, a casa era lotada de homens, os meninos iam para jogar bola, para tomar terebre, então, foi me lembro de uma férias assim, de 13 para 14 anos, mas eu sempre fui muito sossegada, sabe, eu achava que sem minhas amigas “ah não, tenho que beijar, por que, vou ter que contar para as meninas”, todo mundo já beijava, tal, mas não era uma coisa assim, sabe? Não era foguenta, esse amor platônico pelo menino da igreja, foi uma coisa assim, fantástica.
P/1 - E qual foi à sensação, mesmo beijando desse jeito assim, para contar para os outros?
R - Ah, foi engraçado, foi super engraçado, por que na verdade nós éramos 4 amigas das que te falei, que eu ainda tenho contato com as 4, 5 amigas, 4, e eu, e duas delas namoravam e foi engraçado por que uma delas namorava e achava super legal, e uma namorava e achava super chato, e ela não terminava por que ele dava muito doce para ela. E a gente achava muito engraçado, acho que todas nós éramos muito criança. Sabe o primeiro beijo assim, foi só para, não tinha uma coisa, sabe, de sedução e tal. Eu acho que foi mais tarde, foi bem mais tardio para mim essas coisas.
P/1 - E você, estava estudando? Fez o que no ensino médio?
R - Fiz o colegial comum, isso dai no começo eu achava que queria prestar medicina, depois eu achava que queria prestar odontol., depois eu achava que queria prestar fisioterapia, e eu acabei fazendo terapia ocupacional, e assim, meus dois primeiros anos eu não gostava do curso e eu tinha feito por que eu tinha passado em fisioterapia pela Unesp, e meu pai não me deixou ir para Presidente Prudente por que eu ainda era um bebe da família. Eu sempre fui muito bebe dos meus pais, eu deixei de ser o bebe aos 18 anos quando minha primeira sobrinha nasceu.
P/1 - Por que ai ela virou?
R - Ai ela virou o bebe. E nessa época quando eu prestei vestibular e meu pai não deixou, eu fiquei bem revoltada com ele, sabe? Fiquei bem brava assim, por ele não me deixar ir, e eu acabei fazendo terapia ocupacional por que, não aguentava mais fazer cursinho, já tinha feito 3 já, cursinho, para prestar medicina, a bendita da medicina, não aguentava mais. E no terceiro ano acabei me identificando assim, com a profissão, é um curso que tem a minha cara, eu acabei fazendo outra faculdade, acho que, optando também por outro caminho no mercado de trabalho, mas o curso de teatro é mais a minha cara, por que, ele é super alegre, super versátil, ele é divertido, ele é irônico, ele é brincalhão, o curso me identifiquei, o curso tinha tudo a ver comigo.
P/1 - Você exercitava tudo isso?
R - Sim, a gente, não sei se você conhece, mas a gente via tudo lá, a gente teve aula de crochê, aula de marcenaria, aula de teatro, aula de dança, aula de vídeo, a gente aprendeu na época gravar, filmar, a gente fazia de tudo.
P/1 - Para poder aplicar?
R - São coisas terapêuticas, como tudo na vida, se você utilizar de um determinado prisma é um recurso terapêutico, então, a gente aprendeu de tudo um pouco.
P/1 - E você fazendo faculdade, logo foi fazer a outra?
R - Eu terminei a faculdade, logo arrumei um emprego na psiquiatria, trabalhei 9 anos na psiquiatria.
P/1 - Onde?
R - Eu trabalhei nos hospital de psiquiátrico aqui da cidade, que hoje já não existe mais, que é o jardim das Acássia, chamavam aqui ele era conhecido como o hospital dos insanos, mas já lá de trás já trazia esse nome, e logo que eu terminei, eu sempre gostei dessa coisa de fala, de fala em público eu até fiz um projeto, para trabalhar a questão da humanização dentro dos demais cursos da saúde, e eu fui (bati) [00:40:38] eu tinha acabado de me formar, tinha me arrumado já, já tipo um mês dois meses de formada e eu bati em uma escola de enfermagem, ah, vou levar meu projeto lá, se eles gostarem, e cheguei “ah, eu gostaria de marcar um horário para falar com a diretora,” a menina falou “ela está ai, e falou que te recebe” e eu entrei e apresentei o projeto e ela ficou maravilhada e comecei já trabalhando nessa escola de enfermagem, onde eu dava aula, só que eu não dava aula nade enfermagem, que eu não era enfermeira, eu dava aula da parte de humanização, à parte de ética, a parte de valores humanos, para externo de enfermagem, e lá eu conheci um monte de enfermeiro, e os enfermeiros falavam, você não tem cara de (teogela) [00:41:23] você tem cara de enfermeira, e eu queria muito fazer uma segunda faculdade, e você nem imagina o por quede queria tanto a formatura, por que eu adorei, ter a formatura (inint) [00:41:33]. Eu falava “não preciso fazer outra faculdade para ter outra formatura, foi muito legal a formatura” e comecei a fazer enfermagem, acho que tinha dois anos de formada, mais ou menos, e comecei a fazer enfermagem. Foi outro estilo, totalmente, eu já estava diferente. Eu já trabalhava era uma profissional da saúde, eu banquei meus estudos, eu trabalhava no hospital, eu dava aula, e depois logo arrumei outro emprego, então, eu sempre tive de 2 a 3 empregos.
P/1 - E estudava?
R - Estudava, fazia faculdade à noite, que lá são 30- horas, estava saindo 6 horas por dia, então isso me permitia dar aula, me permitia conjugar outras coisas juntos.
P/1 - e o trabalho no hospital?
R - O trabalho no hospital, eu era terapeuta ocupacional, em um hospital psiquiátrico, trabalhava com ala de agudos, que a gente chamava que era as pessoas que estava internadas por crise, então, eu trabalhei com os psicóticos, e com os dependentes químico, acabei tendo bastante convivência com os moradores, mas eu trabalhava mesmo com os agudos, de lá o hospital era um c complexo, na verdade, então de lá eu fiquei 3 anos dentro do hospital mesmo nas enfermarias depois eu trabalhei em uma oficina terapêutica, depois eu trabalhei ajudei nas residências terapêuticas. E fui trabalhar junto, trabalhava no hospital, acabei arrumando emprego em São Rock trabalhei no (CAPS) [00:43:01] e isso foi delimitando um pouco a minha trajetória.
P/1 - Teve alguma história nessa época que você trabalhava com essas pessoas que foi marcante para você, que você lembra dessa época você lembra dessa história?
R - Ah, são muitas, Marcia...
P/1 - Mas, que você pode ajudar.
R - Aquilo é uma escola de vida, eu sempre fui assim, eu sou a filha mais nova, sempre fui muito doente, então, acho que eu sempre fui muito protegida, eu falava que eu sempre fui muito mimada, mas não é aquele mimado daquela pessoa sem limites não, que minha mãe sempre foi rígida, sempre fui muito educada, mas eu sempre fui assim, sabe? “ah, não fala assim que eu fico triste” sempre fui melindrosa, na psiquiatria você vê que não da espaço para isso,você vê que a vida é muito, muito, muito frágil, então você vê histórias de pessoas assim, de pessoas que eram donos de empresas, que falavam 7 idiomas e que pela doença mental, acabou perdendo tudo, até a si mesmo, até sua identidade. Eu acho que a maior forma de ajudar essas pessoas, e até hoje eu penso assim, hoje eu não trabalho com a saúde mental, mas trabalho com eles, ainda que a gente atenda sempre nas pacientes, é você olhar o outro, procurando entender como ele é, e não a doença. Então, assim, atrás de um esquizofrênico tem uma pessoa, atrás de um dependente químico tem uma pessoa, e isso é o melhor jeito de você ama-lo. Eu acho que eu sempre fui muito assim, sempre me aproximei deles por esse lado, e o bom da terapia ocupacional é isso, então, eu me aproximava deles para jogar xadrez com eles, para ler livros, para pintar quadros, e você consegue ver quem é a pessoa e não a doença que ela tem.
P/1 - E teve algum deles que foi bastante, teve vários como você falou, mas teve algum que você até acha interessante contar? Algumas dessas histórias?
R - Só do hospital você fala?
P/1 - Não, fazer mais geral.
R - Tem várias histórias, mas teve alguns que a gente adotava praticamente como filho, apesar de ser às vezes, até bem mais velho que a gente, mas assim, por exemplo os moradores que a gente chamava os pacientes crônicos, deitava a cabeça no colo da gente. Tem uma história em especial que me fez querer sair da psiquiatria que, quando eu fui trabalhar no CAPS, eu fazia um grupo de mulheres deprimidas, dentro desse grupo tinha uma moça que ela, elas sempre acabam se identificando com você, você acaba como terapeuta, ela esta tendo uma referência, é inevitável por que você trabalha isso terapeuticamente. E ela tinha a mesma idade que eu, ela gostava muito, ela era super vaidosa, ela gostava de pagode, ela gostava de samba, a gente tinha muitas coisas em comum, ela era casada e tinha dois filhos, ele não me lembro se eu era casada na época, e essa menina, ela veio a tirar a própria vida dela, em uma das crises dela. E para mim, eu já estava bastante desgastada da psiquiatria por conta dessas perdas, eu sempre conversava muito com Deus e perguntava o porquê? E essa história, até hoje para mim, é muito viva.
P/1 - E você resolveu sair da psiquiatria?
R - Sim.
P/1 - E você estava fazendo enfermagem, e qual foi o próximo trabalho?
R - Então, quando eu sai da psiquiatria eu já era formada em enfermagem, eu já tinha me formado. E quando eu me formei em enfermeira eu sempre gostei muito da parte de atenção básica e da saúde coletiva, eu sou especialista em saúde pública e coletiva. E eu fui trabalhar em São Bernardo do Campo na atenção baseia, então eu sai da saúde mental, e fui para atenção básica outro (inint) [00:47:10]
P/1 - Morou lá?
R - Morei, morei lá. E lá, sim foi muito legal, foi meu primeiro emprego na atenção básica. Então eu tive outros empregos como enfermeira, teve uma época em que eu trabalhava como enfermeira e como teóloga, eu trabalhava como teóloga no CAPS e trabalhava como enfermeira em casa de idosos, e quando fui para lá comecei a trabalhar na atenção básica, que ai é meu universo eu sou apaixonada pela atenção básica, e eu descobri...
P/1 - E o que é isso? Como você faz na...?
R - Na verdade eu sou enfermeira na saúde da família então, a gente atende no posto, e você atende de tudo, seria, no caso, o carro chefe da saúde na família, na estratégia na atenção básica em si, é a prevenção e a promoção de saúde, mas você não faz só isso, infelizmente no nosso pais isso ainda não é muito o foco, mas você atende a criança, você atende a gestante, você atende o idoso, você atende o hipertenso, você atende a mulher, entendeu? E você entra na vida das pessoas, na saúde da família, então, por exemplo, hoje a cidade onde eu trabalho é 100% saúde da família.
P/1 - Onde é agora?
R - Eu trabalho em Salto de Pirapora, então, assim, a gente tem os agentes comunitários de saúde, a gente conhece todas as famílias, que a gente atende, as histórias, onde mora, a gente conhece as famílias pelas pessoas, pela patologia.
P/1 - Você vai na casa deles?
R - Sim,
P/1 - E você? Vamos falar um pouquinho do seu casamento e depois a gente volta para o que você faz hoje, e quando que a dermatite aparece, está bom?
R - Acho que já estourei seu horário?
P/1 - Não, a gente vai até nove e um pouquinho lembra? 9:10...
R - pode ir até 9:30 sossegado...
P/1 - Da uma cortadinha? Você morou em São Bernardo, quanto tempo?
R - Morei, morei quase 3 anos.
P/1 - Onde e quando você conheceu seu marido?
R - É uma historia super legal. Eu e minhas histórias. Eu trabalhava em São Rock, na época em que eu trabalhei em São Rock, eu comecei a trabalhar em São Rock, trabalhando aqui no hospital psiquiátrico como eu te falei. E em uma época eu sai do hospital psiquiátrico fiquei em São Rock em outro emprego, teve uma época em que eu trabalhei em São Rock todos os dias de segunda a sexta, e alguns dias eu ia para Cotia, alguns dias eu ia para Ibiúna, então eu tinha 3 empregos, trabalhei muito.
P/1 - E também, uma época aqui em São Rock?
R - Isso.
P/1 - Quanto tempo de um lugar para outro?
R - Daqui a São Roque? 50 minutos, pela Raposo, mas era bem cansativo, bem puxado, mas eu era solteira não tinha compromisso com nada, morava na casa da mamãe, tudo gostoso, ali, passado, comidinha pronta, então, era um desgaste só pelo trabalho mesmo, mas da história que eu conheci meu marido foi, deixa me lembrar, 2010, foi em 2010, eu trabalhava em São Roque, e teve uma época que comecei a ir de ônibus que eu estava cansada de dirigir, e eu tinha tomada muita multa por velocidade, então eu comecei a ir de ônibus. E já tinha passado multa para todo mundo da família já tinha acabado as pessoas, agora vou ter que ir de ônibus, e eu arrumei um estacionamento no centro, então eu ia cinco e pouco da manhã e guardava meu carro no estacionamento e pegava o ônibus para São Roque no terminal , ele passava ali na lateral do terminal, e era uma segunda feira, eu tinha acho que um ano e pouco quase que eu tinha terminado um relacionamento muito longo, e na verdade eu não estava ainda muito disposta a me envolver com ninguém, então, eu estava muito sossegada da vida. E eu estava cinco e pouco da manhã atrasada, e o ônibus de São Roque se você perdesse ele era de hora em hora, então, eu só ia pegar o outro, e eu ia chegar super atrasada, tinha grupos agendados já no CAPS, e eu fui atravessando a rua e o vi do outro lado da rua, segunda feira cinco e pouco da manhã. E vi sim, um moço super bonito, de mochila a gente via muitos moços de mochila, por que era o pessoal que pega o fretado para São Paulo, pegava no mesmo ponto, então sempre tinha vários moços, os homens com as mochilas. E eu vi, achei ele bonito, mas minha preocupação era não perder o ônibus, então, eu passei por ele e cortei ele e fui rapidinho para o ponto. Eu cheguei no ponto ele também chegou, mas eu nunca tinha visto ele no ponto. Algumas pessoas você acaba vendo que já está ali todos os dias, mas eu nunca tinha visto ele. E essa bom, eu achei estranho que ele começou a olhar para mim assim, e ele não olhava de uma forma simpática, ele olhava, assim, franzindo o rosto, assim, falei “ah, senhor” e eu já trabalhava muito tempo na psiquiatria a gente falava que a gente atrai paciente psiquiátrico, eu tenho certeza que esse moço é paciente psiquiátrico, só pode, cinco e pouco da manhã olhando para mim com essa cara. Uma hora eu falei “ah, eu vou dar um sorriso, se ele quiser se aproximar ele vai corresponder ao sorriso” senão, eu olhei assim, por que eu já estava até meio receosa, e dei um sorriso e ele manteve a cara fechada, esse é paciente psiquiátrico mesmo. E nisso chegou o ônibus de São Paulo via Castelo, o que q maioria das pessoas pegam esse ônibus o de São Pulo. Ele foi para a fila, era uma fila bem grande, ele foi para a fila, e logo atrás parou o ônibus de São Rock, e eu fui, já paguei o motorista e sentei no banquinho, tinha o habito de colocar para despertar o celular por que eu ia dormindo, então eu entrava no ônibus em torno de 5 para as 6, e colocava até 6:50, e peguei, sentei e encostei a cabeça no vidro e fechei os olhos para dormir, como eu fazia sempre, e eu ouvi assim “posso sentar do seu lado?” Eu olhei era ele “nossa, psiquiátrico mesmo, estava lá na fila do ônibus para São-paulino agora está aqui” e falei para ele “, mas esse ônibus vai para São Roque, você viu?” “ah, eu vi, mas eu vim por que senão, nunca mais poderia falar com você” e a gente começou a conversar, e o ônibus de São Ro ele vai pela Raposo, ele quando chegou passando pela entrada de alumínio, a gente trocou nosso primeiro beijo, e nos trocamos telefones, e a gente começou a se falar, só que no começo, ele trabalhava em uma empresa, bem, nesse momento, ele morava em São Paulo por conta do trabalho, mas os pais dele morava em Iperó, então ele estava lá por que ele estava vindo de Iperó, e ele quase não vinha, ele falava “oh, eu vou” e no final, “não vai dar para ir por que vou ter que trabalhar de novo fim de semana” eu “ah, até parece” pensava “deve ser casado” por que nunca aparece, e assim, em uma época meio... Mas, então ele veio, uma vez para Sorocaba, e a gente se conheceu e começamos a namorar, e segundo ele já está há quase nove anos de prisão. E nos casamos em 2012. A gente tinha 2 anos de namoro.
P/1 - Olha só, muito divertido.
R - Muito divertido né?
P/1 - E algum dia, você perguntou por que ele fazia aquela cara tão seria?
R - Ele tem uma fisionomia assim, não sei se você reparou, mas ele é assim. Ele tem uma fisionomia seria assim, é o jeito dele, ele tem o formato do rosto, onde ele tem umas (preminencias) [00:55:05] osseas faz o rosto de ele ser bem marcado, com cara de bravo, e na época você não conhece, você acha que...
P/1 - Muito bom, e voltando para atividade como enfermeira, agora você só trabalha como enfermeira?
R - Trabalho.
P/1 - Ou está ali as duas?
R - Não, só trabalho como enfermeira desde que fui para São Rock, São Rock, não, desde que fui para São Bernardo, por que quando eu fui para São Bernardo, eu sai dos empregos que eu tinha e lá já tinha um emprego, por que na tensão básica a gente faz 40 hás, então, lá eu já tinha um emprego só, e voltei de lá para cá, e logo casei e logo tive o Gabriel e é o único emprego em que estou até hoje, só que hoje eu tenho uma restrição, então, eu voltei a trabalhar, por que, por conta da D.A. fiquei um ano e meio afastada do meu trabalho, e voltei a trabalhar como enfermeira, só que não trabalho efetivamente na parte assistencial do posto.
P/1 - Sim, então a gente vai chegar ai de novo. E você falou que, trabalhar como enfermeira, dependente agora dessa fase, como é para você esse trabalho, o que você...
R - Fantástico.
P/1 - No que ele é fantástico?
R - Cuidar, eu amo cuidar, eu amo as pessoas, adoro gente, adoro. Cuidar por que, quando eu trabalhava no CAPS, um dia, um paciente meu, falou uma coisa muito interessante, a gente estava fazendo uma atividade com argila, e ele falou assim “ah, hoje é você, você é sortuda hein mina” ele chamava a gente tudo de mina “e por que sou sortuda?” Ele falou assim “por que você ganha para fazer o bem” e aquilo me chamou muito a atenção. Pelo lado pessoal e pelo lado profissional, e eu acho que a enfermagem tem muito a ver comigo, por que eu sou extremamente cuidadora até de mais, às vezes até ao ponto de sufocar as pessoas então, eu preciso policiar isso, por exemplo com o meu filho, por que eu sou muito cuidadora, mas e isso não é uma coisa só com a família é com todo mudo, até o (inint) [00:57:23] fala “deixa as pessoas, deixa as pessoas” às vezes eu vejo que tem alguém na rua, e vejo que aquela pessoa está perdida eu falo “quero ir lá, quero ir lá, achar” então, enfermagem tem a minha cara, eu acho que ela é dinâmica e eu sou uma pessoa muito dinâmica, sou uma pessoa super agitada, eu não gosto daquelas coisas paradas, a enfermagem ela muda todo dia, você tem que estar super atualizado, e você trabalha muito com o cuidar, não só da saúde, mas da pessoa, às vezes, a pessoa vai lá, hoje mesmo eu atendi um caso, atendi uma adolescente e ela não tinha nenhum problema de saúde, mas é muito legal poder cuidar da pessoa, isso é muito legal.
P/1 - E as pessoas começam a ter você como referência, como que é?
R - na enfermagem, sim.
P/1 - Nesse trabalho.
R - Sim, até por que, dentro dos postos, isso é uma coisa assim, bem característica da tensão básica, o enfermeiro ele tem um papel de liderança, então, assim quem acaba exercendo bem a liderança, a gestão e a gerencia, só fluxo do trabalho, é o enfermeiro, então, a gente acaba sendo referência para toda equipe, a gente acaba sendo referência para o paciente, para a família. Por exemplo você chega em um posto você não vai direto falar com o médico, você vai falar primeiro com o enfermeiro, então, a gente acaba assim, você tem um campo de alcancei muito grande, tudo passa por você, tudo passa por você, os proble, mas as brigas, tudo passa por você, nos barracos, até nos barracos da recepção. A recepção vai te chamar, entendeu? Quebrou a ambulância, quebrou o carro no meio do caminho, e agora? Tem que arrumar outro carro para buscar o sangue, por que o sangue precisa ir para o laboratório, vamos chamar, então, você cuida de muita coisa.
P/1 - Muito bom.
R - é bem legal.
P/1 - E quando que aparece a dermatite?
R - Bom, eu sempre fui alérgica respiratória, e sempre fui muito alérgica também, das questões mesmo dermatológica, mas até então, nunca tinha ouvido falar, também assim, o que eu tinha alergia? Eu tinha uma picada de inseto, aquela coisa, focal mesmo, do contato. Quando eu fui, em 2009 ou 2010 onde eu tinha 3 empregos, eu comecei a apresentar umas coceiras inexplicáveis, “nossa, mas por que eu estou assim, ninguém me picou e eu não andei em mato” e começaram a se agravar, era uma coisa que não melhorava então, até já era enfermeira, vou passar uma deixa, mas não melhorava. E foi tomando uma dimensão maior.
P/1 - Em que ano você falou?
R - 2009, 2010. Mas, não era nada agravado, era diferente, mas não agravado. E foi quando comecei a procurar, vamos no dermatologista, para ver o que está acontecendo. No primeiro diagnostico que eu tive, “nossa, é escabiose”, falei “gente trabalhei nove anos no hospital psiquiátrico, entrava e saia do hospital, nunca peguei escabiose, agora que e eu nem trabalho dentro do hospital, peguei escabiose”.
P/1 - Por que, pode pegar em hospital essa escabiose?
R - é mais comum, é mais comum, por que assim, pela quantidade de pessoas, pelas pessoas que ficam muito confinadas, e você está em um contato próxima com paciente, nunca peguei.
P/1 - Escabiose é uma coisa que pega?
R - A sarna, é antiga sarna que falava. E falava “meu Deus, que estranho” até assim, foi “nossa, doutora, mas eu trabalhei tanto tempo dentro de um hospital psiquiátrico e nunca tive, e agora?” e olhava em minhas mãos, isso não está com cara de escabiose, ela olhou assim “então, quem é a medica aqui sou eu” eu quis supor, eu já não quis mais voltar nela. Até então, eu passava sempre com ela, mas tudo bem, eu segui o tratamento, eu sou assim, eu vou seguir para depois falar que não deu certo, se eu não seguisse o que eu ia falar? Como você sabe se não deu certo? Você não seguiu. Quando eu passei as loções que são para escabiose, aquilo me abriu inteiro, por que eu tive reação, das loções, e eu já estava com a apele bem, tipo, delicada. Não estava em uma coisona, mas estava. E então, virou uma pipoca, aquilo.
P/1 - Nas pernas?
R - começando nas pernas. E, procurei outro dermatologista, e ela falou que tinha um pouco também de placa nos cotovelos, ela falou isso é psoríase. “Psoríase, vamos coletar uns exames, psoríase, vamos usar isso” eu “psoríase, não tem como, cara de psoríase, mas está bem vamos lá.” E fomos para um terceiro dermatologista.
P/1 - Você passou as coisas que ela mandou ou não?
R - De psoríase? Passei. Uma das pomadas acabava aliviando pela hidratação, mas o problema continuava. E na terceira dermatologista que eu fui, acho que foi em São Bernardo, ela falou “olha, eu acho que você está com alguma coisa mais grave, eu acho que é alguma doença autoimune, e acho que é lúpus” “nossa, tive um treco” tinha acabado de começar a trabalhar lá, até minha chefe falou, “não, vai para Sorocaba, procura um médico, vamos fazer uma avaliação melhor” por que eu fiquei extremamente assustada. Então, já tinham me falado da doutora Andreia, que é a dermatologista, doutora Andreia Jonas.
P/1 - Daqui?
R - Daqui. E eu vim de São Bernardo para cá, e falei “mãe, a minha chefe falou que é para eu passar no medico e só voltar depois que tiver passado e esclarecer isso de uma vez por todas o que é e poder fazer um tratamento correto” então, a doutora Andreia, olhou já estava mais agravado também, por questões de medicações erradas, a doutora Andreia falou “olha, isso é dermatite atópica, para mim isso é dermatite atópica mas eu não consigo cuidar de você sozinha, você precisa de um bom alergista, para gente trabalhar junto, por que eu vou fazer parte do seu cuidado de pele, mas ele tem que fazer uma investigação mais profundo dos seus fatores e de mais um monte de questão”
P/1 - E o lúpus, descartou?
R - Ela olhou e falou que ia começar uma investigação, na verdade ela falou que ia fazer os exames tudo, mas no primeiro olhar dela ela não achou que era lúpus, e nem eu achava que é, mas você fica impressionada da pessoa falar, mas daí que a gente começou, ela coletou material, ela coletou, eu fiz todo o exame da pele mesmo, ela coletou, ela fez raspagem do tecido da mão, do pé, fez uma série de exames, fez exames para descartar a doença auto imune, me pediu um monte de coisa. Só que você precisa não só de era comigo, você precisa passar e em um alergista. E uma amiga nossa, tinha falado do doutor Martti, e minha mãe ligou e falou “não” ele até na época não atendia o convenio que eu tinha, minha mãe falou “não, vamos pagar para ver, qual a opinião dele” e quando chegou lá, ele começou a olhar, e ele olhou para minha pele, e tem, as bolinhas, assim, mais arrocheadinhas, e falou “você é asmática” falei “nossa, nossa, o astro” achei que eu tinha vindo no medico visto um astro. E sim, ele começou a explicar, minha mãe falou “ela sempre teve bronquite” ele falou “ela não tem bronquite, ela tem asma “e ele foi explicando, lá para algumas pessoas, e explicou o que era dermatite atopica, “oh, na verdade ela é super correlacionada a doenças de base respiratória, então, no caso dela, ela veio se manifestar agora, na fase adulta, tem gente que manifesta quando criança, mas ela veio manifestar agora na fase adulta, falou que também dentro da porcentagem, pequena, mas é comum a manifestação da fase adulta, e começou a me explicar, mas foi muito difícil por que...
P/1 - Foi em pouco tempo que você passou essa, em 2010 começou? Quando que você conseguiu o diagnóstico correto com ele?
R - Foi, em 2010 e até falou só que assim, imagine você, que eu tive um super impacto por que, porque a partir de agora você não vai mais lavar sua roupa com sabão em pó, a partir de agora você não vai mais usar shampoo, porque ele fez vários exame, fez o pet, o pint, sei lá, todo o raio de teste, “oh, você não vai mais poder lavar o cabelo com shampoo, oh você não vai mais poder usar maquiagem, olha você evita comer chocolate, batata e semente, olha... “ e assim, cada exame que fazia dava uma coisa, de alergenos, sou bem alérgica a muita coisa, ele falou “você tem dermatite atópica e dermatite de contato também” e começou, e assim, eu me vi dentro de uma bolha, então, apesar de não estar em uma crise grave, para mim foi difícil, porque falei “gente, eu vivo em uma bolha” assim, eu não podia lavar minha roupa com a roupa das pessoas da casa, por que eu não podia usar o sabão comum. Não podia usar amaciante, não podia mais usar hidratante, fui super vaidosa.
P/1 - Não podia passar hidratantes?
R - Não, podia passar os hidratantes da dermatite atópica, não podia passar hidratante da natura, da boticário, eu sempre gostei de usar glamour para ficar brilhando com gliter na pele, e até então, não podia mais, não podia passar o meu hidratante, tinha que passar o hidratante da doença. E foi interessante, Marcia, que nessa fase eu acabei adotando a doença como personalidade, e foi quando eu fui devagar piorando, até chegar na grande crise em 2014.
P/1 - Como assim? Explica melhor.
R - Por que daí, eu falava assim, sabe? Eu fiquei em uma bolha, então, eu saia ia no supermercado já comprava, aquele caminhão de sabão de coco, falava “mãe, está aqui o meu sabão de coco” eu já ia na farmácia de manipulação até por que, eu já morava em São Bernardo, então, eu já mandava fazer 10 sabonetes, daquele que eu usava, mandava fazer 5 potes de creme, sem falar que é caríssimo. Então, aquilo depena você. E você não pode passear, você não pode fazer um monte de coisa, até por que eu gastava todo o meu dinheiro com a dermatite atópica. Entendeu? E eu nem estava em uma crise tão grave.
P/1 - E você disse que começou a tratar disso, como identidade, uma...
R - Uma identidade, e eu passei assim, eu ser a dermatite atópica, entendeu?
P/1 - Você ser?
R - Sim, então, “ah, vamos fazer tal” “não posso.” Eu ia fazer tudo arrisca, até minha mãe falava “deixa de ser tão rígida” aquilo assim, me consumiu, sabe? Aquilo me consumiu “ah, não posso” eu usava, nossa, sempre parecia uma arvore de Natal, mas eu não posso mais usar por que eu tenho alergia do níquel, então, tudo que foi dando, não podia mais usar, e eu não pintava mais a unha, e até então, eu era assim, uma Barbie, por que tinha o cabelo loiro de luzes, fazia cabelo todo mês, fazia unha toda semana, podia não comer, mas a unha tinha que fazer, “ah, não deu tempo de jantar”, mas fazer a unha tem que ir. E eu assumi essa identidade e isso foi muito sofrido, e comecei a tomar os benditos dos corticoides, e comecei a engordar e aquilo foi acabando com minha autoestima.
P/1 - Ele pediu para tomar corticoide?
R - Eu tomava por causa das benditas das crises.
P/1 - Mas, ainda não tinha dado crise forte?
R - Não, assim, só naipe que eu tive em 2014 não, entendeu? Eu tomava assim...
P/1 - Mas, quando dava crise?
R - Na época em que cheguei no Doutor Martti, eu comecei a usar o (credsem) [01:09:41] mais usar os comprimidos de (predsim) [01:09:44] a usar os antialérgicos. Eu te digo isso por que na crise forte eu usei tudo, eu já usei (metrotecsate) [01:09:54] usei (aciclopoesporina) [01:09:56] eu já fiz fototerapia, e estou na espera do (pilamac) que é a grande expectativa.
P/1 - Que estão desenvolvendo?
R - Isso, que na verdade já foi desenvolvido, mas pelo que a Doutora Ana, que trabalha com o Doutor Márcio falou, parece que ainda não foi liberado para (inint) [01:10:17] porque não foi precificado no Brasil. É um processo caríssimo, só vai poder ser fornecido por alto custo, se o governo fornecer para a gente, porque é caríssimo. Mas na crizona que eu tive em 2014, que foi realmente onde a dermatite atópica apareceu, porque até então, nessa época, eu acabei assumindo essa identidade, mas eu nunca tinha tido uma crise tão grave assim. E nunca tinha acometido as minhas mãos. Em 2014 começou então a acometer as minhas mãos.
P/1 - Como foi esse processo? Você pode contar para a gente? De repente, devagar?
R - Foi sofrido. Eu tive a Gabriela. 2012 foi um ano super bom. Eu tive essa crise do diagnóstico, que te falei. Depois disso eu fiquei super bem. Mentalmente só que eu fiquei carregando essa coisa.
P/1 - E você casou em 2010?
R - Casei em 2012. 2012 foi um ano super alegre para mim, então eu não tive nada. Eu estava super, casei, estava grávida, curti muito a minha gestação, não tive nada durante a gestação. Foi uma gestação mega tranquila, mega boa. Fiquei super feliz.
P/1 - Nem na pele, nada?
R - Nada, Márcia. Aí eu te digo mais uma prova que quando você controlar seu emocional, você doma muito dessa bendita DA. E aí em 2014 por algumas questões de trabalho talvez, acho que por várias questões emocionais, talvez a questão da maternidade recente, toda aquela responsabilidade que a maternidade te traz. Como eu disse para você, eu sou extremamente cuidadora, então isso pesa. Aquela responsabilidade que eu carrego comigo do cuidar. E também várias questões profissionais, acho que sobrecarga, tudo, eu comecei a ter lesões na mão. Na enfermagem a gente lava muito a mão, lava a mão toda hora. Para a gente que tem uma pele extremamente ressecada, que a DA é isso, é a pele que pede água por si só, e toda hora você lavar. E aí comecei a ter uns probleminhas, comecei a ter as primeiras fissuras, as fissuras que você coça, contamina e infecta. Então formar os primeiros processos de (inint) [01:12:49] de pus, e aí o doutor começou a me afastar de pouquinho. Eu ia numa consulta, ele via que estava pioR - “vamos afastar uma semana”, só que eu não aceitava, de jeito nenhum.
P/1 - E ele dizia que tinha que afastar por que?
R - Porque eu estava começando até a ter a contratura na mão. E como o que eu faço, eu mexia muito com a mão, não dava para mexer com a mão assim, então vamos ficar cinco dias para dar uma melhorada. Aí eu voltava.
P/1 - A contratura, por que dá?
R - Por causa da pele. Chegou um ponto em que minha pele ficou tão ressecada que ela teve um encurtamento de tecido, que foi até uma das fotos que eu te mostrei. Que também tem vários estágios da minha DA. Essa do encurtamento, da contratura foi um. Foi piorando até que um dia ele falou: “eu vou te afastar por três meses. Não dá mais para você trabalhar”. Eu falei: “não, claro que dá”. E eu trabalhava, daquele jeito. Teve um dia em que eu coloquei as luvas e fiquei assim com a mão. O dedo já não esticava mais. E aí eu percebi que eu estava muito ruim o dia em que eu fui trocar uma sonda. Eu fui trocar uma sonda, e na hora que eu fui fazer a troca da luva estéril, que a gente tem um determinado momento do procedimento em que você coloca uma luva estéril, eu não consegui colocar os dedos até a ponta da luva. E aí eu tive muita dificuldade para trocar a sonda. E aí eu tive que aceitar que não dava mais, que eu precisava do afastamento. Acho que o primeiro afastamento maior foi com três meses, mas foi muito difícil. Eu piorei muito com o afastamento, porque dentro da minha cabeça eu piorei muito. Então eu fiquei afastada um ano e meio do meu trabalho, eu fiquei sem dormir sete meses.
P/1 - Por que você não dormia?
R - Porque a gente coça demais à noite. Porque o nível de cortisol vai decaindo à noite, e quando ele cai, o se processo anti-histamínico também diminui, então a coceira piora muito à noite. E não é uma coceira como as pessoas que não têm acham. Por exemplo, o meu marido falava: “não coça assim”. Minha mãe falava: “não coça assim”. Mas eu chegava a coçar naquele muro de chapisco. Na casa da minha mãe tem aquele muro de chapisco. Sabe aquelas grades que você põe para a criança não cair? Eu acordava de madrugada e colocava as mãos ali. E foi indo assim que eu já não tinha mais mão.
P/1 - E era mais nas mãos?
R - Mais nas mãos.
P/1 - O corpo não?
R - Não. E aí foi quando realmente eu tive a crise.
P/1 - Pegou só as mãos mesmo?
R - Você tinha uma ou outra coisa no rosto, uma ou outra coisa no pescoço. A perna sempre tem, até agora se você perceber. Mas que me acometeu mesmo foram as mãos.
P/1 - E como foi que se desenvolveu?
R - As pessoas diziam: “Deus está te avisando que é para você parar um pouco para pensar em alguma coisa”, e eu não aceitava muito isso no começo. Eu tinha o Gabriel pequeno, e chegou um dia em que eu não conseguia lavar o meu cabelo. Isso é muito sofrido. Isso o que eu falei para você da questão da divulgação, as pessoas não têm conhecimento e não imaginam como ela é uma doença limitante nas formas graves. Quem tem a doença na forma grave, ela é extremamente limitante.
P/1 - E para cuidar dele nessa fase?
R - A minha mãe sempre ajudou muito, o Anderson também sempre ajudou muito. O Anderson é um apoiador muito legal, porque eu nunca acreditei num determinado momento, como eu te falei, que eu ia melhorar já. Teve um momento em que eu já achei que eu ia morrer daquilo, não achei que eu ia sair viva daquilo. Teve um determinado momento em que eu tinha certeza que eu ia morrer. Que eu não aguentava mais aquela vida.
P/1 - Mas você (inint) [01:17:15] as mãos, mas por que essa sensação que ia morrer?
R - Porque eu não dormia, eu não vivia, eu só me coçava. Imagina, sete meses sem dormir. Então aquilo para mim, tinha virado uma tortura. É uma coisa que emocionalmente te tortura. Já não conseguia mais tomar banho. Talvez por ter sido na fase adulta e eu ser muito desencanada, como eu falei para você, eu ser muita palhaça, eu nunca tive muito a coisa do preconceito. Mas chegou uma época em que as pessoas não querem pegar nada da sua mão. Teve uma vez em que eu fui pagar uma mulher na farmácia, a mulher não queria pegar o dinheiro. Eu percebi, porque a mulher falou: “pode pôr no balcão”. Então é uma doença muito sofrida, e é um sofrimento terrível, até porque eu tive quadros infecciosos graves na mão. Não sei se alguém te contou, mas tem pessoas que chegam a ficar internadas. Eu nunca fiquei. Mas ela é uma doença que tem complicações, não é simplesmente uma alergia, uma coceira. Se fosse, seria ótimo. Então eu usei o antibiótico por um bom tempo. Eu usava ele num ciclo semanal, que o doutor (Martti) [01:18:28] montava. Ele foi tentando de tudo. Só que eu fui piorando, porque o meu emocional foi piorando.
P/1 - Ele foi te afastando?
R - É, porque eu só piorava. Eu chegava para passar na perícia, um dia o médico falou: “você sabe que você vai aposentar por invalidez, não é? Nunca mais você vai voltar com isso aí”, porque eu não tinha mão mais. Eu tinha uns pedaços de dedo dobrado, e aqui era só pus e o vivo da pele. Já não tinha mais a camada de proteção.
P/1 - E as unhas?
R - As minhas unhas na verdade, se você reparar, elas ficaram todas deformadinhas. Aqui já não tinha mais pontos de dedo. Destruiu o formato do dedo. É muito sofrido. E, por exemplo, eu deitava, aí o Gabriel dormia, ele era um bebê de um ano, um ano e pouquinho, o Anderson dormia, porque ele acorda cinco e pouco da manhã para ir trabalhar. E eu não dormia. Às vezes o que eu fazia? Ligava o chuveiro e ficava embaixo do chuveiro. Só que você não pode ficar muito tempo na água, só que a água me acalmava.
P/1 - E as mãos podiam?
R - Não, (inint) [01:19:53] me acalmava. Eu chorava absurdamente embaixo do chuveiro. Eu já fiz de tudo o que você imaginava. A gente tem um grupo de dermatite atópica no Face, e aí tem as dicas. Aí tem lá: “vamos passar vinagre de maçã, vamos usar babosa, vamos usar chá de calêndula, vamos usar chá de camomila”, até (inint) [01:20:17]. “Coloca um pedaço de juba de leão”, você sai procurando, porque você está desesperada pela sua cura. Só que eu só fui piorando. Cada vez que eu ia na perícia, e tanto é verdade que eu estava ruim, porque eu nunca fui reprovada na perícia.
P/1 - E o doutor Martti, o que ele fazia?
R - Ele foi tentando entrar com outros tratamentos. Ele falou: “vamos começar com um imunossupressor”, eu tinha muito medo de usar imunossupressor.
P/1 - Por quê?
R - Porque na verdade, quando você é da área da saúde, você sabe que tudo faz um efeito positivo e também tem um efeito supernegativo. Como eu nunca tive uma imunidade legal, eu já achava perigoso desligar a minha imunidade com o imunossupressor. E ele entrou Metrotexati. Na primeira semana minha mão parecia mão de fada, aquilo é mágico, é a varinha da Cinderela. Em uma semana. Minha mão, nunca tive uma mão bonita, minha pele nunca foi grandes coisas, mas eu tinha mão. Estava começando a nascer pele. Aí na segunda semana, tive uma infecção de garganta, na terceira semana uma infecção de urina, na quarta semana comecei... não deu certo. Aí comecei a ter infecções recorrentes, porque estava usando um imunossupressor. Meu medo tinha realmente se manifestado. Ele falou: “vamos trocar, vamos usar a Ciclosporina”. Comecei a usar a Ciclosporina, também imunossupressor. No começo teve um efeito bom também, só que eu tinha muita náusea com a Ciclosporina. Não me sentia bem com a medicação. E eu usei ela por um bom tempo, até o doutor tentou insistir (inint) [01:22:16], mas começou a dar uma alteração nos exames, na parte renal, e aí teve que tirar a Ciclosporina, mas também já não estava mais respondendo. Aí o doutor falou: “vamos tentar fototerapia. Não é uma coisa que eu indico muito, mas vamos tentar fototerapia”. E tudo o que ele me indicava, algumas coisas eu já conhecia por ser da área de saúde, mas eu corria estudar mais a fundo, e aí eu vi alguns quadros bem legais de pessoas que falavam que tinha dado uma resposta com fototerapia. Então cada coisa que ele ia introduzir, que eu via que a pessoa tinha dado certo, eu criava uma expectativa igual criança esperando a bicicleta. E quando vinha a frustração, eu deprimia mais, e ela piorava mais, era um ciclo. E o doutor entrou com antidepressivo, me encaminhou para psicólogo, um monte de coisas. (inint) [01:23:26] falei: “infelizmente não é só a pele”.
P/1 - E aí você fez a fototerapia?
R - Eu fiz a fototerapia. Eu estava usando uma quantidade alta de corticoide e fui fazer a fototerapia. Eu me queimei na fototerapia. A minha pele estava tão debilitada. Na primeira sessão mesmo, que são segundos, se você ver, eu tenho fotos, parecia que eu tinha ficado dois dias exposta no sol de Copacabana. Aí eu voltei, o doutor Martti até estava num congresso, eu acho. Eu liguei para a médica da fototerapia, e ela pediu para eu ir lá para ela me ver, e o doutor não estava. Quando ela me viu...
P/1 - Foi o corpo todo?
R - Queimou, foi.
P/1 - (inint) [01:24:12] entrar com tudo?
R - Eu não lembro. Acho que a gente entra de calcinha e sutiã, me parece. E você fica assim, ela é como se fosse uma lâmpada comprida, e você fica exposto de frente e depois de costas, para que a luz possa pegar (inint) [01:24:31] e tem um especial para as mãos e os pés. E as mãos e os pés na primeira vez não tinha queimado. Ela falou: “vamos tentar fazer mais uma, já que a mão é a pior”. Mas queimou tudo, e aí eu tive uma escabiose secundária por reação da queimadura da fototerapia. Aí você imagina, uma coceira de DA, com uma queimadura, e a coceira da escabiose. E aí eu piorei de novo. E foi quando eu tive uma conversa seríssima com Deus e falei para ele que não dava mais. E eu acho que Deus foi tão sábio, porque se eu não tivesse meu filho, eu acho que teria sido bem pior. Porque eu não tinha mais vontade nenhuma de viver. Tinham dias em que eu não abria a janela, tinham dias em que eu não tinha vontade de fazer nada. Eu fazia as coisas básicas porque o Gabriel precisava que eu trocasse a frauda, que eu desse a sopa. E aí, a médica da fototerapia, o doutor Martti estava num congresso quando eu fiquei toda queimada. Ela falou: “vou te passar um antidepressivo que tem um potencial antialérgico, e que reage bem a algumas pessoas. Vamos testar?” Porque assim: “você já usou isso?” “Já.” “Você já usou isso?” “Já.” “Você já usou isso?” “Não.” “Então vamos testar esse.” Foi a única coisa. E ela me passou Doxepina. E eu mandei fazer a Doxepina, e numa primeira semana não tive resposta. O doutor Martti chegou, e ela entrou em contato com o doutor Martti. Ele falou: “vamos manter”. Porque já não tinha mais, fora o corticoide já que eu usava. Eu já estava começando a ter vários problemas por conta do uso prolongado do corticoide. Vários problemas. E quando eu tive umas três, quatro semanas de Doxepina, eu comecei a ter uma melhora. E as coisas começaram a acontecer ao mesmo tempo. Nisso eu tinha sido indicada para fazer um acompanhamento com um senhor de oração, na igreja católica, e quando eu fui esse senhor se assustou muito, porque ele nunca tinha visto nada parecido com aquilo. A gente começou a conversar, e ele fazia oração, e eu acho que aí eu voltei a ter fé de novo que eu podia melhorar, com a Doxepina, com esse atendimento de oração. E aí eu descobri uma coisa, Márcia, que eu já não tinha mais vontade de fazer nada na minha vida, e eu fui fazer uma comida. Tinha dia que eu fazia só a sopa para o Gabriel, e eu fui fazer uma comida, e eu descobri que durante uma hora e dez minutos que eu cozinhei, a minha mão não coçou. E eu achei aquilo muito legal. E no outro dia eu falei: “vou cozinhar de novo”. Só que aí eu fiquei duas horas cozinhando. E minha mão não coçou. O Anderson chegou em casa e eu falei: “Anderson, a minha mão não coçou duas horas”. Ele falou: “será que é por causa do calor, do vapor da panela? Será que a panela emite alguma (inint) [01:27:56]?” Você começa a ficar paranoica e quem vive do seu lado também, porque a pessoa quer achar uma melhora para você. Eu falei: “não sei, amanhã eu vou fazer mais”. Teve um dia em que eu cozinhei o dia inteiro, Márcia. Eu fiz tudo o que você imagina. Ele chegou (inint) [01:28:10] para a comida na casa. Eu fiz carne, eu fiz frango, fiz feijão, fiz arroz, fiz macarrão, eu fiz tudo. E a minha mão não coçou. E aí eu descobri um prazer que para mim foi mais do que terapêutico, que foi a culinária. E na verdade eu acho que ela não coçava porque era uma hora e dez que eu esquecia da DA e prestava atenção na comida. E aquilo foi me dando prazer de novo. E através da culinária eu comecei a ter de novo vontade de fazer as coisas. E aí que eu fui melhorando. Nisso eu acho que tinha um ano e um mês que eu estava afastada do meu serviço, e eu fui melhorando. Com a Doxepina eu comecei a dormir. A primeira noite que eu dormi, quando eu acordei, parecia que eu tinha ganhado na loteria, porque eu não sabia mais o que era dormir. E quem me deu muito apoio foi o pessoal do grupo. De madrugada o pessoal do grupo falava comigo. Eu fiz amizades.
P/1 - No Face?
R - É. Tem a dona Sebastiana, que é uma senhora, que eu não conheço ela.
P/1 - Nenhuma você conhece pessoalmente?
R - Não. Do grupo, não. Conheço pessoas que têm DA, mas que não querem entrar no grupo. E aí eu fui renascendo. Eu tive que voltar a trabalhar. Eu tinha um medo gigante de voltar a trabalhar.
P/1 - Por quê?
R - Porque eu fiquei um ano e meio dentro de uma caixinha. E lá o mundo é diferente, e de novo eu ia ter que enfrentar uma série de coisas, e em especial o olhar das pessoas, porque muita gente acha que: “imagina, uma alergia e ficar afastada um ano e meio? Uma coceirinha na mão e você fica afastada um ano e meio? Que coisa.” E aí você ouvia vários comentários assim, dos seus colegas, e gente que falava: “mas ontem sua mão estava boa, hoje sua mão está rasgada?” Não entende do processo da doença.
P/1 - Você falava?
R - Até que nesse momento eu estava muito fragilizada. No começo não, quando voltei. E uma das coisas que foi muito difícil para mim, eu voltei com a carta de restrição. E eu demorei uns dois anos para me acostumar com isso. Para mim era sofrido demais eu não poder fazer o que eu amo fazer, que era atender as pessoas. Atender mesmo, no atendimento, fazer os procedimentos de enfermagem. E eu fui para uma parte que hoje eu gosto muito, que é educação permanente, é onde eu trabalho com as pessoas, e eu descobri que eu posso cuidar através da informação.
P/1 - Quem te deu essa carta, o médico?
R - O doutor Martti.
P/1 - O que ele alegou?
R - Que por conta do meu problema de saúde, da dermatite atópica, e da dermatite de contato, as duas graves, eu não posso fazer esse desempenho assistencial, por conta daquilo que eu uso, da luva, de lavar a mão toda hora, do contato com os materiais que são alérgenos para mim, e que acabam ajudando a desencadear. Então no começo foi muito difícil para mim, porque era como se tirasse de mim aquilo que eu sabia fazer.
P/1 - E agora você está achando um novo propósito, e está gostando?
R - Sim. Agora já me acostumei. Até porque hoje eu consigo entender. Hoje quando eu converso com Deus, que eu (inint) [01:31:47] muito com ele, eu já não estou muito brigando com ele. Eu entendi todo o propósito dele. Ele queria me mostrar que eu sou muito mais forte do que qualquer coisa que já aconteceu na minha vida. Se eu olhar minha trajetória, eu sempre tive uma trajetória de muita luta para poder ficar viva. E ainda às vezes eu insistia em achar que a doença era mais forte do que eu. E ele já me provou várias vezes que não. Hoje eu vejo a DA como uma característica que eu tenho. Então se você me falaR - “quais são suas características?” Eu sou alegre, sou palhaça, sou risonha, sou dorminhoca, sou comilona, e sou portadora de DA. Mas é só uma característica, e é uma luta diária, mas eu aprendi a controlar muito pelo meu emocional. De vez em quando, hoje eu consigo entender que às vezes abusar de algumas coisas que eu não posso me faz bem.
P/1 - Faz bem?
R - Faz bem. Porque antes eu vivia naquela bolha: “não posso isso, não posso aquilo”. Então por exemplo, hoje quando eu quero fazer um tratamento cabelo, que o doutor Martti não ouça essa parte, eu vou lá e tomo os antialérgicos, aumento as doses, e vou fazer, porque eu vou ficar feliz porque meu cabelo está bonito. É claro que eu não posso usar tudo o que todo o mundo usa. Eu não consigo ter a rotina de beleza que todo o mundo tem, usar maquiagem todos os dias.
P/1 - Até usa de vez em quando?
R - Uso de vez em quando. Mas eu já tenho as maquiagens também. Hoje a gente tem um leque de coisas bem legais. Tem as coisas hipoalergênicas, tem as coisas que você consegue usar.
P/1 - E ainda tem que tomar cortisona?
R - Eu estou desmamada do corticoide. Quando eu tenho crise eu uso, quando eu estou começando a ter mais cortes, o doutor fala do uso ou o comprimido. Ele não gosta que eu use o injetável, porque o injetável é de depósito, é uma grande quantidade. Eu uso o comprimido pôr em torno de cinco a sete dias, e vou reduzindo. Mas eu estou desmamada de corticoide.
P/1 - E você falou que tinham alguns efeitos, só para completar todo esse quadro que você tinha. Você falou que começou a dar efeitos colaterais. O que era?
R - Tive efeitos colaterais. Eu comecei a ter uma alteração nas articulações, que segundo o ortopedista, é pelo uso exagerado do corticoide, então eu tenho algumas dores articulares, algumas coisas assim. Eu sou meio crocante. Agora melhorou bem, mas na época eu tive uma alteração hormonal super considerável, e aí a doutora falou que é como se eu estivesse numa espécie de menopausa medicamentosa. Então eu comecei a ter alteração no fluxo menstrual por conta do uso, porque eu cheguei a usar 60 miligramas por dia. É bem alto.
P/1 - E agora já está mais tranquilo?
R - Agora eu não uso mais. Demorou quase dois anos para fazer o desmame. Porque o desmame também é bem sofrido. Tanto o desmame é trabalhoso, porque você não pode tirar. Então ele é trabalhoso na dosagem, assim como emocionalmente: “e se eu tiro? E eu vou ficar daquele jeito de novo?”
P/1 - E o Gabriel? Vamos falar só um pouquinho dele, porque a gente já está terminando. Fala dele, de quando ele nasceu, até hoje.
R - É o meu presente de Deus, Márcia. O Gabriel é uma criança surpreendente. Ele, claro, não só porque eu sou mãe, mas eu acho que Deus soube colocar o Gabriel no momento certo na minha vida, porque eu acho que sem o Gabriel seria muito mais difícil. Porque eu só levantava pelo Gabriel, só fazia alguma coisa pelo Gabriel. Não era para mim mesma, não tinha vontade nenhuma. Fiquei muito deprimida. Mas eu olhava para o meu filho e via que um pedaço meu estava ali, e que aquele pedaço não era doente. Que aquele pedaço era muito saudável, que era um pedaço muito lindo. Sempre (inint) [01:35:53] o Gabriel como a melhor parte de mim. O Gabriel é a parte saudável que eu tenho, plenamente saudável. E a gente sempre teve medo dele ter essas reações, até porque eu sou extremamente cuidadora, até de sufocar. Ele tem dermatite atópica, ele tem dermatite de contato, mas graças a Deus, é bem mais leve. Também já é acompanhado.
P/1 - O doutor Martti mesmo que acompanha?
R - Ele foi no doutor Martti, ele tinha sete dias de vida? Quatro dias? Até esses dias que o doutor trocou a foto dele. Ele tinha foto de quatro, cinco dias de vida.
P/1 - É de praxe levar quando a pessoa tem bebê?
R - Ele teve uma reação alérgica na maternidade. Então a gente saiu da maternidade e já passou no doutor Martti. Aí o doutor Martti, quando eu falo: “doutor, olha (inint) [01:36:39] do Gabriel. Mas como, doutor? Eu estou cuidando, não deixo tomar banho quente, (inint) [01:36:43].” “Filho da mãe.” Ele fala: “Filho de peixe? Peixinho é. Filho da mãe. Quem é a mãe dele?” Então claro que ele tem uma predisposição, por isso a gente tem um (inint) [01:36:57] e a gente tem realmente, e aí o Gabriel me ensinou a sofrer pelo preconceito da DA, porque quando ele entrou na escola, um dos fatores que piora o quadro do Gabriel é o suor. E ele usava chupeta, então além dele transpirar aqui, que a gente transpira, ele usava chupeta, então ele transpirava mais ainda. Então ele tem sempre umas reações nessa região. Então quando ele usava chupeta eram muito fortes essas reações. E um dia ele foi na escola, e estava todo pintadinho, e no outro dia eu recebi uma carta na agenda. Era para todo o mundo, não era para mim a carta, assim: “senhores pais, viemos alertar que quando o seu filho tiver uma doença infectocontagiosa não mande seu filho para a escola”. Eu falei: “tenho certeza que foi por...” alguma mãe deve ter reclamado. Alguma mãe viu, alguma mãe deve ter questionado, e eles mandaram. E aquilo me doeu. Logo eu entrei em contato com o doutor, porque quem me acompanha é o doutor Martti e a doutora Ana, que também é da mesma clínica. Aí a doutora Ana fez uma carta, dizendo que não é uma doença infectocontagiosa, que ele não pegou de ninguém e nem passou para ninguém, e isso me doeu. E aí eu falo que senti o preconceito pelo Gabriel, não por mim.
P/1 - E aí você levou na escola, e depois não aconteceu mais?
R - Levei. Ele até hoje tem essa carta lá no prontuário. Toda vez que começa o ano eu já aviso a professora, porque ele também é super alérgico, então por exemplo, esse ano ele começou a escrever, e quando ele risca com giz, porque ele quer brincar com o giz, ele vem com os olhos desse tamanho. A professora se assusta: “(inint) [01:38:52] ele chegou com o olho normal, olha o olho dele desse tamanho”. Então toda vez que começa o ano, eu já aviso, já renovo a carta, já aviso das questões do Gabriel. Mas o Gabriel é surpreendente. Toda vez que eu acho que eu não vou dar conta, o Gabriel vem e me mostra que eu dou conta. E ele dá conta junto comigo. Foi a formatura dele recentemente. Para mim é uma alegria vê-lo crescendo.
P/1 - Vamos fechar com as formaturas? Suas e dele. Você quer perguntar mais alguma coisa (inint) [01:39:26]? Antes da gente terminar. Porque aí eu concluo daquele outro jeito.
M: Uma pergunta, mas é bem mais simples. Qual é seu sonho?
R - Meu sonho? Eu tenho alguns sonhos. Um sonho que eu tenho, é fazer o curso de chef gastronômica. E eu ainda vou fazer. É que é um curso que demanda dedicação, demanda um valor financeiro. Mas eu vou fazer, é meu sonho.
P/1 - Você continua cozinhando bastante?
R - Muito não vejo a hora de mandar meu vídeo no Masterchef. Adoro cozinhar, adoro. Foi um dos caminhos que Deus me mostrou, quando eu falei para ele que era para mostrar, ele me mostrou. E tenho o sonho de conhecer alguns lugares, e em especial tenho o sonho de ver meu filho crescer e ser feliz. Sonho muito em acompanhar, e Deus me dar vida para acompanhar cada conquista dele. Tenho o sonho de poder ter uma dimensão maior em ajudar as pessoas. Meu pai é uma pessoa que ajuda muitas pessoas, e tem coisas que ele faz que a gente toma conhecimento só quando alguém vem e conta. Então eu tenho vontade de lá na frente também poder ter uma dimensão maior, de ter alguma ação maior no cuidado das pessoas. Tenho vários sonhos.
P/1 - Você falou das formaturas, que você quando fez sua formatura ainda quis fazer outro curso para fazer a formatura, e agora o Gabriel se formou também.
R - Eu falo que eu sou muito parecida com o Pequeno Príncipe, eu adoro rituais. Eu acho que os rituais celebram a vida na essência dela, porque se você viver um dia de cada vez, às vezes você é engolido pela rotina, pelo cotidiano, por parecer que é tão banal. E o ritual dá um gosto diferente no seu dia. Então é o aniversário. Agora parece que eu estou ficando mais velha e estou vivendo mais o do Gabriel, mas se você não me desse parabéns no dia do meu aniversário, eu ficava de mal de você. E as formaturas também. Então eu fiz a segunda faculdade e foi fantástico. A formatura pela conquista, e poder levar essa conquista para os meus pais. Porque os meus pais sempre participaram de tudo comigo. Desde o comecinho. De todas as minhas lutas e de todas as minhas vitórias.
P/1 - E ver o Gabriel fazendo a formatura?
R - Foi a primeira formatura, primeira, se Deus quiser, de muitas. Aquele toquinho, aquela coisa mais linda do mundo de beca, subindo uma escada e fazendo um juramento que eu acredito que ele nem saiba realmente o que significa, e você fala: “(inint) [01:42:42] era um dia desses ele estava aqui dentro. Ele era só um sonho, e agora ele já é dono das suas próprias conquistas”. Fantástico, maravilhoso.
M: Deixa eu só fazer uma pergunta, que é a minha última pergunta. Você tem dermatite atópica, e teu filho tendo dermatite atópica. Que recado você pode deixar para uma mãe que tenha um filho que tem DA?
R - A primeira coisa é que ela seja abraçada pela identidade do filho, e não da doença, porque às vezes a gente fica tão voltado para a doença, para a DA, que às vezes você acaba deixando a identidade da criança em segundo plano. Por mais que ela seja grave, a gente vê no grupo, não sei se vocês já tiveram contato, crianças com quadros muito agravados, assim como eu tive, só que crianças com aquele quadro muito agravado. Mas enxergar a criança, e enxergar que como criança ela vai ter uma oportunidade de vida. Porque quando você olha pela doença parece que não. E é um recado que eu dou não só para as mães, mas para quem tem DA. A DA é uma característica da gente, e ela não é a maior. A partir do momento em que você aprende isso, você aprende a controlar 70% das suas crises. Ela é uma característica. Das fotos que eu separei, ela é uma foto. As outras nove sou eu mesma. Então eu acho que todos nós temos características muito melhores e muito maiores que a dermatite atópica. Acho que a gente não pode deixar ela roubar a cena.
P/1 - Para mim fechou. Eu só quero saber se você quer falar alguma coisa que eu não te perguntei, que o Alef não perguntou.
R - Eu acho que para finalizar, e acho que para fechar, como eu falei, eu coloquei a foto, Márcia, porque a dermatite é um marco na minha vida. Hoje eu acho que entendo que ela veio para me ensinar a amadurecer, para ensinar a dar mais valor em quem realmente eu sou e no que realmente eu tenho. Porque a vida é frágil para todos nós. Hoje eu estou aqui, você está aqui, ele está aqui. A gente não sabe se amanhã vai ser da mesma forma. Então às vezes a gente acaba trazendo o sofrimento como essência. A dor, ela existe, mas a gente pode tentar domar o sofrimento. E eu acho que é se aproximar sempre de quem te ama. Porque pessoas preconceituosas a gente tem demais, o desconhecimento, como eu te disse, tanto até dos próprios médicos que às vezes te fazem um diagnóstico errado e atrapalham toda a sua vida, te causam medo por outras questões, pessoas que te colocam para baixo. Então tinha gente que falava: “não tem mais jeito mesmo. Que dó, você estudou tanto para nada.” Então é se aproximar de quem te ama de verdade, porque os meus pais nunca desistiram de mim, o meu esposo tinha uma visão super legal.
P/1 - Você estava fechando como é importante, como as pessoas podem lidar de uma forma mais positiva.
R - Acho que é você enxergar que a dermatite atópica é uma característica só. E você é muito mais que ela. Você tem mil características, então ela não é a sua essência. E pelo sofrimento que ela proporciona, às vezes você mergulha na essência desse sofrimento, e ela acaba roubando todo o cenário da sua vida. E ela não é, você é muito mais que isso, eu sou muito mais que isso. E se aproximar de quem te ama, acho que é a receita para qualquer idade, para qualquer grau de DA. Porque existem muitas pessoas, o desconhecimento, a ignorância, e o preconceito, eles em determinados momentos te puxam sim para baixo, como te falei, da pessoa falar para você várias coisas: “nossa, mas por causa de uma alergia você ficou um ano e meio?” Zombar, ironicamente. E o preconceito, a pessoa falaR - “deixa o dinheiro aí no balcão mesmo que depois eu pego”. E pessoas que falavam: “que dó, você estudou tanto, para aposentar por invalidez?” E você vai comprando. Então se aproxima de quem você ama. Minha mãe, às vezes eu até me irritava com a fala da minha mãe, e em especial também do meu marido. Ele falava: “isso vai passar, você não nasceu assim. Isso vai passar, calma”. Eu engordei 19 quilos por conta da medicação. Eu falava: “eu estou horrível, eu estou gorda. Eu sou uma baleia cheia de feridas”. E (ele) [01:48:45] falava: “você não é assim. Calma, isso vai passar.” E as pessoas que te amam, elas acreditam em você, elas acreditam no seu potencial de melhora, e ela acredita que ela primeiramente consegue te ver além da doença. Então se aproxima de quem te ama, porque eu acho que é o remédio principal. Acho que é isso.
P/1 - Muito bom. A gente ficou fechando. O que você achou de contar essa história para a gente agora? Como foi?
R - Muito bom. Eu achei que eu ia chorar muito, porque para mim a DA é um divisor de águas, como eu te falei. Então foi um sofrimento tamanho. Foi uma guerra tamanha. Mas eu venço a cada dia. Cada dia que passa eu estou vencendo, e eu acho que é essa a possibilidade, como eu te perguntei, se de repente isso também poderia ser uma forma de ajudar as pessoas a conhecer a doença e entender que na forma grave ela é muito limitante. As pessoas entenderem o quanto ela transforma sua vida, então não precisa as pessoas ajudarem a essa transformação ser tão negativa. E eu acho que até profissionais, infelizmente até profissionais médicos têm um desconhecimento tamanho da dermatite atópica. Eu acho que precisa ter uma divulgação maior por parte de todo o mundo.
P/1 - Com essa postura que você assumiu, de ter ela só como uma característica, a tendência é sempre estar melhor.
R - Sim. A minha última crise, que ainda estou me recuperando, é porque eu fui num parque aquático. E aí a água do parque aquático tem muito cloro. Então naquele dia, é igual eu falei para você, hoje eu me permito fazer uma coisa que eu sei que eu não posso. Porque eu me esbaldei de alegria naquele dia. Então eu brinquei. Mesmo sabendo que depois eu ia ter. Mas assim, não vai tomar conta de mim. Eu não sou isso. Então você aprende a lidar. Você vai aprendendo a lidar. Essa semana, a mão não está lá muito legal, está cortada. Semana que vem vai estar melhor.
P/1 - E isso de fato influencia fisicamente.
R - Influencia muito. Até quando eu tenho algum acontecimento que emocionalmente me abala, você pode ter certeza que dois, três dias depois, eu tenho já umas crises de DA. Com certeza. Hoje é (inint) [01:51:31], acho que eu descobri 70% da minha cura, controlando o meu emocional e sabendo que ela é só uma característica.
P/1 - Muito bom. Obrigada, parabéns.
R - Eu que agradeço.
[01:51:47]
Recolher