Projeto BNDES 50 Anos
Depoimento de Luís Alberto Madeira Coimbra
Entrevistado Márcia de Paiva e Cláudia Leonor
Rio de Janeiro, 06/05/2002
Realização Museu da Pessoa
Entrevista BND_TM005
Transcrito por: Palena D. Alves de Lima
Revisado por Fernanda Regina
P/1 – Vou começar a entrevista do S...Continuar leitura
Projeto BNDES 50 Anos
Depoimento de Luís Alberto Madeira Coimbra
Entrevistado Márcia de Paiva e Cláudia Leonor
Rio de Janeiro, 06/05/2002
Realização Museu da Pessoa
Entrevista BND_TM005
Transcrito por: Palena D. Alves de Lima
Revisado por Fernanda Regina
P/1 – Vou começar a entrevista do Senhor pedindo para o Senhor repetir o nome completo, o local e a data de nascimento
R – É Luís Alberto Madeira Coimbra, Rio de Janeiro, nascido no Rio e a data é 7 de julho de 1940.
P/1 – E o nome dos seus pais?
R – O meu pai, falecido já, é Alberto Teixeira Coimbra e minha mãe é Maria Cecília Madeira Coimbra.
P/1 – Seu Luís, e seu pai trabalhava com o quê?
R – Na época, câmbio, corretor de câmbio. Basicamente, é corretor de valores imobiliários com ênfase em câmbio. A profissão, hoje, tá acabando; a ênfase maior são corretores de valores.
P/1 – E em quantos irmãos vocês eram?
R – Eu e uma menina, Sônia, dois.
P/1 – Como era a infância do Senhor?
R – Eu fui interno, os padres agostinianos que tinham um internato em Muquiê. É perto de Cachoeira do Itapemirim, no Espírito Santo. Tempo em que lá tinha um grêmio que reunia alunos e alunas, e eu terminei o curso aqui no Santo Agostinho. Aí, eu fiz faculdade de Economia, na antiga Universidade do Brasil, hoje UFRJ, e fui estagiário do BNDES, realizei o concurso do BNDES e me tornei economista. Depois aposentado pela Fapes.
P/2 – Mas o Senhor fez concurso para estágio ou já...
R – Para economista, na época não havia concurso para estágio. Era indicação com base no currículo, eu era bom aluno e passei na seleção.
P/1 – O que levou o senhor a cursar Economia?
R – É, em princípio era a ideia de ganhar dinheiro. Mas, depois, eu vi que ser economista era muito diferente de ganhar dinheiro. Ao longo do curso, pelas extensões que eu participei, depois no BNDE, eu vi que ser economista é bem diferente da minha ideia inicial. Ser economista é atuar num social bem maior, visando a correção de uma série de problemas que o país tem, a sociedade tem. É diferente...
P/1 – Bem diferente... E o pai do Sr. incentivava a carreira?
R – Não. Naquela época, os pais queriam que o filho fosse advogado, engenheiro ou médico. Mas, nenhuma das três alternativas me atraia. É bem verdade que eu frequentei um cursinho pré-vestibular voltado mais para Engenharia. Chamava-se, na época, PH, eram as iniciais dos donos do curso e era voltado, como eu disse, para Engenharia. Mas, Economia me atraía mais, então eu larguei o curso pré-vestibular no final e fiz só Economia.
P/1 – E depois o Sr. fez pós-graduação?
R – É, mas já no BNDE, fiz um mestrado em São Paulo promovido pelo, um dos promotores era, acho que o (Pirge?). Então, fiz o mestrado lá na USP, mestrado em Desenvolvimento.
P/2 – Já ligado ao seu trabalho?
R – Já ligado ao meu trabalho no BNDE. E o curso, tinha bolsa, foi promovido pelo BNDE. E no final do curso, então, eu fui para o Nordeste inaugurar o escritório de Recife.
P/2 – Só um minutinho, vamos voltar... O senhor foi o primeiro lugar no concurso no ano, quando foi?
R – Eu acho que foi 65, não sei.
P/2 – Tava vendo aqui pelo... 66, aqui pelo seu currículo.
R – ________ né? O currículo é mais certo.
P/2 – Foi uma prova difícil, como é que foi?
R – Não, eu tive, eu estudei muito, então foi possível, estudando você passa. Eu fui também, na Universidade, o melhor aluno da turma, então eu gostava de estudar. Aliás, era uma opção na época, o concurso. O setor público estava crescendo na época, as seleções eram através de concurso, então tínhamos que estudar para participarmos do concurso e, se quiséssemos trabalhar no setor público, então, passar no concurso e trabalhar no setor público. E no BNDE, naquela época, a maior parte era concursada, alguns entraram em empresas paralelas, tipo Ibramec, Fibase, BNDESPAR... Então, ali não havia necessidade de concurso, era seleção com base em título, em currículo etc. Mas, no BNDES, somente havia concurso.
P/2 – Conta para a gente um pouco, então. Quando o senhor entrou, o senhor foi trabalhar, assim, em linhas gerais, a sua trajetória, em que setor o senhor foi trabalhar?
R – Bom, inicialmente, como todo estagiário, eu trabalhava, no meu caso, muito na área de estudos do Departamento Econômico, no Departamento de Operações Internacionais. Depois, fui assessor de um Diretor e trabalho __________ era mais voltado para analisar o que tinha sido feito. Posteriormente, eu fiz o curso em Desenvolvimento na USP,
como eu disse, e fui inaugurar o escritório do Nordeste. Pegava Norte e Nordeste, onde o BNDE buscava ter uma atuação maior, mais intensa. Havia o desenvolvimento do Polo Petroquímico da Bahia e outros projetos, e eu representava o BNDE nos conselhos da Sudam e da Sudene, procurava entrosamento maior no Nordeste com o BNB e com a Sudene no Norte. Com o ___________ era o banco da Amazônia e a Superintendência de Desenvolvimento na Amazônia, a Sudam.
P/2 – Como é que, vamos só para a gente tentando ir quebrar por parte essas informações que o Sr. está passando... Como foi a criação desse escritório? Foi a partir de uma discussão do banco, existia essa proposta de levar o desenvolvimento para outras regiões já desde o princípio, como é que era essa política?
R – Está bem, vamos voltar um pouco. O BNDE era, no meu entender, o principal instrumento financeiro que o governo brasileiro tinha numa atuação de longo prazo. Então, entre os vários problemas do país você tinha, e ainda tem, desigualdades, do ponto de vista social, pessoal, regional principalmente, setorial. Mas, o BNDE como instrumento de desenvolvimento financeiro, desenvolvimento a longo prazo, olhava para essas desigualdades. Então, havia necessidades de uma atuação mais efetiva, mais intensa no Nordeste e no Norte, principalmente no Nordeste onde a população era maior e as diferenças pessoais de renda eram maiores. Então, aproveitando características regionais, houve uma atuação mais intensa do banco nessas áreas. No caso da Bahia, por exemplo, foi o Polo Petroquímico, procurou-se desenvolver em Natal, no Rio Grande do Norte, esse era um Pólo trecho. E por aí foi no interior de Pernambuco, lá em Petrolina, Juazeiro, havia uma região do baixo São Francisco de frutas tropicais com base em irrigação. Então, houve uma atuação intensa do BNDE naquela época, procurando reduzir esse desequilíbrio regional. A participação do Nordeste no total das aplicações do banco cresceu, embora os problemas maiores continuassem no Centro-Sul, no Nordeste eram mais os desequilíbrios que permanecem até hoje, né?
P/2 – E aí, a criação do escritório foi a partir desse aumento também de apoio?
R – É, o aumento dos investimentos na região. E o escritório facilitava o entrosamento com o BNB e a Sudene do Nordeste e o Banco da Amazônia (Basa?) e a Sudam no Norte, porque esses dois instrumentos que o governo possuía eram administradores, basicamente, dos incentivos fiscais que havia para as regiões. A Sudene no Nordeste e a Sudam no Norte.
P/2 – E a relação do BNDES com a Sudam e com a Sudene era uma relação direta?
R – É, começou a ser mais intensa, vamos dizer assim, mais frequente uma discussão sobre os projetos mais viáveis, sempre havia um entrosamento entre o banco, o BNB e a Sudene no Nordeste. E o banco, o BNDES, o BNDE na época, o (Basa?) e a Sudam no Norte. Então, basicamente, o escritório do Nordeste veio para viabilizar essa aproximação.
P/2 – Então, foi em que ano a criação do escritório do Nordeste?
R – Foi, acho que em janeiro ou fevereiro de 73.
P/2 – E o senhor como é que foi? Foi com uma equipe, foi sozinho?
R – Não, eu fui sozinho.
P/2 – Conta para a gente, como é que foi a montagem lá? Foi difícil?
R – Não... lenta, né? Demorou creio que dois meses, porque foi escolhido o local, foi escolhida a equipe que ia ficar... mínima, né?
P/2 – Uma equipe local?
R – Local. Um rapaz que fez o curso de Desenvolvimento comigo em São Paulo, na USP, foi para lá. Eram novos, alguns ainda estão lá.
P/2 – E era um escritório, no início com quantas pessoas mais ou menos?
R – Cinco a sete pessoas, incluindo secretária. Era pequeno, hoje eu não sei como é.
P/2 – E o senhor estranhou mudar assim?
R – É, do ponto de vista pessoal sim, porque é... Mas, do ponto de vista profissional era um desafio, porque fazia parte da minha visão futura de país. Só que a geração é meio fracassada, porque se naquela época fez-se algo, o problema que persiste até hoje. São 30 anos, em história isso é pequeno. Mas, os desequilíbrios regionais ainda existem. Hoje, o banco é privado, o BANDEP. No meu entender, acho que as regiões menos desenvolvidas deveriam ter os seus, não um banco de desenvolvimento como um banco comercial, mas bancos de desenvolvimento que tivessem também a parte comercial, porque da parte comercial se ganha, se faz resultado, e você transfere aquilo para um banco de desenvolvimento. Fora o instrumental que você possui para desenvolver a região, às vezes a empresa precisa de um capital a curto prazo e o banco comercial permite isso, o banco de desenvolvimento gerencia recursos mais a longo prazo, para investimento basicamente. Então, o desafio profissional era muito motivante.
P/1 – O que é que o Sr. mais estranhou de sair do Rio de Janeiro e ir para lá? Pessoalmente, assim...
R – Eu gostei de lá (riso).
P/1 – Mas, assim, teve algum estranhamento com comida, alimentação, temperatura...?
R – Não... Mesma paquera que, na época, havia lá no Rio e lá é uma sociedade mais fechada. Pernambuco, veja, no Nordeste, é onde a oligarquia funciona, funcionava, né? Estou falando de trinta anos atrás... É o Estado no Nordeste onde a oligarquia é mais forte, então, você tinha os seus negros, os João Santos, enfim, os industriais. Todos eles eram separados de um povo, em geral, havia uma distinção muito grande entre oligarcas e trabalhadores, enfim, comerciantes etc. No Nordeste, como eu disse, era onde isso era mais visível. Hoje, eu não sei como está, mas, na época, era. Acho que em outros lugares...
P/2 – E o senhor teve, enfim, acesso a esses empresários de uma forma fácil?
R – Muito grande, muito grande o apoio ao banco.
P/2 – Foram receptivos?
R – Foram, foram muito. Não só na história do BNDE, como depois no Banco do Estado do Pernambuco. Eu consegui, nós conseguimos, a equipe, que um aumento de capital do BANDEP fosse todo realizado com recursos do setor privado e não do governo. Quer dizer, hoje eu vejo que, ao invés de fecharem os bancos estaduais, era muito mais interessante que proibissem ou limitassem a ação do governo do Estado no banco e não acabar com o banco, privatizar o banco. Especialmente em regiões menos desenvolvidas. No caso de São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, o banco do Estado pode ser privatizado e talvez deva ser privatizado, mas não em regiões menos desenvolvidas, tipo Maranhão, né, tá em moda... e Ceará, Natal, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Paraíba, vi... Porque o que acontecia é que quando você tinha a cobertura de um governador, num banco de Estado você podia fazer muito pela região, querendo.
P/2 – O senhor citou o Pólo de Camaçari, eram investimentos mais dirigidos a quê? A um lado... Qual era, mais ou menos, o equilíbrio dos investimentos? Em infraestrutura também?
R – Não, veja, o Pólo de Camaçari, que você citou, tinha uma origem, você tinha a matéria-prima, boas empresas do Sul, ou seja, bons empresários e o apoio do governo, grande. Então, o Pólo Petroquímico de Camaçari cresceu rápido. Em outros casos, tipo em Juazeiro, Petrolina, lá no interior de Pernambuco e da Bahia, que eram parte do São Francisco, demorou mais. Acredito que algumas empresas foram, algum empresário que começou não foi aquele que acabou com o projeto, alguns mudaram de mãos, de propriedade, há algum tempo. Mesma coisa a parte têxtil em Rio Grande do Norte e Ceará, então eu acho que o empresário faz diferença e lá havia muita pequena e média empresa para os padrões do BNDE a nível nacional. Então, você tinha que apoiar empresários pequenos e médios que tem uma cabeça distinta do grande empresário, do empresário de sucesso de São Paulo e do Rio. Então, à assistência financeira nós teríamos que agregar a assistência técnica para que a empresa florescesse...
P/2 – Desses pequenos e médios empresários...
R – É que são quase todos lá, relativamente a São Paulo. E havia pouco, embora...
P/2 – E o banco estava incentivando essa diretriz?
R – Havia muito pouco... Na época foi criado o Sebrae, se fazia alguma coisa ainda em assistência técnica, mas muito pouco ainda. Eu creio que o ideal era perdurar mais isso, intensificar a assistência técnica aliada à assistência financeira. Houve muito pouca assistência técnica, quando havia, a perspectiva, a possibilidade de sucesso era muito maior.
P/2 – E o Funtec, nessa época, ainda estava também...
R – Começando...
P/2 – Começando?
R – Começando, tudo começou nessa época. Era a Funtec e era...
P/2 – O senhor chegou a passar pelo Funtec também?
R – Passei, mas o Funtec era mais voltado à tecnologia, né, e mais aqui no Centro-Sul. E o Funtec procurava apoiar centros de excelência, era um pouco diferente. Então, aqui estava tudo mais perto, era a (Cope?), a Unicamp, enfim, e por aí ia. Depois virou a Fidep, o Fundec, virou a Finep, né. Mas, voltada muito para a tecnologia e lá era periferia, então a perspectiva era de consolidar antigos projetos. Um empresário, mais ou menos, você já tratava com carinho, no sentido de, dava ali assistência técnica, se possível, e financeira. E o banco do Estado, o BNB, o Basa [Banco da Amazônia], tinham a possibilidade de apoiar também a agricultura, pequena agricultura. Daí, como eu disse, a importância desses bancos no desenvolvimento das regiões menos desenvolvidas.
P/2 – O banco trabalhava junto com o Bandep, já? Como é que é essa...
R – É, aí o BNDE, na época não tinha o S do Social, fazia repasses. Tinha um programa específico, chamado Porc - Programa de Operações Conjuntas, que fazia repasse às instituições e as instituições, então, canalizavam esses recursos para os projetos, para a parte de investimento. A parte de giro, a parte comercial, tinha que ser dada pelo próprio banco do Estado, não? Isso era importante, eu me lembro que, ainda em sentido ao Bandep, pelo BNDES, eu fiz uma pesquisa de aplicação em agricultura em cima dos bancos privados e observei que em mais de 99,9% dos recursos eram canalizados para Recife, a capital. Que era onde estavam as administrações das usinas. Então, a pequena e média agricultura não tinham apoio nenhum no setor privado, então o setor estatal é que tinha que dar o apoio. E nós vemos uma privatização geral aí discutível em alguns casos, né... Como eu falei, jamais deveria ser feita nesses bancos tipo o Bandep e o outro, de Estados em desenvolvimento. Telecomunicações eu não vou me envolver, mas energia elétrica tem havido dúvidas, não? Então, não sei se o processo de privatização foi ideal. E vejo hoje o BNDE, vejo, ouço, enfim, participando menos, a longo prazo, das ações de governo. Enfim, a Caixa Econômica Federal, na área social principalmente, participa muito mais do que o BNDE na área de indústrias. Vejo o BNDE participando na transferência de ativos de um governo, né, setor público para o setor privado, estimulando a empresas participarem desse processo, ao invés de tentar criar ativos... Isso comparando o BNDE de então com o BNDE de agora.
P/2 – É a principal mudança que o senhor..
R – É, eu vejo isso, eu vejo mais o BNDE, como eu disse inicialmente, um instrumento financeiro do governo. E o governo hoje está mais, muito mais preocupado com as ações de curto prazo, curto e médio prazo, do que com as de longo prazo. Então, a estabilidade era básica, era importante, é, mas é parte do todo. A estabilidade é a curto prazo, a longo prazo é o crescimento econômico. E não vejo o governo tão preocupado com o crescimento econômico, com as diminuições de desemprego, as diminuições de desequilíbrios sociais, pessoais, regionais.
P/2 – O senhor acha que, naquela época, a política para tentar resolver o problema do desenvolvimento regional era mais discutida do que hoje?
R – Ah, muito bom, muito bom.
P/2 – Então, conta para a gente um pouco mais dessa discussão naquela época...
R – É, naquela época...
P/2 - O senhor falou também do incentivo ao pequeno agricultor, né...
R – É, isso não existe.
P/2 – Quais eram os...
R – Não existe, hoje não existe. E, naquela época, havia umas tentativas frustradas. Você vê, o BNDE foi criado em 52, dentro do Plano de Metas, e era o instrumento financeiro do Plano de Metas. Então, tínhamos pontos de triangulamento na Energia, nos Transportes, principalmente. O BNDE estipulou muito esses, vamos dizer assim, superar esses (Boton X?), esses pontos de triangulamento. Hoje você continua com pontos de triangulamento, o setor externo, por exemplo, é um exemplo bom. Porque existia, naquela época, o problema, e hoje continua a existir, então você, naquela época, tinha como instrumentos de desenvolvimento a Ibramec, não? De um BNDE que permitia a montagem, o financiamento e participação de grandes empresas exportadoras. Era um, sei lá, (Villares?) (Bardelo?) e outras, e a Fibase que estimulava o Pólo Petroquímico da Bahia etc., de Camaçari, enfim, e outras empresas. Num processo geral de substituição de importações, ou seja, gastar menos divisas lá fora. Isso hoje existe, só que você tem que continuar estimulando exportações e, no meu entender, substituir algumas importações para resolver ou diminuir o problema externo. Estou citando o problema externo, mas tem outros, os desequilíbrios regionais continuam, né? A atuação do BNDE no Norte e Nordeste é mínima, poderia ser maior. Eu acho que é assim, não sei.
P/2 – Quantos anos o senhor ficou no escritório lá no Nordeste?
R – Dois.
P/2 - Era chamado escritório do Nordeste?
R – Era. Era Nordeste e situava Norte e Nordeste.
P/2 – E quais eram os Estados principais, assim, que o escritório...
R – Bahia, porque... Bahia, Pernambuco e onde eram as reuniões da Sudam da... Mas a grande...
P/2 – Principalmente Bahia e Pernambuco?
R – É. A grande vantagem que eu vejo é que permitiu ao escritório, permitiu ao BNDE, uma aproximação com o BNB – Banco do Nordeste, com os bancos regionais e com a Sudene, no Nordeste. E, lá em cima, com a Sudam e com o Basa menos, né. Agora, por quê você perguntou, eu fiquei até terminar o mandato. Aí mudou o governo, saiu o Presidente do BNDE, o Marcos Vianna, e eu saí também. E, daí ficou, tive um convite para dirigir o Bandep, então foi eleito aqui, vim um pouco para o Rio, me lembro que eu saí do escritório porque vim para a Área de Planejamento no Rio que era o Saturnino...
P/2 – Você saiu de lá, do escritório?
R – Isso, isso.
P/2 – Então ainda passou por aqui. E o Marcos Vianna saiu?
R – Não, ainda estava.
P/2 – Ainda estava... O Sr. voltou antes, né?
R – Voltei, porque o Saturnino Braga, que era o chefe da parte de Planejamento, foi eleito Senador. Então, o Marcos Vianna me chamou para dirigir o Planejamento, quer dizer, cheguei a voltar para o Rio. Aí, isso em 75, o governador Moura Cavalcante me convidou para dirigir o Bandep, aí eu escolhi, larguei o Planejamento e fui para lá. Fiquei quatro anos.
P/2 – O Sr. foi cedido ou foi...
R – Cedido.
P/2 – Aí ficou quatro anos no Bandep?
R – Isso.
P/2 – O Bandep já trabalhava também com o BNDES?
R – Trabalhava pouco.
P/2 – Tinha parceria ou não?
R – Não, não, não, trabalhava muito pouco.
P/2 – E aí, o Senhor ficou então no Bandep, quatro anos...
R – Tive apoio do BNDE, do BNH, da Caixa, de todo mundo, para reerguer o banco, né? Que estava muito ruim. Foi da época que lá houve o problema de um Senador que foi cassado, lembra? O pai desse Carlos Wilson, era o Wilson Campos.
P/2 – Ah, o Wilson Campos, acho que agora está vindo o nome...
R – É, foi cassado...
P/2 – Foi naquela época?
R – É, foi naquela... antes, né? Aí, eu fui e peguei o banco muito ruim... Porque é fácil fazer, é mais fácil você recuperar algo ruim do que algo que vai bem, né? Então eu fui para lá. Aí, quando terminou, em 79, a opção minha foi ir para o setor privado, para uma empresa de família lá de São Paulo, técnico, porque havia uma briga de acionistas do meu tio, os filhos dos sócios dele, enfim... Mas, o... hoje é vice-governador, o Marco Maciel, convidou para dirigir a Asa lá em Pernambuco, que era uma empresa de alumínio, ou ser diretor da Fibase. Mas, como eu não tinha experiência de setor privado, preferi o setor privado. E era de um tio meu, enfim, estava envolvido, por isso...
P/2 – E, aí, o Senhor, depois, não retornou mais ao banco?
R – Não, fiquei cedido.
P/2 – Foi cedido.
R – É, cedido, aí pede licença, né, dois anos... Aí, teve um chefe de departamento que pediu para ficar, para que eu saísse para contratarem outro, aí eu saí, mas pagava a Fapes, né?
P/2 – Mas, o Senhor continua, então, trabalhando também, pelo... lá por Recife.
R – Não, aí eu trabalhei na Mesbla.
P/2 – Aí voltou para São Paulo, voltou para a Mesbla?
R – Não, voltei a São Paulo, fiquei lá acho que quatro anos, 79 a 83, em 83 fui para a Mesbla. Aí, saí um pouco antes da falência, três anos antes. Aí trabalhei num negócio de cobrança, mas aí estavam me roubando e eu preferi cair fora (risos)
P/2 – Mas, me diga então, vamos só tentar recuperar algumas coisas, assim... Na época do seu concurso, quando o Senhor entrou mesmo no banco, qual era o foco principal de atuação do banco?
R – Eu trabalhava no Departamento de Operações Internacionais. Aí, eram basicamente _________
trigo, na época os Estados Unidos vendiam trigo para o Brasil e o dinheiro era reaplicado no Brasil via BNDE. Era a integração da América Latina, hoje tomando forma via, através do Mercosul, e alguns estudos regionais objetivando essa integração, como o Mercosul. Então, tinha muita área de muita pesquisa. Também foi a época que o americano liberou mais recursos para o Brasil, o BID principalmente. Então foi da época que se começaram __________, teoricamente, pequena e média empresa no Brasil. Mas, na época, pequena e média empresa eram grandes empresas médias.
P/2 – Como o quê, por exemplo?
R – Tinha uma que me lembro... uma de São Paulo... tem várias, qual era o nome... Pô, são trinta anos... (risos)
P/2 – Mas, assim, um grande projeto.
R – É, eram empresas médias, grandes, não? Basicamente em São Paulo. Então, tinha uma que eu visitei, de...
P/2 – O Senhor viajava fazendo acompanhamento, também, das operações?
R – Algumas, alguns projetos. É essa, uma de impressão ou de papel... O nome do cara era ____________ de muita inteligência... Ah, não, a cabeça agora... não vem. Mas, o Fipeme, que era para a pequena e média empresa, no fundo, apoiava grandes empresas privadas e o BNDE trabalhava mais nos pontos de triangulamento direto. Eram grandes projetos. Então, na época, eu desenvolvia um trabalho, chamou-se __________ , que dava ênfase à assistência técnica. Cuja, eu tenho a impressão que foi a origem do Sebrae, mas não tenho certeza sobre isso.
P/2 – E como é que era esse projeto? Era...
R – Era um programa...
P/2 – Tinha mais empresas que o banco apoiava?
R – Assistência técnica às empresas que o banco apoiava.
P/2 – Mas, era um grupo que fazia o acompanhamento ou que tinham cursos, como é que funcionava?
R – Não, o programa em si não funcionou, não foi a fonte, entendeu... Visava mais a assistência técnica, a esses... Aliada à assistência financeira para a pequena e média empresa. Mostrava-se que o Fipeme, que era para a pequena e média empresa, ele acabou se deixando nas grandes empresas.
P/2 – A Fipeme estava começando naquela época, né?
R – Estava, estava, começou.
P/2 – E ela, o quê é, é na década seguinte que ela realmente se reposiciona mais?
R – Ah, eu não sei, eu não sei.
P/2 – Lá, por exemplo, quando o Senhor vai para Recife, aí ela já tem uma outra...
R – Aí, para lá eram os repasses, né, que permitiam a nós apoiar todo e qualquer oiapoque. Eu creio que o BNDE notou, observou, a administração do banco, né, observou que não atuaria diretamente com pequenas e médias empresas, a não ser via bancos. Então, passou a usar esse sistema de repasses que hoje continua, envolve muito o setor privado, mais que o setor público. Agora, se você observar, você nota de 60 para cá que o setor público diminuiu, ou de 80 para cá, né, diminuiu em benefício do setor privado que cresceu. Isso, a longo prazo, no meu entender, foi ruim porque alguns outros triangulamentos nossos, tipo o setor externo, desequilíbrios regionais etc., onde a rentabilidade é baixa, foram colocados de lado. O setor privado olha mais o lucro, olha sempre o lucro, e tem que olhar, porque o gerente do setor privado tem que responder a acionistas que querem cada vez um lucro maior. O setor público não, o governo é muito paternalista, né, olha mais o desenvolvimento do país, da sociedade etc. Eu acho que, como país, o governo e o BNDE, como instrumento financeiro, estão muito dedicados à privatização ao setor privado e esquecendo alguns projetos. Embora, sejam os mais lentos projetos. O Gasoduto com a Bolívia, desde aquela época pensava-se nele, e só agora é que está sendo implantado, tão a longo prazo... Mas, muita coisa foi gerada naquela época.
P/2 – Conta, então, um pouco dessa época.
R – Tipo o Mercosul, né, antes tinha um outro nome.
P/2 – E de, assim, de projetos públicos?
R – Ah, estão levando o Gasoduto com a Bolívia, né? Naquela época era pensado, discutido e já havia projeto. E levou o quê, trinta anos para ser implantada, né? Outros projetos, as usinas elétricas todas, aproveitamento dos rios, tornar os rios mais navegáveis é outra atuação que o BNDE poderia estar atuante...
P/2 – Nas Hidrovias?
R – É, tipo Hidrovia. Transformar, embora os nossos rios sejam caudalosos, sejam rios de planalto. Há a perspectiva, a possibilidade de uma atuação mais intensa para nivelá-los mais, para transformá-los em hidrovias, né?
P/2 – E, naquela época, chegou a se fazer algum projeto de Hidrovia?
R – Não, nada. Nem naquela época, nem agora, nem até agora, nada.
P/2 – Tem a Hidrovia do Madeira, né, do Rio Madeira, tem algumas que...
R – Não sei. Mas, independente do BNDE. Naquela época tinha um programa de estradas vicinais, que é importante, que eu acho que parou.
P/2 – Foram muitas estradas? Essas passaram pelo escritório lá, ou não?
R – Na época não, poucas.
P/2 – Então, qual era o principal polo do escritório?
R – A principal atividade era o Polo Petroquímico de Camaçari e os repasses aos bancos estaduais, onde o escritório procurava melhorá-los. Melhorar a eficiência dos bancos estaduais, que eram precários. Em alguns casos, buscava a fusão entre... porque tinha banco de desenvolvimento e banco de estado. O ideal, ainda, nessas regiões é a fusão, o banco comercial ou de estado ser também banco de desenvolvimento. Mas, como você precisava criar emprego, para o governador era bom ter o banco de estado e o banco de desenvolvimento, que eram mais empregos que ele poderia colocar à disposição dos correligionários. Enfim, era...
P/2 – Muito tempo se insistindo naquele problema da seca, onde se investia dinheiro, se canalizava dinheiro para aquilo e aquele dinheiro...
R – Então, o dinheiro ia para as oligarquias. Para algum lugar vai, ia. Só que as oligarquias estão em processo de morte, lenta mas progressiva. Então aqueles oligarcas de, sei lá, do século XIX, mil e oitocentos, mil e setecentos, hoje não existem mais. Têm algumas restantes que vão acabar um dia, né, os Sarney no Maranhão... Mas, é geração...
P/2 – E o Senhor chegou a sentir, também lá, um pouco esse clima desse poder, dessas oligarquias?
R – Sem dúvida, sem dúvida. Lá eram os grande usineiros, que hoje ao que parece, pelo que eu sei, estão sendo extintos. No outro dia eu vi que várias usinas daquela época, que haviam, que exploravam a mão-de-obra do corte da cana-de-açúcar, estão desaparecendo. O poder das usinas junto ao ____________, o antigo Instituto do Açúcar e do Álcool, não existe mais.
P/2 – O Senhor chegou a pegar o Programa do Álcool, o Proalcool, no ano que estava começando? Conta um pouquinho do Programa do Álcool.
R – É, por exemplo, o álcool foi um programa criado nacionalmente pelo Ministro Severo Gomes e que tinha o (Bellotti?), o outro rapaz que trabalhava lá, enfim, um rapaz do banco. Alguma coisa conseguiu-se, algumas usinas foram beneficiadas. Eu me lembro, por exemplo, do Othon Bezerra de Mello foi uma usina beneficiada, mas que está acabando e algumas outras. Porque eram recursos de longo prazo mas que, no fundo, serviam para pagar dívidas do setor junto ao IA e junto a terceiros ou __________ para desviarem recursos. O problema do álcool é que tem um resíduo do álcool, que eles chamam de borra, que nós tentamos com o Grupo Ermírio de Moraes desenvolver o aproveitamento. Era uma pesquisa que entrava o Bandep, o Grupo Ermírio de Moraes e os usineiros, que era esse aproveitamento da borra. Mas que, pelo que eu sei, não deu em nada. Mas, veja, era uma pesquisa que você participava e é tarefa do banco de Estado ter lucro zero, teoricamente próximo a zero, porque você transfere o resultado para a parte de desenvolvimento, a assistência técnica, pesquisa a longo prazo, que pode dar certo e pode não dar. E foi isso que se fez lá, lá tendo o projeto do álcool tentou-se desenvolver esse aproveitamento da, chamava borra, um resíduo que gera impacto na terra, estraga a terra, enfim, e que pelo que eu sei não evoluiu... (Copebo?) eu acho, porque a (Copebo?) que tinha lá usava o álcool como matéria-prima para produtos químicos tipo borracha e outros. Porque Pernambuco era muito irregular, a topografia, então o rendimento era baixo comparado com Alagoas, por exemplo, que são grandes platôs, fica mais fácil mecanizar o corte da cana. E é aí que você tinha um rendimento baixo na indústria agroaçucareira de Pernambuco. Mas, enfim, tem uma série de setores que você pode dinamizar e que, como eu falei, tem insumos ou tem mercado externo. Hoje vejo lazer, já que frutos tropicais irrigados do São Francisco já é uma realidade.
P/2 – Pois é, essa já é uma região que está com um tipo de desenvolvimento e toda uma infra-estrutura dando certo. Ainda hoje se define, até por uma questão de investimento, as regiões pela própria geografia de Nordeste, ou se procura mapear o Brasil de acordo com as regiões que estão tendo desenvolvimento ou não?
R – Como?
P/2 – Por exemplo, se você pegar Petrolina, essa área de Petrolina e Juazeiro tem o maior desenvolvimento, mas ela ainda fica... ela é mapeada de uma forma diferente ou continua sendo Nordeste, região de baixo desenvolvimento?
R – Aí tem o Nordeste, que eu saiba. Agora, está mais desenvolvida do que Montes Claros, em Minas, do que o resto do sertão de Pernambuco, Cabrobó e outras áreas em que a terra... estão desenvolvendo mais.
P/2 – Pois é, essas ilhas estão desenvolvendo o quê?
R – Maconha, dizem... (risos)
P/2 – Está dando certíssimo?
R – Estão com alta rentabilidade! (risos) Então, você tem que jogar uma estrada para lá... Agora, existem microclimas e regiões que você pode desenvolver pequenas e médias empresas para atender aquele mercado. Segue um exemplo, Garanhuns, por exemplo, e outras localidades... Agora, é difícil privatizando um banco de Estado, um banco nunca vai abrir uma agência num local distante, de pouco atrativo. Quando o que eu entendo, para abrir uma agência, tem que ser mais um instrumento de desenvolver o Estado. Por isso, essa privatização nos Estados menos desenvolvidos é discutível.
P/2 – Senhor Madeira, o nosso tempo está terminando...
R – É, eu fico...
P/2 - É muita coisa para falar...
P/1 – Que bom, né?
P/2 – Deixa só eu lhe perguntar, como é que o Senhor vê então o papel e a atuação do BNDES ao longo desse processo histórico desses últimos anos?
R – É, olhando assim eu vejo o seguinte; primeiro, o S de BNDES é discutível porque hoje a parte de Educação está mais ligada ao Fidep e Habitação e Saneamento mais à Caixa Econômica, então não vejo muita razão para o S... A não ser política, né? Agora, eu vejo o banco, o BNDE, deveria se voltar mais para uma ação a longo prazo e que ação é essa? Uma ação, no meu entender, de crescimento econômico. Reduzindo o desemprego excedente, criando novas oportunidades e minimizando os desequilíbrios sociais. Mas isso é uma ação de governo, onde o BNDE é um instrumento financeiro. Olhando a parte de crescimento econômico, eu jamais utilizaria o banco para estimular mudanças de ativos em termos de mãos, de setor público para o setor privado. Como ocorre, por exemplo, no caso da energia elétrica. Eu olharia o BNDE mais a longo prazo, estimulando o crescimento de ativos na economia, estimulando a taxa de poupança, enfim, para olhar mais o crescimento econômico.
P/2 – O Senhor deu suas expectativas para um futuro, e dentro de um balanço mesmo desses últimos 50 anos?
R – Eu acho que houve uma evolução pequena. A estabilidade é uma conquista que vai continuar, no meu entender, porque a sociedade exige. Então, qualquer um que for eleito continuará com a estabilidade. Agora, um pouco de inflação faz parte, como diz o Bambam... (risos) então, alguma inflação terá que ter e a prioridade tem que ser o crescimento econômico, obrigatoriamente. Criando mais empregos, como eu disse, reduzindo os desequilíbrios que existem. Por exemplo, a distância entre o maior salário e o menor em uma empresa é muito grande, você nunca vai reduzir desequilíbrios quando tem isso. São políticas de governo, onde o BNDE será, deverá ser, é um instrumento financeiro. Então, o BNDE depende de políticas gerais, principalmente do Ministério de Planejamento. Agora, em última análise, do Presidente da República, né? Os incentivos fiscais não estão no BNDE, os regionais, mas deveríamos tê-los de novo. Não sei se vocês se lembram, mas haviam programas regionais, hoje não existem mais. Haviam programas setoriais, hoje não existem mais. Houve muita perda de recursos, houve, mas precisamos aumentar a eficiência. Não é acabando com os órgãos, que é mais fácil do que melhorá-los. Podemos melhorá-los, há muito jovem aí que pensa na sociedade como um todo, pensa em minimizar desequilíbrios, pensa num Brasil melhor, enfim, é isso.
P/2 – Tem muito trabalho pela frente?
R – Tem, isso tem... (risos)
P/2 – Então, Senhor Madeira, muito obrigada pela sua participação.
R – Obrigado a vocês.Recolher