Lembro-me de aos 8 anos dizer a minha mãe que me sentia diferente, ela sem entender muito bem disse "que todos somos especiais do nosso jeito", que também se sentia assim "diferente". Com 14 anos comecei a entender que não me interessava por garotas e sim por garotos, e isso me levou uma grande b...Continuar leitura
Lembro-me de aos 8 anos dizer a minha mãe que me sentia diferente, ela sem entender muito bem disse "que todos somos especiais do nosso jeito", que também se sentia assim "diferente". Com 14 anos comecei a entender que não me interessava por garotas e sim por garotos, e isso me levou uma grande batalha interna, eu negava a minha própria existência, até porque não é fácil ser criado em uma cidade do interior por pais machistas e ter uma cabeça tão aberta ao "novo". Cheguei ao ponto de ter medo de falar ou de me socializar com as pessoas e elas perceberem esse lado que eu encarava como sombrio e infernal. Atingi meus 109KG e uma profunda depressão, sem entender o porque de tudo aquilo, me foquei no lado espiritual e comecei a frequentar igrejas, mas tudo aquilo só me feria mais e mais.
Meu relacionamento com o meu pai nunca foi fácil, em casa ele sempre foi muito violento com todos, por muitas vezes sobrava até para minha mãe que sem pra onde ir apanhava calada. Passaram-se alguns anos comecei a estudar em uma nova escola e tive meus primeiros contatos com pessoas LGBT's e isso me deu uma força tão grande, ainda agradeço por ter os conhecido. Emagreci, e comecei a querer curtir mais a vida, comecei me relacionar com vários parceiros, fiz novas amizades me libertei dos meus velhos tabus, foquei no meu crescimento profissional, estudei e mais tarde um pouco decidi mudar de área profissional e ir trabalhar com minha mãe em um salão de beleza.
Foi ai que comecei a me sentir estranho, sempre indisposto e cansado, decidi fazer alguns exames de rotina. Bumm! Descobri que tinha contraído o HIV, naquele momento me senti sufocado e sem chão, fui até a casa do meu melhor amigo e ele me apoiou e ajudou a superar aquele surto. No outro dia esse mesmo amigo que também é gay decidiu fazer exames e descobriu que também era soropositivo, e mais uma vez o armário se abriu e tivemos que entrar, o medo do preconceito nos amarra, nos paralisa, entretanto servimos de apoio um para outro. Seguimos. Com o tempo fui sentindo que aquela pequena cidade do interior de Minas Gerais, já estava ficando
menor ainda, e então, surgiu uma oportunidade para eu ir conhecer o Rio de Janeiro.
Tinha conhecido um homem mais velho pela internet que logo me convidou para ir visita-lo, me organizei e então fui. Passei uma semana com ele e voltei para casa, ele então me fez um convite de ir definitivamente para o Rio de Janeiro, lá eu poderia morar na sua casa e encontrar trabalho e aos 21 anos de idade sai de casa e fui morar numa cidade grande. Ele viajava muito e era bastante ciumento, em uma das minhas visitas a minha família
recebi a mensagem de que não poderia mais voltar para casa dele, fiquei devastado, porem tinha decidido comigo mesmo que não regressaria o que eu tinha começado. Quando cheguei a porta de sua casa encontrei todos meus pertences em sacolas de lixo, mas isso não me abalou, apenas recolhi tudo e segui em frente.
Decidi morar com dois amigos em um quarto no centro do Rio, que tive grandes problemas por sinal, que iam de falta de água a colocarem água sanitária nas minhas roupas, o banheiro e a cozinha eram compartilhados com 20 pessoas desconhecidas, aquilo tudo me deixou cansado e no meio de algumas brigas com um desses amigos, decidi sair, me mudei para uma favela do Rio de Janeiro, e eu nem imaginava o que estaria por vir. Dormi no chão por algumas noites, e o local onde eu trabalhava faliu, e
então as coisas apertaram mais ainda. Sem renda e as contas chegando decidi me prostituir, foi necessário, a dor de passar fome nos força a coisas estremas, e eu estava sozinho naquela cidade grande "no money, no family". A comunidade onde eu morava estava no meio de uma guerra entre facções, e as coisas só pioravam, tive a casa invadida por bandidos onde tudo foi revirado, tive armas apontadas para minha cabeça e de alguma forma eu ainda não queria voltar para minha cidade, pensar em voltar e conviver com brigas diárias e
agressões entre meus pais, não estava mais em cogitação.
No meio daquele caos consegui encontrar um novo trabalho, e as coisas começaram a melhorar, até que um dia decidi chamar uma amiga para irmos tomar um refrigerante (apenas um porque a grana estava curta) num bar. Como de costume, abrir meus aplicativos de relacionamento e então um homem se interessou por mim, conversamos um pouco e marcamos um encontro para um outro momento. Na noite do dia seguinte combinamos um encontro na praia, ele estrangeiro e falava algumas linguás mas não o português, conversamos pouco e fomos jantar, e o google tradutor sempre me auxiliando. Depois do primeiro jantar tivemos mais alguns e ele decidiu que iria se mudar para o Brasil e morar comigo, alugamos um apartamento e juntamos nossas escovas de dente. Ele mudou a minha vida, e ainda não se criou a palavra certa em nenhum idioma para dizer o quão agradecido sou por ele ter me ajudado, mas ele sabe que eu o amo. Aprendi a falar inglês e visitei vários países que eu jamais imaginaria, a historia ainda não se acabou mas a fase que eu me encontro é maravilhosa.Recolher