Como inÃcio de conversa (um intróito), registre-se que paulista-paulistano, nasci no bairro do Brás, aos 23 de julho de 1913, com a responsabilidade de responder por um nome previamente escolhido (desde que fosse do sexo masculino) pela criatura mais doce da famÃlia, minha saudosa vovózinha, mÃ...Continuar leitura
Como inÃcio de conversa (um intróito), registre-se que paulista-paulistano, nasci no bairro do Brás, aos 23 de julho de 1913, com a responsabilidade de responder por um nome previamente escolhido (desde que fosse do sexo masculino) pela criatura mais doce da famÃlia, minha saudosa vovózinha, mãe de minha também santa mãe.
Do tronco dos "Camargo", nascida em Atibaia, alà vizinha de Bragança, neste Estado de São Paulo. Ao contrário de seu extenso nome: Maria das Dores Oliveira Pires Ortiz de Camargo, era baixinha - teria mais ou menos um metro e meio - se minha lembrança fotográfica não falha. Católica praticante fervorosa, daquelas que batem no peito, persignando-se olhando para os altos, toda vez que seus ouvidos eram maculados por descréditos à Santa Igreja Católica.
Assimilando muito bem o que disse Jesus Cristo quando de seu Santo SacrifÃcio do Calvário, ao se dirigir ao também crucificado, o bom ladrão, ao seu lado, que vinha em sua defesa contra o mau ladrão Jestas, também um fora da lei que expiava alà na cruz a sua culpa "ainda hoje estarás comigo no paraÃso".
Assim, sem que ninguém respeitável da famÃlia, contestasse o acerto do nome escolhido, passei eu, com todas as honras, a ser o Dimas. Felizmente ninguém lembrou-se de levar ao Cartório do Registro Civil, a alcunha de "o bom ladrão". Fico gelado quando penso que poderia ter havido alguém de prestÃgio na famÃlia, de ter levado ao Cartório do Registro Civil, a alcunha, ou o complemento do nome, de "o bom ladrão". Se isso houvesse acontecido, toda vez que meu nome fosse levado a registros, seria "Dimas-o-bom-ladrão"
Dessa forma, antes de nascer recebia a proteção do Santo Padroeiro, cuja santidade havia sido outorgada diretamente pelo filho de Deus Portanto tal proteção teria sido - por certo - a intenção de minha querida e saudosa vovózinha de me dar um padrinho forte e um eterno Anjo da Guarda: São Dimas
Devo, antes de mais nada, me penitenciar, por poder só agora, já carregando o enorme fardo dos 81 invernos tentar escrever sobre assunto tão pesado, com a pretensão de legar aos meus queridos filhos Dimas, Darcio e Dilson, uma história sobre seu pai, que infelizmente, não pôde deixar um legado, nem de leve, de herói.
Um dia todos nós e mais nossa Santa Débora, de novo nos encontraremos para continuar essa felicidade imensa que nossa famÃlia colheu em vida Conosco estarão os anjos no céu rodeados de nuvens muito brancas, e será a nossa Eterna Paz Celestial
Será que meus vivÃdos 81 anos ainda guardam no bestunto, talvez até já contaminado por devoradores e invisÃveis micróbios, algo que possa se aproveitar para este atrevido intento? Será que nesta longa jornada quando muito esforço foi-me exigido, ainda sobre matéria dentro dessa massa cinzenta aproveitável? Tentarei.
A única possibilidade de vencer obstáculos é enfrentá-los Desistir seria negar ter percorrido os espinhosos caminhos que foram vencidos, bem ou mal Estou temeroso, mas tentarei. Não posso desapontar meus queridos filhos que sempre acreditaram no lutador que tive que ser, desde a tenra idade de 11 anos Não aceito a máxima daquela famosa expressão daquele que foi Presidente da grande nação norte americana. Disse ele, que pior que perder é nunca ter tentado Meu espÃrito sabe que nesta minha idade de 81 anos não só o fÃsico começa a definhar como aquelas embarcações que de tanto enfrentarem mares bravios, já se apresentam aldernando O peso dos anos pesam Se isso acontece com o fÃsico, imagine-se com a cabeça. Talvez ela, a essa altura do campeonato, só sirva mesmo para doer (de vez em quando) e para pentear os cabelos meio ralos, brancos ou prateados.
Meu corroÃdo arquivo de memória mostra-me que, à época, minha famÃlia morava no Brás, à Rua Cavalheiro nº 33, onde eu nascÃ. O Brás, saudoso Brás, de tantas lembranças (tristes e alegres). Esse Brás era um bairro populoso, modesto, onde prevaleciam famÃlias que mesclavam com algumas famÃlias de classe média. Prevalecia então, uma enorme, dominante colônia italiana. Nós, naqueles tempos, Ãamos, sem nos aperceber, adotando velhos hábitos daqueles extraordinários trabalhadores que deixaram o resultado de seus esforços, criando empresas que desde então fizeram o orgulho de São Paulo e já estavam ajudando o Brasil a chegar lá. E chegará, com a ajuda de gente desse porte Essa gente, que embalou minha juventude, começava a pavimentar a estrada que desde então vem levando o Brasil para seu glorioso destino.
É curioso como os brasenses, ainda guardam e transmitem aos seus descendentes, o jeito de viver falando mais com os gestos do que com a boca. Aquele estilo de falar cantando, como se estivessem fazendo parte de alguma ópera, era a maneira de falar daqueles moradores do bairro e tais hábitos ainda hoje prevalecem para os indivÃduos que começaram suas vidas lá. Interessante lembrar que o bairro, por ser reduto de napolitanos, foi o berço do criador da "pizza", esse saboroso prato importado da penÃnsula. E por falar na raça, sempre me traz a lembrança aquele "paisano" que salvo de um naufrágio e não sabendo nadar, apelára ao Santo Padroeiro, o simpático São Genaro, patrÃcio velho de guerra.
Naquele estilo, muito falante, mas agora mudo de medo vinha o herói (e candidato a defunto) conversando com o Santo, naturalmente mais com os braços. E braço sobe e braço desce, chegou " luomo ", são e salvo, abraçado àquelas santas, finas e aconchegantes areias sem sequer haver aberto uma vez a boca, senão para cuspir a água que não conseguia evitar, ia absorvendo-a.
Mas, voltemos à pizza, que tantas recordações me trazem. Havia naquela época, apenas duas espécies: muzzarela (que fora do Brás era chamada de "queijo", e as de "alice" (alitche) com as originais napolitanas. Havia ainda naqueles tempos, os concorrentes para os pobres famintos, os vendedores ambulantes, que carregavam em grandes latas tipo canudos, uma massa parecida com as autênticas pizzas, que porém somente tinham, cobrindo aquela massa redonda, alguns pobres e amadurecidos pedaços de tomate
Nós, os pobres mais ou menos famintos, adquirÃamos um pedaço "daquilo" por poucos nÃqueis quando tilintavam eles em nossos bolsos rasos (e também por que teriam eles de ser fundos?). Quando as pizzarias começaram a dominar a Cidade, esses simpáticos ambulantes (os pizzaiolos) foram expulsos do seu caminho grande e humano, que com sua mercadoria conseguiam acalmar os impulsos famélicos daqueles meninos e adultos da minha classe.
Voltando aos pizzaiolo eles, esses ambulantes apregoavam os seus "mata-fome" batendo na lata com a faca que usavam também para cortar, na tampa do latão, os pedaços cujos tamanhos variavam de acordo com os minguados nÃqueis que a sua modesta freguesia pagava. Essas facas, muito naturalmente, só viam limpeza razoável quando de volta de sua "santa" peregrinação à s suas casas.
Mas não foi só a pizza que teve como berço, o saudoso Brás, não. Também esse fabuloso futebol, a alegria do povo, foi trazido ao Brasil, passando para a necessária aclimatação, pelo Brás. Um inglês, agora famoso ao completar os 100 anos de sua chegada: Charles Miller Sobraçando, hoje tão conhecida bola, usando os tradicionais trajes com sua calça carnavalesca, apertadinha no tornozelo, e alà na tradicional várzea do Carmo, hoje movimentado Parque D. Pedro II, improvisou a tÃtulo precário, o seu campo de futebol.
Logo depois quando os adeptos começaram a se interessar, já um lindo e regular campo estava hospedando os futuros grandes futebolistas Esse campo foi devido a outros ingleses que serviam na ferrovia "São Paulo Railway", que ligava e ainda liga Santos a JundiaÃ, junto à estação da Lapa, em cuja empresa trabalhava também o nosso herói Charles Miller. Naqueles idos nosso herói não poderia imaginar, nem de leve, que estava introduzindo no Brasil, além de sua alegria, o esporte que levaria a sua imagem para todo o mundo, graças ainda a ter permitido ao PaÃs a conquista de respeitável galardão de tetra-campeão do mundo Hurras, portanto, ao nosso querido Charles Miller.
Evidentemente um longo perÃodo se passara entre a chegada do futebol e o nascimento daquele que tomara de empréstimo o nome do Santo, até este que alcança a pizza legÃtima e as outras, quase falsas, vendidas no canudo de folha, onde se espremiam aquelas rodas de massa cobertas de alguns mÃseros tomates secos.
Alguns dados da minha infância, com grande sacrifÃcio podem ser lembrados, com esforço, é bem verdade. Aos 7 anos (mais ou menos) fui matriculado no 1º grupo escolar do Brás, na Av. Rangel Pestana, quase defronte à Matriz do Brás; essa escola chamava-se Grupo Escolar Romeu Puigari. Alà fiquei, num esforço medonho para equilibrar estudo e trabalho, estudando como aprender algumas letras e conseguir algum dinheirinho para fazer minha mãezinha sorrir Tentava aprender as primeiras letras (mas já adivinhava que seriam as últimas). Não conseguindo tal harmonia, deixei o Grupo. Ia à cata do trabalho. De inÃcio tentei um lugar de "boy", na já citada "S.P.R.", pensando numa carreira onde já lá estavam mui irmão Djalma e meu tio Valêncio (casado com minha tia Vitalina, irmã da mamãe). Não conseguà o emprego. Não tinha idade mÃnima e me faltavam ainda outros requisitos.
Ainda degustando um pedaço daquelas falsas pizzas, voltemos ao passado, para que a novela tenha prosseguimento. Quando perdà meu pai (sobre o qual voltarei a falar), tinha apenas 6 anos de idade. Ë muito duro lembrar de coisas da época. Mamãe tinha como renda apenas um resto de economia (mal aplicado, como veremos mais adiante) e os proventos como professora primária de uma escola pertencente às lojas 7 de setembro, que ao que me consta, era mantida com muitas outras espalhadas pela Cidade. Fui matriculado no 1º ano do Grupo Escolar do Brás e hoje Romeu Puigari, que situa-se na Avenida Rangel Pestana quase defronte a Matriz do Brás.
Com as agruras que enfrentava minha famÃlia, não conseguà ficar sem trabalhar além do 3º ano, pois terminado esse ano letivo, que a duras penas và chegar ao seu término. Tinha que tentar trabalho e và encerrar meus sonhos de conseguir um dia entrar para a Academia de Letras Jogado à s feras, tinha que me virar, sem preparo e analfabeto (quase). Dessa forma, aos 11 anos de idade, estava eu de "Diário Popular" sob à s vistas, junto ao meu primo Alcides, filho de meu tio Augusto, único irmão de meu pai (sobre que falarei separadamente) procurando emprego.
Conseguà dois empregos como boy, em escritórios que eu não sei de quê. Em ambos levei calote recebendo uns trocados à guisa de ordenado. Foi quando conseguÃ, também pelo Diário, o lugar de boy no então Comitê Mixto Paulista de Seguros, hoje transformado em Sindicato das Empresas de Seguros e Capitalização do Estado de São Paulo, isso em 18 de dezembro de 1928 Eu tinha 15 anos.
Stop. Prá que tanta pressa? É preciso preencher o tempo de minha meninice, porque também a tive, embora muito apertada.
Como menino, morando na rua Cavalheiro nº 33 (onde nasci), fomos jogados para tantos outros locais, porque cavar o dinheiro para o aluguel era difÃcil. Mudamos muito, caloteando, à s vezes. Do lado esquerdo da rua, passamos a morar do outro lado, numa casinha geminada, que era do Argemiro, meu primo, filho da Tia Mina, irmã da mamãe (que se chamava, na realidade, FlamÃnia). Aà moramos de graça, por generosidade do primo Argemiro. Tive, nessa época, as alegrias que a infância proporciona a ricos e pobres. Tive minhas peladas naquela. Era uma rua muito tranqüila, como tranqüila era toda a Cidade.
Quando havia uma folga, ainda que curta, nós os garotos da zona, fazÃamos uma pelada em pleno leito da rua que já era asfaltada. Os automóveis, que estavam longe de ser a loucura de agora, passavam de tempos em tempos, com grandes intervalos. Por isso a interrupção da renhida peleja era curta. Dava assim, tempo para que trocássemos os enormes palavrões sobre os adversários e também pelos companheiros quando falhavam naquilo que esperávamos de suas atuações.
Esse bate boca, principalmente quando citávamos os palavrões, eram ditos em italiano (nem sempre castiço) para acompanhar a moda que cada um daqueles meninos trazia de suas casas. Que pena que minha cabeça não consegue citar os nomes dos pretensos craques. O Higino (vulgo Pioxi), o João, o Tonico, Ariosto, VirgÃlio. Esses nomes ainda posso me lembrar. Nada mais.
Quando anoitecia, nossas mães, sempre severas, nos mostram, sem outra alternativa, a hora de voltar para casa. Enquanto não havia tal ordem, ficávamos sentados na calçada, na guia, conversando mole, junto dos finos postes que seguravam o lampião à gás. AssistÃamos a chegada do "homem-do-lampeão" segurando seu comprido bastão para ascender a tênue luz, que para nós, da época, era um feérico show de luz
De manhã, muito cedo, mal começava a clarear, lá estava o homem do bastão, desligando o gás. Nada era automático, como seria hoje em pleno 1994, se o gás fosse o sistema; Aquela era a rotina: acender e na manhã seguinte apagar.
Assim corria nossa meninice. Assim corria minha vidinha. Entre o trabalho, um repouso, jogando um futebol na rua.
Com os parcos recursos entrados em nossa casa, tentava estudar. Já naquela época, imaginava que sem alguma cultura, o futuro não existiria.
Freqüentei umas escolinhas que serviriam, em última instância, para adquirir um pouco mais que o ABC adquirido no Grupo Escolar Romeu Puigari. A propósito, soube agora, agosto de 1994, que o Ministro da Fazendo, ex- embaixador do Brasil nos EUA, também nascido no Brás, fez seu curso primário no mesmo Grupo. Posso citar hoje, que o grande homem público com larga folha de serviços prestados ao PaÃs, homem de grande cultura, foi meu "colega em épocas diferentes, apenas...
O tempo corria e eu ia percebendo que não podia contar com nada que pudesse fazer com que a subida de tantos degráus, como desejava, não fosse extremamente difÃcil. Teria sido assim a vida do ex-colega Rubens Ricupero?
Voltando ao trabalho do comitê, consegui defender mais uns cobrezinhos, arranjando fazer a limpeza das salas, e aos sábados, encerando tudo e empurrando aquele escovão que dado às minhas poucas forças, parecia que estava no lugar de um rebocador que ao invés de puxar, empurrava o maior transatlântico do mundo
Como dentro de minhas funções, estava a de entregador de Avisos de Tarifas e alterações em taxas e normas orientadas pelo Comitê, em transformação para Sindicato das Empresas de Seguros, o meu contato era constante com todas as Companhias de Seguros. Por esse contato, recebà um convite para trabalhar na firma S. Magalhães Cia., representante como Agente Geral, da Cia. de Seguros da Bahia, onde um chefe ranzinza, me azucrinava todo o tempo. Mas aÃ, com pouco serviço de boy, comecei a estudar questões ligadas a fórmula prática de realizar um seguro. Encontrar taxa na tarifa, fazer cálculo e redigir uma proposta. Acreditando que o que me faltava, iria apanhar trabalhando, candidatei-me ao lugar de sub-chefe da Carteira de Incêndio, na Cia. Adriática de Seguros, com sede em Trieste, na Itália e Representação Geral no Rio de Janeiro.
Na Adriática, que comecei em 18 de julho de 1935 (quase iniciei no dia de meu aniversário), comecei a ganhar conhecimentos técnicos de seguro.
Quando tinha apenas 6 aninhos (que judiação) morre meu pai. Dele não guardo nenhuma recordação. Nem mesmo sei como era sua fisionomia ou constituição. Diziam-me parentes velhos que meu irmão Djalma era muito parecido em todos os detalhes ao papai. De meia altura (para os padrões brasileiros), tinha mais ou menos 1,70 m. Magro, moreno, não fugia muito do perfil português. Hoje, sem mais... Ele, pois até sua caderneta de identidade tenho comigo. E lá está o celebre 2 x 2 Prazer em conhecê-lo Monteirinho, que fugiu da raia levado por, ao que consta, uma pneumonia (ou tuberculose?) deixava assim a pobre Ignez e mais 3 filhos (ou 4) e mais a Luiza, a preta-velha a ver navios
Aprendidos tais afazeres, fiquei mordido pela mosca da pretensão. Eu era o tal, recebendo sempre elogios de meus vários chefes, inclusive o diretor geral do Brasil, com sede na Matriz brasileira, na rua Uruguaiana, no Rio de Janeiro, o elegante e educado Cavalheiro Humberto Roncarati. Devo mencionar que meu chefe em São Paulo, Sr. José Tiburcio de Oliveira... Se tornou para mim um grande professor. Dessa forma, meus pedidos de aumentos de ordenados, eram desordenados, poquer muito constantes e em prazos curtÃssimos. A necessidade era uma pedra no sapato. Não conseguindo no rapidez desejada, aceitei um convite para chefiar dosi departamentos (fogo e transportes) na Cia Segurança Industrial, Sucursal de São Paulo. Isso em junho de 1939. Na viagem que o Diretor Roncarati fez a São Paulo, e não me encontrando na Adriática, surgia um convite para a minha volta, com o ordenado dobrado do que recebia na Segurança Industrial. Inquieto e impaciente, minha permanência na Segurança não foi além de um mês.
Desta vez, na Adriática, esquentei uma posição de chefia durante três anos, de 39 a 42. Ao ler no jornal, 42, março, um anúncio de pedido de um técnico competente profissional, me candidatei ao lugar e fui aprovado, passando-me para a Agência (que existia como Sucursal) da Home Insurance Co., americana que tinha a Matriz brasileira no Rio de Janeiro. Na "Home" fiquei tres anos de 42 a 45. - Muito apreciado prelo meu patrão (Eric Sadler), um extraordinário americano naturalizado brasileiro, passei muito rapidamente a seu procurador. Minha mais alta obrigação, era cuidar, com todo o desvelo e competência, de grandes segurados, entre eles, a firma de algodão Mc Fadden Cia Ltda, com sede também nos EUA. Nenhum pagamento de seguros, que eu organizava e tratava, era pago sem o meu visto. Um dia, morre Sadler, que se tornara tão meu amigo que convidei-o para meu padrinho de casamento, em 20 de novembro de 1943.
Com a morte do meu Amigo, o diretor para o Brasil, mister... Como era mesmo o nome do tal? Ah, me lembro, Willian Cuneghan (será que é assim mesmo que se escreve?), tentou e conseguiu o lugar de Sadler, abandonando o antigo posto. Aqui em São Paulo a agência era muito mais rendosa Não aguentei o novo patrão. Pedà demissão e saà para outro. Menciono mais adiante.
Acho que devo mencionar a maneira que me levou a arranjar o primeiro emprego que cito anteriormente. SaÃmos de casa, na Rua Cavalheiro, eu e o Alcides.
Meu primo irmão, o Alcides, filho de meu tio Augusto, um carteiro, que era o único irmão de meu pai. SaÃamos, a pé, até o centro, na redação do "Diário Popular" (na rua João Bricola onde hoje está a sede do banco), que ao tempo era o grande guia de emprego. AlÃ, ficávamos a espera de sair o jornal, que era ( parece ainda é) vespertino e chegava à s ruas por volta de 3 horas. Eu e o Alcides, então, folheávamos e marcávamos os pequeninos anúncios do "precisa-se um garoto para serviços leves de escritório" etc.
CorrÃamos cada um de um lado, em busca de um emprego que pouco ou quase nada poderia nos proporcionar em... "Caraminguás" que poderiam fazer nossas respectivas mães um pouco alegres.
Tempo que eles duravam. Até que um dia, não sei como, batà na porta do Comitê Mixto Paulista de Seguros (hoje Sindicato das Empresas de Seguros e Capitalização do Estado de São Paulo) que era naquele tempo na rua João Bricola num prédio velho onde hoje se ergue o Banco do Estado de São Paulo, mais tarde foi para a rua 15 de novembro e dalà para a rua São Bento.
Alà conhecà grandes figurões do Seguro da época. Alguns nomes por razões várias... Porque me tratavam com humanidade e ainda, à s vezes, deixavam-nos mÃseros trocados na bandeja que eu levava os seus cafezinhos nas reuniões técnicas que alà se realizavam, sob a vista do Sr. Costa, o responsável pela chefia e meu chefe também. Ainda ocupam minha memória, o Sr. Vicente de Paula Silva do Alvarenga, Tasso Coelho dos Santos.
Charles Coc, Alberto Sevi, Primo Fazziai, e outros tantos executivos cujos nomes não posso lembrar, falecidos, claro
Minha principal função era entregar avisos de alterações de tarifas e circulares diversos, que emanavam também da Comissão Central, no Rio de Janeiro.
Aos sábados, para conquistar um adendo ao salário, fazia limpeza que incluÃa encerar e lustrar o chão que naquele tempo era no muque (que eu nunca tive) puxando um escovão que me fazia pesadelo toda sexta-feira.
Nos dias normais, fazia as entregas e, com isso, ia arranjando como conhecidos no meio das diversos seguradoras, que àquela época, 1928, eram bastante numerosas para quem, como eu tinha que visitá-las, todas no Centro velho de São Paulo. Nessa época não se imaginava que fossem elas espalhadas pelos bairros, saindo do Centro.
Na volta dessa diária peregrinação, (sempre à pé) com fome e cançados, parávamos à porta de um boteco na Avenida Rangel Pestana, quase esquina da rua Caetano Pinto e aÃ, o potequineiro, nos presenteava com um valente pão- italiano-com-mortadela: O tio Augusto, homem muito bom, era o carteiro naquela zona e o homem do bar assistia certo de estar agradando o servidor público. Satisfeito, pelo menos de estomago cheio, continuávamos nosso retorno à s nossas casas.
Eu, ali perto, no Brás mesmo. O Alcides no Belenzinho, numa rua que não me lembro o nome, que levava à Vila Maria, travessa da Avenida Celso Garcia. Tenho lembrança que trabalhei em dois ou tres escritórios de picaretagens diversas. Fazia limpezas, como encerar o chão e pequenas entregas, comprar cigarros, cafés e outras coisinhas. Esses empreguinhos onde às vezes ficava sem receber tres meses, era o...
Devo fazer uma parada na novela para desafogar o desejo.
Na juventude plena, e até quando quarentões, imagina-se que a boa disposição jamais se altere. Lêdo e cego engano. Hoje, entrado em anos, ultrapassados os 81, já no vermelho da vida, aquele estado mesmo que nossa fisionomia acusa quando nos chamam de titio (para não dizer vovô), tais tarefas que então possÃveis sem grandes sacrifÃcios, seriam agora empreitadas difÃceis, verdadeiros desafios. Fui convencido (e aà entra uma vaidade que eu não conhecia) a escrever para a posteridade, aos meus queridos filhos. Deixar escrito o que se convencionou chamar de Memória. E assim, aqui estou eu, tentando atingir o que de mim esperam essas três criaturas maravilhosas: Dimas Filho (o Diminhas), Darcio e Dilson. Querem eles saber como viveu seu pai nessa longa e tortuosa viagem, que facilmente se imagina, a quem, que aos seis anos, ficou órfão de pai. E sem esse amparo, teria que sobreviver à s expensas dos parcos soldos de uma professora normalista primária, que teria de labutar, como labutou, durante anos, para saciar a fome de três bocas (cinco, aliás, como direi à parte). Oh minha Santa Mãe, Ignez Se a demora em retardar esta novela o seu conteúdo fornece mais lembranças a se escrever, a velhice, como se fôra uma enorme, borracha vai apagando tudo. Por mais que se esforce, tênue lembrança ameaça recordações que ao final, nada dizem. Como? Quem estaria vivendo aqueles papéis que queremos lembrar, mas em vão. Tentarei enfrentar o desafio e vou ao mar bravio de enormes ondas, à espera de que se acalme aquela furia e voltemos ao mar calmo. Nem sequer as ondas parecem contribuir. Mas tabém de que serviria a calmariado mar, se um nem sequer sei nadar? Não melhora a situação de angústia, se mesmo sem onda, acabaria morrendo na praia. Mas vale a pena tentar. Se conseguir, faço alegres meus queridos filhos que ainda hoje, ou, principalmente agora, me fazem tão felizes Todos nós temos um pequeno arquivo, com gavetinhas várias, onde buscamos sempre alguma coisa e encontramos o que não buscávamos mas que muito nos satisfaz. Nada é impossÃvel. Dizem que querer é poder Vejamos. Não penso em desistir Se não conseguir, obterei o perdão de meus queridos filhos; se conseguir dirão que eu, de fato, sou ou fui ( quem sabe) um sujeito digno de respeito e admiração. Prossigo. Se Deus e São Dimas meu protetor me ajudar, hei de ancorar meu pequenino barco em porto seguro.
Puxa, mas a velhice Não consigo me desligar dela. Parece um fantasma que acompanha a gente em todos os momentos Quando ela começa a morder nossos calcanhares, sentimos o quanto ela é sentida, principalmente em nossas cabeças. Esquecemos nomes, datas episódios e tantras coisas mais. Quando chega essa hora (só nessas horas) nos lembramos que coisas a serem escritas como esta despretenciosa Memória, deverÃamos ter tentado há alguns anos atrás, pelo menos uns vinte. Uma simples novela como esta história, como fica difÃcil? Mas 81 anos, muito embora forneçam muita coisa a registrar, de repente se apagam, como escritas à lapis e nós, não querendo saber de nada, vamos apagando tudo, como se tivéssemos uma enorme borracha e fosse tão gostoso ir raspando até nada ficar marcado naquele papel branquinho.
Eu respondo pelo nome de Dimas de Camargo Maia. "Camargo" de minha saudosa e sacrificada mãe e "Maia" do meu pai, que Deus levou aos 33 anos. Levou-o uma peneumonia (ou seria doença do pulmão?), que naqueles tempos, em 1919, fazia mortes Meus registros dizem que nascà no dia 23 de julho de 1913. Repetindo, naqueles idos, segundo sei, morávamos no nº 33 da rua Cavalheiro, alà no Brás, bairro populoso e modesto desta outrora pacÃfica Capital do Estado de São Paulo. Minha famÃlia era composta de meu pai, Manoel Ferreira Maia, mamãe, Ignez de Camargo Maia. Nossa famÃlia tinha mais, o Dorival, meu irmão mais velho, o Djalma e eu, alma da preta Luiza, que um dia apareceu, com mais ou menos 10 anos, dormindo junto à porta da casa de minha avó materna, que ao que consta era alà no Largo da Concórdia. Minha avó e meu avô Lourenço Ortiz de Camargo. A Luiza, que disse chamar-se Luiza da Conceição ficou com a nossa famÃlia, por cerca de 70 anos. Morto meu pai, mamãe voltou a trabalhar, professora que era, pra poder manter sustentada essa pequena famÃlia que, a considerar a idade dos tres filhos, tinha constantemente, fome.
Não conseguindo nenhuma escola pública, arranjou uma escola que pertencia talvez a alguma loja maçônica, pois, como outras, chamava-se Escolas 7 de setembro. Não conheci meu pai. Dele não tenho nenhuma lembrança.
Mais três irmãos eu tive que morreram muito cedo: Diógenes (entre o Djalma e o Dorival), Décio e Manoelzinho. A nenhum conhecÃ.
Do comitê, como já foi dito, começando em 18 de dezembro de 1928, com 15 anos de idade passei para agência da Cia. de Seguros da Bahia e daà também em conseqüência da minha inconformidade de esperar as coisas melhorarem, conseguà a Cia. Adriática de Seguros, Sucursal São Paulo em 28 de julho de 1935. Aà tinha como gerente o Dr. Ezio Moncassali, um gentleman. Meus relacionamentos se iniciavam aà na Adriática, graças aos meus esforços reconhecidos pelos meus chefes.
Em 1939, aceitei um convite do Dr...., e passei a chefiar o Departamento de Fogo e Transportes da Cia Seguranças Indultrial. Aà me agüentei até 1942, março, dia 2. Nessa época chegava a São Paulo, vindo do Rio, o Superintendente para o Brasil da mencionada Adriática, o... Humberto... Que bem mais tarde seria por duas vezes o Presidentre do Sindicato das Empresas de Seguros, com a escolha e ajuda do clube da bolinha, que será citado no devido tempo.
Nessa altura, estou mais seduzido pela minha vida particular do que pela minha caminhada profissional. Interrompo-a assim, na Adriática, para voltar logo mais.
Não conhecà meu pai, que morrreu sem deixar nada em mim. Nunca soube ao certo se era ele português, naturalizado brasileiro ou brasileiro nato. Finalmente agora, com elementos guardados pelo meu irmão Dorival, também falecido, encontrado pelo meu sobrinho Décio, segundo filho do Dorival, alguns importantes dados puderam ser vistos. O papai Maneco nasceu em 21 de março de 1885, no Porto, num lugarejo chamado "Maias", em Portugal. Era filho de Albino Ferreira Maia e Maria Rosa de Jesus. O curioso é que os nascidos em "Maias", acrescentavam o nome, "Maia", aos seus legÃtimos (Manoel Ferreira Maia).
Dessa forma, muito pouco, ou nada ficou de meu pai. Conforme era costume na época, os meus avós, Albino e Maria Rosa teriam colocado no navio que vinha para o Brasil, o Maneco e o Augusto, os dois filhos, um o mais velho, Maneco com 11 anos e outro, o Augusto, com 9. Vinham recomendados a um patrÃcio que deveria cuidar e encaminhá-los na nova vida nesta... Que se chama Brasil.
Ambos foram trabalhar no grande armazém atacadista, do português Monteiro, em São Paulo, meu pai, o Maneco, esperto, ganhou a confiança do patrão e passou a ser conhecido como o Monteirinho (por causa do patrão Monteiro). Ambos os garotos dormiam no armazém, em qualquer lugar e comiam na casa. Enquanto o Maneco se esforçava para ser algo, o Augusto aguardava o progresso do irmão, para ganhar algo da vida
Chovendo no molhado, no Brás vivà minha primeira infância. Porque alguém usa essa expressão: primeira infância? Haverá outras? Quais serão elas? Como distingüi-las? As do pobre e as dos ricos? Não entendo, e por isso não endosso essa distinção. Apesar de havê-las escrito.
Na verdade só há uma infância. Depois dela, a única será o estágio seguinte que é a adolescência. É possÃvel que a adolescência do rico possa continuar com todas as alegrias e irresponsabilidades e por isso, apesar da idade ter crescido, continua a infância; É possÃvel que seja isso?
Para quem não se enquadra nessa fase, a 2ª infância é a que guardamos na memória daquele nosso perÃodo de vida. O melhor perÃodo da nossa vida
Nessa recordação vivemos tudo de novo. Com certeza essa é a 2ª infância E mesmo guardada na memória somos alimentados pelo melhor perÃodo da nossa existência. Ainda que em situação de pouquÃssimos recursos: moradia sem nenhum conforto; Alimentação totalmente irregular e sem grandes divertimentos, a infância é o paraÃso que se viverá em tantas outras épocas da nossa curta existência.
Que recordação posso eu ter guardado? Quem conseguir ler estas "mal-traçadas-linhas" verá que recordar é viver e concluirá que eu então não vivÃ: VegeteiRecolher