Entrevista de Alvirio Natalino More
Entrevistado por Lila Schnaider, Janaina Cescato e Victor Brasil
Projeto Barra Bonita
Realização Museu da Pessoa
Entrevista de número PCSH_HV 1152
00:11
P/1 - Boa tarde seu More, tudo bem?
R - Tudo bem.
00:15
P/1 - Você poderia por favor começar fala...Continuar leitura
Entrevista de Alvirio Natalino More
Entrevistado por Lila Schnaider, Janaina Cescato e Victor Brasil
Projeto Barra Bonita
Realização Museu da Pessoa
Entrevista de número PCSH_HV 1152
00:11
P/1 - Boa tarde seu More, tudo bem?
R - Tudo bem.
00:15
P/1 - Você poderia por favor começar falando o seu nome todo e a data de nascimento?
R - Alvírio Natalino More.
00:28
P/1 - E nasceu quando?
R - 26/12/1943.
00:36
P/1 - Onde o senhor nasceu?
R - Aqui mesmo onde nós moramos hoje, aqui no Sítio Belo. Nós nascemos aqui no sítio aquele tempo era um sítio, todo mundo morava no sítio, as molecada elas tinham em casa aqui, a mulherada não ia no hospital e nada. Então nós nascemos aqui no sítio.
01:11
P/1 - E o sítio fica há quanto tempo assim do centro da cidade?
R - 0,4 km.
01:19
P/1 - E o senhor viveu até que idade no sítio?
R - De quando eu nasci até hoje estamos aqui.
01:32
P/1 - Como é o nome dos seus pais?
R - João Batista More e Virgínia Polato More.
01:43
P/1 - E o que eles faziam?
R - Naquele tempo cuidava da casa e cuidava dos filhos, fazia tudo que era serviço de casa, de roça, fazia de tudo.
01:59
P/1 - O seu pai fazia exatamente o quê?
R - Trabalhava na roça, tanto carpia, como plantava café, plantava milho, plantava feijão, tudo que tinha de fazer fazia no sítio.
02:11
P/1 - E aí fazia o que com o que ele plantava?
R - O que sobrava do café vendia, os milhos, o feijão usava para comer e o resto vendia, juntava de porco e vaca e cuidava dessas coisas aí.
02:31
P/1 - E a sua mãe, quantos irmãos o senhor tinha?
R - Nós éramos em 11.
02:39
P/1 - Era um time de futebol mesmo. Quantos homens, quantas mulheres?
R - Era um time de futebol mesmo, 05 mulheres e 06 homens.
02:52
P/1 - E como é que era essa convivência aí com tantos irmãos?
R - Aquele tempo era diferente de hoje. Todo mundo ficava junto, era tudo irmão, quando nós tínhamos uma idade mais ou menos já ia ajudar o pai na roça e ficava tudo junto.
03:13
P/1 - E vocês brincavam de quê? Brincavam juntos, brincavam de quê?
R - Brincava, quase nem isso a gente não fazia naquele tempo, não tinha tanta brincadeira, a gente levantava cedo e ficava em volta de casa, era um monte de irmão, um ia para um lado, o outro ia para o outro.
03:55
P/1 - E vocês ficavam fazendo o que em volta da casa?
R - Brincava desses brinquedinhos, diferente de hoje que a molecada tem um monte de brinquedo. A gente montava em um cabo de vassoura, a gente fazia um carrinho, essas coisas aí naquele tempo.
04:14
P/1 - Tem algum brinquedo que o senhor construiu que o senhor lembra?
R - Aquele tempo para fazer um carretel que a mulherada costurava roupa, fazia o tipo de um caminhãozinho para empurrar assim no chão com uma tabuinha com um engatinho! Aquilo lá fazia aquele tempo!
04:32
P/1 - O senhor aprendia com quem?
R - Uma molecada mais velha, os maiores ensinavam a gente lá e fazia.
04:41
P/1 - E dos 11 o senhor está em que lugar? Dos 11 irmãos?
R - Meus irmãos, acho que estou em torno de 07, acho que eu estou.
04:46
P/1 - Tinha algum irmão que se dava melhor, que você tinha mais afinidade?
R - Não, era tudo igual.
05:16
P/1 - Tinha alguns que você se espelhava, via assim como exemplo?
R - Era tudo do mesmo jeito, era tudo igual, era tudo tratado do mesmo jeito.
05:31
P/1 - E com seus pais, como era a sua relação com os pais?
R - Os pais naquele tempo a gente era diferente de hoje. Aquele tempo os pais só davam uma olhada para os filhos já sabia o que queria dizer. Sabiam o que eles tinham que passar, já sabia, não é que nem hoje que fica falando falando eles não obedecem. Aquele tempo era diferente.
05:58
P/1 - Conta mais como é que era, alguma história que aconteceu com o senhor nessa fase de quando era pequeno?
R - Era tudo igual assim, de tarde tomava banho na bacia, uma hora ou outra tomava banho cada qual saía trocado e esperava, ia dormir e pronto, não tinha nada de nada, era sempre do mesmo jeito. E quando veio um radinho, veio um radinho daqueles que parecia um caixão de abelha, ficava tudo escutando aquele rádio e isso daí é.
06:35
P/1 - Como é que era a casa de vocês?
R - Era uma casona, uma sala grande, quatro quartos, cozinha grande, a dispensa para guardar os mantimentos, o que guardava de saco de sal, saco de farinha, de saco de feijão, tudo na dispensa falava, então era o fogãozão de lenha grande, o lugar de por água, a água não era encanada, era água tirada do poço e colocava dentro de lata, de balde, de pote, falava aquele tempo. Desse jeito aí era.
07:16
P/1 - E aí a casa nesse sítio?
R - Casa no sítio, lavar roupa na beira do rio, a baciona cheia de roupa, minha mãe descia lá para lavar roupa na beira do rio, depois colocava a roupa no varal, recolhia naqueles varal de espinho, levava em casa aquelas roupa de serviço tudo, aquela baciona cheia.
07:41
P/1 - E vocês aproveitavam o rio? Iam só lavar roupa ou aproveitavam?
R - Tinha uma mina assim com uma bica de água lá na beira do rio, então caía no tambor e tinha uma banca daquelas, que falava banca de madeira para a mulher esfregar a roupa, as roupas eram tão sujas aquele tempo que tinha que ferver o tambor para poder limpar se não não limpava, com solda, fervia roupa ainda, sabão que fazia em casa
08:19
P/1 - Que rio?
R - O corguinho que existe até hoje aí, o corguinho na beira lá embaixo no fundo do sítio.
08:29
P/1 - E o senhor costumava frequentar outros rios?
R - Não, a gente não ia em lugar nenhum, meu pai e minha mãe não deixava. Nós temos o rio Tietê pertinho aqui, a gente não ia de medo de entrar na água.
08:46
P/1 - E o senhor tem alguma lembrança do rio Tietê?
R - Do rio Tietê tenho lembrança de quando nós ficamos mais moço que a gente ia pescar, que pegava peixão que dava até gosto de ver, era o divertimento da gente.
09:03
P/1 - Que mais?
R - De sábado depois do meio dia, que a gente não trabalhava de domingo, enchemos os garrafão de pinga, um saco de limão com sal e a gente descia lá na beira do rio, arrancava cascudo embaixo das pedras, assava na brasa e comia, ficava tudo meio uma borracha naquele tempo lá, era uma beleza.
09:27
P/1 - Com que idade isso?
R - Isso era de 12 a 14 anos por aí.
09:35
P/1 - Já bebia?
R - Não, a turma, os mais velhos bebiam, a gente não bebia nada, nossa senhora, de jeito nenhum, os mais velhos que eram os mais chefes já tomavam os golão.
09:49
P/1 - E o senhor acompanhava o seu pai?
R - Não, os colegas mais velhos que tinha, eles chegavam e a gente ia junto e tal.
10:02
P/1 - E o senhor acompanhava a sua mãe indo lavar a roupa no rio?
R - A gente descia lá, era uma barroca lá embaixo que tinha um muro para subir que dava medo, lá tem as vacas também ficava junto lá, a gente descia e subia tudo junto.
10:21
P/1 - E o senhor acompanhava o seu pai no trabalho?
R - No trabalho eu ia de 08 anos para frente, já ia na roça ajudar meu pai, apanhar café, ou ia quebrar milho, ou ia arrancar feijão, ia ajudar meu pai na roça.
10:38
P/1 - O que é que o senhor se lembra desses momentos?
R - A gente não via hora que falava para ir embora de tarde, até que o sol não descia lá embaixo, escondia o sol, a gente não ia embora, não é que nem hoje aqui duas horas a turma já está indo embora, ia a pé e voltava a pé na roça, não tinha nada de ônibus.
11:03
P/1 - E iam todos os irmãos? Conta um pouquinho de um dia que o senhor se lembra. Como era o dia assim quando você ia para a roça?
R - Todos, ia a escadinha inteira. Na roça depende o que fazia, trabalhava até, ia cedo, depois a gente almoçava 08 horas, que naquele tempo a gente almoçava uma vez, meio-dia, almoçava outra vez de tarde, vinha embora tudo junto.
11:34
P/1 - E fazia o que exatamente?
R - Fazia tudo, no sítio tinha de tudo para fazer, carpir, podia quebrar milho, podia apanhar café, todas essas coisas tinha no sítio para fazer. Carpir era direto.
11:50
P/1 - E o que o senhor gostava mais de fazer? Gostava de fazer mais o que desses trabalhos?
R - Menos do que a gente gostava era de carpir, mas tinha que carpir, não tinha jeito.
12:04
P/1 - E o que mais gostava?
R - A gente gostava quando era que nem puxava esterco, trabalhava com carroça, trabalhava com burro, a gente já pegava uma carroça, engatava os burros, e ia na carroça levar esterco, café, milho, a gente gostava mais.
12:23
P/1 - Conta um pouquinho desses dias que vocês saiam com burro, com a carroça.
R - Era um divertimento, nossa, não via a hora de parar de carregar para tocar o burro para depois do tempo que plantava a cana, começamos os plantio de cana, enterrava a cana com burro, com carpideira, passava a carpideira no meio do café, era um divertimento aquele tempo, para nós tudo era festa.
12:52
P/1 - Apesar de ser trabalho era festa.
R - Mas era porque gostava das coisas, tinha vontade de fazer.
13:04
P/1 - E quando foi a sua primeira escola?
R - A escola a gente morava aqui no sítio e na vizinha fazenda Ponte Alta tinha a escola. Então do 1º ano, aquele tempo a gente falava 1º ano, até o 4º ano, a gente ia na escola no sítio. A gente saía daqui a pé de manhã, ia na escola a pé, uns 0,3 quilômetros mais ou menos a pé, entrava na aula 08 horas, saía meio-dia e vinha embora a pé aquele tempo lá, mas fazia até o 4º ano. Até o 4º ano a gente fez no sítio aqui. Depois fizemos o último ano na cidade. A gente ia a pé e voltava a pé também. Daqui na cidade 0,4 quilômetro, ia no grupo Fernando Costa, estudava e vinha embora a pé.
13:58
P/1 - E como é que o senhor via a escola? O que que o senhor achava?
R - Aquele tempo a gente estudava de noite com lamparina, a professora mandava fazer tarefa, naquele tempo não tinha nem força. Na lamparina a gente fazia as tarefas, fazia tudo de noite, aquele tempo não é que nem hoje que a molecada tem que empurrar para eles fazer as coisa, a gente é que fazia com amor mesmo.
14:28
P/1 - O que fazia com amor?
R - Tudo que a professora mandava fazer, as tarefas, a gente estudava, mandava estudar eu estudava mesmo naquele tempo, mas passei aqui do 1º ano até a 5ª série que fala, não reprovei nada foi direto. Não podia ficar, continuar estudando, ia ajudar o pai na roça.
14:57
P/1 - E como era essa sua escola? Essa do 1º ao 4º ano?
R - A professora que vinha naquele tempo lá dava aula, a gente obedecia a todas as coisas e aprendia. O sítio era na escola, na fazenda
15:27
P/1 - E tem algum professor, professora que marcou o senhor?
R - Na escola no 1º ano aqui na Ponte Alta foi só uma professora que atendia a gente.
15:43
P/1 - O senhor lembra de algum fato que ocorreu assim com a professora, quando o senhor era pequeno?
R - Não ocorria nada, não posso dizer nada.
15:58
P/1 - E com os amigos como era?
R - Os amigos iam juntos, voltava junto, ia na escola, depois vinha tudo junto, uma parte ficava lá na fazenda que estudava
lá, e uma parte 07, 08 deste bairro, e o resto era da própria fazenda, toda molecada, tudo mundo junto.
16:34
P/1 - E o senhor foi para estudar nessa escola até a 4ª série, depois foi para a escola na cidade.
R -
Depois naquele tempo falava tirou o diploma, saiu da escola e acabou. Era isso aí
16:51
P/1 - E como foi a adolescência?
R - Tudo bem.
17:01
P/1 - O que o senhor costumava fazer na adolescência?
R - A gente de semana ficava em casa. Domingo e sábado à noite tinha vez quando a gente era mais moço eu ia dar uma voltinha para Barra, e tinha vez que ia no baile, umas brincadeirinhas por aí.
17:23
P/1 - Ia no baile onde?
R - A gente não podia ir longe. A gente trabalhava de dia com um cara para ajudar ele a carregar nas costas, para depois de noite levar a gente em cima de um caminhãozinho lá no baile pra gente dançar até uma certa hora, depois a gente ia embora.
17:46
P/1 - Aonde que era esse baile?
R - Olha no Parmitá, o Parmitá é o município de Jaú, é lá para aquele outro lado.
17:57
P/1 - Conta mais um pouco dessas aventuras aí pelos bailes.
R - A gente ia jogar bola também, a gente ia de domingo jogar bola, ia um domingo jogava no Praeirinho, um dia jogava na Ponte Alta, outro domingo jogava no Parmitá, era assim, naquele tempo não via a hora que chegava o domingo para jogar bola, porque era o único esporte que a gente fazia de domingo era aquilo. E de sábado à noite era um bailinho.
18:28
P/1 - E conta um dia que marcou o senhor desse baile? Um dia que marcou, que o senhor se lembra muito bem desse dia no baile?
R - O baile era direto para gente aqui na ilha, era bom porque era todo o povo já se conhecia, todo mundo chegava no Parmitá, onde ia já sabia, que era aquele povinho que ia direto.
19:01
P/1 - E como foi a primeira namorada?
R - Foi a primeira e a última, foi só uma.
19:12
P/1 - Conta um pouquinho o que aconteceu.
R -
A gente morava vizinho, então a gente se encontrava todo dia, direto, vizinho e depois namoramos uns 03 anos, casamos e até hoje estamos juntos, já faz 56 anos que estamos juntos.
19:39
P/1 - E como foi que o senhor pediu ela em namoro?
R - A gente se gostava desde moleque e estamos juntos até hoje.
19:52
P/1 - Que idade o senhor tinha quando começou a namorar?
R - Tinha uns 15 anos
eu acho, que por aí 16, 17 por aí acho, que a gente andava junto depois de dezenove começamos a namorar mesmo.
20:11
P/1 - E como foi o casamento? Conta um pouco da história do casamento.
R - Foi bem, a gente casou, fomos morar um pouco mais a retirada, ficamos 01 ano, nem a gente acostumava, nem os meus pais costumavam da gente ir embora. Voltamos e estamos aqui até hoje no mesmo lugar que eu nasci.
20:42
P/1 - Quantos filhos tiveram, tiveram filhos?
R - Eu tinha 04, um faleceu mas tem 03 vivos.
20:51
P/1 - E o senhor quer contar? Pode contar um pouco do que aconteceu com o filho?
R - Um filho começou a exagerar a pressão, uma coisa ou outra morreu, e os outros estão aqui vivos, graças a Deus até hoje pulando aqui com nós. No mesmo lugar aqui também, até morrer.
21:11
P/1 - E eles moram também no sítio?
R - Não eles moram, fica metade no sítio, metade fica para a cidade, mas eles moram na cidade. Só eu com a dona Neide que fica aqui no sítio mesmo, moro aqui e vivo aqui.
21:26
P/1 - E como é que é a dona Neide?
R - Dona Neide é a minha companheira desde quando a gente era criança, estamos até hoje juntos, ela faz a parte dela e eu faço a minha.
21:48
P/1 - O que vocês gostam de fazer juntos?
R - A gente trabalha junto, faz tudo junto, tudo no sítio aqui o que tem que fazer estamos sempre juntos.
22:01
P/1 - Mais o quê?
R - Na parte do sítio ela faz o serviço da casa, eu faço o que eu tenho que fazer, e vou tratar galinha e vou tratar porco, vou na horta plantar alface, tudo essas coisas eu faço na horta lá, e ela faz a parte da casa, faz comida, lava roupa, e eu faço outro lado.
22:36
P/1 - E vocês têm algum tipo de lazer fora o trabalho?
R - Não, trabalho, depois aqui a gente tem o restaurante no sítio, de quarta a noite a gente faz uma janta. A turma vem comer a janta. E domingo a gente faz almoço. Então desde sábado a gente começa já a preparar as coisas, deixar tudo ajeitadinho para no domingo fazer o almoço, só trabalha.
23:09
P/1 - E como começou a história do restaurante?
R - Comecei fazer um churrasquinho, umas coisinha para uma turminha, e eles “vamos fazer isso, vamos fazer aquilo, depois vamos fazer um almoço”, aí começamos a fazer um almoço, deu certo, e até hoje, foi o almoço e uma janta só por semana, uma janta de quarta a noite e o almoço de domingo.
23:35
P/1 - Quem cozinha?
R - A tem uma filha mais umas 04, 05 mulherada aí, a mulher que cuida mais lá da cozinha e eu cuido das carnes, prego pau direto.
23:52
P/1 - Quais são os pratos que vocês fazem?
R - Não dá nem para falar de tanta coisa. Domingo a gente faz o costelão no bafo, frango à passarinho, polenta frita, mandioca frita, ovo frito, farofa, maionese, salada, faz 20 tipos de salada, depois macaroni, nhoque de mandioca eu faço também bastante, é um monte de coisa.
24:27
P/1 - E quem costuma frequentar o restaurante?
R - Tem gente de tudo que é lado aqui, na cidade, vem de Jaú, vem de Bauru, São Manuel, vem de tudo lá do Pacatuba, Pederneiras vem direto.
24:44
P/1 - Faz quanto tempo que o senhor tem um restaurante?
R - Há mais de 20 anos já cuido aqui.
24:53
P/1 - Como é que surgiu a ideia?
R - Foi os próprios colegas que começaram, vamos fazer um almocinho, vamos fazer isso, fazer aquilo, começamos e virou, aqui a turma fala que é assim, atendimento tem que ser bom, comida boa, não tem miséria de comida. Então, tudo é bom, eles falam, vão ter o que é, tem gente que vem aqui, almoça, falam assim, “se eu tivesse ido dar nota na sua comida, na sua carne, nas coisas, eu dou nota mil”. Ela fala, não tem outro jeito. Então, por isso que vira. O atendimento tem que ser bom.
25:33
P/1 - Mas antes o senhor gostava de cozinhar, gostava dessa coisa de cozinha, porque eu trabalhava na roça.
R - A gente fazia, supondo, quando naqueles tempos fazia casamento, aqui fazia um churrasquinho para a turma, para os convidados. Então eu já era curioso daquele jeito, eu gostava de ajudar, eu ia ajudar a assar carne, temperar a carne, eu gostava de temperar, temperava bem com limão, bem caprichada depois jogava sal, ajudava a servir, aí vai pegando aquele gosto de fazer as coisas não perde mais.
26:14
P/1 - Teve um dia de abertura da inauguração?
R - Não, foi tudo meio devagar, foi aos pouquinho, vai ajeitando e vai tocando até hoje.
26:27
P/1 - Já aconteceu alguma coisa inusitada no restaurante?
R - Não, foi sempre bem, sempre de acordo, tudo certinho.
26:40
P/1 - Nunca apareceu ninguém inconveniente?
R - Não, a gente tem até medo porque fala que é aqui no sítio, a gente tem hora que fala, nossa, mas a gente não anda direito com as coisas, não tem problema nenhum, muito conhecido que vem aqui, é muita gente, a gente é muito conhecido e todo mundo prefere. É uma beleza!
27:10
P/1 - E quando o senhor era pequeno, o senhor tinha algum desejo de ser alguma coisa, de ser ter alguma profissão?
R - Não!
27:25
P/1 - E quem eram seus melhores amigos?
R - Não dá nem para contar de tanta gente, sou mais conhecido que dinheiro.
27:40
P/1 - E na adolescência tinha algum melhor amigo ou melhor amiga?
R - Na adolescência o bando que a gente era, uns foram embora para um lado, outros foram embora para outro, os outros que ficaram aqui morreram tudo, fiquei só eu quase aqui no bairro.
28:04
P/1 - E os seus irmãos frequentam?
R - Meus irmãos também de homem só sobrou eu por enquanto.
28:13
P/1 - E das mulheres?
R - De mulher tem 03, 02 morreram.
28:25
P/1 - Elas vão no restaurante, vocês têm encontros?
R - Tem, a gente se encontra, ao menos vamos falar, estamos vivos, vamos se abraçar um pouco.
28:44
P/1 - E qual é o nome do bairro?
R - Bairro do entulho.
P/1 - E por que, como surgiu esse nome?
R - Esse nome é um nome tão feio, mas os velhos falavam que aqui era um lugar que dava tanto café que dava, então a astúria era uma casa de madeira que eles guardavam o café. Então de tanto aquele café que dava. Daí eles recolheram o café e guardaram o café para vender no fim das colheitas, falava no Bairro do Entulho. Aí vinha o comprador que vendia todo o café, carregava os caminhões e levava embora os café. Aí pegou esse nome, nome do entulho, hoje o entulho é um lugar feio onde deposita lixo, porcaiada, e aqui fica o nome Bairro do Entulho.
29:40
P/2 - Ainda sobre o Bairro do Entulho, eu gostaria de saber seu More do irmão do tio do Belmonte, o pastor Todarelli foi muito famoso, o nosso artista de Barra Bonita é muito famoso de repercussão nacional, e ele compôs aquela música saudade da minha terra, que é praticamente o hino do sertanejo raiz, conhecido por vários em todo o Brasil. E o tio do Belmonte, eu queria que o seu Lilo contasse a história que era vizinho dele, era amigo, morou aqui no Bairro. Fala um pouquinho do tio do Belmonte por favor pra gente?
R - O tio do Belmonte morou aqui 20 anos com a gente. Então tudo que se passava no começo da vida dele, no começo da carreira dele, que a carreira dele quando começou eles contavam tudo com a gente. Depois quando ele começou já que seguiu aquela carreira, pegou aquela maré bão ele tinha aqueles livrinho. Ele mandava os livrinhos pra gente. A gente gostava de cantar e cantava aquelas músicas tudo, aquelas moda do Belmonte que até hoje ainda dá para reinar alguma coisinha dele aí. Mas era conhecido assim o tio dele, a mãe dele era tudo que a gente se conhecia, só que ele mesmo nem cheguei conhecer.
31:11
P/2 - Será que ele poderia, o seu Lilo gosta muito de cantar, recepcionar todo mundo
aqui com muita festa, alegria, coisa típica assim de descendente de italiano, festeiro, e ele canta muito bem, ele tem um vozeirão, ele poderia cantar a música de Saudade da Minha Terra para vocês?
R - Eu posso?
31:46
P/1 - Pode cantar.
R - “De que me adianta viver na cidade
Se a felicidade não me acompanhar
Adeus paulistinha do meu coração
Lá pro meu sertão eu quero voltar
Ver a madrugada quando a passarada
Fazendo alvorada começa a cantar
Com satisfação arreio o burrão
Cortando estradão saio a galopar
E vou escutando o gado berrando
O sabiá cantando no jequitibá
Por Nossa Senhora meu sertão querido
Vivo arrependido por ter deixado
Esta nova vida aqui na cidade
De tanta saudade, eu tenho chorado
Aqui tem alguém, diz que me quer bem
Mas não me convém eu tenho pensado
Eu fico com pena, mas esta morena
Não sabe o sistema que eu fui criado
'Tô aqui cantando, de longe escutando
Alguém está chorando com rádio ligado
Que saudade imensa do campo e do mato
Do manso regato que corta as Campinas
Aos domingos ia passear de canoa
Nas lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança daquelas festanças
Onde tinham danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem ter alegria
O mundo judia, mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas mãos divinas
Pra minha mãezinha já telegrafei
E já me cansei de tanto sofrer
Nesta madrugada estarei de partida
Pra terra querida que me viu nascer
Já ouço sonhando o galo cantando
O nhambu piando no escurecer
A lua prateada clareando a estrada
A relva molhada desde o anoitecer
Eu preciso ir pra ver tudo ali
Foi lá que nasci, lá quero morrer”.
34:17
P/1 - De quem é essa música?
R - Do Belmonte e Goiás com Belmonte e Amaraí.
34:32
P/1 - E o senhor pode explicar um pouquinho, falar um pouquinho do Belmonte?
R - Belmonte, falar a verdade do jeito que contava o tio dele, ele nasceu com aquele dom de ser um cantor, um homem que cantasse, porque naquele tempo eles moravam no sítio, na fazenda Santa Elisa, aquele tempo quem tinha um pedaço de café na fazenda, que carpia e plantava feijão, plantava milho, colhia o café, uma parte era do dono da fazenda, outra parte era deles, então era terceiro que falava, meeiro, e o Belmonte como trabalhava era molecão ele ia na roça, que todo mundo ia na roça ajudar os pais, então eles falavam assim, cada um pegava uma rua de café para carpir, o pai
dele e falava assim, “onde que está o Pascoal, o Pascoal ele não está. Não está”. Ia ver ele estava tocando viola no cabo da enxada. Então ele não tinha jeito de carpir. Ele tocava viola no cabo da enxada. Então foi que ele se tornou um cantor do jeito que ele era, não tinha jeito carpir. Aqui ele não ia. E foi assim a história que o tio dele contava para nós lá, até hoje ele foi, deu vontade, ele falava nunca que ia carpir, tinha outro dom.
36:00
P/1 - E como o senhor conheceu ele?
R - Eu não conhecia ele em pessoa. Conhecia um tio dele, a mãe dele, o tio dele que trabalhava.
36:21
P/1 - Conheceu a música dele?
R - A música sim, a música, aquele tempo as músicas saiam nos livrinhos e eu estudava, cantava todas elas, o tio dele pegava a música, os livrinhos e trazia para mim, eu cantava tudo, naquele tempo eu era bom de peito.
36:45
P/1 - E o senhor fala com sotaque diferente.
R - É um pouco de sotaque do tempo do…é que eles me tratam assim, “olha o italiano, olha o italiano”, os meus avós que eram italianos.
36:58
P/1 - Conta um pouquinho da sua origem, dos seus avós, de onde vieram?
R - Vieram da Itália, meu avô veio no tempo dos imigrantes. Então, meu avô veio aqui
no sítio. Eles vieram com o saco nas costas e a minha avó ficou era a namorada dele e ficou lá, era moça. Ela veio em um navio, ele veio no outro, aí se perderam, tinha que contar, mas minha tia contava tudo da história, eles se perderam, um chegou aqui e o outro ficou em outra fazenda mais longe, naquele tempo não tinha comunicação nenhuma, eles eram namorados, mas acabou, não se viam. Um dia a minha tia falou, tinha os pastos, era pasto, o córrego, depois tinha o pasto subia para um lado e descia para o outro, então
minha tia falava assim, ele chamava Isidoro o meu avô. Minha tia falou para minha avó lá. ( idioma italiano) falou para ele, para minha avó, e era ele vinha vindo de atalho para o meio dos pastos lá. Eles levavam aqueles botinão nas costas, com cordão pendurado, andava descalço, chegou, aí se encontraram, os dois, aí teve jeito, fizeram já se casaram e ficaram juntos e criou o meu pai, criou a turma do meu pai, meu pai criou nós, nós já criamos os filhos e estamos até hoje aqui no mesmo lugar.
39:00
P/1 - Agora traduz a parte que o senhor falou em italiano.
R - Não, ela falou assim, ela quis dizer, olha aquele lá parece o Isidoro, a outra falou assim, (idioma italiano), ela quis dizer assim, vai saber onde ele está nessas horas aqui. E era ele mesmo que vinha vindo, ele chegou e não teve mais jeito, aí eles ficaram na casa até na hora da morte um do outro.
39:31
P/1 - Que incrível essa história?
R - É, foi incrível mesmo a turma falava, dava quase uma novela.
39:44
P/1 - Eles se encontraram, casaram…
R - Casaram, formaram a família, comprou um sitinho aí, até hoje o sítio está aí, ainda hoje no mesmo lugar, tem o meu irmão que ficou com aquele sítio, e nós ficamos encostado e estamos até hoje aqui ainda.
40:08
P/1 - De que cidade eles eram? Você sabe?
R- Rovigo.
40:18
P/1 - O senhor conheceu a Itália?
R - Não conheci nada.
40:23
P/1 - Mas fala italiano.
R - Eu falo um pouquinho.
40:28
P/1 - Como o senhor aprendeu?
R - Minha mãe conversava muito em italiano, meu pai, quando a molecada, eu ficava, mas nunca com aquela ideia, mas eu sempre pegava um pouquinho de coisa, meu pai e minha mãe conversavam bastante, quanta coisa que eles falavam tudo em italiano, e nós meio um pouquinho de lá, pegava alguma coisinha.
40:56
P/1 - E como era essa história de falácias, falavam em italiano em casa?
R - Meu pai e minha mãe falavam e a gente só escutava aquele tempo, acabou aprendendo, alguma coisinha a gente aprende.
41:17
P/1 - E o que o senhor gosta de fazer em Barra Bonita?
R - Na cidade eu só vou fazer umas comprinhas, alguma coisa que eu vou, volto e fico no sítio. Meu chalé é aqui no sítio. A turma vem aí e fala assim: você nem sabe que você mora no céu. Eu tenho aqui minha casinha, um arvoredo, tenho porcos, tenho galinha, tenho horta, tenho tudo essas coisas, e me divirto o dia inteiro no meio dessas coisaradas, eu passo o dia sem saber para onde foi.
42:03
P/1 - E seus filhos? O senhor falou dos filhos, o que eles fazem?
R - São dois homens e duas mulheres, um homem faleceu. Uma trabalha na Santa Casa, Amaral Carvalho, a outra faz serviço de casa, ajuda a trabalhar aqui no restaurante, e o outro filho quebra a cabeça com maquinário, caminhão, carregadeira, essas coisas.
42:45
P/1 - E ele já tem filho?
R - Tem.
P/1 - Tem neto então senhor? Quantos netos?
R - Tenho oito netos e um bisneto.
43:03
P/2 - Seu Lilo, gostaria que o senhor contasse novamente para nós um pouquinho sobre a história do café, das olarias e depois da cana.
R - O café era uma coisa que dava dinheiro, todo mundo plantava, um plantava outro plantava e era só sítio que tinha aqui, quem tinha um sítio era formado. O sítio inteiro de café. Então todo mundo trabalhava com aquele amor naquilo. Era uma coisa que virava, dava o dinheiro e vinha os compradores, comprava tudo, mas chegava no fim de ano quando vendia a colheita ficava tudo contente com o café que vendiam e recebia dinheiro. Depois como foi caindo, foi desmoronando, aí a turma pegou na cerâmica. A cerâmica tinha a argila encostada, tinha cerâmica para todo lado. Cerâmica na Barra, cerâmica aqui no sítio tudo manual, sem falar que nem energia tinha, era tudo na raça, tocava burro, puxado barro com carroça, e tocava as coisas desse jeito, depois evoluiu, tinha marromba, tinha a parte elétrica que fazia um monte, se fazia dois mil tijolos em um dia, depois eles faziam dez com movimento de que tinha elétrica. Fazia a telha, fazia o tijolo, tudo assim mais rápido. Bom, foi evoluindo. Até que veio a barragem cercou a água, entupiu aqui os barreiros, então as mais fracas foi pifando tudo, foi acabando, os mais fortes aguentam até hoje tem umas quatro, cinco. E o resto se acabou em nada. E depois então veio a cana. A cana foi outra coisa. Aqui no começo a gente fazia uma viagem de cana e dava um dinheirão, depois foi caindo, foi caindo, carregava na unha, depois veio mecânica o carregamento de carregadeira e cortadeira e colhedeira, foi indo, foi indo. Então hoje só ficou a cana mesmo, está tocando a cana, mas antigamente era a cerâmica, o café, e depois virou para a cana. Até hoje é só cana.
45:32
P/1 - Como é que surgiu o nome do restaurante?
R - O restaurante a gente estava aqui em uma turminha aqui, estava tudo aquele banquinho meio moda do outro de pão de ganga comendo e bebendo. E naquele tempo tinha aquela novela da Terra Nossa, a gente estava assistindo, tinha televisão e um colega falou assim, “vamos achar o nome do restaurante agora, vai funcionar o restaurante então vamos achar o nome”. Aí ele falou assim, “vamos cortar a nostra”. Terra Nostra que estava passando aquela novela e grudou até hoje, Terra Nostra colou.
46:28
P/2 - Eu acho interessante, como ele gosta muito de música, gostaria de saber, é uma até das perguntas, quais músicas marcaram a vida dele. Quais músicas seu Lilo, que são marcantes na sua vida? Pode ser do Belmonte, se o senhor quiser cantar Mercedita também fica a vontade que eu sei que o senhor adora contar a Mercedita.
{…
Tus recuerdos Mercedita
Perfumada, flor bonita
Amor meu de uma vez
A conheci no campo
A muito tempo em uma tarde
Hoje só ficou saudade
Desse amor que se desfez
E assim nasceu nosso querer
Com ilusão, com muita fé
Mas não sei porque a flor
Deixou-me dor e solidão
Ela se foi, com outro amor
Assim me fez compreender
O que é querer, o que é sofrer
Porque lhe dei meu coração
O tempo foi passando
E as campinas verdejando
E a saudade só ficando
Dentro do meu coração
Mas apesar do tempo
Já passado, Mercedita
Essa lembrança maldita
Na minha triste canção
Assim nasceu o nosso querer
Com ilusão, com muita fé
Mas eu não sei, porque esta flor
Me deixou em solidão
Ela se foi com outro amor
Assim me fez compreender
O que é querer, o que é sofrer
Porque lhe dei meu coração}
49:04
P/1 - O senhor tem saudade de quê?
R - Não carrego nada.
49:20
P/1 - Tá bom, porque na música falou em saudade, aí eu fiquei pensando do que o senhor tinha saudade. E o senhor então continua trabalhando no restaurante?
R - Agora nós vamos até uma meia noite servindo comida hoje.
49:46
P/1 - Então vou deixar o senhor em paz agora. Tem alguma história que o senhor não contou que gostaria de contar?
R - Já temos mais ou menos calibrado.
50:19
P/1 - Quais são as coisas mais importantes para o senhor hoje?
R - É a vida, nossa e da família inteira, tudo junto é uma beleza. O que é importante hoje, bastante saúde e junto com a minha família.
50:46
P/1 - E quais são os seus sonhos?
R - É viver a vida inteira do jeito dele. Então assim está bom demais. Não tenho sonho porque aqui. Melhor do que está não está. Não tem outra coisa. Não adianta nego querer isso, querer aquilo, querer aquilo lá. Eu estou bem assim. Está bom demais
51:18
P/1 - E o como foi para o senhor contar a sua história aqui?
R - Foi uma beleza, deu certo, não deu certo, eu contei tudo, contei aquilo, contei aquilo lá, começa a puxar uma coisa, puxar outra, então a gente vai lembrando, os passados mais velhos, então vai sabendo aqui, lembrando aqui, lembrando aquilo lá, tudo é bem na roleta dá para dar certo, desde quando a gente era criança.
52:04
P/1 - É isso, vai puxando pela memória. Está bom, então eu queria agradecer muito o senhor por ter nos dado essa entrevista, falando sobre a sua história de vida. Muito obrigada. Adorei ouvir.
R - Tá bom.
P/1 - Tchau.
R - Tchau.Recolher