Entrevistadora - Se calhar, começávamos por nos dizer o seu nome, data e local de nascimento.
João Avelino - João Avelino de Oliveira Pereira. Nasci a 8 de novembro de 1951 e sou natural de Santa Marinha, Vila Nova de Gaia.
Entrevistadora - Como é que era a sua família? O que é que se lembra da sua família, dos seus costumes?
João Avelino - Eu tinha, digamos, quatro avós, eram professores primários. A minha mãe era farmacêutica, o meu pai trabalhava nos serviços do Estado. [pausa] Tinha algumas referências políticas na família. Um dos meus tios tinha sido candidato, no tempo do fascismo, pela Oposição Democrática… mas, no essencial, depois são os problemas da juventude que me agarram e… começo a participar nas atividades políticas, na altura da... em 1969, nas eleições, nas eleições, ou seja, fazia… para a CDE, a Comissão Democrática Eleitoral. Fazia aquele trabalho de muitas formiguinhas, que era o trabalho de propaganda, de proximidade com os jovens, movimentação, movimentação... para tudo. Eu também… pronto… o momento de maior tensão que eu vivi foi, naturalmente, a Manifestação do 15 de Abril [de 1972] contra a Carestia, a qual se depois juntou também o fim da Guerra Colonial, e que foi das maiores manifestações realizadas no Porto, e que se segue... uma manifestação muito violenta… tinha havido o 1º de Maio aqui no Porto, em 71. Eu saio… saio de casa em junho de 72, vou para o exterior do país, tarefa do partido, tenho que atravessar a fronteira clandestinamente, com alguma segurança, porque, inclusivamente, eu tinha no bolso, tive durante esse tempo, um passaporte falsificado pelo partido e quando passei a fronteira, a salto, já ia o carimbo da PIDE, como eu tinha passado, nesse dia, pela fronteira normal, e isto porquê? Porque tinha que atravessar a Espanha toda até chegar a França. Durante este período, e voltando ao 15 de abril, eu digo que foi um dos mais... dos mais desgastantes,...
Continuar leituraEntrevistadora - Se calhar, começávamos por nos dizer o seu nome, data e local de nascimento.
João Avelino - João Avelino de Oliveira Pereira. Nasci a 8 de novembro de 1951 e sou natural de Santa Marinha, Vila Nova de Gaia.
Entrevistadora - Como é que era a sua família? O que é que se lembra da sua família, dos seus costumes?
João Avelino - Eu tinha, digamos, quatro avós, eram professores primários. A minha mãe era farmacêutica, o meu pai trabalhava nos serviços do Estado. [pausa] Tinha algumas referências políticas na família. Um dos meus tios tinha sido candidato, no tempo do fascismo, pela Oposição Democrática… mas, no essencial, depois são os problemas da juventude que me agarram e… começo a participar nas atividades políticas, na altura da... em 1969, nas eleições, nas eleições, ou seja, fazia… para a CDE, a Comissão Democrática Eleitoral. Fazia aquele trabalho de muitas formiguinhas, que era o trabalho de propaganda, de proximidade com os jovens, movimentação, movimentação... para tudo. Eu também… pronto… o momento de maior tensão que eu vivi foi, naturalmente, a Manifestação do 15 de Abril [de 1972] contra a Carestia, a qual se depois juntou também o fim da Guerra Colonial, e que foi das maiores manifestações realizadas no Porto, e que se segue... uma manifestação muito violenta… tinha havido o 1º de Maio aqui no Porto, em 71. Eu saio… saio de casa em junho de 72, vou para o exterior do país, tarefa do partido, tenho que atravessar a fronteira clandestinamente, com alguma segurança, porque, inclusivamente, eu tinha no bolso, tive durante esse tempo, um passaporte falsificado pelo partido e quando passei a fronteira, a salto, já ia o carimbo da PIDE, como eu tinha passado, nesse dia, pela fronteira normal, e isto porquê? Porque tinha que atravessar a Espanha toda até chegar a França. Durante este período, e voltando ao 15 de abril, eu digo que foi um dos mais... dos mais desgastantes, porquê? Porque, inclusivamente, na mobilização para essa manifestação, por um lado, utilizamos meios que não eram habituais, ou seja, a propaganda que nós chamamos de espetacular, que era composta por umas caixinhas que distribuíam papéis muito pequeninos, e que tinham, na base, uma bombazita que fazia explodir e voavam uns papéis, uns metros largos, e assustavam algumas pessoas também, mas não tinha nenhuma... não tinha nada de… carga que tivesse… risco. E eu interceptei, como há bocado estava a querer dizer, é que isto era um trabalho coletivo, embora muito compartimentado, ou seja, cada um só sabia aquilo que precisava de fazer, encaixando-se nesta máquina. Estou a dizer isto até porque depois eu creio que é o José Carlos Almeida o ideólogo destas caixas… deste tipo especial de propaganda, que entusiasmou os jovens que tiveram essa tarefa… e que também permitiu perceber-se que nós éramos uma parte num todo, que se iam encaixando e, por isso, resultava ou não em função do cumprimento dessas funções. Estava a dizer que, por exemplo, para essas ações espetaculares, como lhes chamávamos, para a construção dessas caixas, cada camarada ficou com uma tarefa de comprar material para isso. O meu pai na altura tinha uma pequena papelaria e era necessário comprar cartão prensado para proteger as tarjetas, senão podia queimar. A mim foi-me dada a tarefa de arranjar esse cartão prensado, que só mais tarde é que eu vim a perceber, quando tive que pôr algumas dessas para explodir, é que comecei a perceber que, de facto, aquele cartão prensado que eu tinha ido comprar era exatamente para os camaradas depois poderem… as caixas, as caixas. No que se refere... no que se refere à manifestação em si, eu digo que é um dos períodos mais entusiasmantes da manifestação, estou a falar pela minha experiência, dos mais entusiasmantes, mas também é daqueles períodos em que o stress foi muito elevado, porque havia sempre o medo da minha parte de duas coisas. Uma, falhar a tarefa, ou seja, eu era a pessoa que tinha a função de dar o sinal de arranque da manifestação, para que depois os outros grupos confluíssem … e quando chegou às seis e meia, aquilo já estava com muita gente, muita gente, com o corpo policial repressivo muito… também muito grande, e o pior que podia acontecer era, às seis e meia, a manifestação não arrancar, até porque... o ambiente em que estava era um ambiente muito, muito tenso. Felizmente, não houve azares em termos de se concretizar tudo o que estava planificado… há também a questão de… que eu tinha medo de falhar, ou seja, e falhar em dois sítios. Um era na hora própria, não ter… coragem para avançar… mas não, aí não foi o mais difícil, o trabalho preparatório antes, esse sim, porque fartei-me de ler e reler um livro que eu emprestei a alguém e que nunca mais regressou, um pequeno opúsculo, que era “Se fores preso, camarada”, que era meter na cabeça que não podia falhar, porque punha em causa outros camaradas, outros camaradas. É um bocado esta a questão.
Foi feito, para se perceber a dimensão e as condições em que foi feito, para esta manifestação foram utilizados mais de cento e quarenta mil papéis, aos quais se somam cerca de mais cem mil, ou seja, no global, cerca de duzentos e quarenta mil, tudo feito à mão, ou feito, feito… nas empresas… nas… tipografias clandestinas. Pronto e é… um bocado isto. Entretanto, depois regresso a Portugal, apenas no dia 5… 5 de Maio de 74. Outra coisa também que é interessante, de certa forma, é que regresso no comboio… na cabine com o [impercetível], que era… ou que foi o secretário de Humberto Delgado, com o filósofo Gil da Silva e com o… o Lyon de Castro, que era o dono das edições… Europa-América, das edições dos livros Europa-América. Chegado aqui a 5 de Maio, entrei na organização do partido e pronto, e em Janeiro de 75, estava como quadro subsidiado do partido, ou seja, como funcionário. O que é que posso dizer mais? O que é que posso dizer mais? Dizer que, de facto, os grupos que foram organizados pelo partido, e cada um sabia só as suas tarefas, não é, não falharam, ou seja, não falhou o arranque e não falharam os vários camaradas que tinham a tarefa de fazer fluir o pessoal para a placa, para a placa, a gente chama o cavalo, para a Praça da Liberdade, para o meio da Praça da Liberdade. Foram presos uma série de camaradas e amigos, porque nem todos eram do partido, mas o grosso era malta jovem do partido… a PIDE e o aparelho repressivo, apesar de estar muito, muito intenso e presente, não conseguiu apanhar tudo, e é interessante pois um dos camaradas, que era o mais conhecido porque tinha estado nas tarefas de… da crise estudantil em Coimbra, é preso, é preso porquê? Porque ao atravessar de onde era o Café Astória, que é na esquina que dá para a estação de São Bento e, por isso, tínhamos que atravessar, e atravessámos para o meio, para onde está a estátua, tive que lançar a bandeira para… porque transportei a bandeira até lá, cheguei lá e tive que lançar a bandeira… lançar a bandeira pelos ares, um dos camaradas que vinha atrás, que era o Fernando Pessoa, ficou com a bandeira na cabeça e, por isso, nos autos da… da PIDE, nos relatórios da PIDE, aparece como o desgraçado que levou a bandeira, pronto. Isto tenho aqui uma parte do processo do relatório da PIDE, uma cópia. Mas eu acho que o… o determinante disto foi que… se conseguiu ir encaixando, e volto a repetir, neste trabalho coletivo, porque não há, de facto, heróis isolados e nem se pode referir, digamos, ao heroísmo, não, é a determinação que é dada também pela força que cada um de nós sente ou sentiu num momento que o partido estava ali e que… digamos, as massas estavam disponíveis. Volto a recordar que o aspeto principal era o brutal aumento de custo de vida, hoje, quando fazemos comparações e falamos no preço do azeite e tudo isso, é um regresso a 50 anos atrás, nessa altura também os preços do azeite e das batatas tinham subido muito, e aqui teve um papel importante… as mulheres, que, digamos, dinamizaram muito este trabalho. E, como digo, depois acrescentou-se a luta contra a guerra colonial, porque tinha um conjunto… um conjunto muito grande de jovens. Para hoje, acho que é importante ainda lembrar, e já que neste momento está a polémica, é importante lembrar que a guerra colonial era uma das preocupações maiores das famílias, por muito estranho que pareça, mulheres não queriam ter filhos… do sexo masculino, porquê? Para não irem para a guerra, por isso, queriam filhas e não filhos, porque ali estava a ameaça de perder o filho, o namorado, porque muitos morreram e muitos ficaram para o resto da vida… deficientes.
Entrevistadora - Disseste que tinhas aí o relatório da PIDE, se quisesses nos mostrar… Esses conseguiste recuperar depois?
João Avelino - Sim, sim. Isto foi-me dado por um dos envolvidos nisto, por um dos presos, que foi a seguir ao 25 de Abril que eles tinham recuperado.
Entrevistadora - Esse tal Fernando Pessoa, não é?
João Avelino - Sim.
Entrevistadora - E depois isso explica o que é que tinha acontecido…?
João Avelino - Sim, é a acusação. Atrás, por acaso, tem... esta é a original, que é a carta da PIDE ao Hospital de Santo António para dizer que, por causa das pessoas que tinham sido lá… escondidas, não é, particularmente, neste caso, do António Mesquita. Não se consegue ler… esse é o original. Isto na altura chamava-se papel… papel de segundas vias, porque era feito à máquina de escrever, metiam-se os químicos, por isso, é que é assim tão fino, tão fino. O... aqui é o relatório… é o relatório feito pelo partido à manifestação na altura. Isto é o relatório do partido, da direção da organização do partido. Depois… ainda vindo dos arquivos da PIDE, é a montagem do esquema da PIDE para incluir a manifestação.
Entrevistadora - Isto aqui é…?
João Avelino - É na praça… na praça do cavalo. Isto são fotografias do arquivo da PIDE.
Entrevistadora - Quantos jovens, mais ou menos, que estariam nessa manifestação?
João Avelino - No total, na altura, foram 40 mil pessoas, o grosso… a esmagadora maioria eram mulheres e homens… e jovens, mulheres e jovens. Agora, a parte mais dinâmica, naturalmente, depois no ato em si, foi para os jovens, porque quem é preso tem tudo, ali na casa dos vinte, vinte e poucos anos, dezassete… Ah, interessante! Um dos presos, um dos presos até para... com a noção de que podia ser preso, até tinha arranjado uma justificação e tinha comprado o bilhete para ir ao cinema às seis e meia no Trindade e estava também… estava no processo dessa pessoa. O tal livrinho que eu falo e que emprestei e que não mais me devolveu, é este, “Se fores preso, camarada”. Já agora, isto é um conjunto de tarjetas que ainda serviam para serem lançadas… ser lançadas… já agora. Fizemos isso também na altura do São João, nas rusgas, à noite, iam para lá. Uma das primeiras coisas a fazer é colar isto… lambia-se atrás, colava-se, particularmente, nos bancos dos autocarros e para sair era um bocado difícil. Isto é os comunicados que saíam na altura, que era depois da grande manifestação no Porto, vamos ao 1º de Maio, mas é claro que esse 1º de Maio não teve o mesmo impacto que tinha tido anteriormente o 1º de Maio de 71, que foi muito violento.
Entrevistadora - Estes eram os tais documentos que recebiam por parte das tipografias clandestinas?
João Avelino - Sim, sim.
Entrevistadora - Como é que te chegavam esses documentos?
João Avelino - Pelo circuito próprio do partido, ou seja… por acaso, não encontrei uma forma de passar o Avante, o Avante era naquele papel bíblia, não é, que dobradinho cabia dentro de uma caixa de fósforo e… por isso, para passar isto, alguém pedia um cigarro no café e depois esquecia-se da caixa de fósforo, por acaso, não o encontrei, tenho por aí, mas não o encontrei… era uma das formas. De resto, vinha pela estrutura do partido.
Entrevistadora - Como é que se começou a envolver com o partido? Tinha dito que foi na altura da sua juventude…
João Avelino - Foi. Eu começo a me envolver com a política em 69, nas eleições, nas eleições. A seguir, fui fazendo aquele trabalho muito de propaganda, muito de propaganda, junto da juventude, e participei em algumas das tarefas, algumas das tarefas… não tendo papel de direção, mas como participante, nomeadamente… a quando… realizamos, íamos realizar, aqui em Matosinhos, no Monte, no Monte de São Brás, o acampamento nacional da juventude, isto em 70, 71, e foi proibido, foi proibido, esse acampamento… e com nota na comunicação social, pronto… o que é que é…?
Entrevistadora - Lembra-se de… ou seja, como é que chegou até ao partido? Foi por colegas seus…? Que pessoas é que o levaram até lá? Tem memória da… daquilo que na altura o levou a… ir por aí?
João Avelino - Era gente que eu conhecia, era gente que eu conhecia, que nessa altura se envolveu também… ou tinham tarefas… [tosse].
Entrevistadora - Precisas de água ou de alguma coisa?
João Avelino - Preciso é de tabaco! [risos] Não, fundamentalmente era gente que eu fui conhecendo… que foi… como eu costumo dizer, para aquelas tarefas da propaganda. Por falar em tarefa de propaganda eu na altura, já vos referi, em relação à compra do cartão prensado, em relação ao nitrato de prata, que ao fazermos as pichagens duravam anos e tinham que ser picadas as paredes para sair, mas o sol não estava a bater e voltava a aparecer, aí… hoje considero um erro, conspirativo, mas a única solução que a gente conseguiu, foi que a minha mãe, como era farmacêutica, é que requisitava o nitrato de prata e vá-se a ver… aquelas quantidades para que é que serviam? Mas serviram, para a gente fazer muitas pichagens.
Entrevistadora - Fale-me um pouquinho mais sobre a sua família, falou agora da sua mãe… tinha irmãos? Cresceu com eles? Como foi?
João Avelino - Sim… éramos 7 irmãos e crescemos juntos, crescemos juntos, é um bocado disto, quer dizer.
Entrevistadora - Lembra-se da sua casa de infância?
João Avelino - Lembro. Lembro-me da de Matosinhos, porque da de Gaia eu vim com um ano e meio, nasci em Gaia só e… o resto vivi em Matosinhos. No 25 de Abril, era em Matosinhos que os meus pais estavam. Eu, propriamente, digamos, não era daquelas pessoas vítimas de fome ou de outra coisa qualquer. Fui lá mais pela consciência, pelo sentir o problema de que nem todos éramos iguais, não éramos tratados de modo igual. Tenho que agradecer ao meu pai, que nunca me deixou, nunca me tirou da escola pública, porque tinha perto da minha casa, sensivelmente, à mesma distância, uma casa de ensino público e outra que era do privado, ligada à Igreja.
Entrevistadora - Quantos anos andou na escola?
João Avelino - Na escola? Eu... em 72, quando tenho que arrancar, estava no ministério primário, ou seja, na escola que formava professores primários ou professores do ensino básico e, por isso, tive que deixar, não acabei, não acabei.
Entrevistadora - Ia seguir o percurso dos avós, então…
João Avelino - Os meus avós... eram todos professores primários, por isso, havia uma hierarquia, naquele tempo, o mais importante era o padre ou o regedor e, a seguir, o professor. Pronto, era um bocado isso. Não tinha... não tinha nos meus avós, propriamente dito… gente de esquerda, não tinha. Tinha nos meus tios, no meu tio, mas nos meus avós não.
Entrevistadora - E essa… essa escolha que teve pelo ensino primário, lembra-se como é que foi feita?
João Avelino - Foi… por um lado, acho que o meu pai tinha pouco... tinha pouca relação com a Igreja e, por isso... por outro lado, em termos do ensino, eu achava que... que era junto com os outros, que estávamos bem.
Entrevistadora - Então depois na juventude, começa-se a envolver com o partido, também já nos contou um bocadinho aquelas que eram as funções que tinha, lembra-se como é que surgiu a oportunidade de estar na clandestinidade?
João Avelino - De entrar para o partido? Isso depois, quer dizer, é… surge o convite, aos camaradas ou aos jovens, que... que se destacam mais por isto, ou mais por outro, nestas tarefas, ou naquelas tarefas e… aquele trabalho normal de recrutamento, de ver se agarramos os mais destacados, os… os... por aí fora.
Entrevistadora - Então, mas nunca chegaste a assumir uma identidade falsa, ou a estar numa casa clandestina, é isso?
João Avelino - Não. Usei... usei o passaporte falsificado do partido para atravessar… atravessar não, para dar o salto, e se fosse apanhado em Espanha, tinha até o carimbo do dia da PIDE.
Entrevistadora - Mas numa casa, nunca estiveste numa casa clandestina?
João Avelino - Não, não…
Entrevistadora - Era função de organização… era clandestinidade, mas de outra forma.
João Avelino - Sim.
Entrevistadora - E para além daquelas experiências também que já contou, lembra-se de mais algumas que o tenham marcado, deste período?
João Avelino - Há… há coisas que a gente não esquece. Nós aqui em Matosinhos, era um setor de muita luta, quer operária, quer dos pescadores, com grande força, nos pescadores nas... nas situações de greve mais difícil, inclusivamente, conseguiu-se criar, agora chamaríamos comités de ajuda, mas eram grupos solidários para que chegasse material alimentar a algumas famílias, mais tocadas pelas greves, pelas greves. Matosinhos tinha um conjunto significativo de fábricas, que eram, digamos, o ribeiro da estrutura do partido. E hoje explica-se algumas coisas, com a destruição das grandes empresas, que desarticulam também, digamos, a concentração desse proletariado.
Entrevistadora - E como é que foi essa... essa sua ida para a Espanha? Não sei se quer falar um pouquinho mais sobre isso, essa experiência de ter passado a fronteira com essa identidade falsa. O que é que se lembra desse episódio?
João Avelino - Curiosamente, aquilo que mais me marcou foi ter perdido dois maços de tabaco… [risos] a atravessar a fronteira, que era um português, sabe-se lá porquê que era aquilo que eu fumava… e eu ao atravessar o ribeiro, ia numa motorizada à boleia, e perdi dois maços de tabaco. E curiosamente foi aquilo que mais me marcou. Depois era… foi o caminho, o caminho por aí fora, para a tarefa que tinha que ir fazer.
Entrevistadora - Quanto tempo durou?
João Avelino - Eu regresso a Matosinhos a 5 de Maio, a 5 de Maio.
Entrevistadora - Mas porque é que foste para a França?
João Avelino - Eu fui… fui… para França era um apeadeiro… de uma outra viagem… para mais longe.
Entrevistadora - Ias para a União Soviética?
João Avelino - Sim.
Entrevistadora - Foste fazer um curso?
João Avelino - Sim.
Entrevista - Era aquelas formações para que o partido mandava alguns jovens para lá?
João Avelino - Sim.
Entrevistadora - Gostavas de falar um pouco mais sobre essa experiência? Como é que foi… chegar à União Soviética? Como é que era essa... pode ser interessante.
João Avelino - [Silêncio] Primeiro há… naturalmente que... quando discutimos a União Soviética e quando discutimos a União Soviética em 1972, não é exatamente discutir a União Soviética passados uns anos ou discutir-se depois na queda histórica. Em 72, o que me marcava era, digamos... era a limpeza, a limpeza das ruas, eu tinha que às vezes andar 200 metros com a beata para ir pôr ao cinzeiro no meio da rua, não é, não a deitava, mas depois foi-se degradando, quando lá voltei, a segunda vez, ainda em oitenta e tal, já... já havia sinais de degradação, pronto.
Entrevistadora - Quanto tempo esteve lá então?
João Avelino - Tive um ano, um ano e um pouco…
Entrevistadora - Em Moscovo?
João Avelino - Sim.
Entrevistadora - Tem mais alguma memória desse ano? Mais algumas lembranças que gostasse de partilhar?
João Avelino - Não, não tenho assim nada.
Entrevistadora - Depois então regressa… em…
João Avelino - Sim, a seguir ao 25 de Abril. Chego a casa no dia 5 de Maio.
Entrevistadora - Que memórias é que tem desse momento em que regressa à casa?
João Avelino - É um turbilhão [risos], é um turbilhão até porque durante dois anos a minha mãe martirizava os meus irmãos no dia de Natal, ou seja, porque punha o prato do filho que não estava e, por isso, é das coisas que me chocam, não é, que é ter feito sofrer os meus irmãos, essa angústia no Natal.
Entrevistadora - Como é que soubeste que se tinha dado o 25 de Abril?
João Avelino - Estava na organização do partido e por aí… e soube por aí. E também soube pela comunicação social, não é?
Entrevistadora - Voltou com que idade? Que idade tinha nessa altura?
João Avelino - Tinha 23 anos.
Entrevistadora - E volta para a casa dos seus pais então?
João Avelino - Sim, sim.
Entrevistadora - E o que é que significou para si esse momento? O que é que sentiu nesse turbilhão? [risos]
João Avelino - Para quem tinha posto na cabeça que não voltava a ver a família... significou muito, tê-los ali, significou muito.
Entrevistadora - Depois como é que se desenrolou a sua vida? Portanto, chegou cá…
João Avelino - Cheguei cá, em Maio, em Maio, logo em Maio, ajudei os trabalhadores das fábricas das conservas, estou... fico à frente da parte administrativa do Sindicato até Dezembro, depois em Dezembro vou como funcionário do partido para... para Santo Tirso e por aí, pronto.
Entrevistadora - E alguma vez esteve preso ou teve medo de ir preso? Tem alguma memória nesse sentido?
João Avelino - Ah, medo de ser preso tive muitas vezes. Muitas vezes até porque, como há bocado referi, uma das minhas tarefas era a propaganda, distribuição, meter nas caixas de correio isto… pronto, assim, e por isso naturalmente. Por outro lado, o entusiasmo que eu tinha com as tarefas, com as tarefas que me davam, fazia-me superar e até, de certa forma, meio inconsciente, de provocar, de provocar. A minha companheira, que na altura era minha namorada, coitada até teve que fazer o papel de chatear um PIDE, que fazia com frequência… que se cruzava connosco, ou seja, tinha ali ao fim da tarde, eu ia buscar a minha companheira à Escola Gonçalves Zarco e vinha com ela para Leça, depois ia embora. E é nessa altura disse-lhe “Olha, vai ali aquele”, “Eu já vi ontem e tal”, pronto, quando nós mudamos a estrada que habitualmente fazíamos, ele vai-nos aparecer à frente… e eu disse “Vai-lhe pedir tabaco, isqueiro... fósforos” e a minha mulher [risos] lá foi, como quem diz a gente conhecia, mas isto é de loucos, quer dizer é provocar desnecessariamente. Também, como há bocado, estávamos a falar das caixinhas que faziam rebentar e espalhar a propaganda, aqui em Matosinhos puseram-se várias, ao total para a manifestação foram cinquenta e sete. E o interessante é que ninguém foi preso, não sofreu ninguém, porque não tinha carga para ferir… e… lá chamo outra vez a minha mulher, marco encontro com ela no sítio onde habitualmente todos os dias estávamos, que era para a camioneta e… a atravessar a rua, deixo ficar a tal caixinha, que depois fez ali o estardalhaço, um estardalhaço.
Entrevistadora - Então, a sua companheira também era do partido?
João Avelino - Não era militante do partido, mas era como se fosse.
Entrevistadora - Mas já estão juntos há muitos anos, então.
João Avelino - Sim, casámos formalmente em 76. Começámos a namorar em 67, tinha eu 15 e ela 16 e mantivemo-nos.
Entrevistadora - E tiveram filhos?
João Avelino - Uma filha.
Entrevistadora - Eu acho que gostava de saber um bocadinho mais sobre como era o dia-a-dia, das funções da propaganda, perceber um pouco melhor, já falaste da questão do fósforo, das caixas de correio, mas perceber um bocadinho mais de como é que se fazia esta passagem… portanto, ias buscar os documentos?
João Avelino - Vinham trazer. Porque, como havia a compartimentação das tarefas,
a gente só sabia o que era estritamente necessário e, por isso, o camarada trazia a propaganda para eu, neste caso concreto, ir distribuir, eu e, às vezes, normalmente, dois camaradas, porque fazíamos largas distâncias, que hoje considero que era um erro, mas largas distâncias a distribuir, ou seja, para se ter ideia, vir da Efacec até Matosinhos a pé, a ir metendo nas caixas de correio, demorava horas. Ora, a meio do caminho, basta ver alguém, ver de noite dois jovens… eu hoje considero que era um erro que a gente cometia, mas a ânsia de colocar no maior sítio possível, no maior sítio possível, era… ultrapassava isso.
Entrevistadora - E eram esses documentos contra a guerra colonial…?
João Avelino - Era tudo. Tudo o que foi, fundamentalmente, também dávamos uma ajuda na distribuição da propaganda em geral sobre a carestia da vida, sobre a guerra, pronto, era fazer chegar a mensagem do partido, porque o Avante, quer dizer, depois tinha... era muito mais limitada a sua difusão.
Entrevistadora - Também distribuías os Avantes?
João Avelino - Sim.
Entrevistadora - Podes contar um bocadinho mais sobre algumas outras formas de… era aqui em Matosinhos só?
João Avelino - Sim, sim, era só... só numa parte de Matosinhos.
Entrevistadora - Como é que era feita essa distribuição?
João Avelino - Normalmente, isto ia-se ganhando, um a um, os novos leitores, com muito cuidado, com muito cuidado, e pronto, havendo gente que não era do partido, ia lendo regularmente o Avante.
Entrevistadora - Mas… ou seja, de que forma eram dadas essas indicações… mas como é que vocês se organizavam? Havia reuniões em que participavas? Quais eram esses momentos de reunião, de junção do partido para essas indicações?
João Avelino - As reuniões, na altura, eram muito limitadas a três, quatro camaradas, quer dizer, não... participação nessas reuniões era três, quatro camaradas, porque não era possível expor quem é que era do partido e quem não era, ou seja, a nível superior sabia-se quem, a outro nível não sabíamos, por isso, às vezes, falávamos com malta que era do partido, sem nunca sabermos que era do partido. E também houve situações, aliás, aqui em Matosinhos, não comigo, mas com os jovens de Matosinhos, já em 73, os quais um irmão, que são os últimos presos de Março de… são os últimos presos e… resultantes da tal ação de um dos que lidava e trabalhava com eles. Por isso, não havia, digamos, plenários, onde se juntava mais gente era quando se fazia um convívio qualquer, a propósito de qualquer outra coisa, um piquenique, uma coisa assim, mas, de resto, uma iniciativa cultural, mas, de resto… era muito compartimentada.
Entrevistadora - E em que locais é que se faziam essas reuniões?
João Avelino - Tanto podia ser em torno de uma barraca de campismo, como podia ser num parque, era, portanto, naturalmente, em alguns casos, em casas, em casas mais defendidas, ou seja, casas que não fossem tão conhecidas e que, por isso, para albergar dois, três camaradas, na discussão, depois isto era discutido pelo resto, pelas estruturas abaixo.
Entrevistadora - E tinham algumas técnicas nessa altura das reuniões para passar despercebidos?
João Avelino - Sim. Uma das regras fundamentais era a pontualidade, ou seja, o que estava marcado para as seis significava que às seis tinha-se mesmo que estar. Até porque, nos casos, nos casos em que se ia ter, pela primeira vez, com um funcionário do partido, estou-me a lembrar, por exemplo, no meu caso concreto, o primeiro que me chamaram, o meu primeiro funcionário, foi o Albano Nunes e… ali no Bonfim, acho que se chama Praça das Flores, ali no Bonfim, vi uma cabine telefónica, às seis horas em ponto, eu tinha que entrar na cabine e sair, e ao sair, o Albano Nunes saía cá fora com uma revista que era a Flama, que se calhar, seria a Maria de agora, ou coisa assim, mas ele faria uma pergunta, uma pergunta normal, “Se o autocarro vai para não sei quê” e a resposta que eu daria seria disparatada, pronto, só ele sabia que sim senhor, que era eu, e então a partir daí, vim cá. Isto, como, neste caso concreto, como aconteceu com os restantes, aconteceu com os restantes, caso contrário, pronto, era marcado um ponto, um ponto, para esse tipo de encontro. Havia a senha e a contrassenha, que é a pergunta normal, uma pergunta natural para uma resposta estapafúrdia.
Entrevistadora - E como é que eram as relações com… com os outros camaradas? O que é que mais se lembra desses momentos em conjunto?
João Avelino - Eu acho que, pelo menos para mim, o que me marcava era a solidariedade muito grande entre nós. Pronto, e creio que é isso que me marcou, que me marcou.
Entrevistadora - Em que é que essa solidariedade estava presente?
João Avelino - Uma das questões que eu acho que era assim mais presente é que nós sempre tentamos unir o máximo possível e… e este esforço era feito, era feito pelaa maioria. Não significa que não tivéssemos discussões, não é? Até mesmo nas condições da clandestinidade que o partido vivia, naturalmente, que a opinião contava e isso era, era e é, fundamental.
Entrevistadora - Como é que se sente… depois na sua vida, quando se dá o 25 de Abril, que principais mudanças sentiu na sua vida? Há bocadinho já falamos um pouco do momento em que regressa a Portugal e daquilo que sentiu nesse momento, mas depois, com o passar dos anos, não sei se consegue estabelecer diferenças entre aquela que era a sua vida antes do 25 de Abril e a sua vida depois, o que é que mudou, o que é que se manteve.
João Avelino - Depois do 25 de Abril, muito trabalho político, muito intenso. Depois dizer que… quer dizer, que continuo a considerar que não há data mais importante para mim que o 25 de Abril, é, digamos, a data que marca. Apesar de a gente estar a viver um período muito complicado do populismo e dos erros cometidos por gente que se diz de esquerda e que de esquerda não tem nada, apesar de tudo isso, é fundamental e quem é entusiasmo, ontem não estava em condições, estava a [impercetível], mas deu entusiasmo de ver, quer dizer, que gerações diferentes vieram à rua, como vínhamos a seguir ao 25 de Abril. Ou seja, que é preciso manter a confiança na luta mesmo nos períodos mais difíceis e nas curvas mais apertadas da vida. Agora, naturalmente, que a gente não pode ficar naquele slogan do “25 de Abril sempre”, é preciso acrescentar-lhe “fascismo nunca mais”.
Entrevistadora - Vou andar, se calhar, só um bocadinho atrás… como é que ainda no período anterior ao 25 de Abril, como é que eram as relações que tinham com pessoas que não eram do partido? Ou seja, como é que era… era percepcionado dessa maneira… enquanto militante?
João Avelino - A relação com as outras pessoas era… era a relação normal que se tem com qualquer um, não é, e… e naquela altura… vivia-se muito na base de… da frequência dos vários cafés, ou seja, muitos cafés estavam abertos até às duas da noite, a gente sabia que se queria estar com um determinado tipo de gente ia ao café A, se queria estar com outro determinado tipo de gente, café B. A ideia que eu tenho deste momento é que nada disto acontece, a gente nem sai de casa, quer dizer, chega a noite e nem sai de casa, quando antigamente quantas e quantas vezes a gente ia para o Porto e se perdesse o último elétrico tinha que vir a pé, pronto. Hoje tinha uma trotinete [risos].
Entrevistadora - Que espaços é que frequentava no Porto?
João Avelino - Frequentei os vários cafés, o Piolho, apesar de tudo, era aquele que menos me dizia, que era como eu lhe chamava… era para um certo tipo de elite, de elite entre aspas, depois o Ceuta, que era um café mais amplo e com outro tipo de gente e… e, por exemplo, para a malta que estudava, na Rua da Fábrica, o Estrela… pronto, e por isso ia em função da gente que a gente procurava… estar-se, mas havia de certa forma as tertúlias de café, em que a gente discutia tudo e mais alguma coisa, às vezes com o PIDE ao lado, às vezes com o PIDE ao lado… e mais algumas loucuras.
Entrevistadora - E sente que alguma vez esteve quase na iminência de ser preso? Falou-nos do medo que sentia, não é, mas sente que isso estava perto em algum momento… de ter acontecido?
João Avelino - Sim. Aliás, há bocado referiu-se o aspeto do PIDE ou seja lá o que fosse de… que me acompanhava a mim e à minha mulher durante uns tempos… como em Matosinhos a gente tinha uma atividade interessante, pronto, existia algum receio.
Entrevistadora - Já encontrou algum ficheiro que tivesse lá o seu nome, da PIDE, tinha lá um ficheiro…?
João Avelino - Não, não… nem nunca procurei. Este que tenho da PIDE foi… foi-me dado por um familiar de um deles.
Entrevistadora - Mas, se calhar, até tem um ficheiro… temos de ir à Torre do Tombo procurar… se calhar, ainda há lá um sobre o João Avelino… [risos]
João Avelino - Eu… quer dizer, digamos, se estivesse a refletir, erros cometidos podem ter feito abrir a minha ficha. O julgamento do padre Mário da Lixa, por isso, não sei se vos diz alguma coisa ou não, mas podem ver o… naquela altura, contra a guerra colonial, houve um conjunto de padres que tomaram posições… e foi julgado, foi um dos casos mais mediáticos, digamos… entretanto, fez-se uma espécie de abaixo assinado e exposição… e houve uma tarefa de enviar aquilo pelo correio, na estação de correio que havia em São Bento, ora, passado isso, é que eu refleti que fui lá deixar os meus dados completos, porque ao mandar aquilo ficou o meu nome, morada… portanto, é das coisas que eu posteriormente achei uma estupidez, mas na altura, naquele grupo que estávamos ali no Tribunal de São João [Novo], decidiu-se, pronto, “Vais lá tu”.
Entrevistadora - Já falaste várias vezes das regras conspiratórias e agora talvez do… daquilo que te pudesse comprometer das regras conspiratórias… para nós é um bocadinho difícil de compreender, às vezes, como é que eram dadas essas… que orientações é que eram dadas e como é que vocês entendiam o que é que eram as ordens conspirativas, para não serem… para não comprometerem tanto a vossa identidade como a identidade de outros?
João Avelino - Como te referi, o funcionamento era em pequenas células e , por isso, não era de conhecimento público o conhecimento de outros camaradas, quem é que era, quem é que não era, só sabiam aqueles que fossem necessários para a tarefa A, B ou C. Por exemplo, nessa não sei responder que é… para a manifestação do 15 de Abril, foi comunicado a mim qual era a tarefa e mais outro camarada sabia qual era a tarefa, não havia muito mais… para os outros, para os outros grupos foi feita a mesma coisa, juntam-se à volta do fulano, à volta do fulano, à volta do fulano… não era… depois conhecia-se, mas não… não se conhecia como membro do partido, às vezes, sendo os dois membros do partido, não se conhecia como membro do partido. Aliás, porque é isso que permite que… muitos camaradas não sejam presos e há bocado referi que uns dos momentos mais tensos… foi quando li o tal livrinho, que era o “Se fores preso, camarada”, que era o comportamento a ter na PIDE, essa era… eu acho que o terror de todos que era… mais do que ser preso, era trair a confiança, ou seja, não conseguir suportar as torturas ou… ou o ambiente criado, mas acho que… esse sim era o maior medo de cada um quando se punha a refletir “e se eu não aguentar?”, pronto, o sentimento mais intenso é isso.
Entrevistadora - E que lembranças tem da Revolução de Abril? Como é que viveu esse… esse período?
João Avelino - Depois daquele mês de Maio foi sempre a abrir. Por acaso, há bocado disse que fiquei em casa dos meus pais, mas passava as noites e dormia no primeiro centro de trabalho do partido, aqui em Matosinhos, e dormia para assegurar o funcionamento, até dezembro… pronto e foi isso.
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