Entrevista de Maria Augusta Ribeiro
Entrevistada por Luiz Egypto
27/03/2021
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número SINPRO_HV014
Transcrito por Aponte
Revisado por Luiz Egypto
0:00
P/1 – Boa tarde professora Augusta! Muito obrigado por ter aceitado o nosso convite. Eu queria começar lhe...Continuar leitura
Entrevista de Maria Augusta Ribeiro
Entrevistada por Luiz Egypto
27/03/2021
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número SINPRO_HV014
Transcrito por Aponte
Revisado por Luiz Egypto
0:00
P/1 – Boa tarde professora Augusta! Muito obrigado por ter aceitado o nosso convite. Eu queria começar lhe perguntando o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento? R - Boa tarde Luiz! Boa tarde Alisson! Meu nome completo é Maria Augusta Ribeiro, meu nascimento foi em 18 de setembro de 1953, tenho 67 anos completos.
0:41
P/1 - E onde a senhora nasceu?
R - Eu nasci na cidade de João Pinheiro, Minas Gerais, lá eu estudei até o início do primário e depois a minha família mudou para Patos de Minas. Onde eu estudei o resto que faltava até o ensino médio, foi o Curso Normal de formação de professoras e professores. Terminado esse Curso Normal, com o diploma na mão, eu vim para Brasília com uma irmã. Aqui fiz o concurso para ingressar na Secretaria de Educação e depois fiz o vestibular, um semestre depois para entrar na Universidade de Brasília, dei a sorte que passei em ambos, um em fevereiro, Secretaria de Educação, naquele tempo chamava Fundação Educacional do DF e depois no meio do ano eu entrei na Universidade de Brasília, a UnB para fazer meu curso superior, que é o que eu consegui concluir.
2:02
P/1 – Queria voltar um pouco atrás, qual era o nome dos seus pais?
R - Meu pai, já falecido e minha mãe também. Pai José Ribeiro da Cruz, mãe Filomena Moreira de Lima.
2:20
P/1 – Qual era a atividade do seu pai?
R - Meu pai inicialmente, no começo, eu era bem criança, ele era comerciante, tinha esses pequenos armazéns em cidades do interior, em João Pinheiro, uma cidade bem pequena. Quando nós mudamos para Patos de Minas, aí ele foi e montou uma fábrica pequena de calçados, e se tornou um bom sapateiro, construía, cortava e costurava sapatos, botinas, essas coisas que usava mais lá nas cidades. Porque são cidades rodeadas por fazendas e tinha muita gente que trabalhava em fazendas, boiadeiros, vaqueiros, criadores disso, daquilo, plantadores e tal, e comprava muita botina, então ele fabricava muita botina nessa pequena fábrica onde ele trabalhava.
3:32
P/1 - E a sua mãe, qual era a atividade dela?
R - A minha mãe era aquela mãe maravilhosa, que faz tudo, ela teve 11 filhos e filhas e cuidava da casa, fazia bicos pequenos, tipo plantava horta para a gente vender alface, vender couve na vizinhança, essas pequenas coisas que toda mulher do interior faz, fazia naquele tempo, que já tem muito tempo, e algumas ainda fazem até hoje. Além de cuidar das hortas dentro do quintal da nossa casa para nossa sobrevivência, para nossa alimentação do dia a dia, mandioca, milho, alface, couve, cebolinha, cheiro verde, abóboras variadas, e etc... Ela sempre foi uma doméstica que tinha uma habilidade muito grande em vários serviços domésticos, mas enquanto educava e cuidava de 11 pessoas, 11 crianças, que não é mole, hoje as mães e os pais se têm um ou dois já não dão conta, imagina.
4:31
P/1 – A senhora conheceu seus avós?
R – Conheci os avós maternos, conheci meu avô materno, que chamava Antônio Lourenço de Lima, avó materno, o pai da minha mãe, e conheci a minha avó materna também, que era Augusta Moreira de Lima, e o meu nome Maria Augusta é homenagem a minha avó materna, mãe da minha mãe.
5:30
P/1 - Os avós paternos a senhora lembra o nome deles?
R - Nossa senhora, agora você me apertou, quando eu nasci, quando eu nasci não, quando eu me identificava como pessoa, que guardava na memória as pessoas com quem a gente se relacionava, eles já tinham falecido. Mas lembrei do nome da minha avó paterna, Maria Umbelino Ribeiro, agora o meu avô paterno, numa outra conversa eu falo para vocês, vou consultar minhas irmãs, meus irmãos, minha família.
6:16
P/1 - Os seus pais contavam algumas histórias dos seus avós, se eles eram da região, que tipo de histórias?
R – Contavam! Tanto a minha mãe, a família da minha mãe, quanto a família do meu pai, eram famílias de fazendeiros, os pais e as mães tinham fazendas num pequeno povoado ali perto de Patos de Minas, que foi para onde a minha família mudou, de João Pinheiro para Patos, então é um triângulo, tem João Pinheiro, tem Patos de Minas e tem essa fazenda, esse povoado que chama-se São Pedro da Ponte Firme, que foi onde eles se conheceram. Porque ambos tinham pequenas fazendas nessa região de São Pedro da Ponte Firme, que ainda existe até hoje essa cidade, agora ela cresceu um pouquinho, mas continua muito pequena, povoado especialmente para pessoas que têm fazendas ali aos arredores.
7:27
P/1 – Como é que era a sua casa lá em João Pinheiro, como é que era? Como ela se distribuía, como é que ela se organizava?
R – Era uma casa normal, comum, uma casa simples, sempre, que eu tenho 67 anos, eu sai de lá eu tinha 4 ou 5, então a minha memória não guarda muita coisa não. Eu sei que era uma casa comum, com quarto, sala, cozinha, banheiros, só!
E naturalmente os terreiros com plantações, toda família tinha sua plantação no terreno para essas pequenas compras de legumes, verduras, etc...
8:11
P/1 - O que motivou a mudança da família para Patos de Minas?
R – Principalmente a necessidade de ter escolas melhores, porque eu sou a terceira, a quarta filha, e quando eu estava com meus quatro, cinco anos, os outros três anteriores a mim, já estavam precisando de uma escola acima do quarto ano primário, que era como chamava a educação naquele tempo. Primeiro, segundo, terceiro e quarto anos primários, depois curso ginasial e depois curso científico, curso normal e etc... Então a minha irmã mais velha, a primeira, ela já estava, estaria precisando de um ensino do curso ginasial, que hoje corresponde ao ensino fundamental. E meus pais, meu pai e minha mãe, mudaram levando para lá para garantia de escolas mais evoluídas, mais avançadas no sentido de séries, ter séries além da quarta série primária. Para os três que foram anteriores a mim. Que foram não, que nasceram antes de mim.
9:48
P/1 - A sua primeira escola então foi em Patos de Minas, não foi?! Como é que ela era?
R – Foi em Pato de Minas, chamava e chama até hoje, Grupo Escolar Marcolino de Barros, uma construção assim, vistosa, bonita, com aqueles ares de arquitetura antiga, maravilhosa! Era um prédio térreo que tinha uma parte em cima, cheio daquelas coisas de arquitetura de 60 anos atrás, muito bonito, numa área muito grande no centro da cidade de Patos de Minas. E essa escola até hoje está intacta lá, com esse tipo de prédio e atualizando os cursos lá, da realidade escolar de hoje no Brasil. Grupo Escolar Marcolino de Barros, eu estudei lá da primeira a quinta série, depois eu fui para Escola Normal de Patos de Minas.
10:59
P/1 - Alguma professora que tivesse marcado a sua lembrança?
P/1 – Olha, várias professoras, professores, eu não esqueço jamais da diretora da Escola Normal, que chamava Filomena, que é o mesmo nome da minha mãe, então não esqueço dela nunca, minha mãe chamava Filomena Moreira de Lima, e a diretora da escola normal, eu já da quinta série em diante, chamava Filomena de Macedo Melo, e era assim bem rigorosa, bem dura com a gente, e eu não esqueço dela nunca, também por causa do nome, mesmo nome da minha mãe. E no Grupo Escolar Marcolino de Barros, quando era criança de 7, 8 anos, 8, 9, eu lembro da fisionomia de algumas professoras, eu lembro da fisionomia das merendeiras, mas eu não lembro do nome, infelizmente, de nenhuma delas. Eu lembro... Incrível, lembro de uma que era assim, miúda igual eu, branquinha, porque eu também era branquinha naquele tempo, cabelo lisinho, loura tal, e ela era assim também, eu me lembro dela direitinho, mas do nome de nenhuma de primeira a quarta série eu lembro, uma falha minha.
12:33
P/1 - Na sua casa havia alguma divisão de tarefas, a sua mãe dava responsabilidade aos filhos para exercer algum tipo de tarefa doméstica?
R – Sim, assim que a gente tinha condição, de 7, 8, 9, 10 anos, tanto as mulheres quanto os meninos, quanto os homens, tinham suas funções bem definidas, bem determinadas, bem organizadas, para contribuir com o trabalho da casa, com os estudos, e harmonizar essa vida do trabalho que a gente tem que ter com os estudos, então da minha primeira série no Grupo Escolar Marcolino de Barros, primeira série primária, eu era bem franzina ainda, a gente tinha, eu já tinha as minhas responsabilidades, as minhas duas irmãs acima de mim, um rapaz, um irmão, também tinham as suas, a gente dividia isso muito bem, graças a Deus, meu pai e minha mãe eles souberam nos dar orientações para gente saber sobreviver no mundo. Apesar de não ter a mínima comparação, 60 anos atrás com a realidade de hoje, era uma cidade pequena, João Pinheiro muito pequena, Patos de Minas depois, era uma cidade um pouco maior, um pouco acima, bem maior do que João Pinheiro, com mais organização da sociedade, mais locais de diversão, bares, restaurantes, parquinho infantil, eu lembro bem de um que eu brincava nesse tempo, e a gente tinha assim, ir de acordo com aquilo que a gente mais gostava, era a função que a gente assumia na colaboração doméstica. Eu gostava de lavar roupas, eu gostava de lavar roupas, e gosto até hoje, agora na pandemia e dispensei a diarista e estou lavando e passando toda a roupa, e fico feliz quando estou no tanque, que agora é com máquina né, mas ainda uso tanque, algumas vezes, com algumas peças, isso me traz uma felicidade, estar lavando roupas, eu gosto disso, de limpar a casa também, eu gosto.
15:11
P/1 – Na sua infância como é que as crianças se divertiam, quais eram as brincadeiras que a senhora gostava de fazer?
R – Era principalmente nas ruas que a gente brincava, a gente brincava de queimada, eu era ótima na queimada, apesar de pequena e magra, eu me diferenciava porque era muito franzininha, ainda sou até hoje, tenho 1,60m, já velha. Queimada, brincava de uma brincadeira chamada bete, jogava uma bolinha, batia uma tábua pequena na bolinha, a outra pessoa pegava do lado de lá, é como se fosse pingue pongue, o pingue pongue de hoje, brincava de jogar vôlei, a gente fazia uma rede de arame mesmo, de corda, uma rede imaginária e jogava vôlei. Então essas brincadeiras eram as mais comuns na rua, nas ruas em frente as casas, não tinha transito, essa coisa maluca que é DF, por exemplo, você não pode brincar na rua mais.
16:27
P/1 – Professora o que a menina Maria Augusta queria ser quando crescesse?
R – Olha, a menina Maria Augusta ela virou professora, não foi uma decisão assim da minha parte, eu na verdade, eu não lembro de quando criança se eu tinha a vontade de ser isso aqui, mas uma coisa sempre me chamava muito atenção, que era música, eu sempre gostei muito de música. A gente tinha um rádio daqueles antigos, eu ficava ouvindo música e tal, e peguei um gosto muito grande por música, lá pelos meus 14 anos, já entendendo bem mais a vida, eu pensei em estudar música, e nesse período a minha irmã mais velha veio para Brasília e também... Ela fez o Curso Normal nessa escola que eu falei que onde eu também fiz o Curso Normal, de formação para professores, ela veio para Brasília e entrou na UnB também, e ela me contava muito como era Departamento de Música da UnB, eu ficava assim ansiosa, maravilhada quando ela me contava como é que era, aí aquela vontade. Ela veio já nesse tempo, eu decidi, vou ser estudante de música lá, mas como eu fiz o Curso Normal em Minas, em Patos de Minas e as únicas opções no ensino médio de hoje, que tinha lá naquele tempo, eram o Curso Normal de formação para professores, para o magistério e o curso científico. Eu já estava estudando na escola normal da quinta série em diante e automaticamente eu entrei no ensino médio lá fazendo curso normal e concluiu o curso normal, e quando vim para aqui o que eu tinha era o diploma de curso normal e fiz concurso na Fundação Educacional do DF, que hoje é a Secretaria de Educação. E depois entrei na UnB e fui estudar na área da Educação, aí eu era muito assim, ansiosa para escolher melhor, aprender mais sobre os cursos, quais cursos a universidade tinha e tal, eu comecei estudando Pedagogia. Depois passei para Economia, depois passei para Letras, e foi em Letras, língua portuguesa e literatura brasileira, curso de letras que eu me formei na UnB. E eu tinha também algumas matérias feitas na área de Jornalismo, que eu sempre escrevi muito bem, eu fiz muita matéria na área de jornalismo, que era os dois departamentos, tanto de letras, quanto de ciências da comunicação naquele tempo chamava, tinha muita matéria em comum, então a gente sempre tinha bom relacionamento com o departamento de comunicação social, e fiz muita matéria, até quase formar, mas depois eu entrei no movimento estudantil. Eu atuei assim, no fim da ditadura, 1978, 79 para frente, muito fortemente e muito firmemente no movimento estudantil. Reconstrução dos DCEs, Diretórios Centrais dos Estudantes, que a ditadura destruiu, e nos centros acadêmicos dos cursos e logo, logo, com uma turma do departamento de letras. Nós criamos o CA de letras, é o Centro Acadêmico de Letras e Linguística, chamado Caleb - Centro Acadêmico de Letras e Linguística, e a gente fez muito sucesso na UnB, porque pós-ditadura, começo de 80, 81, 82 foi um dos primeiros centros acadêmicos a ser criado depois que esses institutos, essas organizações foram destruídas pela ditadura e junto com esse movimento que nós fizemos, o movimento da UnB cresceu e logo, logo, nós recriamos o DCE - Diretório Central dos Estudantes, e que está lá até hoje, o departamento de letras com o centro acadêmico também, tudo lá beleza, coisas que a gente escreveu nas paredes lá na época, que era um tempo da gente grafitar um monte de paredes, estão lá ainda, é uma história bonita. E fazendo isso eu já era professora, eu dava aula à tarde e à noite e estudava na UnB de manhã, porque nesse tempo a UnB não tinha curso noturno.
21:53
P/1 – Qual foi a primeira escola que a senhora assumiu? E como foi o primeiro dia de aula?
R – Vixi Maria! A primeira escola eu tinha 19 aninhos, eu sei que foi uma escola rural perto de Planaltina, mas eu não lembro o nome, acho que nem tinha nome, era uma escola rural, eu fiquei lá pouco tempo, porque era bem longe, eu morava em Taguatinga já, e era muito difícil o acesso para lá. Então num instante, como eu era estudante da universidade, eu tinha dificuldade de acertar as distâncias da minha residência, da universidade, da escola rural perto de Planaltina, aí a Fundação Educacional me transferiu para Taguatinga, cidade onde eu morei e moro até hoje, onde eu morava e moro. Em Taguatinga eu me lembro melhor das escolas, eu trabalhei lá como alfabetizadora na escola Classe 10 de Taguatinga Sul alguns anos, alguns bons anos. Quando eu me formei em letras e tive a minha especialização em língua portuguesa e literatura brasileira, eu já entrei, também em Taguatinga Sul, porque eu morava em Taguatinga Sul, para o Centro de Ensino 9, já nas 6ª e 7ª séries dando aula de língua portuguesa e literatura, depois eu fui para escola normal de Taguatinga trabalhar lá, no curso magistério de preparação de professoras e professores para educação primária, e depois eu vim para as escolas de ensino médio em Taguatinga, chamadas uma é CEMAB e a outra a EIT [Escola Industrial de Taguatinga], eu dava aula num turno no CEMAB e no outro na EIT. CEMAB significa Centro de Ensino Médio Ave Branca – CEMAB, e a outra era Centro Educacional EIT, porque era a Escola Industrial de Taguatinga. Eu dava Português tanto na área do ensino médio, quanto na área de educação industrial que era na EIT,
duas grandes escolas, com alunos para caramba, na faixa de 3.000 alunos cada uma delas. Trabalhei nessas duas até me aposentar.
24:50
P/1 - Eu entendi que a sua aproximação com os movimentos sociais se deu via movimento estudantil, e o sindicato dos professores, como é que a senhora aproximou-se do SINPRO?
R – Olha, eu aproximei-me do SINPRO... O SINPRO não existia até 1980, quando ele foi criado oficialmente, como eu era militante no movimento universitário, militante no movimento social já, porque uma coisa não separa da outra. Aí eu já era professora concursada, já estava com uma história de 2, 3 anos nas questões da educação especificamente, e lá na UnB a gente fazia muita passeata, indo da Universidade de Brasília, que é no início da Asa Norte para a Esplanada dos Ministérios, a gente ia a pé fazendo movimentos diante do MEC, exigindo o fim da ditadura, liberdade dos professores presos, estudantes presos, que foi isso que aconteceu, um companheiro nosso de luta na UnB, eu lembro bem, desaparecido, que até hoje ninguém nunca achou, que chama Honestino Guimarães, e a gente fazia esses movimentos indo principalmente para o MEC ou para o Ministério da Justiça, contra as prisões e a morte desses estudantes, e muitos professores também foram presos. Então já fazia esse movimento social, esse movimento importante, e já era professora, e assim que um grupo de professoras e professores, por volta de 78, 79, esse grupo de professoras e professores se organizou também para fazerem a luta contra a ditadura, pela volta das liberdades, pelas liberdades democráticas, contra os assassinatos, as prisões, os exílios de muitas pessoas. Aí nós nos conhecemos, eu conheci esses professores e professoras, já como professora e estudante ainda, através dos movimentos que a UnB fazia, a gente logo se encontrava com os professores também fazendo seus movimentos. E em 1979 eu já participava de muitas reuniões com esses professores, para discutir a criação de um sindicato, não tinha sindicato nesse ano ainda, 1978, 79, então a gente criou uma associação. E foi criada a Associação de Professores do DF, eu participei de quase todas as reuniões para criar essa Associação, mas em função de ter uma carga horária de trabalho de 8 horas diárias, mais 4 horas na UnB, eu não tinha mais espaço de um dia de 24 horas para entrar na associação, mas eu participei de todas as reuniões até criarem, mas fiquei na base dessa associação. E logo depois essa associação foi transformada em sindicato e eu participei fundamentalmente, diretamente de todas as manifestações e movimentos pela criação do sindicato e ele foi criado e eu ainda continuei estudando na universidade e trabalhando, participando de todas as movimentações, assembleias, reuniões, etc... Até que em 1985, final do ano, meados do ano de 1985, eu já formada na UnB, eu estava no segundo curso lá, mas eu falei, não, agora a minha prioridade não vai ser mais, eu já tenho a minha liberdade, tenho um diploma de curso superior que me deu uma profissão, eu sou professora do ensino médio, agora eu quero me dedicar às lutas pelo sindicato. E abandonei o estudo na UnB que eu estava quase concluído já o curso de jornalismo, larguei nunca mais fui, nem sei no que deu. E me dediquei integralmente as reuniões e manifestações pelo sindicato. E em 1985 o sindicato constituiu uma direção, em 1980, e em 1982 o PT foi criado, eu imediatamente, já estava com os meus olhos rumo a um partido de esquerda, me filiei ao PT ainda em 1982, e fui conhecendo pessoas, militantes atuantes no PT e acabei me envolvendo no grupo em 1985 de petistas professoras e professores, que faziam combate a direção do sindicato, mas era um combate naquele tempo bem respeito, era uma disputa ideológica, mas não era essa coisa tão violenta como e hoje. E nós criamos uma chapa com professoras e professores no campo da esquerda e muitos deles filiados ao PT já, e ganhamos a eleição em 86. E a minha primeira gestão no SINPRO então foi de 1986 a 1989, porque as gestões lá são de três anos.
31:18
P/1 – Eu queria voltar um pouco atrás professora, ainda referindo a 1979, quando o sindicato é criado, duas coisas que eu queria que a senhora dissesse, houve uma greve e uma subsequente intervenção no sindicato e outra coisa que eu queria que a senhora me dissesse, me descrevesse a figura do Olímpio Gonçalves Mendes?
R – O Olímpio era um professor, uma boa pessoa eu não nego como pessoa que era um lutador, e ele além de lutador ela era destemido, eu via nele essa vontade de criar o sindicato de fazer um combate ao autoritarismo, ditadura, mas ele era filiado ao PMDB, não me lembro se era MDB o nome do PMDB hoje, ele e a maioria das pessoas que constituíram a primeira direção do Sindicato de 1980 para cá, era quase toda, era quase não, eram todos e todas, militantes do MDB e como nós já éramos militantes petistas, ai já começou uma disputa entre o grupo do MDB e o nosso grupo petista. Havia aquele desgaste já do Olímpio com o pessoal que compunha a direção com ele, porque eles já estavam na segunda gestão, e já acompanhavam as ideologias do MDB, defendiam a nossa categoria sim, não resta dúvida, tiveram a capacidade, a clareza de criar o sindicato, de comprar uma sede que era ali no Setor Comercial Sul, uma sede histórica que ficou lá até poucos anos atrás. Mas faltava, durante esses seis anos de gestão deles, que eram praticamente os mesmos da primeira chapa em 80, e depois em 83 reeleição, faltava um pouco mais de garra, vamos dizer assim, aquela garra de nós estudantes que saímos da universidade com fogo nas veias ainda, o sangue vibrando pelas lutas estudantis. E formamos essa chapa, e defendendo o trabalho de base, as pessoas que compõem a direção sindical, não podem ser pessoas burocráticas que ficam lá nas suas salas com o telefone na orelha o tempo todo, e a obrigação era ir para as bases, onde os trabalhadores estavam que eram as escolas. Com esse discurso, de ter essa aproximação, com esse tipo de desenvolvimento de trabalho, de relação com a categoria, nós ganhamos e muito bem eleição em 1986. E aí ficou, até hoje é uma direção onde a maioria é petista. Essa primeira gestão petista eu participei, e tem pessoas dessa gestão, como a Lúcia Iwanow, Walter Peninha, Márcio Baiocchi, que eu tenho respeito e carinho por eles até hoje, a gente continua amigos até hoje, eles também vão falar aí, não sei se vocês já gravaram com eles entrevista, eles também foram convidados.
35:32
P/1 - Foi essa gestão que propôs a mudança do esquema presidencialista para o colegiado na gestão, não foi isso? Como é que se deu esse processo?
R – Espera aí, deixa eu dar uma relembrada aqui... Nesse tempo era presidencialista mesmo, gestão do SINPRO era presidencialismo, o presidente primeiro foi Olímpio, depois foi o... Meu Deus me faz lembrar o nome? Estou com o nome na boca. Libério Pimentel, isso! Que era morador de Taguatinga assim como eu, ele era o presidente quando nós ganhamos a eleição, e tivemos essa gestão, essa primeira gestão, vamos dizer assim entre aspas, petista, quando a presidenta era uma mulher, a Lúcia Carvalho, e foi um sucesso essa gestão de 1986 a 89. E nessa gestão vitoriosa com muitas conquistas, categoria veio, que a gente ia para dentro das escolas, dentro das direções das escolas batendo no governo, no governo da direita. Ganhamos o carinho e o respeito da categoria que está lá, no chão da escola, onde realiza o seu trabalho. Então esta característica que nós tínhamos, foi o motivo principal de termos uma gestão vitoriosa e aproveitamos nessa gestão até para orientação ideológica de compartilhar ao máximo o poder, nós conseguimos mudar o estatuto do sindicato para gestão compartilhada, compartilhada não, gestão democrática, compartilhada. Só que não tinha figura de presidente, eram secretarias, assim como é até hoje, não é presidencialismo, são secretarias, atualmente são 13 secretarias, naquele tempo não tinham tantas secretárias, me parece que eram 8, e fizemos uma gestão sem presidência, mas com as secretarias e cada secretária com três pessoas, e essas pessoas eram responsáveis pela atuação daquela secretaria. E quando a gente ia para as assembleias, aquelas assembleias lotadas e tudo, maravilha... Na reunião de diretoria que antecedia a assembleia a gente decidia quem ia coordenar a assembleia. Porque quando era presidencialismo, era a presidenta, Lúcia Carvalho, sem o presidencialismo, nós definíamos, e fazendo sempre um rodízio. Porque mesmo essa gestão que começou em 86 sendo majoritariamente petista, o PT tem tendências, tem forças dentro dele, o senhor conhece né, tem seus movimentos internos, que nós chamamos de tendências políticas. Então tinha suas tendências, então a gente fazia discussão dessas várias tendências que tinham na direção, para indicar quem ia ser a coordenação da mesa, quem ia ser a pessoa que faria as anotações, quem ia intervir na assembleia, cada força indicada uma pessoa, quem ia secretariar a mesa, anotar tudo direitinho. E assim continua sendo até hoje, não houve mudança nessa forma de gestão, o que houve foi a ampliação das secretarias, que hoje são 13, contando ao todo 39 diretoras e diretores que compunha a direção do sindicato.
40:08
P/1 - Até quando a senhora integra a direção do sindicato, até quando?
R – Eu tive essa primeira gestão de 1986 a 89, depois saí, e fiquei uma gestão fora, aí quando foi em 92, já com as tendências petistas bem definidas, juntamos um grupo e ganhamos a eleição da outra parte petista que tinha ganhado em 1988, 89. E aí nessa segunda fase aí, eu fiquei três gestões, duas gestões, duas. Então já inteirei três, e depois sai que eu estava perto de me aposentar, fui dedicar a trabalhar, a fazer outros eventos na vida, mas quando foi em 2001 eu voltei, compus uma chapa com outras companheiras e companheiros, ganhamos a eleição dessa parte do PT de novo, e eu fiquei quatro gestões seguidas, são quatro seguidas, de 2001 até 2013, quatro, mais duas que eu tinha tido antes, seis, e mais essa primeira gestão petista e cutista, que a gente fala cutista, da CUT - Central Única dos Trabalhadores, inteirei sete gestões no SINPRO, mas não assim todas seguidas, foram intervalos.
41:57
P/1 – Nesse período professora, a senhora convivei portanto com dois governos petistas no Distrito Federal, como é que se deu a relação, tanto com o Cristovam no primeiro momento, quanto o governo Agnelo no segundo momento, como é que se deram as lutas sindicais com esses governos aliados, digamos assim?
R – Aspas, muitas aspas nos aliados. Na gestão Cristovam, a nossa categoria, até pela atuação do sindicato, como eu já disse, de dentro da escola o tempo todo, ombro a ombro com professor, lá no seu local de trabalho, a gente teve uma gestão assim, muito bem avaliada e muito aprovada pela categoria, tanto que quando houve a candidatura do Cristovam, a nossa categoria, 82% da categoria votaram no Cristovam, tudo influenciado pela ação do sindicato, pela referência que nós éramos, somos petistas, votamos Cristovam. Lá vem o povo e votou. Para você ver a diferença, agora na eleição do Bolsonaro deu o contrário 73% votaram no Bolsonaro, então, eu já entrei nesse detalhe, sei que nós vamos chegar lá, só para fazer um contraponto, pra você ver a diferença. Aí na gestão Cristovam eu estava na direção do SINPRO, recém-eleita, tinha um ano e meio de gestão, o Cristovam foi eleito, e naturalmente muitas pessoas que atuavam no movimento sindical, no movimento cutista eram referências do PT, e foram convidadas e assumiram função do governo Cristovam Buarque. Eu assumi uma função do governo Cristovam, durante um ano só, que foi trabalhar na administração de Brasília como coordenadora de um núcleo dessa administração de Brasília que é o núcleo da Vila Planalto, em comparação, pode-se dizer que eu administrava a Vila Planalto, mas não era administradora, era coordenadora de um núcleo pertencente à administração de Brasília e cuidava das questões extremamente problemáticas da Vila Planalto, aquela primeira Vila onde a história do DF começou, aquela coisa mais linda e maravilhosa, que hoje está totalmente desfigurada e as coisas históricas da Vila Planalto estão destruídas praticamente, e virou um bairro chique ao lado do lago, e antes era o quê? Eram os peões, eram os trabalhadores da construção civil que moravam lá, no máximo engenheiros e tal. O povo que construiu Brasília! Mas agora já expulsaram esse povo mais simples, a maioria já foi expulsa de lá, e tem grandes residências, com a vista do lago assim, bem perto, maravilhosa. Claro que o povo endinheirado está tomando conta definitivamente da Vila Planalto. Então eu fiquei 1 ano e uns, 2, 3 meses nessa função, depois em divergência com o novo administrador de Brasília que entrou no lugar do Walter Peninha, que me levou para trabalhar. Walter Peninha foi exonerado, e indicaram o Toninho Andrade e por divergências políticas de tendências políticas eu não era do grupo do Antônio, do Toninho, a gente chama de Toninho Andrade, e eu saí e voltei para a sala de aula, e fiquei na sala de aula depois dessa saída até aposentar. Agora diretamente na pergunta, a relação... Como foi a relação com o Cristovam, foi muito complicada, a direção do sindicato, maioria petista, porque tinha o PCdoB também já nessa época, não teve uma boa relação com o Cristovam, não teve, apesar de muitos petistas históricos na direção do sindicato, tentando negociar, porque a categoria criou uma ilusão assim muito grande, que vem o governo petista agora é só filé mignon e sobremesa, mas não foi assim que aconteceu. E houve um desgaste grande do Cristovam na categoria, ele enfrentou, ele foi para cima e eu mesma sempre fui uma crítica dele. Quando ele entrou no PT em 84, 94, ele não era do PT, ele entrou já com o projeto de ir para candidatura ao governo do DF, ele era professor da UnB quando eu estudava, ele foi candidato a reitor na UnB, eu como uma petista, nós organizando a campanha dele para ser eleito reitor da UnB, ele foi eleito reitor e da reitoria da UnB ele veio para candidatura, ele fez uma boa gestão UnB. Ele veio para candidatura, para o governo do DF para tirar a direita, o PMDB. E se filiou ao PT para isso, mas de petista assim histórico, aquele petista consciente, das ideologias petistas, ele não tinha, como eu tenho até hoje, com a maioria tem, e aí houve todo esse conflito. Conflito, ameaçou demitir professores em greve, cortou ponto, tirou salário, foi uma ação assim muito parecida com a direita, muito, muito, muito, no enfrentamento com o movimento sindical.
48:52
P/1 – E no governo Agnelo?
R – Eu estava na gestão do SINPRO de novo, já tinha voltado para a gestão do SINPRO. No governo Agnelo foi menos. Menos traumático do que com Cristovam, porque na gestão governo Agnelo, 2013 em diante, nós conseguimos mudanças importantes no nosso plano de carreira. Plano de carreira que a gente conquistou com as lutas desde que o sindicato teve uma gestão petista em 1986 para cá, nós tivemos plano de carreira que não tinha antes, tivemos uma série de conquista, de gratificações, de cursos que a própria Secretaria de Educação oferecia para pessoa ascender na carreira. Curso de Educação Especial, curso de alfabetizadores, curso disso, curso daquilo, e cada um desses cursos no plano de carreira, na medida em que a gente ia evoluindo, ia aumentando, tinha uma gratificação, tinha não, tem! Tanto que todo esse montante fez um salário bastante razoável para nós aqui do DF. E no governo Agnelo tinha algumas pendências do governo do Roriz anterior, e o Agnelo negociou conosco, entre elas uma reestruturação em nosso plano de carreira, para melhorar mais ainda, e nessa reestruturação ficou a divisão dos ganhos com as gratificações, cursos de mestrado, doutorado, ensino especial, parárá, houve um reajuste em cima disso tudo que deu um reajuste assim global, e dividido em cinco, não me lembro se forma cinco ou seis
parcelas, e essas parcelas foram pagas, não, eram menos parcelas, não me lembro bem não, ai você vai pegar essa informação com outras pessoas, minha memória falhou agora, mas eu sei que eram alguma parcelas, quatro ou cinco, que foram pagas, e a última parcela que seria em 2015, março. Que a negociação foi assim, durante cada ano do primeiro semestre uma parcela do reajuste, mais ou menos 30%, no segundo semestre outra parcela, e assim foi indo, quando chegou em 2015, a segunda parcela o governador, não, não, ai já era outro governador, era o Rollemberg, o governo Agnelo pagou as parcelas seguindo direitinho o ritmo, como ele não foi reeleito, sobrou essa parcela, e o eleito que foi o Rollemberg, que era do partido Socialista, partido Socialista não, ele era do PSB, socialista né, PSB. Ele deu calote, e é uma pendencia que está até hoje, e desde 2015 quando houve esse calote do Rollemberg, do Governador Rodrigo Rollemberg. Até hoje nós não tivemos mais nenhum centavo de reajuste, que além do calote que era um índice pequeno três e meio, 5%, não sei, mais ou menos nessa área, de três e meio a cinco, não tivemos em 2015, em 2016 veio o golpe na Dilma. Com o golpe, o golpista Temer assumiu, o traidor golpista assumiu a presidência da República, e junto com “bandidada” dele lá no Congresso Nacional, congelou tudo, todo tipo de reajuste salarial, seja de gratificação, seja como for, por 20 anos, conhece bem essa história né, já estamos aqui bem próximos da nossa tragédia de hoje. E com esse congelamento nós não tivemos um centavo de reajuste, então nos acumulamos, fora esses sete anos, estamos a sete anos sem ter um centavo de reajuste salarial, que é uma coisa importante na vida de qualquer classe trabalhadora, além de ter tido o calote que o Rollemberg deu nessa última parcela da reestruturação do plano de carreira feita no governo Agnelo.
53:59
P/1 – Professora baseado nessa sua larga experiência de gestão sindical, de militância sindical, quais a senhora considera serem os desafios mais prementes que se colocam para o SINPRO hoje?
R – Olha, esse hoje é muito complicado, essa direção que está no SINPRO, eu participei do mandato junto com a maioria, eu participei de três mandatos junto com esse pessoal que está lá hoje ainda, quando eu sai em 2013, ainda tem muita gente que era comigo, nessa gestão, tem muita gente que está lá até hoje. E eu nem gosto de avaliar o 2020 para cá, por causa da pandemia, porque com essa tragédia que está acontecendo no Brasil, com esse desgoverno, genocida, assassino, louco, que não sabe o que faz, nem o que fala, psicopata. O que fazer diante de uma situação dessas? Dessa tragédia tão lamentável que nós vivemos hoje, com 3650 mortos num dia só que foi ontem. Por isso que eu corri para vacinar hoje, porque senão, grupo de risco, pressão alta e ansiosa, se esse diabo desse vírus me pegar, é saco preto. Aí eu avalio que... Claro que toda gestão tem falhas, ninguém é perfeito, ainda mais um conjunto de 39 pessoas, têm muita divergência, muito debate, muita discussão, mas eu considero que está deixando muito a desejar no sentido de ser mais contundente no enfrentamento ao governo Ibaneis, que nós chamamos de “inganeis”, porque tudo o que prometeu na campanha, e a nossa categoria jogou 80% de votos nele, acreditando nas mentiras dele, por isso o “inganeis”, e ele não cumpriu, ao contrário, criou ano passado uma previdência, que o próprio presidente genocida na reforma da previdência propôs em nível nacional. O Ibaneis aqui no DF aprofundou essa reforma aqui e tirou mais do nosso salario, principalmente de quem é aposentado, eu sou!
Eu perdi em torno de R$ 1.000,00 de salário, a partir de outubro do ano passado, qual trabalhadora, qual trabalhador que vai gostar de perder R$ 1.000,00 de salário na tragédia que a gente vive, sete anos sem um centavo de reajuste, você perder, ao invés de ganhar de melhorar o salario, você está diminuindo o salário, você está é perdendo salário, isso nunca aconteceu na história do SINPRO. Aconteceu culpa desses projetos loucos aí de reforma na previdência, de congelamento disso, e congelamento daquilo por 20 anos, que é um crime! Mas eu acho que essa direção ela poderia dar muito mais, mais veemência, mais sabe, eu tenho uma característica bem diferente de muitas pessoas que hoje estão na linha de frente na direção, mais conciliatória, mais de negociação, negociar, conversar parárá, eu sou mais de ir para cima, de ser dura. Porque você é o patrão pertence a uma classe trabalhadora, eu sou trabalhador, a minha classe, a classe trabalhadora, eu não coaduno com você não, eu tenho a força do trabalho, e tenho a força do trabalho e você compra a minha força de trabalho, então não venha com esse papo de ficar com muita lenga-lenga, com classe diferente da minha, a minha classe é a trabalhadora.
58:31
P/1 - Professora numa situação hipotética a senhora está diante de um jovem, de uma moça, de um rapaz que decidiu ser professor ou professora, que a senhora diria para ele ou para ela?
R – Vá, seja, e eu tenho exemplo na família, tenho uma sobrinha, ela com 18 anos, ela terminou o ensino médio dela, imediatamente entrou para UnB, foi fazer letras também, porque ela gosta muito de mim, foi fazer letras porque queria ser professora igual eu. E é professora até hoje, hoje está com 25 anos, professora de inglês, se formou em letras, inglês e é a paixão dela ser professora, eu falei: vá Amanda, ela chama Amanda, vá Amanda, seja professora. Porque eu amei ser professora, eu amo ser professora, essa categoria nossa ela não tem dimensão do espaço que ela tem para conversar com os outros, eu cumpria essa dimensão, eu fazia a politica em sala de aula sim, eu defendi a classe trabalhadora, porque aqueles alunos meus que eu dava aula em noturno, no curso noturno, curso de formação profissional noturno, eu dizia: vocês todos se não estudarem, serão os próximos trabalhadores do salário mínimo miserável. Porque só ascende de classe nesse país desigual quem estuda muito, então vamos estudar, priorize o estudo. “Ai professora, mas a gente trabalha de dia, porque se não, não tem dinheiro nem para o ônibus”, então por isso que tem que estudar mais ainda, é no domingo, é no sábado, é noite, é de madrugada. Eu fazia isso, tinha dia que eu virava a noite sem dormir um minuto, fazendo os trabalhos da Universidade de Brasília e dava aula 8 horas por dia, e ainda tinha 4 horas lá, ia para a UnB de manhã, tarde e noite, eu dava aula até 11 horas da noite, imagina né. Eu sempre fui muito magra e fiquei mais magra ainda nesse tempo, então nos professores temos a faca e o queijo na mão, só saber cortar a fatia certa e mandar pra frente, para mudar esse país, porque não tem outra forma não. Ou educa a sociedade para mudar o país, ou essa miséria vai continuar e esse Bolsonaro, Deus nos livre disso, pode até ser reeleito.
1:01:09
P/1 – Professora sem lhe pedir nenhuma bola de cristal, mas como a senhora enxerga o futuro da educação no Brasil?
R – Olha, eu leio muito, aliás nessa pandemia foi uma coisa que eu senti muita falta, porque eu fiquei muito ansiosa, foi a falta de leitura, eu tenho uma biblioteca particular, como eu estudei letras, então tudo quanto era livro de orientação, de informação sobre história da sociedade, história disso, história daquilo, eu comprava todos, fora os grandes autores, Brasil e mundo inteiro, eu tenho as coleções de todos esses escritores famosíssimos, vou citar Machado de Assis porque Deus e o mundo conhece, eu tenho a obra completa de Machado de Assis, José de Alencar, Graciliano Ramos, de Marx, de Lenin. Eu tenho uma biblioteca assim invejável, e sempre gostei muito de ler, e nessa pandemia eu só consegui ler até hoje um livro, ontem eu separei uns cinco livros e pus aqui em cima da mesa, e falei: vou parar desse negócio de WhatsApp de Facebook, porque eu estou ficando é doida, volto aos meus leitores, mas quem disse, que eu fiquei, dei conta de ficar lendo whatsapp. Cada hora acontece uma coisa, eu quero estar sabendo, mas eu vejo com tristeza, sabe, não esse período da pandemia que está corretíssimo o que o sindicato defende, que não pode ter aula presencial, nós não vamos matar a nossa comunidade com esse vírus tão contagioso. Então você não pode ir para uma sala de aula em condições tão precárias como a educação pública no Brasil inteiro, não é só no sertão nordestino não, aqui também, aqui no DF também, que deveria ser rico, que teve escola de lata onde os alunos e os professores ficavam sendo cozinhados dentro daquelas escolas de lata, que uma secretária anterior, uma fascista que dominou a educação aqui por muitos anos, chamada Eurides Brito, “facistona” criou um monte de escolas de lata e colocou nas periferias, engraçado que ela não colocou uma escola de lata no Plano Piloto, ela colocou em Ceilândia, Planaltina, na zona rural, lá no capeta, mas não pôs uma no Plano Piloto, não pois uma no Guara, não, no Guara teve, não pôs uma no Cruzeiro, são cidades que naquele tempo que eram mais elitizadas, jogou para a pobreza, para a periferia. Eu não cheguei a dar aula em nenhuma não, porque Taguatinga, eu sempre dei as aulas em Taguatinga, e aqui nesse tempo não era tão pobre, mas aqui teve nos assentamentos próximos de Taguatinga, que hoje pertence a Taguatinga, tinha escola de lata, eu visitava como diretora do sindicato, eu ficava lá meia hora fazendo reunião, encharcava de suor, imagina com 40 alunos. Então essa tragédia da educação brasileira, isso é um projeto, não é, um projeto mesmo, de quanto menos consciente, quanto menos estudado for a pessoa, quanto menos conhecimento ela tiver, mais fácil dominar, um projeto igualzinho a o do Bolsonaro. Um projeto político essas mortes, projeto político, organizado, programado, pensado, orientado, estamos aí com 320 mil mortos durante um ano, essa tristeza. Graças a Deus a minha família, teve covid algumas pessoas, mas todo mundo sobreviveu até hoje.
1:05:15
P/1 – Professora é de fato um quadro...
R - Só para concluir essa questão da educação, eu oriunda e quase que 90% dos 11 irmãos, que eu comecei a história contando, todos nós, pela precariedade da vida nossa, de família pobre, muita gente para criar, pai sapateiro, mãe dona do lar, então tinha uma vida muito difícil. Estudamos graças a Deus, só em escolas públicas, eu saí da escola normal de Patos de Minas, formei, recebi meu diploma em dezembro, em fevereiro eu estava fazendo o vestibular na UnB, e graças a Deus fui aprovada. E assim aconteceu com várias outras irmãs, irmãos e agora os sobrinhos. Sobrinhos também estão tudo estudando na UnB, muitos já formaram, estão aí. Mas a escola pública aqui podia ser bem melhor, ela pode ser bem melhor, porque ela tem uma equipe, ela tinha uma equipe de professores muito bons, não sei hoje como está a consciência, porque teve um período pós-ditadura, pois todos os movimentos que nos fizemos pela democratização do país, etc... Mas tivemos uma safra muito boa de professores, e com a proliferação das faculdades, tudo quanto é esquina tem uma faculdade hoje, a gente sabe que o nível, uma faculdade particular, antes fosse publica, que tivesse em cada esquina uma, mas essas particulares pensam mais no dinheiro do que no que ensinam, elas deixam muito a desejar.
1:09:01
P/1 – Tem alguma coisa que a senhora gostaria de ter dito e eu não estimulei à senhora a dizer?
R – Não é uma biografia da Augusta, mas no âmbito familiar, não sei, não tem muito a ver com o que se pretende com esse livro, não tem, é mais a história do SINPRO, é das lutas, das histórias das lutas, história das pessoas que fizeram, construíram essas lutas, que tiveram sucesso ou derrotas aqui ou ali, porque a vida é de vitórias e derrotas também, não só ganha, a gente ganha e perde. Se eu lembrar de mais alguma coisa, eu acho que eu mexi bem na minha memória, é uma cabeça bem organizada, fui pondo a ordem cronológica em ação e a cabecinha acompanhou.
1:10:04
P/1 – Sem dúvida, isso ficou bastante claro.
R – Se tiver mais alguma coisa, eu não sei se posso fazer isso, se eu posso fazer contato com vocês, “olha, lembrei disso”, tem essa condição? Essa possibilidade?
1:10:17
P/1 – Teria sim, por escrito.
R - Pode ser!
1:10:22
P/1 - Mas de todo modo eu queria saber da senhora como é que se sentiu participando dessa entrevista? Como é que se sentiu dando esse depoimento para nós?
R - Eu lembrei uma história. Minha história de vida na luta, claro que antes dessa luta do movimento sindical e no movimento partidário, que eu continuo com ela 100%, mas 100% ainda na luta partidária, porque eu estou na gestão do PT aqui no DF, eu sempre ajeitei ser diretora do SINPRO e ser diretora do PT também. Fui diretora regional do PT, que engloba todo o DF, e agora eu me dedico mais a gestão do PT na zonal do PT de Taguatinga, cidade onde eu moro. Eu cumpro nessa gestão que começou em 2019, o cargo de secretária de formação, PT de Taguatinga. Tem o PT regional e tem o PT zonal, das cidades satélites, eu continuo mantendo a minha ligação direta na executiva do Partido dos Trabalhadores, é o primeiro partido que eu tive na vida, o primeiro partido ao qual eu me filiei com consciência, e por vontade de fazer a luta, por questão ideológica mesmo, e continuo nele até hoje. Então eu me filiei ao PT quando o PT foi criado, no final de dezembro eu me filei ao PT, eu tenho até a carteirinha, tem a data da minha filiação, não a carteira antiga, aquela de papel, naquele tempo o PT era muito pobre, a gente mesmo fazia a carteirinha com um pedaço de papel, baita o carimbo do PT, agora não, ela é tipo um cartão de crédito, assim bonitinha, toda colorida e tal, mas nela vem a data da primeira filiação, pá! Eu tenho!
1:12:23
P/1 - Muito bem professora! Para fechar eu queria...
R – Mas só uma coisa, se eu lembrar de mais alguma coisa, eu faço contato por escrito com toda certeza, e se vocês quiserem mais alguma coisa também, eu estou à disposição.
1:12:41
P/1 – Muito obrigado! Mas eu queria fechar com a senhora me respondendo mais uma pergunta, quais são os seus sonhos?
R – Agora? Primeiro “impeachar” o Bolsonaro, Bozo, genocida, impeachment, interditar esse homem antes que ele acabe com o Brasil, mas do que já foi, porque e inadmissível 320 mortos em um ano, isso não é aceitável, e nenhum brasileiro, nenhuma brasileira, pode concordar com essa prática de desgoverno, que essa gangue que trabalha com ele no Palácio do Planalto faz. E se o Bolsonaro é um psicopata, fascista, nazi-fascista, quem está com ele também é, porque não estaria lá com ele uma Augusta, por exemplo, ele levou os nazi-fascistas, psicopatas como ele. E o povo, nosso povo, tá morrendo sem respirar, culpa deles, tá sendo mortos por eles, então meu sonho de hoje, meu sonho de hoje, é interditar esse homem e mandar ele com toda sua gangue para a cadeia, para eles pagaram pelas mortes dessa quantidade inaceitável de mortes. Quem perdeu um familiar, uma pessoa querida que sabe, eu não perdi, ainda assim muito próximo, já perdi vários, inclusive perdi gente do PT aqui, amigos sindicalistas, muitos, mas eu estou falando assim mais próximo, mas eu imagino a dor de quem perdeu. Porque eu já perdi mãe, perdi pai, minha irmã mais velha que eu perdi também, que era professora, morreu de câncer, tem uns oito anos, e pedir uma irmã ainda quando era criança de uns 15 anos, que também morreu com câncer, quando eu morava em Patos de Minas ainda. Então essas perdas, eu sei que dor é essa, só quem tem e perde essas pessoas que sabem a dor. Imagina 368 mil famílias chorando, sofrendo as perdas provocadas por esses genocidas, eles são imperdoáveis. Não tem perdão!
1:15:35
P/1 – Não tem outra alternativa senão continuar lutando. Eu agradeço muitíssimo a sua atenção, o seu tempo e as histórias que a senhora contou, são memórias importantes de uma ativista, de uma militante raiz que tem muito à mostrar, e de que a gente tem muito que se orgulhar. Muito obrigada pelo seu belo depoimento viu professora.
R - Eu agradeço, mas eu queria dizer só uma coisinha. Agradeço muito a vocês, atenciosos, educados comigo e tal, muito cuidadosos, mas eu quero dizer que a minha família hoje nós, as duas irmãs que morreram e um irmãozinho que já nasceu morto, isso a muito tempo atrás, nós somos só 8 hoje, dos 11. Nós somos todos os militantes do PT, todas as irmãs e irmãos militantes do PT, graças a formação, a educação política, ideológica que meu pai José Ribeiro da Cruz semianalfabeto, e minha mãe Filomena Moreira de Lima, também sabia ler e escrever, assim como o meu pai nem nos deram, além de uma religião, nós somos católicos. Eu sou católica, minha mãe, meu pai também e minha família toda, então nós juntamos essa fé católica na ideologia petista, e nós fomos educados desde antes do PT existir, nessa linha de amor ao próximo e de igualdade. Igualdade de oportunidades, igualdade de direitos e é essa minha meta até hoje. Graças ao meu pai, minha mãe, a Deus que deu a gente esse dom e a toda minha família.
1:17:39
P/1 - Perfeito professora! Muito obrigado viu, foi um prazer ouvi-la eu agradeço mesmo pela sua disponibilidade de falar conosco.
R - Eu agradeço! Agradeço a você, ao Alisson e mando aquele abraço virtual, mas bem caloroso e fraterno.Recolher