IDENTIFICAÇÃO
Meu nome é Fernando Leite Siqueira, eu nasci em Miracema, noroeste do Estado do Rio de Janeiro, em 19 de maio de 1941.
MONOPÓLIO / REVISÃO CONSTITUCIONAL
Na Petrobras, fui superintendente de empreendimentos da Bacia de Campos e da Bacia de Santos. Eu me aposentei porque no Senado...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO
Meu nome é Fernando Leite Siqueira, eu nasci em Miracema, noroeste do Estado do Rio de Janeiro, em 19 de maio de 1941.
MONOPÓLIO / REVISÃO CONSTITUCIONAL
Na Petrobras, fui superintendente de empreendimentos da Bacia de Campos e da Bacia de Santos. Eu me aposentei porque no Senado tramitava um projeto de revisão constitucional que quebraria o monopólio estatal do petróleo. Como eu já tinha tempo suficiente para me aposentar, aproveitei e me aposentei para ir à Brasília. No ano anterior, a gente tinha ido à Brasília pela Petrobras, na época do governo Itamar. Ele incentivou que as empresas mandassem os empregados à Brasília para dar subsídio aos parlamentares. Fomos e nossa atuação foi coroada de êxito, a Petrobras deu um apoio muito grande, em termos de publicações etc. A revisão constitucional não aconteceu. No ano seguinte, em 1995, o Fernando Henrique assumiu e fez o decreto nº. 1403 proibindo a ida de empregados estatais à Brasília. Então, eu tive que me aposentar e levar comigo mais um aposentado. Como a Aepet [Associação dos Engenheiros da Petrobras] não tinha mais cacife para bancar a ida de muita gente, um dos nossos colegas aposentou-se e foi morar em Brasília. Assim, nós três fizemos um trabalho junto aos parlamentares. Mas, infelizmente, o rolo compressor foi muito grande e o Fernando Henrique conseguiu quebrar o monopólio estatal do petróleo.
COTIDIANO DE TRABALHO
Em 1982, eu entrei para a Aepet. Ela fazia um trabalho de estudo da engenharia na Petrobras, o que deu um fruto muito bom. Aquilo me entusiasmou. Eu integrei esse grupo, coordenado pelo Diomedes Cesário, então presidente nosso, uma grande figura. Infelizmente, ele sofreu um acidente, foi atingido por uma bala perdida e ficou paraplégico, mas continua lúcido, competente; é uma das pessoas mais éticas que eu conheço. O Diomedes coordenava esse grupo de trabalho que estudou a função de engenharia na Petrobras. Nós entrevistamos todos os gerentes da área de engenharia, coletamos sugestões e, no final, formamos uma proposta de funcionamento da engenharia na empresa. Essa proposta foi razoavelmente aceita, praticamente 80%. Mais tarde, eu fui chefe da Divisão de Engenharia, no Departamento de Exploração e Produção, onde coloquei em funcionamento essa sugestão da Aepet. Criamos uma forma de integração, porque havia uma disputa por trabalho. O Cenpes, Centro de Pesquisa da Petrobras, queria puxar mais trabalho, o Segen, Serviço de Engenharia, um órgão de engenharia de obras, queria puxar mais uma parte, e o Departamento, outra. Então, a gente conseguiu fazer uma integração de tal forma que o Departamento, com a participação dos demais, fazia um documento chamado “Bases de Projeto”. Este documento era encaminhado para o Cenpes, que fazia um projeto básico, também com participação dos demais. Este projeto era encaminhado para o Segen, que também consultava os demais. Tudo isso ouvindo os órgãos operacionais que seriam os usuários daquele projeto. Isso teve um sucesso muito grande. Parou muito daquela briga por trabalho. Conseguimos que a engenharia deslanchasse e vários projetos de alto nível saíram desse trabalho. Conseguimos essa integração que foi muito útil para a Petrobras.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL
Na Petrobras, a Aepet foi a primeira [organização dos trabalhadores] de que participei. Eu gostei da proposta que era a defesa do monopólio estatal, porque, se não for monopólio, é propriedade do oligopólio internacional, do cartel das Sete Irmãs. O monopólio era a forma mais viável de manter o petróleo com a União Nacional, portanto, com o povo brasileiro que é, no final, o dono da União. A segunda proposta da Aepet era defender a Petrobras e a terceira era defender o corpo técnico para ter o monopólio bem exercido. Temos visto muita confusão, mas o monopólio foi sempre da União; a Petrobras foi criada para executá-lo. Sem monopólio, não tem como o país manter o petróleo sob controle; sem uma Petrobras forte, não tem como a coisa desenvolver bem; e sem o corpo técnico, a Petrobras não sobrevive. A proposta da Aepet era muito boa e o nível de engajamento das pessoas era também muito bom. Havia uma postura de independência e de amor à camisa. O pessoal da Aepet, assim como todos os petroleiros, sempre teve muito amor à camisa, muito prazer em trabalhar na Empresa. Isso me atraiu. Uma vez estando na Aepet, eu tive a oportunidade de conviver com pessoas muito sérias, muito competentes. Um deles é o Diomedes, uma figura maravilhosa, como também o Ricardo Maranhão, outro dirigente que foi até deputado federal; o Antônio Maciel, que depois foi presidente da Ford. Eram pessoas que davam competência e dignidade à Associação. Como eles saíram, a gente tenta manter esse espírito. Por isso, há 22 anos, eu tento ir para casa e não consigo. Lamentavelmente, no ano passado, quando eu estava liberado, com missão cumprida, morreram três diretores potenciais presidentes. Não foi dessa vez que eu consegui ir pra casa e curtir um pouco minha aposentadoria. Mas o trabalho é muito gratificante. A gente tem convite para falar por todo o país sobre a questão do petróleo.
VISITA AO MÉXICO
No ano passado, eu estive no México, a convite da Associação de Engenheiro da Pemex [Petróleos Mexicanos]. Graças a Deus, a missão foi muito boa. Havia um projeto de privatização da Pemex e, depois da minha ida, conseguimos reverter isso. Fui entrevistado, durante quatro horas, pelo segundo jornal mais importante do país, que gerou três páginas de matéria, com chamada na primeira página. Fui entrevistado, na CNN Espanhol, pela Carmen Aristegui, uma âncora muito boa. Falamos durante 25 minutos e esse programa foi reprisado cinco vezes, no dia seguinte. Isso ajudou os mexicanos a impedirem a privatização da Pemex.
CONSTITUIÇÃO DE 1988
Em 1988, a Aepet conseguiu elevar o monopólio estatal da lei nº. 2004 para o nível constitucional. Tivemos uma participação magistral do Maciel, dos demais diretores da Aepet e uma ajuda muito forte do Barbosa Lima Sobrinho, fundador do Modecon, Movimento de Defesa da Economia Nacional. Barbosa Lima Sobrinho liderava várias empresas e entidades, para defender essa bandeira do monopólio. Quando estava para ser votada a questão do monopólio, o Barbosa entrou no Congresso Nacional; o Ulisses Guimarães falava e, de repente, o pessoal começou a aplaudir de pé. O Barbosa entrou e desfraldou a bandeira do Brasil e a da Petrobras. Isso gerou uma votação em favor do monopólio por 441 votos contra sete. Foi uma vitória muito bonita, muito emocionante. Esse tipo de trabalho é muito gratificante, não há nada que se compare a essa possibilidade da gente contribuir para o engrandecimento do país.
MARCO REGULATÓRIO
Em 1994, a gente teve essa experiência de evitar que a revisão constitucional quebrasse o monopólio. Em 1995, infelizmente, o Fernando Henrique entrou e usou um rolo compressor. Nós não pudemos mais ir à Brasília, tive que me aposentar para isso. Ele passou um rolo compressor e derrubou o monopólio com uma lei absolutamente maléfica à questão do petróleo; uma lei que dá a propriedade do petróleo a quem produzir. Em um decreto do Fernando Henrique, foi estabelecida uma participação de 40% [para o país], enquanto que, nos países produtores e exportadores do mundo todo, a média de participação do país é 84%. Esse decreto do Fernando Henrique reserva apenas 40%, com mais 5% de royalties. Ou seja, metade do que recebem os outros países exportadores. O mais grave é que a lei dá propriedade a quem produz. A lei é intrinsecamente incoerente, porque tem um artigo terceiro que diz que as jazidas são propriedades da União, tem o artigo 21 que diz que o produto da lavra é também propriedade da União, enquanto o artigo 26, fruto do lobby internacional, diz que quem produziu o petróleo é dono dele. Quanto à participação do país de apenas 40%, atualmente, fazemos uma campanha para modificar isso, porque ficou escandalosamente evidente com a vinda do Pré-Sal. A descoberta do Pré-Sal é resultado de um trabalho da Petrobras que, durante 30 anos, acreditou nessa filosofia nova, acreditou na intuição dos seus geólogos e geofísicos. Enquanto a tecnologia não permitiu uma segurança maior de perfuração, os técnicos caminharam, fecharam as idéias até que, quando veio a nova tecnologia de sísmica de três dimensões e quatro dimensões, puderam ultrapassar o obstáculo do sal. A camada de sal distorcia os ecos de levantamento sísmico, mas, com essa nova tecnologia, se pode definir exatamente onde perfurar. A Petrobras fez 16 furos e acertou 16 furos. No mundo, um sucesso de 30% é considerado ótimo, mas a Petrobras teve 100%. Então, [a participação de 40%] que era escandalosamente ruim para o país, ficou evidenciado com a perspectiva de se ter um novo Iraque, na América Latina. Nós tínhamos uma reserva de 14 bilhões. De repente, descobriu-se uma reserva com potencial de 90 bilhões, sete vezes aquela descoberta em 53 anos de existência. Nós passamos a ter a quarta reserva mundial. Tem uma na Arábia Saudita com 265 bilhões, o Irã com 140 bilhões de barris e o Iraque com 120. O Brasil passa a ter 105 bilhões, mas é bom considerar que esses 90 bilhões são uma previsão conservadora dos geólogos da Petrobras. Há a perspectiva de haver mais do que isso. Com essa descoberta, o foco de cobiça internacional voltou-se para o Brasil. Por quê? Porque se tem as três maiores reservas do mundo no Oriente Médio, uma zona extremamente difícil, conturbada. Por outro lado, se tem os Estados Unidos, que têm uma reserva de 29 bilhões de barris e consomem 10 bilhões por ano, um país estrangulado em termos de energia. O cartel das Sete Irmãs, que há 150 anos domina o segmento com atitudes pouco recomendáveis, como suborno, deposição de governos, assassinato de presidentes, está numa situação também difícil, porque suas reservas caíram para 3% das reservas mundiais. Quem não tem reserva está fadado a desaparecer. Em abril do ano passado, o Financial Times fez uma matéria afirmando que o cartel não duraria mais cinco anos nessas condições de reserva. Então, esses dois segmentos – os Estados Unidos, que precisam desesperadamente de petróleo, e o cartel internacional, do qual cinco empresas são americanas – fazem um trabalho enorme de lobby na sociedade brasileira, para o governo não mudar o marco regulatório deixado por Fernando Henrique. Fernando Henrique acabou com a lei nº. 2004 e colocou a lei nº. 9478, com um artigo que dá a propriedade para quem produzir. Nosso trabalho tem sido levar para o Brasil todas essas informações. A demanda por palestras está aumentando. Eu deixei de ir a Recife para estar aqui, mas é um prazer muito grande falar sobre a Petrobras. O fato é que a Petrobras não pode falar, porque causaria alvoroço no mercado financeiro. O Ministério das Minas não pode falar, porque faz um trabalho de análise do marco regulatório. Então, sobra para a Aepet, que pode falar e tem conhecimento razoável para isso, pois nossos sócios são geólogos e engenheiros. Procuramos falar com o máximo de propriedade possível, porque vem daí a nossa credibilidade e a nossa ação. O nosso sucesso depende muito da credibilidade.
MONOPÓLIO DE PETRÓLEO
Quando o Maciel se candidatou a presidente da Aepet, eu trabalhei para ele. Passei a integrar a entidade como diretor cultural. O Maciel presidente, o Diomedes era vice-presidente, eu era o diretor cultural, o Ricardo Maranhão era conselheiro e tinha outros diretores que também tiveram um papel muito importante nessa época, como Argemiro Pertence e vários outros. O mote principal sempre foi a defesa do monopólio e do corpo técnico. Desde que a Petrobras foi criada e a lei nº. 2004 foi promulgada, em 1953, [o monopólio sempre foi questionado]. O Assis Chateaubriand apresentou um projeto no Senado para revogar a lei nº. 2004 e, de lá pra cá, todo ataque em cima dessa lei vinha sendo constante. Então, sempre teve um trabalho de difamação da Petrobras. Havia um processo na mídia de difamação da empresa, de achatamento salarial dos técnicos. O trabalho da Aepet era rebater essas questões e esclarecer a opinião pública. Nesse período, de 1982 a 1988, a gente trabalhou muito na Constituição, na elevação do monopólio para o nível constitucional.
GOVERNO COLLOR
Depois, em 1990, no governo Collor, havia uma proposta do Credit Suisse First Boston, um banco que está na liderança da atual crise e que também foi um dos formuladores da privatização da YPF, Yacimientos Petrolíferos Fiscales da Argentina. Este banco veio com uma proposta para o Governo Collor para a desnacionalização da Petrobras. A proposta era, inicialmente, vender as subsidiárias existentes – a área petroquímica, fertilizantes e mineração – e, depois, dividir a empresa em novas subsidiárias para serem privatizadas. O Collor começou a primeira etapa, privatizou as subsidiárias, mas veio o Itamar e interrompeu o processo e até nos mandou à Brasília para defender a Petrobras. No Governo Collor, houve uma tentativa de criação da Petrobras Overseas, uma organização para compra e venda de petróleo fora do Brasil, uma atividade que compraria um milhão e duzentos barris por dia. Imagine o que representaria em termos financeiros, a cada centavo de dólar. A idéia era tirar da Petrobras e levar para o exterior; uma organização desse tipo seria extremamente perigosa. A Aepet se colocou contra essa criação e, felizmente, fomos vitoriosos e a Overseas não foi criada.
GOVERNO SARNEY
No Governo Sarney, houve uma tentativa de compra de uma reserva no Amapá. A mídia sinalizou que, no Amapá, descobrira-se 200 milhões de barris, um outro Mar do Norte. A Texaco, proprietária da descoberta, fazia uma propaganda enorme, queria vender para a Petrobras. Fizemos uma análise usando os nossos técnicos, os nossos associados, e mostramos ao ministro Aureliano Chaves que o campo não era bom, não tinha petróleo. O Aureliano sustou a compra e, posteriormente, verificou-se que o campo realmente não tinha petróleo comerciável. Então, esse ataque à empresa sempre existiu. Em 1993 e 1994, tentou-se fazer a revisão constitucional quebrar o monopólio, mas o Itamar nos deu uma força muito grande. Ele mandou o pessoal da Petrobras [para Brasília] e a Aepet se integrou ao grupo, foi como petroleiro, mas usando nosso conhecimento, nossa capacidade de luta. Eu me lembro que redigia uma média de quatro ou cinco discursos, em Brasília, para os deputados que queriam nos defender e não conheciam o problema. Certo dia, eu cometi a gafe de redigir um discurso para o Josafá Marinho, um intelectual de altíssimo nível, um nacionalista histórico. Ele ficou muito zangado, porque eu mandei um discurso pronto, quando ele queria apenas os pontos principais. Faz parte do nosso trabalho. Eu e outros companheiros redigíamos discursos. O Haroldo Lima era o nosso principal guru; fazíamos a coordenação do trabalho no seu gabinete. Ele nos dava todas as coordenações. Lamentavelmente, o Haroldo Lima foi para a ANP (Agência Nacional do Petróleo) e deu uma mudada de 180 graus, passou a ser lobista de empresas estrangeiras, de leilões etc. Fizemos esse trabalho, em Brasília, com muito sucesso, mas, no ano seguinte, passou a ser proibido ir à Brasília. Criou-se um Serviço de Informação e Apoio Legislativo, o Sial, que, na verdade, era um serviço de espionagem para verificar se a gente estava indo à Brasília como empregado estatal. Isso para impedir que os funcionários estatais fossem ao Congresso dar informações [aos parlamentares]. Como eu tinha tempo mais que suficiente para a aposentadoria, me aposentei e fui fazer esse trabalho.
PETROBRAS / MUDANÇAS
Conseguimos sustar essa estratégia, mas quando veio o Fernando Henrique, ele retomou aquela proposta do Credit Suisse First Boston para dividir a Petrobras em subsidiárias e privatizá-las. Foi quando Henri Philippe Reichstul dividiu a Petrobras em 40 unidades de negócio e foi criado o artigo 64 na lei de petróleo, que permite transformar essas unidades de negócio em subsidiárias, para a venda. Foi feita a privatização da primeira delas, a Refap [Refinaria Alberto Pasqualini], no Rio Grande do Sul. Esta privatização se deu de forma altamente prejudicial à Petrobras. Juntaram a Petrobras com a Repsol, uma empresa espanhola, entre aspas, porque pertence ao Royal Bank of Scotland, um banco escocês de capital anglo-saxão. A Repsol tinha comprado a YPF argentina por um preço irrisório e fez uma associação com a Petrobras para criar uma terceira empresa, a Refap S/A, privatizada. Na criação, essa empresa teria o capital de dois bilhões de dólares pagos em duas etapas: na primeira, um aporte de 500 milhões da Petrobras e outro da Repsol e, na segunda, outros 500 milhões. Mas quando a Petrobras aportou seus ativos no valor de 500 milhões, nós verificamos que esses ativos valiam dois bilhões e 200 milhões: era 10% do campo de Albacora, 30% da refinaria e mais 234 postos estrategicamente localizados no país. Por outro lado, a Repsol colocou ativos que não valiam 200 milhões: era uma refinaria velha de 70 anos e 600 postos de gasolina praticamente desativados. Nós fizemos um trabalho para subsidiar o Sindipetro do Rio Grande do Sul no levantamento desses ativos. O Sindipetro entrou com uma ação, ganhou a liminar que deveria sustar o processo, mas ninguém respeitou, nem a Petrobras, nem a Repsol. Um ano depois, essa liminar foi pro Supremo e o Edson Vidigal, então presidente do Tribunal Superior de Justiça, cassou a liminar dizendo que as empresas já tinham feito muitos investimentos. Ou seja, as empresas não respeitaram a liminar, não fizeram investimento nenhum e ainda conseguiram cassar a liminar. O mérito da ação continua e ela ainda tramita na justiça. Embora a gente não tenha conseguido sustar a privatização da Refap, freamos a privatização da próxima, que seria a refinaria Duque de Caxias. E depois seriam plataformas, enfim, seria tudo vendido na forma de subsidiária. A nossa ação, conjunta com o Sindipetro do Rio Grande do Sul, evitou a desnacionalização da Petrobras, freou a privatização das outras 39 unidades de negócio. Aliás, depois que o Reichstul saiu, o Francisco Gros assumiu e deu uma declaração, no Texas, em Houston, que a Petrobras passaria de uma empresa estatal para uma empresa privada internacionalizada, ou seja, desnacionalizada. Essa nossa ação, de certa forma, evitou isso. São trabalhos que temos orgulho de mencionar.
GOVERNO FHC
[Em 1995], usamos três aposentados, era o máximo de capacidade de recurso que a Aepet tinha: eu e mais um, aqui, e outro morando em Brasília. Fizemos um trabalho para arrebanhar alguns correligionários no Congresso. Contratamos um assessor muito bom, em Brasília, que tinha capacidade para ver como funciona. Ele nos deu uma forma de trabalhar. Claro que tínhamos muito menos poder de fogo do que teríamos na Petrobras, mas nós conseguimos fazer um trabalho razoável, embora tenhamos enfrentado um trator: o Governo Fernando Henrique. Mesmo que tivéssemos os recursos anteriores, não teríamos como suplantar aquele trabalho, aquele negócio de “mensalão”, compra de votos, aprovação de emendas etc. Todo esse esquema que funciona hoje veio dali. Era muito difícil pra gente vencer isso. Mas nós perdemos uma batalha e consideramos que a guerra continua.
PETROS / PREVIDÊNCIA
A gente sempre procurou trabalhar em conjunto [com os outros movimentos de trabalhadores da Petrobras]. A Aepet se atém mais a parte institucional, a defesa da empresa, a defesa do corpo técnico e deixa a parte de defesa do salário com os trabalhadores. Hoje, tem uma divisão na categoria, porque tem a Frente Única dos Petroleiros, a FUP, que, de certa forma, se governizou, ficou muito submissa ao Governo. Nessa questão do monopólio, a gente está do mesmo lado, mas na questão do fundo de previdência houve uma cisão grande, porque nós consideramos que a Fundação Petros, entidade de seguridade social, é uma estratégia de manutenção dos melhores técnicos da Petrobras. O Governo Fernando Henrique se propôs a mudar isso, com a criação um plano alternativo, financeiro, em que os riscos são todos do participante. Nós achamos que isso enfraquece a empresa, porque tira aquele diferencial único que ela tinha. Hoje, temos concorrentes no mercado oferecendo salários bons, com planos de previdências iguais ao novo implantado na Petros. A Petrobras tinha um plano antigo que era muito bom, foi o que ajudou a me manter nela, quando outras empresas me ofereciam salários muito maiores.
SALÁRIOS
Estamos muito preocupados e estamos comunicando ao presidente Gabrielli que o salário dos técnicos da Petrobras está baixo. Olhemos os concursos do Banco Central, da Susep [Superintendência de Seguros Privados do Ministério da Fazenda], do Ipea [Instituto de Pesquisa de Economia Aplicada]. São cinco ou seis empresas do Estado que anunciaram concurso com salário inicial médio de 11 mil reais. O salário inicial da Petrobras é de cinco mil reais, menos da metade. Isso significa que muitos dos técnicos sairão da Petrobras para outras estatais, como está acontecendo. E quando o Pré-Sal deslanchar e, se continuarem os leilões que a gente quer combater e houver empresas estrangeiras, como já há algumas que ganharam leilões, elas podem retirar todos os técnicos, os melhores da Petrobras, pagando. Quer dizer, hoje uma outra estatal paga o dobro da Petrobras, uma empresa privada que tem liberdade ampla total vai pagar o triplo, o quádruplo e aí vai levar o pessoal. Essa é a nossa atual campanha: primeiro, rever o salário dos petroleiros como um todo e, segundo, retomar o plano de pensão, que é um plano previdenciário que ajuda a reter os técnicos na empresa.
MONOPÓLIO DE PETRÓLEO
Um dos momentos [marcantes] foi aquele em que eu me emocionei quando falei aqui, a vitória do monopólio na Constituição: a gente achou que estava garantindo o petróleo para o povo brasileiro, pelo resto da vida. Infelizmente, não foi assim, mas foi uma vitória fantástica. Outro foi em 1994, quando a gente conseguiu que a revisão não acontecesse. Vimos, inclusive, o “centrão” tentando um acordo com a gente. Sentimos a vitória, conseguimos preservar o monopólio. Esses são dois momentos ímpares. Essa questão de impedir a desnacionalização também nos deu um bom alento, porque alguns órgãos de imprensa que hoje tem raiva da Aepet, essa grande mídia que fecha os seus espaços para nós, reconhecem que a nossa atuação impediu a desnacionalização da Petrobras, com essa ação no Rio Grande do Sul. Houve momentos de tristeza, muitos, inclusive a quebra do monopólio. Acompanhamos as quatro votações, duas na Câmera e duas no Senado. Foi uma tristeza muito forte ver uma luta ser perdida. Mas faz parte e nós continuamos de cabeça erguida, estamos, hoje, com muita esperança na questão do Pré-Sal. Há uma nova visão do povo brasileiro sobre a importância dessa riqueza. Essa crise internacional teve o objetivo de derrubar o petróleo e colocar, na mente das pessoas, certo ceticismo em relação ao Pré-Sal: os brasileiros perderam um pouco o entusiasmo e eu acho que isso foi proposital.
GOVERNO LULA
Na verdade, a gente não mudou [com a eleição do Lula], mas alguns companheiros mudaram um pouco. Defendíamos juntos que o plano de previdência deveria ser do tipo benefício definido, porque, como eu falei, é aquele que retém os técnicos. Mas, no Governo Lula, alguns companheiros da Federação Única dos Petroleiros foram para cargos gerenciais e passaram a defender um outro plano que acabou sendo implantado, o Plano Petros 1, um plano puramente financeiro. A gente não mudou de linha, mas os companheiros mudaram. Nós não temos nada pessoal contra eles, mas com essa posição a gente não concorda. Acreditamos, inclusive, que essa é uma estratégia do capital. No passado, havia uma briga forte contra os trabalhadores, conflitos sérios, polícia, prisões etc. Recentemente, o capital resolveu ser mais inteligente e cooptar os trabalhadores. Isso acontece no mundo inteiro, onde entidades são cooptadas por cargos, por benesses que, infelizmente, sensibilizam alguns. A nossa luta tem sido manter aquela linha de trabalho, manter a defesa de um plano realmente previdenciário, defender um salário digno para os técnicos da Petrobras, que está bem abaixo do nível do mercado. Achamos que o fundo de pensão é uma peça estratégica fundamental e, por isso, temos tido certa divergência com os companheiros. Mas não deixamos de tentar trazê-los para a luta do Pré-Sal que, ao nosso entender, é mais importante do que isso.
FUNDAÇÃO PETROS
Eu fui pressionado pelos companheiros a me candidatar a conselheiro do fundo de pensão. Como conselheiro, eu costumo levar as coisas muito a sério. Eu me conscientizei de que estou lá para defender os participantes, que são os donos do fundo de pensão. Infelizmente, há ingerências políticas, mas o fundo de pensão é uma forma de manutenção da tecnologia, dos técnicos, e é propriedade das pessoas. Na Petrobras, a gente tem 120 mil funcionários, cada um com três dependentes em média, totalizam no mínimo 360 mil pessoas. Precisamos ter uma postura de defesa desse pessoal. Claro que uma coisa não incompatibiliza a outra: defender o fundo de pensão é defender a Petrobras, isso eu me conscientizei quando aceitei minha candidatura. No momento, eu defendo que o fundo de pensão seja bom, defendo a estratégia de manutenção de pessoal na Petrobras. Eu não tenho nenhum problema de incompatibilidade entre os dois trabalhos. Uma coisa que eu não gosto de falar muito, para não atrapalhar a luta, é que, no começo do Governo Lula, eu fui convidado para ser o presidente do fundo de pensão. Eu cheguei a aceitar, conversei com o pessoal da Aepet para saber se isso implicaria em um enfraquecimento da luta, mas me disseram: “Não, se você vai pra lá mantendo a sua postura, não tem problema nenhum, você vai defender em loco aquilo que você prega.” Só que, depois, eu fui saber as condições para ser o presidente: teria que aceitar uma postura diferente daquela que eu defendia no passado. Então, não foi possível ser presidente da Fundação. Eu não aceitei mudar de idéia. Mas, nesse meio tempo, fui eleito conselheiro, cargo que ocupei por quatro anos. Depois, eu me candidatei ao conselho fiscal, porque o seu então presidente não poderia ser reeleito. Era o Paulo Brandão, um companheiro da maior qualidade, um dos maiores conhecedores de fundo de pensão, uma das pessoas mais sérias e integras que eu conheço. Portanto, nós trocamos de posição, para que ele não ficasse de fora: ele foi eleito para o conselho deliberativo e eu fui ser presidente do conselho fiscal. A gente procura manter o relacionamento num bom nível. No começo, houve muito conflito. Tivemos que administrar isso, com a preocupação de não colocar tudo a perder, porque quando se radicaliza a briga, podemos perder tudo. Eu sempre procurei, mesmo nos momentos mais difíceis, manter uma postura de defesa da integridade das pessoas. O pessoal continua a me eleger. Recentemente, fui eleito com 60% dos votos. Fomos três eleitos, dois para o conselho deliberativo e eu para o conselho fiscal. Nós fomos contra uma “repactuação” que houve recentemente, por considerá-la extremamente prejudicial para os participantes e para a Petrobras. Embora a repactuação tenha tido um sucesso, 62% mudaram as regras, ainda assim obtivemos 60% dos votos da categoria, mostrando confiança, mostrando que as pessoas acreditam na gente. Isso aumenta a responsabilidade, porque sabemos que temos nas mãos o destino de quase 400 mil pessoas e, para isso, devemos manter uma postura de seriedade, de integridade. É claro que a gente não é dono da verdade, somos seres humanos, sujeitos ao erro, por isso o nível de tensão cresce muito, porque não podemos errar, não podemos colocar tudo a perder.
AEPET / FUTURO
Recentemente, tivemos um sucesso na criação de um comitê de defesa do Pré-Sal, no Rio Grande do Sul. Tivemos o engajamento de várias partes da sociedade. Temos a Frente Nacional dos Petroleiros [FNP] e a FUP lutando pela defesa do nosso petróleo. Nosso objetivo é sensibilizar a sociedade para a importância estratégica dessa riqueza que lhe pertence. Temos clareza de que sozinhos, nós, petroleiros, não iremos conseguir reter essa riqueza em propriedade do povo brasileiro. Nosso trabalho tem sido criar comitês integrados por todas as entidades e forças vivas do país. Na década de 1950, quando o petróleo era um sonho, nós tivemos o maior movimento cívico da história do Brasil: “O Petróleo é Nosso”. Agora que esse sonho virou uma realidade, muito acima de qualquer expectativa, é muito mais motivador, é muito mais importante trazer a sociedade para essa luta. Procuramos a CNBB, a AOB, fomos a várias entidades, várias forças vivas. Diariamente, damos palestras pelo Brasil. No Rio Grande do Sul, gravaram uma de minhas palestras e, embora não tenha ficado tecnicamente perfeita, o pessoal está distribuindo pelo Brasil todo. É difícil para eu distribuir, porque parece promoção pessoal, mas a Ajuris, a Associação dos Juristas do Rio Grande do Sul, e a Assembléia Legislativa estão distribuindo e o pessoal resolveu pedir também para a Aepet distribuir esses DVDs. Precisamos nos atualizar, por isso, junto com o Sindipetro, está em produção um filme sobre essa questão; recolhemos depoimentos de várias pessoas de fora da Petrobras. A UNE, a União Nacional dos Estudantes, fundamental na luta da década de 1950, está, hoje, fora desse processo; há um problema político no meio disso, mas a gente tem esperança de reintegrar a UNE nessa luta. Bom, este é o nosso objetivo, engajar a sociedade na defesa de um patrimônio enorme que pertence ao povo brasileiro.
MEMÓRIA PETROBRAS
Foi um prazer estar aqui. Falar sobre Petrobras é uma alegria. Gostaria de ter conseguido falar mais, mas, às vezes, a emoção atrapalha um pouco. De qualquer maneira, é sempre muito gratificante falar da Petrobras, falar da luta em defesa do petróleo nacional, porque isso é soberania. Tivemos uma primeira chance de ser um país rico, quando Portugal levou o nosso ouro e repassou para a Inglaterra. Agora, nós temos a segunda e última chance de ser um país absolutamente viável, com o petróleo Pré-Sal. Temos todas as condições climáticas, de recursos naturais, recursos não-renováveis. Temos a Amazônia, com uma biodiversidade enorme. Temos condição de substituir o petróleo por energia renovável da biomassa, inclusive na parte petroquímica. Se há uma região no mundo com condições para produzir energia em substituição ao petróleo, ela é a Amazônia; possui 68% da água doce do Brasil e 10% da mundial, possui o trinômio “água, terra e sol”. A Amazônia está cheia de ONGs estrangeiras que querem sua água, sua energia renovável, seus minérios estratégicos e sua biodiversidade, fonte de geração de produtos farmacêuticos, no futuro. Essas ONGs não estão na África subsaariana, onde a miséria é muito maior do que a dos índios brasileiros, porque lá não tem riqueza nenhuma. Também tentamos sensibilizar os brasileiros para isso, porque a Amazônia está sendo tentada à desnacionalização. Ela é o petróleo do futuro, o mineral do futuro, a indústria farmacêutica do futuro. O futuro do Brasil, em grande parte, se deverá à Amazônia. Foi um prazer enorme estar aqui com vocês, falar de Petrobras é a nossa paixão. A Aepet bota isso na cabeça da gente. É sempre gratificante falar sobre a Petrobras.Recolher