Estava escrito nas estrelas! Na primavera de l947, uma jovem (Jandira Ramalho, filha de Francisco Ramalho e Victória Perassole), saiu da cidade de Mococa, interior de São Paulo, e viajou para São Paulo, em visita a parentes que residiam no bairro do Belém; no dia 31 de Agosto foi obrigada a vis...Continuar leitura
Estava escrito nas estrelas!
Na primavera de l947, uma jovem (Jandira Ramalho, filha de Francisco Ramalho e Victória Perassole), saiu da cidade de Mococa, interior de São Paulo, e viajou para São Paulo, em visita a parentes que residiam no bairro do Belém; no dia 31 de Agosto foi obrigada a visitar outra parente no bairro de Santo Amaro, propiciando-nos o encontro que nos levaria a estarmos casando no dia 31 de Julho de l948, exatamente onze meses depois de nos conhecermos.
Nesses onze meses transcorreram muitos acontecimentos. A Jandira veio para visitar parentes, mas a sua intenção era ficar em São Paulo; os primos dela arranjaram-lhe um emprego e ela, com receio de que eu não aprovasse disse-me que o emprego era nas "Lojas Três Irmãos", na Rua Direita.
Várias vezes postei-me nas proximidades para tentar encontrá-la e não me foi possível, em um dos dias quando percebi ela estava perto de mim, mas vindo de outro lugar; daí ela não teve outra alternativa senão me falar a verdade, o emprego era em um bar na Rua da Quitanda (era, justamente um bar que eu costumava ir tomar café com os colegas, quando íamos fazer depósitos ou saques no Banco do Estado que era próximo); não gostei, não tanto pelo local e mais por ela ter mentido.
Como já estava gostando de fato dela e previa que consolidaríamos o nosso relacionamento, aconselhei-a a voltar para a sua cidade, ela aceitou o meu conselho e voltou para a casa dos pais em Mococa, que, soube depois, aprovaram a minha conduta. Ficamos nos relacionando por cartas ( àquele tempo o correio levava quinze dias para levar uma carta e outros quinze dias para trazer a resposta, mas esse contato foi importante para que prosperasse o nosso relacionamento) até um dia, um mês e pouco depois, quando recebi uma das cartas e fiz um suspense para abri-la.
Um meu colega, Moacir Fowler, me convidou para irmos a Campinas e aceitei; íamos no Sábado e voltaríamos no Domingo. Tomamos o trem às 20 horas na Estação da Luz; no trem abri a carta e a saudade bateu fundo; o meu colega que era tanto ou mais louco do que eu, disse: porque não vamos até Mococa?
A sugestão era o que eu desejava ouvir e imediatamente saímos à procura do guarda trem para sabermos das possibilidades. Ele nos encorajou orientando que deveríamos descer em Campinas onde faríamos conexão com o horário da Mogiana que nos levaria até Casa Branca, de lá poderíamos tomar um taxi que nos levaria até Mococa.
Tomamos esse trem e sacolejamos na Estrada de Ferro Mogiana (bitola estreita) até Casa Branca. Descemos na estação e o único taxi que havia estava a serviço de um fazendeiro pelo falecimento de um parente. O funcionário da estação nos orientou e tomamos, às carreiras, um trem que ia para Passos MG, para descermos em São José do Rio Pardo, e conseguirmos um taxi. Em São José uma família desceu na nossa frente e tomou o único taxi para leva-los a uma fazenda; falamos com o motorista e ficamos esperando a sua volta para que nos levasse à Mococa. Até que enfim!
Nós nunca havíamos saído de São Paulo e para mim deveria ser como aqui que os bares amanheciam abertos; o motorista nos dizia, para aplacar a nossa fome: Vou deixa-los em frente de um bar que faz o melhor café de Mococa. Quando chegamos lá o bar estava fechado e não adiantou nada ficarmos em frente, eram cinco horas da manhã. Ficamos próximos à praça principal, e quando as famílias começaram a abrir as portas fomos alvo de curiosidade. Sentamos em uma soleira de porta e esperamos.
Quando eram seis e meia e passava um senhor e o meu colega resmungou, oh! Cidade miserável, estamos morrendo de fome! O senhor aproximou-se e disse, vocês são de fora, porque não foram ao Hotel Terraço? E nos informou e fomos tomar o melhor café que havíamos tomado até aquela data. No hotel as pessoas também estavam curiosas, querendo saber se estávamos tratando assuntos políticos, deixamos tudo em suspense e depois das oito horas fomos procurar o endereço da Jandira.
Quando subíamos a Rua José Bonifácio (o numero era 993) o meu colega dizia, Mik, você não conhece o pai da moça, e se ele aparece com uma espingarda e passar fogo na gente? Mas a determinação e a boa intenção fizeram com que fôssemos bem recebidos. Eu estava meio constrangido, mas meu colega logo ficou a vontade, eu soube depois que havia sido porque vira a minha fotografia, em um porta retrato, em cima do rádio (eu já havia sido aceito, como declarou depois).
Saímos passear pela cidade, e quando voltamos almoçamos e um taxi já estava nos esperando para levar-nos de volta a Casa Branca, onde deveríamos tomar o trem que ali passava ao meio dia e meia. Fizemos a viajem de volta e às oito horas do Domingo, desembarcávamos novamente na Estação da Luz; em vinte e quatro horas havíamos realizado essa façanha.
Dois meses depois saí de férias e fui para lá e fiquei quase as férias todas. Voltei com o coração partido porque apegado profundamente àquela que seria a minha companheira. Passaram-se mais dois meses e a Jandira conseguiu convencer os pais de virem para São Paulo; Alugaram a sua casa lá e vieram residir próximo a parentes no bairro do Belém, mais exatamente na "Mãe do Céu.
O nosso namoro consolidou-se, embora no meio tivéssemos um desentendimento que quase acabou com tudo, mas fizemos as pazes e em 31 de Julho de l948, dançando a valsa Clube XV, realizamos o nosso sonho que tem durado até agora. Fomos morar no quintal da casa onde já residia, aonde construí um cômodo.
Após os primeiros meses em que ficamos tomando refeições em casa de minha mãe, resolvemos assumir a nossa casa, dividimos o cômodo com o guarda-roupas e um guarda-louças que compramos e transformamos o espaço em quarto e cozinha; precisávamos subir na cama pelos pés da mesma; do outro lado ficava uma pequena mesa, duas cadeiras, um fogão a querosene, em cima de uma mesa que eu mesmo construí de um caixote (quando derramava qualquer coisa exalava
um terrível cheiro de querosene!).
Neste ano de l998, em 3l de Julho estaremos completando 50 anos de união. Já aperfeiçoamos o nosso relacionamento? Ainda não! Como poderíamos construir algo perfeito sendo seres imperfeitos? Mas a persistência, a compreensão de ambos os lados fizeram com que fossemos, através dos anos, superando as nossas diferenças, transpondo obstáculos para chegarmos a poder olhar para o nosso passado, contemplar os nossos filhos e netos e concluirmos que construímos algo bom e sólido. Assumindo a nossa responsabilidade criamos, também, uma responsabilidade para os nossos descendentes, qual seja a do dever de constituírem famílias que consolidem a sociedade para que possa haver segurança para os filhos, e através deles para toda a humanidade.
Quando casamos, antes fizemos uma análise da situação que deveríamos enfrentar, contando com o pequeno salário que eu recebia; entramos em acordo que a Jandira não mais trabalharia fora, dedicando-se exclusivamente ao lar. Isso talvez por insegurança minha que pode até ter impedido a ela uma ascensão profissional. Como os afazeres eram poucos ela matriculou-se, juntamente com minha mãe e minha cunhada, em um curso de pintura tendo demonstrado o seu talento. Pena que não deu continuidade (mais tarde ela voltaria a pintar) preferindo, na ocasião fazer um curso de corte e costura, que na verdade foi muito útil, pois passou a costurar para ela, para mim e para as crianças, ajudando significativamente no orçamento doméstico.
Grande parte do patrimônio que conseguimos formar devemos à disposição para o trabalho, de minha esposa, que sempre conservou o nosso lar agradável e acolhedor, além de sua capacidade de organização e economia, aproveitando tudo de tal forma que o salário parecia multiplicar. Não digo que não passamos por dificuldades, mas dentro de uma organização, gastando com proficiência os recursos, alcançamos todos os nossos objetivos.
Hoje ainda tentamos passar esses princípios aos netos, para que eles saibam administrar as suas vidas com a finalidade de caminharem para a realização de suas aspirações.Recolher