P - Bom Zé, primeiramente eu queria agradecer por você oportunizar o seu tempo aqui e contar um pouquinho da sua história pra gente, obrigado.
R - Agradeço também o convite.
P - Desculpe. Por questão de identificação você poderia falar o seu nome completo, o local e a data do seu nasc...Continuar leitura
P - Bom Zé, primeiramente eu queria agradecer por você oportunizar o seu tempo aqui e contar um pouquinho da sua história pra gente, obrigado.
R - Agradeço também o convite.
P - Desculpe. Por questão de identificação você poderia falar o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento.
R - Qual é o nome do programa?
P - Do Programa Cultura Viva. Do documentário ou do Museu da Pessoa?
R - Do projeto de vocês?
P - Então o nome do projeto em si, a gente está junto com o programa Cultura Viva, né, fazendo a cobertura.
P - Não é para citar o projeto de vocês como Ponto de Cultura?
P - Do Museu da Pessoa?
R - Sim.
P - Nós temos um ponto de cultura.
R - Eu quero agradecer o projeto Museu da Pessoa.
P - Acho que enfim, fica à vontade.
R - Bom, o meu nome é José Virgilio Leal Figueiredo, também gostaria de agradecer ao convite do programa Cultura Viva, o pessoal aí do Museu da Pessoa. Eu sou baiano de Salvador, estou há dez anos no estado de São Paulo a principio eu fui ao município de Santo André montar um carnaval fora de época, um grande evento de entretenimento que os baianos criaram. E paralelo a isso eu montei uma escola de percussão, eu trabalhei muitos anos no Olodum e também no inicio da minha carreira lá na Bahia trabalhando no serviço publico na Fundação Cultural, fiz parte de uma equipe que inclusive o ministro Juca Ferreira também fazia parte onde nós fomos os caras do poder público, eu trabalhava no serviço público que incentivamos e apoiamos, e crescemos culturalmente juntos aos blocos afros. Depois quando eu saí do serviço público fui trabalhar no Olodum na área de show business cuidando da carreira da banda Olodum e sempre participei de workshop tanto fora do Brasil como no Brasil levando o ritmo do samba reggae que é uma coisa sensacional, fantástica, o axé, maestro Neguinho do Samba. E lá em Santo André paralelo a essa micareta eu criei um projeto com um sindicato patronal da cidade chamado Régua e Compasso, de percussão, levando o ritmo samba reggae e ministrado por jovem, né, do grupo Olodum, que trabalharam comigo na banda. E a repercussão depois eu me afastei desse projeto, né, a minha dedicação era em cima da micareta, mas esse projeto ele andou, ele circulou por São Paulo, ele esteve em Santos. E na apresentação que eles fizeram na época no SESC de Santos, pessoas da cidade, né, autoridades e tal foi interessante perguntou qual era a raiz daquilo ali, e uma pessoa de Santos que era psicóloga que trabalhava na época na prefeitura de Santo André e era a pessoa da prefeitura de Santo André dentro desse projeto Régua e Compasso que a prefeitura começou apoiar, falou de mim para essa pessoa. A pessoa me convidou para ir a Santos, me apresentou a comunidade do Dique da Vila Gilda, e eu falei “Olha, eu estou voltando pra Bahia porque a micareta lá a gente encerrou e pra gente começar um projeto como esse”, passei as necessidades, de como, e essa pessoa que era um parlamentar ele viabilizou uma empresa e me ligou. E aí eu vim para Santos para montar o Arte no Dique, a principio como uma escola de percussão, né, levávamos o ritmo de samba reggae, em um local extremamente complicado, muito complicado, na maior favela de Palafitas em Dique, na América Latina, onde o poder do tráfico instalado lá dentro, e aquele era um desafio para trabalhar com aquela juventude, né, e passar para eles que existiam outras alternativas, e outras possibilidades se eles acreditassem na capacidade deles de realizar, porque o que era oferecido para eles? Era oferecido ou trabalhar para o tráfico ou então aquelas intervenções pontuais que o município fazia naquelas contratações periódicas, e que a arte e a cultura não só aquele que vai ao palco, mas também aos bastidores da arte da cultura oferecem profissionalização para pessoas que, porque elas sabem montar um gato, tem uma rede de gato, o cara leva TV a cabo para a favela, porque ele não poderá ser um grande iluminador, um grande técnico de som? As mulheres que costuram porque não poderão ser figurinistas, porque não poderão ser maquiadoras, não poderão ser cenógrafas? Então oferece uma série, não é só aquele que vai ao palco, não só aquele que vai pra tela, então com essa proposta de um embrião que seria naquela época, uma escola de arte popular, eram os tambores iam à rua porque não se
tinha nem espaço físico, foram acontecendo varias conquistas. E foram chegando a Prefeitura Municipal, foi chegando, e já tinham contato com o Ministério, o Arte no Dique, que é desta instituição, fui em 2003 quando o ministro do Governo Lula e da gestão do ministro Gil, que na época o secretario executivo Juca Ferreira, e o Juca me falou “OIha, o Zé, o Arte no Dique será um ponto de cultura”, e ele me explicou na época o que era um Ponto de Cultura, o que era aquela
proposta de um ponto de cultura, falou e tal. E foi uma época também que o governo tava chegando, e algumas mudanças fundamentais foram feitas na estrutura administrativa do ministério na época, e eu me lembro, não me lembro o mês, mas só sei
que o Célio, eu acho que ele talvez tenha sido uma das primeiras pessoas, porque ele estava na época chegando lá para ter um encontro com o Juca na Executiva, e ele me apresentou “Essa pessoa ai é uma pessoa que você vai conviver, porque é a pessoa que está assumindo e que vai fazer implantação desse projeto”. Então o Arte no Dique na verdade, nessa questão de Ponto de Cultura, destes que estão aqui, talvez tenha sido o primeiro a saber o que era aquele projeto de inclusão social, de expandir a questão da arte da cultura para as periferias, coisa que nunca tinha acontecido antes. Nunca tinha tido uma intervenção, eu sou um profissional da cultura, comecei a minha carreira em instituições culturais lá da Bahia, onde naquela época a gente tinha essa ação, tinha um grupo que tinha essa ação, no inicio dos anos 80, o Centro de Cultura Popular que hoje é o forte da capoeira, uma feira de cultura brasileira que acabou a Bahia levando cento e tantas pessoas, isso em 83, pra São Paulo e acabou dominando vários e vários projetos de centros culturais no Interior, quer dizer que todas as experiências que a gente procurou, está entendendo? Colocar, trocando idéia evidentemente com as pessoas para saber qual, o que elas esperavam daquilo para formação do arte
modique.
P - Você poderia nos contar como foi o primeiro dia ali no Arte no Dique quando você chegou? Quando foi esse dia?
R - Meu primeiro dia no Arte no Dique foi no final de novembro de 2002, início de dezembro de 2002, nós fizemos um evento numa rua do Dique da Vila Gilda onde os meninos ensaiavam, onde começaram a aprender o toque do samba reggae, eu me lembro que tinha uma parede onde tinha desenhado um crime, um cara abatido no chão, o outro com a arma na mão, ai eu perguntei “Aquilo representa o quê?”, ai eles me falaram “Aquilo foi um crime que teve aqui em uma briga do tráfico”, que não existe mais essa parede, eles pintaram depois e tal, quer dizer, e aí comecei,”Como que eu vou chegar aqui?”, você não pode chegar em um lugar desse com discurso acadêmico, você não pode chegar, você tem que chegar com uma fala que eles entendam, e como você vai tratar assim com os jovens, tem aquele próprio linguajar, tá entendendo? Dessa época agora, que você tem que saber esses termos, saber como conduzir, e principalmente provocar a auto estima que é lá em baixo porque eles convivem com a questão policial que é barra pesadíssima, e quando os caras chegam ali, eles não querem saber, não é gente, não é ser humano que está ali, entendeu? Eles chegam atropelando, chegam pisando, chegam atirando, e ao mesmo tempo existe instalado o poder paralelo que eles têm que obedecer aquele poder paralelo, que é como se fosse o cara que dá as ordens, e o cara que vai dar o afago, mas se você não estiver de acordo com os princípios que ele determina, você vai ser exemplado quer dizer. Então é muito complicado, e o controle disso, de jovens que tem o controle, que sabe que tem curta duração, nessa minha trajetória de sete anos no Arte no Dique, eu já vi três dessas lideranças serem abatidas. Quer dizer, uma logo que eu cheguei, nós fizemos uma parceria, na verdade eu cheguei como pessoa, como o idealizador, mas eu cheguei com a marca do Olodum do meu lado, que era instituição que eu tinha negócios com o Olodum, eu tinha dentro dessa negociação a marca que me acompanhava, que atraiu empresas, que atraiu a opinião do público, a mídia, o músico do Olodum, daqueles que apareciam, que gravou com o Michael Jackson, que menino tocou Paul Simon na Central Park, que era da banda, que as pessoas identificavam, “Esse é realmente um membro do Olodum e não um picareta qualquer”
quer dizer com a
assinatura do Olodum, quer dizer. Então nós fizemos parcerias com, porque lá em Santos as associações comunitárias, eles chamam, esqueci agora, mas é um tipo de uma associação comunitária, e que é complicado porque são lideranças, você está entendendo? Porque na verdade, porque tem uma fala melhor, porque tem uma capacidade de articulação melhor, acaba, claro que isso não é geral, não é uma coisa generalizada, mas ali, na Sociedade Melhoramentos, essa pessoa que é uma hipotética liderança ela barganhava com as pessoas da comunidade, eu me lembro que a empresa, né, a primeira empresa que hoje é a mantenedora, ela disponibilizou recursos, eu peguei e disse: “Parte desse bolo a gente tem que contratar as pessoas aqui para trabalhar, alguma coisa elas vão, sabe? E pegar os recursos e disponibilizar”, não só você chegar e os técnicos, professor e tudo mais. E aí a gente percebeu que não daria para a gente levar adiante com essa sociedade. Então em um ano o Arte no Dique conquistou um terreno, porque a Prefeitura quando viu a visibilidade que eles estavam tendo, ou seja, atraiu antes de um ano programas de rede nacional como Ação [Global], esteve lá,
acabou sendo um programa inteiro porque o Serginho [Groisman] me conhecia e eu vendi para ele aquela idéia de você trazer o samba reggae e misturar coisa da Bahia com o lugar onde a maioria das pessoas ali são nordestinas, o filho, o nordestino mesmo que veio naquela idéia, que São Paulo resolveria a vida e tal, e acabou ali. E aí a gente conquistou um terreno, quer dizer, indicado pelo prefeito e tal, a gente recebeu através de comodato e fizemos em julho isso já de 2003, o grande lançamento do Arte no Dique para opinião publica. A gente fez ações, trabalhou em um lugar e no momento que você tem que chegar e levar aquelas pessoas para outros lugares onde elas não têm acesso, a gente organizou
um grande evento no Sesc de Santos, onde levamos todas aquelas pessoas que nunca tinham pisado naquele espaço, num
bairro da área nobre de Santos, trabalhando a auto estima deles, os meninos da percussão se apresentaram, convidamos um artista de renome nacional como Morais Moreira para participar desse evento. E naquele dia nós recebemos o contrato de comodato de utilização daquele terreno, quer dizer então a partir dali pelo menos já se sabia qual a intenção, aqui vai ter um espaço cultural, a Escola Popular de Arte e Cultura Plínio Marcos vai desenvolver ações para profissionalizar, capacitar através da arte da cultura e fazer a inclusão social, criar dentro dessas estruturas o possíveis produtos para colocar no mercado de trabalho e também desenvolver parcerias, porque nem tudo a gente pode bancar, para atrair através do Senac, do Sesc, dessas instituições, parcerias para fazer outros cursos de capacitação e profissionalização.
P - E o Programa Cultura Viva ele entra nesse momento?
R - Ele entra nesse momento. Quer dizer ele entrou desde o primeiro momento, quer dizer, foi muito importante o Arte no Dique a gente ter a assinatura do Ministério da Cultura, você ter a assinatura do Governo Federal e uma proposta em um projeto que começou ali na rua, que não tinha uma empresa, que não tinha nenhuma assinatura com a prefeitura. E o Projeto Cultura Viva foi o que deu toda uma credibilidade, quer dizer você teve como chegar já com outra... está entendendo? Nas empresas onde você ia buscar, ai nós entramos com a Lei Rouanet, era um projeto que tinha uma vinculação com outra ONG, o Instituto Elos, e ai já foi criado o Instituto Arte no Dique, quer dizer, com dois anos foi criado Instituto Arte no Dique, quer dizer e as coisas foram num processo assim de evolução, outras tendências aí, já chegou o teatro, área de artes cênicas, que é muito forte na cidade de Santos, aí depois nós começamos, introduzimos a dança, depois nós introduzimos o audiovisual, nós fomos o primeiro, eu me lembro que na época os primeiros kits de multimídia chegaram 14, e eu garanti dentro desse 14 um para o Arte no Dique, eu me lembro assim, que chegou aquelas caixas vindo do Ministério, a gente não tinha, nós
construímos um barracão nesse terreno chamado Barracão Cultural Plínio Marcos. Esse barracão ele foi feito pelas pessoas da comunidade, eu sou meio contra esse negócio de mutirão, porque eu acho que é uma coisa meio que utilizar as pessoas que já trabalham a semana toda,
para chegar no final de semana e ainda dar duro, se você faz uma feijoada, uma coisa que foi muito usado na época da ditadura. Então mas ali foi uma outra onda, eu passei para eles: “Olha, é o seguinte, se quiser fazer a gente vai fazer”, eu consegui os madeirites, eu consegui isso, consegui aquilo, na época da campanha do prefeito, ele disponibilizou pra gente o estúdio dele. Então aquele material que eu tinha acústico, né, por causa da questão das horas do tambor, eles disponibilizou, a gente montou esse barracão cultural. E o primeiro espaço físico que a gente teve, na verdade, nesse terreno foi um container, que servia de escritório, esse container que esta lá até hoje, que vai estar dentro quando o nosso espaço for inaugurado ele vai estar ali junto, esse container era o escritório, barracão onde desenvolvia as oficinas, isso no ano de 2004, nós ocupamos esse terreno em 2004. E em junho de 2004 nós inauguramos esse barracão, eu comecei a falar, falar: “Tem que ter, tem que ter, tem que ter”, a gente inaugurou esse barracão, e depois nesse lugar onde a gente tinha esse terreno, o Ministério das Cidades ia criar, muito antes do parque, ia desenvolver um projeto de habitação, e junto tinha uma escolinha de futebol. E essa escolinha de futebol acabaria porque a outra parte do terreno seria do Arte no Dique, e a construção dos prédios era exatamente onde tinha o campo de futebol. E aí teve uma mobilização, que teve que negociar com o tráfico, trocar uma idéia, né, isso num foco comunidade. Mas a prefeitura também estava, porque a prefeitura era a dona do terreno, ela que nos doou o terreno. Então nós negociamos uma outra área, que essa é definitiva, onde vai ser construído o Espaço Mais Cultura, a Escola Plínio Marcos e o Espaço Cibernético Gilberto Gil. Então essa área fica dentro mesmo da favela, quer dizer, ela é a porta da favela, onde na verdade todo o que o Arte no Dique pensa da verdadeira transformação, a transformação sem você impor,
vai acontecer quando esse equipamento chegar lá. Hoje nós temos um estúdio para ensaios, todos equipamentos de última geração, mesa e tal, nós temos o nosso núcleo de audiovisual, com edição completa, com dois ou três Mac,
equipamentos bem, sabe? Bem sofisticado que a gente já comprou aquele kit multimídia do Ministério que nós fomos contemplado em 2003, nos primeiros kits multimídia.
P - Só uma pergunta, Zé. Porque é assim, é todo um processo, né, vocês chegarem e agora já faz uns anos ali, né? Como é esse envolvimento com a comunidade assim? Do começo até hoje, como é que foi essa transformação, como está hoje com essa questão, por exemplo, com o tráfico, como está o zelo em relação ao Arte no Dique? Como está à relação? Como eles vêem vocês hoje?
R - Olha, a comunidade ela faz parte do Arte no Dique, nós, hoje nós nos transformamos em OSCIP, só estamos esperando que o Ministério da Justiça encaminhe para a publicação do Diário Oficial, a diretoria eu faço parte, mais duas pessoas da comunidade, como uma diretora financeira e uma diretora administrativa, pessoas semi-analfabetas que hoje assinam o nome, que sabem o que é um cheque, porque você não pode chegar com tanta responsabilidade que você tem de investimentos de empresas, investimento do dinheiro público, e simplesmente, pelo meu modo de entender, uma coisa demagógica dessa coisa do empoderamento de passar para as pessoas que não estão preparadas, não estão treinadas, não porque elas não tenham capacidade, mas porque elas não tiveram acesso, elas
não tiveram como chegar e simplesmente entregar, pelo meu modo de entender, por uma coisa demagógica, por querer mostrar, está entendendo? Então você tem que preparar essa pessoa, então para isso a estrutura ela tem que ter técnicos qualificados, gente que estudou, que se preparou, e que vai orientar, porque no meu modo de entender, o Arte no Dique teve essa dimensão toda porque ele foi profissional desde o primeiro momento, eu vi experiências como grupos lá da Bahia que as pessoas foram aprendendo fazendo, quer dizer, então tiveram muitos problemas. O Olodum é uma estrutura, que ele é reconhecido no mundo, ele era para estar muito mais do que ele chegou, se tivesse esse suporte, está entendendo? De capacitação daquelas pessoas que construíram, que criaram o Olodum, que saiu como bloco afro, que o Jorge veio e criou o grupo cultural Olodum, e que tomou essa dimensão toda. Quer dizer, ele o João
Jorge se preparou, ele é um homem hoje extremamente bem preparado intelectualmente, mas ele passou por esse processo de construção, são 30, acho que vai fazer 35 anos o Olodum, então como o Ilê Aiyê, outros tantos, está entendendo? O Afro Reggae ele já pegou, eu me lembro que uma vez eu fui lá falar sobre como isso funcionava no Olodum, João Jorge foi, está entendendo? Eles tinham um programa de rádio na época, eu me lembro, o Zé Júnior me convidou e eu trabalhei com Margareth Menezes. Nós fomos lá dar uma entrevista, quer dizer teve um, sabe tinha uns jornalistas na época já formados, já tinha isso, e os caras do Olodum não, eles vieram e saíram do Pelourinho, do gueto, eles vieram como o ritmo que o Neguinho do Samba criou, e eles aí, o mundo “O que é isso, o que é isso?” Quer dizer, então a estruturação deles, eles foram aprendendo e fazendo. Então ter observado essas coisas, no Arte no Dique a gente teve um corpo técnico que chegou ali, está entendendo? E para preparar essas pessoas no sentido que elas estejam capacitadas para dividir com essas pessoas a gestão da instituição. Então a gente não pode chegar e simplesmente, essa questão do empoderamento e colocar e depois lá na frente tudo aquilo ali desmoronar. Então a relação com a comunidade, ela é muito aberta, muito transparente, todas as situações são colocadas para eles, entendeu? Eles tiveram acesso a coisas que eles jamais foram... nós colocamos a banda Querô, já é um dos produtos lá do Arte no Dique, no carnaval de Salvador, então em 2008 tocou no carnaval do Salvador em bairro. Como eu trabalhei lá na Bahia no carnaval e sei como é, eu não levei para colocar no trio elétrico no primeiro
momento, que eram pessoas que estavam iniciando, colocamos em dois bairros que eu sei que tem
um público muito exigente, para sentir a pressão da relação pública e aquele som, coloquei na Liberdade, coloquei no bairro de Itapuã, e teve uma ótima repercussão. E paralelo à isso eles foram recebidos pelo governador Wagner no palácio de Ondina, eles foram recebidos por Gil
na época ministro, na casa dele em Salvador. Quer dizer,
então tudo isso quer dizer, para mostrar à eles,
40 pessoas que nós levamos quase, um ônibus leito, alugamos uma casa com piscina lá em Itapuã, quer dizer, para mostrar a eles que eles tinham, está entendendo, como chegar nesses lugares e não serem vistos como “Ah não, coitadinhos que chegaram dali tal”. Então a relação sempre foi muito aberta, muito transparente, eu tenho uma maneira de ser e isso que uma vez uma delas escreveu, que um documento que um estranho chegou lá para interagir com pessoas estranhas também,com o
jeito de falar e um jeito de ser, que as vezes eles não entendiam, mas que eram extremamente transparente, duro na hora que tinha que ser duro, está entendendo? Essa dureza era para mostrar os caminhos e para trocar idéia a respeito desses caminhos, que quem conhecia o lugar ali eram eles. Eu não moro ali, eu não nasci ali, eu chego ali para fazer um trabalho, eu não posso me envolver com as coisas pessoais daquelas pessoas, o meu envolvimento ali é profissional, é como gente, claro, porque não é um robô que chegou ali? Não, como gente, como pessoa, mas uma relação de trabalho, é claro que as coisas pessoais vem a mim, a gente conversa, a gente troca ideia, mas eu não durmo e não acordo ali, eu não sofro aquela pressão que eles sofrem diariamente, porque a vida é uma pressão total, você imagina num caldeirão como esse.
P - E agora pensando, estamos chegando em 2009, estamos acabando o ano, né, como estávamos falando, quais são as suas expectativas, como você vislumbra agora o programa, como vocês estão pensando para os próximos anos, as expectativas de vocês com o Programa?
R - O Arte no Dique ele foi contemplado pelo PAC, através do Mais Cultura, o Governo Federal disponibilizou recurso na ordem de um milhão novecentos e cinqüenta mil reais para a construção da Escola Popular de Arte e Cultura Plínio Marcos, e do espaço cibernético do Gilberto Gil, hoje está naquela expectativa, mas está extremamente bem avançado, né, com a Caixa Econômica Federal, é quem vai administrar o recurso, esse recurso ele vai para prefeitura de Santos, para a Cohab Santista, e a gente, eu
espero que agora em dezembro a gente entre num
processo de licitação, porque eu gostaria muito que até o final de maio de 2010 o espaço seja inaugurado. Se houver algum contratempo, eu espero que não, até o final do ano nós teremos a inauguração desse equipamento. Eu vejo também que o momento dos Pontos de Cultura, né, e da sociedade cultural começar a pensar, usar os grandes avanços que principalmente nessa questão da cultura chegar à periferia, de você dar acesso realmente à inclusão social, através da arte da cultura como o Governo Federal, como o Ministério da Cultura implementou. No rumo da minha trajetória, como eu te falei, eu fui funcionário público de carreira, lá da Bahia durante uns 15 anos, milito desde meus 17 anos de idade e nunca vi na esfera federal... lá na Bahia a gente via ações governamentais, algumas políticas públicas, até por questão de técnica, né, de envolvidos, de pessoas envolvidas comprometidas, nossa geração do final dos anos 70, início dos anos 80, quer dizer, chegou com vontade, com ideias, com coisa ética bem. Eu nunca vi na esfera federal, assim um Governo e um ministério se preocupar e realmente colocar o Ministério da Cultura a serviço da sociedade brasileira. Porque esse projeto, né, do Ministro Gil com o Presidente Lula, e o Ministro Juca, realmente colocou as periferias onde se produz a cultura, onde se tem grandes talentos, que o talento ele não escolhe onde ele vai rolar, onde ele vai surgir, se não houvesse essa implementação, se não houvesse esse grande processo aí. O que eu acho é que essas pessoas elas fazem parte desse processo, que ajudaram o Governo a construir esse processo, estarem bem atentas para a continuidade desse processo, nós não podemos mais no Brasil ficar à mercê de vontades pessoais, ficar à mercê de que se mudou partidos ou pessoas, aquilo que deu resultado para o país, aquilo que deu resultado para a sociedade, seja colocado, seja esvaziado por conta de vaidades pessoais, eu tenho certeza que as pessoas vão estar organizadas, a sociedade brasileira vai estar organizada porque a grande maioria que está nesse processo, a gente sabe que é até importante que haja assim, como diz Nelson Rodrigues, né, toda unanimidade é burra, mas a gente, ficou muito claro que as questões pessoais elas foram abatidas, aqueles interesses, os grandes grupos,
sem nenhum discurso panfletário, tudo faz parte do processo, mas aquela coisa, o bolo estava ali e os farelos ficaram para a grande maioria, a maioria absoluta da sociedade. Hoje não, hoje o bolo é dividido em partes iguais, e essa conquista a gente não pode jamais se deixar por vaidades pessoais, deixar por outras questões, entendeu? A grande questão maior, ficar à mercê por conta de individualidades ou de regionalismos, ou como eu falei: “Ah deu certo lá, mas é outro processo agora, vamos acabar com aquilo ali, começar um novo e não fazer nada”.
P - Zé, tem alguma história que você queria contar para a gente que eu não perguntei, sobre o Arte no Dique, algum causo, algum fato que tenha sido marcante?
R - Olha, teve algumas situações assim que para mim foram, por exemplo, no dia que pegou aquele grupo ali de jovens que não tinha aquela cultura do samba reggae, porque é muito forte, a cidade de Santos principalmente nas favelas, o funk é muito forte, eles têm uma relação muito grande com o Rio de Janeiro. Aí você vem
com uma
outra onda, com um tambor que é uma forma de comunicação milenar entre povos, aquela batida, porque pode ser o que for, de que tribo for, o tambor e aquele ritmo do samba reggae, ele chegou, a tribo do rock, a tribo do hip hop, a tribo do pop, todo mundo da MPB. E aí depois de três, quatro anos,
você vê como eu vi nesse ano de 2009, o circuito principal do carnaval de Salvador,
a banda Querô
em cima do trio elétrico, em um projeto que nós fizemos com um bloco de crianças que não tem condições de
pagar um abadeco, o Arte no Dique bancou tudo, quatro mil crianças da Bahia e os meninos do Dique da Vila Gilda,interagindo com essas crianças, tocando pra essas crianças, fazendo a festa dessas crianças, aquilo ali para mim foi marcante, está entendendo? Quer dizer, e eu acho que no dia que a gente inaugurar aquele espaço eu acho que valeu a pena.
P - Zé, muito obrigada pela entrevista.
R - Valeu.Recolher