Depoimento de Antônio Peres
Entrevistado por Valéria Barbosa e Ana Paula Soares
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 23 de novembro de 1994
Transcrita por Lúcia Marina G. A. Oliveira
P - Bom, eu gostaria que o senhor nos dissesse o seu nome, o local e a data de nascimento do senhor.
R - Meu nome é Antônio Peres, nasci em 28 de julho de 1930, em Campos Gerais, Minas Gerais.
P - O nome dos pais do senhor?
R - Aníbal Peres Memberg e Helena Ságio Peres.
P - Qual era a atividade do pai do senhor?
R - Meu pai era administrador de fazenda, no início, e depois no final ele era um comerciante, fez alguma, algum trabalho, conseguiu alguma coisinha que ele, aliás ele, já sei porque ele, agora me lembro bem porque ele foi pro comércio, porque justamente ele tinha umas terras que foram desapropriadas por Furnas e, e aí ele saiu, naquele tempo ele estava na fazenda mas já tinha uns 100 alqueires de terra perto de Furnas, e com a... evasão de furnas, quer dizer, com aquela, construção de Furnas ele teve que... foi a escritura número um de Furnas, então com isso ele passou, transformou o negócio dele, vendeu e, e comprou um comércio.
P - E que tipo de comércio que era?
R - Ele tinha parte de... nós tínhamos a parte de alimentos, nós tínhamos a parte de tecidos e também um pouco de ferragens, quer dizer era um misto, né, era um negócio bastante grande, quer dizer, pra aquele momento.
P - E onde que era, que se localizava essa loja?
R - Isso era em Campo do Meio.
P - Eu queria que o senhor falasse das lembranças que o senhor tem da sua infância.
R - Olha, a lembrança que eu tenho mais da minha infância é o seguinte, é que, isso é até uma brincadeira, porque a gente morava numa cidade muito pequena mas pra aquela época era bastante divertido, a gente tinha os amigos e logo que eu pude, eu... logo eu comprei uma bicicleta. Então nós, na cidade, a gente estava ou à cavalo ou de bicicleta, e mais tarde até num,...
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Entrevistado por Valéria Barbosa e Ana Paula Soares
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 23 de novembro de 1994
Transcrita por Lúcia Marina G. A. Oliveira
P - Bom, eu gostaria que o senhor nos dissesse o seu nome, o local e a data de nascimento do senhor.
R - Meu nome é Antônio Peres, nasci em 28 de julho de 1930, em Campos Gerais, Minas Gerais.
P - O nome dos pais do senhor?
R - Aníbal Peres Memberg e Helena Ságio Peres.
P - Qual era a atividade do pai do senhor?
R - Meu pai era administrador de fazenda, no início, e depois no final ele era um comerciante, fez alguma, algum trabalho, conseguiu alguma coisinha que ele, aliás ele, já sei porque ele, agora me lembro bem porque ele foi pro comércio, porque justamente ele tinha umas terras que foram desapropriadas por Furnas e, e aí ele saiu, naquele tempo ele estava na fazenda mas já tinha uns 100 alqueires de terra perto de Furnas, e com a... evasão de furnas, quer dizer, com aquela, construção de Furnas ele teve que... foi a escritura número um de Furnas, então com isso ele passou, transformou o negócio dele, vendeu e, e comprou um comércio.
P - E que tipo de comércio que era?
R - Ele tinha parte de... nós tínhamos a parte de alimentos, nós tínhamos a parte de tecidos e também um pouco de ferragens, quer dizer era um misto, né, era um negócio bastante grande, quer dizer, pra aquele momento.
P - E onde que era, que se localizava essa loja?
R - Isso era em Campo do Meio.
P - Eu queria que o senhor falasse das lembranças que o senhor tem da sua infância.
R - Olha, a lembrança que eu tenho mais da minha infância é o seguinte, é que, isso é até uma brincadeira, porque a gente morava numa cidade muito pequena mas pra aquela época era bastante divertido, a gente tinha os amigos e logo que eu pude, eu... logo eu comprei uma bicicleta. Então nós, na cidade, a gente estava ou à cavalo ou de bicicleta, e mais tarde até num, num Ford 29. Quer dizer, então a gente estava sempre, a gente não andava a pé, né, isso é uma das coisas que era curioso naquele, naquela época, né? E da minha infância assim, foi uma infância normal de garoto, um quintal muito grande em casa, de chupar laranja no pé, aquelas coisas, aqueles brinquedos bem simples, né, porque não existia assim muita, na época coisa muito... coisa muito avançada, né?
P - Que tipos de brinquedos?
R - Ah, era o arco de barril, era bola, era coisas assim, agora eu fui um garoto que brinquei muito pouco, porque eu tinha que trabalhar. Meu pai, 14 filhos, né, e eu precisava ajudar, o negócio dele podia ir, mas eu, todos estavam começando, né, a trabalhar e a gente precisava fazer alguma coisa, e por aí a fora. Então eu fui um garoto sempre que brinquei, brincava algumas horas, mas eu tinha muita responsabilidade, tinha que trabalhar, eu mesmo gostava disso, sentia um interesse assim de, de curiosidade, naquele tempo não se usava máquina, a gente fazia os cálculos no, com papel, de cabeça, enfim, é, era bem diferente, né?
P - Qual foi o primeiro trabalho do senhor, o que o senhor fazia?
R - Meu primeiro trabalho?
P - É.
R - Ah, eu fui, bom, conforme eu estava conversando com você anteriormente, eu comecei a trabalhar com nove anos, eu trabalhava no balcão, ajudava naquilo que podia, apesar de ter uma idade, um tamanho ainda pequeno e, tinha algumas dificuldades, mas eu ajudava, né, eu participava.
P - E atendendo no balcão?
R - Atendendo no balcão, eu era assim um pouco adulto certo, era tipo assim...
P - Os irmãos do senhor também ajudavam, como é que era?
R - Não, os demais, deixa eu ver, tinha o mais velho que gostava mais de lavoura, de mexer com gado, porque na cidade que nós morávamos, só não era, só não pertencia a nossa família a igreja e o padre, porque não existia um padre na família, o restante era tudo, a agência do correio era da minha tia, o não sei o que era do meu primo, sabe, aquele negócio que existia no passado, e que acabou no final praticamente a zero, porque o pessoal antigo sabia trabalhar num esquema, depois as coisas se modernizaram e no final a gente chegou numa situação bem diferente.
P - O senhor falou que começou a trabalhar aos nove anos...
R - Certo.
P - E como que era a escola, assim, como que o senhor conciliava o trabalho e a escola?
R - Bom, a escola era de manhã, parece que é isso, de manhã eu ficava na escola, vinha pra trabalhar... ajudava na loja, trabalhava, não era uma coisa assim, não tinha um horário, um horário rígido, era um negócio quase espontâneo meu, mas eu gostava, e à noite eu completava, fazia os meus exercícios. Então tinha, como estava, morava perto da minha avó, da minha tia, então tinha as tias também que badalavam um pouco, ensinavam, sabe, os parentes também, os adultos participavam daquilo, até mais que a minha mãe, porque minha mãe... minha mãe nem tinha muito tempo, então foi assim.
P - E da escola assim, o senhor tem alguma lembrança de professores, de colegas de escola?
R - Tenho, tenho, tenho da minha professora, me lembro muito bem da fisionomia dela, de uma delas, e tinha até uma outra que era bem mais jovem, coisa de criança, eu estava, tive lá uma infecção renal, qualquer coisa assim, chamava-se Lourdes era o nome dela, não sei, Lourdes Vilela, era o nome dela. Ela era uma loira bonita, eu era um garoto, (risos) então a minha professora era minha namorada, e ela alimentava aquela coisa, né, e... é interessante lembrar disso. Então eu lembro que tinha aquela, minha casa, dentro da sala, e ela chegava pra me ver, batia lá: "Ó, como é que você vai, tal." Meu apelido não era, era Toninho, né, era meu apelido, então era assim. Outra passagem interessante com colegas, que isso é coisa, é, não tinha assim muita coisa, só tinha... não tenho... tenho boas lembranças, entende, foi uma infância assim normal.
P - Certo. Eu queria que o senhor falasse um pouco sobre esse trabalho aí na Casa Peres, né, que o senhor começou a ajudar bem cedo. Como é que era a relação com os clientes, com os fregueses, né, as formas de pagamento...?
R - Ah, sim. Bom, naquele tempo a gente fazia... o que é que tinha que fazer? Tinha alguns concorrentes, não eram muitos, mas nós trabalhávamos de uma maneira assim mais dinâmica, então nós fazíamos, aqui se chama liquidação, lá se chamava, naquela época se falava "queima", né, estamos queimando né?..
P - O estoque...
R - O estoque, aquela coisa toda. Então se fazia uma faixa e tal, e a gente movimentava bastante naquele período, se era tecido era... podia entrar também outros produtos, mas o forte nosso, naquela época, pra esse tipo de coisa era tecidos, porque nós tínhamos um crédito muito bom, tinha naquele tempo os viajantes que nos vendiam tecidos a um preço bom, dava prazo, porque não havia grande consumo, então quem tinha... tinha crédito, tinha mais facilidade de desenvolver seu negócio, né, o seu próprio negócio.
P - E no caso com os fregueses, por exemplo, existia esse, essa facilidade de pagamento?
R - Existia. Inclusive eu como garoto, e depois eu fui crescendo, eu tinha conhecimento com todos eles e havia um respeito muito grande, e tinha aqueles senhores, até de mais idade que conversava com a gente, contava aquelas histórias, porque Minas é muito comum isso aí, né, então contava aquelas histórias, contava aquele, aqueles casos, né, que acontecia e a gente se relacionava muito bem e produzia sem problema nenhum. Agora, não, não só trabalhava eu nessa loja, quer dizer, tinha os meus tios também e tinha mais pessoas, né?
P - E quanto tempo que o senhor ficou trabalhando na Casa Peres?
R - Eu trabalhei na Casa Peres foi de... eu trabalhei até os 21 anos.
P - Conta essa história. Por que é que foi até os 21 e o que é que o senhor fez...
R - Não, 21 anos porque naquele tempo não podia sair de casa antes, e eu queria vir embora, ir pra algum lugar, quer dizer, no final, é o seguinte, uma cidade pequena até existia um, tinha um, o meu pai tinha um pouco de razão, se deixasse a cidade pequena levava a gente ao vício, hoje é o tóxico, é um tipo de tóxico, é maconha, é cocaína, naquele tempo era bebida, e eu perdi quatro primos, que entraram na bebida e não saíram mais. Então havia esse, esse tipo de coisa, como a cidade, não tinha uma vida agitada, era um negócio monótono, pra assistir um cinema tinha que andar 36 quilômetros ou 60, então ficava, né, que se fazia?, era beber, era jogar, eu nunca fui afeito a isso, agora beber a gente podia caminhar nessa direção, então a gente ficava muito limitado. E e a medida que eu, que eu fui crescendo e eu até, houve também aí, né, nesse eu deixei de mencionar na nossa conversa anterior, eu tinha também, nós tínhamos também a bicicletaria, eu comecei com três bicicletas, que eu também fazia, quando eu fazia uma coisa eu não fazia outra, lógico, mas eu também administrava isso, e isto era uma sociedade minha, particular, que eu já tinha alguma economia, não me.... não me lembro quanto era, se era mil reais ou se eu ganhei uma bicicleta e transformei aquilo, e fui fazendo, montei uma bicicletaria e, pedia, comprava peças em São Paulo pelo correio. Uma, um raio por exemplo que custava um cruzeiro, eu vendia por dez, um negócio assim e acabei formando um pequeno... um pequeno capital. Aí eu, da bicicleta eu já comprei uma motocicleta, eu comprei uma motocicleta na Rua do Passeio, na Mesbla, no Rio de Janeiro, vinha os catálogos, era uma motocicleta importada de 125 cilindradas, depois eu achei que aquela era pequena, mas aí eu já estava melhor, eu já estava mocinho, né, já estava... já estava pra ir embora, né? Quando eu comprei a motocicleta aí então a pressão aumentou porque aí vinha o vizinho, o tio, o primo: "Olha, o fulano subiu a rua a não sei que velocidade, não sei o que, estava com não sei quem", sabe, começou fechar muito o meu, o meu, a minha vida. Quer dizer, eu fui ficando, porque cidade pequena todo mundo conhece a gente e sabe de tudo, então eu fiquei pressionado e também eu queria procurar um outro horizonte, porque aquele horizonte pra mim era muito curto e, apesar que os negócios iam bem, mas bem dentro de um proporção que ninguém sabia, porque as medidas daquele tempo não era como hoje, que você tinha, projetava e tal. Um negócio muito misturado, muito parente no meio sabe, ficava muito confuso. Aí já estava os meus primos também entrando no negócio e aí estava ficando, começando a fazer aquela confusão como todas as famílias, e eu queria mesmo sair, principalmente por causa da pressão da família e aquela falta de liberdade, eu queria também procurar um outro canto. Aí quando eu completei, como eu não podia sair, quer dizer, não podia sair em termos, meu pai não deixava: "Quando você completar 21 anos você vai." "Tá bom, a hora que eu completar 21 anos eu vou." Completei 21 anos e no mesmo dia peguei o ônibus e vim pra São Paulo e estou aqui até hoje.
P - Conta pra gente como é que foi esse dia aí da, a viagem, que é que o senhor lembra, pra onde que o senhor veio aqui pra São Paulo, em que lugar o senhor ficou?
R - Ah não, eu vim pra São Paulo, é, eu vim de ônibus por Poços da Caldas, né, que não é muito longe, e fui morar na Rua São Joaquim, 466, ali era uma pensão, eu fui morar numa pensão, meu primo morava lá, naquele tempo as pensões... havia muitas pensões em São Paulo, acho que ainda existe, vagas, né? Então a gente foi morar numa pensão daquela e... fiquei ali por algum tempo, pegava o Diário Popular, que era o jornal que tinha empregos, e ia procurar alguma coisa pra fazer e através de anúncio a gente começou a trabalhar. Primeiro eu procurei um amigo que era, chamava-se Max Zuco, era Casa Mercúrio aqui na, na Alameda Glete, se não me engano, ele me conhecia, mas e, eu como estava, tinha negócio de peças com ele: "Não, quando você vier pra São Paulo você me procura", mas era judeu e eu achei que, fui lá, ele conversou comigo de uma maneira depois as coisas aconteceram de outra, eu não quis prosseguir. Então, aí eu comecei a procurar anúncios e a gente ia procurar nessa base pra ganhar talvez um salário mínimo, naquela época era 1.200, eu não sei se era 1.200 cruzeiros, se era 1.200... o que era, acho que era 1.200 reais, era um salário mínimo e você pagava de pensão 800 ou 900, pra comer uma travessinha de, um bife pequenininho, o arroz e feijão e tal, mas era uma vida boa, quer dizer, a gente tinha a cabeça leve, né, também pela época, São Paulo naquela época tinha 2.500 mil habitantes, 2.600 mil, tinha bonde, ônibus e carros, alguns.
P - O que é que o senhor sentiu, por exemplo, da diferença da cidade do senhor, de Campos Gerais, né, e São Paulo? Como é que foi...?
R - Ah, uma diferença enorme, quer dizer, aquela... no começo, me encantava cidade grande, mas também me dava medo, hoje eu tenho mais medo ainda, mas aquele barulho, aquele, pior que hoje é milhões de vezes mais, mas aquele barulho me deixava assim um pouco assustado. Mas por outro lado eu tinha e... o que mais me maltratava até não é isso, a cidade eu fui me adaptando, pouco tempo depois eu já estava adaptado, mas a saudade da minha casa. Aí eu ficava lá com a mão assim pensando aquela tarde, naquele não sei que, aqueles acontecimentos todos que tinham passado na minha vida. Isso durou mais ou menos aí uns três meses, seis meses por aí, é como a perda de alguém, quer dizer, você tem que curtir aquela perda, então eu curti aquela perda e depois eu toquei minha vida, né?
P - E qual foi o primeiro trabalho do senhor aqui em São Paulo?
R - Primeiro trabalho foi numa, com um libanês, com um senhor libanês, era o velho, o seu Salim, Salim Mussa, e o filho dele, Benedito Mussa, ele era solteiro e eu trabalhava com o filho, o velho já estava assim mais fora do negócio, então eu trabalhava com ele, ele era uma pessoa excelente, como pessoa, pra pagar muito ruim, pagava muito mal e pagava sempre com atraso, (riso) isso me atrapalhava, sabe. Aí, nesse momento eu já estava morando em Pinheiros, na Teodoro Sampaio, já estava num apartamento que uma senhora do Rio de Janeiro alugou e eu aluguei uma parte lá com um outro colega, era assim que a gente vivia, mas já tinha mais conforto, era outro ambiente e também não ganhava mais, ganhava mais ou menos por aí, isso que eu mencionei anteriormente e vivia, mas a minha dificuldade com ele, que ali eu sabia que também eu não tinha futuro, mas o tempo passou e eu fiquei acho que um ano, um ano e pouco. Depois... ele foi até uma pessoa muito boa pra mim no seguinte sentido, eu tive aí um problema de uma apendicite aguda e ele me levou pro hospital, me internou, pagou a cirurgia, e depois eu repus pra ele, naquele tempo 6.000 re... réis, acho que era isso, eu tinha uma economia de quarenta e poucos, e eu paguei 6.000. Mas o cara não me conhecia, não sabia de nada, fazia pouco tempo que eu estava com ele, infelizmente até a poucos dias eu liguei pra lá pra ver se eu conversava com ele porque eu não me encontrei mais com ele, mas me deu saudade dele, sabe que ele me tocou, aí tive a informação que ele tinha falecido de repente.
P - E essa loja de tecidos ficava na... Teodoro?
R - Na Teodoro Sampaio, 2.748, ou 2.548, uma coisa assim, quase, próximo do Largo de Pinheiros. Aí eu fiquei lá um tempo, depois eu saí e fui trabalhar nas Casas Carvalho, também uma casa de tecidos aí já era uma casa, uma firma mais dinâmica, uma loja nova que estava abrindo, eu ajudei na montagem da loja, preparamos os tecidos, porque os tecidos vêm em peças... vinham em peças, e a gente transformava, enrolava naqueles cartões, naqueles quadros, né, pra ficar tudo direitinho. E ali eu trabalhei acho que três meses, faltava acho que um dia pra inaugurar, dois ou três. Aí surgiu em São Paulo, aí naquele tempo os negócios lá em Minas ficou com o meu pai e meus irmãos e eu vim pra cá, e chegando aqui, conforme eu estou dizendo, eu fui trabalhando e quando eu estou na loja próxima pra inaugurar, eu ia ser um vendedor da loja e eu entendia bastante de tecidos naquela época, aí veio... apareceu o meu tio com um cunhado dele, que tinha comprado uma casa, um empório aí no Cambucí que se chamava empório, Casa Rio Preto, na Rua Lavapés, 1.128. E aí falou comigo, eu falei: "Ah, tudo bem", já conhecia ele, fui trabalhar com ele. E aí eu fiquei, quer dizer, eu trabalhava como um tipo de gerente, era a função que eu tinha, praticamente eu resolvia tudo, porque ele não conhecia nada de São Paulo, não conhecia nada de nada, e ele tinha uma dificuldade muito grande, porque ele já não era tão criança pra vir pra cá, e tinha muitos filhos e não tocava a coisa assim com facilidade, eu já estava mais treinado, né? Então assumimos aquilo, eu fiquei com ele até 1956, 56... 1956.
P - Essa mudança, por exemplo, sair do ramo de tecidos e ir pra um empório, como que é, assim, é tranqüilo?
R - Não, não é nada, porque já no, lá em Minas nós já tínhamos também a parte de mercearia, e a parte de alimentos, então eu conhecia açúcar, café, arroz, feijão, óleo, isso tudo a gente já conhecia, então não era muito difícil, apenas o mercado diferente, né, muito dinâmico, e num bairro que nós tínhamos essa mercearia, é... de classe média de São Paulo, que é o Cambucí, onde uma clientela muito conservadora. Então nós lutamos muito, aliás eu trabalhei muito ali, eu me acabei ali, quer dizer era muito trabalhoso porque nós tínhamos que fazer entrega a domicílio, atender telefone, trazer vasilhame, comprar, vender, quer dizer, se a gente fazia uma campanha, uma campanha, um pequeno anúncio, que a loja não era tão pequena, mas pra época era um tamanho bom, naquele tempo existia o que em São Paulo?, três empórios grandes, Empório Rossi, eu já estou entrando no assunto do supermercado.
P - Pode ir, tudo bem.
R - Então, o Empório Rossi, na Penha, onde ele trabalhava, era uma companhia muito, uma casa muito grande, muito forte, com um número muito, tinha 40, 50 vendedores, com telefone, entregava em toda São Paulo e vendia num preço muito bom. Depois, o segundo era Ao Barateiro, de Vila Mariana, era também um empório famoso, na Rua Domingos de Moraes, que trabalhava no mesmo sistema, e o terceiro era o nosso, mas nós estávamos numa localização um pouco pior, além do que nós não tínhamos o mesmo fôlego que eles, tudo isso já acabou, quer dizer, já desapareceram, fecharam nem sei dizer mais porque. E... o que acontecia? Nós tínhamos que trabalhar dentro da nossa, do nosso campo, sobrava uma pequena fatia do mercado porque eles entregavam com grande facilidade em qualquer parte, mas nós tínhamos que sobreviver mais dos clientes do Cambucí. Então a gente fazia um, uma oferta, um folheto, e vendia bem aquela oferta, aumentava um pouquinho, voltava alguma coisa, ou trocava, a venda caía, isso nós ficamos naquela gangorra muito tempo, e a gente não tinha, não sabia como sair daquilo até que chegou num ponto que a gente teve que pensar em vender, porque se trabalhava muito, o prédio era próprio, mas não, não tinha um resultado, era um péssimo negócio pra aquele momento, devido a localização, e tinha outro fator, é... aquele é um bairro intermediário muito próximo do Centro e qual era a vida em São Paulo, no passado? Agora eu vou falar do, do mercado de São Paulo um pouquinho, voltar um pouco lá atrás, o que que existia? Atacado, comércio na parte de atacado, atacadista, que trabalhava com cereais, com bebidas, conservas etc. Onde era o abastecimento dos comerciantes ou dos pequenos merceeiros? Era através do atacado, então eles comandavam, o atacado era muito forte e o varejo muito fraco, muito pulverizado, certo, essa era a posição daquela época. Depois é... passando para... deixa eu ver aqui, nós estamos no, falei do atacado me perdi um pouquinho... Ah, então qual era o ponto pra, pra se conseguir alguma coisa? Era comprar diretamente, nós podíamos comprar diretamente alguma coisa, mas não tudo, a gente podia comprar um pouco, mas nós não tínhamos fôlego pra comprar de uma companhia que exigia quantidade, então a gente ficava numa posição inferior. Diante desse quadro nós resolvemos vender, meu tio resolveu vender a mercearia e aí eu me retirei do ramo, do Cambucí. Mas ainda voltando no assunto de mercado, o que, qual era a dificuldade daquele tempo? Primeiro: preço, que nós enfrentávamos, preço, segundo, próximo da cidade, do Centro, toda vida de São Paulo era no Centro. Então existia Feira das Nações, Depósito Circular, e mais uma outra casa, Feira das Nações, Depósito Circular, Feira das Nações, Depósito Circular e tinha mais uma outra organização que agora eu não me lembro, agora eu não sei se é Agênzio... Então se você precisasse de um produto de melhor qualidade ou de uma maior variedade, você recorria àquelas casas, e era muito simples ir do Centro para o bairro, pro Ipiranga, pro Cambucí tal, era dois minutos de bonde, ia de bonde naquela época, né? Então essa posição intermediária era muito difícil de enfrentar pra, pra ter os clientes que dessem um volume satisfatório; então nós resolvemos parar por aí e cada um tomou seu rumo, meu tio voltou, foi cuidar de uma outra loja de calçados numa outra cidade, e aí eu volto, fiquei sem trabalho.
P - Bom, falando um pouquinho ainda do empório, quais eram os produtos mais vendidos no Empório Rio Preto?
R - Bom, os produtos mais vendidos pelo bairro eram os produtos mesmo de grande consumo, era o arroz, era o feijão, era sabão, era óleo, era os farináceos, produtos básicos exclusivamente e esse era o grande problema, porque existia recursos, naquele tempo não tinha nem idéia, talvez até espaço a gente conseguisse, mas o mix era muito pobre, então esse mix pobre não dava pra sustentar, essa era a grande dificuldade.
P - E os fornecedores, quem eram os fornecedores do empório?
R - Bom, os fornecedores do empório, por exemplo, Companhia União de Refinadores já existia naquele tempo, a... Indústria Química Duas Âncoras, que era da cera Parquetina, hoje é Atlantis, mas a Atlantis não nos fornecia naquele tempo porque a Atlantis tinha uma exigência de quantidade que era impossível a gente trabalhar, mas já existia a Fleischmam Royal que nós comprávamos bem, por sinal comprei gelatina pra 50 anos, acho que tem até hoje, eu fui comprando sabe quando você... vai dando desconto, se comprar cinco eu te dou mais cinco e eu fui aumentando, como eu não tinha experiência, nós compramos gelatina pra uns cinco anos lá, e tinha outras firmas, né que, Martini já existia. Agora, não tinha aquela variedade que existe hoje, tinha o essencial, né, pra se trabalhar, aí eu tenho o assunto das marcas próprias mas de... embalagem, mas um pouco mais a frente eu vou comentar.
P - O senhor comentou comigo também, a questão da entrega de leite, por exemplo...
R - Ah, você me lembrou bem, era esse o ponto que eu queria falar. O que é que tinha... bem lembrado Como era dividido o merca... o bairro, no bairro o que é que tinha? Tinha uma mercearia, a farmácia, o açougue, a quitanda, que é a casa de frutas, e a feira; então a dona de casa tinha cinco pontos de abastecimento ao redor da casa dela. Carro, poucos possuíam, até existia mas não eram muitos, então a pessoa se abastecia por ali, daquela forma. Então você veja que não tinha muitas opções, era tudo muito limitado, quando precisava de um, de um vinho português, vou no Depósito Circular, lá na Praça da Sé, ou vou no Agênzio, ou vou no outro que eu falei, Feira das Nações.
P - Aonde era a Feira das Nações?
R - Era ali pela Praça João Mendes, ali que estava, entre Praça João Mendes, José Bonifácio, ali tinha várias lojas de mercearias finas, né, que eles chamavam, da época.
P - E no caso do abastecimento do leite?
R - Ah, o abastecimento do leite, eu esqueci de falar da padaria, a padaria naquela época o que é que vendia? Pão, leite, café, não existia nada disso que tem hoje na padaria, ela trabalhava exclusivamente... podia ser que uma ou outra tivesse uma venda de lanches ou alguma coisa parecida mas muito pouco, o forte era isso, é o abastecimento do pão, não eram as padarias de hoje, as padarias de hoje são pequenos supermercados, quer dizer, são pequenos mercadinhos, né, então é bem diferente.
P - Bom, do empório, o senhor ficou trabalhando lá vários anos, né, e depois?
R - É, eu fiquei de 53 a 56, três anos, foi o suficiente pra mim sentir que não, que ali não ia bem.
P - Certo. E depois o que é que o senhor foi...?
R - Bom, aí eu, o meu irmão tinha uma barbearia ali na Rua da Consolação em frente ao Sirva-se da Consolação e ele tinha como cliente o seu José Steves, que era diretor da Cia. Torquato de Tela, era fabricante de balcões frigoríficos para supermercado, pra qualquer tipo de negócio. E conversando com ele, ele assessorava, ele tinha um grande conhecimento com o pessoal do Sirva-se e falando, mesmo conversando com ele: "Ah, meu irmão saiu, está aí precisando trabalhar, ele é do ramo de mercearia e tal, será que o senhor não o encaminhava?" "Ô, pois não", ele era argentino. E ele marcou um dia comigo, eu peguei, entrei no carro dele, ele tinha um Hudson naquela época, aqueles carros antigos, fui com ele até a Gabriel Monteiro da Silva, ele me apresentou, eu estava com um terno marrom, sentei, preenchi uma ficha e comecei a trabalhar naquele dia, em mil novecentos... aí já era em 1957, eu sei que eu comecei no começo do ano, eu não me lembro bem a data, aí comecei a minha carreira em supermercados.
P - E qual era a função do senhor?
R - Bom, eu fui ser auxiliar de compras, eu fazia todo trabalho de informação pro comprador, levantamento de estoques, preços, eu calculava tudo, quer dizer, não tinha mais ninguém pra fazer, então tinha que fazer tudo, tinha a maquininha lá, aquela de rodar que ia pra frente e pra trás, aquilo era ótimo, e eu trabalhei ali uns tempos com isso. E esse... e tinha esse comprador, ele é... inclusive naquela época quem administrava o Sirva-se era o doutor Osvaldo Ribeiro Franco que era médico, e casado com uma moça, uma senhora de origem hispânica, né, então tudo que era, aquele pessoal que vinha da Espanha, aquele pessoal que queria trabalhar, eles vinham pro Sirva-se, então era a colônia espanhola, e eu só fiquei lá porque eu tinha o sobrenome Peres, senão eu não teria entrado. Então era curioso, que era a colônia espanhola lá.
P - Eu queria que o senhor falasse como que era o Sirva-se em termos de clientela, de mercadoria, de exposição de mercadoria...?
R - Certo, certo, então eu vou te dizer como funcionava o supermercado. Assumida a parte de compras, a assistência de compras, eu fui criando experiência, né, com o sistema, porque era um sistema completamente diferente de uma mercearia, era muito mais rápido, tudo tinha que ser pensado com muita antecedência, tudo se pensava ontem pra acontecer amanhã, entende não podia deixar pra amanhã pra resolver, porque era muito dinâmico, apesar de ser um negócio novo, era muito dinâmico. E uma grande dificuldade que nós enfrentávamos naquele momento é, era justamente as embalagens de auto-serviço, você conseguia, o que você vendia embalado? Você vendia tudo em... toda a parte de, que hoje se vende em balcão frigorífico, nós vendíamos em lata, era sardinha em lata, era pêssego, palmito, carnes enlatadas, se vendia muito, era o camarão em lata, camarão seco, salgado, não existia camarão congelado naquela época; então nós comprávamos a safra da empresa e a gente comprava na época da safra e armazenava pra vender o ano todo, exceto carnes, que tinha o frigorífico Wilson, Frigorífico Swift, é, Bordon não existia naquela época, é, Armour, né, eram os três mais fortes, então não se trabalhava com produtos no balcão, era linha de conservas que substituía, a feijoada em lata e por aí afora... Agora, a nossa grande dificuldade era fazer com que o fornecedor entendesse que nós precisávamos trabalhar com auto-serviço porque todo mundo achava que supermercado, o que era? Apenas uma substituição de mercearia? Em parte sim, mas qual era a filosofia de supermercado? Vender muito com pouco lucro, mas as pessoas achavam que nós tínhamos, que o custo do supermercado era baixo porque não tinha balconista, mas nos bastidores tinha um trabalho enorme, principalmente naquela época, hoje já vem tudo pronto. Nós, naquela época nós tínhamos que embalar mercadoria de vários tipos. Vamos começar pela mercearia, nós tivemos que induzir os fabricantes a produzir embalagem, o que é que existia de embalagem? Papel, celofane e cartão, então vamos induzir o fornecedor de arroz a empacotar o arroz, conseguimos, em embalagem de papel, em sacos de papel, isso durou muito tempo, era o arroz Brejeiro que está voltando no mercado depois de 50 anos, depois teve o arroz Delta e o arroz Vitória, então nós fomos aos poucos mostrando pra eles que nós tínhamos que trabalhar com auto-serviço. Aí, fazendo o arroz automaticamente veio também o feijão ainda no papel, é... os farináceos já não tinha muito problema porque já existia o, o... como chama, celofane, então fazia-se embalagem de celofane e os saquinhos né, era, naquela época existia a Matarazzo, a Votorantim já tinha esses produtos, então se produzia embalado no celofane, pequenos pacotinhos e tal, isso tudo já estava desenvolvendo. Então esse era o básico, o forte da coisa era isso, depois nós tínhamos que ver o fabricante de biscoitos que também queria só vender a granel, só na lata de dois quilos, ou de quatro quilos, então tínhamos que pesar, nós tínhamos a bomboniére, aquele trabalho imenso de pegar tipo por tipo, 200 gramas de um, 50, 20, sei lá quanto era, e colocar aquilo num pacote ou num saquinho e pesar. Aí nós fomos induzindo, o biscoito não era tão difícil, porque 200 gramas de biscoito não, o custo da embalagem era razoável, mas existia outros produtos como chocolates, né, e até nós, nós que lançamos a embalagem, o Sirva-se lançou a embalagem de chocolate de quatro unidades na Gabriel Monteiro da Silva, com o chocolate Diamante Negro da Lacta, o que é que existia de chocolate naquele tempo? (Sonksen?) e Lacta, não existia Nestlé. Então nós conversamos, nós fizemos a experiência, tínhamos uma bomboniére que vendia, vamos dizer, 600 tabletes por mês, ou qualquer coisa parecida, e eu trabalhava, nessa época já tinha assumido na direção do Pão de Açúcar o senhor Ermínio Ferreira Neto, que era um homem já de uma certa idade mas que ficou nos Estados Unidos, logo, quando a família Simonsen assumiu o Sirva-se, ele foi pros Estados Unidos, ficou lá uns dois anos ou um ano e meio e, pra ver o que que era os supermercados. Naquele tempo existia já o senhor Fernando Pacheco e tinha um outro que era do Peg-Pag, que daqui a pouco eu vou lembrar o nome, que já está, que tinham montado o Sirva-se da Consolação, Raul Borges, o senhor Raul Borges e o senhor Fernando Pacheco tinham montado o Sirva-se e a diretoria do Pão de Açúcar, do, do... do Sirva-se assumiu o Sirva-se e tinha esse, primeiramente esse doutor Osvaldo Ribeiro Franco que não era do ramo e trouxe depois o senhor Ermínio Ferreira Neto, que hoje deve estar com 84, 85 anos mais ou menos, era um professor de supermercado nesse país. Então, quem entendia de supermercado nesse país era Fernando Borges, Fernando Pacheco, Raul Borges e Ermínio Ferreira Neto. Então naquele tempo o que é que se vendia mesmo no supermercado, quando ele assumiu? Um pouquinho de cada mercadoria, primeiro fomos desenvolver a parte de auto-serviço - aí eu volto no chocolate, depois eu continuo. Fizemos a experiência de fazer no fim de semana uma embalagem, um cartão com quatro tabletes envolto em celofane, tinha um ferro que soldava atrás, nós vendemos, o que vendia num mês, nós vendemos num fim de semana e aí nós fomos mostrar pra Lacta e daí a pouco eles começaram a desenvolver a embalagem de auto-serviço, e assim nós fomos fazendo um trabalho. Por outro lado, eu segui uma orientação do seu Ermínio, isso não era na minha função, o gerente de lojas seguia a orientação dele no auto-serviço, como é que tem que vender carne? Eu vou por seções, mercearia, primeiro nós temos que complementar a mercearia com tudo aquilo que for possível para que o freguês chegue e leve o produto pré-embalado, depois para seção dois, pra seção de carnes, nós chamávamos naquela época seção dois, era embalar a melhor carne possível, selecionada, limpa e conservada no balcão refrigerado, já existia uma boa refrigeração naquele tempo, era só cuidar, e acompanhava, muitos funcionários foram embora porque não seguiam a orientação de ter a qualidade ou de não ter o produto em auto-serviço. Então nós tínhamos um Bife Paris que você podia comprar o Bife Paris, levar pra casa que era uma coisa excepcional, e (tornedoze ?) e outros tipos de carne que eram preparadas, nós tínhamos uma grande variedade de carnes. Depois então, seção três, frutas e verduras, isso não dava pra fazer muito em auto-serviço, mas laranja já podia começar a empacotar mas não existia, o plástico ainda estava um pouco difícil naquele tempo, tinha que importar matéria-prima e era difícil, então a gente tentava fazer daquelas bancas e aos poucos nós íamos treinando os funcionários pra embalar, tanto a seção três de frutas e verduras, principalmente as verduras, limpar a verdura, arrumar a verdura, proteger, ou com celofane, por exemplo, você pegava uma alface, não pegava na alface, você tinha um negócio, um envólucro que colocava a alface, envolvia e punha um durex ou colava, então se entregava, ela pegava a alface não com a mão, e era uma alface lavada, limpa tudo. Então era serviço e era qualidade, era diferente, quer dizer, nós não vendíamos muito barato no Sirva-se, mas nós vendíamos qualidade porque era uma clientela, quem ia no supermercado naquele tempo? Quem tinha carro, alguns também, lógico, tinha muita gente que ia no supermercado, com o tempo foi acontecendo isso, mas a grande, a maior clientela era gente de poder aquisitivo porque encontrava variedade, coisas que ela tinha que se locomover pra cidade pra comprar. Então os supermercados começaram a apresentar esse tipo de coisa, então aí nós fomos desenvolvendo a seção três, depois fomos para a seção quatro. O que tinha na seção quatro? Frios e laticínios, na parte de frios existia o frigorífico Santo Amaro, ou Frigoreder, naquele tempo era Frigorífico Santo Amaro, Sadia, praticamente existia mas estava muito distante do mercado, ela estava mais no atacado do que no varejo, ela vendia a produção dela por atacado e tudo bem, talvez vendesse em açougues e outros lugares, mas o Frigoreder, era um frigorífico, ainda não era dos maiores, mas pra época estava bom, tinha muita qualidade mas não fazia nada, eu não tinha condições de, o que ele vendia, o que ele produzia ele vendia, né? Então nós fomos mostrando a eles que deveríamos, o caminho a seguir, mas eles não mudaram, porque alemão tem a cabeça dura, ele acha que o produto dele é bom, tem que ser vendido a granel e não vai mudar, e não mudava mesmo. Mas o frigorífico Wilson, a Swift, e outros, percebendo que o mercado estava crescendo foi desenvolvendo a embalagem, a primeira embalagem que surgiu foi a (craiovac?), desenvolveu a embalagem (craiovac?), já era meio caminho pra nós, porque já tinha facilidade na conservação, era mais protegida, já não tinha aquele trabalho todo de estar pondo na caixinha, de estar envolvendo pra vender pro cliente, mas nós continuávamos vendendo o Santo Amaro a serviço, pouca coisa, e o restante em auto-serviço. Então, o nosso esforço era em auto-serviço, então frios existia poucas firmas e a gente vendia o que podia, mas era mais fácil de seguir esse caminho porque já se podia vender 400 gramas de salsicha ou 200 gramas de salsicha, ou outro tipo de mercadoria. Ficava mais difícil quando chegava no patê, que era uma coisa pequena, teria que ser embrulhada, envolta num celofane, aí a gente ajustava, e depois ia pra é, frios, queijos, né, queijos em geral, frios, laticínios, é, os laticínios... vou falar de laticínios. Nos laticínios, o que existia naquele tempo? Aí vem o caso do caminhão, era leite em vidro, o creme de leite era em vidro, o iogurte era em vidro, então tinha que vender e receber o vasilhame, tudo isso nós tínhamos que enfrentar mas, enquanto a padaria, a padaria vendia dez litros de leite nós vendíamos 100, 200, 500, porque o supermercado tem uma força de vendas que ninguém acredita porque há venda por impulso, você vai no supermercado, e você vê muitas coisas que não estava na sua memória, acaba, você acaba vendo e levando e isso a gente explorava mesmo, esse era o forte. Não fazíamos o que deveríamos fazer, ao invés de vender 20 com um lucro de 50 centavos, nós vendíamos só 10, com lucro de um, de dez, de 50 centavos nós vendíamos com lucro de um real. Isso é um erro, o supermercado está errado em trabalhar nesse sistema, mas como o país aqui é diferente e tinha outros custos e outras, coisas então a gente tinha que seguir, mas o certo é você vender quantidade, o dobro da quantidade que você tem condições de vender, vamos dizer, você vai vender dez, você vende 20 com a metade do lucro é mais importante do que você vender só dez e se acomodar, porque amanhã alguém vende um pouquinho menos, com uma pequena diferença e você acaba perdendo cliente. E o supermercado, a grande força do supermercado deveria ser isso, vender muito com pouca margem, agora, e vender qualidade, isso que nós fazíamos, quer dizer, dar segurança ao cliente de que ele estava comprando qualidade. Qualquer mercadoria que ele estivesse levando em auto-serviço tinha qualidade, isso era uma exigência que nós tínhamos desde o início, mesmo na compra de produtos, nós podíamos comprar a segunda marca, mas sabíamos o que nós estávamos comprando, que era produto de boa qualidade, não era líder de mercado, mas tinha qualidade, é o caso, vamos dizer, de você falar de Cica e Etti ou Olé, sei lá, hoje, quer dizer, ou Arisco, é um produto que nós sabíamos a qualidade que possuía, quer dizer, era bastante razoável, também tinha um preço inferior então nós tínhamos que dar opção, né, de variedade e de preços.
P - Eu queria que o senhor falasse desse desenvolvimento aí do supermercado pro hipermercado, quando que...
R - Certo, deixa eu ver se ainda tem alguma coisa em supermercado, atravessando toda essa fase, quer dizer a nossa grande, o nosso grande trabalho era embalar, a segunda era comprar quantidade, desenvolver uma política de compra assim, conseguir melhor volume, mesmo não atingindo o máximo, com o melhor preço. E acho que isso, se, se não existisse hoje supermercado apesar de que os supermercados hoje alguns aplicarem uma margem exagerada, mas o preço seria muito mais alto porque os supermercados veio tirar a intermediação, só que muitos, não sei se ainda está acontecendo, acabaram transferindo para o seu bolso uma pequena diferença que não deveria, certo. Quem deveria ser o beneficiado disso seria o consumidor, o consumidor final, você tem que transferir pro consumidor as vantagens e tirar, e ficar dentro da sua margem que é o razoável. Então eu falei de seção um, seção dois, seção três, seção quatro, falta ainda uma importante, seção cinco, que é o bazar, aí eu vou te contar a história do meu professor Ermínio Ferreira Neto. Então ele chegava pra mim, ele muito calmo: "Peres..." acionava lá, apertava lá o, telebit lá o aparelhinho, naquele tempo a comunicação era bem... e dizia: "Agora nós precisamos desenvolver uma linha de louças assim, assim; agora eu preciso desenvolver uma linha..." - a cada momento ele dizia uma coisa - "uma linha de plástico tal e isto e aquilo, agora uma linha de produtos de limpeza..." Mas não dizia, não dava dica nenhuma, nem sabia, quer dizer, era um... nesse momento, aí eu esqueci de mencionar, esse comprador que estava na firma, ele saiu, ele não se, ele como espanhol não, não se ajustou bem com o seu Ermínio e eu fiquei como substituto, eu fiquei como substituto lá temporariamente, ele ia trazer um cara do Rio de Janeiro, e tal, aí, tem um amigo meu que ainda está aí no ramo de supermercados, chama-se Ernesto Fransquine, que era gerente da loja que era o homem que executava as ordens do seu Ermínio disse: "Ah, por que você não deixa o Peres lá, parece que está tocando bem." E eu fiquei, fui ficando, ficando e fui desenvolvendo de acordo com o que ele queria, de acordo com o que deveria ser, não como ele queria, mas como deveria ser, e o negócio cresceu e foi muito bem. Então aí os supermercados começaram a ter uma participação maior de não-alimentícios, então você já comprava uma panela no supermercado, uma frigideira, o pano de chão, o pano de louça, a vassoura, onde você ia comprar uma vassoura naquele tempo? Era numa mercearia lá, não sei aonde, às vezes nem achava a vassoura, a flanela que é uma coisa que se vendia muito e se vende até hoje, e aí veio o palito e não sei que mais, e copos de plástico e a medida que foi desenvolvendo, a indústria foi desenvolvendo produtos, onde poderia vender, principalmente ligado, a consumo doméstico? Era supermercado e aí eu quero voltar um pouquinho, por que é que existe, por que teve grande sucesso os pães de centeio? Onde o salgadinho iria encontrar guarida pra vender seus produtos se não fosse o supermercado? Quer dizer, uma coisa puxa a outra. Os Kelloggs da vida, você teria que ir lá, sair da mercearia e ir lá na Praça da Sé, na Feira das Nações comprar um pacote de sucrilhos. Os supermercados não, ele abriu esse mercado, ele deu oportunidade pra novos lançamentos, para produtos novos que de maneira nenhuma chegaria tão fácil na mão do... quer dizer, ele abriu as portas pra levar o produto na mão do consumidor. Essa foi a grande força do supermercado, primeiro, ter tudo num só local pra você comprar, isso eu estou falando quando se fala de uma maneira de trabalho honesta, séria, que eu acho que tem que ser, que todo mundo tem que operar; então dentro dessa linha o que era o supermercado? Levar a dona de casa onde ela pudesse comprar tudo que ela precisava, quer dizer, tudo em termos, mas dava uma possibilidade de escolha; segundo, se ela tivesse o desejo de comer um biscoito amanteigado não sei de que produto, não precisava ir muito longe, ela encontrava no supermercado. Tinha supermercados de poder aquisitivo mais alto onde tinha uma linha muito, a nossa linha ia de um a 13, quer dizer, itens, quer dizer... variedades, conjunto de... como é? Blocos, núcleos de variedades; então em determinadas áreas tinha uma linha, noutra tinha outra de acordo com o poder aquisitivo, mas mesmo se abrisse uma loja em Guarulhos, no centro de Guarulhos, eu nunca ia deixar de ter um produto de qualidade porque também em Guarulhos tem gente que tem dinheiro pra comprar até produto importado, não tem muitos, não é muito grande a venda como é no Jardim Paulista ou sei lá, nos Jardins, mas tem sempre um cliente pra consumir. Então o supermercado foi assim, deu muita força pra produtos novos. Eu até te falava anteriormente é, sobre o óleo de milho, e outras coisas que foram surgindo, o consumidor nem, não, achava que era um absurdo consumir óleo de milho e o supermercado colocou na prateleira e foi vender o óleo de milho; eu tenho a impressão de que se ele fosse pra prateleira de uma mercearia ele ia ficar escondido lá, porque você tinha que olhar lá em cima pra ver se tinha, você não ia descobrir. Agora, você passa no supermercado você vê lá: óleo de milho. "Puxa, óleo de milho, nunca ouvi falar." Mas aí você já tem, sabe, está na mão, aí você começa a ver qual é o teor de gordura, qual é a caloria, sei lá, quantos glicídios e outras, outros componentes do óleo, e você verifica então que vale a pena experimentar. Como é hoje o óleo de girassol que está na frente do óleo de milho, quer dizer, estão tentando mas não conseguiram mercado ainda, pelo preço, não pela qualidade, pelo preço. É isso. O que você gostaria... Ah, falar do desenvolvimento de outras lojas, né?
P - Isso.
R - Bom, aí nós prosseguimos nos supermercados, isso eu estou falando, eu estava no Sirva-se, depois o Sirva-se foi vendido pro Pão de Açúcar, ao Pão de Açúcar em 1965, aí eu me transferi para o Pão de Açúcar. Naquele tempo a minha organização era do Canal 9, do Banco Noroeste, da Companhia Paulista de Café que era da família Simonsen, Bord Wainer, era um grupo muito forte que por sinal o nosso amigo Herbert Levy fez na época uma denúncia contra o Mário Simonsen sobre o envio de, uma exportação de café, porque ele tinha filiais em todo o mundo, e ele era, tinha uma grande exportação de café e houve essa denúncia política, né, e acabou com a empresa, embarcou esse café, estava em Santos ele falou: "Vou embarcar." Era 300 mil sacas, três milhões de sacas, não me lembro bem o número, ele embarcou e aí foi o final da carreira dele, e, houve um problema da fiscalização, uma pressão muito grande, seqüestraram os bens e a família Simonsen saiu desse patamar que estava, hoje ainda existe o Banco Noroeste, mas o velho até, o Mário Simonsen que era o líder e os filhos que era, estava na crista da onda, com muito dinheiro, né, acabaram não sei onde hoje. Aí o Pão de Açúcar compra as duas lojas e incorpora às suas cinco lojas que eles possuíam naquele momento, e aí foi o grande impulso que ele teve porque comprou duas lojas, naquela época ele chamava de dois bancos, não porque eu vim de lá, qualquer um sabia, naquela época, que eram lojas grandes, muito lucrativas, devido à localização e por ser as primeiras e mais bem organizadas. Depois o Pão de Açúcar assumiu. Naquele tempo tinha a projeção da loja sete, no Pacaembu, também ele ficou com a loja sete e aí então tocou, teve um desenvolvimento fabuloso, foi abrindo loja, nós abrimos lojas assim do dia pra noite e em 30 dias se abria uma loja nova, se comprava lojas, fazia o inventário naquela mesma noite, no outro dia já abria com outro letreiro. Aí foi um negócio muito bom, realmente se trabalhou muito, eu trabalhava domingo, o fim de semana, fazia o inventário em Ribeirão Preto, em São José dos Campos, comprava duas lojas de um, uma de outro, e no outro dia a gente já estava com a loja aberta, né, e funcionando e aí foi, a firma foi crescendo. Como o Pão de Açúcar sempre gostou de inovar, o que é que nós fizemos de mudança? Foi os supermercados, aí veio os hipermercados. Os hipermercados, na Argentina, no começo teve grande sucesso, tinha o Canguro, na Argentina, e um outro que eu não me recordo agora. Eram lojas de 12.000 metros, até exageraram um pouco como exagerou aqui o Paes Mendonça, o hipermercado é pra ser grande mas não pode ser muito grande, não pode ter 30.000 metros que é um absurdo, uma dona de casa precisa de patins; nos Estados Unidos não era bem aceita a idéia do hipermercado, os franceses não tinham vindo para o Brasil mas já havia pesquisas sobre o hipermercado principalmente na Argentina, ele estava sendo sucesso naquele momento, mas acho que todos fecharam, me parece que só está lá o Carrefour hoje com, porque é muito, tem um método muito avançado. E aí começou-se a pensar no hipermercado, aí nos abrimos então o primeiro em São... Santo André, era uma grande loja, foi uma coisa fora do comum, era uma loja com, além da mercearia incorporava também o não-alimentício com uma participação de 40%, se no supermercado o bazar representava 7%, ele, nós fomos para 40% de não-alimentício, quer dizer, geladeiras, televisores, barco, era aquele, aquele...
P - Acessórios pra carro...
R - Tudo, era tudo, mas também o Brasil estava de vento em popa; né, quer dizer, eu não me lembro que ano era esse, 74, não 64, estava saindo da, politicamente o país parece que ia bem, acho que havia aquele milagre, tudo que se produzia vendia e tudo que se abria era sucesso. Aí se abriu o primeiro Jumbo, em Santo André, inclusive tinha loja de carro, autopeças, aquele negócio todo, foi um sucesso fantástico, foi na época do Delfim, me lembro o Delfim que fez a inauguração daquela loja, então, e qual era o pensamento do Delfim naquele tempo? Diminuir e fazer fusão de empresas, ele achava, na cabeça dele, não sei se está certo, hoje mudou acho que até nos Estados Unidos isso, era ter grandes empresas, fusão de grandes empresas, grandes grupos e eliminar o pequeno. Quer dizer, eliminar não, quer dizer, firmas pequenas ficar como está na França, está na Europa, o dono, o marido, a mulher o filho, tal opera aquela loja...
P - Familiar.
R - ... familiar. Paris tem até hoje lá mercearia desse tamanho aqui que tem 500 anos e está lá, ninguém ficou rico, ninguém ficou pobre, só que lá está tudo delimitado, quer dizer, você pode abrir uma aqui e outra lá e não tem mais, aqui se abre uma perto da outra não tem esse, nem supermercados tem medidas ou abre próximo ou não, cada um faz o que bem entende, esse é um grande erro. Mas ele estimulava muito o grande comércio e naquele tempo também o governo era um pai, né, um pai rico que dava dinheiro, que emprestava, se tinha problema, você abria a empresa, se tinha problema você recorria ao governo, ele te dava o dinheiro pra não mandar ninguém pra rua e isto perdurou por muitos anos, parece que agora esse tipo de coisa não acontece mais. Estou entrando num campo aqui que não tem nada a ver, que eu me lembro daquela época. Mas voltando ao Jumbo, então abriu-se o Jumbo, foi um grande sucesso, foi uma grande inovação e depois foi expandindo para uma loja dessas, para cada estado, o único erro, é que ele abriu mais de uma em cada estado e adaptou mais de uma loja para hipermercado, quer dizer, não podia ter em Brasília, naquele momento, três lojas, três Jumbos, podia ter um Jumbo e duas lojas convencionais, se o Jumbo era melhor, então tinha que abrir mais um Jumbo na mesma... com a mesma dimensão, mais ou menos na mesma dimensão, mas com o mesmo sistema porque cada mercado, e mercado é diferente um do outro, Brasília, aquilo é muito amplo, mas se você verificar hoje o que tem em Brasília, exceto o Carrefour e hoje tem um Jumbo Extra lá, do Pão de Açúcar, que é muito amplo, todos aqueles prédios construídos em Brasília eram todos pequenos, três andares, quatro andares, então você operar um supermercado de quatro andares é uma coisa do outro mundo, você não sabe como levar o cliente lá em cima, quatro, eu não digo, eram três, então era muito difícil, era tudo verticalizado, os prédios, uma construção que a gente não entendia porque era feita daquele modo, fizeram um shopping center também verticalizado, difícil de trabalhar, tudo apertado e com tanto espaço. Então houve alguns erros que naturalmente se refletiram agora no final, porque criou dificuldades, entrou um concorrente mais, com uma loja ampla, com um grande estacionamento, com tudo dentro das, dentro das medidas, dentro daquilo que deve ser e aquele que foi adaptado você sabe que não tem, perde mesmo o seu, a sua eficiência, né, e a empresa vai crescendo muito, crescendo muito, acaba perdendo um pouco também da eficiência.
P - Bom, em termos dessa qualidade que o senhor falou, por exemplo, no Sirva-se, que tinha essa preocupação com a qualidade. O senhor acha que atualmente, por exemplo, os hipermercados têm esse tipo de preocupação e, em relação à clientela, o que mudou do Sirva-se do início pra o hipermercado de hoje, por exemplo?
R - Não, eu acho que... primeiro eu vou te responder o seguinte, eu outro dia fui no Carrefour e esperei abrir a loja, o Carrefour é uma loja muito limpa como, falar Carrefour, têm muitos supermercados que são bons, mas vou dar exemplo do Carrefour porque a disciplina do Carrefour é muito parecida com a do Sirva-se. Abriu a loja, 9 horas, todo mundo a postos de roupa limpa, todo pessoal de avental branco, deu o sinal, todo mundo ocupou seus lugares. Eu fiquei arrepiado porque há muitos anos na minha vida eu não tinha visto isso, no Sirva-se nós tínhamos isso, mas eram duas lojas comandadas, de cima do escritório você comandava a loja lá em baixo, era fácil, tinha aquela lateral que a gente ficava lá e dava pra, pra ver tudo que se passava lá em baixo, não podia faltar carrinho, não podia isso, aquilo, e a gente acompanhava, não eu, mas o administrativo da loja. Mas eu vi o que é organização mas, agora, eles pecam numa coisa, qualidade, hoje a carne está muito boa, e alguns outros produtos, mas eles trabalham com fornecedores que eu jamais trabalharia na minha vida, jamais eu colocaria o meu logotipo naquele produto principalmente marca própria, não estou falando mal de Carrefour, acho que alguns hipermercados vendem produtos de um frigorífico que não tem responsabilidade. Uma coisa é eu trabalhar com Sadia, outra coisa é trabalhar com Prieto da Silva, quer dizer, não dá pra, não dá pra fazer isso, principalmente um produto perecível, certo. Mas é uma loja muito bem administrada, muito dinâmica, eles mudam a coisa assim rapidamente, é preto, é preto, é branco, é branco, não tem meio termo, não tem depois, tenho certeza que isso era melhor há uns tempos atrás, já está ficando difícil, porque houve muita troca de pessoal, houve muita, saiu muita gente do Carrefour que foi para outras organizações e vice-versa, e treinar pessoal pra isso não é fácil, principalmente em seção de perecíveis. Mas eu acho que ainda ele mantém uma qualidade muito boa, é, e o principal, eu acho que todos têm os produtos com a mesma qualidade só que é uma questão de disciplina, de administração, nem todos fazem isso com bastante cuidado, esse é o ponto. Ontem mesmo eu visitei um hipermercado que eu achei que ele tinha melhorado, quando eu fui ver no detalhe aí eu vi que ele não era aquilo que eu pensava, quer dizer, realmente ele estava com uma aparência muito boa mas nos detalhes, principalmente na parte perecível que agora, todo mundo muito preocupado e até a fiscalização, a gente está vendo toda hora fechando lojas enormes, inclusive do Carrefour, já fechou lojas, mas isso aí é um problema do gerente, eu tenho certeza que a administração não admite esse tipo de coisa, como também, nem Pão de Açúcar, nem Eldorado vai querer que aconteça alguma coisa desse tipo, mas o material humano é muito fraco, a pessoa pra trabalhar em supermercado, eu fui várias vezes pros Estados Unidos, eu ia todo ano para o SMI, Supermarket Institute, e a gente aprendia muita coisa na operação de loja, na qualidade. E até uma vez eu me lembro, que uma coisa, uma coisa que não me esqueci até hoje, era de pessoal, a pessoa pra trabalhar em supermercado tem que ser agressiva, tem que ser uma pessoa com muito, com muita disposição, porque supermercado não é brincadeira, agora, se ela tem essa característica, ela vai muito bem, mas têm elementos que não são, sabe, é... como se diz, não tem a, é... como se fala, esqueço agora o termo... dom pra trabalhar em supermercado, não tem a caraterística primária pra trabalhar em supermercado, porque supermercado é tudo muito rápido, precisa muita atenção, não pode dormir, não pode ficar conversando, tem que trabalhar, e se trabalhar vai muito bem.
P - Bom, a gente está com o tempo aí ... vamos tentar concluir. Eu queria que o senhor me respondesse qual é o sonho do senhor?
R - Hoje?
P - Isso.
R - Não é abrir um supermercado. Eu gosto muito de supermercado, mas o meu sonho era voltar novamente ao trabalho de supermercado, quer dizer, trabalhar ou na administração... em qualquer tipo de administração de supermercado, seja em venda, compras, é... operações, o que for, entende, exceto uma coisa, parte financeira porque isso aí não, está fora dos meus planos, entende. Isso eu gostaria de fazer, e se isso não acontecer, eu vou ter que ir tocando a minha vida como está hoje, quer dizer, estou aí com a minha representação, está dando pra mim empurrar meu tempo, mas isso não é bem o que eu quero, eu sei comprar, eu não sei vender.
P - Bom, pra finalizar mesmo agora, eu queria que o senhor falasse o que o senhor achou de ter passado essa hora aqui com a gente, de deixar o registro da história de vida do senhor, quer dizer, um pouco da sua história de vida e do seu trabalho também.
R - Ah, eu achei excelente, eu gostei muito e, e estava aflito pra chegar aqui pra mim falar um pouco, talvez eu até precisava falar, estava um nó na garganta, realmente agora eu consegui, né, falar muitas coisas que talvez tivessem guardadas e que já nem me lembrava mais. Realmente eu tive que fazer um certo esforço, talvez eu até tenha falhado em algumas informações porque muitas coisas que já aconteceram, é difícil a gente, a gente precisaria rememorar um pouco mais, mas foi excelente, gostei muito, estou muito satisfeito.
P - Bom, nós agradecemos a participação do senhor.
R - Eu é que agradeço vocês, e quando precisar de mim, sabe o meu telefone, falando em supermercado, o que eu puder fazer dentro da minha, do meu pequeno conhecimento, a gente está pronto.
P - Tá bom, a gente agradece. P - Bom, eu gostaria que o senhor nos dissesse o seu nome, o local e a data de nascimento do senhor.
R - Meu nome é Antônio Peres, nasci em 28 de julho de 1930, em Campos Gerais, Minas Gerais.
P - O nome dos pais do senhor?
R - Aníbal Peres Memberg e Helena Ságio Peres.
P - Qual era a atividade do pai do senhor?
R - Meu pai era administrador de fazenda, no início, e depois no final ele era um comerciante, fez alguma, algum trabalho, conseguiu alguma coisinha que ele, aliás ele, já sei porque ele, agora me lembro bem porque ele foi pro comércio, porque justamente ele tinha umas terras que foram desapropriadas por Furnas e, e aí ele saiu, naquele tempo ele estava na fazenda mas já tinha uns 100 alqueires de terra perto de Furnas, e com a... evasão de furnas, quer dizer, com aquela, construção de Furnas ele teve que... foi a escritura número um de Furnas, então com isso ele passou, transformou o negócio dele, vendeu e, e comprou um comércio.
P - E que tipo de comércio que era?
R - Ele tinha parte de... nós tínhamos a parte de alimentos, nós tínhamos a parte de tecidos e também um pouco de ferragens, quer dizer era um misto, né, era um negócio bastante grande, quer dizer, pra aquele momento.
P - E onde que era, que se localizava essa loja?
R - Isso era em Campo do Meio.
P - Eu queria que o senhor falasse das lembranças que o senhor tem da sua infância.
R - Olha, a lembrança que eu tenho mais da minha infância é o seguinte, é que, isso é até uma brincadeira, porque a gente morava numa cidade muito pequena mas pra aquela época era bastante divertido, a gente tinha os amigos e logo que eu pude, eu... logo eu comprei uma bicicleta. Então nós, na cidade, a gente estava ou à cavalo ou de bicicleta, e mais tarde até num, num Ford 29. Quer dizer, então a gente estava sempre, a gente não andava a pé, né, isso é uma das coisas que era curioso naquele, naquela época, né? E da minha infância assim, foi uma infância normal de garoto, um quintal muito grande em casa, de chupar laranja no pé, aquelas coisas, aqueles brinquedos bem simples, né, porque não existia assim muita, na época coisa muito... coisa muito avançada, né?
P - Que tipos de brinquedos?
R - Ah, era o arco de barril, era bola, era coisas assim, agora eu fui um garoto que brinquei muito pouco, porque eu tinha que trabalhar. Meu pai, 14 filhos, né, e eu precisava ajudar, o negócio dele podia ir, mas eu, todos estavam começando, né, a trabalhar e a gente precisava fazer alguma coisa, e por aí a fora. Então eu fui um garoto sempre que brinquei, brincava algumas horas, mas eu tinha muita responsabilidade, tinha que trabalhar, eu mesmo gostava disso, sentia um interesse assim de, de curiosidade, naquele tempo não se usava máquina, a gente fazia os cálculos no, com papel, de cabeça, enfim, é, era bem diferente, né?
P - Qual foi o primeiro trabalho do senhor, o que o senhor fazia?
R - Meu primeiro trabalho?
P - É.
R - Ah, eu fui, bom, conforme eu estava conversando com você anteriormente, eu comecei a trabalhar com nove anos, eu trabalhava no balcão, ajudava naquilo que podia, apesar de ter uma idade, um tamanho ainda pequeno e, tinha algumas dificuldades, mas eu ajudava, né, eu participava.
P - E atendendo no balcão?
R - Atendendo no balcão, eu era assim um pouco adulto certo, era tipo assim...
P - Os irmãos do senhor também ajudavam, como é que era?
R - Não, os demais, deixa eu ver, tinha o mais velho que gostava mais de lavoura, de mexer com gado, porque na cidade que nós morávamos, só não era, só não pertencia a nossa família a igreja e o padre, porque não existia um padre na família, o restante era tudo, a agência do correio era da minha tia, o não sei o que era do meu primo, sabe, aquele negócio que existia no passado, e que acabou no final praticamente a zero, porque o pessoal antigo sabia trabalhar num esquema, depois as coisas se modernizaram e no final a gente chegou numa situação bem diferente.
P - O senhor falou que começou a trabalhar aos nove anos...
R - Certo.
P - E como que era a escola, assim, como que o senhor conciliava o trabalho e a escola?
R - Bom, a escola era de manhã, parece que é isso, de manhã eu ficava na escola, vinha pra trabalhar... ajudava na loja, trabalhava, não era uma coisa assim, não tinha um horário, um horário rígido, era um negócio quase espontâneo meu, mas eu gostava, e à noite eu completava, fazia os meus exercícios. Então tinha, como estava, morava perto da minha avó, da minha tia, então tinha as tias também que badalavam um pouco, ensinavam, sabe, os parentes também, os adultos participavam daquilo, até mais que a minha mãe, porque minha mãe... minha mãe nem tinha muito tempo, então foi assim.
P - E da escola assim, o senhor tem alguma lembrança de professores, de colegas de escola?
R - Tenho, tenho, tenho da minha professora, me lembro muito bem da fisionomia dela, de uma delas, e tinha até uma outra que era bem mais jovem, coisa de criança, eu estava, tive lá uma infecção renal, qualquer coisa assim, chamava-se Lourdes era o nome dela, não sei, Lourdes Vilela, era o nome dela. Ela era uma loira bonita, eu era um garoto, (risos) então a minha professora era minha namorada, e ela alimentava aquela coisa, né, e... é interessante lembrar disso. Então eu lembro que tinha aquela, minha casa, dentro da sala, e ela chegava pra me ver, batia lá: "Ó, como é que você vai, tal." Meu apelido não era, era Toninho, né, era meu apelido, então era assim. Outra passagem interessante com colegas, que isso é coisa, é, não tinha assim muita coisa, só tinha... não tenho... tenho boas lembranças, entende, foi uma infância assim normal.
P - Certo. Eu queria que o senhor falasse um pouco sobre esse trabalho aí na Casa Peres, né, que o senhor começou a ajudar bem cedo. Como é que era a relação com os clientes, com os fregueses, né, as formas de pagamento...?
R - Ah, sim. Bom, naquele tempo a gente fazia... o que é que tinha que fazer? Tinha alguns concorrentes, não eram muitos, mas nós trabalhávamos de uma maneira assim mais dinâmica, então nós fazíamos, aqui se chama liquidação, lá se chamava, naquela época se falava "queima", né, estamos queimando né?..
P - O estoque...
R - O estoque, aquela coisa toda. Então se fazia uma faixa e tal, e a gente movimentava bastante naquele período, se era tecido era... podia entrar também outros produtos, mas o forte nosso, naquela época, pra esse tipo de coisa era tecidos, porque nós tínhamos um crédito muito bom, tinha naquele tempo os viajantes que nos vendiam tecidos a um preço bom, dava prazo, porque não havia grande consumo, então quem tinha... tinha crédito, tinha mais facilidade de desenvolver seu negócio, né, o seu próprio negócio.
P - E no caso com os fregueses, por exemplo, existia esse, essa facilidade de pagamento?
R - Existia. Inclusive eu como garoto, e depois eu fui crescendo, eu tinha conhecimento com todos eles e havia um respeito muito grande, e tinha aqueles senhores, até de mais idade que conversava com a gente, contava aquelas histórias, porque Minas é muito comum isso aí, né, então contava aquelas histórias, contava aquele, aqueles casos, né, que acontecia e a gente se relacionava muito bem e produzia sem problema nenhum. Agora, não, não só trabalhava eu nessa loja, quer dizer, tinha os meus tios também e tinha mais pessoas, né?
P - E quanto tempo que o senhor ficou trabalhando na Casa Peres?
R - Eu trabalhei na Casa Peres foi de... eu trabalhei até os 21 anos.
P - Conta essa história. Por que é que foi até os 21 e o que é que o senhor fez...
R - Não, 21 anos porque naquele tempo não podia sair de casa antes, e eu queria vir embora, ir pra algum lugar, quer dizer, no final, é o seguinte, uma cidade pequena até existia um, tinha um, o meu pai tinha um pouco de razão, se deixasse a cidade pequena levava a gente ao vício, hoje é o tóxico, é um tipo de tóxico, é maconha, é cocaína, naquele tempo era bebida, e eu perdi quatro primos, que entraram na bebida e não saíram mais. Então havia esse, esse tipo de coisa, como a cidade, não tinha uma vida agitada, era um negócio monótono, pra assistir um cinema tinha que andar 36 quilômetros ou 60, então ficava, né, que se fazia?, era beber, era jogar, eu nunca fui afeito a isso, agora beber a gente podia caminhar nessa direção, então a gente ficava muito limitado. E e a medida que eu, que eu fui crescendo e eu até, houve também aí, né, nesse eu deixei de mencionar na nossa conversa anterior, eu tinha também, nós tínhamos também a bicicletaria, eu comecei com três bicicletas, que eu também fazia, quando eu fazia uma coisa eu não fazia outra, lógico, mas eu também administrava isso, e isto era uma sociedade minha, particular, que eu já tinha alguma economia, não me.... não me lembro quanto era, se era mil reais ou se eu ganhei uma bicicleta e transformei aquilo, e fui fazendo, montei uma bicicletaria e, pedia, comprava peças em São Paulo pelo correio. Uma, um raio por exemplo que custava um cruzeiro, eu vendia por dez, um negócio assim e acabei formando um pequeno... um pequeno capital. Aí eu, da bicicleta eu já comprei uma motocicleta, eu comprei uma motocicleta na Rua do Passeio, na Mesbla, no Rio de Janeiro, vinha os catálogos, era uma motocicleta importada de 125 cilindradas, depois eu achei que aquela era pequena, mas aí eu já estava melhor, eu já estava mocinho, né, já estava... já estava pra ir embora, né? Quando eu comprei a motocicleta aí então a pressão aumentou porque aí vinha o vizinho, o tio, o primo: "Olha, o fulano subiu a rua a não sei que velocidade, não sei o que, estava com não sei quem", sabe, começou fechar muito o meu, o meu, a minha vida. Quer dizer, eu fui ficando, porque cidade pequena todo mundo conhece a gente e sabe de tudo, então eu fiquei pressionado e também eu queria procurar um outro horizonte, porque aquele horizonte pra mim era muito curto e, apesar que os negócios iam bem, mas bem dentro de um proporção que ninguém sabia, porque as medidas daquele tempo não era como hoje, que você tinha, projetava e tal. Um negócio muito misturado, muito parente no meio sabe, ficava muito confuso. Aí já estava os meus primos também entrando no negócio e aí estava ficando, começando a fazer aquela confusão como todas as famílias, e eu queria mesmo sair, principalmente por causa da pressão da família e aquela falta de liberdade, eu queria também procurar um outro canto. Aí quando eu completei, como eu não podia sair, quer dizer, não podia sair em termos, meu pai não deixava: "Quando você completar 21 anos você vai." "Tá bom, a hora que eu completar 21 anos eu vou." Completei 21 anos e no mesmo dia peguei o ônibus e vim pra São Paulo e estou aqui até hoje.
P - Conta pra gente como é que foi esse dia aí da, a viagem, que é que o senhor lembra, pra onde que o senhor veio aqui pra São Paulo, em que lugar o senhor ficou?
R - Ah não, eu vim pra São Paulo, é, eu vim de ônibus por Poços da Caldas, né, que não é muito longe, e fui morar na Rua São Joaquim, 466, ali era uma pensão, eu fui morar numa pensão, meu primo morava lá, naquele tempo as pensões... havia muitas pensões em São Paulo, acho que ainda existe, vagas, né? Então a gente foi morar numa pensão daquela e... fiquei ali por algum tempo, pegava o Diário Popular, que era o jornal que tinha empregos, e ia procurar alguma coisa pra fazer e através de anúncio a gente começou a trabalhar. Primeiro eu procurei um amigo que era, chamava-se Max Zuco, era Casa Mercúrio aqui na, na Alameda Glete, se não me engano, ele me conhecia, mas e, eu como estava, tinha negócio de peças com ele: "Não, quando você vier pra São Paulo você me procura", mas era judeu e eu achei que, fui lá, ele conversou comigo de uma maneira depois as coisas aconteceram de outra, eu não quis prosseguir. Então, aí eu comecei a procurar anúncios e a gente ia procurar nessa base pra ganhar talvez um salário mínimo, naquela época era 1.200, eu não sei se era 1.200 cruzeiros, se era 1.200... o que era, acho que era 1.200 reais, era um salário mínimo e você pagava de pensão 800 ou 900, pra comer uma travessinha de, um bife pequenininho, o arroz e feijão e tal, mas era uma vida boa, quer dizer, a gente tinha a cabeça leve, né, também pela época, São Paulo naquela época tinha 2.500 mil habitantes, 2.600 mil, tinha bonde, ônibus e carros, alguns.
P - O que é que o senhor sentiu, por exemplo, da diferença da cidade do senhor, de Campos Gerais, né, e São Paulo? Como é que foi...?
R - Ah, uma diferença enorme, quer dizer, aquela... no começo, me encantava cidade grande, mas também me dava medo, hoje eu tenho mais medo ainda, mas aquele barulho, aquele, pior que hoje é milhões de vezes mais, mas aquele barulho me deixava assim um pouco assustado. Mas por outro lado eu tinha e... o que mais me maltratava até não é isso, a cidade eu fui me adaptando, pouco tempo depois eu já estava adaptado, mas a saudade da minha casa. Aí eu ficava lá com a mão assim pensando aquela tarde, naquele não sei que, aqueles acontecimentos todos que tinham passado na minha vida. Isso durou mais ou menos aí uns três meses, seis meses por aí, é como a perda de alguém, quer dizer, você tem que curtir aquela perda, então eu curti aquela perda e depois eu toquei minha vida, né?
P - E qual foi o primeiro trabalho do senhor aqui em São Paulo?
R - Primeiro trabalho foi numa, com um libanês, com um senhor libanês, era o velho, o seu Salim, Salim Mussa, e o filho dele, Benedito Mussa, ele era solteiro e eu trabalhava com o filho, o velho já estava assim mais fora do negócio, então eu trabalhava com ele, ele era uma pessoa excelente, como pessoa, pra pagar muito ruim, pagava muito mal e pagava sempre com atraso, (riso) isso me atrapalhava, sabe. Aí, nesse momento eu já estava morando em Pinheiros, na Teodoro Sampaio, já estava num apartamento que uma senhora do Rio de Janeiro alugou e eu aluguei uma parte lá com um outro colega, era assim que a gente vivia, mas já tinha mais conforto, era outro ambiente e também não ganhava mais, ganhava mais ou menos por aí, isso que eu mencionei anteriormente e vivia, mas a minha dificuldade com ele, que ali eu sabia que também eu não tinha futuro, mas o tempo passou e eu fiquei acho que um ano, um ano e pouco. Depois... ele foi até uma pessoa muito boa pra mim no seguinte sentido, eu tive aí um problema de uma apendicite aguda e ele me levou pro hospital, me internou, pagou a cirurgia, e depois eu repus pra ele, naquele tempo 6.000 re... réis, acho que era isso, eu tinha uma economia de quarenta e poucos, e eu paguei 6.000. Mas o cara não me conhecia, não sabia de nada, fazia pouco tempo que eu estava com ele, infelizmente até a poucos dias eu liguei pra lá pra ver se eu conversava com ele porque eu não me encontrei mais com ele, mas me deu saudade dele, sabe que ele me tocou, aí tive a informação que ele tinha falecido de repente.
P - E essa loja de tecidos ficava na... Teodoro?
R - Na Teodoro Sampaio, 2.748, ou 2.548, uma coisa assim, quase, próximo do Largo de Pinheiros. Aí eu fiquei lá um tempo, depois eu saí e fui trabalhar nas Casas Carvalho, também uma casa de tecidos aí já era uma casa, uma firma mais dinâmica, uma loja nova que estava abrindo, eu ajudei na montagem da loja, preparamos os tecidos, porque os tecidos vêm em peças... vinham em peças, e a gente transformava, enrolava naqueles cartões, naqueles quadros, né, pra ficar tudo direitinho. E ali eu trabalhei acho que três meses, faltava acho que um dia pra inaugurar, dois ou três. Aí surgiu em São Paulo, aí naquele tempo os negócios lá em Minas ficou com o meu pai e meus irmãos e eu vim pra cá, e chegando aqui, conforme eu estou dizendo, eu fui trabalhando e quando eu estou na loja próxima pra inaugurar, eu ia ser um vendedor da loja e eu entendia bastante de tecidos naquela época, aí veio... apareceu o meu tio com um cunhado dele, que tinha comprado uma casa, um empório aí no Cambucí que se chamava empório, Casa Rio Preto, na Rua Lavapés, 1.128. E aí falou comigo, eu falei: "Ah, tudo bem", já conhecia ele, fui trabalhar com ele. E aí eu fiquei, quer dizer, eu trabalhava como um tipo de gerente, era a função que eu tinha, praticamente eu resolvia tudo, porque ele não conhecia nada de São Paulo, não conhecia nada de nada, e ele tinha uma dificuldade muito grande, porque ele já não era tão criança pra vir pra cá, e tinha muitos filhos e não tocava a coisa assim com facilidade, eu já estava mais treinado, né? Então assumimos aquilo, eu fiquei com ele até 1956, 56... 1956.
P - Essa mudança, por exemplo, sair do ramo de tecidos e ir pra um empório, como que é, assim, é tranqüilo?
R - Não, não é nada, porque já no, lá em Minas nós já tínhamos também a parte de mercearia, e a parte de alimentos, então eu conhecia açúcar, café, arroz, feijão, óleo, isso tudo a gente já conhecia, então não era muito difícil, apenas o mercado diferente, né, muito dinâmico, e num bairro que nós tínhamos essa mercearia, é... de classe média de São Paulo, que é o Cambucí, onde uma clientela muito conservadora. Então nós lutamos muito, aliás eu trabalhei muito ali, eu me acabei ali, quer dizer era muito trabalhoso porque nós tínhamos que fazer entrega a domicílio, atender telefone, trazer vasilhame, comprar, vender, quer dizer, se a gente fazia uma campanha, uma campanha, um pequeno anúncio, que a loja não era tão pequena, mas pra época era um tamanho bom, naquele tempo existia o que em São Paulo?, três empórios grandes, Empório Rossi, eu já estou entrando no assunto do supermercado.
P - Pode ir, tudo bem.
R - Então, o Empório Rossi, na Penha, onde ele trabalhava, era uma companhia muito, uma casa muito grande, muito forte, com um número muito, tinha 40, 50 vendedores, com telefone, entregava em toda São Paulo e vendia num preço muito bom. Depois, o segundo era Ao Barateiro, de Vila Mariana, era também um empório famoso, na Rua Domingos de Moraes, que trabalhava no mesmo sistema, e o terceiro era o nosso, mas nós estávamos numa localização um pouco pior, além do que nós não tínhamos o mesmo fôlego que eles, tudo isso já acabou, quer dizer, já desapareceram, fecharam nem sei dizer mais porque. E... o que acontecia? Nós tínhamos que trabalhar dentro da nossa, do nosso campo, sobrava uma pequena fatia do mercado porque eles entregavam com grande facilidade em qualquer parte, mas nós tínhamos que sobreviver mais dos clientes do Cambucí. Então a gente fazia um, uma oferta, um folheto, e vendia bem aquela oferta, aumentava um pouquinho, voltava alguma coisa, ou trocava, a venda caía, isso nós ficamos naquela gangorra muito tempo, e a gente não tinha, não sabia como sair daquilo até que chegou num ponto que a gente teve que pensar em vender, porque se trabalhava muito, o prédio era próprio, mas não, não tinha um resultado, era um péssimo negócio pra aquele momento, devido a localização, e tinha outro fator, é... aquele é um bairro intermediário muito próximo do Centro e qual era a vida em São Paulo, no passado? Agora eu vou falar do, do mercado de São Paulo um pouquinho, voltar um pouco lá atrás, o que que existia? Atacado, comércio na parte de atacado, atacadista, que trabalhava com cereais, com bebidas, conservas etc. Onde era o abastecimento dos comerciantes ou dos pequenos merceeiros? Era através do atacado, então eles comandavam, o atacado era muito forte e o varejo muito fraco, muito pulverizado, certo, essa era a posição daquela época. Depois é... passando para... deixa eu ver aqui, nós estamos no, falei do atacado me perdi um pouquinho... Ah, então qual era o ponto pra, pra se conseguir alguma coisa? Era comprar diretamente, nós podíamos comprar diretamente alguma coisa, mas não tudo, a gente podia comprar um pouco, mas nós não tínhamos fôlego pra comprar de uma companhia que exigia quantidade, então a gente ficava numa posição inferior. Diante desse quadro nós resolvemos vender, meu tio resolveu vender a mercearia e aí eu me retirei do ramo, do Cambucí. Mas ainda voltando no assunto de mercado, o que, qual era a dificuldade daquele tempo? Primeiro: preço, que nós enfrentávamos, preço, segundo, próximo da cidade, do Centro, toda vida de São Paulo era no Centro. Então existia Feira das Nações, Depósito Circular, e mais uma outra casa, Feira das Nações, Depósito Circular, Feira das Nações, Depósito Circular e tinha mais uma outra organização que agora eu não me lembro, agora eu não sei se é Agênzio... Então se você precisasse de um produto de melhor qualidade ou de uma maior variedade, você recorria àquelas casas, e era muito simples ir do Centro para o bairro, pro Ipiranga, pro Cambucí tal, era dois minutos de bonde, ia de bonde naquela época, né? Então essa posição intermediária era muito difícil de enfrentar pra, pra ter os clientes que dessem um volume satisfatório; então nós resolvemos parar por aí e cada um tomou seu rumo, meu tio voltou, foi cuidar de uma outra loja de calçados numa outra cidade, e aí eu volto, fiquei sem trabalho.
P - Bom, falando um pouquinho ainda do empório, quais eram os produtos mais vendidos no Empório Rio Preto?
R - Bom, os produtos mais vendidos pelo bairro eram os produtos mesmo de grande consumo, era o arroz, era o feijão, era sabão, era óleo, era os farináceos, produtos básicos exclusivamente e esse era o grande problema, porque existia recursos, naquele tempo não tinha nem idéia, talvez até espaço a gente conseguisse, mas o mix era muito pobre, então esse mix pobre não dava pra sustentar, essa era a grande dificuldade.
P - E os fornecedores, quem eram os fornecedores do empório?
R - Bom, os fornecedores do empório, por exemplo, Companhia União de Refinadores já existia naquele tempo, a... Indústria Química Duas Âncoras, que era da cera Parquetina, hoje é Atlantis, mas a Atlantis não nos fornecia naquele tempo porque a Atlantis tinha uma exigência de quantidade que era impossível a gente trabalhar, mas já existia a Fleischmam Royal que nós comprávamos bem, por sinal comprei gelatina pra 50 anos, acho que tem até hoje, eu fui comprando sabe quando você... vai dando desconto, se comprar cinco eu te dou mais cinco e eu fui aumentando, como eu não tinha experiência, nós compramos gelatina pra uns cinco anos lá, e tinha outras firmas, né que, Martini já existia. Agora, não tinha aquela variedade que existe hoje, tinha o essencial, né, pra se trabalhar, aí eu tenho o assunto das marcas próprias mas de... embalagem, mas um pouco mais a frente eu vou comentar.
P - O senhor comentou comigo também, a questão da entrega de leite, por exemplo...
R - Ah, você me lembrou bem, era esse o ponto que eu queria falar. O que é que tinha... bem lembrado Como era dividido o merca... o bairro, no bairro o que é que tinha? Tinha uma mercearia, a farmácia, o açougue, a quitanda, que é a casa de frutas, e a feira; então a dona de casa tinha cinco pontos de abastecimento ao redor da casa dela. Carro, poucos possuíam, até existia mas não eram muitos, então a pessoa se abastecia por ali, daquela forma. Então você veja que não tinha muitas opções, era tudo muito limitado, quando precisava de um, de um vinho português, vou no Depósito Circular, lá na Praça da Sé, ou vou no Agênzio, ou vou no outro que eu falei, Feira das Nações.
P - Aonde era a Feira das Nações?
R - Era ali pela Praça João Mendes, ali que estava, entre Praça João Mendes, José Bonifácio, ali tinha várias lojas de mercearias finas, né, que eles chamavam, da época.
P - E no caso do abastecimento do leite?
R - Ah, o abastecimento do leite, eu esqueci de falar da padaria, a padaria naquela época o que é que vendia? Pão, leite, café, não existia nada disso que tem hoje na padaria, ela trabalhava exclusivamente... podia ser que uma ou outra tivesse uma venda de lanches ou alguma coisa parecida mas muito pouco, o forte era isso, é o abastecimento do pão, não eram as padarias de hoje, as padarias de hoje são pequenos supermercados, quer dizer, são pequenos mercadinhos, né, então é bem diferente.
P - Bom, do empório, o senhor ficou trabalhando lá vários anos, né, e depois?
R - É, eu fiquei de 53 a 56, três anos, foi o suficiente pra mim sentir que não, que ali não ia bem.
P - Certo. E depois o que é que o senhor foi...?
R - Bom, aí eu, o meu irmão tinha uma barbearia ali na Rua da Consolação em frente ao Sirva-se da Consolação e ele tinha como cliente o seu José Steves, que era diretor da Cia. Torquato de Tela, era fabricante de balcões frigoríficos para supermercado, pra qualquer tipo de negócio. E conversando com ele, ele assessorava, ele tinha um grande conhecimento com o pessoal do Sirva-se e falando, mesmo conversando com ele: "Ah, meu irmão saiu, está aí precisando trabalhar, ele é do ramo de mercearia e tal, será que o senhor não o encaminhava?" "Ô, pois não", ele era argentino. E ele marcou um dia comigo, eu peguei, entrei no carro dele, ele tinha um Hudson naquela época, aqueles carros antigos, fui com ele até a Gabriel Monteiro da Silva, ele me apresentou, eu estava com um terno marrom, sentei, preenchi uma ficha e comecei a trabalhar naquele dia, em mil novecentos... aí já era em 1957, eu sei que eu comecei no começo do ano, eu não me lembro bem a data, aí comecei a minha carreira em supermercados.
P - E qual era a função do senhor?
R - Bom, eu fui ser auxiliar de compras, eu fazia todo trabalho de informação pro comprador, levantamento de estoques, preços, eu calculava tudo, quer dizer, não tinha mais ninguém pra fazer, então tinha que fazer tudo, tinha a maquininha lá, aquela de rodar que ia pra frente e pra trás, aquilo era ótimo, e eu trabalhei ali uns tempos com isso. E esse... e tinha esse comprador, ele é... inclusive naquela época quem administrava o Sirva-se era o doutor Osvaldo Ribeiro Franco que era médico, e casado com uma moça, uma senhora de origem hispânica, né, então tudo que era, aquele pessoal que vinha da Espanha, aquele pessoal que queria trabalhar, eles vinham pro Sirva-se, então era a colônia espanhola, e eu só fiquei lá porque eu tinha o sobrenome Peres, senão eu não teria entrado. Então era curioso, que era a colônia espanhola lá.
P - Eu queria que o senhor falasse como que era o Sirva-se em termos de clientela, de mercadoria, de exposição de mercadoria...?
R - Certo, certo, então eu vou te dizer como funcionava o supermercado. Assumida a parte de compras, a assistência de compras, eu fui criando experiência, né, com o sistema, porque era um sistema completamente diferente de uma mercearia, era muito mais rápido, tudo tinha que ser pensado com muita antecedência, tudo se pensava ontem pra acontecer amanhã, entende não podia deixar pra amanhã pra resolver, porque era muito dinâmico, apesar de ser um negócio novo, era muito dinâmico. E uma grande dificuldade que nós enfrentávamos naquele momento é, era justamente as embalagens de auto-serviço, você conseguia, o que você vendia embalado? Você vendia tudo em... toda a parte de, que hoje se vende em balcão frigorífico, nós vendíamos em lata, era sardinha em lata, era pêssego, palmito, carnes enlatadas, se vendia muito, era o camarão em lata, camarão seco, salgado, não existia camarão congelado naquela época; então nós comprávamos a safra da empresa e a gente comprava na época da safra e armazenava pra vender o ano todo, exceto carnes, que tinha o frigorífico Wilson, Frigorífico Swift, é, Bordon não existia naquela época, é, Armour, né, eram os três mais fortes, então não se trabalhava com produtos no balcão, era linha de conservas que substituía, a feijoada em lata e por aí afora... Agora, a nossa grande dificuldade era fazer com que o fornecedor entendesse que nós precisávamos trabalhar com auto-serviço porque todo mundo achava que supermercado, o que era? Apenas uma substituição de mercearia? Em parte sim, mas qual era a filosofia de supermercado? Vender muito com pouco lucro, mas as pessoas achavam que nós tínhamos, que o custo do supermercado era baixo porque não tinha balconista, mas nos bastidores tinha um trabalho enorme, principalmente naquela época, hoje já vem tudo pronto. Nós, naquela época nós tínhamos que embalar mercadoria de vários tipos. Vamos começar pela mercearia, nós tivemos que induzir os fabricantes a produzir embalagem, o que é que existia de embalagem? Papel, celofane e cartão, então vamos induzir o fornecedor de arroz a empacotar o arroz, conseguimos, em embalagem de papel, em sacos de papel, isso durou muito tempo, era o arroz Brejeiro que está voltando no mercado depois de 50 anos, depois teve o arroz Delta e o arroz Vitória, então nós fomos aos poucos mostrando pra eles que nós tínhamos que trabalhar com auto-serviço. Aí, fazendo o arroz automaticamente veio também o feijão ainda no papel, é... os farináceos já não tinha muito problema porque já existia o, o... como chama, celofane, então fazia-se embalagem de celofane e os saquinhos né, era, naquela época existia a Matarazzo, a Votorantim já tinha esses produtos, então se produzia embalado no celofane, pequenos pacotinhos e tal, isso tudo já estava desenvolvendo. Então esse era o básico, o forte da coisa era isso, depois nós tínhamos que ver o fabricante de biscoitos que também queria só vender a granel, só na lata de dois quilos, ou de quatro quilos, então tínhamos que pesar, nós tínhamos a bomboniére, aquele trabalho imenso de pegar tipo por tipo, 200 gramas de um, 50, 20, sei lá quanto era, e colocar aquilo num pacote ou num saquinho e pesar. Aí nós fomos induzindo, o biscoito não era tão difícil, porque 200 gramas de biscoito não, o custo da embalagem era razoável, mas existia outros produtos como chocolates, né, e até nós, nós que lançamos a embalagem, o Sirva-se lançou a embalagem de chocolate de quatro unidades na Gabriel Monteiro da Silva, com o chocolate Diamante Negro da Lacta, o que é que existia de chocolate naquele tempo? (Sonksen?) e Lacta, não existia Nestlé. Então nós conversamos, nós fizemos a experiência, tínhamos uma bomboniére que vendia, vamos dizer, 600 tabletes por mês, ou qualquer coisa parecida, e eu trabalhava, nessa época já tinha assumido na direção do Pão de Açúcar o senhor Ermínio Ferreira Neto, que era um homem já de uma certa idade mas que ficou nos Estados Unidos, logo, quando a família Simonsen assumiu o Sirva-se, ele foi pros Estados Unidos, ficou lá uns dois anos ou um ano e meio e, pra ver o que que era os supermercados. Naquele tempo existia já o senhor Fernando Pacheco e tinha um outro que era do Peg-Pag, que daqui a pouco eu vou lembrar o nome, que já está, que tinham montado o Sirva-se da Consolação, Raul Borges, o senhor Raul Borges e o senhor Fernando Pacheco tinham montado o Sirva-se e a diretoria do Pão de Açúcar, do, do... do Sirva-se assumiu o Sirva-se e tinha esse, primeiramente esse doutor Osvaldo Ribeiro Franco que não era do ramo e trouxe depois o senhor Ermínio Ferreira Neto, que hoje deve estar com 84, 85 anos mais ou menos, era um professor de supermercado nesse país. Então, quem entendia de supermercado nesse país era Fernando Borges, Fernando Pacheco, Raul Borges e Ermínio Ferreira Neto. Então naquele tempo o que é que se vendia mesmo no supermercado, quando ele assumiu? Um pouquinho de cada mercadoria, primeiro fomos desenvolver a parte de auto-serviço - aí eu volto no chocolate, depois eu continuo. Fizemos a experiência de fazer no fim de semana uma embalagem, um cartão com quatro tabletes envolto em celofane, tinha um ferro que soldava atrás, nós vendemos, o que vendia num mês, nós vendemos num fim de semana e aí nós fomos mostrar pra Lacta e daí a pouco eles começaram a desenvolver a embalagem de auto-serviço, e assim nós fomos fazendo um trabalho. Por outro lado, eu segui uma orientação do seu Ermínio, isso não era na minha função, o gerente de lojas seguia a orientação dele no auto-serviço, como é que tem que vender carne? Eu vou por seções, mercearia, primeiro nós temos que complementar a mercearia com tudo aquilo que for possível para que o freguês chegue e leve o produto pré-embalado, depois para seção dois, pra seção de carnes, nós chamávamos naquela época seção dois, era embalar a melhor carne possível, selecionada, limpa e conservada no balcão refrigerado, já existia uma boa refrigeração naquele tempo, era só cuidar, e acompanhava, muitos funcionários foram embora porque não seguiam a orientação de ter a qualidade ou de não ter o produto em auto-serviço. Então nós tínhamos um Bife Paris que você podia comprar o Bife Paris, levar pra casa que era uma coisa excepcional, e (tornedoze ?) e outros tipos de carne que eram preparadas, nós tínhamos uma grande variedade de carnes. Depois então, seção três, frutas e verduras, isso não dava pra fazer muito em auto-serviço, mas laranja já podia começar a empacotar mas não existia, o plástico ainda estava um pouco difícil naquele tempo, tinha que importar matéria-prima e era difícil, então a gente tentava fazer daquelas bancas e aos poucos nós íamos treinando os funcionários pra embalar, tanto a seção três de frutas e verduras, principalmente as verduras, limpar a verdura, arrumar a verdura, proteger, ou com celofane, por exemplo, você pegava uma alface, não pegava na alface, você tinha um negócio, um envólucro que colocava a alface, envolvia e punha um durex ou colava, então se entregava, ela pegava a alface não com a mão, e era uma alface lavada, limpa tudo. Então era serviço e era qualidade, era diferente, quer dizer, nós não vendíamos muito barato no Sirva-se, mas nós vendíamos qualidade porque era uma clientela, quem ia no supermercado naquele tempo? Quem tinha carro, alguns também, lógico, tinha muita gente que ia no supermercado, com o tempo foi acontecendo isso, mas a grande, a maior clientela era gente de poder aquisitivo porque encontrava variedade, coisas que ela tinha que se locomover pra cidade pra comprar. Então os supermercados começaram a apresentar esse tipo de coisa, então aí nós fomos desenvolvendo a seção três, depois fomos para a seção quatro. O que tinha na seção quatro? Frios e laticínios, na parte de frios existia o frigorífico Santo Amaro, ou Frigoreder, naquele tempo era Frigorífico Santo Amaro, Sadia, praticamente existia mas estava muito distante do mercado, ela estava mais no atacado do que no varejo, ela vendia a produção dela por atacado e tudo bem, talvez vendesse em açougues e outros lugares, mas o Frigoreder, era um frigorífico, ainda não era dos maiores, mas pra época estava bom, tinha muita qualidade mas não fazia nada, eu não tinha condições de, o que ele vendia, o que ele produzia ele vendia, né? Então nós fomos mostrando a eles que deveríamos, o caminho a seguir, mas eles não mudaram, porque alemão tem a cabeça dura, ele acha que o produto dele é bom, tem que ser vendido a granel e não vai mudar, e não mudava mesmo. Mas o frigorífico Wilson, a Swift, e outros, percebendo que o mercado estava crescendo foi desenvolvendo a embalagem, a primeira embalagem que surgiu foi a (craiovac?), desenvolveu a embalagem (craiovac?), já era meio caminho pra nós, porque já tinha facilidade na conservação, era mais protegida, já não tinha aquele trabalho todo de estar pondo na caixinha, de estar envolvendo pra vender pro cliente, mas nós continuávamos vendendo o Santo Amaro a serviço, pouca coisa, e o restante em auto-serviço. Então, o nosso esforço era em auto-serviço, então frios existia poucas firmas e a gente vendia o que podia, mas era mais fácil de seguir esse caminho porque já se podia vender 400 gramas de salsicha ou 200 gramas de salsicha, ou outro tipo de mercadoria. Ficava mais difícil quando chegava no patê, que era uma coisa pequena, teria que ser embrulhada, envolta num celofane, aí a gente ajustava, e depois ia pra é, frios, queijos, né, queijos em geral, frios, laticínios, é, os laticínios... vou falar de laticínios. Nos laticínios, o que existia naquele tempo? Aí vem o caso do caminhão, era leite em vidro, o creme de leite era em vidro, o iogurte era em vidro, então tinha que vender e receber o vasilhame, tudo isso nós tínhamos que enfrentar mas, enquanto a padaria, a padaria vendia dez litros de leite nós vendíamos 100, 200, 500, porque o supermercado tem uma força de vendas que ninguém acredita porque há venda por impulso, você vai no supermercado, e você vê muitas coisas que não estava na sua memória, acaba, você acaba vendo e levando e isso a gente explorava mesmo, esse era o forte. Não fazíamos o que deveríamos fazer, ao invés de vender 20 com um lucro de 50 centavos, nós vendíamos só 10, com lucro de um, de dez, de 50 centavos nós vendíamos com lucro de um real. Isso é um erro, o supermercado está errado em trabalhar nesse sistema, mas como o país aqui é diferente e tinha outros custos e outras, coisas então a gente tinha que seguir, mas o certo é você vender quantidade, o dobro da quantidade que você tem condições de vender, vamos dizer, você vai vender dez, você vende 20 com a metade do lucro é mais importante do que você vender só dez e se acomodar, porque amanhã alguém vende um pouquinho menos, com uma pequena diferença e você acaba perdendo cliente. E o supermercado, a grande força do supermercado deveria ser isso, vender muito com pouca margem, agora, e vender qualidade, isso que nós fazíamos, quer dizer, dar segurança ao cliente de que ele estava comprando qualidade. Qualquer mercadoria que ele estivesse levando em auto-serviço tinha qualidade, isso era uma exigência que nós tínhamos desde o início, mesmo na compra de produtos, nós podíamos comprar a segunda marca, mas sabíamos o que nós estávamos comprando, que era produto de boa qualidade, não era líder de mercado, mas tinha qualidade, é o caso, vamos dizer, de você falar de Cica e Etti ou Olé, sei lá, hoje, quer dizer, ou Arisco, é um produto que nós sabíamos a qualidade que possuía, quer dizer, era bastante razoável, também tinha um preço inferior então nós tínhamos que dar opção, né, de variedade e de preços.
P - Eu queria que o senhor falasse desse desenvolvimento aí do supermercado pro hipermercado, quando que...
R - Certo, deixa eu ver se ainda tem alguma coisa em supermercado, atravessando toda essa fase, quer dizer a nossa grande, o nosso grande trabalho era embalar, a segunda era comprar quantidade, desenvolver uma política de compra assim, conseguir melhor volume, mesmo não atingindo o máximo, com o melhor preço. E acho que isso, se, se não existisse hoje supermercado apesar de que os supermercados hoje alguns aplicarem uma margem exagerada, mas o preço seria muito mais alto porque os supermercados veio tirar a intermediação, só que muitos, não sei se ainda está acontecendo, acabaram transferindo para o seu bolso uma pequena diferença que não deveria, certo. Quem deveria ser o beneficiado disso seria o consumidor, o consumidor final, você tem que transferir pro consumidor as vantagens e tirar, e ficar dentro da sua margem que é o razoável. Então eu falei de seção um, seção dois, seção três, seção quatro, falta ainda uma importante, seção cinco, que é o bazar, aí eu vou te contar a história do meu professor Ermínio Ferreira Neto. Então ele chegava pra mim, ele muito calmo: "Peres..." acionava lá, apertava lá o, telebit lá o aparelhinho, naquele tempo a comunicação era bem... e dizia: "Agora nós precisamos desenvolver uma linha de louças assim, assim; agora eu preciso desenvolver uma linha..." - a cada momento ele dizia uma coisa - "uma linha de plástico tal e isto e aquilo, agora uma linha de produtos de limpeza..." Mas não dizia, não dava dica nenhuma, nem sabia, quer dizer, era um... nesse momento, aí eu esqueci de mencionar, esse comprador que estava na firma, ele saiu, ele não se, ele como espanhol não, não se ajustou bem com o seu Ermínio e eu fiquei como substituto, eu fiquei como substituto lá temporariamente, ele ia trazer um cara do Rio de Janeiro, e tal, aí, tem um amigo meu que ainda está aí no ramo de supermercados, chama-se Ernesto Fransquine, que era gerente da loja que era o homem que executava as ordens do seu Ermínio disse: "Ah, por que você não deixa o Peres lá, parece que está tocando bem." E eu fiquei, fui ficando, ficando e fui desenvolvendo de acordo com o que ele queria, de acordo com o que deveria ser, não como ele queria, mas como deveria ser, e o negócio cresceu e foi muito bem. Então aí os supermercados começaram a ter uma participação maior de não-alimentícios, então você já comprava uma panela no supermercado, uma frigideira, o pano de chão, o pano de louça, a vassoura, onde você ia comprar uma vassoura naquele tempo? Era numa mercearia lá, não sei aonde, às vezes nem achava a vassoura, a flanela que é uma coisa que se vendia muito e se vende até hoje, e aí veio o palito e não sei que mais, e copos de plástico e a medida que foi desenvolvendo, a indústria foi desenvolvendo produtos, onde poderia vender, principalmente ligado, a consumo doméstico? Era supermercado e aí eu quero voltar um pouquinho, por que é que existe, por que teve grande sucesso os pães de centeio? Onde o salgadinho iria encontrar guarida pra vender seus produtos se não fosse o supermercado? Quer dizer, uma coisa puxa a outra. Os Kelloggs da vida, você teria que ir lá, sair da mercearia e ir lá na Praça da Sé, na Feira das Nações comprar um pacote de sucrilhos. Os supermercados não, ele abriu esse mercado, ele deu oportunidade pra novos lançamentos, para produtos novos que de maneira nenhuma chegaria tão fácil na mão do... quer dizer, ele abriu as portas pra levar o produto na mão do consumidor. Essa foi a grande força do supermercado, primeiro, ter tudo num só local pra você comprar, isso eu estou falando quando se fala de uma maneira de trabalho honesta, séria, que eu acho que tem que ser, que todo mundo tem que operar; então dentro dessa linha o que era o supermercado? Levar a dona de casa onde ela pudesse comprar tudo que ela precisava, quer dizer, tudo em termos, mas dava uma possibilidade de escolha; segundo, se ela tivesse o desejo de comer um biscoito amanteigado não sei de que produto, não precisava ir muito longe, ela encontrava no supermercado. Tinha supermercados de poder aquisitivo mais alto onde tinha uma linha muito, a nossa linha ia de um a 13, quer dizer, itens, quer dizer... variedades, conjunto de... como é? Blocos, núcleos de variedades; então em determinadas áreas tinha uma linha, noutra tinha outra de acordo com o poder aquisitivo, mas mesmo se abrisse uma loja em Guarulhos, no centro de Guarulhos, eu nunca ia deixar de ter um produto de qualidade porque também em Guarulhos tem gente que tem dinheiro pra comprar até produto importado, não tem muitos, não é muito grande a venda como é no Jardim Paulista ou sei lá, nos Jardins, mas tem sempre um cliente pra consumir. Então o supermercado foi assim, deu muita força pra produtos novos. Eu até te falava anteriormente é, sobre o óleo de milho, e outras coisas que foram surgindo, o consumidor nem, não, achava que era um absurdo consumir óleo de milho e o supermercado colocou na prateleira e foi vender o óleo de milho; eu tenho a impressão de que se ele fosse pra prateleira de uma mercearia ele ia ficar escondido lá, porque você tinha que olhar lá em cima pra ver se tinha, você não ia descobrir. Agora, você passa no supermercado você vê lá: óleo de milho. "Puxa, óleo de milho, nunca ouvi falar." Mas aí você já tem, sabe, está na mão, aí você começa a ver qual é o teor de gordura, qual é a caloria, sei lá, quantos glicídios e outras, outros componentes do óleo, e você verifica então que vale a pena experimentar. Como é hoje o óleo de girassol que está na frente do óleo de milho, quer dizer, estão tentando mas não conseguiram mercado ainda, pelo preço, não pela qualidade, pelo preço. É isso. O que você gostaria... Ah, falar do desenvolvimento de outras lojas, né?
P - Isso.
R - Bom, aí nós prosseguimos nos supermercados, isso eu estou falando, eu estava no Sirva-se, depois o Sirva-se foi vendido pro Pão de Açúcar, ao Pão de Açúcar em 1965, aí eu me transferi para o Pão de Açúcar. Naquele tempo a minha organização era do Canal 9, do Banco Noroeste, da Companhia Paulista de Café que era da família Simonsen, Bord Wainer, era um grupo muito forte que por sinal o nosso amigo Herbert Levy fez na época uma denúncia contra o Mário Simonsen sobre o envio de, uma exportação de café, porque ele tinha filiais em todo o mundo, e ele era, tinha uma grande exportação de café e houve essa denúncia política, né, e acabou com a empresa, embarcou esse café, estava em Santos ele falou: "Vou embarcar." Era 300 mil sacas, três milhões de sacas, não me lembro bem o número, ele embarcou e aí foi o final da carreira dele, e, houve um problema da fiscalização, uma pressão muito grande, seqüestraram os bens e a família Simonsen saiu desse patamar que estava, hoje ainda existe o Banco Noroeste, mas o velho até, o Mário Simonsen que era o líder e os filhos que era, estava na crista da onda, com muito dinheiro, né, acabaram não sei onde hoje. Aí o Pão de Açúcar compra as duas lojas e incorpora às suas cinco lojas que eles possuíam naquele momento, e aí foi o grande impulso que ele teve porque comprou duas lojas, naquela época ele chamava de dois bancos, não porque eu vim de lá, qualquer um sabia, naquela época, que eram lojas grandes, muito lucrativas, devido à localização e por ser as primeiras e mais bem organizadas. Depois o Pão de Açúcar assumiu. Naquele tempo tinha a projeção da loja sete, no Pacaembu, também ele ficou com a loja sete e aí então tocou, teve um desenvolvimento fabuloso, foi abrindo loja, nós abrimos lojas assim do dia pra noite e em 30 dias se abria uma loja nova, se comprava lojas, fazia o inventário naquela mesma noite, no outro dia já abria com outro letreiro. Aí foi um negócio muito bom, realmente se trabalhou muito, eu trabalhava domingo, o fim de semana, fazia o inventário em Ribeirão Preto, em São José dos Campos, comprava duas lojas de um, uma de outro, e no outro dia a gente já estava com a loja aberta, né, e funcionando e aí foi, a firma foi crescendo. Como o Pão de Açúcar sempre gostou de inovar, o que é que nós fizemos de mudança? Foi os supermercados, aí veio os hipermercados. Os hipermercados, na Argentina, no começo teve grande sucesso, tinha o Canguro, na Argentina, e um outro que eu não me recordo agora. Eram lojas de 12.000 metros, até exageraram um pouco como exagerou aqui o Paes Mendonça, o hipermercado é pra ser grande mas não pode ser muito grande, não pode ter 30.000 metros que é um absurdo, uma dona de casa precisa de patins; nos Estados Unidos não era bem aceita a idéia do hipermercado, os franceses não tinham vindo para o Brasil mas já havia pesquisas sobre o hipermercado principalmente na Argentina, ele estava sendo sucesso naquele momento, mas acho que todos fecharam, me parece que só está lá o Carrefour hoje com, porque é muito, tem um método muito avançado. E aí começou-se a pensar no hipermercado, aí nos abrimos então o primeiro em São... Santo André, era uma grande loja, foi uma coisa fora do comum, era uma loja com, além da mercearia incorporava também o não-alimentício com uma participação de 40%, se no supermercado o bazar representava 7%, ele, nós fomos para 40% de não-alimentício, quer dizer, geladeiras, televisores, barco, era aquele, aquele...
P - Acessórios pra carro...
R - Tudo, era tudo, mas também o Brasil estava de vento em popa; né, quer dizer, eu não me lembro que ano era esse, 74, não 64, estava saindo da, politicamente o país parece que ia bem, acho que havia aquele milagre, tudo que se produzia vendia e tudo que se abria era sucesso. Aí se abriu o primeiro Jumbo, em Santo André, inclusive tinha loja de carro, autopeças, aquele negócio todo, foi um sucesso fantástico, foi na época do Delfim, me lembro o Delfim que fez a inauguração daquela loja, então, e qual era o pensamento do Delfim naquele tempo? Diminuir e fazer fusão de empresas, ele achava, na cabeça dele, não sei se está certo, hoje mudou acho que até nos Estados Unidos isso, era ter grandes empresas, fusão de grandes empresas, grandes grupos e eliminar o pequeno. Quer dizer, eliminar não, quer dizer, firmas pequenas ficar como está na França, está na Europa, o dono, o marido, a mulher o filho, tal opera aquela loja...
P - Familiar.
R - ... familiar. Paris tem até hoje lá mercearia desse tamanho aqui que tem 500 anos e está lá, ninguém ficou rico, ninguém ficou pobre, só que lá está tudo delimitado, quer dizer, você pode abrir uma aqui e outra lá e não tem mais, aqui se abre uma perto da outra não tem esse, nem supermercados tem medidas ou abre próximo ou não, cada um faz o que bem entende, esse é um grande erro. Mas ele estimulava muito o grande comércio e naquele tempo também o governo era um pai, né, um pai rico que dava dinheiro, que emprestava, se tinha problema, você abria a empresa, se tinha problema você recorria ao governo, ele te dava o dinheiro pra não mandar ninguém pra rua e isto perdurou por muitos anos, parece que agora esse tipo de coisa não acontece mais. Estou entrando num campo aqui que não tem nada a ver, que eu me lembro daquela época. Mas voltando ao Jumbo, então abriu-se o Jumbo, foi um grande sucesso, foi uma grande inovação e depois foi expandindo para uma loja dessas, para cada estado, o único erro, é que ele abriu mais de uma em cada estado e adaptou mais de uma loja para hipermercado, quer dizer, não podia ter em Brasília, naquele momento, três lojas, três Jumbos, podia ter um Jumbo e duas lojas convencionais, se o Jumbo era melhor, então tinha que abrir mais um Jumbo na mesma... com a mesma dimensão, mais ou menos na mesma dimensão, mas com o mesmo sistema porque cada mercado, e mercado é diferente um do outro, Brasília, aquilo é muito amplo, mas se você verificar hoje o que tem em Brasília, exceto o Carrefour e hoje tem um Jumbo Extra lá, do Pão de Açúcar, que é muito amplo, todos aqueles prédios construídos em Brasília eram todos pequenos, três andares, quatro andares, então você operar um supermercado de quatro andares é uma coisa do outro mundo, você não sabe como levar o cliente lá em cima, quatro, eu não digo, eram três, então era muito difícil, era tudo verticalizado, os prédios, uma construção que a gente não entendia porque era feita daquele modo, fizeram um shopping center também verticalizado, difícil de trabalhar, tudo apertado e com tanto espaço. Então houve alguns erros que naturalmente se refletiram agora no final, porque criou dificuldades, entrou um concorrente mais, com uma loja ampla, com um grande estacionamento, com tudo dentro das, dentro das medidas, dentro daquilo que deve ser e aquele que foi adaptado você sabe que não tem, perde mesmo o seu, a sua eficiência, né, e a empresa vai crescendo muito, crescendo muito, acaba perdendo um pouco também da eficiência.
P - Bom, em termos dessa qualidade que o senhor falou, por exemplo, no Sirva-se, que tinha essa preocupação com a qualidade. O senhor acha que atualmente, por exemplo, os hipermercados têm esse tipo de preocupação e, em relação à clientela, o que mudou do Sirva-se do início pra o hipermercado de hoje, por exemplo?
R - Não, eu acho que... primeiro eu vou te responder o seguinte, eu outro dia fui no Carrefour e esperei abrir a loja, o Carrefour é uma loja muito limpa como, falar Carrefour, têm muitos supermercados que são bons, mas vou dar exemplo do Carrefour porque a disciplina do Carrefour é muito parecida com a do Sirva-se. Abriu a loja, 9 horas, todo mundo a postos de roupa limpa, todo pessoal de avental branco, deu o sinal, todo mundo ocupou seus lugares. Eu fiquei arrepiado porque há muitos anos na minha vida eu não tinha visto isso, no Sirva-se nós tínhamos isso, mas eram duas lojas comandadas, de cima do escritório você comandava a loja lá em baixo, era fácil, tinha aquela lateral que a gente ficava lá e dava pra, pra ver tudo que se passava lá em baixo, não podia faltar carrinho, não podia isso, aquilo, e a gente acompanhava, não eu, mas o administrativo da loja. Mas eu vi o que é organização mas, agora, eles pecam numa coisa, qualidade, hoje a carne está muito boa, e alguns outros produtos, mas eles trabalham com fornecedores que eu jamais trabalharia na minha vida, jamais eu colocaria o meu logotipo naquele produto principalmente marca própria, não estou falando mal de Carrefour, acho que alguns hipermercados vendem produtos de um frigorífico que não tem responsabilidade. Uma coisa é eu trabalhar com Sadia, outra coisa é trabalhar com Prieto da Silva, quer dizer, não dá pra, não dá pra fazer isso, principalmente um produto perecível, certo. Mas é uma loja muito bem administrada, muito dinâmica, eles mudam a coisa assim rapidamente, é preto, é preto, é branco, é branco, não tem meio termo, não tem depois, tenho certeza que isso era melhor há uns tempos atrás, já está ficando difícil, porque houve muita troca de pessoal, houve muita, saiu muita gente do Carrefour que foi para outras organizações e vice-versa, e treinar pessoal pra isso não é fácil, principalmente em seção de perecíveis. Mas eu acho que ainda ele mantém uma qualidade muito boa, é, e o principal, eu acho que todos têm os produtos com a mesma qualidade só que é uma questão de disciplina, de administração, nem todos fazem isso com bastante cuidado, esse é o ponto. Ontem mesmo eu visitei um hipermercado que eu achei que ele tinha melhorado, quando eu fui ver no detalhe aí eu vi que ele não era aquilo que eu pensava, quer dizer, realmente ele estava com uma aparência muito boa mas nos detalhes, principalmente na parte perecível que agora, todo mundo muito preocupado e até a fiscalização, a gente está vendo toda hora fechando lojas enormes, inclusive do Carrefour, já fechou lojas, mas isso aí é um problema do gerente, eu tenho certeza que a administração não admite esse tipo de coisa, como também, nem Pão de Açúcar, nem Eldorado vai querer que aconteça alguma coisa desse tipo, mas o material humano é muito fraco, a pessoa pra trabalhar em supermercado, eu fui várias vezes pros Estados Unidos, eu ia todo ano para o SMI, Supermarket Institute, e a gente aprendia muita coisa na operação de loja, na qualidade. E até uma vez eu me lembro, que uma coisa, uma coisa que não me esqueci até hoje, era de pessoal, a pessoa pra trabalhar em supermercado tem que ser agressiva, tem que ser uma pessoa com muito, com muita disposição, porque supermercado não é brincadeira, agora, se ela tem essa característica, ela vai muito bem, mas têm elementos que não são, sabe, é... como se diz, não tem a, é... como se fala, esqueço agora o termo... dom pra trabalhar em supermercado, não tem a caraterística primária pra trabalhar em supermercado, porque supermercado é tudo muito rápido, precisa muita atenção, não pode dormir, não pode ficar conversando, tem que trabalhar, e se trabalhar vai muito bem.
P - Bom, a gente está com o tempo aí ... vamos tentar concluir. Eu queria que o senhor me respondesse qual é o sonho do senhor?
R - Hoje?
P - Isso.
R - Não é abrir um supermercado. Eu gosto muito de supermercado, mas o meu sonho era voltar novamente ao trabalho de supermercado, quer dizer, trabalhar ou na administração... em qualquer tipo de administração de supermercado, seja em venda, compras, é... operações, o que for, entende, exceto uma coisa, parte financeira porque isso aí não, está fora dos meus planos, entende. Isso eu gostaria de fazer, e se isso não acontecer, eu vou ter que ir tocando a minha vida como está hoje, quer dizer, estou aí com a minha representação, está dando pra mim empurrar meu tempo, mas isso não é bem o que eu quero, eu sei comprar, eu não sei vender.
P - Bom, pra finalizar mesmo agora, eu queria que o senhor falasse o que o senhor achou de ter passado essa hora aqui com a gente, de deixar o registro da história de vida do senhor, quer dizer, um pouco da sua história de vida e do seu trabalho também.
R - Ah, eu achei excelente, eu gostei muito e, e estava aflito pra chegar aqui pra mim falar um pouco, talvez eu até precisava falar, estava um nó na garganta, realmente agora eu consegui, né, falar muitas coisas que talvez tivessem guardadas e que já nem me lembrava mais. Realmente eu tive que fazer um certo esforço, talvez eu até tenha falhado em algumas informações porque muitas coisas que já aconteceram, é difícil a gente, a gente precisaria rememorar um pouco mais, mas foi excelente, gostei muito, estou muito satisfeito.
P - Bom, nós agradecemos a participação do senhor.
R - Eu é que agradeço vocês, e quando precisar de mim, sabe o meu telefone, falando em supermercado, o que eu puder fazer dentro da minha, do meu pequeno conhecimento, a gente está pronto.
P - Tá bom, a gente agradece.
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