Depoimento de Pedro Antônio Duarte
Entrevistado por Valéria Barbosa e Ana Paula Soares
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 29 de outubro de 1994
Transcrita por Carlos Alberto Torres Mattos
P - Senhor Pedro, eu gostaria de começar com o senhor dizendo o seu nome completo, onde o senhor nasceu e em que data o senhor nasceu.
R - O meu nome é Pedro Antônio Duarte. Eu nasci no dia 29 de junho de 1918, em Engenheiro Franca, estado da Bahia.
P - Qual é o nome dos pais do senhor? E onde eles nasceram?
R - Florentino José Duarte e Maria Donata de Jesus, na mesma cidade de Engenheiro Franca.
P - Qual era a atividade do pai do senhor?
R - O meu pai, a atividade dele, naquele tempo trabalhava de mascate. A pessoa comprava corte de tecido e saía vendendo. E ele trabalhava com malas e malas daquilo, vendendo de porta em porta.
P - E a atividade da mãe do senhor?
R - Era lavoura.
P - Vocês tinham lavoura?
R - Era lavoura. Era plantar café, colher café, plantar feijão, arroz. A vida da lavoura, do interior.
P - Eu queria que o senhor contasse pra gente um pouco da infância do senhor. Como foi a infância?
R - Eu não tive. Eu não tive infância, que com sete anos de idade eu já puxava o cabo da enxada e era obrigado a trabalhar. (riso) Então não tive, posso dizer que não tive infância. Nasci no serviço e estou até hoje.
P - Certo. Conta um pouquinho como é que era esse trabalho aí?
R - Era carpir o mato, era plantar, era limpar. Não, cultivar a terra, plantar, limpar, quando amadurecia tinha que colher. E era essa a vida, toda a vida. Também criar, nós criávamos porco, criava galinha, perus, ah, coisas da roça, do interior. Nós trabalhava com tudo isso também.
P - No caso dos irmãos. O senhor tinha irmãos?
R - Tinha, tinha nove irmãos, por parte de mãe tinha nove irmãos. Depois, que o meu... a finada minha mãe, antes, ela casou-se, mas ela não se deu bem com o marido, que era muito mulherengo, jogador,...
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Entrevistado por Valéria Barbosa e Ana Paula Soares
Estúdio da Oficina Cultural Oswald de Andrade
São Paulo, 29 de outubro de 1994
Transcrita por Carlos Alberto Torres Mattos
P - Senhor Pedro, eu gostaria de começar com o senhor dizendo o seu nome completo, onde o senhor nasceu e em que data o senhor nasceu.
R - O meu nome é Pedro Antônio Duarte. Eu nasci no dia 29 de junho de 1918, em Engenheiro Franca, estado da Bahia.
P - Qual é o nome dos pais do senhor? E onde eles nasceram?
R - Florentino José Duarte e Maria Donata de Jesus, na mesma cidade de Engenheiro Franca.
P - Qual era a atividade do pai do senhor?
R - O meu pai, a atividade dele, naquele tempo trabalhava de mascate. A pessoa comprava corte de tecido e saía vendendo. E ele trabalhava com malas e malas daquilo, vendendo de porta em porta.
P - E a atividade da mãe do senhor?
R - Era lavoura.
P - Vocês tinham lavoura?
R - Era lavoura. Era plantar café, colher café, plantar feijão, arroz. A vida da lavoura, do interior.
P - Eu queria que o senhor contasse pra gente um pouco da infância do senhor. Como foi a infância?
R - Eu não tive. Eu não tive infância, que com sete anos de idade eu já puxava o cabo da enxada e era obrigado a trabalhar. (riso) Então não tive, posso dizer que não tive infância. Nasci no serviço e estou até hoje.
P - Certo. Conta um pouquinho como é que era esse trabalho aí?
R - Era carpir o mato, era plantar, era limpar. Não, cultivar a terra, plantar, limpar, quando amadurecia tinha que colher. E era essa a vida, toda a vida. Também criar, nós criávamos porco, criava galinha, perus, ah, coisas da roça, do interior. Nós trabalhava com tudo isso também.
P - No caso dos irmãos. O senhor tinha irmãos?
R - Tinha, tinha nove irmãos, por parte de mãe tinha nove irmãos. Depois, que o meu... a finada minha mãe, antes, ela casou-se, mas ela não se deu bem com o marido, que era muito mulherengo, jogador, isso, aquilo e bêbado, se separaram. E depois dessa separação deles ela começou a namorar com meu pai. O meu pai, falecido, era solteiro e desse, do namoro dos dois veio eu e outro irmão: dois irmãos gêmeos. (risos)
P - E os irmãos, haviam brincadeiras?
R - Quase que não tinha, porque não tinha tempo de brincar naquele tempo não. Aquele tempo era trabalhar. Brincadeira é dia de domingo, é dia de sábado, era pegar um estilingue pra ir caçar passarinho, era aquilo só, não tinha negócio... quase brincadeira, quase que não tinha, a gente não tinha tempo pra aquilo. Era nascido, se tivesse... fui criado da seguinte forma: hoje o nossos filho, eles saem e chega em casa meia noite. Os pais vai falar, acha ruim, e naquele tempo, nós tinha... se nós saísse, uma brincadeira isso e aquilo e desse 7 horas e nós não tivesse em casa, a hora que chegava o coro comia. (risos) É, e não era mole não, era pra bater. O dia de domingo, à vez, o almoço era mais tarde... vocês desculpa, mas isso aí é por causa do meu problema cardíaco. Então, o... na hora do almoço tinha que todos filhos tá ali. Não tinha esse negócio de chegou agora e vai, chegou agora e vai almoçar mais tarde. Se fosse por precisão e ele chegasse mais tarde, ele almoçava. Mas na hora do almoço se ele não estava ali pra todo mundo almoçar junto e ele chegasse depois, ele ia jantar às 7 horas da noite. Não tinha essa moleza que nós tem hoje, carinho... como a gente cria... como eu mesmo criei minhas filhas (riso) e crio meus netos. Tenho cinco netos que faz de mim gato e sapato. (riso) Chego lá: "Ô vô, dá dinheiro aí. Hoje é tudo real, Dá tanto real. Tem um com 13 anos que diz que já tem namorada, já negócio de um real, dois, já não dá, diz que é cinco. É, ô vô... - ele não tem pai, são separados também, eu que criei e estou criando - ô vô, dá cinco real." "Cinco real pra que, Jefferson?" "Ah, eu vou sair. Sair o que? Vou aí com as meninas num bailinho aí. Agora é baile, nós vamos num bailinho." "Vai trabalhar moleque" "Ô, vô." Dá o dinheiro e ele sai, puladinho. Mas noutros tempos, não tinha nada disso não. Noutros tempos era trabalhar e se errasse o couro comia e era forte mesmo.
P - Bom. Durante o trabalho na lavoura, o senhor falou que fazia outras atividades também.
R - Não, isso aí já com a idade de 16 anos. Aí eu comecei a trabalhar. Tocava a lavoura e tinha um fazendeiro lá que ele me alugava seis burros pra carga. Eu alugava seis burros dele e então eu comprava...comprava o café, comprava o feijão, comprava o arroz, comprava a farinha e levava pra cidade pra vender. Também lá na cidade, também essa eu esqueci de falar pra vocês, de lá eu também comprava, naqueles grandes armazéns, eu comprava sabão, sabão, açúcar, jabá - jabá é a carne seca, como nós chamamos. Comprava aquilo tudo pra revender naquelas vendas do interior, no sítio, sabe? Eu levava pra vender e comprava da cidade pra vender pra eles. Também era uma vida dura também. Tinha vez que dava 1 hora, 2 horas da madrugada eu estava no deserto, no meio do mato, burro atolado dentro do barro... (riso) era uma vida cruel, sabe.
P - E o senhor vendia esses produtos onde na cidade?
R - Não, vendia na feira mesmo.
P - Fala um pouquinho da feira. Como é que era essa feira?
R - A feira era grande, então ali, todo mundo vendia, vendia o que tinha ali pra vender. Todo mundo vendia. É tanto que aquela página do jornal que estava ali, que vocês tinham. Tinha uma passagenzinha tão boa disso daí. De uma entrevista do Estadão. Naquele tempo eu vendia carne de sol também, eu vendia de tudo, aí o pessoal chegava com aquelas moedas de prata grande. Mas aquilo tinha saído de circulação como saiu nosso dinheiro agora, né? Chegava ali e ninguém queria aquele dinheiro. Então eu avisava naquelas barracas, eu digo: Quando chegar essas pessoas com essas moedas de prata grande, pode mandar lá que eu dou o mesmo dinheiro pra eles, eu troco pra eles. Às vezes, coitado, aqueles coitados chegavam do interior, levava aqueles saquinhos de moeda pra comprar, chegava lá.... Não, ninguém quer isso aqui não. Esse dinheiro não vale nada, não quero. Então eu avisava a eles, eles falavam: "Vai, vai naquela banca, naquela barraca lá. O Pedro louco... paga pra vocês. Eles me chamavam de "Pedro Louco"... (riso) É ele que dava o dinheiro bom por isso, que não serve mais.
P - Naquela época o senhor já colecionava moedas?
R - Eu não colecionava. Bem, eu guardava, que achava bonito aquelas moedas, sabe, eu guardava aquilo. Então os caras chegava lá: "É, o senhor compra, troca essas moedas?" "Quanto tem?" "Tem tanto." Eu pagava, trocava o dinheiro. Coitados, coitadinhos saíam tão alegre pra ir fazer a compra deles. (riso) Então eles me chamavam de "Pedro Louco". "É, o Pedro Louco que dá dinheiro bom por esses que ninguém quer mais. Eu não quero isso não, vai falar com ele lá." (riso) Aí nesse, naquele jornal até está isso aí, que é... Tanto que quando eu vim aqui pra São Paulo, eu trouxe um saco de moeda assim, tinha 14 quilos de moedas. Mas tinha muitos níqueis, e aquilo não era tudo prata, sabe. Então, eu morava numa pensão aqui no Brás, na Rua Maria Joaquina, e tinha aquele saco de moeda lá em cima do guarda-roupa, naquela mala lá. E eu mexia com aquela mala e disse: "Escuta, o que é que você tem nessa mala com um peso desgraçado desse?" Eu digo: "Não, isso é ferramenta de pedreiro, que eu trabalho de ajudante, trabalhei muito de ajudante de pedreiro, e é ferramenta que eu tenho aí." Mas não tinha nada, era um saco de moeda. Se a senhora mandar eu fazer uma massa de pedreiro, eu não sei nem como é que faz aquilo. Aí, quando é um belo dia eu caí do cavalo, sabe. A dona da pensão, aquilo era 14 rapazes que ela tinha, era 14 pensionista, mas era 14 filhos que ela tinha ali. E aquilo era uma mãe que nós tinha. Aquela velha pra nós era mãe, era tudo na vida pra nós. Aí um belo dia ela tinha um serviço pra fazer lá e tinha o pedreiro, e o pedreiro não tinha ferramenta. Ela veio me falar: "Seu Pedro, eu queria que o senhor me emprestasse as suas ferramentas de pedreiro pra eu fazer o serviço lá no quintal, é que o pedreiro sabe, mas ele não tem ferramentas, seu Pedro." "Pois não dona Hipólita. Ô dona Hipólita, daqui a pouco eu falo com a senhora." Que tinha uma porção de gente no quarto, os colegas e não sabiam o que tinha lá. Aí quando eles saíram eu digo: "Ô dona Hipólita, isso aqui não tem nada de ferramenta, eu não sei fazer nem uma massa pra pedreiro." Aí eu abri a mala e digo: "Dona Hipólita, isso aqui é um saco de moeda, e quase tudo prata, que eu tenho aqui, que eu trouxe do Norte, mas eu falo que é ferramenta, porque ninguém vai mexer lá." Eu digo: "Agora foi descoberto e a senhora vai guardar isso pra mim." "Então trás aí." Levei, ela pôs lá no quarto dela, ela guardou aquilo. Ficou uns oito anos lá, quando eu saí foi que eu peguei. (risos) Isso está naquela entrevista daquele jornal, O Estado.
P - Seu Pedro, quando que o senhor veio pra São Paulo, que época que foi?
R - Em 50.
P - E por que é que o senhor veio?
R - Não, eu vim porque lá, como diz, todo mundo procura um meio melhor e quase todo mundo tem a vontade de vir pra São Paulo, porque o poder aquisitivo é melhor, é melhor pra emprego, mais fácil, a gente pensava lá, naquela época, né? E quando eu cheguei aqui sofri muito.
P - Conta um pouquinho pra gente...
R - Eu sofri muito quando eu cheguei aqui. Uma, que arrumar emprego aqui não era brincadeira pra um nortista.
P - O senhor veio sozinho?
R - Eu vim sozinho e Deus. Vim, vim trazido por lá, que vêm aqueles caminhão que pega a gente lá e trazia pra aqui, sabe. Então logo, quando eu cheguei logo eu fiquei na Almeida Lima, mas já viemos, mas a gente não sabia, mas já saía de lá contratado, né? Tem caminhão que vai pra São Paulo, leva tanta gente, isso e aquilo e tal. A gente pagava a passagem e vinha. Foi como eu vim. Cheguei no Brás ficamos no Hotel... Hotel Queiroz, ali na Almeida Lima. E foi quando eles pegaram nós e puseram dentro de um caminhão, um baú aqui e nós sumimos nesse mundo, nem sabia onde que nós ia... nem aonde estava, nem pra onde ia. Então, nós foi parar lá em São Lourenço, lá dentro de uma mata lá, dessa Companhia Siderúrgica, Companhia Siderúrgica Aliperti. Nós foi trabalhar pra eles lá dentro do mato lá. E aquilo que... - quer que eu termine de contar o mesmo que eu lhe contei lá? Então, ficamos lá dentro do mato lá, eles tinham aqueles barraco no meio da mata e tudo, e cada um com aquele saco, aquela trouxa de roupa, aquele negócio, sabe, "Fica aí e tal." Roupa era nós mesmo que lavava... Aí, trabalhava de dia, de noite, quando era de noite de lua a gente via as onça em cima das madeira andando assim, e aqueles barraco que a gente morava, que eles faziam, tinha uma distância, quase dois dedos de largura, de espaço de uma tábua pra outra. E aquilo, a gente dormia, era um fogo, um fogo enorme no meio da casa lá, e quando foi um belo dia aquele fogo apagou e por aquela tábua, fresta da tábua, a onça meteu a unha aqui em minha costela, aqui. Só vendo... se me pega firme na costela tinha me rasgado todinho Eu sei que pegou no cobertor. Aí eu gritei e voei lá pro meio (riso) da casa, a turma tudo levantou e tudo, e acende a lamparina, isso e aquilo, e saiu fora, tudo normal.
P - Quanto tempo o senhor ficou nesse trabalho?
R -Lá, foi uns dois meses, mais ou menos, eu acho que não nem chegou a isso. Que foi quando nós fizemos, terminamos a empreitada e... era um serviço pesado mas a gente estava muito satisfeito, sabe. O salário mínimo aqui era 1.190. Nós lá tirava 70, 80 por dia, no cabo do machado. Era serviço pesado mas...
P - Qual era a moeda, era 1.190, o senhor lembra a moeda?
R - Não. Era cruzeiro. Era mil e... era um valor. O salário mínimo hoje não é 70 real? Naquela tempo o salário mínimo era 1.190 cruzeiro. Não, 1.290, quer dizer. Era uma nota de 1000 cruzeiro, uma de 200 e mais 90 cruzeiro, o salário mínimo daqui. E naquilo que nós estava lá, terminamos a empreitada, o empreiteiro fez a conta, nós tiramos um saldo assim, até bom. Aí nós ia correr mais mato pra pegar outra empreitada... E nós falava um pro outro: Nós trabalhamos aqui uns seis mês, nós vamos bonito pra Bahia(riso)
P - O senhor tinha essa vontade de voltar?
R - Ah, com dinheiro sim Que nós viemos pra ganhar dinheiro e voltar, a intenção nossa era essa. Aí, quando é um belo dia nós estamos lá, chegou seis jipe da Polícia Florestal, lotado de arma até a tampa. Daqui não tira mais nada Que eles tinha contrato... a Florestal, o Estado tinha contrato com a Companhia Siderúrgica Aliperti, eles tirava madeira, mas plantava eucalipto. Mas naquilo tinha muitos mil hectares que eles tinha tirado só a madeira, mas eucalipto eles não tinha plantado nem um pé. Então, embargaram tudo. Aí despacharam, disseram: Não tem mais serviço e tá, e tal... Pois não. Quando o nosso empreiteiro, nós trabalhava pra ele, ele fez a nossa conta, tudo direitinho e tá... "Vocês vai pra São Paulo receber." Isso era uma distância de, onde nós estava no meio da mata pra sede da fazenda, era mais ou menos, que aqui não sei a distância mais ou menos, como se fosse como daqui na Praça Princesa Isabel ou mais longe. Aí pegou o envelope de pagamento, deu pra nós, dá a carta que era pra nós receber aqui na Praça da Bandeira e chegamos na sede da fazenda, não sabia nada. Mas aquilo já era tudo combinado com empreiteira e os outros. Eles vai e pergunta pra nós: "Escuta, vocês... o Alvim pagou pra vocês? "Não, ele fez a conta. E como é que vocês vai? Não, ele deu a carta pra nós receber lá em São Paulo." Vocês receber? Dr. Juliano pagar pro Alvim?", que era o nosso empreiteiro. "O Alvim deve não sei quantos milhão pra firma Enquanto ele não paga ele não recebe um tostão. Vocês vão pra lá mas não vão receber nada, e é arriscado de vocês ser até preso, essa carta, isso não vale nada" Cada um: "Essa carta é de Alvim." Mas tudo combinado, sabe. Mas a gente, barriga verde, não entendia coisíssima nenhuma, sabe, não entendia o português deles. E eles fizeram tanto que nós abrimos aquela carta. Quando abrimos aquela carta, então ele dizia assim: Ao empreiteiro dr. Juliano, segue esses quatro senhores aí, o pagamento é x, eles quis aqui a coagir nós aqui pra pagar eles a pulso, sem nós ter dinheiro aqui a eles. Pois bem. E disse que a firma não paga pra ninguém. Então, quando eles abriram: "Tá vendo? Cadeia na certa" (riso) Isso era eles: "É, e vocês chegam lá, o dr. Juliano lê... vocês não têm prova que a firma não paga ninguém, vocês vão preso na hora Coitados." Aí nós ficamos, eu disse: "Ah, isso é verdade." Olhamos um pro outro assim: "O que é que nós faz?" Aí apareceu o, como é que chama, o capataz lá, aquele que traiu Cristo, (riso) chegou lá e disse: "Sabe de uma coisa, vocês fala com Martim Preto, Martim Preto paga esse dinheiro pra vocês." "Quem é esse Martim Preto?" "É o feitor aqui da fazenda, não sei o que... ele tem muito dinheiro. Ele vai querer um juros... E vocês, vocês ir com essa carta é cadeia na certa, pra vocês." Coitado, (riso) eu nem sabia que diabo era cadeia e nem queria saber. (risos) "Ainda mais dr. Juliano, é cadeia..." Aí nós conformamos. Não, mas antes disso, quando nós abriu a carta que viu essa... essa carta, o homem acusando nós na carta, que nós não tinha tido uma pequena com ele, aí um colega nosso que era um cara - ele trabalhava por cinco, só ele, mas também fosse pra brigar era um cão -, o cara disse: "Sabe de uma coisa, vamos lá matar esse cara. Agora que ele vai conhecer o..." "Não, não." "Vai, oh, vocês não tem coragem de ir não? Eu vou sozinho lá e dou fim a vida dele." "Não, Nero, não faz isso não, você está sonhando, e aqui se você fizer isso dentro dessa mata, nós não pode ir embora sozinho. De todo jeito nós cai na unha deles" E o homem ficou doido e deu trabalho até ele se acalmar e tudo. "É melhor falar com Martim Preto." (risos) Aí nós conformamos: "Chama esse Martim Preto." E aí veio o Martim Preto: "É, essa carta lá vocês não recebe nada não." Aí olhou o total do dinheiro e disse: "É, é uma nota boa, uma nota boa... E vocês queriam o que, receber?" "É, falaram pra falar com o senhor e tal, que o senhor..." "É, eu pago isso aí pra vocês mas eu desconto 30% na hora, no ato." Olhamos um pro outro assim, que é que faz? Eu disse: "Nós vamos preso... Vim trabalhar e ir pra cadeia... (risos) é jogo ruim, né?" Eu disse: "É..." Aí ele fez a conta e tudo... É, você tem tanto, você tem tanto, você tem tanto. Aí saiu, daí a pouco chegou ele com o maço de dinheiro: "Esse é seu, esse é seu, pode conf... tirei 30% de cada um, hein" "Tá bom." E pegamos esse dinheiro e nos mandamos pra aqui.
P - Seu Pedro, quando o senhor começou a trabalhar nesse comércio aí de moedas e cédulas?
R - Isso foi mais ou menos em... em 60, por aí, mais ou menos, 59, 60.
P - Conta pra gente como é que foi? Por que é que o senhor resolveu...
R - Eu resolvi que... - como eu lhe falei, desde lá da Bahia, eu gostava de moeda, sabe. Então eu trabalhei em diversas firmas por aqui e tal, aí a última firma que eu trabalhei foi na Isnard Companhia. Eu trabalhei cinco anos, ia completar cinco anos e eles me mandaram embora.
P - O que o senhor fazia na Isnard?
R - Eu trabalhava na seção de teste, teste de refrigeração. Vinha a... a indústria era a Indústria Pereira Lopes, que é dessa geladeira Climax. Então vinha de São Carlos pra ir. Então nós era ajudante, então tinha o técnico, que ele ficava na máquina. Então nós fazia a ligação, abria e ligava toda aquela geladeira pra ele testar. Então lá na máquina ele testava tudinho. Se uma dava um defeito nós já tirava aquela geladeira dali e punha outra. As que... aquele defeito que tinha nós tinha que marcar na placa e anotar o defeito e tudo. E trabalhava naquilo, seção de testes. Então, mas nós trabalhava, às vezes entrava 7 horas da manhã saía 11 horas da noite, fazendo hora extra. Então, quando foi um belo dia eles modificaram o motor daquela geladeira e não dava defeito. Aí em 100 geladeiras, quatro, cinco davam defeitos. Então foi parando, foi acabando o serviço nosso lá. E eles foi chamando a turma e pra fazer acordo, pra ir embora, isso e aquilo e tal, mas eu estou lá sossegado. Quando é um belo dia me chegou a carta pra eu vir no escritório central, aqui na Avenida São João, 1.400. Aí eu vim, quando eu cheguei aí, naquele tempo usava muito cigarro americano, e eu fumava também naquele tempo, cheguei lá e o gerente: "Seu Duarte, um cafezinho, um cigarrinho e tal." "Pois não, seu (Dirceu?), pois não." "Seu Duarte, mandei lhe chamar aqui porque o senhor já tem uns três meses que não faz nada quase na firma e eu mandei chamar o senhor pra nós fazer um acordo." "Fazer acordo, seu (Dirceu?), por quê?" "Aqui não tem serviço." E eu disse: "E a firma, como é que vai?" "A firma, graças a Deus, está muito boa, está muito bem." Nós sabíamos que ela estava nadando em dinheiro. Pra isso já tinha tido dissídio de um milhão e tal... E... "Todos que nós chamamos aqui fez acordo com nós e conto que o senhor coopere com a gente." Eu digo: "É, seu Dirceu, é o seguinte: às vezes esses que fez o acordo com o senhor, às vezes têm pessoas que dá graças a Deus de ser mandado embora. E é o que eu não quero é ser mandado embora. Eu prefiro estar trabalhando e chegar o fim do mês eu sei que tem meu ordenado pra receber, do que eu ir embora e ficar desempregado, aí. Não senhor, acordo eu não faço, não seu Dirceu." "Vai mais um cigarrinho, seu Duarte, mais um cafezinho..." "Pois não." "O que é que o senhor resolveu?" "Nada, seu Dirceu." Aí eu disse: "seu Dirceu, o senhor pode olhar, até cartão de... até dia de meu aniversário, a firma precisava eu vinha trabalhar. O senhor pode olhar nesse cartão aí, entrar 7 horas da manhã e sair 7 horas da noite, quando a firma tinha serviço e precisava de nós. Agora, hoje, que tem pouco serviço, eu vou fazer acordo com a firma pra ficar desempregado, seu Dirceu? isso eu não faço não, seu Dirceu." "Não, mas seu Duarte, todo mundo conformou." E eu digo: "É como eu lhe falei." Quando ele desenganou ele veio com essa proposta pra cima de mim: "Seu Duarte, então tem uma coisa, todos que fizeram acordo nós damos uma carta de referência pra ele. Mas o senhor não terá direito a essa carta de referência." E eu digo: "Seu Dirceu, então o senhor está me exigindo eu comprar uma carta da firma" Eu disse: "Seu Dirceu, esta carta já está comigo, eu não preciso dessa carta do senhor, da firma, eu com cinco anos registrado em minha carteira profissional numa firma de 100 anos, seu Dirceu Eu não preciso dessa carta do senhor, seu Dirceu, o senhor me desculpa, essa carta já está em minha carteira profissional" Aí ele ouviu e tal e pensou, pensou... "E porque o senhor sabe disso, Seu Duarte, o senhor não precisa "dessa..." Não senhor, agora eu vou fazer acordo, a firma está nadando em dinheiro, pra comprar essa carta da Isnard Companhia, não senhor." Mas ele, naquela altura, ele não sabia que eu fui sindi... sócio do Sindicato dos Metalúrgico muitos anos, ele não sabia daquilo, sabe. E eu fui, cansei de ir... tinha uma quarta-feira sim, outra não, tinha a reunião dos advogados do Sindicato dos Metalúrgicos e lá eles explicavam tudo pra nós: quando o empregado tinha razão, quando o empregado perdia o direito dava razão pro patrão. Ele não sabia que eu sabia tudo aquilo lá. E aí quando não teve mais jeito mesmo ele disse: "É, então o senhor vai pra casa, vê o que o senhor vai fazer, o que o senhor... o acordo que o senhor achar que está bom o senhor fala pro Mário, o caixa." Eu digo: "Não senhor, o acordo, seu Dirceu, é esse mesmo, comigo eu não vou fazer acordo de jeito nenhum. Pra ficar desempregado ou comprar uma carta da firma? Não." Aí ele desceu do sétimo andar comigo, foi até o térreo, lá embaixo, chegamos na calçada ele falou: "Não resolveu nada?" "Não, não." Quando ele desenganou: "Então, lá pras 2 e meia, 3 horas o senhor vem receber seus direito." Chegou lá, naquele tempo era uma nota muito boa, deu 114 mil e poucos cruzeiro. Em 59 isso era um dinheirinho mais ou menos. Aí eu peguei aquilo e digo: "Sabe, eu vou por esse interior comprar prata, ouro, isso e aquilo, o que eu achar." E fiquei com aquilo. Vivia aí por esse interior de São Paulo, ia pra Minas, então eu vi que aquilo estava melhorando mais do que empregado. Aí eu não procurei mais emprego. E fiquei nisso muitos anos.
P - O senhor saiu pro interior?
R - Não, eu morava aqui na Pompéia, mas eu saía e ia pro interior, de porta em porta, comprando prata, ouro, cordão de ouro, o que aparecia eu comprava, antigüidade era comigo. Às vezes chegava em fazenda ou em casas, às vezes comprava, às vezes tinha um casal que tinha uma filha que estava namorando ou ia ficar noiva: "Já tem aliança?" "Não." "Então eu faço pra senhora ou pro senhor." Ou era um rapaz... Ou ia fazer Bodas de Prata... "Você não vai fazer o anel de formatura?" "Eu faço pra senhora, eu trago." "Mas como?" "O senhor me dá a prata e me dá o ouro, o senhor só vai pagar o feitio só."
P - E o senhor pegava a prata, como que era?
R - A prata eu tinha, prata e ouro eu tinha, mas se eles dava a prata e o ouro, eu só cobrava o feitio, o que eu mandava... pagava pro ourives fazer. Então aquilo eu arrumei muita amizade nesse interior. Tinha casa que eu chegava, às vezes eu chegava, ia pro hotel, na cidade... "Você está aonde? Está em que hotel?" "Estou em tal..." "Não senhor, vai buscar a sua pasta, vai..." "Não, não." "Não, vai buscar. Você fica aí, você só vai... o dia que você quiser ir embora, você vai... mas ficar em hotel o que" Mas aquilo eu fazia era anel, tudo que eles queria. Precisava eu fazia e chegava lá, às vezes não cobrava nada. Chegava lá, eu almoçava, às vezes dormia, não cobrava nada. Tinha vez... o pessoal diz: O interior tem caipira. Mas caipira tem aqui, que não sabe tratar ninguém. Aqui se trata todo mundo... não, a maioria... No interior eles trata a gente, você vê, você trata eles direito, aquilo é o mesmo que estar em casa. Você chega ali eles tratam a gente como seja um da família. Então me dei muito bem com essa gente.
P - Então o senhor tinha um ourives que trabalhava pro senhor?
R - Tinha. Ele fazia toda espécie de jóia que eu precisava ele fazia. Ali na Roberto Simonsen, número 13.
P - E o senhor fazia por encomenda ou o senhor levava também alguma peça pra mostrar?
R - Não, não, só encomenda. Eu tinha a medida, tinha tudo. Só tirava e anotava e mandava fazer. Agora, o meu era só comprar prata e ouro. Às vezes falava com aqueles caipiras: "Se você souber quem tem moeda de prata e de ouro e que queira vender..." Tinha vez que eu estava por lá, chegava em casa tinha duas, três, quatro cartas: "Olha em tal lugar, em tal lugar tem, você vem aqui que tem muita moeda, o pessoal aí tem muita moeda pra vender. Moeda, nota, isso tal." Depois eu desisti disso, desse ramo, por causa de uma passagem minha que aconteceu comigo em Minas. Em 70, na Copa de 70, quando o Brasil foi disputar com o Peru, eu estava em Sete Lagoas, que lá tinha uma pensão que, quando eu chegava lá, aquilo eu estava em casa. No começo, nos dias que eu cheguei as primeiras vezes naquela pensão, tive que fazer ficha, isso e aquilo e tal. Depois que a dona da pensão passou a me conhecer direito, eu chegava com a mala cheia de dinheiro, chegava: Dona Leninha, é o seguinte... - e eu procurava um quarto sozinho, sempre falava. Aí um dia eu falei pra ela: "Dona Leninha, é o seguinte, eu trabalho nesse ramo, assim, assim..." Aí eu expliquei pra ela e mostrei... Aí ela disse: "Ah, seu Duarte." Então, quando eu chegava lá ela arrumava um quarto pra mim, ela pegava a minha pasta, guardava. Quando eu pedia dinheiro, precisava de dinheiro, pedia a ela. Ali eu almoçava, eu tomava café, eu jantava, no meio de toda família ali. Só o dia que eu ia embora, que ela dizia: "O dia de o senhor ir embora, o senhor procura sua conta, mas do contrário, o senhor vai lá, pega café, toma o café, a casa é do senhor." É. Um belo dia eu estou lá, e eu digo: "Sabe que eu vou em Ouro Preto, que é lugar antigo deve ter muita coisa boa." Peguei o ônibus, fui pra Ouro Preto. Cheguei em Ouro Preto, não achei nada. Fui pra Mariana. Cheguei lá também nada. Aí me orientaram, disse: "Onde tem muita moeda é em Itabirito." "É? Certo." Cidadezinha perto, eu fui pra lá. Quando cheguei na cidade fui num hotel, aluguei um quarto e tal e fui localizar a casa do cidadão. Cheguei lá, era uma loja de calçados e ele tinha muita moeda. Mas a coleção de moedas boas que ele tinha estava tudo em casa. E eu passei a tarde com ele lá. Depois eu digo: Aí eu vou pro hotel, quando for mais tarde, eu venho, deixo isso aqui. A minha patroa está em Belo Horizonte e ela vai chegar lá pras 7 horas e antes dela não posso fazer nada. Está bom. Aí eu saí, cheguei assim na praça, tinha um barzinho lá em cima, subindo as escadas e tal. Eu subi aquilo lá e tal, mandei fazer um churrasco e tal, pedi uma brahmazinha gelada, porque estava muito quente e tal. E naquele meio eu ia saindo, escutei a voz: Ele já vem saindo. Quando eu olhei eram dois caras mal-encarados, estavam lá no pé da escada. Um bem vestido e um mal vestido. Aí eu voltei pra dentro do bar e fiquei ali. Aí eu pedi mais meia cerveja, paguei logo para o homem e fiquei naquele meio. De lá eu via pelo vitrô assim, um colega daqueles chamaram eles e eles desceram. Um desceu e outro ficou. Naquele meio o outro saiu, foi lá numa banca de jornal. Eu peguei uma pastazinha e saí, saí numa desembalada, saí doido. Cheguei na praça, logo que subi a escada fui para o hotel e o meu quarto de lá tinha janela pra rua. Quando eu cheguei que abri a janela do quarto, e vem os dois caras, um do lado da rua e outro de outro lado. E entra, um entra num estabelecimento e o outro me procurando. E eu de lá olhando. Daquele dia eu tomei medo. Abandonei esse ramo e nunca mais viajei pra canto nenhum. E dou graças a Deus que quantas vezes com a pasta cheia de dinheiro e moeda de ouro... eu procurando: "Tem ouro pra vender, tem prata?" O negro dizia: "Está com dinheiro..." Dei graças a Deus de nunca ter sido roubado. Mas naquele dia eu tomei medo e abandonei isso daí. Aí foi quando eu resolvi trabalhar assim na rua. Aí um dia cheguei ali e digo: "Ah, eu vou por umas moedas aqui." Cheguei (risos) ali, pus um papel no chão e pus as moedas. Chega o fis...
P - Aonde?
R - Ali no Largo São Francisco, onde eu estou. Chega o fiscal: "Que é isso aqui?" "Não, é as moedas que..." "Aqui? Recolhe isso aqui senão eu carrego tudinho, nesse instante" Eu tinha aquelas pataca, aquelas moeda de cobre, grande, eu tinha comprado... "Não, não, tem que tirar, aqui não" Então o cara saiu, eu saí, cheguei lá, conversei com ele e digo: "Olha moço, paciência, eu preciso trabalhar estou desempregado e tal, e eu tenho mulher e filho pra dar de comer, a coisa está ruim, na minha idade nego não dá emprego." "É, ó, então... - o fiscal chamava Tonhão -, você põe uma bancazinha e forra direitinho, mas no chão assim, não." "Está bom." E eu consegui. Fiquei lá, fiz um a bancazinha, fiz um tabuleirozinho. E isso aí moço: "Que é isso aí?" "Não, o Tonhão falou que podia." "Ah, o Tonhão já falou com você, ah, está bom." Aí fiquei ali, quando era um dia eu falei: "Você sabe, eu vou pagar a licença disso que é melhor". Aí, fui pra prefeitura, fiz a inscrição, fiz tudo ali. E comecei a pagar a licença, fui pro INPS, comecei a pagar o carnê do INPS. Aí fui para o sindicato: "Você tem que pagar um dia do sindicato todo ano." "Está certo." Então pagava tudo ali. Então um belo dia o fiscal chegou lá, pra juntar aquele tabuleiro. "O senhor vai levar as minhas moedas pra onde? Não senhor, não pode. O senhor já viu meus documentos aqui?" "Que documento?" (riso) Quando ele viu eu com aquela pasta, imposto sindical, paga prefeitura, paga INPS, tudo, inscrição, tudo, os caras... O outro chamou: "Escuta, o cidadão aqui, não pode levar ele, se ele paga tudo, tudo que é direito, ele paga os impostos, então não pode mexer com ele." E com isso eu estou aí. Quando o Jânio Quadros entrou, aquilo levava meio mundo, mas comigo não. Nunca, nunca me levou nada. E ali eu estou até hoje, me divertindo com meus fregueses. Brinco com um, brinco com outro, é velho, é novo, é isso, é aquilo. Eu brinco, se você me compra, por exemplo, é cinco real. Você me dá dez. "Está certo" "Está certo como?" "É que eu não conheço bem o dinheiro, eu pensei que essa nota de dez era cinco." "Dá meu troco pra cá (riso) Você está querendo me embrulhar o que. Dá meu troco" "Ah, a senhora me desculpe, é que eu não conheço..." "O que? Um rato que trabalha com dinheiro e não conhece dinheiro?" (riso) E assim eu levo a vida, brinco com Deus e o mundo todinho Assim eu levo a vida.
P - Quando o senhor se estabeleceu lá no Largo São Francisco, em que ano mais ou menos?
R - O dia assim eu não sei, sem ver a licença eu não sei. Mas já tem 27 anos, mais ou menos.
P - E quem que vai comprar lá com o senhor?
R - Ah, tem diversos fregueses, tem muitos diversos fregueses. Ali tem gerentes de bancos. Hoje, como a coisa está muito ruim, mas eu tinha freguês. Era juiz de direito, era promotor, era... Que esse ramo aí, era quase de gente mais ou menos, sabe. Às vezes naquele tempo aparecia nota de 30, 50, cem cruzeiro. O que vive de salário, o operário, não pode comprar, tem de ser com essa gente. Ou se pegava uma moeda rara ia no telefone: "Ô doutor, fulano de tal, olha, tem tal moeda da data tal, isso e aquilo. O senhor já tem?" "Não, não Pedrinho, guarda pra mim que eu já vou aí agora".
P - Ah, o senhor ligava para o freguês?
R - É, em pouca hora ele estava lá. É, ainda até hoje tem muitos fregueses que quando aparece uma coisa boa, eu telefono e ele vai buscar ou: "Trás aqui, Pedrinho."
P - E são colecionadores?
R - São. Tem muitos colecionadores, tem muitos, tem.
P - Senhor Pedro, como que o senhor faz pra comprar as cédulas e comprar as moedas? Como é que...
R - As moedas aquilo tem muitos. Às vezes eu estou ali, às vezes você tem moeda em casa que seu pai deixou: "Ah, o senhor trabalha com isso, o senhor compra moeda, compra nota? Ah, lá em casa tem uma caixa, que meus pais me deixou, então o senhor compra? Escuta, e, pelo acaso, não dá para o senhor ir lá em casa não?" "Dá sim senhor". Quando não é muito longe: "Pois não, é só me dá o endereço e eu vou lá, ou o senhor?" Então ele me dá o endereço, tudo direitinho, marco a hora e eu vou lá... Às vezes, geralmente, eu prefiro dia de sábado, porque meio de semana eu perco freguês. "Pode ser dia de sábado, está bom? Dia de domingo?" "Pois não, seu Pedro." E é do que eu vivo ali, tanto eu vou a domicílio ou eles levam lá, e eu compro e é assim.
P - E no caso das notas?
R - A mesma coisa. Tanto eu compro particular, às vezes que nota, e outros também... Às vezes eu venho na República e têm muitos colecionadores que vêm de fora, eu compro ali. Têm outros que vêm, outros dos Estados Unidos que vêm, que traz... eles trazem e vêm revender aqui também. E compram, quando é nota boa também, eles compram muito da gente também. Agora mesmo, hoje está com oito, não ontem... fez oito dias que teve uma convenção no Hotel Danúbio e fui pra lá... Essa nota que você está vendo ali, foi comprada tudo lá na convenção.
P - Senhor Pedro, qual a moeda que tem mais saída, que dá mais lucro?
R - Não é dá mais lucro, depende da compra. Às vezes você pega uma moeda rara e às vezes você compra mais barato, às vezes na mão de um particular, então essa dá lucro. E, às vezes, tem uma moeda que vale um fortuna, mas você já compra na mão de um colecionador e que já sabe o valor dela, ele te dá pouca chance de ganhar. Então você empata um dinheirão pra ganhar um nada. Mas tem muita moeda rara nossa, tem muita moeda e notas de mil réis, têm muitas nota rara.
P - Mil réis são moedas brasileiras?
R - Notas, notas também, têm muitas notas brasileiras que custa muito dinheiro. Como tem nota de 30 mil réis, 25 mil réis, 40 mil réis, tem nota daquela valor ouro. Tem notas daquela que às vezes é conhecida alguma no Brasil, então aquela nota pra um colecionador é como diz: a gente vende por quanto quer.
P - Ah, o senhor tem, o senhor mexe bastante com moedas brasileiras também?
R - De toda parte do mundo.
P - E é bom mexer com a moeda nacional?
R - Quer dizer, a nacional nossa, hoje, tem pouco valor. É melhor só moeda de prata ou só de ouro. Mas essas moedas 400 réis, 200 réis, isso se compra por quilo porque tem quantidades enormes. Como essas moedas amarela de cruzeiros, isso e aquilo, isso não vale. Tem pessoas que tem caixa daquilo em casa e acha que tem uma fortuna porque ficou dos avôs e ficou, o pai deixou isso e aquilo, mas vai lá ver e não vale quase nada, é por quilo aquilo. Mas às vezes tem a moeda que, às vezes a pessoa não o dá valor, às vezes está lá dentro de uma caixa de moeda que os pai deixou, e às vezes não é grande, é uma moedinha que não dá nada, vale dois, três, quatro, cinco milhão. E, outra, a moeda não tem valor por antigüidade.
P - Como é que esse negócio do valor das moedas, o senhor tem uma tabela?
R - Tem, aqui tem catálogo, tem tudo. Tem, nós temos catálogos, onde tem todas as moedas, toda cunhagem de moeda do Brasil, de prata, de ouro e de cobre, nós tem tudo. Nós tem catálogos que tem toda... até a primeira moeda cunhada no Brasil. E aquilo eu sei, aquilo eu tenho quase tudo de cor, na cabeça. De tão poucos dias que eu trabalho, se eu vejo uma moeda rara na sua mão assim, eu olho e digo: "Olha, você não quer vender, essa moeda é boa." A gente não pode falar, claro, pro freguês que vale tantos milhão, ele é capaz de cair de costas...
P - E não vende pro senhor... (riso)
R - E não vende. Tem que maneirar: "É uma peçazinha boa, mais ou menos." "Mas mais ou menos quanto, seu Pedro?" "É, essa peça vale tanto - se ela vale 10 mil -, essa peça vale cinco, seis mil." Entende? Porque se vale dez e eu digo: "Vale dez", às vezes você precisa do dinheiro e não me vende, porque honestamente eu lhe digo que vale dez e é quanto aquela peça vale. Mas você já diz: "Se ele diz que vale 20 é porque vale cem. Se ele diz que vale dez é porque vale cem." E não vende, entendeu? Então você tem que dizer uma média, mais ou menos assim e tal. E quando não é assim você mostra o catálogo. Olha aqui o catálogo. Lá está tanto, assim, assim. Mas aquilo vale pela data, não é antigüidade. Nós tem um cem réis de 1872 que hoje, essa peça, vale mais ou menos uns... uns 50, vale de 30 a 50 mil real. É um tostão, cem réis de níquel de 1872. Foi cunhado 100 moedas só, na época. Então isso que passa a moeda ser rara e ter muito valor é pela quantidade de cunhagem... Um tostão em 72, nós tem uma peça de ouro do Brasil que é a peça da coroação do Brasil. É 640 de ouro, de 1822. Aquilo foi feito pelo Dom Pedro pra um cartão postal, um cartão de visitas, sabe? Mas aquilo eles cunharam 200 moeda daquela e só foi distribuída 64. E a maioria dessas moeda está mais na Suíça do que aqui no Brasil.
P - Mas por que mais na Suíça?
R - Porque sim, quase todas as moedas raras está tudo lá fora, quase toda. Quer ver por que: porque o próprio colecionador nosso quando tem aqui ele vai vender uma coleção, agora não, que o dólar caiu de lá de cima e se esborrachou todo, mas o cara tinha uma coleção de valor e não vendia aqui, ele vendia lá fora. Ia fazer leilão na Suíça, num outro canto. Como aqui é o cúmulo de não pagar imposto de renda... agora mesmo, há uns quatro anos mais ou menos aí morreu um cidadão - eu mesmo vendi muita peça rara pra ele -, mas ele tinha peças raríssimas, muito, que era grande quantidade, mas aqui ele não vendeu. Teve colecionador aqui que, se quis comprar, foi comprar na Suíça. Foi fazer leilão lá na Suíça, o que ele declarava que foi... Às vezes vocês vêem que está na hora de...
P - Não, pode continuar seu Pedro a gente...
R - Então, teve uma peça, essa peça da coroação, sabe aquele Zarur, como é que chama?, candidato a deputado federal, que era dono daquele prédio, aquele edifício ali no Vale Anhangabaú, é Zarur, Zarrur, uma coisa assim, o nome dele, ele foi quem comprou essa peça lá na Suíça, pagou na época 50 mil libras... que é moeda nossa Podia ser vendida aqui, né? E foi vendida lá, foi leiloado lá. Sabe quanto foi o leilão? Foi calculado em 10 mil, 10 mil cruzeiro, 10 milhão de cruzeiro. Enquanto só uma moeda foi vendida por 50 mil libras. Então a maioria, toda essas peça rara nossa está tudo lá fora, quase tudo. A mesma coisa acontece com nosso ouro. Você vê, o português fala: "O ouro bom é português, o ouro bom é português" Português, todo o ouro nosso foi pra lá, (riso) não é isso? Então é isso, nós... muitos não dão valor ao que é nosso. E outros, pra não pagar imposto, faz isso. Leiloa lá fora, ninguém viu e pronto.
P - Senhor Pedro, tem uma frase que o senhor fala naquela entrevista lá no Estado, o senhor fala que o nosso dinheiro é o que dá mais lucro, que ele mal sai e já é antigo.
R - É, ele diz assim: "Por quê? Por que coleciona e tudo?" Eu digo: "Não, é que o nosso dinheiro, nos perde até de vista" Ele: "Por quê?" Eu digo: "Nosso dinheiro, ainda bem nem saiu de circulação, já recolheu." E esse dinheiro é muito difícil... recolhido pelo Tesouro Nacional. Sabe por quê? Nós mesmos, nós fazemos isso. O dinheiro está em circulação, nós pega o dinheiro e guarda, como a moeda, é difícil, pega, enche caixa de moeda e isso e aquilo. Quando sai de circulação o Banco Central ainda avisa, tem tantos tempos pra trocar, ou a moeda ou a nota, mas ninguém vai lá. E quando perde o valor de tudo, aí aparece por quilo pra vender. Nego tem 20, 30, 50 quilo pra vender, nota, nego aparece com caixas enormes de notas. "É, mas isso não tem mais troco não vale mais nada. Mas, o senhor troca pra mim? Quanto o senhor dá?" E é assim. Então o nosso dinheiro é o que... pro governo dá lucro, pra nós dá prejuízo. Porque o governo lança aquele dinheiro na praça, é muitos milhões. Com 15 dias ou 20, hoje é dois, três meses no máximo, já recolhe aquele dinheiro. Mas a maioria não vai lá no banco trocar. Às vezes o cara não tem dinheiro pra pagar o ônibus. Mas quando acaba ele chega com pacotes e pacotes de notas de 100, de 200, de 500 que ele não trocou no banco, deveria ter trocado. E tem notas nossa, de valores e que às vezes é queimada. Olha uma coisa: vocês viram aquela nota de 50, da baiana?
P - Não me lembro, não.
R - Agora... aquela roxinha. Sabe quanto está uma nota daquela agora? Está 40, 45 real. E é bem poucos que tem. Agora, por quê? Recolhe, mas já têm os magnatas, já têm os magnatas no Banco Central, na Casa da Moeda, que já pega aquilo ou dentro dos grandes bancos e guarda aquilo. "Não, ô fulano, eu tenho essa nota. Eu tenho tantas notas. Tenho 100, 200 notas dessa lá, mas eu quero x". Então eu sei que eu não tenho possibilidade de arrumar, que ela já foi mesmo. Então vai parar na mão deles e eles segura. Então aí que eles ganha dinheiro e vende pra nós.(risos)
P - Seu Pedro, qual é a diferença do valor das notas usadas e das notas novas? O senhor falou que comercializa nota nova.
R - Não, toda nota pra coleção, ela pode ser usada, mas pra coleção ela só tem valor nova. Ela é usada, é velha, mas o estado dela tem que estar nova pra coleção. Você tem uma nota, por exemplo, que vale, suponhamos, ela vale 500 real. Se ela está novinha ela vale aquilo, se ela está dobrada no meio você não acha a metade.
P - Ah, ela perde o valor.
R - É, ela perde o valor. Tanto que quando eu vendo eu já tenho um envelope, às vezes eu vendo pro freguês eu ponho dentro do envelope direitinho e digo: "Não dobra a nota." Têm muitos pais que traz criança e compra coleção de notas, já explico, tanto pra criança como pro pai: "Não deixa eles dobrar a nota que perde o valor." Falo pra aquele garoto: "Se você mostra pra um colega ou uma colega, antes dele pegar em sua nota, você avisa pra ele não dobrar a nota." Por quê? Porque perde o valor. Essa nota nova assim vale tanto, se você dobrar ela no meio perde 50% do valor pra coleção. E às vezes já aconteceu caso de eu vender, às vezes o colecionador começar a colecionar e compra, compra, compra e no fim, ou por isso, ou por aquilo, ele se aperta por dinheiro, ele quer se desfazer daquilo pra comprar uma outra coisa e vem lá e diz "Ah, seu Pedro, e tal, olha, eu comprei tanto do senhor e agora eu resolvi desfazer porque eu quero comprar outra coisa". Mas ele dobra, traz aquela nota tudo dobrada. Eu digo: Infelizmente eu sei que o senhor comprou de mim, mas quando eu lhe vendi, eu vendi as notas todas inteiras, o senhor dobrou assim, pra mim não me interessa, eu não posso comprar, porque eu não tenho pra quem vender. Às vezes tem deles ficar até mal satisfeitos e tal. Isso então, isso é uma ramo, que a turma embrulha a gente: Que na hora de comprar vale tanto, quando é pra vender, vocês... Não, quando a gente vende,, vende a nota inteira, novinha, não é isso?, como eu tenho aqui. Agora o senhor não tem cuidado, dobra a nota todinha. Se eu fosse vender essa nota dobrada, o senhor não compraria de mim, comprava? Agora, uns se conforma, outros não. Então é obrigado a explicar direitinho. A mesma coisa tem a moeda. É uma moeda de prata, uma moeda de ouro, ela tem um grande valor, é uma peça rara. Você não pode deixar ela cair, se ela cai e bate numa pedra, num cimento, aí ela amassa e uma batida daquela... Se a moeda, por exemplo, vale um milhão, ela passa a valer 500.
P - Por que amassou?
R - É, porque amassou.
P - E no caso... o senhor já me disse isso, mas gostaria de voltar outra vez nesse ponto. No caso das notas que o senhor compra, onde o senhor compra as notas?
R - Não, eu compro ali onde eu trabalho, que têm colecionadores que vêm. E vêm diversos me vender ali. Vem muita gente pra vender nota pra mim.
P - As notas estrangeiras também?
R - É, tem americanos, tem muitos conhecidos lá de fora que vêm. Tem o Peter, que ele traz notas que é uma infinidade de diversos países. Tem muitos deles que traz. E outros, tem muitos aí que às vezes tem escritório também de compra e venda de nota estrangeira. Tem comércios, tem escritórios montados disso aí, na Barão de Itapetininga tem, tem na 24 de Maio, tem em diversos lugares aí.
P - Seu Pedro, o que o senhor mais gosta desse trabalho?
R - Sabe, eu gosto de todos, que é um gosto que eu tenho. Eu gosto quando me aparece uma nota muito bonita, uma nota rara ou uma moeda rara, que eu compro aquilo, pra mim é um prazer. Que aquela nota, se é uma nota rara, ou uma moeda rara, eu tenho aquele prazer de oferecer pra um colecionador, um freguês meu. E apertar ele um pouco, porque ele não tem... aí eu gosto de ver ele chorar um pouco: "Não Pedro, é caro" É caro, mas o senhor não tem, né? Isso aí eu paguei caro, eu sei que o senhor não tem." "Não tenho mesmo, Pedro, mas está muito, Pedro Então a gente gosta de ter aquele bate papo muito legal: Não, o senhor sabe, né, eu sei que o senhor não tem, né? O senhor tá vendo, é tão raro que o senhor não tem, né? É Pedro, mas o preço que você quer é demais. Eu digo: O que o senhor quer que eu faça, se eu paguei tanto, então eu não posso ganhar alguma coisa também? Aí vem a mentira, né? Que só é um lugar... eu trabalho nisso mas não dou valor a mentira, e não gosto de mentir. Mas é a única coisa do negócio é a mentira. Aí a gente é obrigado a mentir. O cara diz: Mas fala, você pagou tanto. Eu digo - eu não podia falar não, porque depois... mas se eu paguei 100, eu digo que paguei 130 ou 150, né? Você não pagou Eu estou lhe falando que eu paguei. Porque se eu disser que eu paguei 100, ele quer me dar 110. (risos) E, quando é uma coisa, uma peça comum não, aí eu não peço não. Nós é que tem que adular ele pra comprar da gente, né? Agora, quando é uma coisa rara eles é que têm que bajular a gente pra poder comprar. E a gente já conhece, já é malandro velho, a gente encosta eles, diz: Não, quero tanto. O senhor não quer não, eu vou telefonar pra fulano... Não, não, não.(risos) Quem sabe se um não quer, o outro quer.
P - Seu Pedro, pra concluir, eu queria que o senhor falasse o que o senhor acha de estar aqui hoje com a gente deixando esse depoimento da experiência...
R - Escuta, pra mim, como experiência, pra mim é um grande prazer na minha vida. É mais uma passagem pela minha vida, com 77 anos, isso pra mim é um beleza...(risos) Eu gostaria, se minhas filhas vissem, minhas filhas gostam muito disso: Pai, o senhor também não tem jeito, pai" (risos) Eu falei pra elas, e eu digo: Ah, eles vieram me chamar pra ir amanhã... Vem buscar o senhor de táxi aqui? Ah, o senhor está brincando. E eu digo: Eu sei lá minha filha, eles dizem que vêm me buscar aí, o que eu vou fazer?(riso)
P - Mas o senhor acha importante deixar esse registro?
R - Eu acho, muito, muito, muito, e agradeço muito a vocês por isso. Eu agradeço, não tenho nada que agradecer vocês. Eu quero que vocês me desculpem sabe, porque é como eu disse a vocês, eu não tive estudo, não tenho estudo, não sei falar direito, isso e aquilo, vocês me desculpem, mas isso pra mim é uma glória.
P - Foi muito boa a nossa entrevista.
R - Muito obrigado.
P - Obrigado ao senhor.
R - E qualquer coisa, vocês precisando, eu estou ali às ordens, qualquer hora estamos ali. Se quiser fazer uma entrevista lá. Já teve entrevista de tomar até a rua ali
P - Ah, é?
R - É, já teve entrevista ali de precisar cercar a rua.
P - E entrevista de televisão?
R - Isso. Já passei muitas vezes no Jornal Nacional, já passei muitas vezes. Fui entrevistado muito, muitas vezes... Essa... Folha de S. Paulo, eu já sai na Folha de S. Paulo, uma página inteirinha. É tanto que, naquele tempo, eu acho que foi uma das primeiras entrevistas que eles fizeram e foi quando eles... eu estou em casa, num dia de domingo ou dia de sábado, e a turma brinca muito comigo: "Olha aqui, procurado pela polícia, vivo ou morto, isso e aquilo" (riso) Eu nem sabia quando vai lá, está eu na Folha de S. Paulo, uma página inteirinha, minha foto lá e nota do lado e moeda de outro.
P - O senhor tem esse recorte?
R - Não tenho porque deu uma enchente lá, e a gente tirando os móveis, e aquilo foi embora. Perdi aquilo. Antes eu tivesse... queria perder dinheiro e não aquilo. Não só tinha só aquilo como eu perdi muito onde eu tinha... porque toda vida eu fui, agora eu falo só pra político, eu toda a vida fui getulista de sangue e alma. Então, eu tinha todas aquelas cartas da... aquele drama de Getúlio. Eu acho que vocês não tinha nascido ainda naquela época, em 50. E aquilo levou fim, tudo aquilo.
P - Na enchente?
R - É, aquelas cartas daquele sofrimento dele, eu guardava tudo aquilo, sumiu tudo.
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