Francis Olizeke tem 34 anos e é nigeriano. Diferente do que muitos pensam sobre migrantes, ele não fugiu do seu país de origem. Nem por causa de guerra e nem por causa de fome. Segundo o site das Nações Unidas no Brasil (ONUBR), “migração” é comumente compreendida implicando um processo voluntário; por exemplo, alguém que cruza uma fronteira em busca de melhores oportunidades econômicas. É exatamente por este motivo que Francis agora mora em Canoas, região metropolitana de Porto Alegre.
Irritado com a desinformação das pessoas sobre o seu país, Francis desabafou: “Eu não tá gostando isso! Quando o pobre tá ignorante, dá pra perdoar. Mas quando o rico tá ignorante, não pode perdoar. Porque rico tem dinheiro, tem recurso pra pesquisar e ler antes de abri boca e falar alguma coisa. Mas quando o rico não faz isso e pensa antigo, mesmo com dinheiro, isso é imperdoável! Como que alguém vai entra aqui e vai me pergunta se fugi da Nigéria por causa de guerra? Única guerra que Nigéria já tive foi em 1967 e ficou três anos, acabou em 1970. Eu não nasci na época." A guerra que Francis se refere ficou conhecida como Guerra de Biafra ou Guerra Civil Nigeriana. A crise começou em 1966 na sequência de uma tentativa falhada de golpe de Estado na Nigéria.
"Eu sei que aquele rico tem Whatsapp, usa internet e tem celular de último geração, mas é por causa de ignorância. Não quer pesquisar nada, só generaliza. E fala que a África tá em guerra, guerra, guerra… A África, se eu não me engana, tem cinquenta e poucos países. Enton, quantos países lá desse continente que tem guerra? Não é mais do que quatro. Mas todo mundo: ‘ah, guerra, miséria, pobreza.’ Da onde? O Nigéria é colônia inglesa que também tem problemas sociais deles, mas guerra não tem. Mas alguém chega aqui e pensa que tudo África é guerra, não é verdade”, concluiu...
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Francis Olizeke tem 34 anos e é nigeriano. Diferente do que muitos pensam sobre migrantes, ele não fugiu do seu país de origem. Nem por causa de guerra e nem por causa de fome. Segundo o site das Nações Unidas no Brasil (ONUBR), “migração” é comumente compreendida implicando um processo voluntário; por exemplo, alguém que cruza uma fronteira em busca de melhores oportunidades econômicas. É exatamente por este motivo que Francis agora mora em Canoas, região metropolitana de Porto Alegre.
Irritado com a desinformação das pessoas sobre o seu país, Francis desabafou: “Eu não tá gostando isso! Quando o pobre tá ignorante, dá pra perdoar. Mas quando o rico tá ignorante, não pode perdoar. Porque rico tem dinheiro, tem recurso pra pesquisar e ler antes de abri boca e falar alguma coisa. Mas quando o rico não faz isso e pensa antigo, mesmo com dinheiro, isso é imperdoável! Como que alguém vai entra aqui e vai me pergunta se fugi da Nigéria por causa de guerra? Única guerra que Nigéria já tive foi em 1967 e ficou três anos, acabou em 1970. Eu não nasci na época." A guerra que Francis se refere ficou conhecida como Guerra de Biafra ou Guerra Civil Nigeriana. A crise começou em 1966 na sequência de uma tentativa falhada de golpe de Estado na Nigéria.
"Eu sei que aquele rico tem Whatsapp, usa internet e tem celular de último geração, mas é por causa de ignorância. Não quer pesquisar nada, só generaliza. E fala que a África tá em guerra, guerra, guerra… A África, se eu não me engana, tem cinquenta e poucos países. Enton, quantos países lá desse continente que tem guerra? Não é mais do que quatro. Mas todo mundo: ‘ah, guerra, miséria, pobreza.’ Da onde? O Nigéria é colônia inglesa que também tem problemas sociais deles, mas guerra não tem. Mas alguém chega aqui e pensa que tudo África é guerra, não é verdade”, concluiu nervoso e apontando o dedo para a câmera que estava filmando.
Franca Chinwe é sua esposa há três anos. Casou-se com Francis na tradição Igbo na Nigéria, e depois na Igreja Católica, em Porto Alegre. “Quando eu vim para cá, ela fiquei lá e eu fiquei aqui. Quando eu não tive muita sorte com gaúchas, eu comecei a falar com ela de novo e aí ela vem pra cá”, contou com muitas risadas. O diferente do casamento, foi que Franca casou “sozinha” na tradição da cidade onde moravam, pois Francis já morava no Brasil. O noivo não estava presente, então foi apenas uma formalidade. “Porque a África tem uma tradição e tem que respeitar ela”, afirmou Francis. Sandra Olizeke, de 2 anos e 7 meses é filha do casal e nasceu no Brasil.
Francis veio da cidade de Lagos, que se localiza na parte Sudoeste da Nigéria, próximo da costa do Oceano Atlântico. A população, segundo o censo de 2006, era cerca de 8 milhões de habitantes, número que deve ser maior atualmente. Lagos foi considerada a capital do país até 1991, quando foi substituída por Abuja. A língua nativa é Igbo (se pronuncia Ibo), mas o inglês é a língua predominante.
Vinda para o Brasil em busca de uma vida melhor
Negro, com cerca de 1,90m de altura e muito magro, Francis saiu da Nigéria em janeiro de 2010. Viajou para o Brasil de avião, e foi morar na Ilha da Magia. Viveu cerca de um ano em Florianópolis com a irmã e o cunhado que já moravam em Santa Catarina. Enquanto morou em Floripa, Francis não trabalhou. Apenas estudou e aprendeu sozinho a língua portuguesa. “Eu mesmo tinha dicionário, aprende escrevendo e traduzindo. Até agora eu fala errado”, contou rindo e explicando pausadamente.
“Como todo mundo, como todo brasileiro. Como todo mundo quer vida melhor. Pra tentar vida melhor. E graças a Deus, está melhor. Por enquanto, mas não em todos os sentidos, porque eu deixei família, deixei muitas pessoas lá. Mas com a crise agora o negócio não tá aquele coisa que a gente queria, mas a gente tá se virando.” Francis contou triste que sua arte não está vendendo tão bem neste momento. Ele faz luminárias com canos de PVC e vende outras peças como pulseiras, quadros e acessórios para decoração. Alguns destes objetos vêm da Nigéria, Quênia, Gana e Senegal.
Os desenhos são vazados nos canos de PVC e formam diversas figuras como estrelas, florais, nomes de bandas famosas, animais e também alguns símbolos de cursos de faculdades. Além dos desenhos, Francis faz pinturas nos canos, o que ele não revela de nenhum jeito como é a sua técnica. “Não quero concorrentes!”, explica a um cliente que pergunta como era feita a arte. Aprendeu este método assistindo a um programa de televisão aqui no Brasil. Quando veio morar em Canoas, resolveu experimentar e começou a inventar suas próprias luminárias. Hoje, sustenta sua família com as vendas em feiras e também no Brique da Redenção.
Este é o terceiro ano que ele expõe seu trabalho no Acampamento Farroupilha. Em um espaço de 9m², Francis reclama que todo ano o preço aumenta para expor na feira de artesanato: “É muito caro. Um metro é R$ 445. Eu acho que até o final da feira vale a pena. Ano que vem vou pegar seis metros e pagar pouco. Ano passado o preço de um metro não era tão caro assim, todo ano eles aumentam 20, 50 reais.”
Francis, Franca e, de vez em quando, Sandra também, estão na feira de artesanato diariamente, das 10h às 22h. Final de semana é das 10h às 23h30. Para ir para casa às vezes conseguem carona. Se der tempo, pegam o trem. A casa deles fica há um quilômetro da estação.
Preconceito no país é lamentado por Francis
De acordo com uma reportagem de 2014 no site do jornal O Globo, a Nigéria ainda é muito grande para ser ignorada, com um PIB de mais de US$ 500 bilhões, uma população de 170 milhões e muito espaço para crescer a longo prazo. Seu povo ainda é pobre e falta a muitos o acesso a serviços básicos, como bancos e telecomunicações. A infraestrutura do país é caótica e há problemas também em segurança, educação e saúde.
Francis diz que quer voltar para a Nigéria, sente saudades da família, e gostaria de juntar um pouco de cada país num só, pois gosta muito dos dois lugares. “Já fiz de tudo lá. Não tinha profissão fixa, fiz muita coisa lá. Aqui tá melhor pra mim. Só que se eu tivesse mais organização lá no comércio, acho que não teria o porquê sair lá. Começando vida lá foi mais difícil pra mim do que começar vida aqui."
Infelizmente, o preconceito ainda faz parte da vida de Francis e da sua família. Ele conta uma história rápida, que se repete em todos os lugares onde ele vende o seu trabalho. “O preconceito é aquele assunto, é uma coisa que não sei quando vai acabar. Eu não sei, mas a gente fica vivendo, né. Já tinha uma vez que eu tava na feira, uma pessoa chegou no meu cantinho, olhando meu produtos, e falou assim: ‘Vocês tá tomando conta do Brasil, né?’. Mas como ninguém me sustenta, então não dá pra dar bola.”
*As palavras que estão em itálico foram utilizadas para preservar a forma como Francis as pronuncia.
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