P/1 – Diego, você pode falar o seu nome completo, local e data de nascimento?
R – Diego Christiano Pila. São Carlos, 28 de outubro de 1978.
P/1 – Diego, seus pais são de São Carlos?
R – Sim.
P/1 – Seu pai e sua mãe?
R – Isso. Na verdade, meu pai é de Mogi Mirim, interior de São Paulo e minha mãe é de São Carlos.
P/1 – E seus avós paternos, são de onde?
R – Meus avós paternos são de Mogi Mirim.
P/1 – E seus avós maternos?
R – Maternos são de uma cidade chamada Novo Horizonte, que também é interior do Estado de São Paulo.
P/1 – Vamos falar um pouquinho agora do lado da família do seu pai. O que seus avós paternos fazem ou faziam? Qual o nome deles?
R – Meu avô é Lupércio Pila, ele sempre foi ligado à atividade rural. Nasceu na fazenda, foi criado na fazenda, sempre foi ligado a isso.
P/1 – Ligado como? Ele era o proprietário?
R – Sempre foi pequeno proprietário. Meu avô, meu bisavô era dono de fazenda. Teve vários filhos, aí os filhos continuaram com essa história, já com propriedades menores. E meu avô sempre foi dessa questão do pequeno produtor mesmo, tirava um pouco de leite, plantava um pouco de milho, coisas nesse sentido. E a minha avó sempre foi dona de casa, sempre ajudou meu avô muito no trabalho de roça mesmo, mas muito ligada a ele, nunca teve uma profissão.
P/1 – E seu pai? Ele ajudava quando era pequeno? Como era?
R – Meu pai foi criado também em sítio, mas teve uma condição de estudar, se formou em Contabilidade e teve a parte mais de migração pra cidade, né, já na geração do meu pai. Apesar que depois, com mais ou menos com uns 35 anos de idade, o meu avó adoeceu e não tinha quem cuidasse do sítio, o meu pai também não tava muito feliz com a profissão e meu pai retornou pro sítio pra cuidar disso também. Então...
P/1 – Quando ele retornou ele já era casado?
R – Já era casado. Na verdade eu tinha cinco anos de idade.
P/1 – Então você também foi morar lá.
R – Eu também fui, eu cresci no sítio também. Dos cinco aos 15 anos eu morei em fazenda, estudei em escola rural. A família toda tem um pé na roça (risos) bem forte.
P/1 – E do lado da família da sua mãe? O que seus avós faziam?
R – Meu avô sempre foi...
P/1 – Qual o nome dele?
R – João de Nuzi.
P/1 – Da sua avó?
R – Joselina de Nuzi. A família da minha mãe não tem muito essa questão, são mais urbanos. Meu avô já foi criado em São Carlos, na cidade mesmo. Foi sempre muito humilde e a profissão que ele adotou foi na metalurgia, soldador, esse tipo de coisa. E fez carreira durante a vida toda em uma empresa de tratores que tinha lá em São Carlos. Teve um aspecto mais urbano da minha família, era da minha mãe.
P/1 – Mas eles são todos brasileiros?
R – Todos descendentes de italianos. Tanto os Nuzi, que é da minha mãe, quanto os Pila, do meu pai.
P/1 – Eram bisavós?
R – Os meus bisavós são todos da Itália mesmo, são imigrantes. Da parte das duas famílias.
P/1 – Que época que eles imigraram?
R – Nossa, agora você me pegou. Mas eles vieram pra cá na adolescência. Mais ou menos 1920, 1930, nessas décadas, eles devem ter vindo pra cá.
P/1 – E vocês sabem onde eles foram trabalhar?
R – Não sei. Eu sei assim, o meu bisavô por parte de pai, que é o Luiz Antonio Pila, que é o mais conhecido, assim, patriarca da família, ele já veio pra essa região do interior de São Paulo, em Mogi Mirim mesmo, foi lá onde tem a concentração maior da família. Depois o meu avô acabou saindo, indo pra São Carlos, mas a concentração maior da família Pila é ali na região de Mogi Mirim. E ele já foi pra lá, quando ele começou a trabalhar na área rural, tal. Naquela época tinha essa questão de você arrendar a terra e tentar comprar a terra pra pagar com resultado da lavoura, esse tipo de coisa que alguns conseguiam crescer nessa questão de empreender e tentar depois vender o resultado da lavoura e tentar comprar um pedaço de terra, fazer alguma coisa nesse sentido. Foi como meu avô começou essa história de comprar uma propriedade e ali começar a tentar progredir na vida, né? Já o meu bisavô por parte da família da minha mãe, não tenho certeza, mas acredito que tenha ido diretamente pro interior de São Paulo, junto com a família. E ele, sim, já tinha uma vida bem mais rural. Acho que naquela época todo mundo era mais ou menos isso, né? E também trabalhou na roça, fez essa questão toda, mas a migração do campo pra cidade, eu acho que na família da minha mãe aconteceu uma geração antes, aconteceu já com o meu avô que já foi morar na cidade e teve uma vida mais urbana.
P/1 – E você sabe como seu pai e sua mãe se conheceram?
R – Sim. Eles se conheceram no trabalho. O meu pai trabalhou praticamente a vida toda, antes de retornar pro sítio, numa empresa grande de metalurgia lá em São Carlos, na área de contabilidade, que chama-se...
P/1 – Ele mudou pra São Carlos?
R – Meu avô.
P/1 – Ah, ele já tinha... Agora entendi.
R – Meu avô saiu de Mogi Mirim e foi pra São Carlos. Numa época em que ele e os irmãos compraram uma fazenda em sociedade em São Carlos. Saíram de Mogi Mirim e fizeram mais ou mesmo essa mesma história que acho que mais ou menos toda família fazia, né? De arrendar terra e depois tentar adquirir a propriedade com resultado futuro da plantação que eles faziam, esse tipo de coisa. Então, a família do meu avô migrou da região de Mogi Mirim pra São Carlos. Meu pai já teve essa questão de morar na cidade, fazer faculdade de Contabilidade e ele foi trabalhar nessa empresa em São Carlos. Minha mãe também trabalhava lá, meu pai trabalhava na Contabilidade, minha mãe na área de RH, acabaram se conhecendo na empresa e se casaram.
P/1 – Foram morar onde?
R – Em São Carlos mesmo, em uma casa que eles financiaram na época, juntos.
P/1 – Você chegou a morar nessa casa?
R – Sim, eu morei até os cinco anos de idade lá.
P/1 – E você lembra dessa casa?
R – Lembro.
P/1 – Como é que era?
R – Era uma casa simples, mas era bem bacana. Eu tenho flashes. Era muito criança, mas eu tenho flashes de acordar de manhã, meu pai saindo pra trabalhar e no final do dia meu pai costumava sempre chegar em casa chacoalhando a chave do carro. Tenho muito essas lembranças. Era muito bacana, mas logo que meu pai e minha mãe se casaram, naquela época o pessoal era mais machista, daí minha mãe parou de trabalhar e passou a se dedicar só à casa, família, esse tipo de coisa. Minha mãe deixou de trabalhar e meu pai continuou trabalhando na empresa durante algum tempo ainda.
P/1 – E você tem irmãos?
R – Tenho uma irmã, menor.
P/1 – Ela chegou a morar nessa casa?
R – Ela não, ela nasceu quando a gente já morava no sítio. Nós temos nove anos de diferença, uma diferença grande, né? Quando ela nasceu eu já tinha nove anos de idade e já fazia quatro anos que eu morava na zona rural. Ela nasceu lá.
P/1 – E como foi essa mudança? Sair de São Carlos, da zona urbana e seu pai retornar e você mudar pra lá? O que aconteceu, por que teve essa mudança?
R – Como eu era muito pequeno, não estava nem em escola nessa época ainda, com quatro, cinco anos de idade. Pra mim foi muito tranquilo. Na verdade foi bastante interessante porque passa a ser uma infância completamente diferente, você é criado no sítio, você tem outro nível de amizade com as pessoas, é muito diferente. E meu pai sempre gostou muito. Acho que pelo fato dele também ter morado em fazenda na infância, ter sido criado dessa forma, a história da minha família toda sempre foi trabalhando com sítio, esse tipo de coisa, eu acho que ele sempre foi um deslocado na área urbana. Então, foi uma decisão dele quando meu avô não tinha mais condições de trabalhar, de tocar o sítio. Foi uma decisão muito natural para ele assumir o lugar do meu avô e voltar pra morar na zona rural. Pra minha mãe que eu acho que foi um pouco mais complicado, né, porque ela sempre morou na cidade, tinha um estilo de vida mais urbano... Porque você muda completamente a sua vida, você não tem padaria, não tem bar, não tem vizinho, os vizinhos ficam distantes, é bem complicado. Mas depois ela acabou se adaptando também.
P/1 – E quem morava na casa?
R – Só minha família.
P/1 – Sua avó não estava lá?
R – Não. Quando meu avô ficou com o estado de saúde um pouco mais debilitado, eles passaram a morar na cidade, até pra ter uma proximidade mais de hospital, serviço médico, esse tipo de coisa. Então meus avós passaram a morar na cidade e a família do meu pai, a gente, foi pro sítio e assumiu a operação das coisas.
P/1 – O que era plantado no sítio?
R – Cara, é muito assim, é pequena propriedade mesmo, é praticamente uma subsistência. A gente fala de terras o pessoal pensa, é latifundiário. Não, era bem difícil, uma situação econômica bem justinha. Mas basicamente meu pai tirava leite, tinha uma quantidade de gado de leite, ele tirava leite todo dia e tem um esquema de cooperativa de laticínios que vem, compra o leite dos pequenos proprietários, faz o transporte, leva pra cidade. E plantação de cana, alguma coisa pra venda pra usina e uma boa parte pra utilizar na questão do gado que tem no sítio, e milho, basicamente, plantação de milho que uma parte era consumo interno e a outra era vendida. Era basicamente isso, plantação de cana, milho e gado de leite.
P/1 – Como era essa casa do sítio?
R – A casa do sítio era bacana porque era uma casa muito antiga, bem grande, aquelas casas que tem vários quartos, tem porão, era interessante do ponto de vista... Porque a gente era acostumado com uma casa bem menor na cidade, era uma coisa mais nova, mais urbana mesmo, e mudou pra uma casa histórica mesmo, coisa bem antiga. Aquele chão de madeira que faz um barulhão quando você pisa, aquela sala centralizada com os quartos em volta. Era uma casa bacana. Bem antiga, bem velha, mas era interessante.
P/1 – Você tinha família, além de vocês três que moravam lá e frequentavam a casa?
R – Não. Assim, o sítio do lado era de um tio meu, então duas, três vezes por semana era costume da minha mãe e do meu pai irem jantar na casa desse meu tio, na verdade tio avô, era irmão do meu avô, tio do meu pai. Ou ia tomar um café da tarde, ou ia jantar, ou eles vinham em casa. E meu avô costumava vir porque, na verdade, o sítio fica a dez quilômetros da cidade, não é uma distância muito grande. Pensando hoje que a gente mora em São Paulo (risos) é praticamente do lado. Mas meu avô também vinha com frequência pro sítio pra orientar meu pai, pra ver como as coisas estavam, duas a três vezes por semana também. Era mais esse contato com esse meu tio que tinha um sítio do lado e com o meu avô e minha avó que vinham pro sítio com uma frequência razoável.
P/1 – Quais eram suas brincadeiras de infância?
R – Olha, a gente tinha uma família que trabalhava pra gente no sítio, a gente chama de caseiro, eu tinha muita amizade com os filhos do caseiro. A gente jogava bola, andava a cavalo, nadava no rio, era bem vida de Chico Bento assim mesmo, sabe? (risos) Com sete anos eu já comecei a ir pra escola rural num distrito ali próximo. Às vezes, tinha muita atividade às vezes na escola, mas brincadeira de infância era muito futebol, bolinha de gude, andar a cavalo, andar pelo sítio, com o pessoal dos sítios vizinhos, filho de caseiro, duas, três pessoas, nunca era muita gente, não tem um ambiente com muita gente no local, mas era esse tipo de amizade que a gente tinha e esse tipo de atividade que a gente fazia.
P/1 – Tem algum fato que você se lembra da infância?
R – Ah, era muito interessante o fato que, por mais que a gente fosse, tinha uma vida bastante humilde também, mas a maioria das amizades que a gente tinha era com pessoas, com uma classe bem mais humilde que a gente também, que eram os filhos de caseiro, tal. Porque na verdade tinha vários sítios na região, mas a maioria era administrada pelos empregados, é difícil o dono do sítio que morava. A maioria dos sítios os proprietários moravam na cidade, iam e delegavam essa administração pra alguém que era contratado. E no nosso caso não, a gente era dono do sítio e morava lá. Então era interessante ter essa relação que uma proximidade muito grande com pessoas bem mais humildes que a gente. Isso foi um negócio bem legal da minha infância, foi bem construtivo do ponto de vista de se colocar no lugar do outro e ter essa relação com pessoas mais humildes com um nível de igualdade total porque eram as amizades que eu tinha.
P/1 – Como é que era a sua mãe?
R – A minha mãe sempre foi, digamos assim, a mandachuva da casa. Ela tem personalidade muito forte, muito austera. A gente fala que o meu pai não apita nada em casa, quem manda é ela. Então, ela sempre coordenou, sempre foi a personalidade forte da casa do ponto de vista de tomar as principais decisões, o que tem que fazer, o que não tem. Se a coisa não está legal ela sempre tomava a frente pra dar esporro em todo mundo e organizar a coisa. Ela sempre foi a personalidade mais forte da casa, sempre foi ela.
P/1 – E seu pai?
R – Duas pessoas com personalidade forte juntas não cabe, né? Então sempre tem que ter o mais ativo e o mais passivo. O meu pai é uma pessoa de uma tranquilidade super dócil, sempre tudo está bom, muito amoroso, muito carinhoso, mas sempre um contemporizador, sempre procurando deixar as coisas num clima mais ameno e tal. A minha mãe com uma personalidade mais forte, mais impositiva e meu pai sempre mais calmo, mais tranquilo, procurando colocar as coisas mais no lugar.
P/1 – Você teve educação religiosa?
R – Sim. Nos finais de semana aquela coisa básica do interior, mesmo, sempre. Meus avós, minha avó, principalmente, era muito católica, com uma formação católica muito forte, essa questão da italianada toda é mais ou menos assim. E ela sempre influenciou muito essa questão da vida religiosa, então, eu sou batizado, fiz catecismo, depois fiz crisma, fui do grupo de jovens da igreja, fui coroinha, fiz o ciclo todo, só não virei padre (risos), mas tive a formação religiosa católica, sempre teve uma força grande na minha família. Pelo menos até eu começar a ter um pouco mais de liberdade do ponto de vista de fazer as minhas escolhas. Depois a religião perdeu um pouco de força na minha vida, mas na infância era uma característica muito forte.
P/1 – E vocês comemoravam datas na sua casa, tipo Natal?
R – Ah sim, sempre comemoramos. Páscoa sempre era um momento de reunir a família. A família do meu pai era muito pequena, ele só tinha uma irmã que veio a falecer em um acidente de carro, então ele passou a ser filho único, depois de adulto já, mas passou a ser filho único. Mas a família da minha mãe já é bem maior, eles são cinco irmãos e todos moravam em São Carlos, na cidade. Então, essa época de Páscoa, Natal, é um momento que a gente fazia uma festa no sítio. A gente juntava, vinha a família toda da cidade, a gente fazia churrasco, esse tipo de coisa. O sítio, até por fugir um pouco do dia a dia das pessoas que moravam na cidade, sempre foi um ponto de encontro de unir a família, a família maior, então sempre Natal, Páscoa, Ano-Novo, algumas festas juninas de meio de ano era tradicional no sítio. A gente fazia um churrasco, fazia uma festa, chamava o pessoal da cidade pra todo mundo confraternizar.
P/1 – Política se discutia na sua casa?
R – Não. Nunca foi uma coisa forte dentro da minha casa. Assim, até eu, porque assim, na verdade eu fui o primeiro da minha família a efetivamente fazer faculdade. Meu pai na verdade se formou em Técnico em Contabilidade, então não teve essa experiência de passar por uma universidade pública e tudo o mais. Então eu acho que quem trouxe a discussão política de uma forma mais forte na minha casa fui eu, já na minha geração que teve essa possibilidade de ter uma vivência política, participar de centro acadêmico, diretório acadêmico. Sou formado em Relações Públicas com uma formação de Humanas muito forte, então você passa a conviver com essa questão política um pouco mais forte. Mas em casa, não. Antes dessa minha passagem pela faculdade, política nunca foi muito discutida, era muito no sentido daquela questão das pessoas serem influenciadas pela propaganda eleitoral, de ir com a cara de político a, político b, do candidato a, candidato b, e ser influenciado por isso, mas a discussão política forte dentro de casa nunca se teve.
P/1 – Você entrou com sete anos na escola. Como é que você ia pra escola?
R – A escola rural era interessante. Na verdade, a gente morava num sítio e a escola rural mais próxima que tinha era num distrito de São Carlos que chama Água Vermelha. Era uma escola estadual que tinha lá, mas era rural, e ela atendia todo o pessoal de fazenda do entorno, além do distrito. E a prefeitura colocava ônibus pra circular na rodovia, inclusive entrava em algumas fazendas maiores, na nossa não entrava porque era pequenininha. Esse ônibus fazia uma jornada todo dia. Acordar cedinho, muito cedo, madrugada, tipo cinco, cinco e meia da manhã. Aí meu pai me deixava, me levava até a porteira, que é a entrada da fazenda, que ficava na beira da rodovia, e dali o ônibus passava de madrugada, a gente pegava o ônibus, fazia a linha toda pegando a molecada toda das fazendas, isso demorava uma hora, uma hora e pouco pra fazer esse catado do pessoal todo, aí levava pra escola. A aula começava cedinho, sete horas, sete e meia, eu sempre estudei no período da manhã, aí tinha aula no período da manhã todo e depois na hora do almoço a mesma coisa, todo mundo entrava nos ônibus da prefeitura e distribuía todo mundo de volta, era uma jornada.
P/1 – Como é que era a escola?
R – Ah, era uma escola bacana, uma escola bem humilde, porque era a mesma característica das amizades que eu tinha próximo de casa ali. A maioria dos estudantes era filho de agricultor, de caseiro, filho do pessoal que trabalhava no campo mesmo. Então era muito humilde, mas era muito bacana. Eu sempre estudei em escola pública, tanto no primário, ginásio, colegial e depois na faculdade também, mas era um período que a escola pública tinha uma qualidade bacana, diferente de hoje, eu acho que realmente deu uma caída meio drástica. Eu tive bons professores que eu me lembro até hoje de boa parte dele, tive bons colegas de classe e era um clima muito bacana, eu gostava muito da escola que eu estudava, EEPG Professor Adail Malmegrim Gonçalves. Era muito engraçado, mas eu gostava bastante, foi um período muito bom.
P/1 – E das professoras, você lembra?
R – Eu lembro de algumas. Não é creche que a gente chamava, antes do primeiro ano tinha um ano de parquinho que a gente chamava, que era a Tia Cidinha. A tia Cidinha era muito engraçada, ela morava em Água Vermelha, era fantástica. Eu me lembro de alguns professores da primeira à oitava série. A dona Eurípedes, a dona Lilian, a tia Renata, eram professores muito bacanas, foi uma época bacana da vida.
P/1 – Tem algum fato que tenha te marcado, de alguma professora, alguma coisa na escola?
R – Eu era muito paparicado pelas professoras na escola, na verdade, porque eu sempre gostei muito de estudar, né? Meus pais sempre foram muito, assim, em casa era essa questão porque a gente nunca teve muito dinheiro, nunca teve essa questão, mas sempre teve: “Pra você crescer na vida o estudo é fundamental, você vai estudar. Eu e a sua mãe vamos fazer o que for preciso, mas o estudo é prioritário na sua vida e na vida da sua irmã”. Então sempre foi muito valorizado isso dentro de casa. Eu sempre fui um aluno muito bom por conta disso, sempre estudei bastante, sempre fui o primeiro da turma da primeira à oitava série, então, eu era muito paparicado pelas professoras, era uma situação engraçada. De vez em quando os amigos pegavam no pé, lógico, dava aquela tirada de sarro, mas eu me lembro da dona Eurípedes, por exemplo, ela me elogiava na sala, eu ficava morrendo de vergonha. Mas era uma situação, não sei se por ser uma escola rural, se por ser lá na década de 80 que as coisas eram um pouco diferentes mesmo, mas era uma relação com os professores muito, a gente chamava de tia e acho que considerava tia mesmo, sabe? As professoras cuidavam muito dos alunos, tinham uma preocupação com eles, com o que acontecia na casa dos alunos. Era uma proximidade muito legal, uma relação muito próxima. Não sei se porque era uma escola rural, a quantidade de alunos era menor, não sei se tinha uma aura um pouco diferente na escola porque eu fui estudar na cidade, na verdade, só no colegial, que tinha uma relação bem diferente. Então, esse período, esses nove anos que eu passei na Adail com esses professores foi um período muito legal, que tinha uma relação com os professores bem diferente do que eu vejo hoje. Era uma relação de família mesmo, muito legal.
P/1 – Do que você mais gostava na escola?
R – Eu gostava muito que tinha uma situação que era o seguinte, duas vezes por semana quem estudava de manhã ficava no período da tarde na escola, que era pra aula de Educação Física. Então, nesse dia você não voltava pra casa na hora do almoço, não pegava o ônibus da hora do almoço. Você ia pegar o ônibus pra voltar pra casa só no final da tarde com o pessoal que estudava na parte da tarde. Então eram dois dias por semana que o pessoal, os amigos ficavam soltos no distrito lá. Era o dia que a gente ia passear na cidade, ia nas lanchonetes que tinha, ficava circulando pela cidade, fazendo arte a tarde toda.
P/1 – O que vocês aprontavam?
R – Ah, era muita brincadeira, né? Era brincadeira de polícia e ladrão, quando a gente conseguia juntar uma grana pra tomar um lanche na lanchonete era uma super festa, isso de vez em quando a gente conseguir fazer. E jogava muita bola. Praticamente a gente tinha uma hora só de Educação Física, aí a professora ia, dava aquela parte mais chata dos exercícios e tudo o mais, mas fora isso a gente passava a tarde toda circulando pela cidade, brincando, jogando bolinha, batendo figurinha e jogando muito futebol, porque daí a gente tinha a quadra da escola, tinha o campo do centro comunitário à nossa disposição, então era o tempo, a tarde toda brincando, se divertindo.
P/1 – Você torcia pra algum time?
R – Sempre torci para o Corinthians. É uma tradição de família.
P/1 – Como é que você virou torcedor do Corinthians?
R – Política não se discutia em casa, mas futebol sempre foi muito importante (risos). O meu bisavô, o Antonio Pila, quando ele veio pro Brasil acho que o time que ele simpatizou na época foi o Corinthians, virou corintiano. Passou isso pro meu avô Lupércio, que sempre foi corintiano bem, bem apaixonado também. Eu lembro dele assim, assistindo jogos com meu pai, tal, e passou pro meu pai que também é corintiano fanático, que passou pra mim. Então é doença de família, não tem jeito. E é uma coisa muito forte na nossa família. Meus pais moram em São Carlos ainda, eu moro em São Paulo e eu costumo falar com meus pais duas vezes por semana por telefone. Então primeiro eu falo com a minha mãe, aí com a minha mãe eu pergunto como estão as coisas, se a minha irmã está bem, se meu avô, o único avô que eu tenho vivo, que é o materno, o João de Nuzi, pergunto se está tudo bem com ele, conversamos amenidades da família. E depois quando eu pego o telefone com o meu pai a gente só fala de futebol e só fala do Corinthians (risos) e xinga não sei quem, xinga o técnico, fala o que não está bom. A minha mulher fala: “Cara, você não tem outro assunto com seu pai?” “Não tenho” (risos), a gente só fala praticamente disso, é uma coisa muito forte na família essa questão do futebol e do Corinthians. E a minha mãe é palmeirense, por incrível que pareça. E ela é da palmeirense chata, na verdade ela nem liga muito pro Palmeiras, ela fica feliz se o Corinthians se ferra de alguma forma pra poder tirar sarro do meu pai, de mim e da minha irmã também, que acabou herdando essa questão de ser corintiana também muito forte.
P/1 – Você assiste jogo desde pequeno?
R – Desde pequeno.
P/1 – Pela televisão ou você ia em estádio?
R – Não, a gente sempre morou no interior, essa questão de estádio sempre foi mais difícil, né? Mas assim, sempre me lembro, desde pequenininho... Pra você ter uma ideia, quando eu nasci o meu pai pegou uma camisetinha do Corinthians, colocou na porta do quarto onde a minha mãe tava, tal e todo mundo que foi me visitar assinou a camisetinha do Corinthians e essa camisetinha tem lá, é uma relíquia dele, que ele guarda. Sempre foi muito forte. Eu me lembro da primeira vez que realmente, da importância de sentar, assistir a um jogo, ficar nervoso, torcer mesmo foi no Campeonato Brasileiro de 90. Mas antes disso sempre foi presente na minha família essa questão de assistir jogos pela televisão. Aí em 90 foi quando eu comecei, realmente, a ficar mais ligado, assistir jogos, ficar discutindo com o meu pai, ter essa questão do futebol ter uma importância maior pra mim. O meu avô João de Nuzi é sãopaulino, então sempre tentou me cooptar por outro lado do São Paulo. Então ele me dava camisetinha, eu até usava, mas eu lembro que depois, em 90, quando eu tinha 11 pra 12 anos foi quando realmente eu disse: “Não, não quero mais, não precisa me dar mais esse tipo de presente que eu não vou usar” (risos).
P/1 – E quando você era criança tinha algum jogador que era teu ídolo?
R – O meu primeiro ídolo do Corinthians foi o Neto, um cara que meu pai gostava muito. Era uma coisa muito forte porque o Neto é de Santo Antonio de Posse, que é uma cidadezinha do lado de Mogi Mirim. E meu pai quando era jovem jogou futebol, diz ele que foi muito bom, treinou na Ponte Preta. Naquela época o futebol não tem o glamour que tem hoje, antes era coisa mais de vagabundo, de quem não queria muita coisa com o trabalho, era outra perspectiva. Hoje os pais incentivam, se o moleque tem habilidade, o pai incentiva a treinar e a buscar o futebol. Naquela época era o contrário. Meu pai parece que tinha mesmo um certo talento, mas meu avô falou: “Nada disso, a gente está mudando pra São Carlos, tem uma outra coisa lá, você vai comigo, vai trabalhar, não vai ficar atrás desse negócio de futebol porque isso não dá futuro pra ninguém”. E o Neto é da mesma região, então meu pai sempre gostou dele. E ele foi um dos maiores ídolos do Corinthians, é até hoje. Ganhou o primeiro Campeonato Brasileiro pelo Corinthians em 90, então, acho que foi o primeiro grande ídolo, que eu tenho uma empatia muito grande, gosto muito dele até hoje. Apesar de hoje ele ter ficado um comentarista de futebol meio chato, mas foi o primeiro grande ídolo. Ele, junto com o Viola alguns anos depois, foram os dois que me chamaram mais atenção.
P/1 – E alguma partida que tenha te marcado?
R – Ah, recentemente a gente teve a Libertadores de 2012, que um peso que o corintiano sempre carregou o fato de não ter ganhado uma Libertadores e todos os outros concorrentes aqui de São Paulo já tinham, sempre disseram que a gente nunca ia ganhar e que ia ser eternamente o time sem passaporte, sem título internacional. Então esse título foi muito marcante, eu me lembro de ter sofrido muito, ter chorado muito, foi doído, mas foi muito bom.
P/1 – O que mudou na sua vida com o nascimento da sua irmã? Você diz que tinha nove anos.
R – Isso, tinha nove anos. Mudou bastante porque com nove anos eu acho que nem minha mãe, nem meu pai, tinham perspectiva de ter outro filho, acho que minha irmã foi meio temporã. Hoje, por exemplo, a minha mulher está grávida do primeiro filho, está com quatro meses, eu vou procurar evitar que tenha esse gap muito grande entre os irmãos porque eu acho que assim, eu tenho uma relação super bacana com a minha irmã, tal, mas a diferença de idade dificulta um pouco essa questão de ter uma ligação muito grande de dia a dia. Porque ela nasceu, foi aquele momento de dividir atenção, tal, mas eu já tinha nove anos de idade, já estava pensando em outras coisas. E quando ela foi crescendo, eu com 15 anos fui morar com meus avós pra fazer colegial na cidade porque a escolinha ia só até a oitava série. Então, além da gente ter uma diferença de idade muito grande, que a gente não vivia as mesmas coisas, não tinha o mesmo tipo de discussão, o mesmo tipo de problema, quando eu fiz 15 anos, ou seja, ela tinha seis, a gente parou de conviver diariamente porque eu fui morar com meus avós pra fazer colegial e ela continuou morando com meus pais. E quando eu fiz 18 eu passei no vestibular, fui estudar fora, em Bauru, e ela continuou em São Carlos. Então a gente sempre teve um convívio, amo minha irmã, tenho certeza que ela me ama, a gente se preocupa muito como está a vida do outro, mas a gente tem uma relação meio que à distância. Eu percebo uma diferença muito grande com a minha mulher e com o irmão dela que tem um ano de diferença e tem muito mais proximidade. É uma coisa que eu quero ver se na minha família eu dou uma corrigida nisso, os irmãos serem mais próximos de idade que eu acho que gera uma cumplicidade maior.
P/1 – E aí você saiu do sítio e foi pra São Carlos morar com seus avós. Como é que foi essa mudança?
R – Com 15 anos. Foi ótima porque eu sempre fui muito ligado com a minha avó. Minha avó sempre foi muito protetora, eu fui o primeiro neto das duas famílias, então sempre fui meio mimado. Mas a minha avó era o extremo, me defendia de tudo, não deixava ninguém me dar bronca. Ela sempre foi muito ligada comigo. Então, morar com a minha avó foi sensacional pra mim. Na verdade, foi uma mudança de vida muito grande porque tinha morado desde os cinco anos de idade até os 15 no sítio com outra perspectiva de vida, um universo muito diferente do que eu fui passar a conviver quando eu fui fazer colegial. Fui morar com meus avós, tinha uma certa liberdade maior porque meus avós, tanto meu avô quanto minha avó, minha avó sempre foi ligada muito a mim e sempre me protegeu muito, mas me dava bastante liberdade. E eu fui estudar numa escola pública que tinha, coisa que acho que nem existe mais, mas tinha uma espécie de vestibular pra entrar na escola pública porque era uma escola mais disputada, mais reconhecida. Então eu fui ter um tipo de vida completamente diferente, conviver com pessoas completamente diferentes, que tinham uma vivência de cidade a vida toda, eu era o cara que estava vindo do sítio, então, foi um crescimento muito grande pra mim, foi bem bacana. Foi um período de três anos que foi muito legal, não só pelo convívio com meus avós, principalmente com a minha avó, uma pessoa que eu amava muito, adorava muito, mas por essa nova experiência, de sair de um universo rural, com uma complexidade completamente diferente e ir pra cidade e ter outro nível de amizade, de pessoas, de convívio, de discussões. Foi quando eu fiz os meus melhores amigos, até hoje são os amigos que eu fiz nesse período do colegial. Passar a conviver com um ambiente urbano foi muito diferente. É a época que você começa a sair à noite, a conhecer bebida, toda essa coisa, foi uma mudança muito efervescente pra mim, esse período dos 15 aos 18 anos.
P/1 – Você ia em festas, o que você fazia, como você se divertia?
R – Tinha muito essa questão de todo fim de semana os amigos se reuniam pra programar o que iam fazer na sexta e no sábado. Às vezes, tinha festa na casa de um dos amigos ou de um conhecido que a gente acabava indo. Ou ia prum bar, pra uma boate, boate tudo nas matinês. Porque a gente não tinha nem idade, isso com 16 anos, 17. Foi uma mudança bem, bem drástica na minha vida, mas que foi muito interessante porque acho que tive a sorte de cair num grupo de pessoas muito legais que ajudaram a formar muito da minha personalidade nesse período, com essas amizades que foram feitas nessa fase da minha vida.
P/1 – Como era São Carlos nessa época?
R – Muito parecida com o que é hoje, eu acho (risos). São Carlos hoje tem 200 mil habitantes, é uma cidade de médio porte do interior de São Paulo, com uma presença universitária muito forte, tem uma Universidade Federal, tem uma USP, são universidades muito grandes. É uma cidade muito tranquila, mas que sempre teve uma questão de ter... na época que você está no colegial, você sabe que tem as festas universitárias, então você quer ir, a gente combinava de às vezes ir meio escondido, e era a molecada que ficava no canto da festa vendo a festa acontecer, isso era muito bacana. E ao mesmo tempo é uma cidade muito tranquila que a gente costumava muito, estudava na parte da manhã, na parte da tarde a gente juntava o grupo que gostava de jogar futebol, ia pras quadras das universidades passar a tarde jogando futebol. A minha vida sempre foi com meus amigos, brincadeiras muito ligadas a esporte, nunca fui muito de ficar jogando video-game, acho que nem era tão forte nessa época também. Sempre muitas atividade outdoor, a gente sempre gostava muito de caminhar pela cidade, de ir pro centro, de ver o que estava acontecendo, de se reunir pra jogar bola ou vôlei, sempre foi muito essa questão de atividade ligadas ao esporte, a gente sempre gostava disso. E a cidade sempre foi uma cidade muito boa de se viver.
P/1 – Você já tinha vindo pra São Paulo, você conhecia São Paulo?
R – Eu fui conhecer São Paulo quando eu passei no concurso da Petrobras.
P/1 – Você nunca tinha vindo?
R – Nunca tinha vindo pra São Paulo. Nossa, eu lembro direitinho a primeira vez que eu cheguei de ônibus na estação do Tietê. Eu tinha me informado direitinho que eu tinha que pegar o metrô e descer na estação Brigadeiro, pra da estação Brigadeiro andar X quadras e ir pro prédio da Petrobras pra fazer o exame admissional. Cheguei, aquela cidade doida, grande. Nesse período, quando eu terminei o colegial eu passei no vestibular e fui morar em Bauru. Morei em Bauru sete anos.
P/1 – Eu vou voltar um pouquinho. E namorada, você tinha namorada? Qual foi sua primeira namorada?
R – Minha primeira namorada foi no colegial, no terceiro colegial, mais ou menos no meio do ano assim foi que arrumei a primeira namorada. E nessa época era muito engraçado porque é a época em que a mulherada só quer saber dos homens mais velhos e a gente... Aí eu e o meu grupo de amigos sempre fomos os patinhos feios, não arrumava mulher de jeito nenhum (risos). Quando eu consegui conquistar essa menina, que era da minha sala, comecei a namorar, foi quando os amigos, mais ou menos, começaram a namorar as meninas da sala, três amigos começaram a namorar três meninas da sala. Mas foi legal, eu namorei vários anos com ela, sete anos. Aí não resistiu à crise dos sete e a gente acabou se separando. Mas aconteceu muita coisa nesse meio tempo, a gente começou a namorar, com seis meses de namoro eu mudei de cidade, fui pra Bauru fazer faculdade, o namoro resistiu aos quatro anos de faculdade, mas não resistiu quando eu entrei na Petrobras e tive que morar no Rio de Janeiro, aí ficou insustentável, não deu certo.
P/1 – E nessa época do colegial, você tinha alguma coisa em em mente? “Eu quero fazer faculdade de tal coisa, eu quero ser tal coisa quando crescer”?
R – Até por essa questão que meus pais sempre valorizaram muito a questão do estudo, eu sempre tive claro que eu queria fazer faculdade. Eu nunca gostei muito de Exatas, sempre tive preferência por Humanas, então eu sempre pensei em fazer ou Administração ou Publicidade. Publicidade porque eu sempre gostei de Comunicação e pra quem é leigo, Comunicação é basicamente ou Publicidade ou Jornalismo, né? Eu gostava mais de Publicidade. E na época do vestibular, naquele último ano, que é o assunto: “O que você vai prestar, o que você vai fazer, quais cursos você vai prestar”, aí eu comecei a ler o manual da Unesp e li pela primeira vez sobre o curso de Relações Públicas. Eu achei muito interessante porque eu achei que o profissional de Relações Públicas, pelo menos no texto lá da revistinha da Unesp, era meio que uma mistura do profissional de Administração com o profissional de Publicidade, trabalhava um pouco a gestão, esse tipo de coisa. Gostei e falei: “Vou prestar isso daqui que eu acho que é interessante”. Isso é uma coisa que vale a pena falar também, foi interessante porque eu tava decidido a não prestar vestibular ao final do terceiro colegial porque achei que não tava preparado: “Não, não vai dar certo, não vou prestar, vou gastar dinheiro à toa. Estudei a vida toda em escola pública, não fiz o Terceirão, não fiz aquele reforço que o pessoal costumava fazer, não vou prestar vestibular. Ano que vem faço cursinho e daí eu vejo com mais calma essa questão”. Mas uma das nossas professoras, a professora de Matemática, professora Romana, ela pegou um dia e, engraçado que eu nunca gostei de Exatas, mas eu sempre estudava, aquela coisa, decorar fórmula pra aplicar direitinho pra não errar. E ela resolveu, estava muito próximo do Vestibular: “Olha, o aluno que tirar a maior nota nessa prova vai ganhar a inscrição da Vunesp”. Aí, sem pretensão nenhuma fiz a prova e acabei tirando a melhor nota naquela prova específica, que eu nunca ia bem, mas quando as coisas têm que ser, têm que ser, né? Aí ganhei a inscrição da Vunesp, fiz a inscrição em Relações Públicas sem pretensão nenhuma, fui com meus amigos em Araraquara prestar o vestibular. Prestei e passei no vestibular. Foi tudo muito assim, falam que quando as coisas têm que ser, elas têm que ser, né? Eu não ia prestar vestibular naquele ano, prestei porque ganhei a inscrição e acabei prestando vestibular pra uma profissão que eu não sabia direito muito o que era, mas tinha achado interessante em ler num catálogo do vestibular, e acabei passando no vestibular. Uma coisa que nem a minha família estava preparada praquilo, pra eu mudar de cidade de uma hora pra outra. Mas acabou dando certo e por coincidência alguns amigos meus que foram fazer Engenharia em Bauru, a gente acabou se organizando pra morar junto e acabou que a coisa deu certo e fluiu.
P/1 – Você prestou vestibular em Araraquara, mas a faculdade era em Bauru.
R – Isso, era em Bauru. Você presta pelo campus da Unesp mais próximo da sua cidade. Pelo menos na época o vestibular era assim, não sei como é agora. Mas Araraquara era a universidade da Unesp mais próxima de São Carlos, aí a gente foi prestar lá pra fazer a faculdade em Bauru. Foi outra mudança drástica na minha vida, muito legal. E inesperada, mas super bacana, muito bom.
P/1 – Como é que foi mudar pra Bauru, como era Bauru?
R – Ah, essa época também eu considero a melhor época da vida. Acho que de todo mundo, né, época de faculdade. Pra mim foi uma gradação, sair do sítio, vir morar em São Carlos, já pra uma vida bem diferente, depois com 18 anos saí de São Carlos e vim morar numa república com mais cinco pessoas em Bauru. E foi muito, muito legal. Foi a fase de maior aprendizado da minha vida, sem dúvida. Teve a questão de saber aproveitar o momento, mesmo com uma grana muito curta porque meus pais, acho que não estavam nem preparados pra me manter morando longe de casa, esse tipo de coisa, foi uma época de muito sacrifício financeiro pra minha família, foi bem difícil mesmo desse ponto de vista. Logo no segundo ano eu já fui procurar estágio pra ajudar a me sustentar, tal, mas foi um período fantástico e morar sozinho, longe de casa, com total responsabilidade por mim mesmo. Aprender a conviver com outras pessoas. Você morar numa república, seis homens morando numa república era um caos. Foi muito legal essa questão de você aprender a impor seus limites e a respeitar os limites dos outros.
P/1 – Como vocês dormiam, como é que era a casa?
R – Era uma casa de três quartos que a gente fazia dupla, cada dupla dormia em um quarto, a gente dividia tudo. Mas era muito legal. Eu falo assim, você aprende a ser gente quando você sai de casa e vai morar numa república porque daí... todo mundo está experimentando uma liberdade maior pela primeira vez, então, é a época de muita festa, de muita bebida, de estudar, de ver se é aquilo mesmo que você quer, conviver com pessoas diferentes. Acordar junto, dormir junto. Acho que é o maior estágio probatório que uma pessoa passa antes do casamento. Mas foi muito legal porque, por mais que tenha tido pessoas de convívio mais difícil, também fiz grandes amizades junto com esses amigos que eu fiz no colegial, as outras minhas maiores amizades são as pessoas com quem eu convivi durante esse período, que foi, com exceção de uma ou outra mudança, foram as mesmas pessoas que moraram durante cinco anos na mesma república. Teve uma mudança de uma pessoa que saiu e entrou outra no lugar, mas eram seis rapazes morando juntos os cinco anos. Ninguém se matou, todo mundo sobreviveu, então foi tranquilo. E além dessa questão do convívio, eu acho que você fazer uma universidade mesmo, a mudança que você tem enquanto pessoa é muito grande. Eu falo que a faculdade é quando você vai efetivamente aprender a pensar, a questionar algumas coisas, a ter uma formação política, a participar de... Sempre gostei de participar do diretório acadêmico da minha faculdade, do centro acadêmico, sempre foi um crescimento muito grande. Acho que esses quatro anos de faculdade, por tudo o que representaram, apesar das dificuldades que também existiram, foi uma época fantástica.
P/1 – Como que era o curso?
R – Eu me formei em Relações Públicas, então ele tem uma formação humanística muito forte, você tem Antropologia, Filosofia, Sociologia. E a Unesp de Bauru tem essa característica que a gente, depois convivendo com profissionais de Relações Públicas de outras universidades, de outras faculdades, ela tem essa questão da formação de dar uma prioridade pra formação humana, ou holística, do aluno muito maior em detrimento de uma formação necessariamente técnica. Os nossos professores sempre falaram: “Aprender a organizar um evento, fazer um cerimonial, fazer um planejamento de comunicação, a gente te dá a base e você vai aprendendo no mercado, não adianta você querer aprender isso aqui. Aqui a gente quer te ensinar a ser uma pessoa que pensa, que raciocina, que problematiza as coisas, que tem uma visão, sim, política do que você está fazendo, cultural”. Por eu sempre ter sido mais ligado a essa questão da área de Humanas, pra mim foi muito bacana. Lá que eu digo que eu me formei enquanto pessoa política, foi a formação da faculdade que mudou completamente a minha visão de mundo em relação a isso.
P/1 – Futebol você continuava assistindo (risos).
R – Sempre. O futebol sempre, nunca foi deixado de lado na minha vida porque, como todo brasileiro, o futebol é muito forte.
P/1 – Copa do Mundo, qual a primeira que você lembra?
R – Eu tenho vagas lembranças da Copa de 90, mas a de 94 foi muito marcante. Eu já tinha 16 anos, era adolescente, já entendia direito e foi a Copa que o Brasil foi campeão. Essa Copa eu me lembro muito bem. Uma coisa que eu não esqueço assim era o Romário, que sempre foi um cara que gostei muito no futebol, ele sempre teve uma opinião muito forte – aliás os meus ídolos são esses meio bandidinhos, né, Neto, Romário, Ronaldo. E Romário deu uma entrevista no Fantástico antes da Copa, isso eu não esqueço. Depois que o Brasil foi campeão eu falei: “Esse cara é muito bom mesmo”. Ele deu uma entrevista no Fantástico falando assim: “Eu assumo a total responsabilidade pelo resultado do Brasil na Copa do Mundo. Se perder, podem vir cobrar de mim e se ganhar também podem dar os parabéns pra mim”. Ele é todo marrento, né? É uma declaração bem dele essa, mesmo. Mas depois ele fez tudo o que ele fez na Copa do Mundo, foi um negócio sensacional, metia gol em todo jogo. Foi a Copa do Mundo do Romário mesmo, essa daí. Eu me lembro muito, muito, de acompanhar todos os jogos, de torcer muito. Aquele jogo contra a Holanda que teve aquele gol de falta do Branco que o Romário desvia da bola, quase quebrei a mesa de casa quando eu tava assistindo e saiu aquele gol. E na final com aquela decisão nos penaltis chorar muito, muita, muita tensão. Essa final eu lembro que eu já tava morando em São Carlos pra fazer colegial, mas meus pais moravam no sítio ainda e foi a família toda pro sítio pra fazer o churrasco e assistir a final da Copa. Eu lembro que todo mundo muito tenso em casa, a cara dos meus tios assim, aquela decisão por pênalti. E depois que o Brasil ganhou todo mundo chorando. A minha primeira lembrança de Copa muito forte foi em 94. E também fortemente influenciada pelo fato da gente ter sido campeão, né? E ter sido o primeiro título que a minha geração viu, né? Porque o último tinha sido em 70, muito tempo atrás, eu não tinha nem nascido. Foi muito forte, 94 foi muito forte. Eu, como todo grande torcedor de clube, de time, a gente coloca sempre a seleção em segundo plano. Pra mim, por exemplo, eu torço pro Corinthians, a minha paixão é pelo Corinthians. Seleção eu gosto, acompanho, mas não dou muita importância. Eu percebo que os amigos que eu discuto futebol e que são torcedores fanáticos também têm essa questão. Mas na época de Copa do Mundo tudo muda, né? Na época de Copa do Mundo você realmente incorpora e acho que daí você torce pra seleção tanto quanto você torce pelo seu time. E essa seleção de 94 eu acho que puxou muito isso, foi muito legal.
P/1 – Você disse que gostava bastante de esportes na adolescência. Olimpíadas você acompanhava?
R – Olimpíadas menos. Vou te falar assim, eu gosto muito de esporte, mas pra mim, futebol é futebol e os outros esportes são os outros esportes, tipo, não dá pra comparar uma coisa com outra (risos). Eu falo que o restante é... Você já viu o Brasil ser campeão de basquete ou vôlei e parar a cidade, fazer carreata, todo mundo comemorar, sair na rua, fazer festa? Não existe isso. O que o futebol representa pra cultura brasileira e pro brasileiro, a distância é abissal do restante dos esportes, não dá pra comparar uma coisa com outra. Então assim, gosto de Olimpíadas, às vezes eu me empolgo numa final do Brasil no vôlei, no basquete, tal, acho interessante, torço, vibro, mas não dá pra comparar uma coisa com a outra, futebol é futebol, o restante é o restante, não tem a menor chance de equilibrar as coisas.
P/1 – Vamos voltar lá pra faculdade. Aí você diz que no segundo ano você conseguiu estagiar. Como é que foi fazer esse primeiro estágio?
R – Foi muito bacana. Era um estágio assim, eu fiquei lá um ano e meio, eu acho, mas era um estágio bem simples. Era numa imobiliária de Bauru, que eles na verdade pegaram um estagiário de Comunicação pra cuidar da parte de anúncio de imóveis deles. Na verdade era escrever os anúncios dos imóveis da imobiliária, mas acabei me envolvendo um pouquinho na área de eventos porque tinha parceria com construtora, às vezes tinha evento de lançamento de um imóvel ou de um prédio, então me envolvi um pouco nessa área de eventos. Mas foi legal, eu trabalhava pro Turcão, nome dele. Mas ele era tipo turcão de barba, quase dois metros de altura, forte, gordo, bravo pra caramba, dava esporro em todo mundo, todo dia, nos corretores de imóveis, em todo mundo. Era meio assustador trabalhar com ele, mas foi uma experiência legal, acho que ele me ensinou que chefe é chefe e tem que respeitar. Depois eu dei muito mais valor pros chefes que eu tive depois (risos) que eu nunca tive chefe tão bravo, tão ruim quanto ele, então, foi bom pra dar essa valorizada no que a gente tem hoje. E aí eu fiquei lá um ano e meio e de lá eu já emendei um outro estágio, numa empresa de transporte de passageiros e de cargas, uma empresa muito forte lá na região de Bauru, chama Expresso de Prata, o jornal da cidade é deles, a rádio da cidade é deles, transporte de passageiros, tal. Por um acaso o dono é um ex-deputado muito forte lá da região. De lá eu fiz um estágio, mais um ano e meio, até eu concluir o curso e foi meu primeiro emprego também, eu fui efetivado lá e trabalhei lá durante três anos como assessor de marketing, dava toda essa parte de relacionamento com cliente, comunicação, assessoria de imprensa, publicidade, cuidava de tudo que tinha a ver com comunicação mesmo, que era uma estrutura bem enxuta, né? Trabalhei lá durante três anos até passar no concurso da Petrobras.
P/1 – Nessa época você tinha vontade de sair do interior, vir pra São Paulo, outra cidade?
R – Sim, tinha muita vontade. Foi uma época que eu tentei algumas vezes participar daquele programa de trainee de Volkswagen, Natura, Shell. Aquela época de final de faculdade que você não sabe muito bem se você vai conseguir emprego, se não vai. Eu estagiava, mas não era certeza que eu seria contratado. E eu sempre tive vontade porque eu achei que pra crescer profissionalmente de uma forma bacana eu precisava ir pra uma grande empresa. E grandes empresas, a maioria não está no interior. Eu sempre pensei ir pra um grande centro e fazer carreira numa grande empresa, era uma vontade que eu sempre tive. Uma coisa que eu também não comentei e que eu acho que foi importante pra minha formação, eu sempre morei com cinco engenheiros, então eu era a ovelha negra da república, você imagina o quanto eu sofria. O aluno de Comunicação, vagabundo, maconheiro, que não quer saber de nada, estuda à noite, acorda não sei que horas. E esse nível de comparação, de ter cinco engenheiros morando juntos foi muito bom para eu ter essa visão mais profissional da carreira, entendeu? Eu via que os caras estavam preocupados em crescer, em ir pra grandes empresas e fazer uma carreira legal. E eu acho que esse nível de comparação, me tirar um pouco do nível de comparação só do pessoal da área de Humanas e ter esse envolvimento com o pessoal da área de Exatas, que tem o raciocínio mais lógico, uma visão mais cartesiana do mundo foi bom para eu conseguir equilibrar mais as coisas. Acho que foi uma coisa que me serviu de um norte legal do ponto de vista profissional. Foi bem legal essa convivência com engenheiros, com o pessoal de Exatas, acho que complementou um pouco a minha formação intelectual. Então, sempre tive esse anseio de quem é do interior, de família humilde e tal, tem que estudar, entrar numa empresa boa e fazer carreira, então sempre tive isso. E não tive sucesso nos três ou quatro programas de trainee que eu tentei entrar, fui efetivado no Expresso de Prata e fui trabalhando, fazendo ali a minha carreira, mas sempre com uma vontade de ir pra uma coisa maior, de ir pra uma cidade maior, uma empresa maior, pra poder realmente crescer um pouco mais profissionalmente. Era uma vontade que eu tinha, sim.
P/1 – Aí apareceu esse concurso da Petrobras.
R – E daí também, essas coisas, algumas passagens da minha vida que sempre me marcam. Essa questão de não vou prestar vestibular esse ano, ganhei a inscrição, prestei e acabei passando. Quando eu vim fazer a matrícula, era o último dia pra fazer a matrícula no curso, eu vim de carona com dois amigos meus que haviam passado também, na verdade o irmão dele já estudava em Bauru, esse meu amigo tinha passado em Engenharia Civil, eu em Relações Públicas e a gente tava indo fazer a matrícula no último dia. O carro quebrou na estrada e se perdesse a matrícula naquele dia provavelmente ia perder o curso. Aí eu peguei carona com um caminhoneiro que estava indo pra Bauru, ele me deixou na porta da Unesp, tipo, faltando meia hora pra encerrar as inscrições, aí eu fui e fiz a matrícula. Também altas aventuras, tinha que dar certo. E na questão da entrada na Petrobras também teve um pouco disso. Eu não tava sabendo do concurso, mas a gente tinha uma lista de e-mails do pessoal da faculdade e uma amiga minha divulgou esse concurso pra lista de amigos do grupo de e-mail. Uns cinco ou seis se interessaram em prestar o concurso, daí a gente prestou e quando saiu o resultado do concurso eu vi que eu tinha ficado em quarto lugar.
P/1 – Que ano foi isso?
R – O concurso eu prestei em 2001, fui entrar na Petrobras em 2003. Mas aí, saiu o resultado do concurso, fiquei em quatro lugar e tinham quatro vagas. Aí comemorei, pô legal, vou pra Petrobras, tal. Mas tinha uma questão no concurso que o quarto lugar perdia a vaga pro deficiente físico melhor colocado. Aí eu falei: “Putz, não vai ser dessa vez ainda”. Mas tinha um período que eles poderiam chamar pra lista de reserva. Mas como essa época eu ainda tava morando em república, tal, porque continuei morando em república depois que terminou a faculdade, trabalhando. E a gente mudou de uma casa pra outra e eu esqueci de atualizar os meus dados na Petrobras, pra questão de receber o telegrama, esse tipo de coisa. Quando eles foram me chamar mandaram o telegrama, o telegrama nunca chegou até mim. Por sorte, numa sexta-feira, era mais ou menos umas seis horas da tarde, tocou, eu tava já fechando as coisas no trabalho pra ir pro bar pra tomar uma cerveja com os amigos, tocou o celular e era uma pessoa do RH da Petrobras falando: “Olha, você não recebeu um telegrama tal, tal?”, eu falei: “Não, não recebi” “Então, você está sendo chamado pra assumir o seu cargo aqui na Petrobras, só que houve várias tentativas de tentar entrar em contato contigo que não foram bem sucedidas e você tem que estar aqui na segunda-feira, que é o seuo último dia”. Uma ligação pra celular na sexta-feira, quase seis horas da tarde. Eu falo que o que tem que ser tem que ser mesmo, não tem como. Hoje conhecendo a Petrobras eu fico imaginando qual a chance de alguém do RH da Petrobras ligar seis horas da tarde pra um telefone celular. É muito pouco. Daí foi aquela correria, falei com a minha chefe, levantei a documentação e na segunda-feira peguei aquele ônibus e vim conhecer São Paulo pela primeira vez, fazer os exames admissionais.
P/1 – Vamos retomar. Qual foi sua impressão chegando aqui?
R – Eu tenho flashes. Flash de chegando na cidade, vendo muito prédio, muito carro, que por mais que Bauru seja uma cidade já maior, não tem essa questão do trânsito de São Paulo. E depois a rodoviária, aquela rodoviária enorme do Tietê, aquela coisa assustadora. Nunca tinha andado de metrô, fui andar de metrô pela primeira vez também. Achando tudo super complexo, super difícil. Como é que eu vou conseguir dar conta? Mas aí tudo estudadinho, direitinho, conversei com a minha chefe na época da Expresso de Prata, que era já uma pessoa mais, com uma vivência de São Paulo, ela me explicou as coisas direitinho. Descendo na Estação Brigadeiro, conhecendo a Avenida Paulista pela primeira vez, aquela coisa grandiosa, bonita, né? Descendo a Brigadeiro, o prédio da Petrobras nessa época não era na Paulista, era na Rua dos Ingleses, ali na Vila dos Ingleses. Descendo a rua, chegando, fazendo os primeiros... Eu tenho essas imagens muito frescas na minha cabeça, do meu primeiro contato com São Paulo sendo uma coisa tão angustiante e nervosa como foi, tipo, recebi uma ligação na sexta-feira e segunda-feira ter que estar em São Paulo que era o último dia pra fazer a inscrição, senão eu perderia a vaga. Foi tudo muito nervoso, mas tenho esses flashes bem claros, foi muito legal. Quando tudo deu certo, quando eu assinei o contrato, foi muito legal. Aí eu me lembro também que a coisa que a memória afetiva que a gente tem que é muito forte. Eu lembro que quando tudo deu certo eu assinei meu contrato de trabalho na Petrobras, eu saí de lá andando por São Paulo, conhecendo e é pertinho do Shopping Pátio Paulista. Aí entrei no shopping também, um shopping daquele tamanho nunca tinha visto, e tem uma choperia, chama Braugarten, acho. Eu lembro assim: “Eu vou tomar um chope de que tudo deu certo, que bom, coisa boa”. Aí tomei o chope nessa choperia, hoje eu moro ali perto, moro no Paraíso, a gente frequenta o shopping. Toda vez que eu passo em frente à choperia eu lembro do episódio, o primeiro chope que eu tomei em São Paulo pra comemorar, foi muito bom. Uma passagem interessante também.
P/1 – Aí você voltou pra Bauru.
R – Aí voltei pra Bauru, na verdade, só pra fazer... Porque quando eu saí da reunião eu já tinha data pra me apresentar no Rio de Janeiro. Já te dão um número de tíquete pra você agendar a passagem aérea, toda a parte organizada. Então, eu já sabia que eu tinha que voltar pra Bauru pra encerrar minhas coisas lá no Expresso de Prata, acho que tinha uma semana ou 15 dias pra fazer isso, pra avisar o pessoal da república que eu tava saindo, tava tudo meio que sabendo, né, mas não sabia datas ainda. Aí voltei pra Bauru basicamente pra ter essas duas semanas pra me organizar, organizar minha vida pra ir pro Rio de Janeiro.
P/1 – Como é que foi a chegada no Rio?
R – Foi muito legal também. Nessa época, hoje em dia está bem diferente, mas era uma época, entrei na Petrobras em 2003, era uma época de vacas gordas, era bem diferente. Era a época que a Petrobras tinha retomado a questão do concurso público, que tinha ficado um bom tempo sem contratar ninguém, do período que foi a recém eleição do Lula, que voltou a ter investimento forte na Petrobras e acreditar nela como estatal. Foi um concurso público que chegou muita gente junto. Nessa chamada de profissionais do meu concurso, entre jornalistas, publicitários e relações públicas, chamaram 40 pessoas. E não era só da área de Comunicação, chamaram pessoal de Engenharia, Geologia, Administração, advogados. Então chegou todo mundo no hotel no Rio de Janeiro, no Guanabara, chegaram umas 300 pessoas que haviam entrado na Petrobras na época. Foi uma semana que a gente ficou hospedado no hotel e tinha durante o dia todo palestras, aulas com os gerentes da Petrobras, com o pessoal da Petrobras explicando como é que funciona, como é que não funciona a empresa, o que a empresa faz, o que a empresa esperaria das pessoas, tal. Foi um período de uma semana dessas palestras e logo depois começou o que a Petrobras chamava de “Curso de Formação”, que foi durante seis meses. O pessoal de cada área passou a ter o que eles chamam de nivelamento de conhecimento. Eles deram praticamente um MBA de Comunicação.
P/1 – Aí vocês ficaram seis meses no hotel?
R – Seis meses. Seis meses morando em hotel e praticamente só estudando na Universidade Petrobras.
P/1 – E qual foi a sua impressão ao chegar no Rio de Janeiro? Igual teve a de São Paulo, como é que foi no Rio?
R – No Rio foi assim, é uma cidade muito diferente, né? Foi muito bacana, no Rio me chamou mais a atenção a questão que foi um novo período de faculdade quase, esses seis meses. Um monte de pessoa, todo mundo chegou vindo de várias regiões do país, convivendo no mesmo espaço, num período só pra estudar. Foi um período que a gente conseguiu conciliar muito, conhecer a cidade, se divertir, conhecer os pontos turísticos, ir pra praia, conhecer os bares, conhecer a Lapa, conhecer a vida boêmia do Rio de Janeiro junto com um período de estudo porque, com certeza se a gente tivesse ido já direcionado diretamente pra começar a trabalhar com responsabilidades, com chefe te cobrando e tudo o mais, não ia ter sido um período de adaptação tão bacana como foi no Rio de Janeiro. Foi um período de muito convívio social. Hoje a Petrobras não tem mais isso por questões de custo, tal, está num outro momento, mas foi legal que o que se construiu naquele grupo ali de profissionais que entraram naquela época foi uma questão de amizade muito forte. E aquelas pessoas ficaram seis meses juntas, estudando, convivendo, criando um laço forte entre elas e depois de seis meses as pessoas se espalharam pela empresa. Tem gente que foi pra Manaus, pro Nordeste, pro Sul, pra São Paulo, foram trabalhar nas refinarias, alguns foram...
P/1 – Como era feita essa escolha de local?
R – Durante os seis meses a gente teve aulas e provas, então foi feito um ranking de acordo com as notas que você tinha. Na verdade era assim, o peso um da decisão era o fato da pessoa escolher o lugar e o gerente que faz a entrevista pra levar a pessoa também escolher a pessoa. Porque tem muito essa questão das pessoas quererem voltar pra sua terra, né? Por exemplo, se eu tenho um profissional de Comunicação que é de Fortaleza, quer voltar pra Fortaleza e tem uma vaga lá pra ele voltar, a preferência era dele em detrimento de uma outra pessoa que também, um paulista que diz “Quero morar em Fortaleza”. A vaga era preferencialmente da pessoa que tivesse retornando pro seu local de trabalho. E se houvesse duas pessoas, aí pesava o ranking das notas que tiveram durante esse curso de formação. Mas a questão da nota dificilmente foi usada, normalmente se chegava a um acordo entre a pessoa que queria a vaga, o gerente que estava disponibilizando a vaga e se tivesse mais de um interessado as pessoas negociavam, procuravam chegar num acordo. Foi nessa época que depois de seis meses eu voltei pra São Paulo.
P/1 – Você queria vir pra São Paulo?
R – Naquela época sim, queria ficar mais perto da família, tal. Aí eu voltei pra São Paulo pra trabalhar no escritório de Comunicação da Petrobras aqui em São Paulo. Fiquei três anos trabalhando aqui e depois eu voltei pro Rio de Janeiro, fui promovido pra uma função de coordenador, me ofereceram ir pro Rio e nessa época eu entendi que era importante ter uma passagem pela sede da empresa pra entender como as coisas funcionam. Voltei pro Rio de Janeiro, morei seis anos lá trabalhando na área de Publicidade.
P/1 – Você foi morar onde?
R – Morei no Botafogo. Aluguei um apartamento lá de uma colega da Petrobras e sempre morei... De lá mudei pro Flamengo pra um outro apartamento que a gente alugou quando a minha atual esposa foi pra lá, mas sempre morei ali, Botafogo, Flamengo, perto do metrô, relativamente perto da Petrobras. E nessa fase eu realmente me apaixonei pelo Rio, acho o Rio uma cidade fantástica. Voltei pra São Paulo depois de seis anos, já estou há dois anos em São Paulo, mas o Rio de Janeiro foi uma cidade que me conquistou muito, pretendo um dia voltar pra lá pra morar lá. Paulista, às vezes, tem uma certa dificuldade de se adaptar, eu tive uma certa dificuldade cultural durante seis meses, mas depois desses seis meses, se fosse por uma questão simplesmente de cidade eu não voltaria pra São Paulo em relação ao Rio. O Rio hoje acho que é uma cidade que você tem muito mais qualidade de vida, você tem uma convivência com as pessoas muito mais saudável, com a cidade, com o trabalho, é um pouco diferente. O paulista é mais workaholic mesmo.
P/1 – E quando você voltou pra cá você cresceu novamente na carreira?
R – Aí foi uma oportunidade profissional, eu vim pra assumir uma Gerência Regional.
P/1 – Mas isso é convite, alguma prova?
R – É convite, na verdade é um cargo de confiança. Aí acho que é muito parecido com a iniciativa privada mesmo. Você tem lá o pessoal todo trabalhando, o seu trabalho é avaliado pelos níveis superiores e a partir do momento que você tem alguma oportunidade, de uma pessoa que se aposenta, de uma pessoa que muda de área, o Gerente Executivo, que é quem tem essa prerrogativa de ter uma visão mais ampla da força de trabalho dele vê a pessoa que melhor se encaixa naquela vaga e nessa época eu recebi o convite pra voltar pra São Paulo pra assumir essa Gerência Regional. E daí é uma oportunidade de crescimento profissional que era importante pra mim na época, eu aceitei e estou há dois anos de volta aqui nessa loucura.
P/1 – E você conheceu sua esposa quando?
R – Eu conheci minha esposa na minha primeira passagem por São Paulo, aqui na Petrobras. Ela era estagiária, mas não da área que eu trabalhava, deixar isso bem claro, uma outra gerência.
P/1 – Qual foi a primeira vez que vocês se viram?
R – A gente conviveu no ambiente de trabalho um bom tempo, sei lá, vários meses. Na verdade, numa determinada oportunidade que a gente foi num evento junto a gente acabou ficando junto e tudo o mais. Mas foi na Petrobras que eu a conheci.
P/1 – E ela se efetivou na Petrobras?
R – Não, acabou que não. Ela fez o estágio e na Petrobras por essa questão de entrar por concurso público, os estagiários nunca são efetivados. Hoje ela trabalha com assessoria de imprensa, ela também é Relações Públicas. Dois Relações Públicas, um casal, tem que ter muita comunicação (risos). Mas ela seguiu a carreira dela na iniciativa privada.
P/1 – Quanto tempo vocês estão casados?
R – Por coincidência hoje completa quatro anos. A gente se conhece há sete, mas somos casados há quatro anos.
P/1 – Teve festa, como foi o casamento?
R – Sim, teve. Ela é de Pindamonhangaba, interior de São Paulo, uma outra região, e quando a gente se casou tem essa questão, né, no interior tem que ter festa pros parentes, não tem jeito. Teve festa, teve igreja, teve o pacote completo. Foi divertido também, mas acho legal, é um investimento que vale a pena, o negócio fica marcado na memória também.
P/1 – E vocês têm filhos?
R – Não. Ela está grávida do nosso primeiro filho, vai ser o primeiro. Está de quatro meses.
P/1 – Quais são seus maiores desafios profissionais hoje lá na Petrobras?
R – Eu acho que a Petrobras é uma empresa que te oferece muitas oportunidades e muitos desafios. Hoje, o desafio da Comunicação, eu trabalho com Comunicação, é muito grande no sentido que a gente é responsável pela imagem e pela reputação da empresa, seja trabalhando com Publicidade, Assessoria de Imprensa, Eventos, Comunicação Digital, Relacionamento Corporativo. Em todas as ferramentas que a gente tem, hoje a gente é responsável pela imagem e pela reputação da companhia. E uma empresa do tamanho da Petrobras, uma empresa que tem todas as implicações políticas que uma empresa do tamanho da Petrobras tem, até por ser uma empresa de controle do Governo, isso é um desafio muito grande, né? Porque a gente, seja por questões técnicas, seja por questões políticas, a gente apanha todo dia da imprensa, da oposição, no caso da política. A gente muitas vezes é utilizado pelo Governo Federal como viabilizador de políticas econômicas. Tem uma pressão muito grande em cima da Petrobras no sentido de ser a locomotiva do desenvolvimento do país, por ser a maior empresa do Brasil, por ter um plano de investimento de 220 bilhões de dólares, tudo é muito grande na Petrobras, inclusive as responsabilidades que se tem em relação a isso. Então a gente é muito cobrado nesse sentido e, do ponto de vista do meu trabalho, do trabalho de quem está na área de Comunicação Institucional da Petrobras, que é responsável por fazer essa gestão da imagem e da reputação, é um desafio diário de estar conversando com os públicos, de estar esclarecendo as coisas, estar dando a versão da empresa sobre o que está acontecendo, é uma luta, não é fácil, não.
P/1 – Diego, quais são seus maiores sonhos hoje?
R – Ah, hoje eu estou muito influenciado pela questão do filho, né? Tudo é filho, tudo é filho. Hoje a minha preocupação é muito de conseguir criar o meu filho, a minha filha, a gente não sabe ainda o sexo, com uma situação de poder dar, por exemplo, coisas que meus pais não puderam me dar, que é essa questão muito de valores, de acreditar muito na questão que o estudo e o trabalho é fundamental, de você ter tranquilidade e valorizar outras coisas que não sejam só essa questão do consumo, do ter, do fazer, conseguir prover uma boa educação pra ele, conseguir toda essa questão de saúde e tudo, a preocupação, enquanto você é responsável só por si mesmo acho que a vida é muito mais fácil do que quando você passa a ser responsável por outra pessoa, né? Eu tenho essa preocupação, eu sei que meu filho vai ter uma experiência de vida, uma experiência de crescimento, muito diferente da que eu tive. Da tranquilidade que eu tive de ser criado no sítio, na roça, de ter uma outra, não existia internet, não existia essa pressão, não existiam as redes sociais, essa questão toda que eu acho que é muito preocupante, acho que a sociedade ainda não se resolveu em relação a isso ainda, acho que é uma coisa que é inexorável, não vai mudar, não tem como voltar, mas as pessoas ainda não criaram uma forma saudável de lidar com isso. Então tudo isso me preocupa. A gente passa a ter mais medo de decisões que a gente toma porque não vão influenciar mais a nossa vida. Mas eu sou uma pessoa bastante simples, eu quero ter uma vida tranquila. Meu sonho é ter uma vida tranquila, estável financeiramente, mas também não quero ganhar rios de dinheiro, não é o meu objetivo. É conseguir ter uma vida tranquila, confortável e poder dar uma vida tranquila e confortável pros meus filhos, mas com uma preocupação grande nessa questão que eu acho que é o grande diferencial das pessoas que são os valores que a gente vai conseguir passar. Acho que é fundamental isso, coisas muito de pai e mãe. Eu vejo muito questão do comportamento que os filhos refletem o que receberam dos pais, isso não tem como. Então, eu vejo muito a preocupação que meu pai sempre teve tipo: “Não se importa muito com o que os outros falam, aja com o que você considera certo. Seja uma pessoa correta, bota a cabeça no travesseiro à noite e dorme tranquilo. Não faça nada que você possa se arrepender, não faça nada pra prejudicar os outros”. Essas coisas sempre foram muito presentes na minha vida e eu quero conseguir transmitir esses valores que eu recebi dos meus pais pros meus filhos. Acho que isso é meio caminho andado.
P/1 – Diego, a gente falou de pedaços da sua vida. Tem alguma coisa que a gente não tenha tocado e que você acha importante deixar registrado? Algum fato, qualquer época.
R – Acho que foi bem completo. Conseguimos falar de fases da minha vida, foi legal porque foi resgatando até na hora.
P/1 – O que você achou da experiência de contar a sua história aqui no Museu da Pessoa?
R – Achei bem bacana, bem legal. A forma como é conduzido eu consegui pegar coisas que me marcaram na infância, na adolescência, na fase adulta, as principais passagens da minha vida, acho que a gente conseguiu falar, foi bem bacana. Algumas coisas que eu nem lembrava direito, mas que na forma como a gente foi conversando acho que acabaram surgindo, foi bem legal, gostei bastante.
P/1 – A gente queria agradecer a sua presença aqui.
R – Imagina, eu que agradeço.
FINAL DA ENTREVISTA
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