Nasci em Belém, Palestina em 29 de novembro de 1923. Em 1912, meus pais migraram de Mido, aldeia nas montanhas do sudeste da Turquia para a Palestina, passando pelo norte da Síria e Líbano. Após um ano de viagem - caminhavam à noite e se escondiam de dia -, eles e outras famílias chegaram em...Continuar leitura
Nasci em Belém, Palestina em 29 de novembro de 1923.
Em 1912, meus pais migraram de Mido, aldeia nas montanhas do sudeste da Turquia para a
Palestina, passando pelo norte da Síria e Líbano. Após um ano de viagem - caminhavam à noite e se escondiam de dia -, eles e outras famílias chegaram em Belém.
Meu avô materno era padre da Igreja Sirian Ortodoxa. Foi o último padre de sete gerações de padres na família de minha mãe.
Éramos ao todo oito irmãos, uma irmã mais velha e sete irmãos, sendo eu o filho homem mais velho.
Minha família e eu mudamos para Jerusalém em 1928. Estudei em uma escola comunitária da comunidade assíria durante três anos. A escola ensinava os idiomas aramaico, árabe e inglês.
Depois, passei a estudar na escola inglesa Saint George, muito conhecida na Palestina. Era dirigida por um bispo inglês da Igreja Anglicana. Lá estudavam crianças inglesas, assírias, judias, árabes, armênias, etc.
Devido a difícil situação financeira da família em 1939 fui procurar emprego. Caminhando
pela Rua São Paulo, onde morava, avistei uma placa oferecendo emprego de lavador para aquele fim de semana na Associação Cristã de Moços Militar Inglesa (ACM Militar). Candidatei-me, trabalhei por dois dias na última semana de maio e me convidaram a voltar nas férias.
No dia 13 de junho de 1939, já de férias, fui efetivado na
ACM Militar e lá fiquei por seis anos.
Em 1944, na véspera de Natal, a ACM resolveu festejar as duas datas
- a Véspera de Natal e o Primeiro Centenário da ACM -, com um almoço. O sósia do Marechal Bernard Montgomery era o convidado de honra.
Naquela madrugada, sob muito frio, um major polonês bateu à porta quase chorando pedindo comida, pois há um dia não comia nada. A cozinha já estava fechada, mas providenciei uma refeição para ele. Ficou imensamente grato e naquele momento sequer imaginava que um dia nos reencontraríamos.
Em 1918, os ingleses obtiveram mandato das Nações Unidas para administrar a Palestina (não era considerada colônia). Havia pessoas de 32 diferentes nações morando na Palestina entre 1938 e 1947, quando o Estado de Israel foi criado pela ONU.
Em 1949, teve início a guerra entre árabes e judeus. Para não morrer, a família toda fugiu para Beirute, capital do Líbano, somente com a roupa do corpo. Ali fiquei um ano desempregado. Por falta de documentos não podíamos viajar para outros países. Posteriormente, descobri que seria possível viajar com passaporte jordaniano.
Topei a parada e embarquei no dia 17 de agosto de 1949 com destino ao Brasil. Viajei no navio turco Ancara de Beirute a Marselha. Viajei de trem a noite toda a Bordeaux, onde fiquei uma semana até a partida do navio francês Kergulen para Santos.
Estudava espanhol no navio, até que um amigo que conheci no navio me disse que no Brasil se falava português. Joguei o livro de espanhol no mar. Cheguei em Santos em 12 de outubro de 1949. No dia seguinte estava na cidade de São Paulo. Jantei na casa dos dois irmãos deste amigo que encontrei no navio. Eles eram os
donos da fábrica de cosméticos Palermount que se situava na Rua 13 de Maio, no Bexiga. Me levaram de volta para o hotel na Rua Florêncio de Abreu e escreveram em um cartão para mim: “Bom dia, onde fica a Rua Libero Badaro?”
No dia seguinte, troquei de terno e esqueci o cartão do hotel no bolso do terno que usava no dia anterior. Fui procurar o meu amigo George Romanos, que havia migrado antes de mim, na loja da Rua Líbero Badaró, mas não o encontrei naquele momento.
Encontrei o Miguel (meu futuro cunhado) na porta da loja. Ele só falava português. Depois chegou o seu irmão Gabriel com um amigo e este último falava árabe e aramaico. O Miguel me trouxe um prato com pêssegos e uvas e
duas xícaras de café. Ligaram para a casa deles e a Dna. Estela, minha futura sogra, me disse que me esperava a seis dias e que me levassem para a casa deles. Era na Av. Jabaquara, 817. A Eva não estava lá. Dna. Estela me beijou e me convidou para almoçar: arroz, feijão com grandes pedaços de carne, salada e bife. Fiquei lá até às três horas da tarde e voltei para a loja. Logo chegou da chácara o Sr. João Gabriel, meu futuro sogro. Ele conversou comigo em aramaico e me convidou para mudar para a casa dele. Quando cheguei, a Raimunda, empregada da família me viu e disse, “chegou o noivo da Eva”. Só vim a conhecer a Eva no final do dia, pois ela também estava na chácara.
Trabalhei durante dois meses na rua, vendendo frutas. Só deu prejuízo.
Um dia fui ao escritório de advocacia do Dr. José Sales de Faria à Rua Barão de Itapetininga, 50, 2º andar, sala 22. Ela me auxiliava a tirar a carteira de identidade. Ele não estava lá. Eu estava sem documentos; pois eles haviam sido enviados à Delagacia de Estrangeiros à Rua Barão de Limeira. Desci a Rua Barão de Itapetininga sentido Praça Ramos de Azevedo. Olhava a vitrine do Mappin e notei que um senhor me observava. Era alto forte e com aparência de militar europeu.
Graças àquela refeição na noite de 24 de dezembro de 1944, ele me arranjou um emprego de recepcionista noturno do Lord Hotel. Trabalhei lá durante cinco meses. Depois passei a trabalhar na Philco Rádio e Televisão.
Em 1952, meus pais e irmãos vieram ao Brasil.
Casei com a Eva em maio de 1953. Estamos casados há quase 52 anos. Temos três filhas e um filho e três netas e um neto.Recolher