P1 – Giovana, começando agora, apesar de eu já ter falado seu nome, por favor, qual seu nome completo, onde você nasceu e a data.
R – Meu nome é Giovana Machado Bizzotto. Eu nasci em Brasília (DF), dia 30 de janeiro de 1992.
P1 – E o nome dos seus pais?
R – Minha mãe...Continuar leitura
P1 – Giovana, começando agora, apesar de eu já ter falado seu nome, por favor, qual seu nome completo, onde você nasceu e a data.
R – Meu nome é Giovana Machado Bizzotto. Eu nasci em Brasília (DF), dia 30 de janeiro de 1992.
P1 – E o nome dos seus pais?
R – Minha mãe chama Cláudia Machado dos Santos e meu pai, Fernando Bizzotto.
P1 – Você sabe a origem da sua família, Giovana? Eles nasceram em Brasília também ou vieram de outro lugar? Os pais deles, da sua mãe e do seu pai.
R – Os meus avós, a maioria veio de Minas e só o pai da minha mãe que veio do Espírito Santo. E aí minha mãe nasceu no Rio, mas foi pra Brasília muito nova. Com um ano só, ela já foi pra Brasília. O meu pai é de BH (Belo Horizonte - MG) e foi pra Brasília depois dos dezoito anos, mais ou menos.
P1 – Seus pais se conheceram em Brasília?
R – Isso. Eles trabalhavam juntos, no Ibge (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
P1 – Você sabe por que seus avós foram pra Brasília? Talvez seja pela construção [da capital federal]. Se você puder detalhar um pouco.
R – O que eu sei é que o meu avô trabalhava como empreiteiro e aí ele foi pra Brasília exatamente pra construção.
P1 – Seus avós por parte de pai, só o seu pai, né, que foi pra lá? Morava no Espírito Santo e foi pra lá?
R – Não. Meu pai morava em Minas, é de BH, e foi pra Brasília. Meus avós por parte de pai, eu não conheci. Faleceram antes de eu nascer.
P1 – Qual a atividade deles, Giovana, dos seus pais? Você disse que eles trabalharam no Ibge, mas outras atividades, atualmente?
R – Não. Meu pai continua no Ibge e a minha mãe conseguiu já [se] aposentar, tem alguns anos.
P1 – Você morando em Brasília, nascida em Brasília, quais eram os costumes da sua família? Você, seus pais, avós...
R – Qual era o quê? Não escutei, desculpa.
P1 – Costumes da sua família, quais eram?
R – Na verdade, assim: meus avós moraram em Brasília durante a maior parte da minha infância e aí, o pouco que eu lembro dessa época, era a gente indo pra lá, pra casa dos meus avós maternos, nos fins de semana.
P1 – Ia só você, sua família ou tinha primos, tinha mais gente que ia também, nos finais de semana, lá?
R – Então, a família da minha mãe é meio espalhada e aí, o único primo com quem eu tive mais contato, era um que morava com os meus avós. A mãe dele e ele moravam com os meus avós. Então, quando a gente ia no fim de semana, era eu, minha mãe, meu pai e o meu irmão, que é mais velho, que tem a idade do meu primo. Então, a gente ficava só nós três, de primo.
P1 – E nesses encontros familiares, quando vocês se encontravam na casa dos seus avós, tinha alguma brincadeira diferente, especial? Lembranças que marcaram essa época?
R – Brincadeiras, não muito, porque, como eu disse, meu irmão e meu primo eram mais ou menos da mesma idade. Eu acabava ficando um pouco de lado (risos) e eles ficavam brincando. Mas uma coisa que eu lembro muito dessa época, principalmente dessa casa, é da minha avó, na cozinha. Então, muitas vezes, quando eu ficava de lado, acabava ficando na cozinha com a minha avó. Ou no quarto, com a minha tia, mas, normalmente, era na cozinha com a minha avó.
P1 – E por que esse interesse de ficar mais na cozinha com a sua avó? O que acontecia, nesse momento?
R – Eu nem sei, na verdade, se era um interesse meu, propriamente dito, ou se era ela que via que eu ficava sozinha e já me puxava pra cozinha. Mas o que eu lembro, assim - que a minha memória não é muito boa -, é dela sempre arrumando a mesa do café da tarde. E o que eu mais lembro desse café da tarde é o chá que ela fazia e que eu bebo até hoje. (risos) Eu comecei a gostar por causa dela, que é um chá mate: todo dia ela fazia e colocava na mesa pra gente.
P1 – E além desse chá mate, o que tinha de bom?
R – O que eu lembro, assim, não era muito saudável, que era sempre alguma porcaria: (risos) chocolate, ela devia fazer bolo [também]. Mas o que eu lembro era o chá, mesmo, é uma memória, assim, fortíssima. E uma coisa que eu sempre comi por causa dela também, que é leite condensado com Toddy, (risos) que ela me dava, pra poder me deixar alegre, porque eu ficava sozinha por causa dos meninos. Aí ela me dava umas porcarias extras. (risos)
P1 – Muito bom. E na sua casa, como era a convivência com você, seu irmão? Quais eram seus costumes? Fala um pouco do cotidiano de vocês.
R – Em casa, meu irmão, apesar de ser oito anos mais velho do que eu, sempre foi muito amigo, né? Ele sempre brincou comigo, apesar da idade e do gênero também, né? Ele brincava de boneca. Nunca deixou eu falar isso pros amigos dele, mas agora algumas pessoas vão ficar sabendo. (risos) Ele sempre foi muito gente boa, assim, teve muita paciência. Sempre brincou e deu atenção e, na época, os amigos dele também tinham irmãos da minha idade, que não faziam a mesma coisa, então eu tenho isso, que o meu irmão foi ‘o’ diferente, na época. Mas é isso: a convivência, em casa, era muito boa até certo ponto, mas, assim, com meu irmão, sempre foi muito boa.
P1 – E você, em relação às brincadeiras dos meninos, tinha alguma coisa que ele fazia, que você gostava e fazia junto, aprendeu com ele?
R – Do meu irmão, até que não, porque, assim: ele brincava mais das minhas coisas, né? Das minhas brincadeiras. Quando ele tinha o tempo dele, estava, normalmente, no computador, porque ele sempre foi muito de eletrônico. Inclusive, trabalha com isso hoje. Então, desde aquela época, ele já ficava muito no computador, essas coisas. Ou então ele saía com os amigos. E eu, obviamente, não tinha condição de acompanhar. (risos) Mas de brincadeiras, assim, que ele e o meu primo faziam, né, quando a gente estava na casa da minha avó, era brincadeira com carta, algumas coisas ou eles se vestiam de alguma coisa, pra fazer palhaçada pra mim, mas, assim, não tenho muita lembrança. (risos)
P1 – Com seus pais… Você lembra de momentos, assim, com seu pai, com sua mãe, que até hoje foram marcantes pra você? Que você convivia com um ou com outro, ou trouxeram aprendizados pra você ou trazem lembranças [que] foram marcantes? Você pode contar pra gente?
R – Sinceramente, (risos) eu não tenho muita lembrança. Eu tenho umas lembranças muito picadas, assim. Então, eu lembro muito [de] uma época [em] que eles começaram a construir uma casa - eu já não era tão criança, eu devia estar com uns onze, não sei - num condomínio e a gente ia pra lá nos finais de semana. Nessa época, meus avós já tinham saído de Brasília. Então, o final de semana mudou de lugar. (risos) Mas, e aí a gente fazia churrasco, ficava lá e tinha uma área boa, com aquelas piscinas desmontáveis, não sei. E aí é a lembrança que eu tenho, assim. A partir dos onze, dez anos, a gente já ia pra lá.
P1 – Eles trabalhavam? Se você puder contar um dia da sua casa, o cotidiano. Eles trabalhavam fora? Então, se você puder contar um pouco desse cotidiano. Se você brincava na rua também ou não, mas esse cotidiano da sua casa.
R – Então, teve um momento, né, antes deles separarem - que eles se separaram, não sei se eu falei -, que eles saíam cedo pra ir trabalhar e teve uma época que eles almoçavam em casa, aí então almoçávamos nós quatro juntos, né? Eles dois, eu e meu irmão. Aí, a partir de um momento, não lembro quando exatamente, não sei se foi antes ou depois deles se separarem, mas aí eles pararam de almoçar em casa. Ficou meio complicado de ir pra casa pra almoçar, então acabou que ficou só eu e meu irmão pra se virar com o almoço. (risos) E aí teve essa época que a gente... Meu irmão, no caso, fazia alguma coisa, assim, que já tinha sido adiantada pela minha mãe, (risos) pra gente almoçar. Depois de uma época, a gente começou a comer em restaurante mesmo. E aí a gente meio que perdeu essa coisa de comer sozinho... De comer junto, né? Aí acabou que cada um começou a se virar.
P1 – As brincadeiras de vocês, além dessas que você já contou pra gente e além dessas brincadeiras com seu irmão, do que mais você brincava, na sua infância? Se era sozinha, se era com amigos.
R – Como eu morava em Brasília, a gente... Eu não sei se era um costume geral, mas lá em casa a gente não tinha... Não tive muito essa coisa de ir pra rua, que, na época, já era perigoso. Então, as brincadeiras que eu tinha ou eram na escola e algumas, assim, embaixo do prédio. Típica menina de apartamento, né? Então, as poucas vezes que eu brinquei na rua foi fugida, escondida da minha mãe e aí eu tinha que ficar perguntando a hora pros outros, na rua, que a hora que desse dela estar voltando pra casa, eu correr pra casa e fingir que nada tinha acontecido. [Essas] foram as brincadeiras de rua, as poucas que eu tive foram assim. O resto eram com pessoas do próprio prédio ou vizinhas do prédio e a gente acabava brincando embaixo do prédio mesmo. Não era tão divertido, mas era o que tinha. (risos)
P1 – E essas de rua que você fugia, conseguia brincar um pouco, depois voltava correndo, teve algum dia assim que teve algum episódio, até hoje é lembrado?
R – Ai, eu lembro de um dia que foi exatamente isso: de eu perguntando o horário o tempo todo, eu estava mais preocupada com o horário do que com brincar e ficava perguntando o horário pros outros, pra poder voltar pra casa antes dela chegar, pra ela não saber que eu tinha saído. (risos) É a única lembrança que eu tenho, das poucas vezes que saí. E a gente ficava jogando bete (jogo de taco). Era só isso: jogava bete e saía correndo pra casa.
P1 – Giovana, a família toda migrou, voltou pra Minas ou só você que veio pra Mariana (MG)?
R – Então, o meu pai foi pro nordeste. Resolveu ir pra lá, antes de aposentar. Ele está pedindo aposentadoria agora. Então, eu vim em 2011 pra Belo Horizonte (MG), na verdade, e a minha mãe veio em 2012, pra ficar comigo. E só. Meu irmão continua em Brasília e é isso. (risos)
P1 – Qual o motivo da sua ida pra Mariana?
R – Pra Mariana, especificamente, o meu atual marido, na época, era namorado - marido, mas a gente não é oficial, né? -; a gente se ‘juntou’ (passaram a morar juntos), pra vir pra Mariana. Ele conseguiu um trabalho aqui, aí a gente resolveu ‘juntar’ e eu vim junto. Foi isso aí. Rápido, assim. (risos)
P1 – Vocês vieram de Brasília... Ele era de Brasília também?
R – Não.
P1 - Então, conta de Brasília [ou] se você foi pra algum outro lugar, onde vocês se conheceram, enfim, até chegar em Mariana.
R – Eu mudei pra BH, em 2011, e comecei a faculdade de Arquitetura lá. E aí a gente se conheceu em 2012, num encontro de arquitetura. Eu fazia uma faculdade, ele fazia outra e aí, nesse encontro, a gente se conheceu. Depois de um tempo, começamos a conversar e tudo o mais, começamos a namorar e aí a gente já tinha uns cinco anos… Agora eu não vou fazer as contas, mas a gente já tinha por aí, quase cinco, e resolveu ‘juntar’, pra vir pra Mariana juntos, porque ele aceitou o trabalho. E aí a gente achou que ia ficar um pouco complicado ele em Mariana e eu em BH. (risos)
P1 – Você, mudando de Brasília pra BH, sentiu que mudança? Que impressões que você teve, nessa mudança? Na sua forma de viver, as diferenças entre os próprios lugares também. Como foi essa mudança?
R – A principal coisa que eu sempre falo, quando me perguntam qual cidade que eu prefiro, é com relação a mobilidade, porque em Brasília é tudo muito longe. Eu não morava no Plano, que é o que todo mundo conhece. Sempre morei numa cidade satélite, próxima ao Plano, mas, mesmo assim, como eu disse, lá tudo é muito longe. Basicamente, você precisa de um carro ou de um transporte que demora... Pelo menos, na minha época, demorava bastante, né? Não sei, não acredito que tenha melhorado muita coisa, mas talvez tenha aumentado [a] frota, alguma coisa desse tipo. Mas como tudo é muito longe, esse transporte é muito difícil. Então, a gente acabava ficando muito ali, naquela cidade satélite, que é como se fosse, [a] grosso modo, um bairro. Então, não tinha essa facilidade de locomoção. Já em Belo Horizonte, eu consigo andar a pé, pegar um ônibus com muito mais facilidade. Então, a principal mudança, pra mim, foi isso. E a questão de encontros, também, porque quando você vai marcar com alguém de sair, você tem essa facilidade, (risos) que quando você está em Brasília. Pelo menos… Eu saí de lá com dezenove, dezoito anos. Então, foi na época que eu começaria a sair e tudo o mais e seria um problema, com certeza, porque teria que pegar um transporte pra ir pro Plano e coisas que dificultam um pouco a vida. E em Belo Horizonte, a gente tem essa facilidade, tanto pra resolver problemas, quanto pra viver. A gente tem essa mobilidade, melhor.
P1 – Você falou de encontrar pessoas aqui em BH, [que] isso é muito mais possível, prático. Antes de ir pra BH, voltando ainda pra Brasília, você disse que brincava, enquanto criança, mais naquele ambiente do seu prédio. E quando você foi ficando adolescente, na juventude, como é que você fazia pra se divertir?
R – Quando eu comecei a entrar na adolescência, estava praticando vôlei na escola, então o meu círculo de amigos acabava que era as pessoas que estudavam comigo ou que jogavam comigo, então a gente acabava encontrando na escola, mesmo. Pra mim era muito mais fácil encontrar com todo mundo na escola. Então, quando eu não estava em casa, estava na escola, basicamente.
P1 – Além da escola, tinha algumas outras atividades?
R – Eu tinha o vôlei que, pra mim, foi a parte mais importante da minha adolescência, (risos) que eu ficava, sempre que possível, na escola, pra isso. E nos finais de semana teve uma época que eu ia à igreja. E aí tinha esse círculo também, mas aí era só no fim de semana. Então, era bem separado. Durante a semana, eu ficava com os amigos da escola, do vôlei e, no final de semana, ia pra igreja, encontrar com as pessoas da igreja.
P1 – Igreja católica ou...
R – Evangélica.
P1 – Mas vamos falar do vôlei, então, antes. Você disse que era uma atividade muito importante pra você. Conta um pouco desse momento do vôlei, como você começou, o que aconteceu de bastante importante nesse período.
R – Então, eu comecei a jogar vôlei - acho que foi - com uns treze anos, se eu não me engano. E aí tinha o que a gente chamava de escolinha, na escola, [que] era umas duas vezes, três vezes... Duas vezes por semana, à tarde. Alguma coisa assim. E aí a gente foi jogando tanto, foi empolgando. Um grupo foi empolgando e gostando tanto do vôlei, que a gente acabou criando um time. O professor montou um time pra gente começar a competir. Então, teve essa época, que eu treinava à tarde, que era a escolinha e aí, depois, a gente começou com o time, então eu treinava à tarde e à noite. (risos) Então, essa parte, pelo menos pra mim, na minha lembrança, assim, foi a mais importante. E aí a gente começou a competir, mesmo, com as escolas lá do entorno e foi uma fase ótima, mais por essa convivência, mesmo, de time e tudo o mais. Então, quando a gente ia fazer alguma coisa, acabava fazendo todo mundo junto.
P1 – Giovana, você conseguiria descrever pra gente essa sensação, essa relação com o vôlei? Que você disse o quanto era importante pra você, mas de que forma?
R – Não sei se eu vou conseguir (risos) descrever exatamente, mas acho que essa sensação de grupo, de sempre ter aquelas pessoas por perto, era uma coisa muito boa, porque, se eu não me engano, esse time durou uns dois anos direto, assim. Então, foram dois anos com as mesmas meninas perto e aí sempre falando de vôlei. (risos) Não sei explicar, mas pra mim foi uma fase importante, muito, por causa disso, dessa questão coletiva, mesmo, de grupo, de amizade e tudo o mais.
P1 – E em relação à competição, propriamente, às competições, teve algum momento, assim, que foi bastante intenso? Enfim, ou uma das competições ou alguma situação vivida entre vocês, desse coletivo?
R – Assim: foi bom pra gente, porque adolescente não gosta de perder, né? Mas o problema nisso, é porque eu estudava em uma escola particular e a maioria das escolas com quem a gente competia eram públicas. Então, não necessariamente tinha um treinador, um professor responsável pelo time das meninas, né? Então, assim, hoje eu vejo o privilégio que a gente tinha. Na época, a gente, simplesmente, não entendia, mas já teve competição que era um professor muito estúpido, que brigava com as meninas no meio do campo, assim, e a gente ficava meio horrorizada, sabe? Porque o nosso treinador, nosso professor era muito carinhoso, muito amigável com a gente. Ele ensinava a gente, ele não brigava, tipo: “Você tem que acertar”, não. Era uma coisa normal, saudável. (risos) E aí, quando a gente se deparava com esse tipo de situação, era um pouco assustador, assim. E aí acabava que as meninas não tinham treino, não treinavam com a frequência que a gente treinava, não participavam de mais competições. Então, acabou que esse tempo que a gente jogou foi assim: praticamente, a gente ganhando de todo mundo. (risos) Então, eu tenho essa memória, da gente só ganhando e, obviamente, na época, era muito bom. E aí, depois de um tempo, a gente começa a perceber: não era tão bom assim. Às vezes, é bom aprender a perder também. E aí o nosso treinador falava isso também: “Vocês estão vendo?”. Quando acontecia uma situação dessas, pesada, com os outros times, ele falava: “Não está certo, olha o que está acontecendo” e tudo o mais. E eu acho que foi importante pra isso também, pra gente ter um pouco de noção não só da gente, mas pra prestar atenção no que está acontecendo com os outros também, né?
P1 – Além desse professor de vôlei, pensando em toda sua trajetória de escola, o ensino médio, teve algum outro professor ou professora que te marcou?
R – Teve, mas acaba que tenho lembrança muito boa de vários. Então, não sei se chegou a marcar especificamente um. Porque a escola era relativamente pequena, então a gente acabava tendo o mesmo professor de Geografia, Português. Acabava sendo o mesmo, durante muitos anos. Então, eu não sei dizer se tem um professor específico, mas lembro de alguns. Tenho alguns em redes sociais e um certo contato, até hoje.
(P1 – E na igreja, o que te levou a frequentar? O que acontecia nesses encontros de finais de semana? Conta um pouco pra gente.
R – Então, eu comecei [a ir] na igreja, muito aleatoriamente, porque uma época uma tia começou a frequentar - como é que chamava? Célula, igreja evangélica tem célula – uma de casais, chamou meus pais pra participarem. Numa dessas, eu fui, fiquei na salinha de criança (risos) e aí pegaram meu telefone. Alguns anos depois, meus pais já tinham parado de ir e uns anos depois, essa menina que pegou meu telefone, me ligou e perguntou se eu queria ir prum encontro, que, na minha visão, é um acampamento. Como se fosse. A gente viaja, vai pra um sítio, alguma coisa assim e fica lá um fim de semana, obviamente, com cultos e coisas relacionadas à igreja, mas ela me ligou e eu não estava fazendo nada: "Vamos", né? Perguntei pra minha mãe, ela deixou e eu fui. Eu tinha uns onze anos, eu acho. E aí, depois, disso eu continuei, voltei desse encontro e continuei indo na igreja e tudo o mais, minha mãe acabou voltando também e fiquei assim por uns bons anos. E acabou que o meu irmão começou a entrar na igreja, ir, frequentar essa mesma igreja, com uns amigos, mas eu ainda era na parte das crianças e ele já estava na parte de jovens. E aí, como ele entrou junto com muitos amigos da escola, que eu já conhecia e que já me conheciam, eu acabei começando a acompanhá-lo muito e aí isso, pra mim, era o máximo, né? Meu irmão é oito anos mais velho do que eu. E aí eu comecei a andar muito com eles, acabei mudando pra essa parte de jovens, que eu já estava na fase... Nem estava indo na igreja por causa da igreja, já estava indo pra encontrar as pessoas. Já não estava ligando muito pra igreja. (risos) E aí comecei a frequentar com meu irmão e com os amigos, aí era outra dinâmica. Quando tinha festa, eram festas com adultos, tudo de igreja, na igreja, às vezes, ou na casa de alguém, encontros nos finais de semana. E aí, quando a gente não estava na igreja, estava com todo mundo da igreja. (risos) E aí foi assim durante uns bons anos, até que eu [me] distanciei, saí da igreja. Não vi mais sentido. Tive alguns problemas lá dentro e resolvi sair. Meu irmão continua, não, necessariamente, na mesma igreja, mas continua evangélico. Foi uma fase boa. Tirando o ruim, foi bem bom. (risos)
P1 – Giovana, além dessa convivência social que você tinha na igreja, a relação com a religião, o que agregava pra você ou o que era importante nessa prática religiosa? Além dessa convivência também, né? Existia uma importância também por esse lado?
R – Sinceramente, não muita. Porque a lembrança que eu tenho muito, hoje, é disso: de ir pela convivência. Eu gostava dos cultos, acompanhava e tudo o mais, mas eu nunca tive essa... Não sei explicar... Devoção toda, sabe? Até porque eu entrei muito nova, então não sei nem se fazia sentido na minha cabeça. Era uma coisa meio que, assim: "Deus existe", sempre foi assim e eu só aceitava. (risos) E aí eu ia na igreja, porque comecei a ir, mesmo, sabe essa coisa assim? Não estava muito... Não era, muito, [uma] questão religiosa. A minha ida à igreja, eu confesso, era bem mais social do que religiosa. Jamais… Depois que a adolescência foi chegando, aí eu fui, inclusive, [me] afastando. Quando eu fui percebendo essas questões de religiosidade, imposição e problemas gerais: "Porque você não pode isso, não pode aquilo, você tem que fazer isso, fazer aquilo" e por não concordar, eu comecei a [me] afastar, né, até que saí de vez. Mas a importância da igreja na minha vida, no caso, foi social, não religiosidade. (risos)
P1 – E, nesse contexto todo, você tinha, assim, namorado? Qual foi seu primeiro contato social? Conta um pouco dessa parte pra gente. Eu relacionei com a igreja, porque você disse que "isso pode, isso não pode". Aí, me ocorreu essa parte da história.
R – Então, eu comecei a namorar, já estava na igreja, só que eu comecei a namorar com um primo de terceiro grau, que morava em Belo Horizonte. (risos) Então, era um namoro à distância e eu já estava meio que [me] afastando da igreja quando a gente começou e, quando eu comecei a namorar, isso foi um dos problemas que eu tive, por ele não ser da igreja, por não ter pedido permissão, não ter orado e coisas que, assim, pra mim, não fazem o menor sentido, mas pra quem acredita, vai na igreja e tudo o mais, tem que ser assim, tipo uma regra, um ritual. Não sei como é que [se] chama. Mas aí tinha que ter essa parte pré namoro que eu não tive, que eu nem ligava. Nunca nem sabia que tinha isso. E aí, quando eu comecei a namorar, foi um dos problemas, inclusive, que: “Porque tinha que ter conversado, porque tinha isso, tinha aquilo”. E aí eu: “Não, a vida é minha, no caso” (risos) e aí, isso, foi um dos maiores problemas, na verdade. Na época, eu tinha um amigo que era, assim, meu irmão. A gente deu uma passada... Mas, na época, a gente era grudado, que a gente estudava na mesma escola e ele começou a frequentar a igreja também, nesse grupo do meu irmão e dos amigos. E aí, quando eu passei pra essa parte de jovens, eu já estava namorando e era muito grudada com esse amigo meu, e um dos problemas foi esse: começaram a falar que eu estava namorando com ele, que não podia, aí eu falava que não, que era outra pessoa e ninguém aceitava. Assim, confusão. Que eu não queria ser preconceituosa, mas acabo tendo esse preconceito, que é a questão da religião, né? Assim, lá está falando que não pode, o pastor fala que não pode, então não pode. Mas ninguém para pra pensar no que está acontecendo, de verdade. E aí tem muita fofoca. Não estou falando que todos são, mas o meio que eu estava, estava sendo assim. E aí foi isso, inclusive, que me afastou da igreja, porque começou uma confusão, uma fofocaiada [sobre] mim e esse amigo, uma encheção de saco comigo e meu namorado da época. E foi assim: “Não preciso disso”, aí eu saí. (risos) Mas foi por isso, né, a questão dos problemas que eu comentei, exatamente questão de namorado.
P1 – Você disse que tinha esse namorado em BH. Você vinha pra BH, enquanto você estava em Brasília? Como que era? E aí eu já vou engatar por que você escolheu BH pra estudar? Se teve um motivo da escolha desse lugar. Qual sua relação com a BH? Ou Minas.
R – Então, sim, eu vinha pra cá nas férias... Pra cá, não, pra Belo Horizonte ou ele ia pra Brasília. E aí, nessas vindas minhas pra Belo Horizonte, eu fui conhecendo a cidade um pouco mais, fui me interessando um pouco mais, vendo essa questão da mobilidade, que, por mais que pareça besta, pra mim é uma coisa muito importante. Aí eu comecei a gostar muito da cidade e acabei resolvendo que eu queria vir pra cá, pra Minas, de qualquer jeito. Tanto que mal tentei vestibular em Brasília e já quis vir pra Belo Horizonte. E aí acabou que a minha mãe deixou, com muito custo e aí eu vim e já comecei a faculdade em Belo Horizonte.
P1 – Fiquei curiosa pra saber como é que você conheceu o namorado de BH.
R – (risos) Era primo. Era, não, né? É primo de terceiro grau. Então, nessas vindas de família, que a gente passava aqui alguns dias das férias ou passava aqui pra ir pra outro lugar, no caso, visitar meus avós maternos, numa dessas vindas, eu o conheci e aí a gente começou a namorar. (risos)
P1 – Você escolheu BH, inclusive, prestou vestibular [lá]. E a escolha do curso, como foi? Já era uma intenção antiga? Como é que foi acontecendo essa opção?
R – Então, na verdade, é um pouco desanimador porque tem gente que, desde a adolescência sabe o que quer fazer e tem convicção e tudo, mas eu, quando cheguei no terceiro ano, que comecei a pensar mais seriamente nisso, porque eu tinha que marcar, no vestibular, a opção de curso (risos) e aí eu pensei em fazer Matemática, Engenharia, diversas coisas, completamente aleatórias. E aí minha tia é arquiteta - eu tenho uma tia arquiteta - e eu comecei a pensar nisso, sabe, pode ser. No final das contas, eu fiquei entre Engenharia Civil e Arquitetura. Eu fiquei na dúvida entre Arquitetura, na verdade, porque Engenharia é muito Exatas, né? Teria muita conta, Física, Química, essas coisas. E a Arquitetura, tinha a parte de desenho. Essas partes é que estavam me deixando, um pouco, na dúvida, que eu sou péssima pra desenhar à mão. E aí, quando eu descobri que Arquitetura não tinha que saber desenhar, foi a melhor notícia da vida. Quando eu conversei com alguns arquitetos e eles falaram: “Não precisa saber desenhar à mão, não se preocupe”, aí eu decidi por Arquitetura. Foi meio que... Escolhas por eliminação, a escolha do curso. (risos)
P1 – Mas você falou Matemática, área de Exatas, mas a Engenharia, a Arquitetura, mesmo tendo a tia... Mas essa parte da construção, já tinha algum interesse em relação a isso?
R – Eu já tinha esse interesse. Comecei a pensar em Engenharia e Arquitetura, por isso. Comecei a pensar em construções e achei muito interessante. E achava que Arquitetura era, basicamente, projeto. Na minha inocência, achava que Arquitetura era basicamente isso. E aí, a questão que me eliminou, que tirou a Engenharia da minha vida de vez foi essa questão de Química e Física que, na época da escola, eu gostava de Matemática e Ciências, mas eu pensei: “Isso, pra vida, não me interessa tanto assim”. (risos) Ainda mais quando descobri que tinha Química e em Química eu sou péssima, aí falei: “Não é isso que eu quero pra minha vida”, então eu acabei indo pra Arquitetura, por causa disso. Mas, graças a Deus, a gente descobre isso no meio da faculdade, que Arquitetura não é só projeto. (risos) Tem muito mais pra se trabalhar sendo arquiteta do que só projeto.
P1 – Eu vou só insistir mais um pouquinho nessa questão das construções. Se tinha algum interesse nesse sentido, na construção civil, vamos dizer ou outro tipo de construção, mas voltado pra essa área. Se havia algum interesse pra isso, especial.
R – Não, não tinha um interesse especial porque, pra mim, era o projeto. A questão maior era a de projeto, fazer o projeto, pensar a edificação em si, porque, no começo, quando eu comecei a pensar [em fazer] a Engenharia, achei que engenheiros também faziam isso. Então, quando eu fui pesquisando um pouquinho mais, fui vendo o que realmente se encaixava no que eu queria e era mais essa questão de pensar o espaço que me interessava mais, sabe?
P1 – Entendi. Daí, quando você entrou na universidade, como foi esse período pra você? Além do estudo, da descoberta pelo curso, outras coisas que acontecem nesse período escolar: convivências, mudanças de vida, mudança de cidade. Como foi esse período? Conta pra gente.
R – Foi completamente diferente de qualquer coisa que eu pudesse imaginar, porque em Brasília - como é que eu vou falar? A minha questão é sempre social – a gente meio que não tem muito sotaque, a maioria das pessoas. E aí, eu chegando em BH, na faculdade, não só o sotaque de BH, que é mais leve, mas tinha muita gente do interior, então eu comecei a ter contato com essas pessoas com sotaque diferente, o jeito de falar diferente, com histórias e experiências de vida completamente diferentes também. Até pelo fato de eu ter vindo de Brasília, (risos) então essa questão foi uma das coisas que mais me marcam, assim, da faculdade, porque eu lembro disso, do primeiro período: essa convivência com pessoas de vários lugares diferentes; que em Brasília não tinha esse costume. Todo mundo era de Brasília, não tinha um interior. Brasília não era a capital e todo mundo vinha. Em BH é muito isso: muita gente sai do interior pra vir estudar na capital. E isso nunca tinha passado pela minha cabeça. Quando eu cheguei, dei de cara com isso. Eu achei bem interessante, na verdade. Achei meio estranho no começo, mas depois eu comecei a gostar.
P1 – E teve algum momento, alguém que você conheceu, alguma história que possa contar pra gente dessa convivência, de pessoas de tantos lugares diferentes? Teve alguma situação, assim, que mostra bastante isso? História de alguém.
R - A minha memória, realmente, não é muito boa. (risos)
P1 – Não, é que às vezes não existe momento específico também na sua memória e às vezes tem algum momento que mostra bem, né, o que significa essa _____. E em relação ao curso, quais as descobertas? Além de não ser só projeto, o que você descobriu, assim, na Arquitetura?
R – Nossa! Pra mim, realmente, o mais marcante foi descobrir que não era só projeto, porque à medida que o curso foi passando, eu não sei exatamente o que aconteceu, mas fui perdendo um pouco o interesse, sabe? E aí chegou em um momento que eu pensei em trancar a faculdade, comecei a pensar o que ia fazer, porque eu já, também, não tinha nenhuma segunda opção na cabeça. Acabei querendo mesmo trancar. Meu namorado - hoje, marido - e a minha mãe me impediram de fazer isso. Aí fui fazer disciplina em outra faculdade, que eu estava achando que ia ser melhor, que eram umas disciplinas diferentes e, assim, eu não sei, mesmo. Eu fui desanimando. E aí, quando chegou nesse período que eu fui trancar, falei: “Não, vou terminar o curso, vou [me] formar, que pelo menos uma graduação eu vou ter, e aí depois eu penso no que eu faço”, mas até o final da faculdade, eu estava bem desanimada. Assim: ao longo da faculdade, eu fui perdendo o interesse. E aí chegou no final, por incrível que pareça, do curso, eu comecei a interessar de novo, mas aí foi a questão voltada, mais, pra área social. E aí eu conheci uma ocupação urbana lá em BH e comecei a acompanhar. Inclusive, o meu TFG (Trabalho de Final de Graduação) foi um projeto pra essa ocupação e aí eu comecei a ter um ‘animozinho’ mais, um vínculo com a Arquitetura. (risos) Mas a minha questão com a faculdade foi bem essa, de desânimo. E aí, depois, eu descobri uma área que me interessava um pouco mais e terminei feliz o curso. (risos)
P1 – E, nesse projeto, nessa ocupação, fala um pouco pra gente a sua experiência, o que te mobilizou. Que ela te fez, inclusive, te reanimar. Conta pra gente como foi essa experiência.
R – Então, foi em 2015, se eu não me engano, começou a ter muita ocupação de prédios ociosos em São Paulo. E aí esse foi um tema que acabou sendo nacional. Não sei se durou muito tempo, acho que não, mas foi assim que eu comecei a conhecer esse assunto. E aí, alguns colegas de faculdade, eu acho que um irmão de algum deles frequentava essa ocupação. Eu não lembro exatamente agora como conheci, mas foi um grupo de colegas da faculdade, que começaram a frequentar essa ocupação e eu fui junto. E aí, no que eu fui junto, comecei a me interessar cada vez mais pelo assunto da habitação, em particular das ocupações. A partir do momento que eu fui fazer a minha monografia, meu TFG, que é o trabalho final de graduação, fui estudando e vendo a quantidade de prédios ociosos. Fui entrando nessa questão de função social da propriedade e aí que eu fui [me] interessando mais. E meu TFG foi um projeto voltado pra essa ocupação, especificamente. Então, eu peguei, fiz levantamento do edifício, consegui os projetos originais… Não necessariamente, mas os projetos antigos daquele prédio, que é da União, e fiz um projeto voltado pra aquelas famílias. Eu fiz um levantamento muito simples, das famílias que estavam lá, que estariam elegíveis pra conseguir um apartamento, caso houvesse algum projeto naquele edifício. E fiz voltado pra essas famílias, porque essa ocupação tem quatro entidades responsáveis. Quatro movimentos sociais se uniram pra ocupar o prédio. E aí é isso: eu consegui fazer esse projeto, até deixei a apresentação lá pra eles. Infelizmente, depois que eu vim pra Mariana, não tive mais contato, que acaba que eu não vou mais pra BH , ou quando eu vou, é muito corrido, pra ver um familiar, aniversário de criança, alguma coisa assim. Então, eu acabei perdendo esse contato. Mas foi muito importante pra mim ter essa visão mais - Como é que eu posso falar? - de dentro, mais ou menos, mas mais próxima, né, dessa questão habitacional, que é um problema tão grande no país.
P1 – Giovana, só falando mais um pouquinho dessa experiência, tudo isso que você contou, que descobertas - Se a gente puder falar assim - você fez, estudando essa ocupação? Você já falou [sobre a] função social dos edifícios, mas teve alguma outra descoberta importante, chegando mais próxima dessas ocupações? Você, como arquiteta, olhando pro espaço...
R – Então, não sei se foi bem uma descoberta, mas foi bom pra mostrar a realidade, mesmo, porque, até então, ocupação a gente achava que as pessoas só entravam lá e... Nem sei. Na época, quando eu comecei a ouvir falar sobre ocupações, não fazia muito sentido na minha cabeça como é que funcionava. E aí, quando a gente entra e tem contato com as pessoas, a gente consegue, entende como é que funciona: eles se organizam, veem as famílias que estão realmente mais necessitadas, juntam um grupo, os movimentos sociais, as entidades se organizam pra fazer isso. Não: “Tem um prédio vazio, vamos entrar”. Então, assim, a gente ter essa proximidade foi bom pra isso, pra entender como funciona. Tem um estudo pra ver qual edificação, no caso, vai ser ocupada, de quem é aquele edifício. No caso deles é da União, já estava abandonado há quinze anos, se eu não me engano. Então, foi importante pra isso, né? Pra ver, entender a organização antes da ocupação. E quando a gente entra na ocupação, a gente vê essas falas ridículas de muita gente, de: “Ocupa e depois vende, pra ocupar de novo”, achando que uma pessoa ocupa um espaço ocioso porque é legal, né? E aí seria muito bom que todo mundo tivesse esse entendimento, porque ninguém ocupa um espaço porque quer. Ocupa por necessidade. E a gente indo lá e vendo a situação que eles moram, a gente consegue ter isso muito claro na cabeça, porque era um edifício do Inss. Então, é um edifício institucional, comercial e então não tem quartos, divisões, igual a gente está acostumado numa residência. São várias famílias, que não, necessariamente, se conhecem, que têm que conviver em um espaço muito pequeno e que não tem condições, porque a luz demorou, não lembro quanto tempo, pra ser ligada; água, essas coisas. Então, assim: não é uma situação confortável e as pessoas fazem isso por necessidade mesmo, pra lutar pelos seus direitos. Enquanto tem muita gente que fala como se fosse bacana fazer uma ocupação, como se fosse legal. Então, eu achei muito importante, pra eu ter esse entendimento, essa noção do mundo, mesmo porque, às vezes, só lendo no livro ou assistindo uma aula sobre isso, a gente não consegue ter real noção do que é. E aí, indo lá e vendo a situação, é bem diferente.
P1 – Obrigada, Giovana! Agora, você vai pra Mariana... Lá em BH, você trabalhou na área que se formou?
R – Eu trabalhei num escritório como estagiária e aí, depois que eu me formei, eu saí. Na época do TFG, estava um pouco complicado de me organizar e aí essa pessoa com esse escritório com quem eu trabalhei, é um escritório familiar, o pai, que é o arquiteto que estava trabalhando lá, é mais velho, não mexe no computador, então eu era meio que estagiária dele, nos projetos que ele fazia. E aí, quando eu me formei, ele me chamou de novo. Então, eu acabei trabalhando, assim, informalmente, como prestadora de serviço.
P1 – E, além desse trabalho, teve outros em BH ainda?
R – Não. Em BH, foi basicamente esse que durou mais. Os outros eram algum projeto muito pequeno, assim, partes de projeto ou só fazer um desenho no “site”. Coisas menores. Só bico.
P1 - E você contou que resolveram ir pra Mariana, com seu companheiro. Foi uma mudança que aconteceu pra ele. Eu entendi que vocês vieram pra Mariana. E aí, chegando em Mariana… Quando foi, mesmo?
R – A gente veio em 2017, no final. Ele começou a trabalhar em outubro e eu vim em novembro. A gente fez a mudança geral em novembro.
P1 – E, chegando em Mariana, talvez você já conhecesse, mas como foi se instalar, passar a morar em Mariana?
R – Eu não conhecia, nunca tinha nem ouvido falar de Mariana. A gente ouve muito falar de Ouro Preto (MG), mas Mariana nunca tinha ouvido falar, até esse momento. E aí, antes de mudar, eu só vim pra cá uma vez, que foi pra poder olhar a casa, porque ele estava trabalhando o dia inteiro [e] não tinha como. Como, no momento, eu não estava trabalhando, foi mais tranquilo pra eu resolver essa parte. Então, eu vim, a gente procurou casa, achamos uma casa, por sorte, maravilhosa e aí, um mês depois, a gente mudou de vez.
P1 – E aí, chegando em Mariana, conta um pouco como as coisas foram acontecendo. Antes de trabalhar na escola, se teve algum outro projeto aí em Mariana e como você chegou na escola. Chegando em Mariana houve algum projeto, algum trabalho? E aí, como você chega na escola de ofícios?
R – Então, quando a gente mudou, em novembro, que eu falei. Em fevereiro, eu consegui um trabalho, já, temporário, já sabia que seria um contrato temporário e eu trabalhei com os atingidos, na parte do cadastramento dos atingidos da barragem de Fundão. E trabalhei lá por um ano, depois encerrou o contrato e eu fiquei trabalhando com alguns projetos que apareciam pra mim e pro meu companheiro, né? Ele também é arquiteto, então a gente tem um escritório [e] acaba pegando alguns projetos. E aí, depois que eu saí desse trabalho do cadastro, fiquei pegando alguns projetos, muito poucos, mas aí, na época que a escola apareceu, eu tive interesse exatamente por isso. Eu estava sem projeto, sem trabalho e aí, como eu vi que era um curso de formação, especialização, mão de obra e tudo o mais, eu me interessei por isso. Porque aqui em Mariana, patrimônio, igrejas e tudo o mais, imaginei que seria uma boa área pra começar. E aí eu fui de cara, já, no primeiro semestre já quis e, quando eu fui ver os ofícios, eu realmente me interessei por todos. (risos) O objetivo inicial era fazer todos, mas a pandemia não me ajudou. E aí eu consegui fazer só um, que foi o da cantaria. Então, eu fiz a primeira turma. Comecei a fazer o da alvenaria, aí a pandemia veio e não consegui concluir. Mas aí eu fiz esse primeiro semestre, a primeira turma, conheci os dois professores maravilhosos. Aí, esse ano, o outro professor não continuou e eles me chamaram pra dar aula lá com eles.
P1 – Quando aconteceu o rompimento da barragem, você estava em BH, né?
R – Sim.
P1 – Como foi trabalhar com essas pessoas atingidas? Tem algum momento ou alguma situação importante, inclusive, de registrar aqui? De contar esse processo que você viveu com as pessoas, próxima das pessoas atingidas.
R – É um pouco difícil de falar sobre isso, essa questão, mas, assim, uma coisa muito óbvia que ficou pra mim foi o fato de quem não mora em Mariana não tem real noção do que essas pessoas passam, né? Não tem noção do que a Renova fez, do que a Samarco e a Vale fizeram com essas pessoas. Então, eu não sei como eu posso falar (risos) dessa parte, assim, mas tem muita gente muito doente, realmente. Então, assim, a gente vê situações tristes, né? Porque acabou com a vida das pessoas. Mesmo quem não morreu no dia do crime, teve a vida destruída. Teve crianças que... Ouvi histórias e aí eu já não estava mais trabalhando, assim: quando teve o rompimento em Brumadinho, eu fiquei sabendo que muitas crianças ficaram desesperadas, achando que ia acontecer aqui, porque já tinham passado por isso, né? Então, assim: tem gente... Tem gente, não, todos eles não têm casa até hoje, estão morando de aluguel. Então, a vida deles foi destruída. E eu acho que, antes da gente mudar pra cá, não tinha como a gente ter essa noção do tamanho do crime. A gente tem noção do crime ambiental, isso passa na televisão todo dia... Passava, né? Hoje, já parece que esqueceram. Mas a questão das famílias, das pessoas, do modo de vida delas, da convivência com os vizinhos, que era uma comunidade muito unida. Eram comunidades, né, que foi mais de uma, mas que tinha essa proximidade, essa convivência com os vizinhos, tudo mais e que não tem mais, hoje. Então, quando eu atendia, eu e toda a equipe atendíamos essas famílias, dava pra perceber isso. E tem alguns que ficaram doentes, mesmo: alcoolismo, depressão e várias outras doenças, né, que surgiram depois do crime e que não tem essa visibilidade na mídia. Então, quando a gente não mora aqui, não tem contato, a gente não sabe dessas coisas, né? Então, o principal foi isso: saber a real dimensão desse crime, né, que não foi só o ambiental.
P1 – E aí você chega na escola de ofício. Agora, a gente vai entrar na escola junto com você: que ano, exatamente, você fez o primeiro curso e contar um pouco, assim, da sua experiência com esse curso? Tanto de conteúdo, quanto da atuação do mestre, mesmo, do professor, como era a dinâmica dessas aulas, o aprendizado, dinâmica entre o professor e o mestre. Como as aulas foram conduzidas. Primeiro isso.
R – A primeira turma da escola foi no segundo semestre de 2019, de agosto a dezembro, que eu comecei. E aí, o contato, essa questão de ensino com os professores sempre foi muito informal. A escola, por ser pequena e ter uma turma muito pequena, eu acho que isso é meio que inevitável, né? (risos) E aí, já no primeiro período, na primeira turma, eu fiquei realmente interessada no assunto e dei sorte da Ufmg (Universidade Federal de Minas Gerais) estar promovendo um seminário sobre Arquitetura Vernacular. Não lembro exatamente o nome do seminário, mas era relacionado à Arquitetura Vernacular, patrimônio e coisas do tipo. E aí eu chamei o professor, na época, o Mateus, porque ela já tinha sugerido pra quem quisesse, fazer um grupo de estudos e tudo o mais. Pouco tempo depois, eu fiquei sabendo desse seminário e o chamei pra gente fazer um artigo, escrever um artigo pro seminário. Aí conseguimos que a escola pagasse a nossa inscrição e a gente participou desse seminário. Eu achei o auge da felicidade pra mim, (risos) fiquei muito feliz de ter conseguido, não só fazer o artigo, mas participar do seminário e é isso: eu gostei muito do assunto e quis continuar. Infelizmente, depois, eu não consegui, como gostaria, me dedicar tanto tempo e agora, voltando como professora, eu tenho essa oportunidade. Então é por isso que eu fico, realmente, muito feliz de ter voltado como professora. (risos) Mas a questão do ensino, é isso. A gente, lá na escola, não tem um aprofundamento no conteúdo, porque são só quatro meses, não tem condição, não tem tempo hábil pra aprofundar no assunto, tanto assim. Então, a questão teórica, a gente fica um pouco mais no básico e a questão prática, a gente conseguiu ver o básico, que é o mais importante, no caso da cantaria, fazer essa técnica: você aprende o básico e aí, a partir do básico, é só repetição... Não, treino. Você aprende o básico, o resto você vai evoluindo conforme o treino e o tempo que dedica a isso.
P1 – Fala um pouco da cantaria. O que seria o básico desse aprendizado?
R – Então, a cantaria é uma técnica de entalhe em pedra. E é um ofício tradicional. Então, a gente tem... eu não sei se eu vou conseguir explicar isso direito, sem um desenho. (risos) Mas no trabalho em pedra, a gente tem a escultura e a cantaria. A escultura é como se fosse um trabalho mais livre, linhas orgânicas e tudo o mais. Na cantaria, não, a gente tem linhas, no caso, paralelas, então a gente tem que seguir sempre essa linha. Seria bom desenhar, porque eu não consigo explicar muito bem isso. (risos) Mas a gente faz um... A gente tem ordens, né, pra serem seguidas. A gente não pode simplesmente começar a talhar a pedra. Então, a gente faz o desenho, mede, faz as linhas e corta essa linha, como se fosse um chanfro e, a partir desse chanfro, a gente começa a moldar da forma que for do projeto. E aí tem alguns detalhes, mas o básico é isso: saber usar a ferramenta, quais ferramentas, a posição da ferramenta. Então, esse é o básico. E aí, depois, a gente se vira, na experiência e no treino.
P1 – Essa prática, você diz que em Mariana tem uns prédios que precisam de manutenção e restauro, o patrimônio aí preservado é grande. Esses ofícios, aprendendo na escola, são possíveis de serem aplicados depois? Qual a relação de você buscar esses cursos? Porque a cidade pode oferecer um espaço pra você trabalhar com isso, há um mercado. Aí você vai na escola e faz esses cursos. Qual o resultado desses aprendizados, pra depois poder trabalhar? Como você vê isso?
R – Na escola, como eu falei, a gente vê o básico e, assim, eu posso falar pela cantaria. Os outros cursos, realmente, eu não sei, mas acredito que seja o básico também, devido ao tempo. Mas, na cantaria, a gente sabendo a técnica, como ela foi feita, como ela é feita, a gente consegue, não, necessariamente, com o certificado da escola, porque ninguém vai sair dali um restaurador, mas quando a gente for trabalhar em alguma obra de restauração, vai ter uma noção de como aquela peça foi feita, está sendo degradada pelo tempo e como talvez possa ser recuperada, porque é isso: a gente também não vê questões de restauro. Isso seria uma coisa mais técnica, um curso mais aprofundado. Então, por exemplo, sabendo a técnica, a gente consegue pensar em como seria uma prótese de alguma peça, se for necessário. Se tem uma peça de cantaria quebrada, a gente consegue saber como fazer a peça, pra ser encaixada lá. Mas aí, como eu falei: todo mundo que for formado no curso, vai ter que trabalhar sob orientação. Ninguém vai sair do curso já conseguindo entrar como responsável numa obra de restauração.
P1 – Vamos pensar no curso que você fez: o público, basicamente, era de que perfil? Eu digo, assim, de formação.
R – Quando eu era aluna, tinha gente que trabalhava... Tinha pedreiro, algumas meninas que eram faxineiras, que trabalhavam na prefeitura, e tinha uma colega que fazia faculdade também, que estava na História. Então, assim, era bem diversificado. Tinha gente (risos) de tudo quanto é lugar. E hoje, ainda, continua assim. Tem gente que é graduado e tem gente que só tem o ensino médio, por exemplo.
P1 – Eu estou perguntando um pouco do conteúdo, tá, dos cursos. A sua visão sobre o conteúdo relacionado, agora, ao público. Você diz que quem faz o curso, tem noções. E, como arquiteta, entendo que você vai poder usar esses aprendizados pra poder orientar qualquer obra. E as pessoas que são formadas na escola, que não têm formação na Arquitetura, Engenharia, conseguem usar o aprendizado e aplicar como trabalho?
R – Então, na questão de obra de restauração, mesmo eu sendo arquiteta, acho que eu não tenho condições pra isso, porque questão de patrimônio é sempre uma coisa muito específica e eu não tenho formação específica pra isso. Então, não poderia chegar pra comandar uma equipe de restauro de cantaria, por exemplo. Não tenho essa competência. Mas a gente saindo do curso, consegue executar algumas obras, que não sejam de restauro, né? Se alguém, por exemplo, encomenda uma portada, a gente consegue fazer isso, tem a noção da técnica pra poder fazer, entendeu? Mas aí, como a gente... O uso principal seria em obras de restauro, a gente comenta e fala o básico sobre isso, mas qualquer um faz, assim. Normalmente, todos saem com essa noção de como trabalhar com a pedra, como é feito o trabalho de cantaria na prática. Pegar um pedaço de pedra e talhá-la, como que é feito. Isso, a gente consegue saber e sair do curso fazendo.
P1 – Como foi ter aula com o mestre? Você falou em relação ao professor. E em relação ao mestre, como fazer aula dada pelo mestre? Era um mestre só, no caso. Como foi a experiência?
R – Foi bem parecida com a do professor de teoria, na verdade, (risos) porque é sempre isso: é uma turma muito pequena, acaba todo mundo ficando um pouco mais à vontade [e] não tem aquela formalidade do professor, mestre, aluno. Então, é uma coisa mais tranquila, mais dinâmica. E hoje, eu trabalho com ele. Foi ele, inclusive, que me indicou pra trabalhar lá na escola, então é bem tranquila (risos) essa convivência e esse aprendizado.
P1 – Quando eu perguntei do mestre foi no sentido de aprendizado tradicional. E pra você, qual o significado desse conhecimento dos ofícios tradicionais? Quando se convida o mestre, que conhece muito desse ofício tradicional pra poder compartilhar esse conhecimento com seus alunos. Pra você, qual o significado desses conhecimentos, desses ofícios tradicionais?
R – Eu vejo - até por causa do curso que eu comecei a interessar mais por essa questão do patrimônio - a importância disso, né, de guarda desse conhecimento. Não só guarda, mas transmissão desse conhecimento, porque, principalmente, a cantaria não é uma coisa muito comum hoje em dia. Então, a gente conseguir ter esse aprendizado na escola, eu acho importantíssimo, pra continuar existindo a técnica. Porque quando a gente vai procurar registros e informações sobre isso, é muito difícil encontrar. Não é um conhecimento, assim, tão divulgado. Então, acho importantíssima essa função que a escola está exercendo, de trazer esses ofícios de volta e abrir pro público, pra poder tentar salvar esse conhecimento.
P1 – Teve um momento aí, durante o curso, que foi bastante significativo pra você, especialmente? Nós falamos de forma geral, mas pra você, teve um momento, assim?
R – Eu acho que o que mais me marca, assim, foi essa questão do artigo, da participação do seminário, que eu entrei um pouco meio sem muita esperança, sabe, do curso e aí, quando veio essa oportunidade, eu comecei a escrever o artigo e tudo o mais. Foi uma parte muito importante pra mim.
P1 – O artigo era sobre o quê? Ou é, né?
R – (risos) É sobre a salvaguarda, mesmo, dos conhecimentos tradicionais. Ficou bem simples, não ficou tão bom como eu gostaria, mas (risos) a gente conseguiu fazer e apresentar. Então, só de ter conseguido finalizar e apresentar, pra mim já valeu muito. Então, pra mim, o mais importante da escola, como aluna, foi isso: o aprendizado e conseguir usar esse aprendizado pra alguma coisa tão rápida, né? Que, antes de terminar o curso, a gente já participou do seminário. Então, isso, pra mim, foi ótimo.
P1 – E o que, em linhas... Bem resumidamente: qual a mensagem, a ideia central do curso de salvaguarda?
R – É isso: a gente fala um pouco da visão de quem vive numa cidade histórica, por exemplo, e pessoas que vêm como turistas, essa questão de pertencimento, de como cada um vê, né, essas tradições, esses conhecimentos tradicionais. Então, eu acabei falando um pouco, também, sobre a questão dos atingidos, (risos) porque ainda estava um pouco recente, mas essa questão de pertencimento, mesmo. A questão dos conhecimentos e pertencimento, com relação a patrimônio. Basicamente, é isso.
P1 – Você pode contar pra gente... Você falou de ter feito esse artigo do curso. Você começou a fazer descobertas e até relacionou com o acidente... Acidente, não, com o crime. Então, se você puder falar um pouco, descrever um pouco mais porquê você chegou a relacionar o curso, o trabalho, que foi resultado desse processo que você estava tendo no curso e você falou em patrimônio, nessa cidade que tem turista e morador. E tudo isso você foi falando que o artigo chegou a abordar. Você pode fazer um resuminho?
R – Estou tentando lembrar exatamente (risos) como é que está lá, mas foi muito isso, essa... Não tem, necessariamente, a ver com a cantaria, né? Isso a gente não citou muito, mas foi com relação a esse resgate de conhecimento que a escola está trazendo. A gente cita a escola nesse sentido, também, de trazer esses conhecimentos que estão se perdendo, mesmo numa cidade histórica que, teoricamente, ainda teriam esses conhecimentos sendo aplicados e a gente tenta trazer essa reflexão sobre isso que, às vezes, um turista consegue perceber uma importância no patrimônio, mais do quem mora aqui. Ao contrário, também tem outras pessoas que moram aqui e conseguem ter essa percepção, esse pertencimento de patrimônio. Com relação aos atingidos, eu trouxe a questão: casas foram destruídas e casas, em alguns momentos, em algumas situações, centenárias. Eu trouxe, especificamente, a de Bento Rodrigues. Foram várias comunidades atingidas, mas eu trouxe a de Bento, que foi a primeira a ser atingida fisicamente pela lama. Então, foi a que teve, fisicamente, praticamente todas as suas edificações destruídas, é uma das comunidades mais antigas, e eu trouxe essa questão: casas foram construídas pelas famílias; foram passadas de geração em geração e foram completamente destruídas [com a lama]. E isso era importante pra muita gente. Quando eu trabalhei no cadastro, trabalhei com essa parte de cartografia também, né? Então, eu tive essa oportunidade, de conhecer algumas famílias e ouvir de algumas esse relato, né? De: “Meu pai construiu essa casa de pau a pique e ela foi destruída. Tem um tijolo aqui que foi meu pai, minha mãe que fez e construiu a casa”. Então, foi nesse sentido que eu trouxe no artigo, de perder essa questão do pertencimento, do: “Eu que fiz. Minha família que fez, está na família há muito tempo”, né? E que, pra alguns, é muito importante; pra outros, nem tanto; e também muita gente com material industrializado. Essa questão da construção civil mudou um pouco. Pessoas mais novas costumam achar que o bom é o industrial: o tijolo, a cerâmica, concreto e tudo o mais. E algumas pessoas que eu conversei tinham esse afeto, essa importância, davam essa importância pra casa que foi construída pelo pai, pela mãe. Não, necessariamente, industrial, mesmo pau a pique ou de tijolo adobe. É um pouco sobre isso. (risos)
P1 – Pensando na escola, eu vou perguntar depois sobre a sua atuação como professora, mas pensando ainda como aluna e nos seus colegas de curso, você consegue dar sua impressão, assim, pra essas pessoas que não eram, até então, desse universo de construção... Você disse que tem pedreiros, sim, mas tem algumas pessoas que trabalharam em outras áreas... O que a escola pode trazer... Já entendi o quanto é aprendido lá, pra depois poder já praticar, mas do ponto de vista do que essa escola pode contribuir com as pessoas, também com os jovens, sobre esses ofícios tradicionais? Qual seria a contribuição das escolas? Deu pra entender a pergunta?
R – Acho que sim. (risos)
P1 – É porque você já falou sobre vários aspectos. Agora, pensando na contribuição da escola, pra pessoas que não são, ainda, desse universo, ou até pra jovens, que estão começando a pensar num ofício, numa profissão, qual seria a contribuição?
R- Acho que, assim, não só pela questão do ofício, né, porque na escola a gente tem aula de Patrimônio. Hoje, de Empreendedorismo também e Comunicação. Então, a escola como um todo, né? A importância que eu vejo é essa: é trazer essa noção de conhecimentos tradicionais, que foram se perdendo, sabe? Não, necessariamente, do ofício e do trabalho, mas eu acho a parte mais importante da escola, seria essa retomada dos conhecimentos, que nem todo mundo conhece cantaria. É até engraçado que tem gente que entra, faz dois dias de aula e percebe que não é nada do que tinha pensado e sai. Então, nos outros ofícios, eu não sei, mas na cantaria isso acontece bastante. A pessoa se inscreve, liga pra escola achando que... Já teve gente achando que era aula de canto. (risos) Então, completamente diferente da realidade. Eu já tinha visto alguma coisa sobre cantaria, ouvi o nome na faculdade, mas pessoas que não são ligadas à construção, realmente, ficam muito distantes da realidade. Mas é isso: a importância, eu acho que, da escola, principalmente pra essas pessoas que não são ligadas à construção civil, é essa noção de pertencimento, da importância que a gente tem que dar pros bens que a gente tem aqui, tombados ou não, né? Principalmente por Mariana ser uma cidade com tantas igrejas, tantos monumentos tombados. Acho que é importante trazer isso, porque aí a gente conversa. Eu sempre converso isso com algum aluno ou, na época da escola mesmo, com o professor, sobre a educação patrimonial aqui em Mariana, porque eu não sei se tem, realmente, mas que eu acho que seria importante ter pelo menos um pouco pra isso, pras crianças já crescerem com essa noção de pertencimento, de entender o que significa um patrimônio ser tombado, uma igreja ser tombada. Entender a importância dela pra história da cidade, do país e ter uma noção de cuidado também, né, porque quando a gente tem essa noção de pertencimento, a gente cuida. E aqui, não necessariamente é tão cuidado, pela população, (risos) que picha e joga coisas em igrejas e tudo o mais. Então, acho que essa educação patrimonial que a escola traz é muito importante.
P1 – Agora, como professora... Eu vou dar uma olhadinha aqui em coisas que você já me respondeu. Sônia quer falar.
P2 – Eu estava curiosa, exatamente sobre isso que você perguntou, Márcia, e no que ela respondeu, mas não sei se tem mais coisa pra falar. Você fala de um público muito diversificado, né, desse público que procura o curso: desde faxineira; pedreiro; arquitetos, como você. Como é que vocês lidam com essa expectativa e esses diferentes níveis de expectativa, de conhecimento e de interesse? Enfim, como é que é isso, assim, na dinâmica do curso, com esse público? Como é que vocês trabalham isso?
R – Então, eu não sei. (risos)
P1 – Acho que você pode falar, já, Giovana, como aluna e agora como professora.
R – Então, eu não sei se a gente consegue diferenciar muito essa dinâmica, porque a gente, desde o começo do curso, mesmo quando eu era aluna e agora, como professora, não fazia muito essa distinção. Então, a partir do momento que as pessoas estão lá, a gente entende que elas têm interesse. A gente, nos primeiros dias, já fala, explica o que é, como vai ser o curso e aí, quem tiver interesse, continua. E quem falar: “Não era isso que eu tinha pensado”, a pessoa já vai embora. Mas eu, na aula teórica, que só faço da parte teórica, tento explicar o mais simples possível, do jeito mais informal possível, que é pra que todo mundo entenda. Se eu falo de uma forma simples, eu sei que uma pessoa mais simples, com menos estudo, vai entender; quem tem graduação, obviamente, entende também. Então, no meu caso, eu tento fazer isso. O Mateus, com quem eu tive aula também, fazia muito isso, né? Então, ele tinha essa preocupação de saber que todo mundo estava entendendo. E aí, sempre tem aqueles que estão lá, mas não estão muito interessados, ou estão lá e estão só interessados na parte prática, que isso acontece muito também. Então, o professor teórico é um pouco complicado, (risos) por causa disso, que, na escola, o interesse principal é nas oficinas, na prática do ofício e a prática, enfim, quem é pedreiro, por exemplo, tem mais facilidade, no caso da cantaria. O mestre, Rinaldo, no caso, fala isso sempre. Quem já tem contato com algum tipo de ferramenta, alguma coisa assim, tem um pouco mais de facilidade pra pegar a técnica mais rápido. Mas, assim, todo mundo consegue. No final das contas, todo mundo aprende o básico, ali, do ofício. Então, está dando certo, (risos) independente do tipo do público.
P2 – É você que define o conteúdo, a dinâmica? O material, tem pronto [ou] você produz material da aula? Como é isso?
R – Então, como eu cheguei e já tinha um professor antes, né, eles já me deram, não um roteiro, mas o básico que teria que ter no curso. E a apostila também, o caderno do ofício também já estava pronto. Então, eu uso a apostila. De vez em quando, a gente lê a apostila, mesmo pra dar uso, porque entendo que todo mundo lá, a maioria, trabalha, muitos não têm tempo, muitos também não têm muito interesse em pegar essa apostila pra ler em casa, né, de fazer esse estudo fora da escola. Então, eu acabo usando a apostila dentro da sala, pra dar esse uso pra apostila, que ficou bem bonita. (risos) Tenho que puxar esse saco, porque, realmente, eu achei bem bonita, ficou muito bem-feita. Então, eu a trago pra sala, pra isso, pra dar esse uso pra apostila e, ao mesmo tempo, eu faço apresentações de “slides”, com imagens, pra poder mostrar algumas coisas que, na apostila, não tem. Ou que, na apostila, só está citando alguma coisa brevemente, aí eu tento trazer imagens e outras coisas nas apresentações. Mas o conteúdo, em si, quando eu cheguei, eles já me deram como se fosse um cronograma, uma listagem de tópicos que eu teria que abordar.
P2 – Posso perguntar só mais uma?
P1 – Só vou perguntar e aí a Sônia vai perguntar depois: quem produziu a apostila, que está tão bonita?
R – Foram os professores e mestres. Então, no caso da cantaria, foi o mestre Rinaldo com o professor Mateus. Inclusive, tem o nome deles lá. E aí, cada ofício com o seu professor e mestre, a apostila no caso tem a parte de Patrimônio, a parte de cada ofício e uma parte de Empreendedorismo e Segurança do Trabalho.
P1 – E você disse que ficou bonita. O que chama a atenção nesse material? Isso também é um dado, pra gente avaliar. O que a fez ficar bonita? Depois, a Sônia vai perguntar.
R – (risos) Fisicamente, esteticamente, ela ficou muito bonita, ainda mais porque tem a comparação da primeira apostila, que eu não sei o que aconteceu, que na primeira turma a apostila só chegou no final do curso. Então, assim, a gente passou o curso inteiro sem apostila e aí, no dia de pegar o certificado, recebeu a apostila. (risos) Então, assim: a apostila ficou, realmente, muito bem-feita, muito bonita; mas aí eu ainda comparo com a outra e a acho melhor ainda. (risos) Mas ela ficou com a qualidade muito boa, realmente. Tanto fisicamente, como de conteúdo.
P1 – Sônia, você quer perguntar?
P2 – Então, você saiu uma boa professora? Como você se sente, como professora? Que você se formou aí, como professora. (risos) É a primeira vez que você dá aula ou não? Então, como você se saiu, assim? Como você se sente?
R – Então, (risos) eu fico nervosa até hoje. Inclusive, fico nervosa pra dar entrevista, igual eu estou fazendo aqui, agora e fico gaguejando. Fico: “Então, então, então”. Mas, no geral, assim, acho que está dando certo porque, até por essa insegurança, eu fico o tempo todo perguntando: “Vocês estão entendendo? Vocês entenderam isso aqui? Quer que eu explique de outra forma?”. Eu fico nisso, sabe? Essa insegurança acaba me trazendo essa resposta, de que está dando certo. Então, eu acho que, por enquanto, estamos bem, caminhando tranquilamente. Não houve reclamação comigo, pelo menos. (risos)
P1 – Giovana, indo no caminho que a Sônia trouxe: você não fez uma formação pra ser professora e por que, o que motivou esse convite e você ter aceitado?
R – (risos) Então, o mestre Rinaldo, desde quando eu era aluna, eu ficava enchendo o saco dele, pedindo pra ele me arrumar um trabalho. E eu falo que eu enchi o saco, mesmo, porque eu sou chata. Tem hora que eu sei que eu sou, mas eu estava muito empolgada e queria muito trabalhar com ele. Eu falei: “Me dá um estágio de graça. Eu trabalho um dia por semana com você, de graça” e fiquei enchendo o saco dele durante muito tempo. E aí, esse ano que o professor saiu, né, o Rinaldo me indicou na escola e o Ney me ligou, perguntando se eu tinha interesse, fez a entrevista e tal. Realmente, eu nunca tinha dado aula, mas a questão da ocupação, a gente sempre... Sempre, não. A gente acabava tendo que conversar muito com as pessoas. E aí, uma das questões que o Ney trouxe pra mim foi essa: “Você conseguiria passar informação pra um público diversificado, de pessoas formadas na faculdade até gente que só tem ensino médio e tudo o mais? Pessoas de diferentes níveis de estudo”. Aí eu fui e falei: “A experiência que eu tenho é essa, né, de ocupação. E de quando a gente vai conversar, a gente conversa com todo mundo, da forma mais simples possível pra que todos entendam. Então, eu nunca dei aula oficialmente, mas acho que pode ser considerado”. Eu falei com ele dessa falta de graça que eu fico, dessa vergonha toda, mas está dando certo, então acho que não é um problema.
P1 – Giovana, eu vou repetir a pergunta, tá? Ou as perguntas. O nome do mestre e qual o trabalho dele, atual? Apesar de ter esse ofício, mas o que ele faz, além de dar aula? O mestre, o trabalho dele, quem é o Ney e o que te fez, no curso, de repente, depois, até fazer o estágio com ele?
R – Então, o mestre é o Rinaldo Urzedo e ele trabalha na área mesmo, é mestre canteiro. Ele faz peças em cantaria. Inclusive, recentemente, o último trabalho que eu fiquei sabendo dele foi inaugurado mês passado: foram os monumentos na entrada da cidade, com o nome da cidade. Então, ele trabalha, já, nessa área há nem sei quantos anos. Mas ele tem bastante experiência e já trabalha com isso há muito tempo. E aí eu acho que foi até por isso que ele foi chamado pra escola, né? Porque ele faz muitos trabalhos em cantaria e é restaurador também, se eu não me engano. Então, ele trabalha na restauração das igrejas também, quando ele consegue espaço, mas eu não sei como funciona exatamente. (risos) Mas ele trabalha nas igrejas, em restauração e fazendo peças em cantaria também. O Ney é coordenador pedagógico, se eu não me engano, lá na escola, faz parte da administração - Ney Nolasco - e foi ele que fez a entrevista comigo. O Rinaldo me indicou e foi o Ney que fez a entrevista. E sobre o interesse, fui conhecendo a técnica e gostando muito daquilo. (risos) Não sei [se] foi um momento, o que foi, que eu estava gostando muito de trabalho manual. Inclusive, pelo tempo que eu fiquei desempregada, comecei a mexer com crochê, macramê, um monte de coisas. E aí a escola entrou, nesse meio tempo, e então eu comecei a ficar muito interessada em trabalhar com isso, né? Até pra eu começar a trabalhar nas restaurações, que um dos objetivos também era esse. E não consegui trabalho de estágio com o Rinaldo, (risos) nem de graça, mas esse ano ele me chamou pra trabalhar com ele na restauração da igreja, que ele está participando, e aí trabalhei lá, com ele, um tempo. Agora, eu estou só na escola, mas eu também estou gostando muito dessa questão de estar dando aula. Não só pela aula em si, também por poder aprofundar nesse estudo, de cantaria, patrimônio e tudo o mais. Então, eu estou pensando ainda se faço mestrado, o que eu faço. Estou realmente interessada nessa área, por causa da escola, né? Por causa do curso que eu fiz lá em 2019, que despertou esse interesse todo de patrimônio, de cantaria e tudo o mais.
P1 – Em relação ao trabalho, você continua buscando trabalho, projetos não só dessa parte de restauro? E vou falar já a segunda, engatando: [em] Mariana, você acha que tem bastante oportunidades pra esse tipo de trabalho? Ou, pelo menos, senão de restauro, mas de práticas de ofícios tradicionais, de uso dessa mão de obra? Então, as duas coisas: você, pessoalmente, quais são os caminhos que está buscando e tudo o mais, em relação ao trabalho e depois, de modo geral, o mercado, vamos falar assim, dessas práticas tradicionais, para os alunos.
R – Então, eu não estou procurando diretamente por isso, porque não tenho a competência real de poder pegar uma obra pra eu coordenar alguma coisa do tipo. E essa parte de patrimônio, quanto mais eu vejo, mais tento saber de como funciona, mais eu escuto das pessoas que é um campo muito fechado. Então, acaba que são sempre as mesmas pessoas, as mesmas empresas. É o que me dá a impressão, hoje. Eu, de fora, estou com essa impressão. Então, por eu não ter essa titulação de restauradora ou coisa do tipo, não ter essa especialização, acho muito difícil de eu conseguir algum trabalho, diretamente, de restauro. Talvez dessa forma que eu tinha conseguido com o Rinaldo, que ele pega a obra e me chama pra trabalhar com ele, entendeu? E aí é como se ele fosse um coordenador da equipe e eu fizesse parte dessa equipe, porque ele tem essa titulação, mas pros alunos, esse ano, a escola começou a ter o programa de estágio. Então, hoje, a gente, na cantaria, acho que são dois alunos, um ex-aluno e uma aluna, que estão trabalhando em uma das obras aqui, em Mariana. A escola começou a trabalhar com essa parte de estágio, esse programa de estágio, com os alunos. E aí, não necessariamente é a técnica, porque é restauro. Ninguém vai fazer uma peça de cantaria, não vamos usar a técnica, necessariamente, mas a gente está em contato e tem a ver, é como se fosse. (risos) Então, eles estão meio que aplicando, mesmo que seja a parte de patrimônio, que eles estão aprendendo na parte de patrimônio, estão conseguindo aplicar, de alguma forma, acredito eu.
P1 – Eu estou insistindo também nesse caminho das perguntas, pensando como o projeto a proposta é de avaliação, inclusive, pra perceber a importância da escola. Você diz que o que contribui bastante... Eu entendi assim, que o que contribui pra todas essas pessoas é essa noção, esse conceito de preservação, de pertencimento, de respeito ao patrimônio... Profissionalmente, além dessas pessoas que estão fazendo estágio, também você disse que a parte de empreendedorismo, algumas outras disciplinas, mas, especificamente, em relação - agora vou resumir - a ofícios tradicionais, qual a contribuição da escola pra essas pessoas, talvez, conseguirem agregar um valor ao seu currículo, pra conseguir mais oportunidades de trabalho? O que a escola poderia agregar com relação à ocupação profissional mesmo?
R – Eu acho um pouco mais difícil quando a gente fala disso na cantaria, porque é um ofício que realmente não é tão existente hoje, né? Não se faz mais uma casa com pedras. Então, fica um pouco mais complicado dos alunos de cantaria aplicarem isso, adicionarem isso ao currículo, de uma forma, realmente, que agregue, mas a gente tem relatos, lá na escola. Se eu não me engano, a última turma de alvenaria, uma das moças que fez o curso, já conseguiu fazer, montar uma empresa. Não sei se foi realmente uma empresa, mas ela montou um grupo e ela consegue… Hoje, constrói casas ou partes de casas - não tenho muito essa informação - de alvenaria tradicional, de terra. Então, foi uma coisa que ela aprendeu na escola e conseguiu aplicar isso profissionalmente. Na cantaria que eu vejo um pouco menos, por isso, né? Porque é, realmente, um pouco menos comum a gente fazer alguma coisa com pedra, uma edificação com pedra, porque é muito caro. É muito difícil. Continua sendo, ainda. Então, com relação a cantaria, eu vejo essa dificuldade um pouco maior. Por isso que eu estou focando um pouco mais nessa questão de patrimônio, porque eu acho que os alunos da cantaria vão acabar fazendo isso. É mais tendencioso pra isso. (risos) Mas, óbvio, se eles receberem uma encomenda de algum... Igual: o Rinaldo faz monumentos, ele fez um monumento aqui em Mariana, pode ter alguma encomenda de lápide, não sei. (risos) Qualquer coisa os alunos da cantaria conseguem fazer, mas é um serviço menos procurado, como a pintura, ou a própria alvenaria. A marcenaria também é muito mais fácil das pessoas aplicarem, né, de forma profissional e abrir alguma empresa com relação a isso.
P1 – Já estamos chegando ao final: queria perguntar... Queria, não, vou perguntar pra você o que você mais gostou na escola e o que você não gostou, que pode ser melhorado, possível [de] ser melhorado?
R – O que eu mais gostei é um pouco difícil. (risos) Mas, realmente, esse contato com o ofício foi muito bom pra mim, porque, por mais que eu já tivesse ouvido falar de cantaria, não era uma coisa muito familiar. A hora que eu entro na escola e tenho contato, mesmo, com a ferramenta e sei como trabalha, abre os olhos pra muita coisa. E pra mim foi, eu acho, o contato com a técnica, o mais importante. Com relação à escola, assim: na primeira turma, quando eu era aluna, a gente tinha uma aula, toda semana, de patrimônio. Então, era como se fosse uma coisa mais contínua, tinha uma ordem cronológica. Como se fosse, entendeu? Eu achava isso excelente, muito maravilhoso e agora eu não sei, mas parece que é uma aula meio que... Tem a aula de patrimônio, mas eu não sei se, necessariamente, tem essa ordem, um assunto contínuo. Então, talvez isso pudesse melhorar e a questão, eu acho que a escola até pensou em fazer isso, como se fosse um módulo II, pra poder aprofundar nos assuntos e, realmente, pelo meu entendimento, a gente aprofundando no conhecimento, consegue realmente aplicar isso de outras formas. Então, acho que fazer esse módulo II, ou uma continuidade, alguma coisa assim, eu acho que seria bem interessante.
P1 – A gente já está terminando, eu vou te fazer duas perguntas finais: quais seus sonhos daqui pra frente, os que você já tem, e o que você achou de contar a sua história aqui? Quer dizer, uma parte da sua história, pra gente.
R – Meus sonhos são muitos e muito aleatórios, também. (risos) Então, fica um pouco difícil, mas não necessariamente um sonho, uma coisa que eu estou pensando mais recentemente em fazer seria um mestrado ou alguma coisa, uma especialização com relação a isso, né? À cantaria, ou aos materiais pétreos, de uma forma geral. Que aí seria não só a cantaria, mas conservação, restauro, essas coisas. Então, o objetivo que está começando a ficar um pouco mais claro, na minha cabeça, hoje, é isso. E qual que é a outra? Me perdi. (risos)
P1 – O que você sentiu, achou de contar sua história pra gente?
R – Sim. Então, eu sou um pouco difícil pra falar em público e falar com pessoas que eu não conheço, eu fico meio desse jeito. (risos) Mas, quando eu fiquei sabendo da proposta do Museu, eu achei muito interessante e até por isso que eu topei participar, né? Mas sempre com essa falta de graça. Eu achei muito bacana, né, pela proposta de vocês, do Museu, em si. Eu achei muito bacana poder contribuir, de alguma forma.
P1 – Eu posso te dizer que essa timidez, não sei se é isso, né, essa coisa de ficar sem graça, pelo menos pra mim, não foi predominante, não. (risos) Foi bem tranquilo. Foi muito gostoso te ouvir e eu ficaria mais tempo aqui. Sei que, pra você, como eu já falei, é uma energia, acaba desgastando, mas eu perguntaria muitas outras coisas a partir do que você falou. Então, foi muito rica a sua história pra gente. Muito obrigada! E Sônia apareceu aí.
P2 – Não, é só isso. Eu quero me despedir, porque eu preciso, também, falar com outro grupo e queria agradecer [a] você. Eu acho que essa timidez é, não sei, se te faz mais reflexiva, mais coisa. Então, eu acho que foi muito bom, mesmo, tudo que você falou. Foi bem acho que autêntico, assim. A gente conseguiu te ver, apesar que você diz que é tímida. (risos) Então, muito obrigada, gostei muito e aprendi muito, tá? (risos) Então, ótima a sua contribuição! Obrigada! (risos)
R – Obrigada, gente! (risos)Recolher