Entrevista de Cami Gironde
Entrevistada por Torigoe / Daniela
22/07/2021
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número FUNAS_HV022
Transcrito por Aponte
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P/1 - O seu nome completo, a cidade que você nasceu, e o dia que foi por favor?
R - O meu nome é Cami Estevão Gironde Cabral eu nasci em 30 de Abril de 1980 no município de Duque de Caxias aqui no Rio de Janeiro.
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P/1 - Cami, você sabe por acaso como foi a sua gestação? O dia que você nasceu?
R - Sim! Eu ouvi essas essa história muitas vezes. Acho que ainda escuto muitas vezes da minha mãe. Os meus pais tem uma diferença de idade bem grande, tinham uma diferença de idade bem grande, o meu pai era 19 anos mais velho que minha mãe. E a minha mãe era uma menina, para mim uma menina. Hoje eu posso dizer que era uma menina de 23 aninhos, quando eles casaram. E logo em seguida ela engravidou. Ela começou a passar mal de madrugada, deu aquele primeiro aviso, olha estou sentindo alguma coisa diferente, acho que a gente precisa ir para o hospital. Não tinha nenhuma bolsa estourada, não tinha assim, nada muito urgente. Mas eu acho que todo mundo muito ansioso, pelo primeiro filho, na época. Eles ainda não sabiam se era uma menina ou menino. E o hospital que eu nasci ficava numa ladeira bem grande, e a minha mãe conta que o carro que levou ela não subiu essa ladeira, ela teve que subir a ladeira toda, grandona, em trabalho de parto, segurando a barriga, para chegar lá no hospital. E o médico conta que foi o que ajudou muito ela no trabalho de parto. Minha mãe teve uma gestação muito tranquila, muito feliz. Uma das coisas que hoje ainda fala bastante. Que apesar deles terem uma diferença de idade, meu pai casou com ela tinha uns 43, era o primeiro filho, era o primeiro casamento dele. Hoje em dia normalmente a gente não vê uma galera assim, 43 anos sem filho, ou no primeiro relacionamento com filho, casando. E aí eles estavam com uma expectativa muito grande, era muito novinha, aquela coisa da minha primeira bebezinha. Então foi uma gravidez muito esperada e muito tranquila. E o dia do parto, foi assim, subindo ladeira um com barrigão. Eu acho que eu comecei a ser meio guerreira dali, a primeira coisa que eu enfrentei na vida, para nascer, foi uma ladeirão gigante, para chegar no hospital. Nasci de parto normal, também na época não tinha muito aquele acompanhamento dos pais na sala de parto. Hoje em dia todo mundo participando. Mas acho que logo no dia seguinte nós fomos para casa. E tinha uma festa enorme esperando por mim. Os meus pais moravam com uma tia minha, que é irmã do meu pai, e uma cachorrada, eles tinham um quintal enorme. E nós tínhamos uma cadela chamada Soraia, que era tipo um labrador, e já no primeiro dia que eu cheguei em casa, Soraia tomava conta de mim, na porta do quarto e no tapete. A gente tem uma história grande com Soraia na minha vida, desde bebezinha.
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P/1 - Você tem irmãos?
R - Então eu sou filha única, não foi muito por opção dos meus pais. Logo depois que eu nasci eu sou de 30 de Abril. Como eu falei para vocês, mais ou menos 2 meses depois, o meu pai sofreu um acidente. Voltando do trabalho e ele ficou paraplégico. Então, meu pai tinha acabado de se formar, tinha acabado de casar, tinha acabado de ter a primeira filha. E onde ele estava, acho que era o que ele mais almejava na carreira dele, que era assumir o cargo para o qual ele tinha estudado, que ele tinha se formado. O meu pai era economista da Rede Ferroviária Federal, extinta Rede Ferroviária Federal. E aí ele teve a carreira interrompida por esse acidente, meu pai levou um tiro num assalto no ônibus, que teve a reação de dois policiais que estavam à paisana. E nessa troca de tiros, um tiro do Policial pegou no meu pai, foi o caso mais grave, teve 13 feridos, e o meu pai foi o caso mais grave nessa troca de tiros. E ali a carreira do meu pai se interrompeu, e ele com muito medo, porque era um futuro incerto, profissional. Eles acabaram não tendo mais filhos, então eu sou filha única deles. O que eu tenho são muitos irmãos agregados, apesar de filha única, ou justamente por ser filha única, minha casa sempre viveu meio cheia de primos. E uma galera que estava ali para suprir algumas carências de uma filhinha única, de papai e mamãe dentro de casa. Esse acidente me fez uma privilegiada, porque eu tive o prazer de ter sido criada por uma dona de casa e por um pai muito presente, já que ele teve a carreira interrompida ali. Então o meu pai e minha mãe foram 100% presentes na minha criação, até eu sair de casa para casar.
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P/1 - Qual que é o nome inteiro da sua mãe? E quem são seus avós maternos? E de onde eles são? O que eles fazem? Eles estão vivos hoje?
R - A minha mãe é Maria Paulina da Silva Gerondi, filha de Geralda da Silva e Antônio Geronde. Meu avô paterno era filho de italianos, a minha avó materna, eu não tenho certeza da descendência dela, mas ambos nasceram na cidade de Miranda do Sul, Espírito Santo. Então são capixabas, assim como a minha mãe. Meu avô paterno era José Estevão da Silva e a minha avó paterna era Rita Francisca da Conceição, vulgarmente chamada, acho que nem cabe vulgarmente, carinhosamente chamada de tudinha. Eu não conheci os meus avós paternos, eles já tinham falecido quando eu nasci. E o meu avô era português e a minha avó era Pernambucana, de Caruaru, aonde o meu pai nasceu também. O meu pai e todos os meus tios, por parte de pai, nasceram. Então eu tenho uma mistura boa aí, tem um pedacinho italiano, meio português, Capixaba, Pernambucana. Eu tenho as características físicas toda da família do meu pai. Meu pai era moreno, cacheado, bem cacheado. E a minha mãe é branca, de cabelo liso, olhos claros, bem Italiana. Uma característica pouco brasileira, minha mãe tem carinha de gringa, gringuinha. Aí nasceu eu, bem japonesa, que nem o meu nome, como vocês podem ver o meu nome Cami, é descendente de japonês, e eu sou assim, bem japonesa, bem lisinha e amarelinha, como vocês podem ver.
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P/1 - Como é que foi a negociação para escolher o seu nome? Quem é que deu essa ideia?
R - Então o original do meu nome, seria um Cami com k, mas na época tinha umas briguinhas de cartório, alguns aceitavam algumas letras Americanas e outros não. E aí o meu pai, “não importa, eu gostei do nome, eu quero que coloque, se tiver que ser com C, pode ser, não tem problema. Mas o Cami é originário japonês e tem alguns significados, um dos significados, de papel que para o japonês é bem importante. Por exemplo, na palavra origami, eu não sei muito bem a origem do ori, mas a princípio é dobradura de papel. Tem ali o ori, o cami e juntando vira origami. Tem uma papelaria aqui no Rio, que chama Kami, o ideograma é diferente do que deu origem ao meu nome, que é Deus, como a gente tem kamikaze, que é um Deus suicida. Em outras figurinhas, para quem assisti Jaspion, assistiu Jaspion, Changeman, e todos aqueles outros seriados japoneses, é um Deus com letra minúscula. Então todas as vezes que tem como deuzinho, com letra minúscula tem um Kami, ou outra coisa muito muito parecida na palavra japonesa que dá origem. Foi por isso que meu pai escolheu. Eles não sabiam se era um menino ou uma menina, e o Kami seria um menino ou uma menina, Kami também.
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P/1 - E você sabe como seu pai e a sua mãe se conheceram?
R - Sei! Eles se conheceram numa estação de trem. Uma história bem digna de Ferroviário. Eles moravam em Caxias, na época, e os dois usavam trem para ir trabalhar. Eu acho que o meu pai conheceu a minha mãe numa volta para casa. A minha mãe conta, que estava olhando os passarinhos na estação Central do Brasil e meu pai estava olhando para ela, já de dentro do trem. E ela estava com algumas amigas, e quando entrou no trem, ele abordou ela. Uma garota linda, naquela época, ela conta que foi aquela primeira moda dos anos 70, das calças santroppê. Então uma barriguinha de fora, um cabelão enorme, e ali ele abordou. Aqueles rizinhos das amiga e tal. Eles começaram a se encontrar algumas vezes na estação, foi assim que eles se conheceram e começaram a namorar. No final de semana ela levou ele para conhecer o meu avô, que não fez gosto do namoro deles, logo de cara, porque o meu pai era velho, para ela. A 40 anos atrás, 43, 42, ele era muito velho para filha dele, mas depois que começaram a namorar entendeu que era um rapaz bem intencionado, como ele mesmo diria. E eles casaram. Foi assim!
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P/1 - E quando eles se conheceram, o que o seu pai fazia? O que a sua mãe fazia, nessa época? Se conheceram e quanto tempo depois você nasceu?
R - Eles se conheceram meu pai estava terminando a faculdade de economia e a minha mãe era empregada doméstica. Eu acho que eles namoraram por cerca de um ano mais ou menos e casaram.
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P/1 - O seu pai estava terminando Economia, mas ele já trabalhava na Ferrovia, ou não?
R - Meu pai, ele se alfabetizou muito tarde. A historinha do meu pai é bem essa, eles vieram de Caruaru, minha avó veio de Caruaru com cinco filhos, meu pai era o filho mais novo. Eles vieram direto para São Paulo, meu pai devia ter por volta de uns 14, 15 anos, ele não sabia nem ler. E quando ele foi para o serviço militar, eu não sei te precisar mais ou menos quando ele foi chamado para uma missão da ONU, e o meu pai foi para o Egito, Líbano. E ali ele foi meio que alfabetizado, meio que na marra, tinha que saber falar, tinha que saber ler, para conseguir se virar, e ainda numa outra língua. Aí ele voltou de lá sabendo escrever o nome, sabendo ler algumas coisas. Entendeu que para ele ter uma vida melhor, ele precisava estudar, que ele só via um futuro melhor para ele e para família que ele queria criar, estudando, educação. E os meus tios trabalhavam, meu pai também trabalhava, numa fábrica de sapatos e estudava de noite. E aí ele saiu de São Paulo, veio para o Rio. E o sonho do meu pai era fazer engenharia, ele começou um supletivo quando ele conseguiu terminar o científico, na época, lembro bem do termo, quando ele falava, “na minha época segundo grau era científico”. Ele tentou vestibular para engenharia durante uns 5, 6 anos, e ele não conseguia passar. E aí perto do trabalho dele, nessa época ele já era da Rede Ferroviária, ele trabalhava como contínuo ainda. E ele conseguiu então entrar na Suesc, que é uma faculdade de economia, que tem ali bem pertinho da Central do Brasil, hoje eu nem sei se ela ainda existe, acredito que sim. E ele falou: se eu entrei e consigo pagar, eu vou fazer economia mesmo. Aí quando ele entrou na faculdade, a vida profissional dele começou a mudar, ele deixou de ser contínuo, começou a trabalhar no administrativo, e depois quando ele se formou, ele chegou a assumir o cargo de economista lá na Rede Ferroviária. A minha mãe era empregada doméstica, quando ela conheceu o meu pai, que casou, ela parou de trabalhar, antes de casar, ela parou de trabalhar. E cuidou da casa desde sempre. Quando meu pai sofreu o acidente, eu acredito aliás, que essa vida da minha mãe. A gente acredita muito em Deus, a minha família é Cristã, e como isso foi bem desenhado na vida dela, na vida dele. Talvez minha mãe tivesse tido uma oportunidade, o mesmo um sonho de carreira e tal, que a minha mãe não tinha. O sonho da minha mãe sempre foi casar e ter filhos, a família dela era muito assim com as meninas, com as mulheres. Então quando meu pai sofreu o acidente, que ele ficou paraplégico, a minha mãe dedicou a vida toda a cuidar dele e de mim. Eu vejo isso como uma benção, eu falei para vocês uma benção para mim e para ele também, porque ela abriu mão. Essa missão da vida dela, cuidar, apesar de ser muito jovem, podia ter optado por não ficar com a gente, pelo menos por não querer ficar com meu pai. Mas ela cuidou do meu pai e de mim, cuida de mim até hoje. Meu pai já é falecido, mas a minha mãe cuida de mim, da minha casa, dos meus filhos, da minha vida, até hoje, graças a Deus. Estou em excelentes mãos, tenho aprendido nessa pandemia demais com ela, a cuidar, porque nunca precisei cuidar tanto, como tenho precisado cuidar agora, cuidar dela também, estou aprendendo a cuidar dela. Porque a minha mãe esse ano fez 65 anos, está entrando no time da terceira idade, das idosas. E essa missão acho que é uma missão que ela cumpriu e cumpriu muito bem. Minha mãe ficou casada com meu pai durante 36 ou 37 anos, mais ou menos, até o meu pai falecer. Ele faleceu de um câncer no fígado, chegou no estádio final e deu um até breve para gente. Todo esse tempo minha mãe se dedicou aos cuidados da casa, aos cuidados com ele, que não eram poucos. Uma pessoa que tem uma deficiência dentro de casa, passa por muitas situações, terríveis, a própria saúde fica muito debilitada, devido a postura que ele fica o dia todo. Apesar da deficiência do meu pai, era uma coisa que não define ele, a deficiência dele não define. Ele, meu pai, deixou de ser o economista da Rede Ferroviária, eu falo muito essa questão da carreira, porque isso para ele era uma coisa muito latente, durante toda a vida dele, ele se preocupava muito comigo, ele tinha muito essa coisa de, “você precisa estudar, você precisa trabalhar, que eu não sei quanto tempo eu vou viver, enquanto eu viver, estou aqui para te apoiar e te ajudar a fazer o que você quer, mas se eu morrer, eu não sei como vai ser a sua vida.” Isso ficou muito e encucado na minha cabeça, essa coisa da carreira, hoje eu até trabalho um pouquinho nisso, para ver se eu desapego um pouquinho da carreira. Penso em muito os outros aspectos como parte da minha vida, acho muito importante da minha vida, mas quando você escuta isso o tempo todo dentro de casa, isso acaba sendo muito latente, acho que fica visível na vida da gente. Mas logo que a saúde dele deu uma estabilizada, devido ao acidente, meu pai começou a dar aula em casa, ele foi professor de física, professor de matemática. E no nosso bairro eu era muito conhecida como a filha do professor Estevão. Meu pai preparava alguns alunos para Colégio Militar, para Colégio Pedro Segundo. Então mais uma vez minha casa vivia cheia de criança, vivia cheia de gente que estava estudando, que estava ali, e ele só parou mesmo, porque ele não conseguia mais ficar muito tempo sentado, o corpo enchia de escaras. Passou por várias cirurgias, e isso era uma coisa que mexia muito com a dinâmica familiar, com a dinâmica da gente. Um pai que às vezes ficava internado 1 ano, e minha mãe cuidando de mim em casa, eu não tinha os meus avós próximos, e ficava se dividindo entre os cuidados com a filha, com a filha pequenininha e indo para o hospital para poder visitar o marido. Então acho que esses são dois exemplos assim, que a minha família marcou, que os meus pais deixaram marcados em mim. A minha mãe como cuidadora da casa, do lar, da família e o meu pai com essa pressa de você precisa ser independente, você precisa cuidar de você, você precisa estudar que eu não quero que aconteceu com você o que aconteceu comigo, de deixar tudo para muito mais tarde e alguma coisa acontecer. Enfim, apesar de crer que esse era o destino que Deus tinha preparado para ele a gente tem as nossas vontades e os sonhos para os nossos filhos. Então acho que ouvi muito isso dele, a vida inteira e agora tem ouvido mais a parte dela. Às vezes tem ficado mais próximo e tenho aprendido um pouquinho mais com ela, essa parte do cuidar.
22:02
P/1 - O seu pai se locomovia com cadeira de rodas?
R - Meu pai se locomovia através de cadeira de rodas. Meu pai dirigia também, ele comprou alguns carros adaptados e tal. Acho que aqui no Brasil era um pouco novidade. Mas ele tinha muito orgulho de dizer que ele não ia desistir e que ele precisava de mais pernas, que se não fossem as pernas dele, que fosse as rodinhas da cadeira ou que fosse os braços de alguém, que ele não podia ficar ali preso dentro de casa sem ver as coisas acontecerem. Então mesmo deficiente ele correu atrás do que ele entendia que podia ser um pouquinho de liberdade para ele. Meu pai dirigia, meu pai saía, muito não, mas pelo menos para fazer o que ele achava que era básico, enquanto ele pode fazer isso sozinho ele fez, não colocou a deficiência como um obstáculo, para ele sair e tal. Só que quando ele já fez tudo isso, já estava mais velho, acho que já estava por volta de uns 60 anos, quando ele começou a poder correr atrás disso. Que aí ele não podia mais trabalhar, que acho que o sonho dele ainda era de ter voltado para uma carreira, numa empresa grande, como ele tinha.
23:33
P/1 - Você lembra das primeiras coisas que te marcaram? Quais seriam as suas primeiras lembranças se você parasse para pensar agora?
R - Eu não vi o meu pai andar, eu tinha dois meses de nascida, não viu meu pai andar e não tenho nenhuma lembrança dele de pé comigo, andando. Talvez algumas coisas eu pense, ou tenha na memória, por eu ver a minha mãe falar. Que a minha mãe contava que todos os dias, quando ele chegava do trabalho, ele tomava um banho e descia comigo para o quintalzinho do prédio, que a gente morava, e ficava comigo lá embaixo pegando aquele restinho de sol do dia, mas isso durou muito pouquinho tempo. Acho que a minha mãe conta isso muito saudosa e com a esperança que se ele andasse ela teria tido muito mais apoio, para criar, e para ter alguma liberdade dentro de casa, para fazer alguma outra coisa, com alguém tomando conta do bebê dela. E com ele já na cadeira de rodas, o que eu me lembro muito, é que ele foi muito presente. A gente comia muito junto, e talvez eu me lembrei muito disso, porque a grande maioria das minhas amigas não tinha essa presença, como eu tinha. Então quando alguém ia na minha casa, e a gente sentava para comer na mesa, e estávamos os três comendo na mesa, todo mundo achava muito legal. Porque “caramba, teu pai come todo dia com vocês, você toma café, almoça e janta”. Na verdade não tomava café, meu pai não tomava café da manhã, mas assim, almoço e janto com meu pai na mesa, todos os dias, todos os dias. Meu pai tomava muito café, e o pai tinha o hábito de tomar café naqueles copinhos de geleia de mocotó, não servia a xícara, e isso é uma coisa que eu faço até hoje, me lembro muito dele, de ter um copinho daqueles bem extrato de tomate, um copinho daqueles bem pititinhos, “não, xícara não, eu quero um cafezinho naquele copinho, que tem carinha de copinho de boteco, eu quero naquele dali”. Então isso é uma coisa que hoje eu faço, me lembro dele por isso. Meu pai estudava junto comigo, lição de casa, estudar para concurso, tudo que meu pai podia ler junto comigo, que meu pai podia discutir comigo, ele fazia. Deixa eu pensar, sempre saía para brincar e ele estava tomando conta. Ele não me ensinou a andar de bicicleta, mas era o meu maior incentivador, então assim as coisas que ele não podia participar segurando, segurando pela mão, empurrando, ou catando, ou apoiando, ele tinha uma voz muito ativa, no meu ouvido, na minha cabeça, “não, vamo embora, levanta, vamos, vamos fazer, caiu, levantou, caiu, levantou”. Eu acho que tentava tratar com a maior naturalidade. E hoje que eu sou mãe, eu vejo assim, gente não devia ser tão natural assim, porque dá uma dorzinha ver ali, levanta, mas tá tudo bem. Ainda mais sem poder ajudar muito, com o tempo a gente vai crescendo, vai ficando mais pesado, ele já não podia fazer muita força para tirar do chão, não era muito simples, porque ele mesmo podia cair. Mas assim, a lembrança que eu tenho dele é essa, sempre muito presente, em toda minha vida sempre muito presente, em tudo que ele pode participar, e ser um grande incentivador, ele não deixou espaço para ninguém me incentivar a nada, ele marcou o pontinho dele ali em tudo.
27:37
P/1 - Você se lembra da sua casa de infância? É a mesma até hoje? Vocês se mudaram muito, me conta?
R - Não! Eu nasci nessa casa em Caxias, como eu contei para você. Mas eles estavam ali temporariamente, só aguardando a compra de um apartamento, que eles tinham. E nesses dois meses, a gente conseguiu se mudar para o apartamento que o meu pai estava comprando, mas esse é um apartamento que ficava no quarto andar de um prédio, que não tinha elevador, esse apartamento eu tenho pouquíssimas lembranças, eu conheço o prédio, porque passei por lá algumas vezes, mas não me lembro muito de lá, apesar de ter saído de lá, por volta dos seis anos de idade, quase não tenho lembranças do apartamento, do lugar, sei que era um apartamento amplo, mais amplo do que o apartamento que eu passei o resto da minha vida de solteira com eles. Eles precisaram comprar um apartamento que fosse térreo, ou que tivesse elevador. Aí o meu pai comprou um outro apartamento, com ajuda da própria Rede Ferroviária, que era um apartamento térreo, ficava no primeiro andar, para facilitar a locomoção dele. Esse apartamento eu morei até os 27 anos, quando eu casei, 26, 27 anos. Porque eu me casei no dia do meu aniversário, eu casei no dia que eu fiz 27 anos. Então esses 20 anos que eu morei ali, tenho lembrança sim o apartamento, esse apartamento ainda está na minha família, ainda está comigo. Tenho uma lembrança incrível da vizinhança, todas as vezes que a gente vai lá, o pessoal já conhece os meus filhos na rua. Eu não moro muito perto, mas moro relativamente perto, e como a gente ainda tem gente próxima que mora lá, a gente tem alguns contatos. Mas o lugar onde eu fui criada, um conjunto habitacional, ali eu não tive muitas amizades da minha idade, eu me relacionava mais com pessoal mais velho, eu não era uma criança que se relacionava com as crianças da minha idade, existiam algumas diferenças entre a minha escolaridade e a escolaridade das crianças da minha idade. O meu turno escolar era diferente, por causa de série, que às vezes a escolas oferecem um turno, e eu acabava me relacionando com o pessoal um pouco mais velho. Eu perdi alguns amigos de infância ali, pro crime. Mas enfim, saí de lá bem, e viva, conheci uma realidade ali, que hoje não é a minha realidade, não é a realidade que eu tenho para oferecer para os meus filhos. Mas a gente está sempre lá, e olho para aquele lugar ali com muito carinho, foi o lugar que eu cresci e pude me expirar, em muita coisa ali, porque eu queria para minha vida hoje.
31:05
P/1 - Você pode me descrever como que era esse apartamento?
R - Logo quando a gente foi morar lá, esse apartamento, tinha um campo, dois campos, um de vôlei, mais ou menos, uma quadra asfaltada, onde o pessoal jogava vôlei ali, nos finais de semana, e à noite, muito, muito, muito. E era bem de frente para entrada do prédio, mais para esquerda, era um campo de futebol, mas de areia batida, ali foi onde eu aprendi andar de bicicleta, era um campo com muitas amendoeiras em volta. E tinham duas ruas ali, uma rua de paralelepípedo que separava meu prédio desse campo e depois do campo já uma rua asfaltada, onde os ônibus passavam. Para direita tinha um rio, que passava ali, um rio bem poluído naquela época. Mas por volta de 1993, talvez 94, não tenho uma memória muito certinha para essa data, eles começaram a construir ali a linha amarela, e aí hoje em frente ao meu prédio, esse prédio, onde eu fui criada, passa a linha amarela, ele fica bem próximo da saída 4 da linha amarela. A minha janela, quando a gente foi para lá, dava de fundos para um espaço, como se fosse uma área de lazer, e ali tinham algumas árvores, os carros dos moradores ali, e era o espaço onde as crianças brincavam. E hoje ali é uma rua projetada, onde só viraram vagas, não tem mais um espaço para brincar. Eu fui moradora do bloco 15 e o meu prédio na lateral era o bloco 16. Ali nessa lateral, tem um senhor, que é conhecido como Auê, e hoje o Auê deve estar com uns 98, 99 anos, ele é vivo ainda, ali ele tinha um barzinho, nessa esquina, esse barzinho dava bem assim para o meu quarto, o som desse barzinho dava direto para o meu quarto. Era um lugar ali de muita festa, muito pagode e a galera ficava ali, principalmente às sextas-feiras e sábados, curtindo um sonzinho e um churrasquinho ali no Auê. Hoje o Auê não promove mais as festas, acho que ele está um pouco mais tranquilo com ritmo de festa dele, mas ele até hoje está lá e todos os dias ele tem uma rotina, ele já fazia isso na minha época, quando eu tinha 7, 8 anos de idade, descia do apartamento dele, abria o barzinho, que era um barzinho meio garagem, onde ele tinha ali umas ferramentas de serralheiro, de marceneiro e tal e ficava ali o dia todo, sempre com uma galera em volta dele, bebendo alguma coisa, fazendo servicinho, consertando um fusquinha, consertando um carrinho. Isso dava um movimento ali para o lugar, em que eu me sentia muito segura, eu não tinha medo de chegar ali, hora do dia e nem da noite, porque eu sabia que todo mundo que estava ali me conhecido, afinal de contas eu era filha do professor Estevão. Todo mundo conhecia meu pai, todo mundo me conhecia como filha dele. Essa convivência com eles, aí nesse interblocos, quando eu comecei a fazer faculdade, que foi a primeira vez que eu estudei à noite, eu acabei ficando conhecida em todos os botecos que tinham da Gama Filho até minha casa. Porque eu voltava a pé para casa, da universidade para casa eu voltava a pé, e aí todos os lugares onde eu passava, que tinha o hábito de ficar com gente ali, eu cumprimentava, então todos os botecos me conheciam, eu passava, “gente, boa noite, boa noite”. Eu não bebo, não bebo nada, até hoje, mas todo mundo no boteco me conhecia. Se eu passasse cinco minutos mais tarde, ou meia hora mais cedo, sempre tinha alguém para dizer, “ué”? Eu não sabia o nome dessas pessoas, “está passando mais cedo hoje menina”. “Hoje estou correndo, hoje eu tive prova”, ainda dava uma satisfação da vida e ia embora. Então, recentemente, recentemente não, já tem 10 anos que eu estou morando no lugar onde eu moro hoje, e diferente de mim o meu marido morou num condomínio de casas, e que não tinha muito essa vizinhança como eu tive a do Auê, qualquer comércio, qualquer outra coisa, já era fora do condomínio. Logo quando eu fui morar ali, tem um boteco, uns 200m da minha casa, e eu passei por lá, e uma das primeiras coisas que eu falei: olha, passa por aqui cumprimenta quem está por aqui, porque a gente vai passar por aqui de noite e a galera tem conhecer a gente, isso dá uma certa segurança. Ele: eu nunca vi isso, como assim conhecer o pessoal do boteco? Eu falei: gente, mas esse povo ajuda a gente, esse povo está aqui olhando, eles sabem a hora que a gente chega, sabem a hora que a gente sai, quero tê-los sempre como os meus olheiros, meus amigos, de que eu estou vindo, eu estou passando, estou passando com criança. E quando eu comecei a buscar os meus filhos na escola, voltava às vezes de carrinho e grávida. Teve uma época que eu estava grávida do meu mais novo e o meu mais velho não andava no carrinho de jeito nenhum, quantas vezes os botecos me salvavam, tipo de vir da escola com o meu mais velho no colo, já com aquele barrigão, porque ele dormia no meio do caminho, do nada. Então eu vinha carregando a barriga, carregando a mochila e o gorduchinho de 4 aninhos meio pendurado, chegava no boteco, dava uma sentadinha, tinha sempre alguém ali, “senta um pouquinho, respira, quer uma água, quer alguma coisa”. E eu devo isso a essa convivência, com esse botequinho ali interblocos, que me deixava bastante à vontade.
38:02
P/1 - Você falou que sempre tinha tio, tia, e a cachorra Soraia também. Me conta essa história da cachorra Soraia?
R - Eu tenho algumas Sorais queridas na minha vida. A Soraia, eu convivi pouquinho com ela, logo que eu nasci e que eu fiquei nessa casa lá em Caxias, que a minha tia tinha a Soraia, que a minha tia criava Soraia. Soraia tomava conta de mim, na beira do berço, estava lá deitadinha, vestidinho, arrumadinha, muito pequenininha e ela tomava conta da Cami. E algumas vezes minha mãe passava por ela e falava: olha, toma conta da Cami. E ela não deixava nem minha tia colocar a mão no berço para me pegar. E aí durante um tempo, logo que a gente se mudou, devido ao acidente, Caxias não era muito perto, para ir de ônibus, minha mãe não tinha carro, minha mãe não dirige. Depois de um tempo eu voltei a casa onde Soraia estava. E Soraia reconheceu o cheiro da Cami, o cheiro do seu Estevão na Cami, e Soraia deitou no meu pé, como se ela tivesse participado da minha vida, sentindo falta dele, todo tempo que a gente ficou longe. E ela tinha quase que uma devoção, voltar lá, e encontrar Soraia todas as vezes que ela me via se arrastava e vinha assim como se ainda tivesse tomando conta do bebezinho no berço. Soraia morreu quando eu tinha uns 12 anos, e ela tinha quase uns 18, morreu uma cadela muito, muito, velhinha, morreu dormindo. Eu tenho outra Soraia muito especial, foi a minha primeira estagiária em Furnas, e eu estou me preparando para ser madrinha de casamento dela daqui 1 mês e 1 semana. Essa segunda Soraia, ainda mais maravilhosa que a primeira, foi a primeira estagiária que eu tive em Furnas. A gente saia juntas, e as pessoas perguntavam para mim quando que o meu contrato acabar. Porque eu já era analista, mas me tratavam como estagiária ainda. Nossa amizade cresceu muito ali. Eu era funcionária do antigo DDS, ponto G, que era a Divisão Desenvolvimento de Sistemas para área de suprimentos e ali nasceu uma grande amizade, não podia deixar de ser diferente, essa Soraia na época tinha por volta dos seus 19 anos, eu já tinha uns 20 e uns, uns 26 talvez. E aprendi muito ensinando para ela, como desenvolver algumas coisas ali na empresa. E agora recentemente, a gente nunca se desligou, mesmo 16 anos depois, 17 anos depois, a gente nunca se desligou, eu fui surpreendida com convite para ser madrinha do casamento dela, estou me preparando para isso. Soraia é a filha menina que eu não tive, não tenho idade para ser mãe, mas é uma filha de coração, uma amiga maravilhosa, uma mulher linda e uma profissional exemplar.
41:38
P/1 - Como é que era essa coisa da sua casa, que você disse que tinha sempre um monte de gente, primos, tios, tias. Como é que era essa convivência na época?
R - Então, filha única, com muitas características de filha única, imagina filha única, com pai e mãe em casa o tempo todo, super presente, precisava de ter uma família por perto para dar algum apoio. Um dos irmãos do meu pai, teve 12 ou 13 filhos. E quando meu pai se casou, um pouco antes do meu pai se casar, meu tio ainda não tinha todos esses filhos, estava ali pelo 4º o 5º filho. Meu pai ganhou um filho de presente, quase um filho de presente, um sobrinho, veio morar com ele, com a minha outra tia que era solteira. E esse é um primo muito presente na minha vida, desde então. O nome dele é Kleber, ele também foi funcionário da rede Ferroviária Federal, quando ele fez 18 anos, ele foi para lá, foi trabalhar lá. E ele ajudou a manter um monte de coisa da história do meu pai na minha vida. Ele tem uma irmã, que a Kelly, que já é a 12º ou 13º, desse mesmo tio, que também morou um tempo com a gente. Então assim, eu não tenho irmãos de sangue, mas esses foram dois irmãos que passaram muitas vezes pela minha casa, para que eles pudessem conseguir realizar os planos da vida deles também. São meus primos de sangue, são meus irmãos de coração. O Kleber morou com a gente, eu acho que umas 10 vezes, umas 10 vezes diferente, uma 10 idas e vindas, cada vez que tinha um plano, precisava fazer uma mudança ele estava por ali. E algumas vezes fez bastante papel de irmão mais velho, algumas vezes fez papel de pai. Eu me lembro de uma história que... eu fui uma aluna muito burra e era uma filha muito tranquila também, mas um dia quando eu estava na escola técnica, eu resolvi matar aula, não sei dizer se isso é uma característica de uma boa filha, mas como eu nunca tinha feito isso na vida, eu tinha aí por volta de uns 15 anos. Eu liguei para o meu pai e avisei, “o pai, vou matar aula, minha turma inteira está indo matar aula, eu vou matar aula também”. E meu pai falou: mas vocês vão matar aula onde? Vão matar aula fazendo o quê? Por que você vai fazer isso? “Pai todo mundo vai, eu não tenho porque ficar aqui sozinha, eu vou também, vou matar aula também”. E o pessoal foi para o shopping, quando eu cheguei no shopping eu dei de cara com ele. E aí eu falei, caramba que vergonha. Eu tinha contado para o meu pai, como é que eu podia não ter vergonha de falar para o meu pai que ia matar aula, mas como foi esquisito para mim, ser pega no flagra, por ele ali. As minhas primeiras festas, as primeiras saídas, que eu não pude ter o meu pai presente, ele era quem fazia as vezes, a presença masculina ali para me auxiliar, para me levar e tal. A Kelly esteve menos tempo com a gente, morando, mas também foi uma presença, irmã mais velha, me ajudou perder alguns medos, tipo esse, matar aula sem precisar contar para o pai, isso não existe. Ele era um pouco mais desprendia, um pouco mais rebelde. A gente fazia uma parceria excelente, porque eu tenho essa cara de sem vergonha, e era muito certinha, e ela tem uma cara de santa, até hoje, e era da pá virada. Então, tudo que ela aprontava, caia na minha conta, porque ninguém acreditava que tinha sido ela que tinha feito, e achavam que tinha sido eu, quando a gente contava história, quem conhecia sabia o que era, mas no final das contas eu também gostava de levar a fama de rebelde, só para dizer assim, “vocês sempre acham que eu não faço nada”. Até perder o medo de começar a fazer umas gracinhas de adolescente. E além deles, eu tenho dois outros primos também muito presentes, que eram os filhos do meu padrinho. Meu padrinho era o irmão da minha mãe, meu tio João Batista, que eu nem sei dizer como foi maravilhoso tê-lo na minha vida, em todos os momentos que a gente precisou, ele estava lá, muito próximo, era o irmão mais próximo da minha mãe, ele já é falecido. E eu tive o prazer de ser muito próxima dos filhos dele, que é a minha prima Elba e o meu primo Helder. Eles são mais jovens do que eu, é um outro contexto de primo, são mais novos, mas eles sempre me receberam e sempre foram recebidos na minha casa com muito, muito carinho. E como eles eram crianças que moravam em casa e eu era uma criança de apartamento, apesar de serem mais jovens, eles eram muito mais espertos do que eu, para muitas coisas, para muitas brincadeiras. Tenho muitas lembranças de brincadeira, de sair, de correr, de cair, de machucar. E de quando está na casa deles de aprender umas coisas que dentro do apartamento a gente não faz, que no play a gente não faz, que numa área de lazer a gente não faz, que só em casa mesmo. Correr de vaca, subir em árvore, enfiar o pé na lama depois de ter acabado de tomar banho. Uma das coisas que a gente viveu junto na casa da minha vó, foi bem assim, a casa da minha avó tinha um balanço e todo dia tinha horário do banho, a gente ficava o dia todo na rua em férias e horário do banho, “entra vai tomar banho”. E aí uma vez dessas, nessa hora do banho, eu resolvi tomar banho, mas fui sentar no balanço. Tinha chovido, eu tomei um tombo do Balanço, tinha lama até o último fio de cabelo, eu me lembro ainda, do rosto deles rindo de mim, com a roupa toda suja de lama, muito legal. Então assim, acho que a minha família tentava suprir essa coisa da filha única, da presença masculina em algumas coisas que o meu pai não podia participar. Então eu lembro muito deles nessa coisa da infância. Eu tenho outros primos que também participaram, mas acho que essas quatro presenças, são as quatro presenças assim mais reais, como primos e como família.
49:36
P/1 - Você consegue listar o que vocês brincavam nessa época? O que você mais gostava Cami?
R - As lembranças de brincadeiras legais, todas são da casa da minha avó. Na minha casa o que a gente fazia era andar de bicicleta, jogar bola. Mas na casa da minha avó a gente barbariza, eu ficava muito levada, quando estava na casa da minha avó. Eu me lembro da gente brincar de roda, apesar de ser uma brincadeira super tranquila, a gente brincava de roda e tinha muitas cantigas, porque a minha avó é Capixaba, e bem de roça, tinham muitas cantigas, que a minha avó cantava. E que hoje, quando eu escuto os meus filhos cantando, eles mal sabem o que a gente fazia quando aquela música tocava, porque tem algumas músicas que a gente brincava de roda, mas só rodava, só dava a mão e rodava. Como era divertido, só da mão e rodar e olhar para a cara dos seus amigos e rodar. Cantigas de roda, a gente jogava muita bola, alerta, é uma brincadeira que eu não vejo as crianças brincando hoje, quando brincam de bola, é diferente de queimada, mas a gente jogava também muita queimada. Queimada a gente joga até hoje, quando a gente tem um grupo muito grande, ainda tem uma brincadeira, aí eu vejo as crianças jogando queimada. Me lembro de jogar bola, me lembro de jogar queimada, lembro do povo brincar de salada mista. Que era uma brincadeira assim, na casa da minha vó, onde tinha muita criança, ficava uma fila enorme de crianças brincando de salada mista. A gente pulava amarelinha, era fácil desenhar uma amarelinha no quintal, que era de terra. A gente corria muito atrás dos bichos, subia muito em árvore, catava muita fruta, corria de vaca mesmo, prendia as roupas na cerca, naqueles aninhos farpados e voltava para casa todo rasgado, todo arranhado. Não estou me lembrando de nenhuma outra brincadeira, assim específica, acho que só essas, acho que era bem mais elevada do que hoje. Eu tento fazer que os meus filhos façam, mas hoje quando eles veem uma cerca de arame farpado, eu não incentivo muito não, que tentem pular. Mas acho que é isso.
52:34
P/1 - Nessa época você lembra de ouvir muito rádio na sua casa? Assistir muita TV? Vocês gostavam disso nos anos 80, na sua infância? O que vocês ouviam, o que vocês viam na época?
R - Rádio gente escutava muita notícia. Meu pai ouvia muito rádio, mas não era uns muito musicais, não me lembro. Lembro Kleber, ouvindo muita música, me lembro mais das músicas dele. E me lembro de Paralamas do Sucesso, que ele escutava muito, e eu acabei gostando depois. Mas eu lembro de uma música, que talvez seja Nenhum de nós, que cantava, que era Marvin, era uma música que eu me lembro dele fazendo barba no banheiro e está escutando. Titãs? Marwin? Isso mesmo! Me lembro de Astronauta de Mármore, que era uma música que eu amava quando ele ouvia. Marina, quando ele ouvia, mas nós não éramos muito musicais. Meu pai e minha mãe não eram muito musicais. Eu me lembro do meu pai ouvir muito rádio, notícia. Eu fui baixinha da Xuxa, durante um tempo, mas a gente não tinha grana para comprar roupa do Bicho Comeu, e tal, e eu nem era loira e linda para ser paquita. Então era uma baixinha assim, que eu gostava, mas com as minhas ressalvas. Eu lembro das minhas férias, em que eu estava em casa ansiando pelas idas para a casa da minha avó, sentava na frente da Xuxa e eu passava a manhã inteira assistindo o Show da Xuxa, adorava. E de tarde tinha o Clube da Criança, com Angélica, na época ainda do vou de táxi. Mara Maravilha, uma coisa que eu assistia muito. eu assisti muito TV, hoje eu brigo com os meus filhos que eles veem televisão, mas eu assistia muita TV. Tinha um programa chamado ZY Bem Bom, que eu acho que era no canal 7, Bandeirantes. Tinha alguns desenhos, estou falando que a gente não era musical, mas um dos desenhos favoritos nessa época, era Jean e as Hologramas, que eram duas bandas de rock rivais, que eu amava. Mas também curtia na época, os desenhos que o povo dizia que era desenho de menino, eu gostava muito de He-Man, Thundercats, Liga da Justiça, o Fantasma. Denunciando muito a idade aqui, eu já falei o ano que eu nasci. Mas tinha uns desenhos de super-heróis que hoje em dia a gente nem ouvi falar muito. Já gostava muito de homem-aranha, muito diferente do homem-aranha de hoje. Mas recente, desenho animado que eu curtia muito, era o Capitão Planeta, adorava, já pegando uma primeira onda de sustentabilidade, uns assuntos bem atuais. Mas eu acho que Capitão Planeta tem pelo menos uns 30 anos, se não tiver, uns 25. Gostava muito dos filmes japoneses, Ultraman, Ultraseven, Spectroman, Jaspion, Jiban, Changeman, Flashman. Assistia muito, acho que TV para mim, era muito isso. Mas eu acho que eu fechei uma saga de televisão, por volta de uns 15, 16 anos. E aí eu entrei no pré-vestibular, na faculdade, aí eu dei uma afastada da questão da televisão. Apesar da muita televisão, e apesar de eu ter dito que a minha casa não era muito musical, eu passei adolescência, como eu falei para você, a minha família Cristã. Eu passei a adolescência, eu tocava teclado numa igreja. Então um pouco do que ouvia mais, que eu escutava mais, eram músicas da igreja, que eu ensaiava eram músicas da igreja, para tocar ali, e era paixão da minha vida. Foi uma época muito feliz, eu fazia aquilo ali com muita dedicação. Eu fiz isso acho que dos 11 aos 18 anos. E com 18 anos, que foi a época que começou a apertar um pouco mais o clima na faculdade, de mais matéria e mais trabalho, eu acabei precisando dar uma parada. E eu nunca mais voltei a tocar, recentemente comprei um teclado, para ver se eu consigo introduzir esse amor para os meninos. Mas ainda sou uma pessoa muito pouco musical, precisava ser mais, queria muito mais. Mas não consigo dedicar meu tempo para isso.
57:47
P/1 - Na TV você lembra de assistir novela? Você lembra se alguma te marcou? Futebol também, você falou que jogava muito, vocês tem um time no bairro, na sua casa?
R - Meu pai torcia para o Bangu. Então você vê que é uma paixão por futebol muito diferente. Como ele mesmo dizia, ele era apreciador de um bom futebol. Então meu pai via na televisão, qualquer jogo de futebol que tivesse passando, se tivesse passando a quinta liga lá de Itapipoca, se o meu pai tivesse com a televisão ligada, e tivesse qualquer outra coisa passando e o jogo, ele assistiu futebol. Mas não era um grande torcedor, não era um grande apaixonado, gostava, porque para ele era melhor ver aquilo dali do que qualquer outra coisa. Mas era um cara que ficava ali comentando, todas as jogadas. Como eu disse, meu pai da torcedor do Bangu, eu virei a casaca algumas vezes, não vou dizer para que time, porque eu não quero que isso fique manchado no meu currículo. Mas hoje eu sou vascaína, já adolescente eu era vascaína, mas eu fui e voltei umas duas vezes, até me decidir. Foi muito bom, porque o meu marido é vascaíno, não virei a casaca por causa dele, que isso fique bem claro, mas quando conheci, que ele era vascaíno, então agora eu acho que eu não mudo nunca mais, até para incentivar os filhos a amar um time levá-los ali. Tenho um marido vascaíno, dois filhos vascaínos, na minha casa não entra outra camisa, só do Bangu e da seleção de Portugal. Vasco, Bangu, que era o time do meu pai, eu tenho umas camisas do Bangu, seleção brasileira e seleção de Portugal. Voltando ao meu pai, uma coisa que a gente assistia muito, jogos olímpicos na TV, quando era época de copa e olimpíada, a minha televisão era ligada às 6 horas da manhã, dependendo do horário do país, e a gente assistia tudo, tudo, esgrima, atletismo, o que tivesse passando de olimpíadas e a gente assistia, gostávamos muito. Fórmula 1, eu fui apaixonada, eu tinha um gato que era apaixonado por Fórmula 1, a gente ligava a televisão no domingo, nas corridas do Nelson Piquet, nas corridas do Sena, e o meu gato ficava tentando pegar os carrinhos, no canto da televisão. A morte do Senna para gente foi um terror, me lembro até hoje como eu recebi a notícia, era uma coisa que a gente fazia praticamente todos os domingos. A única coisa que eu me lembro muito da Fórmula 1 é, “o Grande Prêmio de Mônaco”, quando eles anunciavam, “o GP de Mônaco”, meu pai ansiava, por aquela pista, ele gostava muito. Me lembro basicamente disso. Teve uma época também, que era muito Silvio Santos, a gente ligava a TV, na época do Domingo no Parque, “lá, lá, lá, lá, lá”, e assitia Silvio Santos durante um tempo. Acho que boa parte do Domingo a gente assistiu Silvio Santos, isso é uma coisa quase religiosa, assistindo Sílvio Santos. Acho que a gente ia a igreja de manhã, assistia Silvio Santos, comia macarrão, maionese e frango, que era o prato de domingo, a macarronada da mama, coca-cola, que era coca-cola de 1 litro, e dava para uma família, que é coisa impressionante. Hoje em dia eu não bebo mais coca-cola, mas naquela época a gente torcia para não chegar visita em casa. Você não deve ser dessa época. Mas a gente torcer para não chegar visita em casa, para ter um copinho de coca-cola para tomar na janta, que a garrafa era aquela de um litro, de vidro. Acho que isso, TV. Eu não sofria da síndrome do Fantástico, segunda-feira para mim é um dia feliz, de deixar de estar só com pai e mãe, para ir para escola e fazer um monte de outras coisas. Novela, eu me lembro de ter acompanhado um pouco, Tieta, uma novela que eu me lembro um pouco, Dona viúva Porcina, Regina Duarte. Talvez uma das últimas novelas que eu tenho assistido, não me lembro, Laços de Família, é uma novela que eu me lembro um pouco. Sítio do Picapau Amarelo eu assisti algumas vezes, bem pequena. Uma novela que a gente tem uma marca, eu já tinha o meu primeiro filho, estava fazendo uma pós-graduação, não fui eu que assisti, foi o meu marido que acompanhou a novela inteira, que foi Avenida Brasil. Eu me lembro de chegar em casa, e ele ter um milhão de coisas para contar sobre a novela e eu mal fazia ideia de quem era Carminha, porque eu estava estudando. e ele ficava em casa com o Samuca pequenininho, assistindo novela, até a hora de eu chegar da faculdade. Acho que o início de Malhação, eu assisti um pouco, mas não acompanhei muitas fases de Malhação, a minha Malhação ainda é da época do Danton Mello, em que ele era o faxineiro da academia, acho que é a bem primeira versão, o Mocotó, que é o André Marques. Acho que televisão não estou me lembrando de nenhuma outra coisa, assim, muito especial, mas acho que até lembrei bastante. Mas novela nunca foi meu forte, eu gostava muito dos desenhos e dos filmes. Falando agora que novela não foi muito forte, na época, as nossas séries eram as Panteras, Trovão Azul, Magaiver, Barrados no Baile, Maltose. Teve uma época d minha vida também, que eu assistia um pouquinho. Friends, acabou sendo mais recente, mas adolescente eu acho que eu assistia um pouquinho dessas daí. Gostava muito de Magaiver, muito, muito. Descobri recentemente que tem uma nova versão no Amazon Prime, que não se compara, não é igual. As Panteras já era uma coisa bem feminista, para as meninas na época, também não é a versão mais nova, que não é mais nova, a última versão das Panteras deve ter uns 14, 15 anos já, talvez. Mas a versão que eu assistir pequenininha ainda era meninas de Santropê e calça boca de sino. Não estou me lembrando de nenhum outro programa marcante não, na TV.
1:04:59
P/1 - Você lembra de algum jogo do Vasco que te marcou? Na época da sua infância era uma ótima época do Vasco, né?
R - Eu contei para você que eu virei a casaca algumas vezes né, então. Quando eu era pequena mesmo, eu não torcia, torcia. O jogo do Vasco, que assim, eu não estava lá, apesar dessa época já ter ido a São Genaro algumas vezes. Foi o jogo que a arquibancada caiu, e que foi muito tenso, isso foi uma coisa que eu não esqueci, mas esse jogo especificamente eu não estava acompanhando, nem pela televisão. Eu tenho mais jogos de outros times, mas não, mas tem alguns outros jogos que me marcaram mais, um jogo que para mim foi inesquecível, a gente assistiu um Boca Juniors, não vou me lembrar agora o nome do outro time. Mas lá na Bombonera, e eu fiquei muito apaixonada, pelo jogo, pelo lugar, pelo estádio. A gente ter saído de onde a gente estava, também a gente já tinha criança, e minha sogra estava comigo, a gente vai arriscar, a gente tem que ir até lá, não dá para ir embora daqui sem assistir um jogo com eles. E a gente ficou muito impressionada com os argentinos. A gente foi de táxi, mas os ônibus, todos estavam lotados de argentinos. Todos os ônibus, um trânsito enorme do lugar de onde a gente estava, até lá. A gente fala que o carioca é muito apaixonado por futebol, mas a gente não tem noção do que eles fazem lá para poder chegar no jogo. E os ônibus tinham gente saindo pelo teto, pela janela e cantando muitas músicas, todas as músicas deles, para chegar no estádio. Não estou me lembrando o nome do outro time, se eu me lembrar, Barcelona Guayaquil, foi um jogo da Libertadores, e foi boca Júnior e Barcelona de Guayaquil. Muito impressionante o jogo, muito impressionantes o estádio, muito impressionante os argentinos. Todos os jogos do Vasco que eu fui, eu fui assim, Vasco e Itapipoca, porque eu tinha muito medo de pegar um Vasco e Flamengo e acontecer alguma tragédia no campo. E presencialmente assiste outros pequenos jogos, só para levar os meninos até o estádio, para conhecer como era e tal. Meu marido já foi muito apaixonado por Futebol, mas hoje em dia a gente dá aquela assistida de longe. Não tem nenhum jogo Marcante de quando pequena, do meu time. Eu me lembro do tetra campeonato, não sei quantos anos eu tinha, nem sei se eu era tão pequena assim, mas eu me lembro assim, dos gritos do Galvão e me lembro de chorar muito, muito, porque talvez eu nunca mais tivesse oportunidade de ver o Brasil sendo campeão de uma copa. Depois daquilo ali, a gente ganhou de novo, mas tinha um tempo que a gente não ganhava uma copa do mundo. Eu me lembro da festa, de todo mundo super comemorando. Eu era muito fã do Leonardo, todo mundo era fã do Bebeto e dos outros times, mas eu gostava muito do Leonardo, que me chamou atenção algumas vezes, por causa de algumas entrevistas que ele já tinha dado, acho que ele já tinha uma carreira internacional, era um cara de Niterói, e isso ficou marcado na minha infância. Eu me lembro da cotovelada que ele deu um jogo e que eu defendi ele até a morte, “claro que não, ele não deu aquela cotovelada, ele quebrou o nariz do cara, mas foi a altura que o cara estava ali”, ele ficou fora dos jogos, é isso.
1:09:25
P/1 - Como que foram as escolas que você frequentou até a faculdade? E o que você lembra com mais vivacidade das escolas que você passou?
R - Eu estudei do maternal até a 4ª série, no Colégio Pequeno Céu, extinto Colégio Pequeno Céu, localizado ali na rua Ritid, meu bairro ainda, Todos os Santos. E hoje ali é uma escola estadual. O diretor da minha escola, o sobrenome dele era Marçal, casado com a dona Isabel Marçal, eu me lembro que ela era uma mulher muito, muito, bonita. Eu me lembro da minha primeira professora, tia Mary, a professora do maternal. Lembro do primeiro Dia das Mães, nesse maternal, que a gente cantou uma música que era do Trem da Alegria, que É de Chocolate, o nome, e na música a gente cantava com uma colher de pau, mexendo numa panelinha, que deve ter sido muito bonitinho. Mas eu lembro dessa panelinha e da leiteirinha, cantando É de Chocolate. Minha professora do jardim foi a tia Cátia, que foi uma pessoa que apareceu em muitos momentos da minha vida, era quase minha vizinha, depois que a escola acabou, ela montou uma escolinha para ela. Minha professora do CA, que me alfabetizou, foi a tia Gleide, que era também linda e terminou o ano letivo grávida, e eu achava engraçado, porque na minha cabeça professora não ficava grávida, porque ela era tia de tanta criança, mas eu me lembro dessa tia Gleide grávida. A minha primeira série, eu não me lembro, mas a segunda série as minhas professoras foram a tia Fernanda e a Tia Arlete, também me lembro da tia Fernanda, como se fosse hoje, com os muito xixis na calça. O meu uniforme era lindo, era um uniforme branquinho, uma camisa social branca, e tinha um cachorrinho na camisa, e a minha saia era azulzinha quadriculado, mas não era ainda que ela sainhas de pregas não. Nessa escola eu tinha 3 grandes amigas, Aline Formiga, Amanda Lima de Souza e Beatriz Ribeiro Valério. Depois de um tempo a gente se encontrou novamente no Facebook, mas Aline mora muito próximo dessa escola, então vira e mexe encontra ainda os pais dela, acho que ela já não mora mais por ali. A Bia hoje está em Recife, e a gente tem algum contato pelas redes sociais. E a Amanda é de Macaé, também a gente vira e mexe ver uma coisa da outra. Amanda era minha vizinha, na casa dos meus pais, a gente morava bem perto. E quando eu sai da 4ª série, eu fui para o Colégio Metropolitano, que é no Méier, era um colégio que já não era muito pertinho da minha casa, tinha que pegar ônibus, e estudei lá da quinta a oitava série. E na oitava série eu comecei a ver alguns dos meus amigos dizendo que queriam fazer Escola Técnica. Apesar de eu ser uma das mais novas da minha turma, eu achei que eu podia fazer Escola Técnica também. Eu nem entendi muito porque o pessoal estava saindo dali, fazendo concurso, para escola técnica. E aí já começa algumas das minhas histórias favoritas, de formação. É que no oitavo ano, lá no colégio, a gente tinha o soil, na minha primeira escola não tinha, mas o serviço de vocação já falava algumas coisas com a gente, sobre orientação vocacional. Quando eu falei, todo mundo quer fazer Escola Técnica, deve ter alguma coisa boa de fazer Escola Técnica. O meu pai não era favor, mas eu comecei a falar muito disso, e a querer muito isso. E o meu teste vocacional, o primeiro teste vocacional que eu fiz, deu interesses dispersos, mais uma tendência para Belas Artes. E eu escondi o resultado daquele teste vocacional do meu pai, porque eu não podia dizer para o meu pai que a minha tendência era para Belas Artes, eu nem sabia direito o que era Belas Artes. Aliás acho que até pouco tempo atrás eu não sabia direito tudo que estava dentro de artes, mas ali eu queria fazer Escola Técnica, não sabia muito bem porque, porque todo mundo queria. Mas eu via na escola técnica uma oportunidade de ser independente, como ele dizia para mim que eu deveria ser. E aí como essa coisa dos interesses dispersos, a única coisa que passou pela minha cabeça e que ele aprovou, foi fazer um segundo grau voltado para processamento de dados, e que eu poderia aplicar processamento de dados em qualquer outra coisa que eu fosse escolher, para fazer a faculdade, mas que ainda não era uma decisão, eu não tinha obrigação de tomar aquela decisão. E aí eu fui estudar numa escola que também era bem pertinho da minha casa, que foi a Escola Técnica Virgínia Patrick. E ali eu fiz um 2º grau, que era em 2 anos, na época eu não tinha a menor pressa. Mas enfim, era uma escola técnica próxima da minha casa, fiz uma bolsa, ganhei uma bolsa para escola e estudei os 2 aninhos ali. Quando eu saí dali, eu tinha só 15 anos, quando eu terminei a Escola Técnica. E eu achava que ia sair dali, e eu ia conseguir um emprego, de técnicas de processamento de dados em qualquer lugar. E ninguém me aceitava, nem para fazer estágio, porque eu era muito nova. Mas eu descobri que aquela coisa de processamento de dados, rolava, que a minha cabeça rolava para aquilo dali, que tinha alguma tendência que poderia ser aproveitada naquilo dali. Essa experiência do 2º grau técnico, foi muito diferente para mim, porque, como eu falei para vocês, eu era muito novinha, eu entrei no segundo grau, com 13 anos terminei com 15 anos. Mas quando eu entrei, a minha turma, era uma turma de pessoas que estava correndo atrás de fazer o segundo grau em dois anos, porque já tinham ficado reprovados. E essa opção da Escola Técnica em 2 anos era para recuperar o tempo perdido. E eu era muito novinha, e a galera já tinha 16, 17 anos. Eu fui muito patinho feio, nessa turma de Escola Técnica, eu era muito excluída, era carinhosamente excluída, por eles, porque eles me poupavam de assuntos que eles diziam que eu era muito jovenzinha, “não, você é muito novinha para escutar isso daqui”. E foi a primeira vez que eu senti uma diferença de maturidade, eu não tinha muita maturidade, porque eu queria estar popular ali, eu queria estar junto com eles, eu queria participar de tudo. E eu era sempre muito barrada, tanto que assim, eu tenho muito pouco contato, eu tenho algumas lembranças, mas tenho muito pouco contato com essa turma de Escola Técnica, só tem uma amiga, Patrícia Silva Araújo, que a gente se fala, até hoje, são duas, na verdade. E a Michele, que também era um pouquinho mais velha, mas a Michele era um pouco mais quietinha, um pouco mais estudiosa, não era muito da panela da bagunça, da galera que saía mais, e a gente se tornou ali um triozinho mas quietinho. Que a galera só procurava a gente para copiar a matéria do caderno, porque o nosso caderno era arrumadinho e colorido, então a gente só era amiga deles em época de prova, e que para gente era uma enorme satisfação, porque tinha alguém um pouco mais velho, que chegava conversava e trocava uma ideia. Então essas foram as três escolas que eu passei na minha vida. Depois que eu sair dali, eu precisei fazer um ano de pré-vestibular, entrei no pré-vestibular para recuperar o que eu não tinha aprendido na escola técnica, porque era em dois anos. Mas não fiz um ano de para vestibular. Planejei fazer um ano de pré-vestibular, e só fiz seis meses, nesses seis meses eu fui aprovada para a Universidade Gama Filho. E aí entra algumas questões de porque a gente não optou por uma universidade pública e acabou ficando com universidade particular.
1:19:02
P/1 - Todos os Santos é Zona Norte?
R - É! E o Méier é do lado. Todos os Santos é um bairro muito pequeninho, tem, sei lá, uma meia dúzia de ruas de um lado da estação e umas três ruas do outro lado. Eu não sei nem localizar essa escola, se é Todos os Santos, ou outro bairro.
1:19:32
P/1 - Com 15, 16 você estava na igreja também, né? Era igreja católica ou era evangélica?
R - Era uma igreja evangélica.
1:20:00
P/1 - Você participava de grupo de jovens? Como é que era esse grupo? Que igreja?
R - Eu passei a adolescência, boa parte da infância e da adolescência numa igreja evangélica, que era a Igreja Cristã Maranata. Como eu comentei, acho que dos 11 aos 17, 18 anos mais ou menos, eu fui tecladista deles, e a gente tinha um grupo de jovens muito legal. Eu tenho algumas amigas de lá ainda, Juliana, Edgar, foi ali que eu tive o meu primeiro namorado. Muitas pessoas passaram pela minha vida alí, eu dediquei a minha adolescência a Deus, e a servir a igreja e a Deus ali na igreja. Apesar de muitas coisas aqui fora e da juventude me chamar bastante atenção, eu me sentia muito segura e muito feliz fazendo o que eu fazia lá. A igreja promoveu algumas viagens, a gente tinha alguns retiros, em Cachoeira de Macacu, em Pedro do Rio. Apesar de morar em todos os santos, a minha igreja em Osvaldo Cruz, não era muito perto da minha casa. Eu tinha uma frequência assim, quase que diária, de estar lá, de estar com eles, nessa época. Foi por isso que a faculdade acabou dando uma afastada, porque eu não conseguia conciliar os meus horários da faculdade com a ida até lá. Eles são uma igreja que até hoje eles têm cultos diários, não agora na pandemia. Porque algumas igrejas não tem cultos diários, não sei se todo mundo sabe disso, mas a grande maioria das igrejas evangélicas não tem cultos diários, tem cultos aos domingos ou alguns cultos específicos, durante a semana. Mas enfim, eu participei de uma construção de uma igreja, e aquilo foi muito envolvente. Tive um pastor na minha vida, que foi o pastor Antônio Carlos, eu não sei o sobrenome dele. Mas ainda sei aonde encontra-lo hoje, que é casado com a Silvana, e tem dois filhos da Lídia e o Tiquinho, que é o Antônio Carlos Júnior. E ele chegou na minha igreja para mudar, porque a gente ia numa igreja que era estava numa sala alugada, numa casa alugada, e ele veio para comprar uma igreja, o presbitério chamou ele para estar ali, para tirar a gente daquela casa alugada, e vê se a gente conseguiu comprar um imóvel e tal. Foi ele também que envolveu meu pai, trouxe o meu pai para estar mais junto, e isso fez uma diferença muito grande na nossa família. Que era estar em família unido por um propósito, em Deus, muita mudanças de comportamento, muita mudança de direção mesmo de vida. Quando meu pai se envolveu com igreja, quando meu pai conheceu Deus, vamos dizer assim, na profundidade que a gente conheceu nessa época. Meu pai que ainda tinha muitas revoltas pelo que tinha acontecido com ele, tinha muita coisa interna presa, ele conseguiu curar muita coisa ali, foi com esse envolvimento, com o coração, mas com muito envolvimento ali com muita dedicação, nessa construção, nessa igreja. E eu era muito pequena, lembro da gente ir para lá para pintar telha e colocar lá nesse lugar e quando a obra ficou pronta foi sensacional, olhar para aquilo dali, eu pintei uma telhazinha, a gente participou da colocação de um tijolinho, literalmente, não é assim, dei o dinheiro para alguém comprar o tijolo, eu vim aqui e assentei o tijolinho também, reformei, ajudei a pintar um pedacinho daquela parede ali. Foi uma época de grande crescimento, dentro de uma igreja a gente ver gente de todos os tipos, com todos os problemas que você pode imaginar. A gente costuma dizer que uma igreja não é lugar de gente sã, é um hospital. Isso me fez amadurecer muito, em muitas coisas da minha vida, ver os problemas que eu tinha dentro da minha casa, que o problema do meu pai ainda era um problema muito pequeno, e poder olhar para aquilo dali com muito amor e com a mão estendida para ajudar, para participar, para se envolver na vida de outras pessoas. E quando eu precisei me afastar um pouquinho deles, outras coisas acabaram tomando algum espaço na minha vida, que foi essa questão mais profissional, que é uma coisa que eu me arrependo muito, que eu adoraria ter continuado com uma vida mais dedicada a eles. Eu nem sabia o quanto era importante para mim, naquela época, hoje que eu tenho isso muito mais em mim. Fez muita diferença também, teve muita coisa que eu passei ali, depois dos meus 18 anos, nas minhas primeiras experiências profissionais, que eu já tinha visto alguém passar, que eu já conhecia a história de alguém e que isso me deu muita força, isso me deu muita esperança, que acho que Deus me abençoou, com toda essa experiência, para eu aplicar algumas coisas na minha vida também. Hoje ainda mais, quando eu vejo as minhas crianças envolvidas em trabalho na minha atual igreja, eu me lembro o quanto foi importante para mim estar ali e aprender sobre Deus, sobre Cristo, sobre solidariedade, sobre experiências espirituais mesmo, de se dedicar, de orar, de ter Deus na sua vida, de elevar o pensamento, de conversar e consegui buscar nele a saída para os seus problemas, dele ter o governo da minha vida, o quanto é importante a gente ter isso dentro da gente.
1:26:41
P/1 - Por que você acha que você se emocionou quando você falou da sua escola, que você estava cantando aquela música? O que você acha que veio na sua cabeça?
R - Eu acho que quase tudo que recorda minha infância, hoje depois de ser mãe, me emociona. Eu me sinto muito sobrevivente, mas isso não é um choro triste não, eu acho que os meus pais fizeram o melhor que eles podiam por mim. Então assim, a ida para escola, e o primeiro dia das mães. Acho que eu nunca tinha me lembrado disso, eu nunca tinha parado para pensar como esse Primeiro Dia das Mães foi gostoso e como eu ainda me lembrava da música, e como eu ainda me lembrava da dança. Eu tive um dia das mães muito marcante, como mãe também, e que eu também me emociono quando eu falo dele. Quando eu estava grávida do Felipe, que é o segundo filho, o Felipe é de maio, então a escola do meu filho mais velho estava se preparando para uma festa do dia das mães. E que eu não me lembro porque, foi adiada, aconteceu alguma coisa esse dia das mães foi adiado. E como eu já estava de quarenta e muitas semanas, quarenta e tantas semana, minha médica queria que eu fizesse o parto, porque eu não entrava em trabalho de parto, e ela queria fazer uma cesariana. Só que ela marcou minha cesariana para uns dois dias antes do dia da festa do dia das mães. Então, a festa do dia das mães, “não, tem que segurar mais um pouquinho, porque adiaram a festa do dia das mães, e eu quero estar lá nessa festa, o Samuel vai cantar e vai se apresentar”. E hoje eu nem me lembro qual foi a música que ele cantou nesse dia, porque a gente já teve alguns dias das Mães. Mas eu me lembro que ela marcou o parto para o dia da festa, e eu fui enorme para festa do dia das mães. Eu não ia para festa. E eu marquei com vó, falei: eu quero as duas vós lá, eu quero a Dinda lá, eu quero todo mundo lá, porque é a festa do dia das mães, eu quero que esteja alguém lá representando, e depois vocês vão para maternidade. E em cima da hora, já com a bolsa pronta, com tudo pronto para sair para ir para o hospital, eu liguei para coordenadora e falei: olha, essa festa vai atrasar? Vocês vão fazer tudo no horário? Porque eu não vou poder ir, eu estou indo ganhar neném. E aí ela falou assim: se você vier eu faço tudo no horário, eu não deixo atrasar. E eu me lembro que eu cheguei, começou e terminou, sabe aquela apresentação que dá tudo certo, não deu nada errado, e a coordenadora falou assim: a gente tem uma mãe que tá saindo daqui e indo ganhar neném. E aí a escola inteira veio falar comigo, ao invés de eu correr para ir ganhar neném, várias mães vieram falar comigo. Aquilo para mim, foi muito emocionante também, porque eu consegui participar de um momento da vida do meu filho, que era o Dia das Mães, ele não imaginava que eu ia estar lá. Saindo dali para ser mãe do segundo. E o carinho de todas as outras mães, me dando uma segurada ali, me atrasando para ir ganhar neném. Eu acho que essa coisa do Dia das Mães é muito gostosa, talvez seja por isso a emoção com É de Chocolate, ter lembrado, com certeza foi a minha primeira festa do dia das mães, foi a minha primeira apresentação do Dia das Mães e me veio à mente só aqui. Por todo carinho, por toda a dedicação que eu tenho de mãe, de exemplo, de tudo, pela mãe que eu sou um pouquinho também, não que eu seja muito, muito boa, não. Mas acho que um dia eles vão achar isso, deixa eles acharem, vou ter lá minhas duas dúzias de defeitos, mas eles vão falar várias coisas bonitinhas de mim também. Então acho que é por isso que emocionante, a gente devia passar... na hora talvez, nem seja a coisa mais legal do mundo, mas com o tempo aquilo ali tem um valor muito grande, é muito gostoso.
1:31:17
P/1 - Me conta como que era essa coisa de namorar na época, de flertar, porque muita gente começa a namorar com o pessoal do grupo de jovens.
R - Esse primeiro namorado, esse primeiro amorzinho, era Antônio Carlos, não era o Antônio Carlos Junior, Tiquinho não, era outro Antônio Carlos. Que era de uma família que eu admirava muito, ele tem duas irmãs mais velhas, um irmão mais novo e o irmão mais velho. Era uma família grande, super diferente da minha, de núcleo, muito diferente da minha. Eu conhecia todos eles, eles estavam ali, eu tocava teclado, o Toninho tocava violão, um pouquinho de guitarra. Então éramos todos ali, muito envolvidos com essa questão da igreja. Eu era muito apaixonada por ele, aquela paixão de criança, desde os meus nove anos de idade, como pode dizer, uma menina de 9 anos de idade super apaixonada. E aí por volta, eu acho que eu tinha uns 11, 12 anos, a gente era muito novinho, hoje eu entendo a preocupação dos pais, de olhar para aquilo ali, a gente era muito novinho. Ele é um pouco mais velho. Eu olhei para ele durante muito tempo, acho que o que eu mais gostava dele, na verdade, era o fato de tocar, de estar ali, de ser dedicado, de ter um objetivo comum, de ter esse cuidado com uma coisa que para mim também era muito importante. E aí um dia, ele resolveu conversar com o meu pai, ele não veio falar comigo não, 13 anos, 13 anos. Aquela filha única, de 11 anos, mas meu pai sabia que eu olhava para ele e que eu gostava dele, então eu acho que meu pai recebeu com muito carinho, um primeiro pedido. E o meu pai não pensou duas vezes, falou: você pode ir até minha casa, você pode ir conversar um pouquinho mais com ela, vocês tenham muito juízo. Eu imagino como deve ter sido duro para ele, dizer isso, naquela idade. Mas eu vou te falar, que foi um namoro que durou quase dois anos. E a gente estava junto na igreja aos domingos, então o máximo que a gente fazia era dar uns beijinhos. A gente ia junto para o ponto de ônibus, ia para algumas reuniões, a gente não saía muito sozinho, meu pai não deixava. Tinha que ter alguém mais velho, então estava sempre com a presença das irmãs dele, ou da minha mãe. Mas aí teve essa época, e aí um dia a gente acabou influenciando mal, ou bem, alguns outros adolescentes e todo mundo começou a querer namorar também. Só que as situações em outras casas não eram as mesmas situações que as nossas, a gente tinha aprovação dos nossos pais, apesar de sermos muito novos, e era tudo muito vigiados. Nessa época alguns namoros escondidos começaram aparecer e para que isso não se tornasse um problema, esse pastor, esse pastor Antônio Carlos que eu comentei antes. Ele chegou para gente e falou: olha, se vocês têm autorização do pais de vocês eu não posso proibir vocês, quem sou eu para dizer o que vocês podem o que vocês não podem, mas eu posso deixar vocês sem serviço, de tocar aqui na igreja, porque eu estou achando que está tendo um burburinho aí e eu preciso me resguardar, que esse lugar aqui não é para isso. Como é que a gente pode acertar isso? Eu posso dizer para vocês que vocês tocam ou vocês namoram. E nenhum dos dois pensou duas vezes, gosto muito de você, valeu legal, um dia a gente se encontra aí nessa vida, mas eu quero continuar tocando, foi bem assim. Então a gente saiu dessa conversa terminados. E foi muito bom para gente, porque a gente terminou, ele foi para uma igreja, em uma outra localidade, que era mais perto da casa dele, eu continuei ali. E mais tarde, uns quatro anos depois, a gente se reencontrou. A gente se reencontrou, eu já estava trabalhando, já era estagiária de Furnas. Ele estava trabalhando também, e a gente voltou a namorar. E aí foi lá, pediu para o meu pai de novo, e a gente voltou a namorar, a gente era um pouquinho mais velho, eu estava com uns 18, 19 anos, ele tinha uns 20 pouquinhos. E aí a gente namorou um pouquinho menos, ali a gente já olhava um para o outro assim, vamos tentar, era aquele amorzão de adolescente, fazia tanta coisa junto. Mas aí já tinha um monte de coisas envolvidas, coisas diferentes, a gente acabou não ficando junto. Mas a família, a gente tem super carinho também, quando sabe um do outro, sempre torceu muito um pelo outro. Mas assim, ali, naquele grupo, foi o único relacionamento que eu tive. Acho que logo em seguida ele casou, ele casou mais jovem que eu. Dos nossos adolescentes dali, tem uma pessoa, tem um casal, que era namoradinha nessa época é que é casado até hoje, que é Luzinete e o Alex, eles têm gêmeos lindos, uma família muito abençoada.
1:37:12
P/1 - Então você escolheu no caso a Gama Filho, para que curso e por que teve essa escolha?
R - Como eu vinha falando, tinha feito alguns testes vocacionais, fiz a Escola Técnica, quando eu terminei a escola técnica que fui para o pré-vestibular. Quando terminei a Escola Técnica, eu tive um primeiro episódio de stress na minha vida, eu fiquei meio anêmica, porque eu era muito dedicada, eu queria muito terminar os meus projetos finais, ter uma nota maravilhosa, eu dormia muito pouco. Eu não tinha computador em casa nessa época, então eu passava muito tempo na escola fazendo, e os meus pais tinham perdido um pouco controle da alimentação, do sono, sempre tinha tido uma vida mais regradinha, mas eu não queria parar de fazer nada, queria continuar indo à igreja, queria estudar e queria fazer tudo. E aí quando eu terminei, eu terminei meio fadigada. A minha pediatra, ainda na época, falou: dá um tempo, aproveita que você terminou novinha, vai descansar. Eu não consigo, três meses depois eu estava matriculada no curso de inglês, daqueles assim, todos os dias. Não dá para ficar parada, aproveita que está no ritmo, com 15 anos de idade, a sensação que eu tenho até hoje é, faça, vamos agir, porque daqui a pouco a gente não tem mais essa vontade toda. E aí quando eu entrei no pré-vestibular, o meu compromisso era comigo mesmo, com os meus pais era de não forçar muito a barra. Era só de estar ali, de recuperar uma matéria perdida, algumas coisas que eu não tinha visto na escola. E a minha turma de pré-vestibular, era uma turma super legal, mas também era uma turma de uma galera bem mais velha, que já sabia muito bem o que queria, um monte de gente já tinha tentado várias vezes entrar numa universidade pública. E a gente tinha algumas questões, a gente não tinha muita grana para pagar uma faculdade. E pensar, será que a gente tinha muita grana para pagar transporte para ir para a URJ para UERJ. E como eu também não tinha muita certeza do que eu queria fazer, eu tinha muito medo de fazer uma opção universidade pública e estar muito exposta. Meu pai tinha muito medo, de deixar a garotinha dele de 15 anos de idade, sair de casa, pegar um ônibus lá para o fundão e passar tanto tempo fora de casa, numa cidade universitária, que perigos que eu naquela época jamais imaginaria. Mas enfim, diante desse cuidado, ele fala: cara, a Gama filho é super pertinho de casa, estou bem mais disposto fazer um sacrifício aqui com grana e com um monte de coisas, mas você vai e volta a pé, isso é uma economia para mim, se você tiver que comer, você consegue voltar em casa, comer e voltar, e dá tempo de você arrumar um trabalhinho e alguma outra coisa para fazer. Mas foi assim, eu resolvi tentar, eu Fui aprovado em quarto lugar, consegui uma bolsa, desde que eu optasse, não me lembro agora se tinha questão, mas eu apetei pelo horário da noite. E foi a primeira vez que eu comecei a estudar de noite, também já pensando em arrumar alguma coisa para trabalhar, durante o dia, é óbvio, quase todo mundo faz isso, estuda de noite e trabalha durante o dia. E aí o meu perigo, entre aspas, era o perigo de ir e voltar, que durante o dia era fácil, saia de casa 6 horas da tarde, ia até a faculdade. Mas na volta era às 11:30 da noite, como eu disse para vocês, eu conhecia todos os botecos e todos os vizinhos, “oi gente, oi, boa noite, oi, boa noite”. Tinha feito um segundo teste vocacional, na época do pré-vestibular, que deu sabe o que, adivinha? Belas Artes e interesses dispersos e tinha uma leve, não lembro qual era o termo, um percentualzinho que apontava alguma coisa para exatas, mas era um percentual bem pequenininho, mas Belas Artes estava ali firme e forte. E aí eu preconceituosamente, nunca contei para o meu pai essa história das Belas Artes. Eu só pensava naquelas Belas Artes, falava assim: não tem a menor possibilidade deu tentar nada para Belas Artes, eu preciso ser independente, eu preciso ganhar dinheiro, o meu pai vai morrer a qualquer momento, porque eu escutei isso a minha vida inteira. O que eu vou fazer na faculdade Belas Artes, meu pai vai rir da minha cara quando eu mostrar isso para ele. Então quando apareceu essa tendênciazinha para exatas, eu já tinha feito um técnico em processamento de dados, achava que o curso não era de se jogar fora. Eu falei, ah quer saber, vamos colocar Ciências da Computação, matemática aqui, vamos ver o que vai dar. E foi assim, que eu fui parar no curso de Ciências da Computação da Gama Filho. Era só para ser um teste, mas quando meu pai fez as contas, financeiramente e cuidadosamente, pensando, além de cercar o bibelozinho dele, era mais vantajoso, economicamente para a gente estar ali. E aí eu fui, entrei na faculdade aos 16 anos. Não consegui fazer um ano de pré-vestibular, entrei na faculdade aos 16 anos e fui muito, muito feliz, na escolha que eu fiz, no curso que eu fiz. Porque nos meus primeiros três semestres era matemática pura e aplicada, e eu nem achava que gostava tanto de matemática assim, mas me sair super bem, fui uma excelente aluna, só não fui melhor aluna, porque eu arranjei um emprego que era para trabalhar durante a noite, numa escola. E aí eu, no meio do meu segundo período, troquei o meu turno da noite para a manhã. E a carga horária do grupo da manhã, era uma carga horária maior do que a carga horária noturna. Esse segundo período me deu uma embaralhada geral ali de matéria, que era matéria do primeiro, matéria do segundo. E aí eu comecei a perder umas... do primeiro não, porque o primeiro período eu fechei tudo, mas ali no segundo período, eu comecei a fazer uma bagunça no meu currículo, por conta desse emprego. E aí eu fui trabalhar numa escola técnica, Escola Técnica Rezende Rammel, foi o meu primeiro emprego, eu comecei com eles como estagiária, fazendo monitoria nas turmas do professor de informática. A Escola Técnica tinha um curso de administração, mecânica, eletrônica, esses três cursos eram os cursos principais, pelo menos são os cursos que eu me lembro bem, que eu participei das turmas. Eu comecei fazendo monitoria nessas turmas, e aí surgiu uma vaga na administração, para o turno da noite, perguntei para o meu pai se eu podia ir, porque era uma grana que ia entrar, ele deixou. Então eu ia todo dia, meu pai tinha que ir me buscar no trabalho, que era no Lins, e ele tinha medo de me deixar voltar sozinha para casa. Enfim, ali fiz uma baguncinha no meu currículo, mas foi por uma boa causa. Esse primeiro emprego foi sensacional, eu amava trabalhar nas turmas com a monitoria da Escola Técnica, fiz grandes amigos, principalmente na turma de mecânica, que foi uma turma que eu acompanhei durante mais tempo. E essa turma de mecânica, o coordenador dessa turma de mecânica, era o professor Gilson, já falecido. Eu trabalhei numa turma de 2º ano de mecânica, que eram 45 meninos e 1 menina, tinha uma menina na turma de mecânica. Era uma escola técnica, mas foi uma experiência de escola Técnica, muito diferente da minha experiência de Escola Técnica. Eu tinha a idade deles, estava trabalhando, mas eu tinha idade deles. E eu achava o máximo a forma como aquela turma interagia, eles competiam em notas, eles eram extremamente competitivos, mas eles se ajudavam muito. E quando eles iam para o laboratório, que eles tinham que lixar as peças, milimetricamente, para aquilo ali encaixar, eu fiquei muito apaixonada, por aquela turma, por aqueles meninos, Marco Antônio Paquetá, Anderson Marechal, Filipe Caju. De vez em quando tem uns que já tem filho também, na mesma escola que a minha, tem uns que a gente só olha de longe, “caramba, foi quase meu aluno, fiz monitoria na turma dele, que legal já tem filho”. E foi uma experiência diferente. Mais tarde, eu pensei muito nisso, eu lamento muito que a minha experiência com a Escola Técnica, não tenha sido uma experiência que quase todo mundo tem de Escola Técnica, de levar a escola técnica para vida inteira, os amigos de escola técnica para vida inteira, fui um pouquinho precipitada, mas valeu a pena, deu tudo certo. Mas enfim, na faculdade fiz o meu curso de Ciências da Computação. Esse foi o primeiro emprego, lá na escola técnica Rezende Rammel. E quando eu completei um ano mais ou menos, com a carteira assinada lá, eu fui demitida e já estava guardando o meu estágio em Furnas. E esse estágio em Furnas, nós tínhamos uma pessoa que era conhecida nossa, e que estava aguardando por uma vaga. E eu não podia ter ido antes para o estágio, porque eu não tinha 18 anos ainda, eu não podia estagiária, Furnas não aceitava estagiário com menos de 18 anos. Foi uma época que não se abria concurso, não estava se abrindo concurso. Não tem isso muito marcado, porque não pensava muito nessa questão política na época, já tinha ali uma preocupação com privatização, uma primeira leva de privatização, governo Fernando Henrique, se eu não estiver muito errada. E não tinha concurso, as pessoas estavam entrando por contrato. Então eu tinha uma grande chance de ficar como contratada depois desse estágio. E aí eu fui estagiar na subestação do Grajaú, foi ali que eu conheci Furnas. Foi uma das maiores experiências da minha vida.
Entrevista de Cami Estevão Girondi Cabral
Entrevista por Torigo e Daniela
Projeto: Furnas
FURNAS_HV022_parte 2
29 de julho de 2021
0:00
P/1 - Aonde que foi esse estágio de Furnas? E como foi o seu primeiro dia, você se lembra como foi?
R - Cheguei a Furnas, não me lembro como foi o primeiro dia de admitida. Mas me lembro que quando eu soube da minha vaga, para estágio, também tinha uma vaga para estágio em administração, e eu indiquei essa vaga para estágio em administração, para umas pessoas que eu conhecia. E uma das minhas amigas de infância, ela se candidatou a vaga e foi ser estagiária lá. Ela ainda entrou antes de eu entrar, antes da minha vaga abrir efetivamente, ela começou o estágio dela. Então quando eu cheguei lá, eu já conhecia a Fernanda, a Nanda, e isso acaba dando um acolhimento, de você de saber que tem alguém ali, que já conhece as outras pessoas, uma pessoa para te apresentar. Então entrei com alguma segurança, por causa da Fernanda, que cumpriu muito bem esse papel. Acho que ela entrou uns 4, 5 meses, antes de mim, e é uma pessoa bastante sociável, já tinha feito várias amizades lá dentro. E nessa época também, tinha acabado de chegar na subestação, um grupo, que se eu não estiver muito errada, eram 6 técnicos, que tinham acabado de vir do Centro de Treinamento, vieram seis rapazes, seis meninos. Deixa eu ver se eu sei ainda direitinho quem são, Maurício Faiad, o Marquês, o Allan, Welirson Belmonte, Davi, deve ter mais alguém que eu não estou me lembrando agora, todos éramos muito jovens. Mas enfim, éramos 3 meninas da subestação, não tinha muitas outras mulheres, tinha o pessoal da equipe de limpeza. Mas assim, na região ali no administrativo, com mais acesso à sala de controle, nós éramos as únicas meninas ali. Até um tempo antes da gente entrar, não tinha nem banheiro para mulher, no nosso andar, os banheiros eram só masculinos. Mas o gerente da subestação, gerente responsável, não me lembro agora o nome, tinha um nome especial para isso. Como se fosse um encarregado da subestação, o gerente maior ali na subestação, que era o Júlio, Júlio Moreira. Ele tinha feito uma obra, muito pouco tempo, cedendo um banheiro que era exclusivo dele, para as meninas terem um banheiro naquele andar. Eu nunca tinha visto isso na minha vida, chegar num lugar para trabalhar, assim, não tinha trabalhado em muitos lugares antes, mas nunca imaginei passar por isso, chegar num lugar para trabalhar, e caramba, a gente tem esse banheiro aqui, não tinha banheiro para mulher, a muito pouco tempo. Como eu já disse, eu nunca tive muito acostumada a pensar que alguma dificuldade que eu tivesse vivido, fosse por ser mulher, ou por alguma condição natural minha, nunca atribui nada a isso. Então nunca imaginei que a gente pudesse chegar num lugar para trabalhar e não ia ter banheiro para mulher. Mas enfim, os meninos tinham acabado de chegar lá, tinha muito pouco tempo, eles passavam um tempo sendo treinados para atividades que eles iam desenvolver e depois passava um tempo como se fosse um estágio probatório, ganhando ali uma experiência e tal. Então, você imagina uma subestação, além da gente, tinha mais outros 3 estagiários, estagiários jovens, uma galera bem mais nova, na área de manutenção. Então estávamos quase todos ali na faixa dos 18. 22 anos. E foi muito legal, acho que é assim, passei por muitas experiências profissionais, obviamente, eu digo que eu visualizei ali 2 apagões, 2 blackouts na subestação, eu achava o máximo, estar num lugar que transmitia energia, que a gente via os disjuntores se desligando, que a gente viu os transformadores, a gente participava, assim pouquinho, que o trabalho era bem da sala de controle, bem do pessoal de manutenção. Mas imaginar que a gente fazia parte de uma coisa que era tão grandiosa, sabe, e muito jovens, e todo mundo muito novo. Os mais velhos também trabalhavam com esse brilho no olhar, mas isso refletia muito na gente. Então chegar ali para trabalhar, era uma coisa de responsabilidade, mas era um encantamento com aquela situação, de pensar que a luz estava passando por ali, a energia estava passando por ali. E que uma semana antes tinha faltado luz no país inteiro, e um pouquinho lá fora, porque tinha dado problema ali, e que a gente estava lá ouvindo como eles resolviam esse problema. Eu acho que muito da minha paixão por Furnas nasceu ali, sabe. Enfim, todos os meninos dessa leva, eles acabaram ficando em Furnas e foram contratados como operadores. E depois eu tive o prazer de reencontrar, alguns deles, com a minha história de retorno a Furnas. Mas enfim, eu tenho uma outra grande amiga, tanto a Fernanda, quanto os meninos, os meninos que eu ainda vejo, mas a Sabrina que era na época uma estagiária de manutenção. Sabrina é uma mulher de 1,77, enorme, negra, linda. E naquela época a gente tinha 19 anos, e a Sabrina estagiava, um dos trabalhos dela na manutenção era operar uma ponte rolante, que ficava num andar enorme, que tinha a subestação, uma das duas subestações que tinham lá, acho que era a de 138kw. Então, vira e mexe a gente tinha alguma coisa para tratar com a área de manutenção, chegava na subestação e ela estava lá em cima, operando a ponte. E eu ficava muito encantada com trabalho dela, ela era eletrotécnica, estagiário de eletrotécnica, eu ficava super encantada com o trabalho dela. E pensava assim, gente, eu nunca faria aquilo ali, eu morro de medo de altura, eu nunca faria aquilo ali. E até hoje eu falo isso para ela. A gente naquela idade, como você naquela idade, subia lá e manuseava e mandava aquela ponte para um lado, para o outro, subia e descia equipamento, mexia. Como a gente era tão jovem, com uma coisa tão importante, fazendo uma coisa tão importante ali para empresa e tal. A gente tem muitas fofocas, muitas lembranças dessa época, de como agente admirava tudo aquilo ali, de como era... difícil encontrar uma palavra, mas assim, hipnotizante, pensar que fazia parte daquilo, muito legal. E a gente tinha uma rotina, tanto eu, a Fernanda e a Sabrina, nessa época eu fazia faculdade, então eu saia do estágio e ia direto para faculdade, mas o horário de saída era um pouco mais cedo, não dava tempo de ir direto para faculdade, eu sempre parava no caminho, parava perto da casa delas para lanchar, para comer alguma coisa, diariamente a gente fazia isso. Então não tinha como fortalecer esses laços de amizade, acho que a gente quase família. Hoje cada uma um pouquinho mais distante, mas assim, a gente ainda é muito amiga. E eu não tenho isso em todos os lugares que eu estive na minha vida, tenho na maioria, mas assim, esses laços de Sabrina, Fernanda, de todo cuidado, ali surgiu, surgiu muito forte ali, com os meninos também, mais com alguns que a gente tem mais contato hoje. Eu me lembro, que na época dos meninos, foi a primeira vez que eu tive contato com o processo de contratação de Furnas. Eu entrei para o estágio, na verdade quando eu entrei no estágio, eu nem entrei no estágio por causa da faculdade, eu ainda entrei no estágio para cumprir exigências de horas daquele meu segundo grau técnico, que eu não tinha conseguido diploma, porque eu não tinha feito o estágio. Então eu fiz um ano de estágio, por conta do técnico. E aí quando eu fui renovar, eu falei: olha, eu já cumpri as minhas horas, agora eu quero entrar como estagiária de nível superior, para cumprir horas para faculdade. E aí eu fiquei ali por volta de mais uns oito meses, na época esse gerente ainda conversava para tentar estender por 2 anos o de técnico e mais 2 anos o de analista. Mas eu acompanhando a história dos meninos, eles tinham sido estagiários concursados, eles acabaram ficando contratados por uma empresa terceira e quando na época, na verdade o que tinha que ser feito, era eles serem absorvidos por Furnas, eles tinham prestado um concurso, então eles seriam funcionários. Foi a primeira vez que eu tive contato com isso. E eles muitos jovens, já discutiam esse futuro, contratação como terceiro ou como funcionário de Furnas. E quando eu vi que estender mais esse prazo de estágio, podia não ser muito interessante para mim, eu acabei ficando só os 8 meses para cumprir a carga horária, e saí de lá muito apaixonada, muito triste, mas eu precisava tocar outras coisas na minha vida. Então assim, vivi muitas coisas ali naquela subestação. Quem não conhece a subestação de Grajaú, fica na Rua Borda do Mato, no Grajaú, lá em cima, é bem pertinho da comunidade Nova Divinéia. A gente ali, de vez em quando na subestação, acontecia uns casos. Por exemplo, a gente tinha uma pessoa que trabalhava na área de manutenção, que tinha vindo de Campos, ele era um aposentado que tinha sido chamado para prestar serviços novamente para empresa, Soter. E ele tinha um Monza, muito, muito novinho e bem tratado, com CD de mala, acho que hoje os adolescentes nem sabem o que é isso. Assim, com aquela pintura sem nenhum arranhão, ele estava sempre com carro super limpo, de vez em quando ele dava carona para gente ir para casa, ou para faculdade, porque ele morava perto da gente. Hoje, inclusive, eu moro muito perto do apartamento que ele ficava, porque ele é de Campos. Numa dessas, naquelas demonstrações, meu carro tá aqui e tal. Esqueceram o portão da subestação aberto, na entrada de algum caminhão a subestação foi invadida por um bode, que desceu da comunidade. O bode podia ter parado em qualquer carro, mas o bode resolveu subir no capô do Monza do Soter. E assim, momentos de desespero para ele, que tratava o carro com maior carinho, mas depois rendeu muitas risadas, porque tinham vários carros ali, vários carros da empresa, e o bode mirou no carro da pessoa cuidadosa, do cara chato com carro. E assim, foram muitas risadas para conseguir tirar aquele bode de cima do capô do carro, muito engraçado. Fora isso, a gente também... eu tinha acabado de tirar carteira, nessa época, tirar carteira de motorista, eu ainda não tinha carro, mas a gente conseguia sair algumas vezes para almoçar, o pessoal da subestação emprestava, com muita responsabilidade, para gente, então renderam alguns almoços no Shopping Iguatemi, que era recém inaugurado. Normalmente esse triozinho, Sabrina, Cami e Fernanda, algumas vezes com os meninos, mas normalmente o triozinho, Sabrina, Cami e Fernanda, estava presente, muito juntinhas, muito unida nessa época. Apesar da escola ter sido meu primeiro trabalho, na escola eu também tinha contato com gente mais velha, mas esse contato dos aposentados que tinha voltado a trabalhar, que tinha sido chamados, era uma coisa que eu não sabia que existia muito, de você ter a possibilidade de ser recontratado após aposentado, para trabalhar até mesmo no mesmo lugar que você tinha trabalhado antes. Já sentia neles o carinho que eles tinham pela empresa, pelo fato de retornar, até de um período de descanso, uns por mais necessidade, outros para estar mais perto mesmo das pessoas dos que tinham feito parte da vida durante muito tempo, a gente ver muito isso ainda, em Furnas, as pessoas têm dificuldade mesmo de estar longe da empresa. A gente, quando eu estou dizendo aqui, as três meninas, a gente conviveu ali com algumas pessoas que já tinham a idade mais avançada e que logo em seguida a gente perdeu essas pessoas, eles faleceram. Enfim, me lembro muito do Anselmo, que era um cara lá de Padre Miguel, era um negro, lindo, já grizalinho, de barbinha grisalha. E o Alselmo aconselhava a gente em tanta coisa, eu acho que ele olhava para nossa meninice ali e tinha um carinho muito gostoso, era muito gostoso ser jovem, ser muito jovem, numa empresa de tanta responsabilidade, com pessoas que entendiam a nossa meninice, com os assuntos que a gente tratava e do jeito que a gente falava. Que hoje eu imagino, que devia ser cheia das gírias, “pô e aí, resolve isso daqui, resolve logo, vai logo com isso aí”. Eu imagino que devia ter um jeito muito diferente. A gente aprendeu demais ali, com carinho desses mais velhos, com carinho dessas pessoas que a gente ia fazendo e errando e eles acertavam, ia podando as nossas arestas. Mas ainda assim entendendo muito a nossa postura, corrigindo para o bem mesmo, sem muitas críticas, eu sentia muito isso em todos eles, o olhar de carinho e da meninice. E posso dizer que um privilégio, ser menina, ser mulher ali no meio deles, tenho certeza que fazia eles ainda mais carinhosos, jeitosos com a gente. Porque eles nos poupavam de muitas discussões que eles tinham e vira e mexe era assim, “sai daqui agora que não é para vocês escutarem isso aqui”. O bicho pegava lá dentro, o pau comia mesmo, de decisão ou de alguma outra coisa que eles tinham vivido. Isso que eu falo do trio, Cami, Sabrina e Fernanda, a gente trabalhava em coisas diferentes, mas os operadores eles trabalhavam em turnos de três e eles ficavam 8 horas por dia fechados, juntos na sala de controle, durante três dias seguidos, depois descansavam dois dias, mas assim, eles passavam na casa, buscavam, o trajeto para o trabalho, eles já faziam juntos. Que nem família, quando o pau comia, o pau comia de verdade, quando eles brigavam o negócio era tenso. E eles vira e mexe eles nos poupavam, de ouvir algumas coisas, enfim. Mas eu me lembro, de algumas pessoas ali da operação, que eu não sei muito bem os números, quanto a isso, mas é muito grande, o número de pessoas que têm depressão, problemas no casamento, por causa desse regime de trabalho em turno, muito poucos deles tinham esses problemas ou passavam esses problemas para a gente. Também foi muito difícil quando a gente viu isso acontecer com algumas pessoas ali. Primeiro contato com alguém que podia estar sofrendo no casamento pela distância, por conta do trabalho ou uma família que sentia ausência daquele pai, daquela pessoa, por conta do trabalho. Quantas reflexões isso ao longo da minha vida eu fiz e me lembrava de algumas coisas assim, que a gente viu passar, foi mais um aprendizado, que eu apliquei em outras fases da minha vida. E também uma coisa que me chocou muito, quando eu estava em Furnas, não é uma coisa extremamente comum, mas aconteceu, os acidentes em Furnas, os acidentes numa subestação podem ser terríveis. Eu não presenciei nenhum acidente grave na subestação, como eu disse, a gente era muito bem cuidada, muito bem orientada, até a questão de usar salto alto, estar de saia, aqui você anda, aqui você não anda, não pode passar ali, aqui só de capacete. Nós éramos muito bem orientadas, onde a gente podia circular e em que momento a gente podia circular. E eles que eram muito mais detentores desse conhecimento do que a gente, ainda assim, vira e mexe acontecia alguma coisa. Então quando eu fui embora da subestação, eu soube de um acidente que aconteceu com uma pessoa que eu convivi lá, não foi um acidente fatal, mas foi um acidente bem triste e mexeu muito comigo, essa questão do acidente de trabalho, dessa possibilidade. Quando a subestação era uma coisa que fazia a gente trabalhar com responsabilidade, sempre muito atento ao que podia estar acontecendo. E vou repetir, a gente era muito jovem, a gente era muito nova para estar ali, vendo tudo aquilo ali, isso fez uma diferença enorme no caminho das três, que é de quem eu posso falar, porque eu tenho contato até hoje. Mas esses dois anos, um ano e oito meses, mais ou menos, que eu fiquei ali, eu aprendi muito, não só profissionalmente, aas aprendi muito de convivência, de amizade, de experiência de vida mesmo. E um dia, mais tarde, eu acabei retornando para Furnas, por causa desse laço que eu fiz nesse um ano e oito meses de estágio. Eu saí dali, e fui estagiar numa outra empresa, que era mais pertinho da minha casa, que era a Betunel. Betunel IHE, na época, era uma empresa que trabalhava com composição de asfalto. Fiquei muito pouquinho tempo lá, mas também foi um grande aprendizado. Porque eu não sei vocês, mas eu achava que asfalto a gente só fazia para a rua, sei lá, a prefeitura era quem contratava asfalto, para asfaltar uma determinada rua. E quando eu cheguei lá, eu descobri que não era assim, descobri que tinha fazendeiros, que tinham fazendas enormes, que tinha gente que tinha terrenos muito grandes e que precisavam, obviamente, de asfaltar um caminho para você poder chegar do portão até a casa, ou do portão até o celeiro, ou qualquer outro lugar ali dentro. Passei pouco tempo lá, meu estágio até em número de horas, foi um pouco menor, também fiz alguns amigos ali, que trouxe também para a vida. Logo depois que eu saí da Betunel, eu estava quase me formando e nesses dois estágios, da Betunel e de Furnas, foi quando eu comentei que a minha vida começou a ficar meio complicada na faculdade, porque eu fazia... tinha mudado período, matéria de manhã, matéria de noite, se você contasse essa daqui eu estava no segundo, essa daqui eu estava no quinto, nesse daqui eu estava lá no sétimo. Eu estava tentando organizar a minha vida, quando eu sair desse estágio, eu sai meio que pensando em organizar a vida na faculdade, afinal de contas eu já tinha cumprido a carga horária, não tinha que pensar em dar um passo maior assim, para trabalhar em algum lugar, eu via muito pequenas chances de contratação, também lá na empresa. Eu ia falar sobre isso em Furnas, mas enfim, quando eu vi a situação dos meninos, em relação a ser contratado como terceiro, eu optei por não aguardar a minha época de ser contratado em Furnas. E resolvi, apaixonada ainda, mas buscar outros horizontes. E aí eu terminei esse estágio, sai desse estágio, para poder tentar organizar um pouquinho a minha vida na faculdade. Quem me conhecia nessa época, eu tinha um jargão, para tudo que eu ia fazer, eu dizia: não gente, eu não posso fazer isso porque eu preciso terminar essa faculdade. Mas era chata assim, eu falava isso umas 20 vezes por dia, qualquer convite para sair, para qualquer coisa, qualquer gatinho, “vai, fulano vai estar lá”. Gente não dá, eu preciso terminar a faculdade, eu preciso estudar. “Vamos comer não sei o que”. Não dá, eu preciso terminar a faculdade, eu falava isso dia e noite, quem conviveu comigo nessa época, repete isso para mim até hoje. “Você já terminou a faculdade? Agora a gente pode fazer isso”. “Preciso terminar a faculdade”. Aí eu dei um tempo, fiquei quase um ano tentando terminar a faculdade, tentando acertar ali umas matérias, para pelo menos conseguir cumprir num tempo “aceitável”. Aquela confusão que eu tinha feito, e a minha graduação. E aí foi uma época que eu comecei a conhecer as pessoas mais na faculdade, porque até então, eu aparecia, assistia a aula, tchau, beijo, tinha que ir embora, porque no dia seguinte estava trabalhando e estava muito cansada. Nessa época do meu estagio de Furnas, eu saia de casa por volta das 5h30, 6 horas, era uma época que transporte público era muito pior do que hoje, eu acho, no Rio. A gente ainda via gente pendurada na porta, pendurada em cima. E apesar do Grajaú ser perto da minha casa, era muito contramão de ônibus, eu tinha que andar muito para pegar um ônibus que me deixasse perto da subestação, ou tinha que pegar três transportes. Eu saia de casa por volta de umas 5h30, 6 horas, o meu horário lá era 7h20, 7h30, se eu não tiver muito errada e saia de lá às 4, para poder lanchar e ir para faculdade, porque eu tinha que terminar a faculdade. E saia da faculdade às 11 horas da noite, meu último horário de aula era 11 horas, nessas 11 horas eu andava quase meia hora para poder chegar em casa. Então eu dormia pouco, ou pelo menos bem menos do que eu gostaria. Eu chegava em casa ainda tinha que tomar banho, jantar, conversar com os meus pais, nessa época, eu acho que eu tive meu primeiro celular. Nessa época era uma época que eu dormia pouquinho. Já tinha conversado com vocês, o meu caminho ali era recheado das pessoas que estavam no caminho, fazia de tudo para ser mais ou menos conhecida ali no caminho, porque eu estava sozinha, passava ali sozinha. Algumas dessas vezes eu chegava em casa, jantava, tomava, banho, quando estava frio, do jeito que está hoje, a minha mãe deitada na minha cama, para eu chegar a minha cama está quentinha, uma linda, cuidadosinha. Uma lembrança que eu tenho dessa época e que todos os dias, minha mãe me esperava chegar, às vezes meu pai já estava dormindo, mas a minha mãe me esperava chegar, a minha toalha estava limpa, no banheiro, a minha roupinha toda arrumada, para eu tomar banho, não ter que me preocupar com nada, só tomar banho, me secar, vestir, sentar, comer, ela ainda lavava minha louça, deitava lá no quarto e ainda ficava comigo lá, perguntando como tinha sido o dia, até eu adormecer. E no dia seguinte não era eu que despertava, muito mimada, era ela que acordava, vinha chamar, meu café estava pronto e todos os dias ela ainda me dava um vai com Deus, “vai com Deus”, sempre. Uma vez aconteceu um caso, esse vai com Deus, é muito marcado para mim, porque uma vez eu passei por uma situação. Num dia que ela não estava bem, ela botou meu café e ela falou assim: eu preciso voltar para cama, porque estou me sentindo mal, estou resfriada, você sai, você vai lá, você vai sozinha? “Claro né mãe, não tem problema”. Mas nesse dia ela não falou para mim, vai com Deus. E obvio, eu não duvido que ele não estava comigo, mas eu passei por uma situação muito esquisita, eu acho que poucas pessoas passaram por isso na vida. No meu caminho para faculdade, eu encontrei uma mulher e ela me parou, segurou o meu braço e perguntou se meu nome era Tânia, se eu não tiver muito errada. Aí eu respondi, “não, não sou essa Tânia, não sou essa pessoa. Ela: é você sim, você é a Tânia! “Não, não sou eu”! E aí veio uma outra mulher, gêmeas, e ela falou: é você, você está saindo com meu marido! Falei: meu Deus do céu, eu não sou essa Tânia. Resumindo, eu tomei uma coça, daquela mulher traída, hoje eu posso contar isso bem rindo. Eu apanhei, apanhei, muito, muito, enquanto uma me batia, a outra mexia na minha bolsa para procurar documentos e tal. E foi juntando um monte de gente na rua para ver o que estava acontecendo. O meu cabelo era enorme, nessa época, ainda maior do que hoje, bem grandão mesmo. E ela conseguiu pegar meu cabelo de um jeito que eu não conseguia me mexer muito, que eu só repetia que eu não era a pessoa que ela estava procurando. Eu me lembro que um carroceiro parou e estava prestes a tirar minha roupa, afinal de contas, a mulher que está saindo com marido da outra. E eles queriam me chicotear ali na rua. Até que uma mulher saiu de casa, saiu da casa dela, escutando o burburinho, e falou: moça, não essa menina aí não, porque a Tânia é outra, a Tânia vai passar daqui a pouco, ela vai passar aqui antes e tal, não sei o quê. E assim, ela salvou a minha vida, porque eu não sabia o que podia ter acontecido comigo ali, naquele dia. E eu voltei para casa, as duas inclusive, me levaram em casa para poder explicar o mal entendido para os meus pais. Enfim, isso rolou um processo na justiça. Mas assim, a importância desse vai com Deus para mim, de novo, não que ele não estivesse comigo ali, mas foi o único dia que a minha mãe não pode levantar para me dizer esse vai com Deus, saca. Eu nunca me esqueci disso, da importância desse cuidado dela, o quanto eu creio que ela tem uma autoridade sobre a minha vida, do que ela sempre declarou de bom e do quanto ela desejava todo esse bem. Enfim, por mais que ela não tivesse dito para eu ir com Deus nesse dia, tenho certeza que ela estava lá no cantinho na cama pedindo proteção, para ele, foi um livramento que eu tive ali, porque podia ter sido muito, muito pior. Desse dia eu me lembro que quando eu cheguei na minha rua, acompanhada com elas, os meus vizinhos acharam que eu tinha sido atropelada, porque eu me machuquei muito, no rosto. E ai, enfim, depois meu pai preciso ir até a casa dessa mulher, para acreditar. Já falei para vocês, eu tenho essa cara de sem vergonha e todas as coisas que podiam dar errado alguém sempre achava que tinha sido a Cami. Eu acabei fazendo amizade no caminho, essa senhora que salvou a minha vida, me vendo sair dali, e falou assim: ó não é a Tânia, essa menina está indo para faculdade, ela passa aqui todos os dias. Ela me conhecia de horário, ela me conhecia de tudo isso. Por muito tempo eu passei ali e aqueles vizinhos ainda me perguntavam, você está melhor, você resolveu, ficou tudo bem, o seu pai acreditou. O meu pai depois foi lá na rua conversar com ela, para saber se o que eu estava contando era verdade, porque a minha história extremamente descabida. Se você apanhou, você deve ter merecido, deve ter aprontado alguma. Mas enfim, a gente tinha essa relação de confiança, ele me levou até lá, para ver se a gente conseguir alguns dados, conversei com a própria menina, com a própria Tânia lá, para saber quem era, o que tinha acontecido, se ela estava bem. Enfim, mais uma experiência que eu guardo, mas principalmente com esse vai com Deus da minha mãe, que sempre me fez tão bem. Mas enfim, voltando outras histórias dali, de Furnas. Cheguei nessa época, que estava muito determinada a acertar a minha vida na faculdade e terminar a graduação. Eu já sabia o que eu queria fazer, logo depois que eu terminasse a graduação, que eu queria emendar numa pós, queria acertar minha vida, começando a procurar emprego, mas de forma que fosse um emprego, emprego mais certinho, não queria mais estagiar, eu achava que já tinha tido experiência suficiente para começar a trabalhar, para entrar no mercado de trabalho como funcionária. Aí eu comecei a fazer alguns concursos, na época, eu acho que eu fiz uns concursos para aeronáutica, mas ainda assim o foco era terminar a faculdade. E aí na faculdade, eu conheci meu marido, meu atual marido, meu atual e único marido. Eu lembro que eu devo ter ficado ali mais um tempinho, só para conhecer ele, não tinha motivo para ter ficado um pouco mais, já que eu precisava tanto terminar. E aí a gente se conheceu, em pouco tempo, o Leonardo é um pouco mais jovem que eu, então ele tinha mais tempo de faculdade, para ficar, mesmo depois que eu terminasse. Se eu tivesse terminado no meu tempo certinho, eu não teria conhecido ele. Fiz algumas matérias com ele, e a gente começou a namorar. A gente começou a namorar no dia do meu aniversário. Nessa época também, a gente tem um amigo, que a gente é padrinho do casamento dele, que é o Rafael, e que participou muito das primeiras conversas com o Léo, dos meus primeiros papos com ele, meus primeiros flertes. Nessa época minha cunhada estava grávida da Júlia, que a minha sobrinha mais velha, então quando a gente deixou de falar algumas coisas de faculdade, os primeiros assuntos que a gente conversou, foi da gravidez da minha cunhada. E aí conheci minha cunhada já grávida, a Júlia, que era quem está ali na barriguinha, está fazendo 20 anos, esse ano. Muito bom, fazer parte da vida dela, assim, desde pequenininha. Acho que foi uma das primeiras crianças com quem eu tive contato depois de adulta, porque a minha família não tinha muita criança, nessa época. E enfim, começamos a namorar e quando a gente começou a namorar, nesse período de início de namoro, eu arrumei um trabalho. Arrumei um trabalho na Xerox do Brasil, fui contratada para trabalhar no helpdesk deles. Era um produto novo, que estava sendo lançado, era um portal, hoje em dia a gente fala muito sobre EAD, mas na época não tinha nada parecido no mercado, era uma ferramenta que tinha sido desenvolvida por uma outra empresa, não pela pela xerox, e a xerox tinha adquirido essa outra empresa, e ao invés de trabalhar comprando só a ferramenta, a xerox estava fazendo um portal quê abrigasse a ferramenta, e que a ferramenta fosse só a parte do que o portal oferecia. Então foi o primeiro contato que eu tive com educação à distância, isso a vinte e uns anos atrás. Eu fiquei na Xerox, por volta de um ano e meio também, essa empresa acabou. A xerox na verdade, tinha um produto voltado para EAD, mas esse produto da outra empresa era um pouco melhor do que o da Xerox no mercado, como esse projeto do portal não foi muito para frente, esse produto da outra empresa acabou e a Xerox ficou comercializando só o produto deles. Passado o meu tempo na Xerox, eu terminei a faculdade e fui começar a pós-graduação que eu queria começar. Eu fui demitida da Xerox, no dia 31 de dezembro, foi o ano-novo mais esquisito da minha vida, porque a gente tinha comprado alguma coisa para ano novo, a casa estava cheia, aquele clima de Réveillon, galera, todo mundo vai passar junto. E eu com aquela cara de demitida, meu Deus, como é que eu vou fazer para pagar as minhas contas agora. Como é que eu vou fazer para me virar no ano que inicia, como é que eu vou comemorar uma virada de ano novo se eu fui demitida. Mas beleza, vamos embora. E aí esse ano virou, eu já tinha me matriculado na PUC, para fazer a pós-graduação que eu queria. Não estou muito certa das datas, mas assim, eu já estava matriculada para fazer a pós. Tive que contar com ajuda dos meus pais, para iniciar após. E mais do que isso, eu precisava ir e voltar da Gávea, então além do custo da faculdade, eu precisava bancar a ida e a volta e todas as outras coisas que um curso desse porte requer, material e tal. Então assim, eu acho que eu passei o meu primeiro período de pós-graduação e eu acabei conhecendo umas pessoas que moravam próximas, simplesmente me ofereci, “gente, vocês não querem me dar essa carona, eu preciso tanto”. Isso também é história que o povo conta, até hoje, “nossa, Cami se apresentou de uma maneira super sutil. “Oi, Meu nome é Cami, eu moro em tal lugar, me dá uma carona para casa ai, todo dia, eu divido à gasolina, a gente dá um jeito, mas me leva”. Porque eu não tinha como ir de ônibus, da Gávea para o Méier, era muito longe e era muito tarde, e sem grana, muito sem grana. Nessa época tem Alexandra, O Tiago e a Priscila, a gente passou por algumas aventuras nesse caminho PUC, Méier. Um deles foi um assalto terrível, no dia do aniversário da Priscila, nesse dia a gente tinha saído um pouco mais tarde, não, a gente tinha saido um pouco mais cedo da faculdade. E a Priscila resolveu me deixar na porta de casa, porque era uma carona, éramos muito amigos, mas não queria desviar muito do caminho, então eu ainda andava um pedacinho, ela me deixava em um lugar, que eu ainda andava um pouquinho para ir para casa. Mas nesse dia ela podia me deixar um pouco mais perto, porque ela tinha alguma coisa para fazer. E a Priscila, praticamente morava no carro, então ela tinha assim, uns 10 pares de sapato, várias mudas de roupa, livros, cadernos, tudo que você podia imaginar tinha dentro do carro deles, eram irmãos, a Priscila e o Tiago, e ela praticamente morava no carro. Nesse dia a gente estava indo em direção a minha casa, chegamos numa rua que até hoje é uma rua bastante deserta, a Priscila estava com uma certa pressa de passar naquele caminho, e um carro cortou a nossa frente, ela não pensou duas vezes, em dar um buzinadão daqueles bem, “sai da frente, pô, como é que você faz isso”? Quando não foi a nossa surpresa, que esse carro freio e junto com esse carro frearam mais uns quatro carros, fechando o nosso e mandando a gente descer do carro, com a mão na parede, mão na cabeça, vai para parede que eu vou matar todo mundo. Foi, acho que a pior experiência da minha vida. Porque eu tinha certeza... aquilo que as pessoas falam, passa um filme muito rápido na sua cabeça, passa um filme de toda sua vida muito rápido na sua cabeça. Eu só pensava nos meus pais. Meu filme era, meus pais recebendo a notícia, de que eu tinha morrido, com um tiro na cabeça, com a mão na parede, ali no lugar. Eu estava estudando nessa época para o concurso de Furnas, uma amiga tinha conseguido para mim, imprimir várias matérias, várias apostilas, estavam dentro de um envelope grande. Aliás, era por isso que a Pri estava me dando uma carona para casa, porque eu estava com muita coisa no carro. A cena que eu tenho na minha cabeça desse assalto, uma pessoa me abordando, o Thiago estava dormindo atrás, uma pessoa me abordando, outra pessoa bordando a Priscila, e a Priscila reagindo, dizendo que não ia sair do carro, que era aniversário dela. Meu Deus! E o cara que me abordou, ele pulou com a arma de frente para mim, no carro, eu sonhei por meses com a bala saindo daquela arma no meu rosto, eu acho que ele devia estar sobre o efeito de muitas drogas, muita adrenalina também. Então ele abriu a porta do carro e ele jogou o meu envelope no chão, e começou a me puxar para fora do carro, eu ia sair, era obvio que eu ia sair. Estava todo mundo muito nervoso e as minhas folhas começaram a voar, o envelope rasgou e as minhas folhas começaram a se embolar ali dentro do carro, e o assaltante, ele parava, e ele repetiu o tempo todo isso para mim, mão na cabeça, vai para parede que eu vou matar todo mundo. E aí ele largava arma no chão e catava as folhas, e jogava as folhas dentro do carro. E aí ele lembrava que ele estava saltando, que a arma estava no chão, e aí ele pegava arma e apontava. Então eu fui para a parede com certeza de que eu ia morrer, mas eu olhava assim por baixo do braço e eu via aquela cena dele catando as folhas e jogando as folhas dentro do carro, não entendi muito, porque ele estava fazendo aquilo. Até a hora que a Priscila meio que se atracou com o cara que estava rendendo ela, e a gente teve que tira-la do lugar, ao invés de obedecer e ir para lá. Mas de novo, graças a Deus, que cuidou da vida da gente ali, naquele dia também. A gente saiu e eu não perdi nenhuma folha, nenhum fio de cabelo, não, fio de cabelo eu devo ter perdido. Mas assim, nós saímos dali, fomos para uma delegacia, foi muito tenso ligar para os nossos pais, avisando que a gente estava sem carro e tudo, mas que estava tudo bem, graças a Deus. Depois o carro foi encontrado, porque eles estavam fazendo só um arrastão, só para puxar telefone, bolsa e tal. Enfim, a gente podia ter perdido a vida, num ato de nervosismo, tanto deles quanto o nosso. Mas eu vou repetir, Deus me guardou, com muito, muito carinho, porque não faltou nenhuma folha, quando o carro saiu, a gente não tinha mais relógio, não tinha mais celular, não tinha mais carteira, não tinha notebook, não tinha nada, mas as minhas folhas estavam todas lá, todas lá. Eu tinha me inscrito para esse concurso de Furnas. Chega de falar de assalto, era só para falar das folhas. Eu tinha me inscrito para esse concurso de Furnas e esse concurso foi assim, eles abriram concurso, abriram as vagas, a gente pagou inscrição e o concurso não aconteceu, no prazo que estava previsto. Então eu estava estudando, aproveitei para fazer outro concurso, outros concursos, fui aprovada para um concurso civil da Aeronáutica, nessa época. E esqueci o concurso de Furnas, porque não saía, provavelmente mais para frente eles iam devolver o dinheiro. E foi isso mesmo que aconteceu, quem quisesse podia entrar e pedir o dinheiro de volta. E eu fui aprovada para esse concurso civil da aeronáutica, departamento de Aviação Civil. E aí, fui convocada, passei acho que em quarto lugar para lá, fiz um tempo de nivelamento, para poder aprender as regras da corporação, eu fiquei com eles 1 ano e 6 meses. Antes um pouquinho deles me convocarem, foi feito a prova de Furnas. E eu fui fazer a prova assim, tinha estudado, mas eu já fui fazer a prova muito descrente, porque não tinha certeza se aquilo dali estava tudo bem, se ia ser bom para mim, já tinha dado tanto xabú com concurso, tanto problema. Eu fiquei, cara, não é possível. Mas enfim, eu estudei para caramba, vou lá fazer a prova para ver qual é. Era daquelas provas, esqueci o nome da instituição, mais uma prova que todo mundo odeia muito, que era aquela de você marcar a cada duas erradas que você marcava, anulava uma resposta certa. Eu fiz a prova, e aí a aeronáutica me convocou. Eu fui bem na prova de Furnas, mas não sabia a colocação, não me lembro se já sabia a colocação, não, a minha colocação foi um pouco mais para frente, eu acho que tinha umas 30 e tantas pessoas na minha frente. Na aeronáutica eu tinha passado melhor, o salário da Aeronáutica era muito melhor, mas era um concurso temporário, e aí eu fui para lá. Não fui só eu que fiz o concurso, eu fiz, o meu marido fez, na época ele ainda era meu namorado, a gente não era nem noiva. Tinha mais umas três amigas, e todos nós fomos aprovados, a gente entrou junto também lá. Essa amiga era da pós, fazia pós-graduação comigo, e a gente foi para lá. E a gente trabalhava em setores diferentes, eu fiquei trabalhando no setor de suporte, conheci muita gente no departamento de Aviação Civil, foi o meu primeiro contato com a instituição militar, com uma corporação militar, como civil. Porque é diferente você estar numa corporação como militar. Vou repetir, não senti em nenhum momento, que alguma dificuldade que eu tenha passado ali, foi pelo fato de ser mulher, lá na verdade, eu acho que alguma das dificuldades que eu passava, era pelo fato de ser civil. Porque entre eles, eles com eles, têm um tratamento diferente. Não me sentia discriminada não, mas entre eles, a questão da hierarquia mesmo, na divisão, é tudo muito certinho. Tinha muitas coisas que eu gostava ali, que eu achava muito legal, tinha outras que eu não entendi muito. Que era assim, tem um elevador só para oficial, um elevador para civil. Foi um lugar em que eu aprendi a respeitar muito a questão da hierarquia, que eu acho que até ali eu respeitava, mas respeitava mais do meu jeito, até de uma forma muito informal, ali não, ali a gente aprende ser formalzinho, a dançar muito conforme a música. Acho que isso faz bastante diferença na vida da gente, certo ou errado, bom ou ruim, faz diferença, a gente aprende um monte de coisa. Mas enfim, quando a gente entrou e começou a fazer o curso de nivelamento básico, para poder aprender algumas coisas sobre Aviação Civil, sobre a própria aeronáutica. Eu conheci um menino lá, que era o Eduardo, e de novo, de uma forma muito sutil, eu me apresentei para ele. Eu tinha visto o nome dele na lista dos aprovados do concurso de Furnas, e ele tinha sido aprovado numa posição bem anterior a minha. E logo que Furnas começou a chamar, o Eduardo foi convocado. A gente tinha passado para o mesmo cargo e o Eduardo foi convocado, então acho que com uns 3, ou 4 meses, no departamento de Aviação Civil, o Eduardo foi convocado. As poucas vezes que a gente se falou, foi assim: oi, tudo bem? Meu nome é Cami, eu vi o seu nome na lista dos aprovados de Furnas, você está empolgado com o resultado do concurso? E o Eduardo é um cara super calado, super discreto, super quietinho. “Quem é essa mulher”? A gente virou grandes amigos ali, depois dessa abordagem a gente ficou muito amigo. Ele trabalhava direto com meu marido, eles eram parceiros, nos mesmos projetos, inclusive, de desenvolvimento. No pouco tempo que o Eduardo ficou lá, acho que foram dois ou três meses, ele foi convocado. E até hoje ele fala para mim, “eu vim para Furnas por sua causa”. Porque eu sentei do lado dele, e falei: olha, você precisa ir para Furnas, Furnas é assim, Furnas é assado, você vai gostar muito, eles tem isso, eles tem aquilo, na, na, na, eu falei, falei, falei tanto no ouvido dele, que o Eduardo acabou aceitando. Ele foi para Furnas para ganhar menos da metade do que a gente ganhava no departamento de Aviação Civil. Ele também já namorava, com a Raquel, acho que a Raquel estava fazendo faculdade na época, não lembro se eles já estavam fazendo plano para casar, eu acho que não. Eu lembro que ele acabou largando o departamento de Aviação Civil e foi para Furnas. E aí ele foi, e vira e mexe a gente falava, para saber como é que estava, se ele estava gostando muito, se ele estava gostando pouco, onde ele tinha ficado, o que ele estava fazendo se ainda se encaixava com alguma coisa que eu queria fazer, se valia a pena ou não vale a pena. Mas o fato, que um ano e tanto depois, quando eu fui convocada, eu voltei a procurar o Eduardo, para falar sobre o concurso, eu acabei indo trabalhar na mesma divisão que o Eduardinho. Aí foi a vez dele me convencer, porque nessa época, eu já estava ganhando um pouquinho mais, a gente estava comprando a nossa primeira casa, então eu já tinha umas contas que não dava para simplesmente, caramba, vou largar tudo, pai me ajuda aí. Era umas continhas um pouquinho mais altas, pensando em casar. E o Eduardo super discreto, muito diferente de mim, deixou ali assim, a pronta escolha, “olha, eu faço isso, faço aquilo, mas não tem nenhuma garantia que você vai trabalhar com a mesma coisa, no mesmo lugar”. Porque o nosso cargo era um cargo amplo, não tinha muito direcionamento de onde a gente podia cair, na verdade na fase de entrevistas é que o pessoal escolhia, que algum gerente escolhia onde a gente podia ir ajudar. Aí eu me lembro do meu pai interferir, ele falou assim: olha, eu não quero saber como você vai fazer para pagar as suas contas, o fato é você vai, porque o teu emprego na aeronáutica é temporário, você já esteve em Furnas, você sabe como é, você ainda perturba o garoto para o garoto ir, porque você não lembra de tudo que você falou de bom para ele para você aplicar isso agora para você, e lembra que você não perdeu uma folha de matéria. Ele foi enumerando, você podia ter desistido do concurso, você não desistiu e você foi, nana, nana. “Tá bom pai, sou obediente, vamos lá, vamos para Furnas”. E de novo, Deus é muito, muito bom comigo. Fui admitido no mês que o novo plano de cargos e salários tinha sido aprovado, e acho que assim, não perdi dinheiro nenhum. Ainda consegui entrar lá, pagando a mesma quantia que eu pagava com o outro salario, merreca, mas era o que eu precisava. Entrei em Furnas de novo. O que pesou muito na minha decisão de voltar e não voltar, eu sabia que provavelmente a minha vaga era para o escritório central, e eu tinha muito medo de não me adaptar ao escritório central, porque o meu estádio tinha sido numa subestação e numa subestação, você vive muito diferente... você vive Furnas de uma forma muito diferente que é o escritório. Eu ainda entrei pensando em voltar um dia para uma área regional. Mas enfim, entrei, fui parar numa área de desenvolvimento para suprimentos. A minha primeira entrevista, eu me lembro muito, da Cristiane Staccioli, que trabalha até hoje na TI de Furnas. Ela trabalhava na época com Nolts, e eu tinha tido alguma experiência com CICEmail e Nolts em Furnas, no estágio, a uns 5 anos, ou 6 anos antes. A gente está falando aqui de 2005, maio de 2005, que foi quando eu entrei. Eu me lembro que a Cris foi a pessoa que mais se interessou por mim, na entrevista, mas como eu já tinha trabalhado com suporte, no departamento de Aviação Civil, quando eu fiz o estágio em Furnas, eu tinha passado também por um suporte, suporte diferente, o próprio trabalho com helpdesk, que era considerado um trabalho de suporte. Eu queria muito ter a oportunidade de trabalhar com desenvolvimento de sistemas né.
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P/1 - Você estava falando sobre o local que você ia ser alocada em Furnas. Não tinha certeza se era no escritório central ou não. Mas no fim das contas você soube que ia trabalhar com desenvolvimento de sistemas né?
R - Isso! Então apesar do interesse de uma das gerentes de outra área, ter convidado para continuar trabalhando com suporte. Eu pedi muito, para ter uma oportunidade para trabalhar com desenvolvimento de sistemas. E aí eu fui trabalhar com desenvolvimento, pela primeira vez. Foi na área do Samuel Zoé , que era desenvolvimento de sistemas para suprimentos. E quem trabalhava lá era o Eduardo, não tinha pedido para ficar especificamente na área dele e nem na área de suprimentos, que eu não conhecia, mas dentro das áreas de desenvolvimento, a que tinha vaga e que eles acharam que encaixava no meu perfil, era a de suprimentos. Eu fiquei com eles ali por volta de 4 anos, de 4 para 5 anos. Foi bem diferente para mim, trabalhava escritório central e trabalhar numa regional. Eu tinha muito a paixão da área regional, o sangue de Furnas correndo na veia, muito diferente. Ano após ano, eu me questionava se o que eu não estava adorando, se a paixão que eu não estava vivendo, era por conta do desenvolvimento de sistemas, se não tinha sido uma boa escolha, trabalhar com aquilo dali, ou se era o fato de eu não ver mais Furnas... De ter amadurecido, de ser diferente também, de não ver Furnas como eu via na regional. E nesses quase cinco anos, que eu fiquei ali no desenvolvimento, na área de suprimentos, eu casei. Já muda muito a visão da gente, da vida, de todo o resto. E no final do quinto ano, que era 2010, eu tive o meu primeiro filho, que é o Samuel. Não é Samuel em homenagem ao primeiro gerente, mas eu já brincava com o meu gerente, falava com ele na época, “olha, você não vem me taxar de puxa saco lá na frente não, mas se o meu primeiro filho for um homem, sinta-se homenageado, mas não é por tua causa não, o nome do meu filho vai ser Samuel, se eu tiver um filho homem o nome do meu filho vai ser Samuel”. Mas Samuel nessa época já tinha se aposentado, acho que Samuel já estava aposentado. Mas ele ficou sabendo, que o nome do meu primeiro filho era Samuel. E um pouquinho antes de ganhar o Samuel, de ter o Samuel. O Samuel Zoé, não era mais gerente da área, ele tinha saído de lá e ido para uma outra área, e depois ele se aposentou. E nessa época a minha gerente era a Isabel Lins. E eu sentei com ela para ter uma conversa, de mulher para mulher, falei: olha, eu não estou feliz aqui no desenvolvimento, tem alguma coisa que eu não estou sabendo explicar. E a Isabel foi muito legal comigo, ela falou: minha filha, você está grávida, será que isso não são todos os seus hormônios, e muita novidade que você está querendo, tem muita coisa que está mexendo com a sua cabeça, vai para casa, tenha o seu filho, quando você voltar a gente conversa sobre isso de novo, eu acho que não é hora de você mudar, não é hora de você fazer uma mudança muito grande, você sai daqui, vai para uma área que de repente você não vai conseguir… vais ser muita novidade ao mesmo tempo, ir para uma outra área, com um bebê e muita coisa nova para aprender, para fazer, vai lá, ganha o seu neném, volta, quando você voltar a gente conversa, se aparecer alguma oportunidade aqui, a gente vê se o seu perfil se encaixa. Foi um excelente conselho, eu fui para casa, fui ter o meu neném, do mesmo jeito que eu falei sobre uma das piores coisas que aconteceu na minha vida. Ser mãe foi de longe, a melhor coisa que aconteceu na minha vida, independente de qual filho eu esteja falando, dos dois. Eu fui uma grávida muito feliz, muito saudável, e os meus bebês foram bebês maravilhosos, lógico que eu passei por momentos muito descabelada, cheia de olheiras e bem acima do peso também. Mas assim, fui muito feliz, fui muito feliz como mãe de recém-nascido, foi muito feliz amamentando, acho que isso refletia muito no comportamento deles, foram bebês ótimos. Mas enfim, voltando ao primeiro Samuel, nessa primeira gravidez, passei por essa conversa com Isabel, fui para casa, fui ter meu neném, a gente já estava usufruindo da licença maternidade de 6 meses. Mas por volta do quarto, quinto mês de licença, recebi um telefonema da Isabel. Isabel que a gente chama de Bebel, também já está aposentada hoje. Mas a Bebel me ligou e falou: olha, tem um negócio aqui que é a tua cara, eu sei que você está de licença, lembra daquela conversa que a gente teve, você me pediu um desafio diferente, não consigo pensar em outra pessoa, quer? Falei: olha, quero! Isso não vai influenciar no meu retorno? Ela: não, não, não vai influenciar não, fica tranquila aí, quando você voltar então, vou conversar com quem está precisando e a gente espera você voltar para assumir. E aí foi a minha primeira mudança de área dentro de Furnas, sai do desenvolvimento de sistemas e fui trabalhar com Biai, era na época da implantação do SAP, VW, era a ferramenta que fazia a parte de relatórios gerenciais. Então ainda não tinha ninguém que fizesse, era o primeiro pós-implantação de RP. E aí quando eu voltei de licença eu fui direto. Mudei de salinha, peguei as minhas trouxinhas e mudei de lugar. E ali eu trabalhei também, com uma equipe que foi muito, muito legal, era uma equipe que tinha acabado um projeto, que eles tinham passado mais ou menos 1 ano, 1 ano e 4 meses, um pouquinho mais, porque quando eu cheguei o projeto já tinha acabado, eles estavam lá no pós-projeto. E todo mundo muito unido, uma equipe muito coesa, eu fui muito bem recebida pelo Castelo, que era o gerente da minha frente, nessa época. Então eu fiquei um tempo ali com ele, depois essa parte migrou da estrutura do projeto, de volta para Furnas. E quem ficou me gerenciando nessa época, foi o Henrique. Henrique José Maria, que é um cara, não da para explicar, acima de 1 milhão, e acho que é pouco, muito gente.
1:04:42
P/1 - Antes de você continuar, explica para a gente o que é BIAI? O que é SAP? Que projeto é esse?
R - Tá! O projeto que eu estou falando, é o Projeto Sintonia, que foi o projeto de implantação do RP, que é o SAP, o RP de Furnas é o SAP. O Projeto Sintonia deve ter durado isso. A equipe de projetos teve um ano para implementar, foi uma implementação, um projeto super ousado, esse prazo é um prazo extremamente curto, mas obviamente a gente conseguiu, foi feito no tempo determinado, no início de 2010 a chave foi virada e estava tudo funcionando, ou pelo menos do jeito que dava para começar funcionando. O BIAI é uma parte relacionada a relatórios gerenciais e análises de dados. Então, a tradução é bizness e Intelligent. Então assim, tem a ver com inteligência de negócios, você pegar dados que aquele RP, que aquele sistema naturalmente absorve, por causa das entradas que são feitas e transformar aquilo ali em alguma informação que seja útil para uma tomada de decisão. A ferramenta do SAP que faz isso, na época era o VW, hoje eu não sei se continua, mais para frente vocês vão ver, eu dizendo que não estou mais na equipe. Eu sei que já tiveram algumas mudanças, mas eu não sei se o VW continua como frente relatório, ele é uma ferramenta mais... mais com carinha de RP, ele não tem uma visualização muito fácil, não é muito, a palavra certa não é agradável, mas não é uma ferramenta, com uma interface muito fácil, tem outras ferramentas no mercado que fazem isso com mais facilidade. Que a própria SAP acabou comprando e trazendo e unindo aos produtos dela. Tá bom? Era isso que você queria? Então, eu fiquei cinco anos no desenvolvimento de sistemas, lá no suplementos, depois fui para o Biai, trabalhando com toda equipe de projeto. E logo depois a gente migrou para uma outra gerência, ainda trabalhando com Biai VW. Nunca deixei de ser analista de sistemas, deixei de ser desenvolvedora VBenetti, para ser analista de dados. Nessa época eu fiz uma outra pós-graduação na PUC, mas voltada para bizness inteligente. Foi uma época bastante cansativa, porque eu já era mãe, estava trabalhando durante o dia, era mãe e estava estudando à noite. Então alguns dias eram dias bem difíceis, de estar ali conectada em 100% das atividades. Mas enfim, eu fiquei nessa área até engravidar do Felipe. Quando eu estava grávida do Lipe, inclusive a gente tinha uns serviços para fazer, que precisava ser rodados durante a madrugada. Algumas vezes eu saí de Furnas assim... entrava às 8 horas da manhã de um dia e saia de lá 11 horas da manhã do dia seguinte. Eu fiz isso grávida, algumas vezes e ainda voltava para casa dirigindo, cansada para caramba. Mas assim, a ânsia de ver tudo funcionar, ver tudo rodar, era muito grande. A ânsia de querer sucesso naquela ferramenta, a ânsia de querer ver aquilo funcionando redondinho e fazer funcionar, para o nosso público alvo. Mas assim, quando eu penso público alvo, fosse ele um diretor, um gerente, um colega, era para os meus amigos, as minhas entregas eram sempre... quando eu via o cliente do outro lado, que precisava daquilo dali, sempre foi muito fácil, olhar para o cliente em Furnas e ver ali um colega, que queria tanto sucesso naquele trabalho, quanto eu queria mostrar. Aí na gravidez do Lipe, passei por isso algumas vezes, mas já comecei a refletir um pouquinho, quanto eu estava dando de mim naquilo dali, não precisava fazer tudo isso grávida, tinha que ter mais gente para trabalhar aqui no ali comigo. Quando eu voltei da gravidez do Lipe, juntada a essa situação, agora já era mãe de dois, eu achei melhor buscar um desafio diferente na empresa. Tinha uma Superintendência que estava tentando estruturar uma área de segurança da informação e as pessoas ficaram sabendo que eu queria muito sair um pouquinho da TI, e fazer uma coisa diferente. O superintendente na época era o Vitor Albano, ele é falecido, me chamou para conversar, tinha uma área que eles estavam pensando em começar e eu aceitei, eu topei o desafio de ir para lá e mudar completamente a minha vida de tecnologia da informação. Apesar de segurança da informação, ser um assunto que tem bastante a ver com tecnologia, essa área era uma área mais voltada para governança, para gestão. E eu não tinha ideia de como fazer funcionar, de como aquilo ali funcionava, o que eles faziam. E como era esse trato como auditoria interna, auditoria externa. E eu topei. Então quando eu fui para lá, essa área de segurança da informação, era uma coordenação. O primeiro coordenador era Márcio Victi, o Márcio ficou algum tempo ali, se não me engano, menos de um ano. Logo em seguida, ele foi convidado para um outro desafio e a gente teve um outro coordenador. Que foi o Luís, ficou com a gente também durante um tempo. E a coordenação acabou, coordenação de segurança da informação, acabou. E eu fiquei me sentindo assim... pensando algumas vezes, se eu tinha feito a decisão certa, de ter ido para lá. Mas quando eu via, que era um início, era uma área sendo construída, eu pensava que não era possível, que alguma coisa não fosse acontecer ali, para aquela estruturação dá certo, para aquela estruturação ali, para aquele caminho ali acontecer. Enfim, a coordenação acabou, tiveram algumas mudanças também de estrutura, hierárquica. O Vitor não estava mais com a gente, a gente já tinha um outro superintendente e devido essa reestruturação, algumas coordenações viraram departamento e criou-se uma gerência de segurança da informação. E qual foi a minha surpresa, tão boa foi a minha surpresa, que a pessoa convidada para assumir a gerência de segurança da informação, foi o Castelo, que já tinha sido meu gerente anteriormente. Então mais uma vez assim, entrei numa gerência, que era mais uma família, de novo, mais um pedacinho de família ali, com gente que eu amava e respeitava desde sempre. E isso só contribuiu, para minha dedicação e carinho com a segurança da informação aumentar. Acho que eu tive muito mais certeza, de que aquilo ali era o que eu queria fazer, os meus parceiros ali de gerência, além do Castelo, era o André, que era contratados de Furnas e a Cláudia, que tinha passado um tempo longe de Furnas e tinha voltado, e o Bruno, que ele era da área de gestão documental e a gente convidou para ir para lá trabalhar com a gente e ficou. Então a gente formava um time, cara, profissionalmente falando, um time muito apaixonado, com muita coisa para aprender, muita coisa para aprender, uma área totalmente nova, para a gente, uma área que ninguém na empresa nunca tinha feito nada parecido, com muita gente para conquistar, com muitas portas para serem abertas. Porque quando você entra numa área de gestão ou de governança, significa que você vai bater na porta de alguém e vai falar assim: como é que você faz isso daqui? Então, o desafio maior era conseguir bater nessas portas, e que as pessoas olhassem para a gente, com bons olhos. O desafio era ser visto com bons olhos, porque se tem uma coisa que eu aprendi, e não foi só com segurança de informação, com segurança de uma forma geral, e que o cara da segurança, é um cara chato, o cara de segurança é o cara que vai te perturbar por causa de alguma coisa que você faz e que você não faz do melhor jeito que deveria. O cara da segurança é o cara que vai dizer para você, olha, você pode fazer isso aqui diferente de uma forma mais segura, ou então você não devia estar pensando nisso daqui. Mas como a minha superintendência é uma superintendência de conformidade, e de controle interno, e de avaliação de risco. Todo mundo foi apoiando e suprindo a gente ali com experiências de como conduzir esse processo, de como se chegar as áreas, e de como conquistar esse espaço, como ser visto como um agregador, ao invés de ser tão chato, você vai ser um chato, mas vai ser um chato agregador. É muito interessante também, que a gente tem uma parceria com as outras empresas do grupo Eletrobras, eu vi muito menos isso nas áreas anteriores, eu não sei se isso foi por causa da época, ou mesmo por causa das posições que ocupava, e que de repente não tinha essa interação com as outras áreas, com as outras empresas.
1:16:01
P/1 - Essa gerência foi criada em que ano? Essa nova gerência de segurança da informação, porque ela foi criada só nesse momento? Quais eram os problemas que foram observados?
R - Deixa eu tentar lembrar aqui! A gerência foi criada em 2015. Em 2015 foi quando eu fui para lá, e tinha essa coordenação de segurança da informação. Então acho que até o final de 2016, a gente ficou sendo coordenação e acabando como coordenação. E aí em 2017 a gente virou GSI.P, gerência de gestão e segurança da informação. Já na época da coordenação, não é a primeira gerência, não é a primeira estrutura de segurança da informação que a empresa tem. Eu acho, que talvez, por volta de 2010, 2012, houve uma área que tratava dos assuntos, mais voltados para essa gestão de segurança, que já falava sobre classificação da informação. A gente tem alguns normativos, os primeiros normativos foram de 2007, então se não tinha uma área já estruturada, já tinha alguém que falava sobre segurança e sobre alguns assuntos que a gente trata hoje oficialmente, como sendo assuntos de gestão de segurança da informação. Mas oficialmente, ela retornou 2017, 2016, 2017. Que foi quando o castelo chegou como gerente, e a equipe se formou. Era mandatório, porque já tinha alguns assuntos regulatórios, que tratavam ali, sendo uma superintendência de conformidade, a parte de controles internos e a parte de Gestão de Risco, foi uma estrutura que foi criada em todas as empresas Eletrobras. A gente até foi uma das primeiras empresas que conseguiu estruturar a área, foi muito bom ter participado, foi a primeira vez que eu vi uma área nascer, nascer ou renascer. E participar da construção das atribuições dessa área, o que realmente a gente ia fazer ali, o que dá para fazer, a gente queria colocar um monte de coisa nas atribuições e a gente sabia que não ia ter tempo hábil, que não dá para dar conta de tudo. Porque as nossas equipes, já são equipes mais reduzidas. Enfim, a gente sabia que tinha, como eu tinha dito anteriormente, que conquistar um espaço ali, e de chegar em algumas outras áreas, como gestão e governança de informação. Principalmente nas áreas de tecnologia da informação, de Tecnologia da Informação voltada para operação, que a gente chama de TO ou TA, tecnologia de automação. Basicamente elas tratam da nossa rede corporativa e da nossa rede operativa. O que a gente faz ali, é gerir e tratar com essas áreas, alguns controles que a gente precisa ter, para aumentar a nossa segurança. Tecnicamente eles põe bastante a mão na massa, a maioria dos projetos são feitos por eles, mas um, ou outro ponto, a gente identifica que tem alguma fragilidade, alguma coisa que precisa ser cumprida. E a gente auxilia, a gente tenta encaminhar ali novos projetos, para que aquelas brechas sejam minimizadas, para aqueles riscos sejam minimizados, e a gente tenta tocar assim a segurança. Com o tempo, e muito pouco tempo, as nossas atribuições aumentaram muito, mesmo a gente tendo desenhado já pensando em bastante coisa. A gente tenha LGPB, que chegou, e a gente teve que abrir um projetão enorme, para poder colocar a empresa para se adequar, isso lá na segurança da informação. A gente teve um projeto aí, que durou uns dois anos, também com participação de bastante gente. E vire e mexe a gente tem novos projetos, que a gente tenta engajar a empresa, fazendo sempre eles pensarem com esse foco, na segurança das nossas informações. O que a gente precisa, como a gente precisa, quanto custa manter isso daqui do jeito que a gente precisa fazer, e como é que a gente pode minimizar isso ao longo dos nossos dias, enfim, cuidando da segurança de Furnas. Hoje o assunto tá muito, muito na moda, a gente vê direto na mídia, em vários veículos falando sobre ataque cibernético, sequestro de dados, se Deus quiser em Furnas vai passar bem longe, não vai ter nenhum incidente desse tipo, por favor!
1:22:11
P/1 - Você apesar de ter voltado concursada, você trabalhou na subestação a um tempo atrás. Na sua experiência, como é que você ver Furnas incorporando, ou fazendo áreas com tecnologia da informação. Como é que é implantar esses serviços, esses sistemas, dentro de uma empresa tão grande?
R - Acho que eu sei bem como eu vou começar falando sobre isso. Eu acho que é bem notório, que a empresa tem um pedaço grande no meu coração, na minha vida, foi como eu falei, eu acho que eu entrei em Furnas, as duas vezes que eu entrei, eu entrei sabendo. Não, não entrei sabendo, mas entrei apaixonada. A primeira vez não conhecendo quase nada, mas assim, não só pela vivência que eu tinha com as pessoas, mas tudo que eu via acontecer ali na subestação do Grajaú, era o que fazia os olhos brilharem pela imensidão que Furnas era. E naquela época, só tinha visão da empresa como Grajaú, como subestação do Grajaú. Indo ali para o escritório central, como eu falei, que tinha algumas dúvidas, se eu queria estar lá, eu queria estar numa regional. Foi mais fácil, digamos assim, mas não muito fácil, entender e enxergar a dimensão, porque dentro da TI, por mais que eu trabalhasse com desenvolvimento de sistemas, a gente tinha contato com as pessoas que trabalhavam ali na infraestrutura de TI, e quando você adentra na estrutura de TI, você já vê. Eu não estou falando aqui só de um servidor, para a gente desenvolver sistema e atender aqui o cara que faz compras, o cara que lida com material. Estou falando, olha para esse servidor aqui, olha em quantos outros servidores ele está ligado, olha para todas essas outras coisas aqui. Isso ainda dentro da TI corporativa, já era uma coisa muito grande, quando você pensa numa sala de servidores de uma empresa do tamanho de Furnas, assim, não era só uma, ali no escritório central, era uma em cada lugar, era uma sala grande em cada Regional que você visita. E a gente não fala só de TI, mas tá falando de TI, de telecomunicações, de operação. E aí você vai potencializando, vai aumentando aquilo ali. Não é fácil explicar, mas tem uma coisa que aconteceu aqui na minha casa, e que eu acho que mostra muito assim, o quanto eu tento passar para as pessoas o que é Furnas. Porque é muito estranho você dizer para uma pessoa, alguém te perguntar, “onde você trabalha”? “Eu trabalho em Furnas, eu sou funcionária de Furnas”. E tem gente que olha para você e fala assim: o que é Furnas? Tipo, como o que é Furnas? Você é brasileira? Como assim, o que é Furnas? E aqui em casa, os meninos, tem muita essa coisa de voltar da escola com uma pergunta, no que a mamãe trabalha, no que o papai trabalha, o que você faz? E o Samuel, uma vez eu recebi um vídeo, na verdade ele nem me perguntou, não foi uma pergunta que ele me fez, mas eu recebi um vídeo do Samuel, ele foi participar de um projeto do pessoal de série bem mais avançada que a dele, eles estavam replicando um experimento. E aí na réplica desse experimento, algumas das perguntas que eles faziam, era no que os seus pais trabalham? E o meu marido também é de TI, mas o Leonardo nessa época estava trabalhando com Interface para máquina de cartão de crédito, ele trabalhava numa espécie de financeira, mas quando você está falando da máquina do cartão de crédito, e por mais que tenha uma estrutura muito grande atrás disso, você está falando de uma máquina de cartão de crédito, que é uma coisa que você vai no mercado, vai em qualquer lugar, e a criança vê você passando o cartão de crédito. Então ele falou: o meu, o meu pai trabalha desenvolvendo sistema para máquina de cartão de crédito, se não foi isso, foi quase isso, mas ele conseguiu dizer direitinho, meu pai trabalha fazendo sistema para máquina de cartão de crédito. “E a sua mãe, o que a sua mãe faz”? Deu um friozinho na barriga de saber o que ele ia responder, mas acho que ele conseguiu colocar um pouquinho do que eu passo para eles, que é a imensidão de Furnas, ou a quantidade de coisas que eu já fiz na empresa. Mas a resposta que ele deu, foi assim: minha mãe, eu não sei, mas minha mãe da luz para a cidade, não, minha mãe da luz para o Brasil. Eu acho que Furnas é muito isso. Ali dentro a gente tem engenheiro, a gente tem analista de sistema, você pisca, você hoje está numa área de suprimento, amanhã você está trabalhando com conformidade, ou você é um engenheiro que hoje está trabalhando numa obra, mas que algum momento você pode tá virando um gerente de RH. Mas no fundo, o que a gente tá fazendo ali, e levando energia para o Brasil inteiro. Então, esse experimento, trouxe isso de experiência para a gente, de olhar para ver como as outras pessoas talvez enxerguem Furnas. E para mim, como eu enxergo Furnas. Se eu estou trabalhando ali hoje, com segurança da informação, com desenvolvimento de sistemas, ou se um dia eu for parar numa ouvidoria, ou numa auditoria, ou em qualquer outra coisa. O que eu não posso me esquecer, é de que eu levo luz para a cidade, que eu levo luz para o país. E é bem isso!
1:29:37
P/1 - Cami, você acha que esses sistemas de Furnas são visados para hackers? Qual que é o nível de preocupação que vocês têm com relação a isso? Quais ações vocês têm trabalhado nesse sentido?
R – Então, tem umas coisas aqui que não dá para colocar do jeito que eu queria, porque o assunto é sempre muito sigiloso, a gente tem que falar sobre isso sempre com muita cautela. Mas assim, tratando de parque industrial, hoje o sistema elétrico é muito visado no mundo inteiro, todo sistema elétrico do mundo inteiro é muito visado. E não existe 100% de segurança, tudo que a gente faz é sempre tentando minimizar os riscos. E eu trabalho crendo que os milagres podem acontecer, que a gente faz o melhor que a gente pode aqui, mas que eu preciso segurar na mão de Deus, e falar, me ajuda aqui, não deixa nada acontecer não, se não a dor de cabeça é muito grande, a gente tá colocando muitas vidas em risco. Então quando eu estou falando de um ataque, de um Cyber ataque, dependendo de qual seja o alvo, dependendo da intenção, eu posso estar colocando uma cidade debaixo da água, ou eu posso estar colocando a dezenas de hospitais, dezenas de outras estruturas, que dependem de energia, para cuidar de vidas, e isso é muito tenso, para quem trabalha com segurança, para quem trabalha principalmente com segurança na rede operativa, é isso. O nosso dia a dia não é muito esse, porque a gente está numa área de gestão, de segurança da informação, mas a gente precisa ter esse olhar de segurança, para essas infraestruturas, é para isso que a gente trabalha, para que a energia não deixe de estar nas cidades, para que a gente não deixa de dar luz para cidades, que não deixe de dar luz para o país, para que a gente não pare nunca de gerar e transmitir e com segurança.
1:31:58
P/1 - As pessoas não imaginam que tudo lá no campo também é informatizado.
R - Depende de algum sistema para rodar. E que isso pode ser parado a qualquer momento, por causa de uma pessoa mal intencionada, ou de muitas pessoas mal intencionadas. O impacto disso pode ser muito grande, muito grande. A gente não está falando só da marca da empresa, que é óbvio, que quando isso acontece, a gente tem um problema com a nossa marca, a gente tem um problema com grana, tem problema. Mas a gente pensa acima de tudo, nas vidas, energia tem tudo haver com isso. No que pode ser danoso para outras estruturas que dependem da gente para cuidar de vidas, acho que é muito isso.
1:33:10
P/1 - Você hoje está nessa área? Qual que é o seu cargo? O que você espera para o futuro da sua área?
R - Hoje eu estou gerente substituta lá na DSI.P. Hoje a gente voltou a ser um departamento, deixou de ser gerência, voltou a ser um departamento. O meu gerente é o Julio Guedes, ele está com a gente a uns 2 anos, um pouquinho mais de dois anos, como ele diz e como eu adoro repetir, ele é um presente para a gente também, e a gente é um presente para ele. É um prazer estar dirigindo ali com ele, e com a equipe de segurança, esse trabalho, é um prazer está trabalhando, é uma satisfação enorme está trabalhando de casa, e ter a equipe que dividi essa responsabilidade comigo, o Bruno, o Caco, Claudinha e o Juninho. Porque a gente acha que a gente pode fazer ali de melhor, tem muita coisa acontecendo, a gente não para, essa é a verdade, desde que a gente chegou ali, a gente já teve alguns momentos mais tranquilos, quando a gerência, quando a estrutura estava sendo criada, quando a nossa caixinha estava sendo criada. Mas a verdade é que a gente passa ano após ano, concluindo os nossos projetos, e quando a gente acha que no ano seguinte.. Poxa, esse ano a gente vai ter pelo menos um projeto a menos, porque tal projeto acabou, a gente descobre que no ano seguinte, três projetos foram aprovados, assim de uma vez só, e que tem mais gente querendo fazer alguma coisa, e que tem grana para fazer essa alguma coisa. E o mais legal é que a gente está sempre torcendo por alguns dias mais tranquilos, mas quando um projeto desses vem, rapidinho o olho brilha, “nossa, nós vamos conseguir acabar com aquela pendência, a nossa nota vai subir, a nossa avaliação vai melhorar muito nisso daqui, vamo embora, quem vai pegar e quem vai fazer, e como é que a gente vai se ajudar nisso daqui”. Então repito, acho que é imensamente satisfatório estar com a equipe que eu estou, e com a quantidade de trabalho, e com os trabalhos que a gente tem para fazer. Esse ano a gente teve a implantação de um plano de continuidade de negócios, um projeto de gestão de continuidade de negócios, justamente pensando numa parada dessa que pode acontecer, e eu não estou falando de parada giria não, estou falando parada de sistema mesmo. Se alguma tragédia acontecer e o sistema elétrico parar, e alguma coisa precisar parar aqui, como é que a gente faz para recuperar isso daqui, como é que agente faz para voltar a funcionar, e como é que agente faz para que esse tempo de retorno seja o menor possível, como é que a gente faz para reduzir. A gente recentemente terminou um projeto de continuidade negócios, a gente já está montando um novo GT, para dar continuidade a esse assunto, mas não em forma de projeto. A gente está falando de LGPB, a gente já está agora as beiras de começar as sanções, por causa da aplicação da lei. Hoje a gente já tem andamento aqui um projeto (1:37:35...) que é justamente ali uma visualização, um monitoramento maior sobre as atividades da nossa rede, principalmente da nossa rede corporativa. A gente também já tem aqui umas outras coisas acontecendo, mais voltadas para proteção de dados, para vazamentos de informação e que estão aqui na nossa manga. E outras coisas que a gente precisa implementar, para poder estar sempre melhorando essa questão da segurança. Hoje a gente também está passando por um processo de capitalização, uma coisa que mexe muito com a cabeça de todo mundo, a gente não tem muita certeza sobre as nossas (1:38:13…) a nossa continuidade na empresa. Enfim, o nosso futuro na empresa, um futuro relativamente incerto, mas ainda acho que a equipe de segurança de informação está extremamente motivada e tranquila em relação a esse assunto, não sabemos até quando e o que o futuro tem esperado para gente. A gente tem é fé e vontade de trabalhar e vontade de manter o nosso assunto aí super em dia, fazendo melhor que a gente pode.
1:38:43
P/1 - E como é que tem sido essa pandemia para você? Você tem algum desejo, algum sonho?
R - Essa pandemia veio para me fazer conhecer muito a minha casa e os meus filhos. Porque quando a gente tem filhos e a gente trabalha em tempo integral, fora de casa, felizmente a gente tem algumas instituições e algumas pessoas que podem nos apoiar, eu tenho graças a Deus. Durante muito tempo tive a minha mãe e o meu pai, depois de um tempo não tive mais o meu pai, mas a minha mãe continua me ajudando. E a gente sempre valorizou muito essa questão do trabalhar, mas eu conhecia muito pouco os meus meninos, muito pouco em relação ao que eu vim conhecer durante a pandemia. No início da pandemia para gente foi... eu não sei se para todo mundo foi assim, acho que tem bastante gente que no iniciou levou bem, e agora está mais tenso. Mas, como a gente tem uma profissional de segurança na casa, e que faz questão de seguir alguns controles muito certinho, a gente se isolou, se isolou mesmo, principalmente dos nossos velhos, a gente tomou muito cuidado com eles. Então quem a gente precisou trazer para perto, porque não ia conseguir ficar longe, sem suporte. A gente trouxe para perto e falou, ô, tá todo mundo junto e é junto. E quem a gente não podia ter por perto, a gente até hoje não teve contato. A gente ainda está aguardando o isolamento, a gente ainda está bem guardado em relação a isso. As minhas crianças não voltaram para escola e eu não voltei para o escritório. Apesar de que a gente ainda não está liberado para voltar, o escritório central ainda não está liberado para voltar, mas eu não estive no escritório. Antes da pandemia a gente estava se mudando, de escritório central, Furnas estava em Botafogo e estava passando para nova sede, que era o centro. Então temos esse novo escritório há mais de um ano, e eu só estive lá uma única vez, para buscar a minha máquina de trabalho. Furnas implantou uma política de teletrabalho, eu tive uma grande satisfação de participar da elaboração dessa política. Eles usaram o sistema de informação para essa política e devo ter sido uma das primeiras assinar, o novo contrato de trabalho, porque é um dos meus motivos foi justamente entender que de casa eu podia ter maior participação na vida dos meus filhos e da minha família. Eu acho que foi isso que é pandemia trouxe de bom para minha casa. Muitas reflexões, que a gente fez durante a pandemia inteira, a gente perdeu algumas pessoas queridas, e se aproximou muito de outras muitas pessoas queridas, por conta do isolamento, por ver o quanto a gente precisa dar mais atenção, ter mais atenção e cuidar mais dos outros, acho que essa é a lição mais importante que fica para gente da pandemia. É sempre ter esse olhar do quanto o outro precisa que você faça sua parte, do quanto cada um precisa fazer a sua parte. Aqui a gente não teve covid, nenhum de nós aqui, tivemos covid, mas eu posso dizer que a gente tratou o isolamento com maior rigor possível, maior rigor que era previsto. Até hoje, a gente brinca muito que tem gente que não lava mais as compras, até hoje a gente vai na rua para o mínimo possível e lava a mão ainda 500 vezes por dia, quando toca numa sacola de compra que veio da rua, aquele saquinho que ficou esquecido lá e de repente não foi bem lavado, a gente ainda lavava tudo. “Não bota a mão no nariz, não encosta, não pode, não faça, olha o carro, deixa aberto, janelas abertas e vamos que vamos”. Não acho que a gente fez isso porque, porque a gente é legal não, porque a gente é medroso mesmo, a gente teve muito medo de que a gente pudesse ser atingido, e quanto menos problema a gente puder lhe dar, é sempre melhor.
1:43:40
P/1 - O que você achou de contar um pouquinho da sua história e um pouquinho da história da empresa? Como é que foi para você?
R - Gente é muito bom falar da vida. Será que isso é um pouquinho de narcisismo, sei lá, deve ter um nome, na psicologia deve ter um nome para gostar tanto de falar da vida. Egoísmo, não, egoísmo acho que não, mas é bom, é bom mesmo, deve ter um nome, eu não sou a pessoa certa para lembrar desse nome. Mas assim, falar da vida e recordar algumas coisas... Eu não sei qual o melhor nome que a gente dá, para gostar de falar tanto da vida, deve ter um nome na psicologia, deve ter um nome para isso, mas o melhor de falar da vida é lembrar com muito carinho, por todas as coisas que eu passei que eu pude falar aqui, isso que é mais legal. Tem um monte de coisa que a gente vai vivendo e acha que não vai esquecer nunca e às vezes coisas ruins, que a gente vive e que assim, não é possível, nunca vou me esquecer disso, isso me feriu tanto, doeu tanto e quando a gente começa a falar da vida nem passa pela nossa cabeça, falar sobre essas coisas, isso é muito bom. Sei lá, a gente perdoa pessoas, mas assim, o perdão para as pessoas a gente esquece e não manda mais a conta para as pessoas. Mas acho que as coisas mesmo e as situações, eu também não me lembro de uma palavra para isso, mas é isso, eu descobri que aquele peso de alguma coisa que você viveu e foi muito ruim, foi muito chata, você não tem mais. Olha que coisa boa! E que infelizmente a gente também não tem memória, ou não memória imediata para falar de todas as coisas boas. Quando a gente começou hoje, eu estava falando que eu deixei de mencionar das pessoas que foram incríveis na minha vida, que foi a minha bisavó e que foi uma tia que eu tive, das mulheres maravilhosas. Lembrança de comida. Minha bisavó chegou a ser tataravó do meu filho mais velho, eles chegaram a se conhecer, que são coisas que para mim são muito importantes, mas a gente não tem aquela memória imediata, de quando está falando de alguma coisa se lembrar de todas elas. Isso é um ponto negativo. E o ponto positivo para mim é justamente ver que mesmo tendo passado por experiências ruins, elas não vem à mente quando você está colocando, e quando você esta colocando coisas da vida para fora, nem as mais emocionantes, que acaba tendo um fundo daqueles que você chora. Sempre o que vem a memória boa, é memória com sorriso, é leveza, foi uma coisa que passou assim... esses dias que a gente passou aqui, foram dias bem leves. E para mim é muito divertido, muito divertido, acho que eu ri muito né? Acho que eu ri muito aqui com vocês, contando coisas que... Gente, terminar a minha faculdade foi difícil para caramba, foi muita grana, foi muito sacrifício, e hoje quando eu conto isso, eu mal consigo pensar em todo sacrifício que foi feito, não é pesado, pelo contrário. Eu acho que isso é muito gostoso e um monte de outras coisas, que deixaram de ser vistas como peso, sacrifício, momentos difíceis e que viraram história para contar com sorriso no rosto, isso que é o mais legal.
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