Projeto Kinross Paracatu
Depoimento de Davi Luiz Ribeiro (Davi Brasil)
Entrevistado por Marcelo da Luz e Fernanda Prado
Paracatu, 07/06/ 2017
Realização Museu da Pessoa
KRP_HV09_Davi Luiz Ribeiro (Davi Brasil)
Transcrito por Karina Medici Barrella
P/1 – Nós agradecemos, Davi Brasil, por ter topado participar e contar sua história, disponibilizando esse tempo para estar aqui conosco hoje e fazer essa história de vida, sua história de vida. Bem, Davi Brasil, pra começarmos, qual o seu nome completo, local e data de nascimento?
R – Meu nome completo é Davi Luiz Ribeiro. Nasci no dia 29 de dezembro de 1961 e resido na cidade de Paracatu [MG].
P/2 – E que cidade você nasceu?
R – Nasci exatamente nos barrancos do rio Preto, no município de Unaí [MG] (risos). Eu fui criado na fazenda, aos 12 pra 13 anos que eu vim pra cidade pra continuar os estudos. Na fazenda, na época, não tinha, não complementava, era só mesmo o grupo [escolar], aí eu vim pra cidade pra estudar e a oportunidade de aprender a trabalhar. Foi onde eu aprendi a trabalhar e aprendi a profissão de marcenaria.
P/1 – Qual o nome dos seus pais?
R – O meu pai já é falecido, chamava José Luiz Ribeiro. E minha mãe chamava Julieta Teixeira de Souza, que também é falecida.
P/1 – Qual era a atividade deles?
R – O meu pai era carpinteiro, meu pai era tipo “Bombril”, mil e uma utilidades. Exemplo, você comprava um pedaço de terra, não tinha nenhuma benfeitoria, as construções, então ele pegava lá do chão, por exemplo, uma casa, entregava na chave, pra fazer barracão, curral, chiqueiro pra porco, galinheiro... Ele fazia de um tudo, era muito inteligente. Até interessante que antigamente fabricava os tecidos, fazia plantação de algodão e fiava, tecia e costurava. E tudo isso aconteceu na minha casa, na minha família; o meu pai fabricava os equipamentos, a exemplo a maquininha de fiar – chama roca – a roca de fiar, tem a outra de cardar, cheia de dentezinho, que é de cardar o algodão. Primeiro processo planta, colhe, escaroça. Escaroçar é tirar o caroço do algodão, depois de descaroçar, pega o algodão e passa na carda pra dali for fazer um formato específico pra fiar. Aí é fiado na roca. É interessante que esse material todo meu pai fabricava: a roca era fabricação dele, o tear fabricação dele, menos as cardas porque é um negócio mais minucioso, então, ele comprava. Mas o resto tudo era fabricação dele. Tem uma maquininha também, chamada quarteador, é uma base com uma cruzeta com os fueiros – fueiros em carro de boi, mas também chama fueiros – quatro fueiros. O equipamento chama quarteador. Vai pra esse quarteador pra depois passar pro novelo, do novelo vai pra roca, da roca vai pro tear, tece e do tear vai pra mesa de costura onde, tudo isso, minha mãe fazia. Meu pai plantava o algodão, ela escaroçava, cardava, fiava, tecia e costurava. Criou 15 filhos. Aliás, teve 15 filhos o mesmo casal e foram criados 14. Interessante que foram sete casais, sete homens e sete mulheres. Eu sou o caçula dos homens e tenho três irmãs mais novas. Todos da família vestiram roupa de algodão que meu pai plantava, colhia e ela fazia todo o processo até chegar no ponto final de vestir a roupa pronta, passava pela mão dela. Então assim, ambos muitos inteligentes e esforçados, criaram esses 14 filhos do suor, quando não era no cabo da enxada era no cabo do machado, era do formão do serrote. Às vezes passamos algumas dificuldades, mas fome, graças a Deus, o velho foi guerreiro, a gente se alimentou (risos).
P/1 – Vocês moravam em uma fazenda.
R – É. Meu pai foi nascido e criado em Paracatu, casou muito novo, ainda jovem e daqui ele foi pro município de Unaí. Então a gente sempre morou em zona rural, tanto os filhos, os 14 filhos foram nascidos e criados na zona rural. Eu vim pra cidade com 12 pra 13 anos pra estudar e correr atrás de uma oportunidade de trabalho, de aprender uma profissão. Foi aí que eu realmente aprendi. E de lá eu vim pra Paracatu, eu estava com 16 pra 17 anos quando eu vim de Unaí pra Paracatu. Até aí tem uma história interessante que na época, com 16, 17 anos eu já era profissional na marcenaria, com cara de menino, pequeno sou até hoje (risos), mas na época tinha cara de menino e as pessoas não davam credibilidade. Tanto que o primeiro serviço meu em Paracatu, é interessante, não tinha nada a ver com o que eu já sabia fazer, que era trabalhar com a madeira, foi trabalhar de ajudante em serralheria, que trabalha com ferro, com metal, com aço. Até que alguém me deu a oportunidade de fazer um teste. Esse teste eu tirei de letra, na marcenaria. Que na marcenaria são várias máquinas, várias especificações de trabalho, é bem semelhante a exemplo Medicina, tem suas especificações e tem a clínica geral. Até hoje eu aprendi trabalhando na clínica geral, tanto que eu trabalho no segmento da madeira maciça, tem também o planejado, que são pré-fabricados que você recorta e monta. Eu aprendi a fazer isso aí de modo geral. Mas a primeira paixão minha dentro da marcenaria foi o torno, que faz as peças de formato arredondado, chama de serviço de torneiro. Foi a primeira máquina que eu apaixonei, o torno. Essa pessoa que me deu a primeira oportunidade, exatamente o teste era no torno. Então, não tive dificuldade, foi fácil. Com essa pessoa, eu trabalhei uns três ou quatro anos até surgir outras oportunidades, a gente foi repassando, até as pessoas realmente conhecerem o meu trabalho, aí eu já passei a trabalhar por conta, né? E estou na marcenaria até hoje, inventei mais algumas modinhas por fora aí, que a gente vai chegar lá.
P/1 – Você se lembra, ou sabe como ou quando seu pai saiu de Paracatu e foi pra Unaí?
R – Eu não me recordo bem em que ano foi que ele saiu de Paracatu. Me parece que a data de nascimento dele é 1930. Ele casou novo, se casou novo deve ter se casado lá pelos 22 anos, no máximo 25 anos, então dá pra gente ter uma dedução mais ou menos, equivaler a data atual.
P/1 – E ele foi pra lá sozinho ou foi com a família?
R – Na época, foi com a minha mãe, não tinha filhos ainda. A família rendeu lá no município de Unaí, que foi ele e a esposa, no caso minha mãe.
P/1 – Sua mãe também é de Paracatu?
R – A minha mãe, eu não sei bem a história, me parece que o meu avô era paulista que veio pra Paracatu, eu não sei se quando vieram ela já era nascida ou se ela nasceu aqui em Paracatu. Essa história eu não tenho com precisão. Mas alguma coisa, mineiro misturado com paulista (risos).
P/1 – Você conheceu seus avós?
R – Não. O meu avô foi um fato interessante. Até a lembrança que eu tenho do meu avô foi o dia do sepultamento dele. Antigamente, o pessoal tinha umas ideias meio diferentes, meio carrasco, tanto que minha mãe a exemplo, se eu te contar as histórias da minha mãe é impressionante. O meu avô não preocupou em estudar os filhos, nenhum deles estudou. E ela era muito inteligente e tinha esse sentimento de não ter tido a oportunidade de estudar. A exemplo, se você perguntasse pra ela, ela não sabia pegar o lápis ou a caneta e escrever pra você os números, mentalmente, ela memorizava. Você perguntava pra ela: “Julieta, tanto mais tanto?”, ela não parava pra pensar: “Tanto!” “Tanto menos tanto” “Tanto!”. Podia conferir que realmente estava certo, mas ela não sabia pegar e escrever pra você os formatos, as letras corretas, né? Até um fato interessante que, por ela ser analfabeta, ela era muito observadora e às vezes ela pegava a gente aprontando, pintando como dizia antigamente, em vez de chegar e dar bronca, ela ficava só olhando. De repente, a gente percebia e assustava, né? Quando ela via que a gente assustava com ela: “Bonito, hein? Não tem probalidade um negócio desse!”. Depois que ela faleceu, anos depois, eu lembrando e falei: “Pera aí”, peguei o dicionário e fui olhar, até então a gente olhava que era uma colocação que não era correta. Depois que ela faleceu eu peguei o dicionário e fui olhar, pra despertar a curiosidade, e eu vi, realmente era correto porque probalidade é o mesmo que possibilidade, não é possível, não tem probalidade, não é possível, não tem possibilidade. Totalmente correto. Mas por ela ser analfabeta a gente achava que estava errado. Não quer acionar, ok, mãe. Mas depois que ela faleceu, eu tive essa curiosidade e fui observar, realmente, totalmente correto (risos). E ela mandava a gente nos vizinhos pra dar algum recado, que às vezes recado você passa pro mensageiro, ele distorce a conversa, às vezes gera até confusão, o mal-entendido. Ela passava o recado pra gente e no final ela comentava: “Se eu soubesse ler e escrever, não mandava recado”, pra não ter erro, né? Era tudo no manuscrito. Ela tinha esse sentimento de não ter tido oportunidade de estudar. Mas era uma pessoa muito inteligente. A começar do trabalho que ela fazia de costura, de fiar, tecer, costurar, realmente muito inteligente. Faleceu com 56 anos. O meu pai, um ano e sete meses depois veio a falecer também, sentiu muito a falta um do outro, morreu com 62 anos também. Analisando, novo ainda, né? Então a história é essa daí.
P/1 – E o que vocês aprontavam? Esses irmãos.
R – Menino! Não pergunta isso porque a confusão era grande, viu? (risos). A confusãozinha tinha, com certeza, a meninada tudo junto lá, de repente tem as arengas, mas em termos de diversão a gente inventava e fazia a coisa acontecer. As ferramentas eram faca, furava era com ferro quente. O velho tinha as ferramentas dele, mas privava a gente de usar, mas a gente inventava. Fazia carrinho de boi, fazia caminhãozinho, usava as frutas pra poder usar como peça de acessório. A exemplo, os caminhãozinhos, a gente usava uma fruta que chama jangada, ela é uma árvore da folha larga e ela dá uma fruta no formato de um pneu de carro, ela é redonda, achatada, bem a forma de um pneu. Aí a gente furava ela no centro pra colocar o eixinho e fazia os caminhãozinhos, a armação de cana de milho, pé de milho. O pé de milho a gente usava pra fazer esses caminhõezinhos e fazia também cavalo de pau. Os cavalinhos de pau tudo tinha crina, tudo na íntegra; os carros de boi era tudo feito na íntegra, tinha as canguinhas tudo moldado, o canzil, os cambãozinho, que a gente chama de tiradeira ou cambão pra emendar uma junta de boi na outra. A gente usava uma fruta, que é uma árvore do cerrado que chama pau-santo. Essa dá uma fruta alongada em formato triangular, ela dá três quinas, são três lados iguais tipo um triângulo e ela é alongada. Também a gente usava pra poder armar como boi no carro, ou então sabugo do milho, também a gente usava pra poder fazer os bois. E fazia a coisa acontecer. As pessoas olhavam e se impressionavam. Às vezes a gente vendia, fazia outros, aí ia pro meio do cerrado lá, cada um escolhia uma árvore que tinha uma sombra gostosa, aí montava: “Aqui é a minha fazenda”, o outro tinha a fazenda lá. Aí tinha os encontros dos carros de boi, os encontros dos cavalos de pau e por aí seguia (risos). Muito bom, bons tempos (risos).
P/2 – E como era essa casa no sítio? Como que ela acolhia os seus irmãos?
R – Ah, a casa do sítio lá, como era uma molequeira grande, tinha que ter espaço pra todo mundo, a casa era bem grandona. Mas as camas lá, às vezes dormia até dois, três numa cama só, mas se ajeitava lá e dormia. Um dia rusgava, outro dia estava de bem, se abraçava (risos). Graças a Deus, foi um tempo muito bom, a convivência muito bacana. Os velhos muito rígidos, natureza totalmente adversa um do outro, o meu pai e minha mãe. Meu pai era muito rígido com a gente, a gente não tinha liberdade com ele, era: “Sim, senhor”, “Não, senhor”, pronto e acabou. A gente não tinha direito de errar, o mínimo que a gente aprontasse que ele entendesse que estava errado não tinha conselho não, a gente apanhava era com meada de laço, era cabresto que é de pôr na cabeça do cavalo, era cipó. E adverso, a minha mãe, era totalmente meiga, sensível, uma pessoa 100% saudável, compreensiva. Às vezes, ela tinha que interferir porque senão, realmente, ele ia ao extremo com a gente e ela ia amenizando. Ela não, era tranquila, conversava e tal, muito tranquila. Agora, o velho era mais duro com a gente, mais exigente. Uma situação interessante que eu não entendi que com a gente ele era muito curto e grosso, era a voz dele e pronto, a gente não tinha direito de responder. E já a relação entre ele e a minha mãe, a voz ativa era a dela. Porquê, eu não sei. Aconteceu uma história, depois que eu saí de casa, porque na medida que foram crescendo, cada um foi saindo, foi seguindo seu rumo e foram restringindo [ficando] os dois e as irmãs mais novas. Aí eu sendo, dos homens, o mais novo, o caçula dos homens, eu saí por último. E aí aconteceu que um belo dia eu cheguei na fazenda e, a sós com a minha mãe: “Ah, seu pai não está falando comigo, está isso, isso e assim”. Aí quando eu fiquei a sós com ele, ele veio queixar: “Ah, sua mãe não conversa comigo” e ficou aquele negócio: um reclama de um lado, o outro reclama do outro. E eu sempre servi de ponte na família, pra ligar um com o outro. A exemplo dos irmãos, até certo tempo, um não falava com o outro. Quando tinha qualquer necessidade, eu que era o mensageiro, o intermediário, a ponte de ligação, então eu sempre tive essa liberdade com todos eles, irmão, sobrinho, tios, eu sempre tive essa liberdade. E entre os velhos também eu tinha essa mesma liberdade, né? Então, quando foi a segunda vez que eu voltei lá na fazenda, e ouvi a mesma queixa tanto de um lado como de outro, eu não opinava, ficava neutro. Aí quando foi a última vez, eu armei a minha e deu certinho. Pra eu voltar pra cidade, eu andava seis quilômetros pra ir pra uma parada de ônibus, pra pegar o ônibus. Aí ouvi as queixas e quando foi na hora de ir embora eu intimei os dois: “Ó, os dois me levam na parada de ônibus”. Aí fomos. Eu fui no meio dos dois, puxando assunto, de pingue pongue. E pra voltar tinham que voltar os dois, andar seis quilômetros sem trocar uma conversa? Aí foi a gota d´água, deu certinho. Ninguém entendeu o porquê desse negócio de um ter pendurado o bico com o outro, como se diz. Pouco tempo, eu conversando com uma irmã, que ela me contou uma coisa que dá pra gente tentar entender e ligar uma coisa com a outra, né? Porque até então eles criaram esses 14 filhos, sem não dar exemplo de discussão em voz alta, quanto mais briga, quebra pau dentro de casa. Não teve. A exemplo eu perguntava pra minha irmã mais velha, porque eu tenho sobrinhos três anos só mais novo do que eu. Eu amamentei na minha irmã, ela dava muito leite, represava muito, às vezes, o filho mamava e o seio continuava cheio ainda, aí eu era bitelão, até três anos de idade eu mamei – eu tive três mães de leite, eu mamava na minha mãe, na minha irmã mais velha e numa tia. A tia porque tinha só dois filhos homens e queria mais. Ela chegava: “Julieta, você tem sete, Davi é meu, Davi é meu”. E me paparicava, me punha no seio, me amamentava e eu cresci até três anos de idade um bezerrão mamando em três mães (risos). E aí, deu um colapso, eu estava falando de...
P/2 – Do que tinha acontecido com seus pais quando eles ficaram sem se falar.
R – Isso. Correto. Então, eu conversava muito com essa irmã porque eu mais novo, ela mais velha... Eu perguntava pra ela como era a relação deles, se tinha desentendimento, se tinha. Não, nunca teve. Se teve, eles souberam acobertar da gente, sem a gente presenciar. Confusão entre eles dois lá, pai e mãe, a gente não teve esse exemplo dentro de casa. Talvez seja um dos motivos que eu estou solteiro até hoje, porque eu vejo umas convivências aos trancos e barrancos, um dia bem e outro dia também, dia sim, dia não, então, não encaixa na minha mente. Mas está bom assim, agradeço a Deus por tudo.
P/2 – E como era na hora das refeições com toda a família junta, também com a questão das facilidades, quer dizer, não tinha luz, como é que fazia quando escurecia?
R – Lá na fazenda realmente não tinha energia. Antigamente era tudo na lamparina ou lampião. Na lamparina usava querosene, aí eram as lamparinas em cima da mesa. Na hora da gente fazer o dever de casa, que estudava pra fazer o dever de casa tinha uma mesona grande. Na sala grande tinha uma mesona grandona, a gente punha umas duas lamparinas lá em cima pra dividir com os que estavam usando a mesa. Mas era interessante, na hora de comer não tinha aquela mesona pra todo mundo e cada um pegava seu pratinho, sentava lá no seu canto lá e a coisa acontecia (risos), o britador funcionava (risos).
PAUSA
P/1 – E havia alguma criação de animais, plantação nessa fazenda?
R – Lá tinha lavoura, plantação de subsistência porque alimentava do que plantava e colhia, né? Então não era plantio pra comercialização, era só mesmo pra subsistência, pro consumo doméstico. Tinha o quintal de plantação, mandioca, outros derivados da lavoura, além do milho e o feijão. E nos intervalos que não tinha o serviço na lavoura, ele [o pai] trabalhava, prestava mão de obra terceirizada pra outros fazendeiros lá que sempre procuravam. Tinha cliente que ficava esperando um ano, dois anos, ou até mais, ele terminar de um pra passar pro outro, no caso de construir as propriedades, as sedes nas fazendas, né? Como ele era conhecido, bastante requisitado, as pessoas esperavam pra não perder a oportunidade, não abria a mão pra outro, tinha que ser ele porque ele era muito exigente. Tanto que eu sou visto como perfeccionista porque eu tive onde herdar isso, primeiro dentro de casa, no tempo da companhia do meu pai, as exigências dele. Ele determinava pra gente uma tarefa, terminei: “Eu vou lá ver”. Ele olhava e se não estivesse do jeito dele: “Pode desmanchar e fazer de novo”. Desmanchava, fazia. Terminou. Voltava. Se não estivesse do agrado: “Pode desfazer de novo, não tá bom, não”. Se mandasse desmanchar dez vezes, tinha que voltar atrás dez vezes. Enquanto não saísse do jeito dele, não aceitava. Quando eu saí da companhia dele e fui pra cidade pra ter a oportunidade de aprender a trabalhar, caí nas garras de outra pessoa, ou seja, o dono da marcenaria, que me exigia mais do que meu próprio pai. Muito perfeccionista, muito exigente. Mas graças a Deus, hoje eu colho o fruto disso aí que me faz muito bem. Ser responsável, ser zeloso e zelar pelo que se faz, faço com muito gosto. Tanto que há exemplo dentro da marcenaria, como são várias especificações, tem uns que especifica: “Eu só quero trabalhar com planejado”, outro: “Quero trabalhar só com torno”, o outro que trabalhar só com madeira maciça. Eu aprendi a clínica geral, então trabalho também com restauração porque um “consertozinho” qualquer um faz, agora a restauração autêntica de antiguidade não é qualquer um. Primeiro, tem que gostar e, segundo, ser habilidoso, ter habilidade. Então eu não questiono: “Ah, eu não gosto disso, não gosto daquilo”. Tanto que tem cliente que quando me procura, às vezes não me conhece, já chega, já entra dando risada. “O que foi?” “Brasil, já andei a cidade inteira, a mesma ladainha, Davi Brasil, Davi Brasil”. Às vezes é um rabisco lá pra você entender, interpretar o que o cliente quer, às vezes é um projeto autêntico pra você executar, às vezes, é um pedaço de uma peça pra você fazer, reproduzir outra, né? Eu não vejo dificuldade. Mas eu entendo o seguinte: tem coisa que não é questão da dificuldade, é questão da disponibilidade, de boa vontade de querer servir o cliente. Às vezes, é serviço que eu nunca fiz, nunca imaginei fazer, mas se eu analiso e percebo que é pra mim, eu assumo com responsabilidade, sabendo do resultado positivo. Uma vez que eu vejo que não é pra mim, eu não me comprometo pra poder me aventurar, procuro indicar o cliente para outra pessoa, já oriento: “Tem picaretagem, tem casos que tem as picaretagens, toma cuidado, o certo é Fulano”, dou o endereço certinho. Resumindo a conversa: as pessoas viram perguntam: “Brasil, você não é de Paracatu, é?” “Não, mas por quê?” “O seu vocabulário é diferente dos outros, você não tenta iludir” “Não, eu aprendi assim, procuro preservar assim”.
P/1 – E a época da escola? Quando criança vocês iam à escola?
R – A época da escola foi boa, muito boa. Até eu tenho muitas boas recordações do meu tempo de estudo lá no meio do mato onde a gente foi criado. O grupo de roça, quando eu terminei, tradicionalmente falando, a professora foi na minha casa pedir a minha mãe para não deixar eu parar de estudar. Quando os outros mais velhos completaram o grupo lá na época, não quiseram mais continuar a estudar. Na minha oportunidade, a professora foi na minha casa pra falar pra minha mãe e incentivar a minha mãe a não me deixar parar de estudar. Nessa altura, a minha mãe já conversava comigo, se eu quisesse continuar ela ia providenciar para eu vir pra cidade aprender e assim aconteceu: eu vim pra cidade. Na época do grupo eu tinha meus privilégios. Só tinha um aluno concorrente comigo dentro da sala e a professora muito bacana, pra incentivar, nem que fosse um lápis ou uma borracha, mas tudo o que dava valendo ponto, que era pontuação: “Primeiro lugar, vai ganhar um presente, uma prenda”. Aí já tinha aquela gozação: “Ah, pode entregar pra Davi, pode entregar pra Davi”. Mas não era só Davi que era o gênio da turma não, tinha um outro até interessante, filho de cigano, ele tinha uma deficiência, esse osso aqui na frente, ele não tinha esse osso aqui não. Ele falava, já viu sapo quando ele está respirando, que tem um tipo um diafragma que faz isso? Bem parecido. Mas isso não interferiu na mente do cara, um cara muito inteligente, chamava Zeca. Deve chamar, não tenho notícia, mas creio que deve ser vivo ainda, chama Zé Carlos. E tinha um outro, Arlindo, eram os três. Disputávamos entre nós três, o primeiro lugar. Então foi muito bom. Aí eu vim pra cidade, quando cheguei na cidade, continuei tendo meus privilégios. Eu tenho vários certificados de melhor aluno do ano, de aluno exemplar, Brilhante Participação, até de Brilhante Participação eu ganhei esse certificado da diretora em 1982. Em 1982, houve uma feira de ciências no estado de Minas Gerais. Todo estado de Minas Gerais participando dessa feira de ciências. E o procedimento era o seguinte: a cidade inteira participava com os trabalhos, invenções e eram selecionados e escolhidos primeiro e segundo lugar de cada cidade pra ir pra final em Belo Horizonte. Eu não sei se é do conhecimento seus, Colégio Milton Campos, que é colégio e faculdade, dentro de Belo Horizonte, doutor Milton Campos, podem verificar. Esse trabalho nosso foi realizado lá nesse Milton Campos. Aí todas as cidades de Minas iam pra Belo Horizonte pra participar da final. Ô, que maravilha, cara! Até uma coisa que me deixou impressionada, de Uberaba [MG] dois moleques, os caras muito inteligentes, eles fabricaram um carrinho tipo um kart movido a sumo de laranja, porque o sumo da laranja é combustão, né? Chique. Além desse trabalho lá, muita coisa bonita, muita coisa interessante, realmente, que abre a mente da gente cada vez mais. E aí, na altura, de Paracatu foi classificado o meu trabalho e um outro, foram dois trabalhos de Paracatu participando lá. Foi muito bom. Aí no final a gente ganhou os certificados de Brilhante Participação dessa feira lá em 1982, em Belo Horizonte, foi muito bom o aprendizado, muito gostoso.
P/2 – Qual foi o seu invento?
R – A minha invenção? Na época foi aquele fuzuê na mídia em torno do casamento da princesa Diana e do príncipe Charles. Aí quando lançou o trabalho tinha que formar equipes. Aí formamos as equipes e o negócio estava meio em cima da data de apresentação. Aí eu imaginei fazer um aviãozinho, tipo um aeromodelo, mas como o tempo estava curto, nós reunimos e eu questionei com a turma: “Olha eu tenho a ideia do aviãozinho, só que o tempo está curto, a gente tem que fazer pesquisa de material, densidade de material, velocidade de motor, essa coisa toda, talvez não dê tempo. Mas eu tenho uma outra ideia que essa eu assumo e garanto” “O que é?”. Eu falei: “Nós vamos fazer um barquinho, pegar dois bonequinhos, vestir de noivo, coloca dentro e escreve Britânia reluzente, com brocal, pra poder ficar bem reluzente” “Você garante?” “Garanto”. Aí fui atrás do material pra botar em prática o invento. Eu arrumei um motorzinho de toca fita, testei a velocidade dele, deu certinho. Fiz a helicesinha pra colocar embaixo. Eu fiz uma caixinha bem delicada, coloquei o motorzinho dentro, todo vedado, ele aparecia por fora só a poliazinha, ela foi colocada no pilotinho da canoa, do barquinho, aí por fora saía uma correinha, pegava na outra poliazinha lá embaixo, na hélice, onde fazia girar. Aí fiz o barquinho mais ou menos uns 60 centímetros de comprimento, aí dentro dele eu fiz um suporte pra quatro pilhas, que era pra mover o motor. E aí, organizamos direitinho os bonequinhos lá dentro, o Charles e a Diana. Eu pintei ele com tinta à óleo, ele vedou as emendas, junções e ficou parecendo que era fibra. No dia do teste, nós fomos pra piscina. O pessoal tomando banho na piscina, piscina dando onda, a gente soltou o barquinho lá e ela ia, girava, parecendo filme. Aí todo mundo perguntando: “Quem fez, quem fez? Onde você comprou?” “Não, eu que fiz” “Você que fez?” “Duvido”. Aí foi classificado, foi pra Belo Horizonte e disputou lá, esse barquinho, minha invenção. A ideia veio da cabeça, não foi que eu vi no papel ou vi em qualquer lugar: “Não, vou copiar a ideia”. A ideia veio na cabeça, executou e deu certo, bacana.
P/1 – Nessa época você estava com quantos anos?
R – Os meus 18, 19 anos, bons tempos, quando ainda tinha, né? Agora, o vento levou, mas me conformo com isso (risos). Não faz falta, não, com certeza, é privilégio. Agradecendo a Deus, tanto que as pessoas questionam: “Brasil, se você nascer de novo você quer mudar alguma coisa?” “Não” “Vai ficar careca de novo” “Não, pode passar pelo mesmo processo, não tem problema” (risos). Uso chapéu porque gosto, não porque tenho complexo da calvície (risos).
P/1 – E quando criança, o que você pensava em ser quando crescesse?
R – Olha, quando criança eu tinha várias fantasias. Se eu tivesse levado os estudos mais a sério e me formado, eu teria feito zootecnia, veterinária ou agronomia, porque está ligado, mais ou menos, bem próximo do mesmo segmento, infiltração no meio rural, animais, esse tipo de coisa. Também cantor, que até hoje eu gosto de cantar uns modão, não levei a sério profissionalmente. Peão de rodeio é uma coisa que desde moleque eu sempre gostei, sempre admirei, de assistir rodeio, ver o bicho puxar lá e o peão segurar o negócio na espora lá, isso aí (risos). Montei, tomei muito tombo, montava em bezerro nas fazendas lá, segurava, tomava tombo, mas tudo era brincadeira e diversão, ficou saudade disso aí, viu? (risos). Eu tinha que ter nascido com uma esporinha no pé pra ser peão de rodeio, ou então a dedeirinha no dedo pra ser músico, né? Mas lamentavelmente eu machuquei dois dedos ainda quando eu estava aprendendo a profissão, aí dificultou pra tocar nas cordas e eu não aprendi a tocar. Mas canto. É até polêmico porque as pessoas veem eu pedir os tons, alguém que está tocando, as pessoas questionam: “Brasil, pega e toca” “Não toco” “Você toca” “Não toco” “Você toca, como você sabe tom?” “Eu não aprendi a tocar, mas aprendi a cantar. Você cantar fora do tom, é uma balança, é o ponto de equilíbrio, a coisa desanda” (risos). Mas eu gosto, sou apaixonado com a música.
P/2 – E se escutava muita música na sua casa?
R – Eu escutava muita música. É até interessante que as pessoas quando ouviam eu falar de música, ou até mesmo cantar, fala: “Cara, você deve ter um arsenal de discos”, antigamente eram discão, vinil. Nunca tive uma discoteca em casa, mas era mente ativa. A gente ouvia pelo rádio, era rádio, sempre ligado no radinho. A música que eu ouvisse e achasse interessante, bastava eu ouvir ela mais umas duas vezes. Não escrevia também não, o ouvido. Tanto que na época, até uma certa idade eu ouvia as pessoas questionarem: “Ah, eu sabia, eu esqueci”. Aí eu questionava: “Quem aprende, não esquece, não, isso é conversa”. Mas hoje, lamentavelmente, eu me dou conta disso porque o tempo realmente, o que não acaba, modifica, né? Realmente, o tempo faz a gente esquecer. Interessante que coisas que eu lembro, essa época que eu amamentava na minha tia, na minha mãe, eu lembro disso, eu tinha dois anos, três anos de idade eu lembro como se fosse hoje. Que quando a minha irmã mais velha ainda era viva, eu contava essas historinhas e as pessoas duvidavam, ela confirmava: “Não, ele lembra sim porque aconteceu do jeito que ele está contando”. Um fato que nunca saiu da minha mente, como era aquele tanto de menino e, o velho, a condição dele não era de trazer todo mundo na ordem, na íntegra, então pra facilitar nas roupas quando era minha mãe que fazia, ele ia na cidade, na loja, os armazéns antigamente, falava os fardos de pano, aí já comprava o fardo fechado, pra adiantar o lado dela, em vez de fazer tudo caracterizado, a camisinha com o shortezinho, ela abreviava. Até uns três anos de idade a gente usava, fazia uns jalecozinhos, tipo um vestidinho, pra gente ficar à vontade, usava aquilo lá. Até uns três, quatro anos de idade. Aí quando eu estava nessa idade, uns três anos, eu já tinha vergonha de usar essa encrenca do jalequinho, né? Tanto que tinha uma vizinha lá, também uma história parecida com a história da minha tia, que ela tinha acho que quatro ou cinco meninas, não tinha menino homem, e também vivia no pé da minha mãe pra dar eu pra ela. “Não, você tem sete, dá Davi pra mim”. E chegava lá e me paparicava, e me bajulava, levava pra casa dela. Isso o dia que ela chegava lá e eu estava de shortezinho, estava bem composto. Mas o dia que eu estava com jalequinho, que eu via que ela estava vindo lá na estrada, eu corria pro quarto e trancava. Aí ela chegava: “Cadê Davi?” “Está trancado no quarto” “Ah, mas por quê?” “Está com vergonha da senhora”. Aí ela fazia mil propostas pra mim abrir a porta e ela me ver, quem disse que eu abria? Abria não. Isso dois anos e meio, três anos de idade, não esqueço disso. E coisas mais recentes às vezes você passa batido, esquece. Na música, por exemplo, ontem mesmo a dupla que cantou comigo lá na festa da igreja de Santo Antônio, uma dupla já tradicional, a gente é entrosado, então, pediram a participação, a gente cantou lá. Aí a gente comentando, no final do show, sobre isso. Realmente, a gente esquece, hoje muita música que eu cantava na íntegra hoje eu já esqueço as letras. Então é o tempo, é a vida. Eu fico analisando o seguinte, vendo o conflito do ser humano, às vezes até consigo mesmo, de simplesmente não ter entendimento de que a vida da gente é uma sequência, eu entendo que a vida da gente é uma sequência de fases. Tem a fase da sua geração, tem a fase do seu nascimento, tem a fase do seu crescimento, tem a fase do seu amadurecimento, eu penso assim, e creio. A exemplo da calvície, nunca me preocupou porque quando eu tinha cabelo, eu tinha um cabelo que até os homens admiravam, elogiavam meu cabelo, deixava ele crescer. Vou mostrar uma foto, ficou lá, uma foto bem... vou te mostrar lá em casa, você não vai acreditar no cabelão que eu tinha. E era bonito! Hoje já estou carequinha, já estou barrigudinho, mas já tive um corpinho de manequim que deixava as molequinhas com o olho aceso, né? Então eu entendo que tudo isso são as fases. O implante por exemplo, tem um tratamento no Paraná, eles mostram o antes e o depois. Isso há uns dez anos atrás quando lançou esse tratamento lá no Paraná. Um colega pagava pra mim até as despesas de estrada para eu fazer, pagava todo o tratamento, custava na época oito mil reais. “Cara, deixa de ser besta, vai lá fazer, muda seu visual”. Eu falei: “Não, não quero mudar meu visual, sou muito satisfeito com o que eu sou e agradeço a Deus todos os dias pelo que sou e pelo que vivo, então não quero mudar não. É a realidade, não quero fugir da realidade” “Ah, você vai nascer de novo, quer mudar?” “Não” “Vai ficar careca de novo” “Tranquilo, sem problema. Sou conformado com a realidade”.
P/1 – E nessa mudança de fase, você morava na fazenda com os pais e como foi ir pra cidade?
R – Olha, o mais difícil foi separar da minha mãe, né? Foi separar da minha mãe porque era uma ligação muito forte com a minha mãe, tanto que tinha esse conflito dentro de casa, pras irmãs, eu era o melhor irmão, pra minha mãe, eu era o melhor filho, pras tias, eu era o melhor sobrinho, e gerava essa encrenca, essa confusão. Porque dentro de casa os irmãos cobravam: “Ah, que a senhora trata Davi como o melhor filho”. Mas só que os abençoados não prestavam atenção que se ela me tratava diferente porque o meu tratamento com ela era diferente, isso desde criança, quando eu comecei a definir as coisas; por exemplo, se eu fosse no vizinho e me desse um biscoito, tivesse como partir, não era eu que partia e dava pra ela o pedaço, eu recebia: “Ó mãe, eu ganhei”. Ela que dividia comigo. Os outros não tinham, quer dizer, se eu prestava essa atenção, ela correspondia, né? Eles observavam e cobravam. Só que a minha atenção era diferente, né? Então, a gente era muito apegado. E quando foi pra vir pra cidade, o apego mais foi ela. Ela ficou toda contente, toda feliz, até acontecer um fato interessante na família, o ditado que se diz, a ironia do destino. A gente foi visitar uma das irmãs, que na época já era casada e mãe de dois filhos. E ela toda contente foi contar pra minha irmã: “Davi vai pra cidade, vai continuar a estudar, professora pediu pra não deixar ele parar e tal”. Ela ironicamente virou pra minha mãe e falou: “É, vai deixar ele ir pra cidade pra virar marginal, virar moleque da rua”. Como eu já disse pra vocês, da humildade da minha mãe, ela não teve palavras pra responder. Mas foi o mesmo que você perceber uma faca cravando no peito, né? E, no dia de eu sair, ela fez minha mochilinha, quando eu pus a mochilinha nas costas pra me despedir, ela me abraçou, chorando e falou: “Ó meu filho, vá e faça o possível pra você ser uma pessoa e mostrar pras pessoas que não acreditam em você que você é capaz, que você é diferente”. Nunca esqueço isso vai fazer 40 anos já que eu perdi minha mãe, eu nunca esqueço desse conselho dela. Quer dizer, já se passaram 40 anos, mas pode passar 400 anos, eu não esqueço das palavras dela. É até interessante a ciumeira dela comigo. Isso eu vim pra cidade, fui morar na casa de um parente, onde tinha um outro molequinho da mesma idade, primo. E logo o cara começou a ficar de marcação comigo. Eu estava na volta da tarde, o colégio era longe, aí andava bastante, chegava em casa já à noite. Quando eu chegava, já era tirado e guardado lá no fogão a minha marmitinha de comida. Aí quando foi um dia, ainda bem que na sexta-feira, logo na sexta, eu cheguei, sentei na mesa, estou jantando, ele sentou do lado. Na hora que eu terminei de comer, ele virou pra mim: “É, nós não temos fábrica de comida aqui não”. Não respondi, não questionei. No outro dia, no sábado, vazei pra roça. Aí cheguei lá, contei à minha mãe a piadinha. Você acha que na segunda-feira que eu tinha que voltar eu voltei pra mesma casa? Voltei pra outra casa. Ela já ajeitou outro local para eu ficar. E a exemplo, nessa outra casa também tinha problema. Só que o dono da marcenaria onde eu estava aprendendo a trabalhar tinha dois filhos um mais velho que eu e outro mais novo e eu no meio dos dois. E logo eles fizeram amizade comigo, criaram aquele aconchego comigo. E o mais novo principalmente, chama Euler. O Euler é mais prestativo. O dia que ele via que eu não estava bem ele chegava: “Davi, você não está legal, o que está acontecendo?”. Eu comecei a me abrir com ele, né? Aí ele falou: “Você vai morar lá em casa com a gente, vai sair da casa do seu parente”. Aí chamou os dois, chamou o velho: “Pai, o Davi tá passando por dificuldade lá onde está ficando, você podia deixar ele morar com a gente lá, a casa é grande”. Ele falou: “Quanto a mim não tem problema, não, sua mãe que vai decidir isso”. Uma pessoa de um coração de um tamanho que eu tenho um apreço muito grande, chama Dorci, conhecida por Maninha, é viva ainda. O velhinho faleceu há pouco tempo, mas ela é viva ainda, minha segunda mãe. Então lá eu passei por coisas que eu não podia chegar lá em casa e contar porque se eu contasse minha mãe me tirava de lá, até eu de vez em quando o velho arengava com ela, com a mãe dos meninos. Teve um dia mesmo que ele avançou nela pra pode agredir ela, eu atravessei, ele me deu uma porretada, uma paulada. Quando eu machuquei os dedos aqui, ó. Isso aqui sangrou muito, pegou esses dois dedos aqui. Eu deitado em cima de umas pranchas lá fora do barracão, amarelinho, da cor de uma flor de algodão, e sangue ó. Ele estava pra rua, quando chegou que entrou, aí um dos meninos falou: “Ó pai, Davi machucou” “Cadê ele?” “Tá lá atrás do barracão”. Chegou, me olhou de longe: “Seu estúpido, vai lá e passa o pescoço, não aprende a trabalhar mais? Se fosse meu filho ia tomar uns tapas pra aprender”. Desse jeito. Isso eu não contava lá em casa não, porque se contasse minha mãe me tirava sem pensar duas vezes, era uma ciumeira. Então, o que pesou mais essa saída de casa foi exatamente esse desligamento temporário da minha mãe. Mas sempre que dava a gente estava junto. E, lamentavelmente, o filho que ela era mais ligado era eu, quando ela veio a falecer o único que não viu ela... Ela foi sepultada sem eu ver. Porque na época eu tinha ido pra Brasília, recente, aí eles não tinham endereço meu pra comunicar comigo. Fiquei sabendo no dia que ela foi sepultada. Eu tinha um outro irmão que trabalhava na região aqui, na Sexta-Feira Santa, era a data do ano que coincidia de reunir quase toda a família, às vezes ficava faltando um, dois, mas era data de reunir todo mundo. E aí eu vim de Brasília pra Paracatu pra daqui ir pra Unaí, lá pra fazenda. Só que pela primeira vez a viação parou, a empresa parou o transporte no dia da sexta-feira santa, aí eu fiquei preso aqui sem poder ir. Na tardezinha, esse irmão meu, que sempre a gente ia junto, a gente encontrava que ia junto, ele veio de lá pra cá. Quando, eu estava na casa de uma tia, que ele foi entrando no portão eu falei: “Uai, você não foi lá pra casa?”. Ele falou: “Fui”, assim na hora. Ele falou: “Eu ia, aí nós sepultamos a mãe lá em Unaí hoje e eu estou voltando”. Eu falei: “O quê?”. Ele falou: “Mamãe foi sepultada hoje”. Assim. Aí o mundo desabou. Mas o tempo passa e é o tempo às vezes o melhor remédio pra determinada situação, e passou. Eu não sou de frequentar a sepultura dela, até pessoas interpretam: “Ah, porque você é frustrado, você não gostava da sua mãe”. Pelo contrário. A minha preocupação é de bater desespero. Eu carrego ela no coração, mas ir em sepultura dela, de pessoa nenhuma. Por exemplo, se você está aqui na minha frente, eu admiro você, o que eu tenho que falar pra você, demonstrar, eu procuro fazer enquanto é tempo pra você perceber o que é que realmente eu signifiquei pra você ou significo. A exemplo de um velório de família, aí veio uma mocinha, uma prima, se abraçou comigo toda sentida e falou: “Primo, era o meu tio e o meu padrinho, eu amava tanto ele e nunca disse isso pra ele”. Eu falei: “Pois é, passou da hora”. Então, faça enquanto é tempo, porque se eu não demonstro a você a minha afinidade com você como você vai adivinhar pra você tentar corresponder isso comigo? Então, o momento é hoje, é agora, faça o que você pode fazer pra não lamentar depois, né? Devia, devia, mas acovardou, não fez. Eu penso da seguinte forma, eu acho que é mais válido você lamentar: “Não deu certo, mas eu tentei, eu tentei e não deu certo”, do que: “Ah, eu pensei, eu pensei”. Pensou, mas não expôs, não demonstrou. Tanto que quando eu tinha funcionário, primeiro dia de serviço eu sentava, conversava e deixava bem claro isso: a liberdade de exposição, de expressão, a harmonia no ambiente de trabalho, o dia que não tiver bem pode chegar e acionar, eu abono o dia, é melhor do que eu pagar um dia pra você do que você ficar dentro da empresa mal humorado, de repente outro colega não sabe o que está acontecendo e vem, às vezes, com uma brincadeira, toma mal a resposta, gera constrangimento ou até mesmo briga e talvez até prejuízo. Então é harmonia. E a ideia não é porque eu sou patrão que eu sou o dono da verdade. Eu posso passar pra você o serviço e a ideia, mas se você tiver qualquer ideia exponha a sua ideia, de repente, pode ser mais interessante do que a minha. Ou se não é mais interessante do que a minha, às vezes, juntando duas gera uma terceira importante, interessante. Então eu sempre cobrei isso. Nesse ponto de vista aí, até eu sou diferente da mania, que a maioria tem a mania, e às vezes é de duvidar da capacidade do outro, né? Eu às vezes tento impor: “Não, se eu faço, você também tem que dar conta de fazer” (risos). Eu insisto no positivo, não no negativo. Eu penso assim, então eu acho que é mais válido você lamentar. Não deu certo mas eu tentei, do que: “Ah, eu pensei, eu pensei”. Pensou, mas não agiu, se acovardou, então eu penso assim.
P/1 – E nessa época que você veio da fazenda pra cidade você estudava, trabalhava e como foi essa ida pra Brasília, quando foi?
R – Olha, a ida pra Brasília foi mais ou menos em meado de 1982. Eu cheguei em Paracatu no finalzinho de 1979 e em 1982 eu tive uma proposta. Na verdade, eu fui pra Brasília pra prestar um socorro. Tinha um funcionário já de bastante tempo de empresa na Embaixada do Canadá, em Brasília. Aí eu tinha um primo que trabalhava na época lá, e tinha que cobrir a vaga desse profissional, dois meses, aí me ligaram convidando ir pra lá pra cobrir a vaga desse outro. Eu fui cobrir essa vaga e achei por bem ficar por lá. Dei um tempo lá, fiquei mais ou menos um ano, depois, retornei pra Paracatu. E em Paracatu eu estou até hoje. Mas proposta de trabalho tem várias, tem proposta pra ir... Tem trabalho meu na Nicarágua. Aqui em Paracatu, nós temos um médico nicaraguense, o doutor Calderon. Tem trabalho meu na Itália, Goiânia tem uma rede de instalação bancária, só montagem de banco, né? Qualquer hora que eu quiser ir, tenho convite aberto pra tomar conta de turma. Belo Horizonte tem um aqui que é construtor lá, constrói prédios, só pra acompanhar, fabricar móveis pros prédios. E também um outro trabalho com casa pré-moldada, só pra acompanhar a turma. Então por várias propostas. Na Nicarágua, foi o seguinte, a mãe do doutor Calderon veio passear em Paracatu, ficou uns dias com ele e, nesse meio tempo, ela acabou falecendo aqui em Paracatu. E tem o tempo, não sei se três ou quatro anos, pra exumação, um negócio assim. Sei que lá, eles são muito exigentes, tem que cumprir na íntegra os trâmites legais. E deu o tempo e pra fazer o traslado – exumar e fazer o traslado – tem uma norma muito rígida. Vem de lá o projeto, então é feito, faz a exumação dos restos mortais, é feita uma caixa, colocada dentro dessa caixa, essa caixa é colocada dentro de uma outra caixa, dentro de uma outra caixa final, toda trabalhada, que eles mandam o projeto. Inclusive tem o símbolo deles lá, é um gorrinho, o símbolo em cima dessa caixa. Eu fiz esse trabalho na íntegra. Aí chega lá é feito o cortejo como se a pessoa tivesse morrido um dia antes, que normalmente é de um dia pro outro. E nas alfândegas, todas que passava que via: “Quem fez isso, onde fez isso?” “No Brasil” “Ah, quem?” “Davi”. Aí quando chegou lá, que o governo tomou conhecimento, aí fizeram os elogios e mandou um convite pra mim. Aí ele chegou, foi parabenizar mais uma vez pelo trabalho e fazer o convite: “Olha, Davi, qualquer hora que você quiser ir embora pra Nicarágua, pessoal igual você lá é privilegiada, lá filho seu não paga colégio, não paga estudo, não tem aluguel pra você, é tudo por conta do governo. E tem seu salário, o governo que paga”. Eles falam de artesãos, escultores. Então, qualquer hora que eu cismar em ir pra lá eu tenho esse apoio pelo governo, o governo paga tudo. Eu falei Itália? Itália ou França? É na Itália, um italiano que tinha uma fazenda aqui. Esse da Nicarágua, [eles] trouxeram o projeto, eu trabalhei em cima do projeto, agora esse da Itália foi uma invenção. O cara ganhou um cristal, comprido, tipo uma vela, todo lapidado, cheio de raiozinhos, aí ele queria fazer esse cristal acender. Aí alguém falou: “Davi faz isso pra você”, ele me procurou. Ele falou: “Brasil, eu quero fazer esse cristal acender”. A experiência, aí eu olhei, analisei e falei: “Olha, isso aqui pra acender total eu teria que broquear ele por dentro para eu jogar um flash de luz dentro dele pra entrar, abrir e expandir pra ele acender todinho, porque ele maciço aqui pode reluzir embaixo, mas não vai acender todo” “Não, mas faz assim mesmo”. Eu peguei e fiz tipo um abajurzinho, torneei uma peça de madeira, broqueei ela por dentro pra colocar uma lâmpada lá dentro e aí fiz um cônico, pintei com tinta alumínio pra fechar o flash da lâmpada, fechar aqui no cone e sair centrado nele, né? Aí montei, fiz a ligação, instalação elétrica. Aí tinha duas peças e tinha um encaixe. A lâmpada instalada lá dentro e você encaixava tipo a tampa de um liquidificador, encaixava, torcia e ela travava. Aí virava um abajur. E você ligava. Quando eu liguei esse bicho à noite não precisou de broquear não, ele acendeu todinho! Coisa mais linda do mundo! Mas todo mundo que via essa peça apaixonava com a peça, aí ele levou pra Itália (risos). Eu gosto de desafio.
P/1 – E durante a juventude, o que você fazia pra se divertir?
R – Olha, durante a minha juventude as minhas diversões eram mais ou menos limitadas, eu nunca fui de muita badalação, sempre amei estar no meio de pessoas, mas quando causa tumulto, não. Tanto que há, exemplo, algumas festas famosas de rodeio que eu gosto, mas eu não tenho vontade de ir. Festa do Barreto, aqui próximo a Paracatu, a Fenamilho. Eu vejo as pessoas comentarem, o tumulto é muito grande, tem hora que você suspende o pé, quando quer abaixar de novo já não tem lugar mais. E dizem que as pessoas fazem gracinha, joga laço nas pessoas, você está com sua namorada, o cara vem e joga laço. De repente, sujeito a confusão e encrenca, né? Eu sempre procurei preservar esse lado aí e não infiltrar. Então, na época da minha juventude, não era muito de balada, era as festinhas mais tranquilas. Quando eu vim pra Paracatu, na época, 17 pra 18 anos, eu estranhei muito porque lá na minha cidade a tradição era essa, antigamente falava hora dançante. Não tinha rede social, então tecia no colégio: “Ó, sábado que vem vai ter”, falava hora dançante. “Sábado que vem vai ter hora dançante na casa de Fulano”, ficava todo mundo ligado. Aí quando chegava no sábado, que a curtição era só no sábado, [estava] todo mundo no endereço marcado. Se a festa estivesse boa, ficava acomodado, se não estivesse agradando, aí de repente chega alguém com uma ideia: “Ó, na casa de Fulano também tem, bora pra lá?”. Aí já largava e ia pra lá. Tinha essas opções, mas uma coisa sadia, bem tranquila. Coisa de dança lenta, coladinho rosto no rosto. Tinha a discoteca também que dançava sozinho, aquele negócio bem chamegado, né? (risos), época da discoteca. Quando eu vim pra Paracatu, aqui era totalmente diferente, não tinha esse negócio em casa mais, era na rua, tinha as casas noturnas na rua, né? Onde tinha ali a Rua Goiás nessa época de noite nem transitava carro ali, não, aquilo era lotado. Tinha casa noturna de um lado, de outro. Com o tempo, foi fechando, modificando. A concentração noturna foi espalhando mais pela cidade, mas era por ali. E era diferente lá da minha cidade, não tinha essas coisas das festinhas nas casas, não, era mais isolado. Aí eu estranhei. Mas era bom. Turma, eu nunca gostei de turma, tanto que quando voltando lá atrás, que eu falei dessa minha irmã, que eu ia virar moleque da rua, que eu ia virar marginal, interessante que ela veio a ter dois filhos na mesma sequência, ela tinha uma menina e um menino, depois ela teve mais uma menina e um outro menino sendo o caçula, como se diz, a história da praga, de rogar praga, se foi uma pra mim, lamentavelmente bateu e voltou. [O filho dela] estava lá com seus 15, 16 anos, fiquei sabendo das histórias, fui, busquei, coloquei dentro da minha casa, do trabalho, fui ensinar a trabalhar, aí quando eu vi que, lamentavelmente, estava sendo impossível eu pus no carro, levei e falei: “Lamentavelmente, se a gente for insistir vai arrumar encrenca e confusão, porque não adianta eu tentar enfiar na cabeça dele o que ele não quer”. Já estava nas drogas, estava perdido. E logo depois ela veio a falecer. Quando chegou na beira da sepultura, que eu fui olhar: “Pode voltar com ela pra capela, ela não está em condição de ser sepultada, não” “Ah, mas tá na hora”. Eu falei: “Não. Pode estar na hora, mas não está passando da hora. Dois pontos que não está passando da hora: tenho um irmão que está vindo, ele está na estrada, vindo pra ver ela. E ela não está em condição de ser sepultada, não, pode voltar com ela pra capela”. Aí não teimaram, não, voltou pra capela. Peguei o carro, fui numa loja e comprei roupa, passei na floricultura, comprei flor, o que tinha lá, tinha pouca coisa. Aí por sorte, saindo da floricultura, um jardim na frente de uma casa, flor que era à vontade. E a dona estava lá cuidando. Eu parei, cumprimentei e falei: “Moça, a gente está com pouco pra ajeitar pra sepultar e, lamentavelmente, eu fui na floricultura aqui do lado e não tem muita coisa. A senhora não me vende...” “Meu filho, entre e apanhe o que você der conta” “Não, quanto que é?” “Apanhe o que você der conta e vai embora”. Aí enchi o carro de flor lá, que chegou e ajeitou direitinho, que sepultou. Dias depois eu encontro com esse sobrinho, que estava no mau caminho, que ele já tinha me ligado várias vezes querendo voltar comigo e eu tendo mão nele pra quebrar a cabeça pra poder aprender. E nessa altura ele já queria saber como é que ia fazer pra tira documento. “Ah, eu perdi”. Perdeu, mentira. Aí eu fui passar a limpo, estava tudo preso, pagando dívida. Aí quando foi esse dia que eu fui atrás dele, que nós fomos lá pagar as dívidas pra liberar os documentos dele, que ele também não presenciou o sepultamento da mãe, né? Aí ele veio e falou: “Ah tio, eu fiquei sabendo que se não fosse o senhor arrumar minha mãe, ela tinha sido enterrada como indigente”. Eu falei: “Foi, a situação” “Pois é, meu pai agiu dessa forma e agora está aí com namorada, mandando buquê de flor pra ela todo dia”. Eu falei: “Olha, meu filho, se alguém tem que pagar é quem erra. Se pra você está errado isso e tem que pagar, é ele que vai pagar, não vai arenga com seu pai, criar caso com ele por causa disso não. Segue o seu caminho e deixa ele na dele, lá. Eu fiz o que era o meu dever de fazer, fiz, não tem nada que pese, não, então, ela está em bom lugar, com certeza”. E esse moleque está lá em Brasília. Tem uma esposa lá, ela que fica tendo mão na situação, mas de vez em quando dá umas recaídas. Agora como passei por esse exemplo aí, então eu já tinha convicção formada: o mundo da perdição, eu conheço muita porcaria na palma da mão, mas sempre tive minha convicção formada de que não vale a pena. Então, já tive na palma da mão, já tive na mesa, mas nunca coloquei na boca ou nunca cheirei nada porque tenho minha consciência de que é uma experiência que não vale a pena, então pra quê? Graças a Deus, Deus tem me sustentado no caminho do bem (risos), que tem hora que eu fico surpreso comigo mesmo, assim como muitas pessoas admiram o meu lado bom, o lado do bem, fica assim deduzindo se eu tivesse pendido pro lado do mal, eu acho que eu tinha muito mais inteligência do que pro lado do bem. Mas ainda bem, graças a Deus, Deus me sustentou pelo lado do bem, pelo bom caminho. Então, não fui de enturmar porque na época da adolescência tem aquela empolgação, junta as turminhas e aí já sai com ar de confusão: “Hoje a gente seca o bagaço”, né? Então, turminha minha era no máximo dois, três e na hora de sair eu já cantava a pedra: “Ó, confusão, se achar, estamos junto. Agora, se procurou, tô fora, não conta comigo, não, me esquece”. Era desse jeito. Tanto que quando eu vim pra Paracatu, fui morar na casa de uma tia, irmã do meu pai, e na época nós enturmamos, eram quatro, tinham três que eram sempre os três, era um primo, que a gente morava junto, e dois colegas, dois irmãos colegas dele, sempre saíam os três. Aí eu cheguei e completou o quarteto e todo sábado a gente saía junto. Quando foi um belo dia, o meu primo bebeu demais, acabou fazendo xixi no meio da rua lá, aquela feiura, eu não gostei da ideia e minha tia também, muito conservadora, a gente tinha muita liberdade, eu comentei com ela: “Olha tia, Tião fez uma presepada na rua que eu não gostei, não. Eu não saio com ele mais não”. E foi a última vez que eu saí com ele mesmo, tanto que depois disso dava no sábado, a gente aprontava, eu arrumava qualquer artifício para sair primeiro ou depois deles, mas nunca mais enturmei com eles. Minha relação era essa, sair pra poder curtir e não pra poder arrumar encrenca, procurar arenga. Então é coisa sadia. Chegava no bar, cerveja. O dia que eu estava pra mim eu tomava um golinho junto com eles, o dia que não, guaraná. “Ah, mas... cerveja?” “Não, guaraná” “Ah, mas está todo mundo bebendo, você vai beber” “Não vou. Se um guaraná estiver envergonhando a mesa, estou dando licença, estou indo embora” “Não, você está apelando” “Não, vocês que estão apelando comigo, se eu não quero”. Acendia cigarro, estava todo mundo fumando: “Você vai fumar?” “Não vou, não” “Ah, mas está todo mundo fumando, você vai fumar.” “Não vou, vocês vão me obrigar a fazer o que eu não quero? Não vou. Está envergonhando? Estou indo embora” “Não, você está apelando” “Não, vocês estão apelando comigo”. Então, graças a Deus cigarro também nunca, vício nenhum. Meu vício é gostar de cantar, beijar na boca de vez em quando (risos).
P/1 – E o cantar? Você teve um conjunto, um companheiro com uma dupla? Quando isso começou?
R – O cantar, na verdade, profissionalmente nunca teve essa formação profissional de correr atrás profissionalmente, não. Mas desde criancinha que despertava minha curiosidade de querer cantar. Quando criança, eu ganhei uma gaitinha de sopro, empolguei bastante. Isso em meados dos meus 23, 24 anos, por aí, a gente chegou a formar uma dupla, mas durou uns dois anos só, aí acabou a dupla e eu não corri atrás da música, não. Já era profissional na marcenaria, larguei a música pra dedicar mais à marcenaria. E depois fluiu mais coisas no currículo.
P/1 – E quando você foi ter a sua primeira marcenaria? Sua mesmo.
R – A minha primeira marcenaria me parece que meu registro de empresa é de 1993, me parece que foi 1993, que eu registrei minha empresa, então, Davi Luiz Ribeiro M.E.[microempresa], nome fantasia Davi Brasil, que eu sempre tive essa paixão nacional com o Brasil, então, achei por bem Brasil Móveis é o nome da minha empresa, nome fantasia.
P/1 – Aqui na cidade de Paracatu.
R – Isso, na cidade de Paracatu, exato. Foi minha primeira. Trabalhei tempos funcionário, depois entrei de sócio, montamos uma empresa de sócio, questão de meses depois eu achei por bem não continuar na sociedade, aí saí da sociedade, fui trabalhar tomando conta de um comércio pra ele, uma madeireira e daí, junto da madeireira eu fui comprando máquina e fui montando, até que, individualizei e montei a minha empresa, registrei a minha empresa, Brasil Móveis.
P/1 – Isso em 90?
R – Em 93.
P/1 – Antes disso você teve sócio?
R – Isso. Trabalhei de empregado, montei uma empresa como sócio e achei por bem não continuar, aí desmembramos. Ainda bem que não teve arenga, foi na boa, tranquilo.
P/2 – Eu queria que você falasse um pouco qual é esse cenário da indústria moveleira daqui de Paracatu. Quer dizer, qual é o movimento, quem são as pessoas, se tem algum espaço de exibição das peças.
R – Olha, a indústria moveleira em Paracatu é bastante movimentada. Além de mim, que não sou um grande empresário, sou microempresário, tem empresas grandes. Nós temos aqui Paracatu Madeira, tem Indústrias de Móveis Quatro Irmãos, tem Madeireira Santo Expedito, que é madeireira e indústria também, a exemplo da Paracatu Madeira que é madeireira e indústria. Temos também a Martan Móveis. Nós temos bastante empresas, entre grandes e pequenas, tem bastante, serviço tem, é bastante movimentado, a oferta é grande. Quer dizer, a procura da mão de obra é grande, então, pra poder atender a demanda tem que ter também a mão de obra pra ofertar, né?
P/1 – Como que é ver as suas peças lá na Casa de Cultura, representando a cidade, você tendo visualizado, feito?
R – Tem alguns trabalhos meus expostos na Casa de Cultura. Quando inaugurou em Paracatu o Sesi [Serviço Social da Indústria], foi feita uma mostra da indústria moveleira de Paracatu, onde eu tenho catalogado fotos dessa exposição na inauguração do Sesi, esteve com a gente o superintendente do Sebrae [Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas] na ocasião, o jornalista do Sebrae. Assim, [foi] muito bacana. Agora um ponto fixo pra exposição a gente não tem pras pessoas exporem.
P/2 – Mas fala do leão que está na Casa de Cultura, pra gente que não conhece. Descreve a obra, o desafio de fazer.
R – (risos) A Casa de Cultura. Os primeiros desafios foram quando, numa restauração, você conhece o interior, lá tem umas portas em altas...
P/2 – Mas quem está assistindo pode ser que não conheça, né?
R – Isso (risos). Então aquelas portas, tinha umas que elas abriam sentido contrário, aí pra poder mudar, a gente chama de jabre, é um encaixe pra ela poder encaixar no portal. Aí como não tinha jeito de passar a máquina, aquilo eu fiz tudo no formão, foi feita boa vontade. Tem coisas que eu faço, as pessoas perguntam qual é o segredo pra conseguir fazer. Eu falo: “A necessidade faz a capacidade e a boa vontade também faz a capacidade”. Porque não adianta você ter um recurso de última geração na mão se você não tem boa vontade de querer fazer a coisa acontecer. É o mesmo que você usar uma máquina já desatualizada, sem muito recurso, mas se você tem boa vontade você faz ela acontecer. E ao mesmo tempo você coloca uma máquina de última geração na mão do operador que não tem interesse, não tem boa vontade. A máquina não vai fazer. Eu sempre questiono isso, a capacidade do equipamento está na cabeça do operador pra fazer ele realmente funcionar à altura. Então é a boa vontade, é a capacidade diante da boa vontade. Eu penso assim e insisto em bater nessa tecla. Até achei interessante o engenheiro, ele esteve aqui na marcenaria, olhou aquele raladorzinho de milho, olhou uma coisa e outra, aquele ajudante que eu inventei. Ele virou pra mim: “Brasil, como você cria essas ideias e como você consegue fazer?”. Aí eu repeti pra ele, falei: “A necessidade faz a capacidade”. Ele ficou assim, pensativo. “Como é que é? Repete aí”. Eu repeti: “A necessidade faz a capacidade, ou a boa vontade faz a capacidade” “Me dá um papel aí”. Pegou um papel, mandou repetir de novo e escreveu, botou no bolso. O cara é engenheiro, muito inteligente, essas estruturas metálicas, é engenheiro civil, né? Ele encucou. Quer dizer, são os mistérios da vida, né? Vocês acreditam em mistério? Vou contar pra vocês rapidinho uma passagem que aconteceu comigo, em meados de 1980, exatamente no ano de 1986. Eu estava programando um casamento, um namoro de já mais de três anos e faltava um mês e meio pro casório. Aí, um belo dia lá achamos por bem botar um ponto final e não ter casamento. Essa interrogação existe no ar até hoje porque até então a gente era visto como um casal exemplar na sociedade, a gente se “acertamo” e, tanto que, procuraram ver lá: “Davi pisou na bola”. Não, pelo contrário, qualquer mulher gostaria de ter. As pessoas: “Marina”. Não. É uma mulher que qualquer homem gostaria de ter. “Ah, mas o que é que houve?” “Uma coisa nossa”. E aí, dentro de uns 15 dias da decisão, eu andando com a cabeça meio atarefada de pensamentos negativos, na época eu estava até de bicicleta passando em frente a um barzinho, o barzinho lá é metade desse cômodo aqui. Lá no centro tem a Jovem Lar, no centro, na Rua Paulo Camilo Pena, em frente ao hospital, você pode passar por lá e certificar. Logo depois da Jovem Lar, do mesmo lado, tem um barzinho. Ele é uma porta só, é tão pequenininho, tem uma mesinha colada na parede aqui e outra mesinha colada na parede e um espaçozinho pra você encostar no balcão. Aí eu passando por lá, eu senti vontade de tomar um guaraná. Encostei a bicicleta no meio-fio, entrei, sentei e pedi um guaraná. Ele me serviu, quando eu comecei a tomar, eu olhei na parede tinha um quadro. Simplesinho, fundozinho branco com escrita preta: “Saber o que é certo e não fazer é covardia”. Aí, tomei o guaraná, paguei, levantei, montei na bicicleta, totalmente leve e solto, a cabeça totalmente aliviada com esse pensamento. E isso impregnou na minha mente. Isso 17 anos depois, eu falei: “Vou lá ver o quadrinho de novo”. Cheguei, encostei o carro, desci, sentei na mesma mesa, pedi um outro guaraná, quando eu ia tomar que eu olhei não tinha quadro. Eu falei: “Fulano, cadê um quadrinho que tinha naquela parede?” “Não, nunca teve quadro nessa parede, não”. Eu falei: “Não é decoração, não, é um quadrinho simples com uma mensagem”. E nunca vi isso escrito em lugar nenhum e nem ninguém falar isso mais. Mas estava lá pra mim esse dia. Aí ele teimou: “Davi, nunca teve quadro”. Eu falei: “Ó, não é nada decorativo, é um quadrozinho simplesinho, um fundozinho branco escrito de preto: ‘Saber o que é certo e não fazer é covardia’”. Ele falou: “Nunca teve esse quadro”. Eu já voltei lá umas três vezes depois disso, insisto com o cara que tinha esse quadro e ele: “Davi, nunca teve”. Mas esse dia o quadro estava lá pra mim ler, entender e mudar minhas ideias. Então, existem mistérios, eu creio que existam, é um mistério, né? (risos).
P/2 – E você acabou não falando do leão!
R – Ah sim, vamos voltar lá do leão. E aí o trabalho lá na Casa de Cultura começou por essas mudanças lá de sentido de abertura das portas lá, fiz tudo no formão, pessoal gostou, e aí começou aparecer mais trabalho relacionado na Casa de Cultura, aquele leão lá e a sala de piano, né? É montado na sala de piano, é tipo um mezanino. Lá é um tablado, tipo um palco, onde tem a sacadinha, em balaústre, torneados, e finalizando com dois leões onde você, pra subir no tablado lá tem que passar entre a cabeça dos dois leões. Na época houve uma exposição na Casa de Cultura, Ronaldo Lara, ele é artista plástico, viaja o Brasil e esbarrou em Paracatu pra fazer uma exposição de artes plásticas, exatamente na Casa de Cultura. A através dessa exposição de artes plásticas na Casa de Cultura, foi onde a gente entrosou, descobrimos um ao outro, e aí ele achou interessante Paracatu e fez uma parada em Paracatu e ficou alguns dias em Paracatu e, nesse meio de tempo, foi onde eles me procuraram pra poder executar a ideia lá da sacadinha da sala de piano, onde me levaram na casa paroquial, lá na igreja matriz de Santo Antônio pra poder tirar alguma ideia de lá, não plagiando, mas pra tirar alguma ideia, aí eu passei pro papel as minhas ideias, foi aprovado, o modelo dos balaústres e a sacada, e precisava fazer os leões. E aí, eles mais artistas do que eu no entalhe, pra esculpir, nós fizemos a parceria, ele esculpiu pra mim os leões e eu fiz o resto, eu fiz a parte torneada e a montagem, está lá o resultado lá, aquela obra que vocês viram lá, trabalho muito bacana. Ronaldo Lara e Davi Brasil.
PAUSA
P/1 – Então Davi, você trabalha com restauro, né?
R – Sim.
P/1 – A cidade de Paracatu teve recentemente um processo de patrimonialização, né?
R – Sim.
P/1 – Então você deve ter visto isso quando você foi lá na matriz, olhar. Você participou em algum momento desse processo, te procuraram?
R – Já sim. Tem o Iphan [Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional], o órgão fiscalizador e incentivador. Aí tem que ter as empresas pra fazer parte da licitação e tal, então em algumas oportunidades, não trabalhando diretamente, mas sugerindo, analisando, dando ideias, analisando projetos, orçamentos. A Igreja do Rosário passou por uma restauração há dois anos, nessa eu cheguei a trabalhar, alguns acabamentos que era pra empresa contratada ter entregado na íntegra e, lamentavelmente, entregou faltando algumas coisinhas, alguns detalhezinhos. A festa de reinauguração eles me procuraram para eu prestar alguns reparos na construção lá, aí eu fiz isso, até ainda tem uma partezinha, na época houve um roubo lá, roubaram umas santas lá e tal. No santuário tem como se fosse uns pingentes, umas pecinhas trabalhadas na madeira, parece pingente, um brinco, aí cortaram lá pra roubar, só que eles não perceberam que tinha um encaixezinho lá que era puxar e soltava, né? Foram com uma cegueta, cortou o negócio lá, aí ficou. Aí eu refiz essas pecinhas, tem até ainda que ir lá pra colocar no lugar, está faltando só eu colocar no lugar, elas já estão feitas, estão guardadas na paróquia lá. Então esse trabalho a gente acompanha de perto, às vezes nem sempre fazendo, pondo a mão na massa, mas acompanhando, olhando, analisando a situação. É um trabalho interessante, em prol do patrimônio histórico de Paracatu, né?
P/2 – E como você se sente fazendo parte disso, quer dizer, ajudando a manter, a ter esse olhar de cuidado com as peças?
R – Pra mim é muito gratificante contribuir, principalmente quando se trata de ação social, de promoção do ser humano, em especial as pessoas menos favorecidas, então é muito gratificante a gente dar a contribuição, como diz o lema dos rotarianos: “Dar de si sem pensar em si”, é o lema que os rotarianos carregam, né? Você fazer sem se preocupar com recompensa. É muito gratificante, eu gosto disso. E fora de lá, as ações sociais da cidade naquilo que está à minha altura, que eu posso contribuir. A exemplo, agora tem uma festança aí, a festa paroquial de Santo Antônio, já começou três dias atrás, até o dia 13, toda noite Brasil está lá dando recado pra galera, divulgando os produtos, artistas da cidade. É promoção, é valorização, é confraternização, é união, né? Então isso pra mim eu acho válida, é importante e me faz muito bem isso.
P/1 – Davi, você fez algum curso de especialização na sua área de carpintaria ou outra?
R – Na Marcenaria? Curso mesmo não, mas eu tive um aprendizado muito amplo porque na marcenaria que a primeira oportunidade que eu tive, tinha bons profissionais e tinha um que era diferenciado, ele tinha mais atenção comigo, porque a começar do dono era meio ríspido com a gente, não tinha muita oportunidade de se abrir. Então pergunta, tinha que saber a hora e esse funcionário era mais tranquilo e me dava mais oportunidade. Então foi meu professor de inspiração. Dois professores que eu tive dentro da marcenaria, como a minha primeira paixão, o que me despertou a primeira curiosidade foi a máquina chamada torno. Eu via as peças prontas e eu imaginava que tinha um molde que você encostava lá que já saía a matriz. E aí quando eu chego na marcenaria, o cara tinha dois tornos, além do resto de maquinário. Aí que eu cheguei lá, fui ver o cara tornear, aquele monte de formolzinho, pega um, larga e pega outro, “liquidificou” minha mente, nossa, dou conta disso, não (risos). Mas aí um cara muito paciente, muito bacana, o que ele começou a fazer comigo? Ele moldava num e jogava, colocou em outro, só pra dar polimento, fazer acabamento, lixar. E aí assim foi. E quando ele viu, aí já me botou pra cortar também, pra moldar. Aí, quando eu moldei as primeiras próprias: “Se vira, tudo seu!”. Aí já deu as costas pro torno, já passei a tomar conta dos dois tornos. E depois que eu me emancipei, que eu montei a minha, ele chega na minha marcenaria, você vê, no torno, ele admira as coisas que eu faço, ele que me ensinou a tornear e ele que fica surpreso com as coisas, o recurso que eu consigo no meu torno. Porque o torno mecânico tem vários recursos, placa luneta, ponto fixo, ponto rotativo, placa mecânica. E o torno pra madeira é totalmente simplesinho, de um lado é um ponto fixo, que prende e fixa madeira, e do outro lado tinha uma ponta rotativa, que ele gira, pra madeira girar e você trabalhar ela. Não tem muito recurso. Só que o meu, eu inventei, eu criei coisas além dele, recursos a mais. No lugar desse ponto fixo o que eu fiz? Eu comprei uma placa do torno mecânico, que adaptei no meu que é pra madeira, para ter recurso e pegar uma peça mais grossa e também quando eu vou trabalhar uma peça que tem que trabalhar com a ponta livre, porque por exemplo, quero fazer uma taça, eu quero fazer uma taça. Então lá tem que estar livre para eu trabalhar por dentro, né? Então você prende um lado só. Ele com um não tem como fazer isso, agora com essa placa mecânica sim, eu prendo, moldo nas castanhas lá, prendo pra você trabalhar dentro. O mecânico tem freio, o que madeira não tem, mas o meu tem porque eu inventei um sistema de freio e tem freio, está aí, funciona belezinha, bacaninha. E ele não tinha essas criatividades com a máquina e eu já tenho. A exemplo que mostrei pra você ali o furador, é uma máquina de furar madeira, também usa um mandril pra prender as brocas, eu dispensei o mandril, adaptei também uma placa mecânica, eu faço o serviço de torneiro mecânico num furador, usando esse recurso que eu acrescentei nele lá. Então é o que eu sempre menciono, a capacidade está na boa vontade e na criatividade. Acontece (risos).
P/1 – Eu conheci o Davi Brasil comunicador, narrador. Como é que você passou pra comunicação?
R – Sim. Complementando a resposta anterior, que eu não complementei quando você perguntou se eu me especializei, se eu fiz curso. Então fui especializado na boa vontade e na prática, assim teoricamente não fiz nenhum curso, não tenho nenhuma especialização teórica, então é especialização na prática. Agora, passando pra parte Davi Brasil locutor, desde moleque sempre as pessoas observavam meu jeito de falar, minha voz e tal: “Ah, você tem que fazer rádio, tem que fazer televisão” e não sei o quê, mas não me despertava essa curiosidade. Cantar sim, sempre gostei de cantar, sempre me chamou a atenção. E aí, o tempo passou, isso me parece 16 anos atrás, é, 16 anos atrás, me intimaram pra sair candidato a vereador, porque, com 16 ou 17 anos o promotor me intimou pra ser mesário, eu trabalhei durante 20 anos na sequência, como mesário. Tem pessoas que questionam: “Ah, não ganha nada e é obrigado a ir”. Eu nunca questionei, como eu gosto de contribuir, eu sempre fui numa boa, sem questionar, até era motivo de farra lá porque as outras seções iam lá pra minha porque eu bagunçava, cantava e pintava lá, eles iam pra lá pra ficar perto de mim (risos). Foram muito bons esses 20 anos. Até então eu não era filiado, não tinha vínculo nenhum porque não pode ter vínculo nenhum com política. Quando surgiu essa ideia, o presidente da câmara era muito amigo e começou a me induzir: “Brasil, você vai se filiar”, porque tem que ter um ano de tempo pra filiação, “pro ano que vem você sair candidato” “Não, não vou mexer com isso, não” “Vai”. E aí começou a me incentivar. Eu comecei a tomar palpite com as pessoas que realmente me conhecia. O que realmente me conhecia foi o primeiro: “Meu filho, não se suja não” (risos) “política é sujeira, tem que ter duas máscaras e ninguém conhece sua máscara e não vai conhecer, então não misture com esse povo, não”. Tá. O primeiro. Quando foi o segundo, eu falei: “Seu Zé, estão me induzindo pra entrar na política aí, o que senhor acha?” “Vai, deve e vai. Não vou prometer muita coisa mas, mil reais de gasolina eu te dou” “Beleza”. Aí consultei mais uns três que também deu positivo e confirmei. E aí, coincidentemente, nesse meio de tempo até chegar o lançamento da campanha, saiu um comunicado anunciando em todas as rádios do Brasil um curso de comunicação em Belo Horizonte; curso, Atualização do Rádio, e ninguém tinha esse curso ainda. Negócio muito bacana, você entra em contato e eles te mandam o currículo dos profissionais que vão aplicar o curso, tudo direitinho, tudo bonitinho, até direcionando hospedagem, hotéis pra você procurar e tal, um negócio bacana. Como eu não tinha conhecimento e aquilo que eu tenho consciência, eu procuro fazer com responsabilidade e o que eu não tenho conhecimento eu procuro com pessoas que realmente tenham a informação correta. Aí o que eu fiz? Em vez de procurar saber e ingressar no esquema, fui atrás de informação, se realmente era algo autêntico. Então nós temos aqui a Rádio Boa Vista, que é uma rádio já há bastante tempo na cidade e tem uma audiência muito boa. E nesse meio tempo, eu adquiri uma convivência muito boa com ele, ele sempre acreditou no meu trabalho, na minha capacidade e aí foi meu porto seguro. Aí procurei se ele tinha conhecimento, que estava divulgando também na rádio dele. Aí ele falou: “Olha, Davi, é autêntico, eu conheço, é coisa e realmente ninguém tem esse curso no Brasil, então vale a pena você fazer, corre atrás, faça. Fazendo seu curso lá minha rádio é a sua casa, você tem tua liberdade” “Beleza”. Aí foi o que despertou a curiosidade de fazer o curso de Comunicação visando participar da política, eu tinha que aprender a falar publicamente, usar microfone e tal, entrar no esquema da forma correta. Aí liguei, procurei saber, aí fui lá em Belo Horizonte e fiz um curso intensivo de uma semana, de cedo até de noite, foi muito bom e lá eu participei com pessoas, eram 35 anos, a maioria tudo veterano já, acho que só tinha eu e mais um que era, como se diz, marinheiro de primeira viagem. Os outros já faziam rádio, televisão, foram só pra lapidar porque o negócio é interessante. Aí, eu fui em Belo Horizonte e fiz esse curso de Comunicação do Rádio. E aí aconteceu a campanha, foi uma participação, eu tinha total consciência de que eu não tinha a mínima condição de me promover, de me eleger, mas foi uma participação. Valeu a pena a participação, que eu recebi os frutos do incentivo da política, da campanha. Então passou a campanha, não consegui me eleger, mas ficou esse fruto, esse curso. Aí passado, me parece, um ano e meio, aí eu fui convidado pra ir lá na feira pra cantar, pra chamar atenção, até promoção, que o pessoal que desenvolve uma oficina pedagógica com pessoas que têm deficiência física, oficina pedagógica próximo à rodoviária. Eles já tinham muito produto, muita coisa confeccionada e queriam vender esses produtos pra arrumar dinheiro pro caixa. Aí ligou se eu ia lá, a título de contribuição, pra poder cantar pra chamar a atenção do público e divulgar pra vender esse material. Eu não pensei duas vezes e convidei mais dois colegas, levamos uma caixinha lá, ligou uns dois violões lá no gramado lá e fizemos um modão, realmente chamou a atenção, sabe? Que no final da brincadeira os feirantes, uns vieram verbalmente parabenizar, agradecer e convidar pra voltar, outros escreveram bilhetinhos, também parabenizando, agradecendo e colocando pra voltar. Aí eu já tendo conhecimento da situação, analisei direitinho, achei interessante, só que em vez de voltar na informalidade, aí passei pro papel, fiz um projeto, aí corri atrás de documentar. Quando eu retornei já voltei tudo esquematizado. E se não tivesse voltado assim na íntegra, eu tinha feito a abertura no sábado e encerrado na segunda (risos). E graças a Deus a brincadeira deu certo, a brincadeira agora, no dia 26 de novembro próximo agora faz 13 anos já de brincadeira. Tem empresa lá que me patrocina desde que eu comecei, nunca cortou o patrocínio, e outras que às vezes faz esporadicamente e depois volta, então é um trabalho patrocinado pelo comércio local e também pelos feirantes. Das bancas também a gente faz divulgação, passa uma taxazinha de parceria que tudo, somando o pacote, já dá pra pagar as despesas. Então, a política gerou esse fruto aí, resultado do projeto Rádio Feira, que acontece já há 12 anos, junta produtor rural de Paracatu. Esse daí eu realmente corri atrás de qualificar pra depois tentar fazer a coisa acontecer e, graças a Deus, está acontecendo.
P/2 – Como foi esse primeiro modão que vocês cantaram? Você se lembra dele, como é que foi ter a ideia do que falar sobre o produto deles na feira pras outras pessoas, pra atrair?
R – Sim, o ponto de atração pro pessoal ver o produto era realmente a música. Quer dizer, pra quem gosta, ouviu, quer despertar, quer aproximar pra ver o que está acontecendo. Então realmente foi o ponto x, a música pra pessoa chegar até o produto, vir até a gente pra chegar até o produto. E realmente foi uma ideia muito positiva, o resultado realmente positivo. As pessoas prestigiaram, e prestigiaram os dois lados, né? O lado musical e o lado do pessoal da oficina pedagógica que realmente expôs o produto e vendeu o produto. Ficou muito interessante, muito bacana. Modão é música raiz, o que é música raiz? São as músicas autênticas, aquelas mais idôneas, que logo quando começou era música caipira, né? Ao longo do tempo, o que era a música caipira? A música caipira era interpretada como violão, viola e acordeão, a música caipira. E aí depois foram surgindo novos artistas com ideias inovadas, diferentes, a exemplo Leo Canhoto e Robertinho. Não sei se vocês conhecem música, tem uma até bonita que eu gosto dela: “Meu velho pai” (canta): “Meu velho pai, presta atenção no que eu lhe digo, meu pobre papai querido enxugue as lágrimas do rosto por que papai que você chora tão sozinho, me contaram papaizinho, por que lhe causa desgosto? Você sofreu quando eu era ainda criança...” por aí segue. Leo Canhoto e Robertinho, um dos grandes sucessos deles. Então, aí começou a modernizar a música caipira. O que eles fizeram? Eles já introduziram, dentre os outros instrumentos, uma guitarra, mais moderno, né? Então eles foram os introdutores da guitarra na música caipira, que aí ela foi evoluindo e já foi modulando pra sertanejo, entendeu? Já deixou de ser o caipira pra modernizando passou pra sertaneja. E aí depois veio o Pedro Bento e Zé da Estrada, que lamentável, parece que ele morreu antes de ontem, o Zé da Estrada, que é dessas duplas raízes, os pioneiros, eles que tiveram a ousadia também de entrosar na música caipira, passou pra sertaneja, o instrumento de sopro, o sax. E aí foi infiltrando mais instrumentos diferentes, mais modernos, que aí passou pra música sertaneja. Antigamente era música caipira, aí já modernizou pra música sertaneja, aí já veio outras duplas com gênero mais romântico, que antigamente as letras eram coisas mesmo do sertão, falava diretamente das raízes do sertão. Aí foram surgindo novas duplas, trazendo uma roupagem diferente, músicas mais românticas, mais lentas, que aí passou pro sertanejo.
P/2 – Eu nunca fui a essa feira, como é que você fala, o que você fala? Me dá um pouco desse ambiente.
R – Você não conhece a feira?!
P/2 – Ainda não!
R – Você chegou em Paracatu...
P/2 – Sábado à tarde.
R – Sábado à tarde? Ah não, então essa semana tem, essa semana você vai lá. A feira livre acontece ali atrás da prefeitura, na Rua Romualdo Ulhôa Tomba, a partir das quatro horas, quatro e pouquinho você chegou na feira, é comer um pão de queijo saindo fumaça já tem, um pastel frito na hora também, frito ou fritado, você decide (risos). Também caldo de cana fresquinho, passado na hora, sucos naturais, já tem esse movimento lá na feira. E os produtos expostos já. E essa movimentação vai até lá pra meio-dia, uma hora. Eu a exemplo, como lá eu trabalho no palco, tenho um palco coberto com a tenda, aí pra ganhar tempo na sexta-feira à tardezinha e à noitezinha eu vou e monto a estrutura, monto o palco e a tenda, aí já dorme montado. No outro dia, no sabadão, eu levanto quatro e meia, cinco horas eu estou saindo de casa, cinco e pouquinho eu estou chegando lá. Aí o palco já está montado e eu vou instalar o som, eu trabalho com duas caixas no palco e de 15 em 15 metros a sonorização em linha, num raio de 600 metros, aí eu falo, a feira toda me ouve ao vivo. Aí eu instalo o som, terminou de instalar o som eu vou passar nas bancas pra ver quem vai divulgar e quem não vai divulgar. Porque tem alguns que desde que eu comecei nunca falhou, outros intercalam sábado sim, sábado não, e outros nunca fez e nem interesse tem. Também eu agradeço, obrigado, mas cordialmente passo na banca de todo mundo, brinco, bom dia. São dois lados, né, ida e vinda, aí eu vou de um lado, fecho lá, volto, aí a hora que eu fecho o círculo, sete, sete e pouquinho, eu já começo a falar. Eu subo no palco e dou um bom dia Brasil lá, um beijo no coração da galera lá e a jiripoca pia. Aí eu falo das sete horas até às onze horas. Eu divulgo, falo uma banca, falo uma empresa, vou intercalando, passa uma pessoa lá eu brinco, brinco com a criançada porque eu tenho paixão com criança, tanto que as pessoas já fazem uma colocação: “Brasil, você tem que montar uma creche”, aí quando eu questiono: “Por que creche?” “Porque onde você anda, quando não é menino empencado no seu pescoço, é velho”. Mas menino criança e pessoas idosas realmente se dão bem comigo. Aí eu já levo balão, levo balinha, coloco um balãozinho no pé da tenda, aí as criancinhas passam e já ficam encarando, aí quando eu vejo que as criancinhas estão encarando eu já dou alô pro pai ou pra mãe: “Ei, ó, o baixinho aí, a princesinha ou o principezinho, traz aqui, quer falar comigo. Você está distraído, mas está ligado no movimento”. Tem uns que nem falam, mas já quer ir lá pra poder ver de perto. Aí tem uns que ficam meio assim, não quer chegar perto, eu pergunto o nome, dou alô, falo o nome. O outro já quer vir, quer me abraçar, quer me beijar. Aí eu dou balinha, dou balão e faço um fuzuê lá com a criançada, é muito gostoso, eu gosto disso.
PAUSA
P/2 – E você fala o quê dos produtos? Porque aí eu já consigo ver você com os meninos e tal, as crianças, movimentação, bom dia...
R – Legal. E aí pra começar a gente faz a abertura dando um bom dia brasil pra galera lá, tem uma música que eu rodo de abertura, tem um cantor gospel, J. Neto, ele canta igualzinho o Roberto Carlos, se você ouvir, você: “Não, é o Roberto que está cantando”, mas é o cara, chama J. Neto, eu não sei o nome certo dele, mas ele se expõe J. Neto. Ele deve ter quase 30 CDs gravados e dentre eles eu tenho um que é a “mesclagem”, as 20 mais. E dentre elas tem uma que fala: “Eu sinto o amor de Deus dentro de mim”. Eu faço a abertura, rodo essa música oferecendo pra quem está me ouvindo. Em seguida à música vem uma oração muito bonita, até um colega meu que encontrou essa oração, o mesmo trabalho. O meu não foi copiado, foi criatividade minha mas eu sei que fora de Paracatu existem outros que fazem o trabalho. Até é interessante eu sair pra ver, porque de repente você inova alguma coisa, né? Eu nunca fui ver dos outros, o meu é ideia própria. Aí esse colega meu viu em outra feira e o cara trouxe pra mim o CDzinho gravado com essa oração, muito bonita, aí eu anexei em seguida com a música, muito bonita. E aí, finalizou a oração, eu agradeço, cumprimento os clientes e amigos, desejo um bom dia lá pros colegas de trabalho e começo. Aí falo dos patrocinadores e começo as bancas: “Banca de Fulano de Tal, onde você vai saborear um delicioso caldo de cana fresquinho, passado na hora e aquele salgado, ó, que dá água na boca”. Aí começo a falar. Eu falo de uma banca, tem um moleque meu filho, a voz dele é a mesma minha, até polêmico porque a voz dele é idêntica, mas como eu não sou informatizado e ele é, ele vai com o notebookzinho dele. E aí as pessoas acham que ele tenta mudar lá no computador pra me imitar, só que não é, a voz dele é a mesma da minha, porém até mais interessante do que a minha, só que não tem vontade de querer seguir, faz pra me servir, me ajudar. Então, por exemplo, acabei de falar uma banca, “Banca de Fulano de Tal, num oferecimento”, e ele fala da empresa: “Comercial Prado, compra e venda de cereais no varejo e no atacado, além de cereais também rações, as famosas rações Guavi pra animal de pequeno e grande porte. Lambe-lambe, está na época de tratar melhor do animal pra ficar mais nutrido, tem o Lambe-lambe que é uma das opções pra cuidar da nutrição do seu animal. Ração pra peixe” e aí segue, né? Então vai entrosando um e outro lá e a coisa... aí passa uma pessoa lá, eu já, tanto que eles me qualificam como outdoor ambulante por causa do carro, as logomarcas. Ou então agenda vida, porque eu gravo muito telefone na cabeça. Às vezes a pessoa passa lá, e me escuta: “Comercial Prado”, não tá nem aí, de repente, sem que você precisa: “Ah, Brasil falou do Comercial Prado lá”, me liga. Como meu telefone é divulgado, conhecido, aí eles me ligam: “Brasil, você divulga tal empresa, qual o telefone de lá?”, aí eu passo o telefone. Então eles me qualificam como agenda viva ou outdoor ambulante por causa do carro (risos). E aí eu brinco, tanto que até um ano e meio eu corria atrás, oferecendo. Aí a partir do momento que as pessoas começaram a ver o trabalho, entender a ideia e dar credibilidade, aí já inverteu, eu não ando mais atrás oferecendo a minha propaganda, às vezes eu recuso, que aí as pessoas me procuram. Só que como eu procuro trabalhar com exclusividade porque a publicidade quando bem-feita realmente divulga e quando malfeita simplesmente confunde a cabeça do ouvinte, né? A exemplo, se eu divulgo você, você tem um segmento, divulgo você, ele também é o mesmo segmento, eu acabei de falar de você sem nem um intervalo, sem nenhum outro entretenimento pra tirar da mente da pessoa que acabou de ouvir, eu falo dele, quer dizer, eu matei você, ele que vai permanecer, que é a última ideia que prevalece, entendeu? Então, como eu fiz o curso, lá eles batem bem nessa tecla, falam: “Ó, até hoje vocês tinham uma maneira de ouvir mídia, a partir de agora vocês vão ter uma outra concepção de ouvir mídia”. E realmente faz todo sentido, que é onde você aprende a diferenciar o certo do errado. Colocações, informação, porque o microfone é uma arma, se você souber lidar com ele você realmente faz o bem, mas se você cismar de usar pro lado mal, dependendo do que você fala aqui e o que o outro ouve lá no final do mundo, você faz em cima do outro lá o que você falou aqui, o outro ouviu, não gostou e aí a coisa segue, flui, então tem que saber lidar com a situação. Informação, por exemplo, quando você vai passar informação, jamais o sujeito [pode falar]: “eu isso” ou “eu aquilo”, se não provem dele, jamais [usar o] “eu”. Segundo fato, segundo boato, segundo informação, segundo boato, segundo eu ouvi, segundo comentaram. Eu lembro direitinho um cara no programa do FM Repórter, que passa meio-dia na Boa Vista, o cara dando entrevista sobre Unimed [Sociedade Cooperativa de Trabalho Médico, operadora de seguro saúde], que ele tinha Unimed e aderiu a outro plano. Aí o repórter perguntou pra ele: “Por que essa adesão do Unihosp e saindo do Unimed?”. Daí o cara: “É porque no Unimed tem fraude”. E um cara instruído, ele deu esse vacilo. No outro dia, no mesmo horário, no mesmo espaço, quem é que estava lá? A Unimed. Se ele repassa sem usar o sujeito eu, segundo suspeita-se, segundo boatos, entendeu, há possibilidade de ter fraude, mas não é porque na Unimed tem fraude. Aí tem que provar, meu filho, e como provar? Complicado. Então, interessante você saber lidar com isso aí, a exclusividade. Eu procuro prezar a exclusividade. A exemplo, eu tinha um cliente que já estava divulgando comigo, aí outro cliente procurou, o mesmo segmento. Aí eu questionei: “Só que eu estou com Fulano, pra eu fechar com você, eu tenho que acordar com ele”. Porque às vezes acontece quando é acordado. Então, se eu trato com você exclusividade e passo por cima, divulgo outro, você tem todo o direito de abrir um processo contra mim, isso vocês conhecem mais do que eu, todo direito de abrir um processo contra mim e a indenização é das mais pesadas que têm. São duas indenizações que pesam: pensão alimentícia e danos morais, é pesado. Então, eu procuro trabalhar com exclusividade. Aí teve esse caso que o outro me procurou, falou: “Eu já estou com o outro do mesmo segmento” “Não tem problema, não, porque ele não está batendo em hipermercado porque tem posto, tem gasolina, tem veterinária, então não era exclusivo”, o produto dele que eu batia na tecla, né? Aí continuei divulgando os dois. Quando foi um dia esse anterior vai lá na feira, eu abro espaço pra ele, subiu no palco, falou, deu o recado. Não sei se o outro passou por lá e ouviu, ou se alguém comentou com ele, aí quando foi na segunda-feira me ligou cedo: “Brasil, vem cá que eu preciso conversar”. Aí já deu pra entender o recado, né? Adiantou o recado. Quando eu cheguei, cumprimentou e falou: “Ó Brasil, não te adiantei porque, primeiro é particular nosso e segundo tinha pessoas por perto pra ouvir, mas eu não gostei do fuzuê de Fulano no seu palco sábado, não. Quanto é que ele está te pagando?”. Eu falei: “É tanto” “Pode cortar que vou pagar dobrado, mas o espaço é meu, eu não quero ver ele lá naquele palco seu mais, não, é só eu. Antes, eu concordei porque ele não estava batendo no setor de hipermercado, agora ele está batendo nessa tecla, então cruza com o meu. Pode cortar, o espaço é meu”. Aí eu tive que cortar (risos). A partir de um ano e meio, mais ou menos, eu passei a ter esse privilégio, em vez de correr atrás, inverteu a regra do jogo, às vezes a pessoa procura, o espaço já está comprometido. Eu falo: “Já está comprometido, se você quiser aguardar na condição de cliente preferencial, ele cortou a preferência é sua”. Então funciona assim. Quase todo sábado aparece um e outro, às vezes dá o cartão: “Vai lá na minha empresa que eu quero falar com você”. Graças a Deus, uma brincadeira que deu certo, 12 anos já, vai fazer 13.
P/1 – Você também tem sido chamado para as festas populares. Conte pra gente sobre essas festas culturais, religiosas que você participou recentemente, o que há de específico nelas, como é feito.
R – Sim! O meu entrosamento na comunicação começou por aí, a participação na política, quando na época da campanha que eu subia no trio elétrico lá, nos palanques lá que eu pegava o microfone e dava um “Boa noite, Brasil”, lá (risos), as pessoas ficavam curiosas pra saber quem estava falando. E até o interlocutor da campanha comentava comigo: “Brasil, esse boa noite Brasil seu vai pegar”. E realmente, pegou. Aí finalizou a campanha e como Paracatu tem essa tradição de muitos e muitos anos, fala quermesse, as festas religiosas nas igrejas, termina de uma, passa pra outra, vai fazendo um rodízio até fazer em todas. Aí da campanha começaram a me convidar pra fazer essa animação nas festinhas, nas quermesses das igrejas e começou por aí, até surgir essa oportunidade da Rádio Feira, do trabalho na feira, que aí agora, a partir daí fechou um pacote, é feira e nas oportunidades as barraquinhas nas igrejas. De vez em quando tem umas cavalgadas também que eles fazem durante o decorrer do ano, né? A exemplo, nós temos a cavalgada do Rotary Club, é uma cavalgada beneficente, porque o trabalho rotariano é um trabalho conhecido e reconhecido não só nacionalmente, como mundialmente, como o trabalho mais sério em termos de ação social, inclusive a erradicação da poliomielite, erradicou através de um trabalho rotariano, você tinha conhecimento disso? Foi. O trabalho rotariano que conseguiu erradicar a poliomielite. Então é um trabalho muito sério, tanto que, não sei se vocês sabem como que funciona, que ser um rotariano não é você querer ser, é você ter o privilégio de possuir o perfil que encaixa no trabalho. Você é observado, se de repente um companheiro, eles chamam de companheiros, percebe que o seu perfil encaixa no esquema, aí ele te convida. Ele te convida e te apresenta no clube. Vai marcar uma reunião pra discutir o seu ingresso. Por exemplo, se um só votar contra, eles desconsideram, passam por cima, que é quase unanimidade, né? Aí aceita o seu ingresso. Agora se dois votarem contra, pode ter um milhão contra dois, aí vai ter uma outra reunião pra esses dois tentarem convencer o outro um milhão. Se eles conseguirem convencer, aí considera os dois e desconsidera você, mas senão, aí você ingressa. No dia do seu ingresso, é feita uma festança, um cerimonial muito bonito, muito bacana. Então não é você querer ser, não, você é observado, analisado e passado pela prova de fogo, aí você passa a ser um rotariano. E é um trabalho interessante. O trabalho funciona o seguinte; a sede é uma só, agora que eles estão construindo uma outra sede pra poder dividir. Como vai ingressando muita gente, vai ficando muito movimento pro mesmo espaço, aí eles dividem em grupo. Em Paracatu, por exemplo, o primeiro clube é o Rotary Club Paracatu. Depois de um tempo gerou outro clube, Rotary Club 200. Depois gerou o Rotary Club Universitário. Depois veio a Juventude, a Rotaract, as Mulheres, Caso da Amizade, então aí reveza no mesmo espaço. Na semana um usa na segunda, o outro usa na terça, o outro clube usa na quarta. A sede é uma só, porém reveza os dias. E quando tem as grandes festas, os grandes eventos, a exemplo teve agora, o resultado foi entregado domingo passado, dia quatro [de junho], resultado dos exames mutirão saúde do homem, porque é muito importante, eles fazem isso acho que é a quarta ou quinta vez, mais de mil homens. A princípio o pessoal resistia muito, as bobagens, preconceito, mas até foi aderindo a ideia. Hoje já fazem pra mais de mil pessoas, então é o trabalho do Rotary. Outro clube já faz a campanha de visão, pra aviar consultas e óculos. Então é um trabalho muito interessante. Eu carrego essa bandeira com muito prazer, falo muito bem, tanto que quando as pessoas questionam se eu sou rotariano: “Não, eu não sou rotariano efetivo, mas sou rotariano afetivo”. Não sou ingressado por ciúmes dos clubes, que quando um clube me convida pra ingressar o outro me freia: “Não, não, dá um tempo aí, não vai ingressar com eles não”. E é bom pra mim porque eu fico light no meio e todos. Aí eles bolaram essa Cavalgada Solidária do Rotary Club, então esse ano nós já vamos pra décima primeira cavalgada. Desde a primeira, todas, eu tenho que estar junto, eu que sou o porta-voz da cavalgada, além de outras que também acontecem no decorrer do ano, então eles sempre fazem questão. Tanto é que antes eles não deixavam nem eu ir no trio elétrico, que aí eu vou falando e vai um trio acompanhando. Antes, até um certo tempo, eu tinha que ir montado, com um microfone sem fio, e o carro próximo de mim. “Não, lá em cima você fica longe da gente”, tinha que estar próximo, infiltrado neles lá. Por um tempo eu ia montado e o trio elétrico ia acompanhando. Até que eles concordaram deixar eu ir lá em cima (risos). Mas é muito gostoso. Teve uma aí, Cavalgada de Santo Antônio. Essa foi quando a turma era unida, Cavalgada da Amizade, Cavalgada de Santo Antônio. Essa aconteceu parece que até a sexta edição, aí depois política, começou politicar um com o outro, esfarelou o blocozinho que era unido e acabou com ela, já tem tempo que ela não realiza. Mas é bacana, um trabalho muito bom de confraternização entre companheiros e amigos. Essa dos Amigos, participava prefeito, juiz, aí tinha o doutor João Ari, que hoje está em Uberlândia [MG], também gosta de montar, na época o prefeito Vasco Praça Filho, que era o prefeito, hoje presidente da Coopervap [Cooperativa Agropecuária do Vale do Paracatu] também. Aí quando eu falava de autoridade: “Ó, hoje é proibido falar de autoridade”. Aí eu arrumava meus artifícios: “Já que eu não posso falar de autoridade, então vou falar de celebridade”, aí começava o nome de um, de outro deles (risos). Muito bom, interação, entrosamento, muito bacana.
P/2 – Conta pra gente qual a publicidade mais curiosa que pediram pra você falar na feira? Uma coisa inusitada ou diferente, que nunca tinha tido antes.
R – Ah (risos). De vez em quando acontece as gozações, às vezes a pessoa chega querendo bagunçar com o outro, criticar o outro: “Ah, deles você vai falar isso”. Eu falo: “Pera aí, assina embaixo pra mim então. Ou então você fala”. As provocações ou alguma coisinha assim, né? Mas o que me deixou constrangido uma vez foi que chegaram e pediram para divulgar uma, como é? Esse pessoal que joga carta, que faz negócio de espiritismo, sei lá bem como é a situação, esses atendentes aí, pai de santo! É, pai de santo. Realmente me deixou meio constrangedor. Falei mais ou menos por alto, sem aprofundar. Porque você vai agradar uns e também constranger outros. Então normalmente quando chega uma coisa assim, que eu vejo que não encaixa bem: “Não, eu não posso passar, por isso no ar”. Mas que acontece, acontece (risos) algumas coisas inusitadas.
P/2 – E quando você começou a usar o chapéu? Essa característica sua de andar de sertanejo, com o chapéu.
R – Ah sim. Essa caracterização de sertanejo, como eu fui criado no meio do mato, lá era bem mato mesmo, então isso já vem de lá de berço. Você estar de chapéu, de bota, cinto cowboy, cinto country e depois que eu entrei pra Comunicação é minha caracterização no palco, usar um chapéu. Até o pessoal dá risada, os que ficam me conhecendo de chapéu, né, aí a primeira vista quando me vê sem o chapéu, tem um até que brinca comigo, quando ele me vê sem o chapéu ele grita comigo: ‘Quem é você?”, que ele insiste comigo: “Não, a sua identidade é o chapéu, você tem que andar sempre de chapéu” “Rapaz, mas não é, porque eu uso chapéu não é pra poder disfarçar a calvície, é porque eu gosto. E nas horas oportunas, então não vou usar chapéu o tempo todo, como tem alguns calvos que usam boné ou qualquer artifício pra não expor a calvície. E eu nunca tive esse preconceito, nunca preocupei com isso, até porque gosto mesmo do chapéu, gosto dos trajes country, mas nas horas oportunas.
P/2 – Tem coleção de chapéu?
R – Tem coleção de chapéu. Tem branco, tem preto, tem amarelo, tem vários, assim como botinha também, tenho coleção (risos).
P/1 – Davi, vamos passar então pro bloco de avaliação final. Como é pra você ser esses dois Davis? O Davi artesão e o Davi locutor? Fazer uma avaliação.
R – (risos) Até então vou te contar uma piadinha, mas está dentro do contexto da sua pergunta, os dois Davi. Até então, isso em meados de parece que 2004. Não, meados de 2006. Existe a TV Rio Preto, ela é matriz de Unaí e aí trouxeram a filial dele pra Paracatu. E aí na altura, eu já estava fazendo o trabalho da Rádio Feira, na feira livre, aí eles me convidaram pra poder apresentar o programa. Eu formatei a ideia, Rincão Sertanejo, assim bem caipira mesmo, bem sertanejo, onde eu convidava os artistas pra poder estar gravando com a gente o Rincão Sertanejo. Eu gravei durante três meses, uma experiência muito bacana, mas lamentavelmente eles não deram conta de manter esse braço dela aberto aqui e eu tive que parar com o programa. E nessa época que eu estava gravando eu conheci uma pessoa, até lá de Patos de Minas. E aí, eu sou muito aberto, não sou de querer levar na conversa, então a coisa é mais curta e séria. No segundo, encontro nosso eu já me abri com ela, eu falei: “Olha, Cláudia, relacionar comigo é meio complicado. Primeiramente, pelo jeito que eu sou, de lidar com as pessoas, às vezes, as pessoas confundem isso, e principalmente agora, depois que eu entrei pra comunicação, as pessoas criam aquela afinidade com a gente, aquele carinho, aquela atenção e também quem está do outro lado às vezes confunde a situação, a exemplo de quem está namorando comigo já acha que eu estou interessado, que a pessoa está interessada, então isso dificulta um pouco relacionar comigo”. Aí ela virou pra mim e falou: “Não, vai dar certo porque eu vou saber lidar com isso aí. Eu vou te entender que Davi Brasil é do povão e Davi Luiz é o meu Davi”. Quando ela falou isso, eu falei: “Moça, eu fui lá nas nuvens”. Eu falei: “Caiu minha estrela do céu, é essa que eu preciso!” Menino, imagina onde a estrela foi parar? E aí aconteceu, acho que estava com uns três ou quatro meses de namoro, aí me contrataram pra fazer um evento na praça e eu fui fazer esse evento. Levei um bocado de gente pra cantar e o negócio foi bão. Quando foi no final da história lá, e ela junto, percebendo o público lá, os farolzinhos em cima do Brasil. Ah, não deu outra, quando foi finalizando lá, ela jogou os “baixeiros” no chão (risos), ditado da roça, né, me estranhou. E aí insistimos mais um tempo até que acabou. O ciúme era demais, não dava conta de lidar com a situação, acabou (risos). Mas essa primeira impressão aí: “Não, Davi Brasil é do povo e o Davi Luiz é o meu”. Eu falei: “Nossa! É a minha estrela”. Só que a estrela não brilhou muito tempo, não (risos). Bacana.
P/1 – E como é que foi pra você contar a sua história?
R – A minha história pra vocês hoje, aqui e agora? A cores e ao vivo? (risos):
P/1 – Isso.
R – Você ouviu a história dele, um radialista lá de Brasília, o Mario Eugênio? Você conhece essa história? Ele era repórter policial, um cara de muita coragem, chamava Gogó das Sete. Gogó das Sete que ele fazia de manhã, a gente ouvia o programa dele. E ele não tinha medo não, ele provocava os bandidos, os bandidos provocavam ele, marcavam encontro e ele ia. E aí ele ia entrevistar os bandidos na cela, ele chegava com o microfone e chamava o cara na grade: “Vem cá, ô, vagabundo, fala comigo aqui, de gogó a gogó, sem tremer e sem mentir” (risos). Mataram ele. O pessoal da polícia mesmo matou ele. É. Ele estava, coincidentemente, tempos depois (risos) eu tive uma experiência com uma pessoa que conheceu a história bem de perto. Ele estava numa investigação, quando estava pra poder botar a prato limpo matou um policial que estava acompanhando ele e dias depois matou ele, saindo da rádio, aí fuzilaram ele. Aí depois quando foi passar essa história a limpo, um tal de Cabo Bruno, né, que atirou nele, matou ele. Mas o cara não tinha medo, não. “Vem cá, ô vagabundo, fala comigo, de gogó a gogó, sem tremer e sem mentir’ (risos).
P/2 – Você se sentiu assim?
R – Não! Não, não. Muito tranquilo, muito à vontade. Ficou a marca do Brasil, né? Por que Brasil? (risos) O Brasil é essa paixão nacional que eu sempre tive com o nosso país, apesar dos pesares, mas eu tenho esse carinho pelo nosso Brasil, pelo verde e amarelo, então quando eu registrei minha empresa, nome fantasia é Brasil Móveis, então é minha identidade antes, Davi da Brasil Móveis. Aí quando eu decidi entrar pra política, participar da campanha, na época o presidente da câmara, ele enviava as correspondências e ficava com preguiça de estender, Davi da Brasil Móveis, abreviava, Davi Brasil. E quando foi pra fazer o santinho ele nem me consultou, ele foi lá e mandou fazer o santinho Davi Brasil. Ai pegou, Davi Brasil. Até não foi legal pra mim na época porque eu fiquei sem identidade, porque antes era Davi da Brasil Móveis, de repente Davi Brasil, só as pessoas que viam que entendiam, outros não. Depois eu fui muito cobrado por isso. Mas pegou, ficou uma marca, agora já é uma marca registrada, né, Davi Brasil. Aí pegou o Brasil, agora se eu tirar aí que perde a identidade, né (risos), então é isso aí.
P/1 – Você falou sobre o Brasil, a paixão pelo país, apesar dos pesares.
R – Sim.
P/1 – Quais são seus sonhos?
R – Os meus sonhos? Os meus sonhos, lamentavelmente (risos), até eu costumo dizer que me jogaram numa praia errada (risos) porque o sonho da minha imaginação é um mundo diferente onde eu vejo as pessoas realmente se amarem, as pessoas se confraternizarem, as pessoas andarem de mão dada, um mundo de prazer, de alegria, de satisfação e de união. Então, esse é o meu mundo. Porque quando eu disse lamentavelmente, infelizmente, voltando pro lado da nossa política e os políticos... Tem um colega que eu quero dar bronca nele porque quando ele comenta das barbaridades, das falcatruas dos políticos, aí ele dá bronca no eleitor: “Tá vendo? Olha aí, isso é vocês que não sabe votar, não sabe votar”. Eu quero perguntar pra ele se ele sabe o que ele está fazendo votando na pessoa que está votando se ele nunca jogou um voto dele fora, nunca se decepcionou com um político. Porque, lamentavelmente, a situação que está aí vai acreditar em quem, qual é a sua garantia que você deve acreditar e votar?
P/2 – E profissionalmente?
R – Eu profissionalmente? Não, profissionalmente, graças a Deus, é igual eu questionei antes, se fosse ter pendido pra outros lados eu teria feito zootecnia, veterinária, agronomia ou então peão de rodeio, cantor, mas entre a comunicação e a marcenaria também eu sou muito realizado. Tanto que é até polêmico, as pessoas que me admiram na marcenaria acham que eu devia largar o microfone pro lado. Os que me admiram no microfone: “Não, larga a marcenaria pro lado, vai pro rádio, vai pra televisão”. Porque até então esse espaço eu tenho em aberto, nós temos quatro rádios em Paracatu, tem um canal de televisão, todos esses espaços estão abertos pra mim, mas não quero me envolver muito pra não restringir meu tempo. A exemplo, a feira acontece também no domingo, o pessoal do domingo dá bronca em mim porque eu não acompanho eles no domingo. Eu falo: “Não, se eu for acompanhar no domingo, eu não vou ter um dia na semana pra mim”. Então eu não quero tumultuar. Eu já vivi essa ansiedade quando mais novo, na época entre os 20 e 30 eu tive essa ansiedade de querer correr atrás e ganhar dinheiro e ficar rico. Depois, lá pros 30 eu sosseguei minha mente, falei: “Não, pera aí, eu dando conta de cumprir com minhas obrigações, sem te rabo preso, entra e sair e não ter que questionar, tá bom demais. Então, eu não quero muita preocupação visando ganhar dinheiro e ficar rico, não. A minha riqueza é espontânea, é a satisfação e o entendimento que Deus me deu da vida, de entender que a vida é uma sequência de fases, que a gente deve obedecer isso aí e conformar com o que realmente Deus proporciona na sua vida. Porque se hoje eu não tenho mais é porque não fui merecedor, então é agradecer o que ele já proporcionou na minha vida. Então, sou realizado, sou contente e tenho mais pra agradecer do que pra poder reclamar e questionar. Obrigado, Senhor e a vocês também (risos).
P/1 – Esse é um projeto do Museu da Pessoa financiado pela Kinross. O que você acha, qual a importância da Kinross promover um projeto com base nas memórias das pessoas?
R – É louvável sim, é interessante, porque, como eu já mencionei, eu acredito muito na promoção e na valorização do ser humano. Realmente a gente vive num país capitalista onde às vezes a ambição fala mais alto do que a razão, onde o grande sempre querendo mais e o pequeno diminuindo mais. Eu acho que isso aí deveria ser ministrado de uma forma mais interessante pra dar oportunidade também pro menor pra poder também se fortalecer, pra poder crescer. Infelizmente isso acontece mas na minoria. Então é um trabalho interessante, importante da Kinross em prol da nossa sociedade paracatuense quanto à promoção das pessoas, à valorização e o resgate da história de Paracatu porque realmente é uma cidade histórica, né? Tem muitas pessoas que realmente fazem parte dessa história e que devem de ser vistas e reconhecidas. Quer dizer, não me vangloriando, obrigado por ter me visto como uma dessas pessoas, mas tem muitas outras pessoas que realmente merecem ser vistas e reconhecidas e guardadas nessa memória. Então, parabéns à empresa Kinross porque vocês sabem que é uma empresa polêmica na cidade, não só na cidade, mas no mundo, porque ela é internacional, mas tem seus benefícios sim para o nosso município, pra nossa cidade, pro povo de Paracatu. Porque a qualquer momento que ela fechar as portas aí vai ter muita gente que vai lamentar, está trabalhando há tanto tempo, até então já serve como ponte. Quer dizer, poeira, antes não existia poeira, agora só existe poeira depois da Kinross? Então tem uns que por picuinha se apega nessa tecla aí pra provocar, pra denegrir. Não, eu não vejo por isso. O índice de doença, o câncer, por exemplo: “Ah, porque Paracatu é mais, é a Kinross que está matando”. Gente, as cidades circunvizinhas, Unaí, João Pinheiro, o índice lá está maior do que em Paracatu e a Kinross não está lá, entendeu? Então, acho que é isso que eu falo pra você, o meu mundo, no mundo da minha imaginação é diferente, não existem essas picuinhas, as pessoas se entendem, vivem em harmonia, sempre promovendo o bem dos seus semelhantes, então isso é o mundo que eu imagino. E eu vejo isso também na empresa, ela preocupa também com o lado social do ser humano. Então parabéns, parabéns vocês pelo trabalho.
P/2 – É a gente que agradece.
P/1 – Em nome do Museu da Pessoa e da Kinross nós agradecemos a você por ter participado e contado sua história, muito obrigado.
R – Bacana, obrigado vocês.
[Conversam sobre músicas de Paracatu]
P/3 – Se você fosse, não tem erro, tá? Mas se você fosse fazer uma abertura, como se fosse uma locução que você faz na feira, tal, como é que você faria essa narração? Bom dia, Paracatu!, só pra ver como fica.
R – Legal. Começando o filme? Eu vou fazer como se vocês estivessem chegando lá na feira. Legal. E lá eu começo assim: “Bom dia, Brasil, bom dia, Paracatu e a todos que estão me ouvindo com muito carinho, um bom dia especial de Davi Brasil! Hoje é sabadão, começa mais uma edição da nossa Rádio Feira trazendo pra você música, informação e muita descontração. E hoje nesta manhã gostosa e abençoada, marcando presença e abrilhantando a nossa manhã de sabadão, a equipe da Kinross, inclusive realizando aí um filme sobre Paracatu”. Dei uma atropelada aí.
P/3 – Não, perfeito! Eu só queria fazer esse teste. Obrigado, está ótimo! (risos).
FINAL DA ENTREVISTA
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