Projeto Memória da Televisão Brasileira
Associação do Pioneiros da Televisão Brasileira/Museu da Pessoa
Entrevista com Murillo Antunes Alves
Entrevistado por Luís André do Prado e Sara Mendonça
Estúdio Lemos Brito
São Paulo, 23 de julho de 1997
Entrevista nº 04
Transcrito por Rosália Mar...Continuar leitura
Projeto Memória da Televisão Brasileira
Associação do Pioneiros da Televisão Brasileira/Museu da Pessoa
Entrevista com Murillo Antunes Alves
Entrevistado por Luís André do Prado e Sara Mendonça
Estúdio Lemos Brito
São Paulo, 23 de julho de 1997
Entrevista nº 04
Transcrito por Rosália Maria Nunes Henriques
P/1 - Então, vamos começar com a sua identificação, nome, data e local de nascimento.
R - Eu sou Murillo Antunes Alves, nasci em Itapetininga e, pelo que me contaram posteriormente, por volta do meio dia e meia do dia 28 de abril de 1919, já se lá vão quase oitenta anos.
P/1 - Bom, vamos falar um pouco sobre as suas origens, eu gostaria que o senhor falasse sobre os seus avós, pelo lado paterno inicialmente, depois o lado materno. O que é que o senhor conhece de história das duas famílias?
R - Bom, evidentemente toda essa parte do meu depoimento é por ouvir dizer. Logo que eu nasci, posteriormente me contaram vários dados referentes ao meu nascimento e com referência às minhas origens paternas e maternas. Mamãe, Florisa Piedade Alves, nasceu em Sarapuí, é uma cidadezinha perto de Itapetininga, e meus avós maternos eram Olegário Eugênio da Piedade e Francisca Cerqueira da Piedade. Agora, do lado paterno eu não cheguei a conhecer o meu avô, ele morreu quando eu era ainda muito criança, sei que se chamava Leopoldino Alves Carriel, segundo papai me contou. Agora, minha avó paterna era Maximiana Antunes, mas eu já a conheci como Maximiliana Antunes Pontiani, porque ela, vamos usar a palavra um pouco pedante, ela convolou segundas núpcias e casou com um italiano que fora morar em Itapetininga, Luigi Pontiani. Portanto aí estão: mamãe, Florisa, e papai, Antônio Antunes Alves, professor de História e exerceu vários cargos no magistério, inclusive foi diretor da Escola Normal Peixoto Gomide de Itapetininga, que era um dos tradicionais estabelecimentos de ensino secundário do nosso Estado, porque a Escola Normal de Itapetininga foi criada conjuntamente com a Escola Normal de Casa Branca. Mais alguma informação?
P/1 - Murillo, no caso dos seus avós, você sabe dizer as atividades que eles exerciam?
R - Claro, o meu avô materno, que eu conheci, se a gente fosse usar a expressão daquela época, ele no fundo começou a viver como tropeiro, porque naquela região de Itapetininga, cidade onde eu nasci, as pessoas que se dedicavam às atividades rurais também se dedicavam à pecuária e iam às vezes buscar tropas no Rio Grande do Sul. Então o meu avô materno sempre se dedicou às atividades agrícolas e também foi durante, numa certa fase da vida, tropeiro. Agora no que se refere aos meus avós, já falo o meu avô e que não é exatamente o meu avô de sangue, o avô que casou que casou com a minha avó, ele era de origem italiana e era marceneiro. Então chegou lá em Itapetininga, montou uma casa, no começo confeccionando móveis e depois mantendo uma casa mesmo, que vendia móveis, colchões, etc. Foi assim que eu o conheci e foram as atividades que exerceram. No caso dos pais, mamãe foi professora de desenho e papai, já disse, foi principalmente professor de História, foi professor de Atividades Comerciais, foi diretor e fundador da Escola de Comércio de minha terra natal.
P/1 - Os seus pais então nasceram e cresceram, passaram a vida em Itapetininga mesmo, viveram sempre lá?
R - Viveram sempre lá e eu também passei uma certa fase da minha vida, porque se não fosse um fato superveniente, possivelmente eu teria ficado durante muitos e muitos anos na minha terra natal. Mas acontece que quando terminei o grupo escolar, mamãe e papai, ligados às atividades do magistério, achavam que eu deveria fazer um curso secundário, depois um curso superior e não havia ginásios naquela época no interior, a gente tinha que vir fazer o curso ginasial em São Paulo. Então o exame para entrar no ginásio era feito no Ginásio do Estado, na capital, e mamãe, que sempre teve muita visão das coisas, resolveu então que eu viesse estudar em São Paulo como interno no Colégio São Bento, que era um dos renomados colégios daquela época. Então, em 1931 passei nesse exame, não era bem um vestibular, era um exame de seleção para entrar no ginásio, e fiz o primeiro ano ginasial no Colégio São Bento. Nesse entretempo foi criado o ginásio na minha terra natal, Itapetininga, Ginásio de Itapetininga, então o segundo ano eu já passei a fazer pra lá, me transferi do Colégio São Bento para Itapetininga. E fiz o meu curso secundário, formei no ginásio em 1935, e aí depois vim para São Paulo para fazer o meu curso na Faculdade de Direito. Agora uma imodéstia, mas já que isso aqui é um depoimento com o coração nas mãos, eu sempre fui o primeiro da minha turma, no ginásio, no grupo escolar e na Faculdade de Direito do São Francisco, onde me formei em 1943, numa turma, na formatura, de 216 alunos. E modéstia à parte, eu tirei todos os prêmios, Carvalho de Mendonça, Theodorico de Carvalho, Rodrigues Alves, Instituto dos Advogados, Associação dos Advogados e outros.
P/1 - Murillo, vamos falar um pouco da personalidade de seu pai, que também foi uma pessoa ligada às letras, porque além de professor foi jornalista.
R - Aliás, o que aconteceu com papai foi um fato curioso, porque eu sempre me senti atraído para a imprensa por um fato curioso. Desde criança, papai era correspondente do “Correio Paulistano” em Itapetininga, o “Correio Paulistano” era o órgão oficial do PRP [Partido Republicano Progressista]. Papai tinha atividades políticas, foi vereador uma certa fase da vida lá em Itapetininga, então ele, como correspondente, eu o surpreendi muitas vezes naquela época, ainda as máquinas de escrever não havia em grande quantidade no interior, ele enviava a correspondência para o jornal manuscrita. Então eu o via muitas vezes, sentava lá, fazia as notícias de Itapetininga e mandava para o “Correio Paulistano”. Depois, houve uma certa fase na vida que ele deixou o “Correio Paulistano” por motivos políticos e até por certo parentesco, porque o meu lado materno, nós tínhamos ligação com a família dos Cerqueira César, então chegamos até a candidatura do Armando de Salles Oliveira, porque ele também era ligado à família do Júlio de Mesquita, que era casado com uma Cerqueira César, e por isso papai acabou sendo correspondente do “O Estado de São Paulo”. Aí nós já estávamos por volta de 1934, 35. Então ele mandava correspondência para o “Estado”, e eu, como o via se dedicar à imprensa, resolvi fundar uma espécie de jornalzinho, em retalhos de papel, chamado “O Juca Pato”. O Juca Pato era aquele boneco criado pelo Belmonte. Então eu fazia “O Juca Pato”, eu copiava dos jornais o que tinha no jornal, eu fazia uma espécie de jornal com manchete, e sabe, o único exemplar do jornal eu entregava para a minha cozinheira, que era analfabeta, que ela levava para as filhas que liam em casa e ela gostava daquilo. Bom, então eu sentia aquela atração. Quando eu estive no ginásio, em 1933, já no terceiro ano do ginásio, alguns colegas tiveram a ideia de fundar um jornal estudantil. Eu tinha um padrinho que era dono de um cinema em Itapetininga e tinha uma gráfica, era uma máquina rudimentar mas imprimia uma espécie de um boletim semanal lá. Eu consegui com ele autorização para fazer um jornal e fundamos o jornal, eu e mais três colegas, chamado “O Arauto”, esse jornal circulou em 1933, 1934 e 1935. Aí eu vim para São Paulo e aqui também continuei com aquela ideia, e resolvi manter um jornal aqui chamado “O Itapê”, que era diminutivo de Itapetininga. Esse jornal também circulou por umas três ou quatro vezes. Mas então, as minhas primeiras lides jornalísticas foram nesse jornal manuscrito para a cozinheira, de um exemplar só, com “O Arauto”, jornal estudantil e posteriormente com o “O Itapê”. Nessa época eu me sentia muito atraído pela correspondência do jornal “O Estado de São Paulo”. E eu então comecei lá em Itapetininga nas férias, papai não pode fazer, eu mandei umas correspondências para o jornal. De repente papai resolveu desistir, achava que não havia mais interesse, disse que não queria ser mais correspondente do “O Estado”, então eu me candidatei a substituí-lo. Eu, àquela época, devia ter uns 16 anos, vim pra São Paulo, procurei o chefe da seção do interior do jornal “O Estado de São Paulo”, que era o Rodrigo Soares de Oliveira. Quando me anunciei como correspondente do “O Estado”, como pessoa que mandava a correspondência no lugar de papai, ele estranhou, porque ele entrou numa sala e falou: “Quem é Murillo?”, “Eu.” “Mas não pode ser. Você tem 16 anos? Você que mandou aquelas correspondências e tal?”. Ele se entusiasmou, porque eu fiz o seguinte, descobri uma mina, em Itapetininga havia um jornal que começara a ser editado no fim do século passado, chamado “A Tribuna Popular”, então como vi que o “O Estado” tinha certa queda pelos fatos históricos, eu comecei a transcrever fatos do arquivo tirado, então eu mandava assim “Como Itapetininga recebeu a proclamação da República”. “O Estado” chegava a publicar um quarto de página com toda aquela matéria. Então ele acabou concordando, gostou muito, e eu fiquei correspondente do “O Estado” por uns três a quatro anos. Mas como tinha vindo para São Paulo para estudar, e aí que vem o problema, eu fui, procurei o Rodrigo, disse: “Rodrigo, a única paga que a gente recebe é o jornal de graça”, eu recebia lá em Itapetininga o “O Estado”, porque não havia remuneração do correspondente. Então eu cheguei aqui, como vim estudar aqui, disse: “Rodrigo não daria pra você em vez de mandar o jornal para Itapetininga mandar aqui para São Paulo?” “Mas como você vai ser correspondente de lá morando em São Paulo?” “Não, mas papai continua lá, qualquer fato urgente ele mesmo prepara a matéria e manda. E se normalmente der tempo eu preparo”. Porque eu escrevia no jornal de lá, recebia o jornal de lá, então eu cozinhava, para usar a expressão, fazia o noticiário e entregava no “O Estado”. E assim continuei durante quase três anos correspondente em Itapetininga mas morando em São Paulo. Eu ia todo final de semana para lá. Aí aconteceu um fato novo: começou a guerra, em 1º de setembro de 1939, e uns quinze dias depois eu fui chamado pelo Rodrigo, que disse assim: “Murillo, gostamos muito do seu trabalho, está tudo cem por cento, mas não vamos mais poder fornecer o jornal pra você, porque com a falta de papel, agora com a guerra, está havendo uma restrição geral e todas as assinaturas de graça estão sendo canceladas, mesmo para os correspondentes”. Então aí eu falei: “A única paga que eu tinha era receber o jornal, se eu não posso receber o jornal...”. Então deixei de ser correspondente do “O Estado de São Paulo”, isso foi nos fins de 1939. Aí então estava começando a minha atividade no rádio. No rádio eu comecei dia 1º de outubro de 1938, na Rádio São Paulo, naquele tempo o prefixo era PRA5. Às suas ordens, Luís.
P/1 - Antes de a gente entrar nessa parte mais profissional, eu queria que senhor falasse um pouco do ambiente da sua casa, quer dizer, lá em Itapetininga, quantos irmãos, como é que era o dia a dia da família.
R - Eu tinha apenas, tinha e tenho, graças a Deus, uma irmã chamada Marília. Ela foi para o magistério. Enquanto eu vim para São Paulo e ingressei na Faculdade de Direito, ela fez a Escola Normal de Itapetininga, diplomou-se como professora, foi uma excelente professora de História, porque papai também sempre se especializou em História, depois alguns anos decorridos. Marília que era o nome da minha irmã, papai se inspirou no nome de Marília de Dirceu, como no meu caso também, Murillo e Marília, porque muitos espanhóis dizem: “Mas é Murílio?” Eu assino Murillo com dois “éles”, mas Murillo porque era o pintor famoso Bartolomé Esteban Murillo. Então a minha irmã, professora de História, quando se transferiu para São Paulo também foi professora aqui no Instituto de Educação Caetano de Campos, foi professora de História no Colégio Porto Seguro, e até tem uma particularidade, porque foi professora de História da atual rainha Sílvia da Suécia, porque ela estudava lá, foi aluna de minha irmã. Ela até hoje está bem, graças a Deus, bem disposta, aposentada, mas ela se aposentou no magistério como professora. Agora, na minha casa, papai sempre foi uma pessoa muito trabalhadora, muito conservadora, ele comprou alguns imóveis em Itapetininga, mas mamãe, embora tendo nascido numa cidade pequena, que era Sarapuí, ela sempre teve muita visão das coisas, ela antecipava coisas curiosas. Uma certa fase da vida ela achava que eu deveria vir, por exemplo, porque é que eu não entrava na Marinha? Ela achava Marinha muito bonito, queria que eu fosse engenheiro naval. Mas nunca deu certo isso, depois ela começou a insistir: “Não, você tem que fazer um curso superior”. Naquela fase todo mundo ou era engenheiro ou era médico ou era advogado. E eu senti mais vocação talvez para a advocacia e vim para São Paulo. Às vezes o papai dizia: “Fica em Itapetininga, você estuda aqui mesmo”. Mas mamãe não, ela sempre queria do bom e do melhor. Quando foi na época do ginásio uma das idéias foi essa: “Mas vai pra São Paulo, faz o ginásio do Estado” “Não, vai ser o Colégio São Bento”. E ela, pela visão que teve, porque foi muito interessante, porque embora eu tenha feito só um ano no colégio São Bento, com o passar do tempo eu tive depois várias figuras importantes da vida política, vida administrativa, que foram meus colegas no São Bento, Sérgio Pinho Mellão, o Hélio Motta, foram todos meus colegas naquela época. E assim, com esta visão, ela também queria do bom e do melhor para mim. E em matéria de casa, agora aqui vai uma confidência que eu nunca fiz, mas papai numa certa fase da vida pretendia construir uma nova casa, porque a casa em que nós morávamos já tinha ficado um pouco antiquada, então ele comprou um terreno por insistência de mamãe, na praça principal de Itapetininga, no Largo da Matriz, ao lado da igreja. Papai foi um dos construtores da igreja matriz de lá, ele foi o tesoureiro da comissão, o vigário da época, Padre Brunetti queria fazer uma nova igreja e procurou Benedito Calixto, este arquiteto que projetou também a Basílica de Nossa Senhora da Aparecida. A igreja de Itapetininga foi feita antes e tinha muito das linhas, embora em menor escala, da Basílica de Aparecida. Mas logo que começou a campanha para arrecadar fundos para a igreja, o vigário morreu, o Padre Brunetti e papai, que era o tesoureiro praticamente, ficou responsável por tudo e conseguiu levar a bom termo e fez a igreja, que é uma das grandes igrejas do interior. E o nosso terreno era ao lado e naquela época, o papai sempre muito seguro, muito objetivo, queria procurar alguns arquitetos em Itapetininga para projetar a casa, mas mamãe disse não: “Tem que ser o melhor arquiteto”. No momento, naquela época, um dos mais renomados arquitetos de São Paulo era Alfredo Ernesto Becker, que tem muitos desses palacetes tipo bangalô projetados por ele. Então o que é que aconteceu? Mamãe resolveu vir procurar o Alfredo Ernesto Becker, insistiu, insistiu, custou para marcar hora, porque ele era muito sobrecarregado, um dia ele recebeu, isso ela que me contou depois: “Eu vim de Itapetininga”, mostrou tudo isso. Ele disse: “Olha, minha senhora, eu mal dou conta do que eu tenho pra fazer aqui, eu não tenho condições de fazer”. Ela insistiu, insistiu, resumo da ópera: tantas vezes que ela veio que ele disse: ”Vou abrir uma exceção, eu vou fazer”. Ele projetou a casa, depois ele se entusiasmou com a construção, inclusive os lustres, a parte toda de ferragem que tem no portão, ele desenhou tudo e ficou sendo, com o tempo depois eu vou lhe mostrar a fotografia, eu tenho a fotografia até hoje, que é uma coisa rara de acontecer e não é pra mostrar agora, mas você pode guardar no arquivo. Ficou uma casinha interessante. Bom, pela visão de minha mãe foi a mesma coisa, eu vim para a Faculdade de Direito, me formei e terminei o curso em 1943.
P/1 - Como professor parece que a vida do seu pai economicamente sempre foi estável, um bom nível, um bom padrão.
R - Não, foi, porque ele sempre foi muito trabalhador e ele não se limitou, porque, sabe, que o magistério depende muito de vocação também, mas a remuneração sempre fica aquém talvez das reais necessidades. Mas é que o papai além de ser professor da Escola Normal, ele mantinha outras atividades, ele se aperfeiçoou também, naquele tempo chamava-se escrituração mercantil, chegou a ser contador, fez um curso de contador e em 1921 ele fundou com outros colegas a Escola de Comércio de Itapetininga. Então ele lecionava na Escola Normal e também lecionava na Escola de Comércio, que era particular. E depois, com o passar do tempo, ele sempre foi muito prestativo, era presidente de Associação Vicentina, fazia parte lá do Asilo São Vicente de Paula, exercia essas atividades locais, mas também professor, depois essa associação Escola de Comércio junto com o ginásio fundado em 35, onde ele também lecionou, tudo incorporado deu origem à Associação de Ensino de Itapetininga, da qual ele foi um dos cotistas, parece que eram vinte professores. Então até hoje eu tenho uma cota da Associação de Ensino de Itapetininga, que herdei de papai.
P/1 - Vamos lá pro rádio então. O senhor entrou em 1938 na Rádio São Paulo. Como é que se deu essa entrada? Porque razão o senhor foi acabar parando lá?
R - Bom, naquela época, nas cidades do interior havia a mania de serviços de alto-falante. Então, geralmente na praça principal, e com o passar do tempo... Em Itapetininga foi na Praça Marechal Deodoro, que era conhecida popularmente como Largo dos Amores, porque à noite os casais iam lá fazer o footing, namoro, etc. Então havia um serviço de auto-falantes que era lida a publicidade comercial e tocava música, era uma espécie de estação de rádio só para o local. E eu, estudante, me senti atraído e acabei sendo locutor nesse serviço de auto-falante durante quase um ano. Então, quando eu vim para São Paulo eu me senti: “Olha, eu vou tentar rádio”, pensei em tentar o rádio. Nos primeiros instantes não foi muito fácil e eu acabei também trabalhando num serviço de auto-falante na Rua Direita, quase na Praça da Sé, que funcionava à noite. Fiquei lá acho que uns dois ou três meses, mas trabalhei como locutor lá. E comecei a procurar uma forma de poder entrar em rádio. Me ensinaram que normalmente, naquela época, quem queria entrar em rádio tinha que fazer teste, às vezes fazia concurso para entrar em rádio e havia as rádios mais conhecidas: a Rádio Educadora, eu cheguei a fazer um teste lá, normalmente a gente passava, dizia assim: “Ah, tá muito bom, deixa seu nome e endereço”. E fui deixando. Acontece que trabalhava em rádio naquela época, e nós já estávamos em 1938, eu estava no pré-jurídico do São Francisco, trabalhava na Rádio São Paulo um músico itapetiningano muito conhecido naquela época, chamado Pinheirinho, ele tocava muito bem bandolim e cavaquinho. A particularidade é que o Pinheirinho era irmão de uma grande brasileira e itapetiningana que foi talvez a primeira aviadora aqui no Brasil, que era a Anésia Pinheiro Machado, ainda está viva, deve estar beirando os cem anos atualmente. Então o Pinheirinho, irmão da Anésia, trabalhava na Rádio São Paulo, e eu fui procurá-lo um dia e falei: “Pinheirinho, gostaria de trabalhar em rádio” “O problema é que é difícil, tem muita gente querendo trabalhar em rádio”. Aí inaugurou-se a Rádio Cultura, a Rádio Cultura naquela época era no Jabaquara, eu fui lá, fiz concurso, passei também, fica o nome, mas não me chamavam. No dia 30 de setembro de 1938 eu passei, eram três ou quatro horas da tarde na Rádio São Paulo, que era na Rua Sete de Abril, quase em frente onde depois veio a ser a Rádio Tupi, era ao lado da Biblioteca Municipal, aquilo tudo já foi demolido... Mas eu passei e encontrei: “E aí Pinheirinho, nada de novo?” ”Escuta, sabe que hoje de manhã aqui dois locutores brigaram com a direção...”. E se a memória não me falha um era o Zé Ferreira Fontes, que foi um locutor famoso da época, e o outro parece que era o Ribeiro Filho. Então os dois tiveram um confusão e pediram demissão. Então ele falou: “É possível que haja uma oportunidade.”. Então ele me levou lá, me apresentou, o diretor da época, que me atendeu, Pedro Edmundo Santoro, foi diretor comercial da Rádio São Paulo, depois trabalhou na Rádio Record. Eu conversando com o Santoro, ele disse: “Bom, o senhor tem prática?”, “Eu já falei no interior” “Então vamos fazer um teste”. A Rádio São Paulo tinha uma espécie de auditório e o estúdio era separado por um vidro, e as pessoas assistiam a programação num auditório pequeno ali na Rua Sete de Abril. E eu me lembro como se fosse hoje, no auditório sentaram Antonio Toledo Passos, que também depois foi diretor da Rádio São Paulo, o Pedro Edmundo Santoro e o Armando Bertoni, que era diretor artístico da Rádio São Paulo. Então eu entrei lá no estúdio para fazer o tal teste e quem entrou comigo para me apresentar e fazer perguntas foi o Waldemar Cilioni, eu me senti à vontade porque o Waldemar Cilioni tinha feito o teste comigo lá no Jabaquara, na Rádio Cultura. E o Cilione então começa: “Leia aqui”, porque naquele tempo, é bom que se ressalte, naquela fase do rádio, era proibido o improviso, não podia haver improviso no rádio, não havia “jingle”, não havia “spot”. Então tudo o que era apresentado o locutor tinha que ler, porque gravação também não havia, só havia gravadores de acetato, eram uns discos grandes, gravação mecânica, não era eletrônica. Então a gente tinha que ler. Ele começa: “Anuncia esse programa aqui”. Então tinha a programação, programa de música americana: “Vamos ouvir agora Cole Porter, não sei o quê, Orquestra de Glenn Miller” e anunciava. E ele dizia: “Agora leia essa notícia”. Tinha muita notícia, depois: “Leia os anúncios”, porque os anúncios vinham já separados por intervalo, o locutor tinha que pegar aquilo: 4º anúncio, “Casimira nobre, não sei o quê, Casa dos Quaquás anuncia a Roda Sorte”, mil anúncios. Eu fiz tudo aquilo, aí veio a parte final, a presença de espírito me ajudou. Todo teste para locutor eles queriam que fizesse improviso. Então o Cilioni disse assim: “Agora você vai fazer um improviso, você está aqui no estúdio, de repente chega na rádio o ministro da guerra”. Naquele tempo não era ministro do exército, era ministro da guerra. “Como é que você anunciaria a presença dele?” Eu meio brincando disse assim... eu não me lembro agora o nome do ministro da época, mas naquela ocasião eu perguntei: “Como é o nome do ministro da guerra?” O Cilioni colhido de improviso: “Não interessa, não precisa dizer o nome, diga lá”. Eu disse: “Eu sei, o ministro da guerra é o general fulano de tal”. Eu já vi que os que estavam me olhando lá acharam graça no auditório, então eu falei: “É com enorme satisfação que registramos no nossos estúdio a presença da sua excelência, o general fulano de tal, ministro da guerra”. Então gostaram. Eu saí, aí o Santoro, que era quem me recebeu, levou lá para a sala dele e me disse: “Me diga uma coisa, o senhor pode começar amanhã?” “Pois não”. Isso foi em 38, você vê, lá se vão quase sessenta anos, ele disse uma coisa que o tempo não mudou. Ele disse assim, eu não me lembro, vamos supor que se fosse hoje, eu tinha pensado ”Vou ganhar pelo menos uns quinhentos reais ou mil reais, pelo menos”, pensei. Chegou lá ele disse assim: “Bom, Sr. Murillo, o senhor não tenha grandes ilusões em matéria de ordenado, em? Nós só vamos poder pagar pro senhor cento e cinquenta reais”, por exemplo. Naquele tempo era cento e cinquenta mil réis talvez. Porque ele disse isso: “Se eu sair aqui na porta e disser que eu preciso de um locutor, tem gente que paga para trabalhar em rádio”. Isso não mudou muito, continua ao longo dos anos. Bom, aí no dia seguinte eu comecei e o primeiro programa que eu fazia, me deram o horário das cinco às seis, o programa “Broadway Melody”, então só de música americana. Então todo dia eu fazia. No mesmo dia, na outra vaga estreou Geraldo José de Almeida. O Geraldo era locutor do Rio de Janeiro, tinha vindo pra São Paulo e como tinha essa vaga, eu fazia das cinco às seis e o Geraldo ficou com o horário das seis às oito, porque “A Hora do Brasil”, naquele tempo “Voz do Brasil”, era às oito horas da noite. Então estreamos no mesmo dia, eu das cinco às seis e o Geraldo das seis às oito.
P/1 - Bom, eu queria fazer uma pergunta que volta no tempo, quando que o senhor descobriu que tinha esse talento da locução? Foi fazendo essa locução lá em Itapetininga?
R - Primeiro aí eu faria um juízo de valor, que me tornaria imodesto saber quando é que eu descobri esse talento. Eu não sei se descobri talento, talvez eu descobri a vocação. Eu gostei, não sei porque, eu acho que era mais pela parte da notícia, da informação, eu gostava de dar notícia, transmitir, etc. Então eu me sentia atraído mais talvez por isso. Até vou contar um caso curioso: em 1938 houve a célebre final do campeonato mundial de futebol que o Brasil acabou depois perdendo e eu cheguei lá em Itapetininga no serviço de auto-falante, porque, se a memória não me falha, quem transmitiu o jogo naquela ocasião era o Galeano Neto, transmitiu da França etc. E eu cheguei a fazer o seguinte, eu ouvia a irradiação dele e transmitia pelo auto-falante de Itapetininga, acompanhando o jogo, “Está terminando o primeiro tempo.” e não sei o que mais, então fazia o noticiário daquilo. Eu sempre gostei e fui para o rádio, mais pela celeridade da informação, pelo desejo, embora, repito, era proibido o improviso, a gente tinha sempre que fazer, tudo era datilografado e arquivado. E naquela época havia o Departamento de Imprensa e Propaganda, o Dip, nos Estados o Deip, a gente chegava no estúdio, o locutor sempre tinha fixado atrás assim: “É proibido noticiar”, vinha a relação, coisas curiosas, como por exemplo, “é proibido noticiar o atropelamento de uma doméstica por um carro oficial no Rio de Janeiro”. Então não havia a parte de improviso. E quando começou a guerra, aí que vem um fato curioso, a guerra começou em setembro de 39, eu sempre tive uma queda pela informação, eu estava na Rádio São Paulo fazendo o meu programa quando começaram as notícias que começaram a guerra, conversei pelo telefone, falei com o Santoro que era o diretor, ele disse: “Como é que nós vamos arranjar notícias?” “Eu vou tentar ouvir por alguma emissora do exterior”. E aí que eu descobri que na Rua Sete de Abril havia uma agência telegráfica alemã chamada Transocean, que depois fechou, mas era alemã. Mas eu telefonei pra lá porque era perto, era a uns três quarteirões de lá: “Vocês não poderiam fornecer alguns telegramas pra gente aqui” e eles evidentemente tinham interesse, porque era a versão mais ou menos alemã da coisa, e começou a mandar, fiquei o dia todo quase, eu mesmo assumi a coisa e fui fazendo a cobertura do primeiro dia da guerra. Teve tanta repercussão, foi a primeira vez que, como eu diria, talvez que eu filei bóia, quando chegou uma certa hora o Sr. Santoro falou: “Olha, parabéns, formidável e tal”. Aí eu falei: “Só que tem uma coisa, eu não almocei ainda. Eu estou desde cedo, desde as oito horas”. “Não, está aqui, pega um vale e vai lá no Restaurante Palhaço”, que era um restaurante famoso, eles tinham permuta, fui lá, fui almoçar no Restaurante Palhaço por conta da primeira guerra.
P/1 - Vamos começar então falando da sua entrada na Bandeirantes como primeiro locutor esportivo e depois a gente faz esse painel aí dessas outras passagens pelas outras rádios.
R - Pois não. O que acontece é o seguinte, como já disse, eu estreei na Rádio São Paulo, no mesmo dia que o Geraldo José de Almeida. E o Geraldo já tinha iniciado a sua carreira no Rio de Janeiro, inclusive com propensão para cobertura dos acontecimentos esportivos, principalmente futebolísticos. Então ele estava na Rádio São Paulo e uma tarde ia haver aqui uma final do campeonato entre paulistas e cariocas, no Parque Antárctica, um jogo noturno, e o Geraldo achou, “Porque é que a Rádio São Paulo não transmitiria aquele jogo?”. Então procurou o Santoro, que era o diretor, mais o Toledo Passos, que era a parte comercial, e o Tom Biu, que era um italiano, ele fazia humorismo, mas era corretor de anúncios, naquele tempo as agências de propaganda ainda estavam iniciando as atividades com o rádio, eram principalmente os corretores que arranjavam. Então o Tom Biu e o Armando Bertoni é que arranjavam patrocínio para a Rádio São Paulo. E eles se entusiasmaram com a ideia do Geraldo e de repente arranjaram patrocinadores para transmitir o jogo, e ainda foram além, a Rádio Tupi e a Rádio Record foram convidadas pra fazer uma espécie de “pool”[“associação”], para irradiar junto, e toparam. Mas aí quando foram executar, tomar as providências para transmissão do jogo, surgiu um fato, é que a Organização Byington, que era a Rádio Cruzeiro do Sul e a Rádio Cosmos, eles tinham exclusividade das transmissões de futebol nos campos, tanto que todos os campos daqui: Parque Antárctica, Parque São Jorge, Pacaembu, tanto que eles tinham cabines ali nas gerais que era para a Rádio Cruzeiro do Sul e Rádio Cosmos para transmitir os jogos. Então, quando eles já tinham vendido, arranjado patrocinador e tudo isso, chegaram no Parque Antárctica: “Não podem entrar e não podem irradiar, é proibido”. O Palmeiras, naquela época era Palestra, os diretores do Palestra não quiseram comprar briga, disseram: “Olha, da nossa parte nós não temos nada a objetar mas temos um contrato em vigor, não podemos autorizar”. E aí o Geraldo e outros tiveram a ideia de alugar uma casa na Rua Turiassú, com vistas para o campo, era um sobrado, e depois tirar as telhas, tinha visão para o campo e resolveram escalar três locutores pra ajudar o Geraldo nesse jogo, nessa transmissão noturna. Então foi o Renato Macedo pela Rádio Record, o Ribeiro Filho já estava na Tupi, e eu que era um novato, tinha um mês e pouco de rádio. E como o Geraldo era da Rádio São Paulo, eu fui com o Geraldo. Chegando lá, um sacrifício danado, porque nós tínhamos que ficar de cócoras, abaixo das telhas, para não perturbar o Geraldo, e o Geraldo olhava por cima. E nós com uma lanterna para ler os anúncios, porque o Geraldo não tinha tempo de ler lá em cima. Acontece que o corretores, o Tom Biu, principalmente, eles queriam orientar a turma, que é aquele negócio: “Lê com entusiasmo”. Chegou lá na hora, uma hora de cócoras, o Ribeiro começou a ler o anúncio, até abaixar, pegar lá, ele começou: “A Casa dos Quaquás...”, o Tom Biu: “Lê depressa”, ele se queimou, disse: “Eu não vou ficar de cócoras” e foi embora. A mesma coisa aconteceu com o Renato Macedo, também achou que estava sendo diminuído e coisa, e sobrei eu. Eu achei melhor ler depressa e comecei a ler depressa os anúncios e fiquei. Quando chegou no intervalo, me lembro como se fosse hoje, e olha que lá se vão sessenta anos, o Geraldo, para descansar, ele tapou o microfone: “Como é o seu nome inteiro, Murillo? Então, enquanto aguardamos o segundo tempo agora os comentários de Murillo Antunes Alves” e me deu o microfone. Eu não tinha visto nada do jogo, estava de cócoras, mas eu peguei e fiz o comentário, evidentemente falei sobre o luar que havia naquela noite, sobre as dificuldades da Record, resumo da ópera, saiu bem. Então foi um sucesso, porque houve a quebra daquele monopólio. Mas aí Organização Byington fez a coisa mais simples do mundo, contratou o Geraldo e assim, o Geraldo acabou de irradiar o jogo, no dia seguinte foi contratado pela Byington. Então na outra semana ia ter jogo de futebol, o pessoal da Rádio São Paulo estava entusiasmado com o sucesso, mas o Geraldo tinha saído. Eu até cheguei a pensar que eu poderia ser locutor esportivo, embora não entendesse nada de futebol, a não ser jogador de futebol, jogava futebol. Mas o Aurélio Campos, que era diretor comercial da Rádio São Paulo, se candidatou e ele passou a transmitir os jogos de futebol. No primeiro momento eu não quis aceitar, ele me convidou para ser comentarista, eu não quis: “Eu não vou ser”. Mas no fim eu vi que ele ia ficar mesmo, aceitei, e nós formamos uma dupla que durou quatro anos de 1938 a 1942. Nessa altura, quatro anos depois, eu estava ansioso para transmitir um jogo de futebol, porque já aí conhecia bem, estava em ordem. Mas não tinha chance, porque o Aurélio sempre ia transmitir e eu ia com ele. Até que, um belo dia, o Aurélio ia casar e o casamento dele foi numa sexta-feira. Então eu pensei, ele casa sexta, domingo ele não vem transmitir, pensei comigo. Mas ele começou a lua-de-mel na segunda-feira, ele irradiou o jogo no domingo. E eu continuei sem oportunidade de transmitir. Até que um dia, um sábado eu fui chamado na Rádio São Paulo, eu sempre falo do Santoro, que foi com quem eu me relacionei: “Sr. Murillo, o senhor tem peito para irradiar um jogo?” Quer dizer, era sopa no mel, ou vice-versa. Eu: “Pois não” “Então amanhã o senhor vai irradiar o Corinthians e Juventus, porque o Aurélio tem um problema dentário, está com o rosto inchado, não pode irradiar o jogo”. Então lá fui eu para irradiar o jogo e levei pra ler os anúncios um locutor famoso da época, que depois foi galã de novela, o Nélio Pinheiro. O Nélio era um excelente locutor de Jaú, mas aconteceu o seguinte, o Nélio não dizia de improviso acho que nem o prefixo da emissora. Então quando chegou na hora que eu comecei a irradiar, passava a palavra pra ele, ele falava um pouquinho e devolvia o microfone. E na hora de começar, você vê, eu me lembro até hoje a escalação do Corinthians, tudo isso, eu sei que era Lopez, Servílio, Teleco, Joane, Carlinhos... Bom, preparei tudo para irradiar o jogo, me concentrei, decorei os quadros. Ao ser dada a saída me deu um branco, porque eu comecei assim: “Vai se iniciar agora, apita o árbitro, Teleco...” e dei uma parada porque eu me atrapalhei, agora eu não sei se acompanho a bola ou o jogador, então eu passei o microfone: “Nélio, diz qualquer coisa”. Nélio pegou: “PRF5, Rádio São Paulo” e devolveu o microfone. (risos) Mas eu fui me controlando e modéstia à parte, o jogo... e saiu boa a irradiação, razoavelmente boa, porque naquela época não havia muito locutor esportivo. O que é que aconteceu? Na noite daquele mesmo dia, no domingo, eu recebi um telefonema na pensão onde eu morava, do Capitão Balduíno, o Capitão Balduíno foi uma figura marcante do rádio, trabalhava na Rádio Bandeirantes, chegou e disse assim: “Murillo, parabéns, eu ouvi a sua irradiação, gostei, você sabe, a Bandeirantes está querendo entrar no futebol, está precisando de um locutor, você não gostaria de vir pra cá?” Eu disse: “Ah, depende, né? “Então eu vou falar com o Nicolini amanhã”. No dia seguinte me chamaram lá, fui convidado e fui o primeiro locutor esportivo da Bandeirantes, isso em 42, já fui ganhando o dobro do que eu ganhava na Rádio São Paulo. Então você vendo a minha biografia, tem uma passagem meteórica por várias estações como locutor esportivo, porque na época o futebol sempre era bem pago, porque haviam anunciantes que se interessavam. Então era um bom negócio para as estações e havia poucos locutores esportivos, porque geralmente eles faziam leilão. Então era
um tal de um ir pra cá, ir pra lá, Pedro Luís, o Geraldo, o Geraldo ficou na Rádio São Paulo, mas depois veio pra Record, o Geraldo veio pra Record e ficou muitos anos na Record. Mas eu estava na Bandeirantes, uns cinco ou seis meses depois, nem isso, a Cultura, que pertenceu aos irmãos Fontoura, me convida para ser locutor esportivo e eu fiquei naquela dúvida e tive a bobagem de telefonar para o Nicolini, disse: “Ô Nicolini, acabo de receber uma oferta da Cultura o que é que você acha? Vocês têm possibilidades de cobrir essa oferta e tal?”. “Eu não faço leilão por telefone” e desligou o telefone. Eu fiquei com raiva e aceitei a oferta da Cultura. Aí fui pra Cultura, depois também de uns quatro, cinco meses, a Gazeta precisou de locutor esportivo, porque o Pedro Luís, que era o locutor, tinha saído, me ofereceu um ordenado daqueles, eu fui pra Gazeta. Fiquei na Gazeta, onde eu fiquei mais tempo, fiquei um ano e meio como locutor esportivo, e como gostava muito de jornal eu me afeiçoei, basta dizer que minha mesa era na redação da Gazeta, eu fiquei mais ligado à “A Gazeta” do que à rádio. E isto me fez um relacionamento muito bom, eu fui muito prestigiado na Gazeta. Aconteceu que depois de um ano e meio eu fui chamado pela Tupi, porque o Aurélio Campos, que era o locutor da Tupi, fora convidado para dirigir comercialmente a Tupi no Rio. E ele acabou indo para o Rio de Janeiro mas aí tem um problema, a Tupi descobriu, o diretor comercial da Tupi, naquela época era o Chico Rizzini, ele descobriu que havia uma cláusula no contrato de patrocínio feito através da McCann Erickson, que o locutor esportivo da Tupi tinha que ter um nome. Então quando o Aurélio foi para o Rio, eles quiseram colocar um locutor desconhecido ou novato, e pelo o que eu soube posteriormente, quando chegou na segunda ou terça-feira a McCann Erickson disse: “Não, tem que ser locutor conhecido pois senão o patrocinador cancela o patrocínio”. Contaram-me depois que perguntaram quem eles aceitariam: “Tem que ser o Geraldo José de Almeida ou Pedro Luís ou Murillo Antunes Alves”. E acontece, pelo o que eu soube depois, o Pedro Luís tinha contrato com a emissora, o Geraldo tinha contrato com a Record e eu não tinha contrato com a Gazeta. Então numa quarta-feira eu fui lá no escritório da Tupi, que era na Senador Feijó, e Chico Rizzini: “Murillo, você não quer vir aqui pra...” Vamos supor que fosse hoje, eu ganhava, por exemplo, dez mil na Gazeta, ele disse: “Murillo, você não quer vir para a Tupi? A Tupi é a mais poderosa emissora paulista!” Eu: “Mas eu não.” No fim ele falou: “Escuta uma coisa, você tem que ter um preço, quanto você queria para vir para cá?” Não sei o quê e o no fim eu falei: “Vinte mil.” Era o dobro do que eu estava ganhando. Ele falou: “Ah não, isso nós não podemos pagar.” “Então até logo.” “Não, mas vem cá, volta.” De repente ele diz assim: “Você decide já e começa domingo.” Porque eu não tinha contrato. Eu pus a mão na cabeça e fiquei lá: “Está bom, está fechado, você começa domingo.” Aí eu saí ali da Senador Feijó, até a Gazeta, que era na Rua Conceição, que agora, depois, é Avenida Cásper Líbero, e comecei a pensar: “Puxa, eu gostava da Gazeta, será que eu fiz um bom negócio?” E quando eu cheguei na Gazeta, eu falei lá: “Olha, eu não sei se eu fiz um bom negócio, mas eu vou sair.” “O que é que aconteceu?” Aí veio a diretoria: “Mas você não deu nem chance da gente fazer. Você assinou alguma coisa?” “Não, não assinei. Mas agora eu já me comprometi.” Resumo da ópera: eu saí da Gazeta e guardei uma mágoa, uma tristeza, digamos assim, porque eu gostava muito de jornal e não sei se foi vingança ou não e todos sabiam, o Ferreira Jorge que era um dos diretores da fundação disse: “Murillo, você não sabe, aconteceu uma coisa! Nós vamos tirar “A Gazeta Esportiva” diária. E nós tínhamos um problema porque “A Gazeta Esportiva” tinha dois redatores famosos: o Thomaz Mazzoni, que era Olímpicos,
e o Miguel Munhoz. “Então, na ‘A Gazeta Esportiva’ diária, os dois querem ser diretores da “A Gazeta Esportiva” diária, se nós pusermos, um vai brigar com o outro, então a turma tinha chegado à conclusão de que o melhor era pôr você como diretor da “A Gazeta Esportiva” porque você era do rádio.” Ai, aquilo me deu uma tristeza, eu teria sido diretor da Gazeta Esportiva, mas agora tinha que sair, e saí. Mas é raro acontecer o que aconteceu, eu tenho até hoje os recortes, em que a gente vê que eu saí da “A Gazeta”, com artigos na “A Gazeta”, na “A Gazeta Esportiva”, eu redigi também uma crônica de despedida dizendo assim: “Passo pela redação, até logo fulano, até logo sicrano, chego na rua, de todos os andares, até o “roofing” da Gazeta me despedindo.” Tive uma despedida chorando num almoço. Aí saí muito bem na Gazeta, fui para a Tupi, sempre essa carreira meteórica. Agora perguntará você, “Luís”, por que é que eu deixei a parte esportiva? É que eu tinha formado na faculdade já uns dois ou três anos e a minha família estava muito impressionada, porque naquele tempo não havia equipe, eu irradiava praticamente sozinho. E começaram, a mamãe chegava e dizia: “Você não vai aguentar isso muitos anos isso.” Às vezes irradia o jogo no sábado, jogo no domingo e sozinho quase. E começou a insistir para eu deixar a locução esportiva e eu fiquei naquela dúvida: “Deixo? Não deixo?”. Até que resolveram que eu fosse candidato a deputado, porque o papai tinha sido convidado para ser candidato a deputado e não aceitou. Então me procuraram lá de Itapetininga, mas com a condição que eu precisaria ir nos finais de semana fazer política. Eu digo: “Mas eu não posso, irradio futebol.” Então nesse vai e vem, eu entrei com o Edmundo Monteiro e propus a ele que ele me desse uma licença até o final do ano, nas eleições. Ele falou: “Mas se eu te der licença vamos precisar contratar outro nome conhecido, não dá jeito.” Então ficou naquela dúvida, mas o Aurélio não se acostumou no Rio de Janeiro e resolveu voltar, e um dia o Edmundo me disse: “Você ainda quer ser político?” “Quero, mas eu estou nessa dúvida.” Então vamos fazer o seguinte: “O Aurélio volta e você pede demissão.” “Eu prefiro fazer o seguinte, eu fico até dezembro, embora não trabalhando, você me dá licença até dezembro se eu for candidato? Muito bem, e se eu também não for.” Sabe o que aconteceu? Adiaram as eleições para deputado, quando chegou dia 31 de dezembro, daquela época, acho que foi 1946, eu estava fora do rádio e não era candidato. Aí começa uma outra história que fica para uma outra vez.
P/1 - Essa história aí que o senhor está dizendo é sobre política, o lado da carreira política. Mas ainda na carreira de locutor esportivo o senhor depois da Tupi vai para a Bandeirantes?
R - Não. A Bandeirantes eu fui como repórter. É como eu falei, porque eu estive na Bandeirantes como o primeiro locutor esportivo em 1942, que não pertencia às Emissoras Unidas. Quando eu deixei de irradiar futebol na Tupi, a Bandeirantes já era da Record. E o que é que aconteceu? No começo de 1947 eu estava no Ponto Chic, ali numa noite, e encontrei o Paulinho de Carvalho, e o Paulinho: “Ué, Murillo, você não está mais no rádio?” Eu disse: “Não, saí dessa coisa.” Poucos dias antes tinha havido um famoso incêndio na Estação da Luz, porque com a queda do Getúlio Vargas em 1945, uma vez deposto Getúlio, começou essa euforia libertária, todo mundo podia fazer tudo no rádio, tudo era proibido antes, no Estado Novo, e aí podia fazer tudo. Então eu falei assim: “Paulinho, esse incêndio na Estação da Luz poderia ter sido irradiado, ninguém deu nada e tal.” Ele disse: “Você está fora do rádio?” “Estou.” “Escuta, me dê seu telefone.” No dia seguinte ele me chamou lá na Record. “Você vai falar lá na Bandeirantes.” Era o Nicolini, estava o Nicolau Tuma. “Você vai lá para a Bandeirantes, nós estamos com a ideia talvez de fazer, você poderia voltar lá para fazer.”, o que eu tinha sugerido. Aí eu voltei à Bandeirantes como repórter, aí eu passei a irradiar tudo, de manhã à noite. Bom, a Bandeirantes, que era a nona colocada parece, uma coisa assim, em quatro, cinco meses passou parece que para segundo lugar porque eu fazia, eu passava o dia inteiro. Dr. Paulo importou uma máquina, um gravador de fio de arame, os primeiros gravadores eram fio de arame, parecia um fio de cabelo, quando arrebentava a gente dava um nozinho com fósforo e soldava, era um gravador General Electric. Então com esse gravador, o Adhemar, eleito governador do estado, estava em Pindamonhangaba e lá fui eu com o gravador, tem fotografia até hoje no meu arquivo, fui, localizei o Adhemar e ele deu uma entrevista. Deu uma bruta repercussão, com o governador fazendo uma entrevista, porque não havia isso no rádio. E daí para frente foi crescendo, passei a irradiar tudo, eleições na Itália, aqui em São Paulo. Para você fazer ideia. Ah, e o Dr. Paulo se entusiasmou e chegou a importar equipamento de guerra, um microfone volante, que eu tenho fotografia também, acho que mais ou menos meio metro, que a gente usava com mochila nas costas para irradiar. Eu irradiei em uma ocasião um incêndio do Banco do Brasil, que estava em obras, tem lá a fotografia, um para carregar, outro para levar a pilha, mais o microfone volante. Depois importou também um gravador, aliás, um transmissor de ondas curtas. Pode parecer brincadeira, mas eu fui irradiar eclipse total do sol em Araxá. Foi o equipamento. Porque Araxá e Bocaiúva eram os dois pontos melhores para observar o eclipse total do sol, era, parece, por volta de oito horas da manhã. Nós instalamos o transmissor de ondas curtas em Araxá e na hora do eclipse, porque na Bandeirantes eu tinha tempo, fazia o que queria, e na hora do eclipse: “Os galos se amiudam, a escuridão baixa sobre Araxá.” Essa coisas. Então eu comecei. E o Dr. Paulo se entusiasmou: “Vamos irradiar eleições na Itália”, e fui para a Itália. Fui irradiar depois... Qualquer acontecimento no Brasil eu ia, uma enchente em Minas Gerais... Então a Bandeirantes foi crescendo. Para ver que no rádio, como na televisão, para usar aquela frase do José Fidélis: “Nada se cria, tudo se copia.” Naquela ocasião o Adhemar tinha muita sensibilidade política, chegou até a combinar comigo de nós fazermos um programa semanal no Palácio dos Campos Elíseos, chamado “Conversa ao pé do fogo” porque depois surgiu “Conversa ao pé do rádio”. Era “Conversa ao pé do fogo” porque havia uma lareira no Palácio dos Campos Elíseos. Diante disso, o Adhemar ficou tão entusiasmado que comprou a Bandeirantes. E agora que vem a fase, eu agora posso contar, porque agora é parte da história, aconteceu que ele gostava das minhas entrevistas: “Sr. Murillo, comprei a Bandeirantes, agora você vai fazer o que você quiser. Você se dá bem com o Rebelo Júnior?” “Me dou.” “O Rebelo é que vai ser o diretor, conversa como ele.” Eu combinei com o Rebelo, fomos jantar, e aqui entre nós, eu, jovem, entusiasta, começo de carreira, comecei a pensar comigo: “Agora, sei lá, vou ser o dono da Bandeirantes.” Mas no jantar com o Rebelo, que sempre foi meu amigo, eu vi que tudo que ele sugeria eu não entrava em nada, ele começava: “O diretor artístico vai ser o Dárcio Ferreira. Você conhece o Dárcio Ferreira?” “Não.” “O diretor comercial vai ser o Ribeiro Filho.” E aí eu falei: “E eu?” Ele falou: “Não, você vai ter carta branca para irradiar o que você quiser, pode irradiar tudo.” “Bom, vou fazer aquilo que eu já estou fazendo.” Pensei comigo e meditei um pouco: “Mas olha aqui, eu vou ligar a minha carreira a uma atividade política, a estação vai ser do Adhemar”. Pensei muito e procurei o Dr. Paulo: “Dr. Paulo, eu não quero mais ficar na Bandeirantes.” “Mas como vai fazer?” Eu tinha contrato com a Bandeirantes. “Olha, você é advogado, ache uma saída.” “Eu tenho uma saída, Dr. Paulo. Eu vou mandar uma carta por senhor ante datada, propondo, pedindo um aumento de ordenado.” Ele já começou a rir. “E o senhor vai me responder que a Bandeirantes não dispõe de verba para isso e tal mas se eu quiser podemos rescindir o contrato e fazer um contrato com a Record.” Mas tudo ante datado, ele disse: “Vai levar vantagem, mas pode fazer.” Então eu preparei tudo, dali a dois ou três dias, depois de tudo assinado, encontrei o então governador Adhemar de Barros: “Como é Murillo, está tudo certo com o Rebelo?” “Não, aí tem um problema Dr. Adhemar, o meu contrato é com a Record.” Aí eu fiquei na Record com o Tico-Tico, que eu levei para trabalhar comigo na Bandeirantes, ficou na Bandeirantes. E ficamos os dois, um do lado, outro do lado. Para você ter uma ideia, nesse entusiasmo pela Bandeirantes eu passava o dia todo inventado coisas, eu cheguei a fazer uma série, só fiz três programas depois não tive tempo. As reportagens que eu gostaria de ter feito, uma delas, por exemplo, fiz a chegada da família portuguesa. Então começava: “É dia tal de 1808, estamos no Porto do Rio de Janeiro, já vemos à distância a Nau Capitânia da frota portuguesa.” E comecei a narrar a história, tudo com sonoplastia; fiz o julgamento de Sócrates e para interpretar o papel de Sócrates peguei o Vicente Leporace, eu redigi o texto e o Leporace interpretava o Sócrates. E assim foi, irradiei tudo.
P/1 - Bom, então o senhor começa na Record em 47 e até hoje o senhor ainda está na mesma emissora. Então são cinquenta anos de Record.
R - É o primeiro meio século.
P/1 - Vamos então fazer uma retrospectiva disso, quais são os primeiros programas que o senhor fez ainda no rádio e, posteriormente, como se dá a sua passagem para a televisão?
R - Bom, no rádio o que aconteceu foi o seguinte: eu estava acostumado, na Bandeirantes eu dispunha praticamente de todo o horário, porque a Bandeirantes só tinha programa de músicas variadas, etc, e eu podia entrar em qualquer lugar. Então quando eu fiquei na Record, eu fiquei um pouco tolhido, porque à noite havia programa de auditório, eu não podia interromper certos programas. Então não tinha mais aquela facilidade e até há um depoimento curioso, que é bom ficar aqui, o grande competidor meu acabou sendo o Tico-Tico, porque o Tico-Tico ficou na Bandeirantes e podia irradiar tudo e eu ficava tolhido às vezes, não podia. E houve até um episódio engraçado, porque a Record montou um carro muito grande, importou uma viatura (Deug?) que tinha frequência modulada, e podia irradiar de qualquer ponto da cidade, foi pioneira naquele setor. E eu ficava geralmente até duas da madrugada com a viatura estacionada no Pátio do Colégio, que era o plantão da central de polícia. Então a qualquer hora até as duas da madrugada eu entrava, a partir das onze horas da noite não tinha programa de auditório, então podia entrar, mas durante aquele outro horário. Uma noite eu estava lá, por volta mais ou menos das dez horas, e vem a notícia, um controlador da rádio patrulha sempre contava para a gente: “Murillo, está havendo um incêndio no gabinete de investigações, o gabinete é na rua dos Gusmões, e parece que é grande.” Eu imediatamente pus no ar. “Alô, senhores ouvintes aqui fala o repórter B9.” Eu falava “o repórter B9”: “Aqui fala o repórter B9, Murillo Antunes Alves, tal, e de acordo com as primeiras informações que chegaram aqui, um incêndio está lavrando nas dependências do gabinete das investigações e parece que é de grandes proporções. Vamos rumar para o local e daremos informe.” E aí fui. Bom, chegou lá tinha sido um rebate falso, o incêndio tinha sido numa lixeira lá, dois ou três minutos apagaram, houve exagero, e aí eu liguei para a Record: “Vamos colocar no ar.” “Agora tem que esperar meia hora.”, porque estava num programa de auditório e não podia interromper. Enquanto eu estava esperando, entra um carro na contramão na rua dos Gusmões, acendendo os faróis e tocando a buzina e tal, que era o Tico-Tico. E eu estava num bar tomando um café e esperando a hora. Ele chegou: “Murillo, como que foi o incêndio, eu ouvi que você deu a notícia agora.” Eu disse: “Não, felizmente já está dominado, foi coisa de nada.” Aí ele pegou o telefone, porque naquele tempo era no telefone, e ligou para a Bandeirantes, eu sempre fui amigo dele, ele sempre muito afobado: “Alô, põe no ar. - Alô senhores ouvintes, aqui fala o repórter José Carlos Moraes, podemos desmentir em absoluta primeira mão as notícias exageradas sobre um incêndio e não sei o quê.” Eu falei: “Você me desmente na minha cara.” “Quem está me ouvindo não está te ouvindo, quem está te ouvindo não está me ouvindo. Deixa, deixa” Ele desmentiu em absoluta primeira mão. Bom, mas aí eu comecei a fazer essa parte na rádio, até que chegamos a 27 de setembro de 1953, a inauguração da Televisão Record. E eu sempre digo para quem acompanhou a evolução do rádio, também acompanhei na Tupi e tudo isso, noventa por cento ou mais dos que começaram, os pioneiros da televisão, vieram todos do rádio, com os defeitos e as qualidades do rádio. Então na primeira fase, nessa fase inicial, era raro uma pessoa especializada em televisão ou que veio só para a televisão, fazia o rádio e fazia televisão. Lá na Record, por exemplo, foram fazer os jornais, eram os setoristas do rádio que faziam, eu, por exemplo, era o setorista político. O jornal tinha eu para a parte política, o Vandick Freitas fazia o editorial, Salomão Schwartz na parte política, o Clécio Ribeiro a parte policial, e foi assim que nós começamos os jornais na Record. O jornal se chamava “Última Edição” e o produtor era o Raul Duarte.
P/1 - Bom, e como é que funcionava o “Última Edição”? A curiosidade é que o senhor disse que com Getúlio não havia noticiário, não havia jornalismo nem na rádio. Depois o jornalismo estoura no rádio, na Bandeirantes ele passou a ser até carro chefe pelo o que eu entendi. E na Record a televisão já começa com o jornalismo expressivo, quer dizer, como que era o jornalismo antes disso?
R - Bom, mas aí nós já estávamos... o Getúlio caiu em 45, foi 29 de outubro de 1945, e nós estávamos em 53, houve aquela evolução toda. Agora esse jornal “Última Edição”, a curiosidade maior é que ele não tinha propriamente um âncora, ele tinha quase, vamos dizer assim, compartimentos estanques no estúdio, entrava um de cada vez. Então abria o programa o Vandick Freitas, fazia o editorial, ele usou... ele foi um dos que melhor soube usar o teleprompter no começo, o teleprompter não era propriamente eletrônico, ele era um papel enrolado numa peça lá, que ficava de frente, ao lado de uma câmera e ele acionava com o pé, e o Vandick se acostumou muito bem, ele lia muito bem no teleprompter. Agora nós não, nós improvisávamos, a gente levava os dados ali e improvisávamos. Então o programa, em síntese, era muito simples. Vamos supor. os nomes que eu citei, Cabral Vandick Freitas fazia o comentário, dois ou três minutos, aí cortava, punha o “slide”, por exemplo: “Assembléia não sei o quê.” Aí entrava eu, falava: “Hoje a Assembléia votou isso,” e pá, pá, pá, parte política. Polícia, entrava o Clécio Ribeiro e terminava até: “Basta isso!” O finalzinho que ele fazia. Quer dizer, o jornal não tinha nem um âncora, não tinha ninguém que alinhavasse todas as peças, era... cada um fazia o seu setor, Salomão fazia a parte política, é claro, cada coluna, aí não é bem coluna, cada compartimento, cada parte da coisa tinha uma manchete, era projetava, e a gente falava, inicialmente foi feito assim. Até que na Record surgiu também o caso do “Repórter Esso”, agora o “Repórter Esso” que era diferente. O “[Seu] Repórter Esso” tinha filmes, era ilustrado, porque esse jornal, “Última Edição”, tinha poucas ilustrações, era mais falado só. O “Repórter Esso” não. E por sinal, para você ver os meios deficientes daquela época, as dificuldades, a primeira noite do “Repórter Esso”, porque o “Repórter Esso” era vinte para as oito, o último ano na televisão eu que apresentei na Record, e acontece que a Record tinha sido vítima de um daqueles incêndios, teve vários incêndios. Então, no dia da estréia do “Repórter Esso”, nós íamos fazer a apresentação na Rua da Consolação, pegado ao Teatro Record. Eu queria complementar a história da inauguração, da primeira apresentação do “Repórter Esso” na Record, em virtude dos incêndios o programa ia ser apresentado a partir daqui da Rua da Consolação pegada ao Teatro Record. E eu chego lá uns quinze, vinte minutos antes, e não tinha nem o texto, era apenas uma saleta acho, de uns dois metros por dois metros, uma câmera, a mesa ali, e eu fiquei aguardando, porque a projeção dos filmes ia ser feita lá no Aeroporto de Congonhas, lá é que estava o projetor. E o texto redigido lá vinha para cá. Então, faltava acho que dois ou três minutos para começar, não tinha chegado o texto e o pessoal da agência de propaganda que produzia o “Repórter Esso”, começou: “Acho melhor desistir, porque não vai dar tempo.” Mas quando já estava para não entrar no ar chega o “boy” lá e traz o texto correndo, e eu peguei o texto na primeira vista, sentei, já entrou o prefixo, já entrou no ar e eu nem cheguei a ler. Então tinha aquele prefixo conhecido: “Aqui fala Repórter Esso, testemunha ocular da história e bá, bá, bá.” E tinha um monitorzinho, naquele tempo era branco e preto, o monitor ao lado, eu com o rabo dos olhos vendo o monitor: “As chuvas torrenciais que caíram na cidade de São Paulo.” E eu vi com o rabo dos olhos, no monitor estava uma corrida de bicicleta e aí eu resolvi improvisar, disse assim: “Caíram na cidade de São Paulo e não tiveram o condão de perturbar a realização das competições esportivas.” Aí entrou a coisa. Quer dizer, eu levei uns três ou quatro minutos porque eu falava uma coisa e saí outra, e no fim acertou. Então começou assim. O “Repórter Esso” durou um ano na Record, na TV Record, e por que ele terminou? Acontece o seguinte: o “Repórter Esso” era das vinte para as oito às oito e, pelo que me contaram, a direção da Record, se não me engano foi Paulinho Machado de Carvalho, ele na época da renovação do contrato disse: “Olha, o “Repórter” está criando um problema porque tem vinte minutos e nós vendemos o horário de meia em meia hora ou de hora em hora.” Aí começou aquela negociação: “Ou paga a meia hora ou então nós não fazemos.” “Não, não, não paga.” Em resumo, não chegaram em acordo e acabou o “Repórter Esso” na televisão.
P/1 - Bom, os outros programas que o senhor fez em televisão em seguida, o senhor fez o “Repórter Esso”, fez o “Última Edição” e depois tem o famoso “Record em Notícias”, que começou com “Tempo de Notícia”, como é que foi essa história?
R - Mas antes disso quando a Record começou, a TV Record, a Televisão Record, eu fui convidado para fazer quase que tudo, cheguei a fazer programa de auditório, um programa de perguntas e respostas, cheguei a ser convidado para produzir aquele “Essa é a sua vida”, um programa parecido com o “Céu é o Limite”. E fui fazendo, porque a gente tinha que ver para onde é que enveredava, eu tinha tirado sete “Roquetes Pinto” como repórter, porque eu sempre gostei da parte da reportagem. Aí comecei a fazer também para a televisão reportagens no exterior, fui irradiar o Ano Santo em 49, fui irradiar, acompanhei, o Presidente Geisel ao Japão, fui, irradiei, uma das últimas reportagens que eu fiz para a Televisão Record, das grandes, que foi o casamento do Príncipe Charles, eu transmiti, dia 29 de julho de 1981, transmiti de Londres. Então eu fazia reportagens no exterior, e pelo fato de gostar de jornais, esse programa do Hélio, Hélio Ansaldo, ele tinha um programa chamado “Tempo de Notícia”, onde ele convidava apresentadores da Record, jornalistas, esportistas, para debater os assuntos, não tinha convidados de fora. Durante certa fase, no começo, era Sônia Ribeiro, esposa do Blota Júnior. O Blota chegou a falar uma vez ou outra, o Wilson Fittipaldi, o Milton Peruzzi, eu... Então nós fazíamos esse jornal, e assim foi até que depois, numa determinada fase, esse programa era produção do próprio Hélio. O Hélio se desinteressou um pouco porque ele que arranjava os patrocinadores e, pelo que me contaram, ele quis acabar com o “Tempo de Notícia.” Mas aí o Paulinho de Carvalho já estava entusiasmado com o programa, que tinha público, e ele disse: “Não, a Record mantém o programa.” Manteve, só que mudou o nome para “Record em Notícias.”
E o Hélio continuou apresentando e nós continuamos participando e assim foi até a venda da Record, quando da venda para o novo grupo o Hélio teve lá um problema lá qualquer, tinha pedido demissão para ser candidato a deputado, aí depois não acertou mais, não voltou. E o novo grupo me deu, me confiou, eu passei a ser editor-chefe e âncora do “Record em Notícias.” E assim foi durante muito tempo. E havia naquela época, desde o tempo do Hélio, dizem que foi o Ferreira Neto que deu o título de “Jornal da Tosse.” E a Record não tinha assumido nem nada, não se falava mais nisso, mas eu, quando passei a ser editor chefe, foi em 89, fins de 89, eu resolvi assumir: “Jornal da Tosse”. E assim pegou e foi assim até o final de 1996, quando o programa saiu do ar.
P/1 - Esse programa começa em 58, o “Record em Notícias?”
R - A data certa eu não me lembro mais, assim.
P/1 - Esse tempo todo até 96?
R - O programa é antigo, durou muito tempo na Record. Eu sei que depois eu fui para Brasília, eu não me lembro exatamente a época em que começou o “Tempo em Noticia”, o “Record em Notícias”, mas que eu participo do programa, pelo menos, eu sei que depois de 1960 eu sempre participei do programa, porque quando eu voltei de Brasília... Eu fui para Brasília no tempo do Jânio.
P/1 - Ah, o senhor começou depois de 60 no “Record em Notícia?”
R - Não, eu participei no começo, não é isso, no começo eu fazia, mas quando o Jânio foi para a presidência ele me convidou para ir com ele e eu fui, licenciado pela Record. Continuei na Record, fiquei em Brasília, o Jânio renunciou e eu voltei para participar de novo do programa.
P/1 - Como é que foi esse contato com o Jânio?
R - Bom, o Jânio, eu conheci o Jânio, que é bom que fique esclarecido uma coisa, uma coisa é ser janista e outra coisa é ser amigo do Jânio. E eu, politicamente e pela própria atividade jornalística, eu não participava de atividades políticas ostensivamente, eu era amigo do Jânio desde o tempo da faculdade. Então o Jânio, eu achei que ele era uma pessoa pitoresca, tinha um linguajar típico, então eu comecei a entrevistar o Jânio no tempo do rádio ainda, quando ele foi vereador. Eu dava cobertura, porque naquela fase nós não tínhamos propriamente setoristas, e eu, como era repórter primeiro da Bandeirantes depois da Record, eu era credenciado em todos os lugares. Eu era o representante da Record
na Assembléia, na Câmara, na polícia, então eu tinha credenciais em todos os lugares. E na Câmara Municipal o Jânio, eleito vereador, eu comecei a entrevistá-lo e ele dava ao público. Então o Jânio, qualquer assunto, ele podia negar entrevista para os outros, mas nunca me negou. E eu gostava, porque ele tinha aquele linguajar pitoresco. Chegava lá e dizia assim: “Dr. Jânio, o senhor está chegando agora de Curitiba.” “Hoje pela manhã peguei o aeroplano lá em Curitiba.” Ele usava isso e sempre foi indo. Aí vem a pergunta, como é que eu fui acabar indo a Brasília? Aí é um fato curioso, porque durante a campanha eleitoral para a presidência da república eu fiz algumas entrevistas com o Jânio. E o Jânio, nós tínhamos um repórter na Record, Alaor José Gomes, que depois casou com a Dirce Maria, portanto era ligado ao Jânio, ele sempre me dava informação do Jânio. “Alaor, você sabe se o Jânio vai viajar?” “Ele vai para o Rio de Janeiro.” Eu sabia aquelas informações, até que terminada a eleição, a eleição foi dia 3 de outubro de 1960, no dia 5 de outubro todo mundo andava atrás do Jânio, porque o Jânio estava eleito presidente da República pelos resultados, e ninguém sabia onde estava o Jânio. Aí eu perguntei: “Alaor, aonde é que está o Jânio?” “Depois do almoço eu vou ver”. Ele voltou: “Ele está na Bertioga, na casa do José Ermírio de Moraes. Mas não adianta você ir lá, porque a polícia já cercou lá a estrada, ele não quer ser entrevistado, ele não quer falar antes da diplomação.” Mas a Record, tinha helicóptero na Record naquela época, então peguei o helicóptero, o gravador, e desci no jardim. Eu me lembro que na estrada o pessoal da polícia fazia sinal, mas desci. Chegou lá o Jânio não saiu, mas o genro do Carvalho Pinto apareceu, chegou para mim e disse: “Oi, Murillo, como vai?” “Eu preciso falar com o presidente.” “Ele não vai falar. Não recebe ninguém.” “Você poderia levar um bilhetinho para ele?” Pus lá, “Parabéns presidente pela sua eleição”. Ele levou, trouxe de volta uma mensagem manuscrita do Jânio que eu tenho escrita até hoje o texto: “Por intermédio da Rádio Record, dos meus amigos, Paulo Machado de Carvalho e Murillo Antunes Alves, envio uma saudação muito calorosa ao povo do Brasil.” E fez uma mensagem. Bom, foi um sucesso. Eu peguei o helicóptero, vim para cá e pus no ar. Aí o “Jornal do Brasil”, “O Globo”, naquele tempo tinha uma revista “Diretrizes”, todo mundo queria cópia daquilo. Eu dei para todo mundo e estava lá o nosso nome, Record, Paulo Machado de Carvalho e Murillo Antunes Alves. Então foi uma repercussão tremenda. Aí eu passo a viver um drama muito curioso, que talvez seja o último episódio que eu vou poder contar aqui hoje, que é o seguinte. O Jânio eleito, depois do dia 6 ou 7, ou 10, ele apareceu. Ah não, ele apareceu em público a primeira vez em 10 de outubro de 60, na casa do Quintanilha Ribeiro, porque ia ser o casamento civil do Alaor José Gomes com a Dirce Maria e eu fui. Lembro-me como se fosse hoje, eu entrei com a minha mulher na casa do Quintanilha, olhei, e numa sala estava Jânio, Magalhães Pinto, Ney Braga e Carlos Lacerda, estavam os quatro ali. Eu não sei se ele queria se ver livre ou não, quando eu apareci na porta ele: “Como vai meu amigo?” “Tudo bem, presidente. Então com licença.” Eu entrei com a minha mulher: “Parabéns pela sua eleição.” A minha mulher também o cumprimentou. Então ele disse assim: “Murillo, quando é que você poderia ceder alguns minutos do seu precioso tempo?” Bom, presidente eleito queria todo mundo. “Quando a vossa excelência quiser.” “Pode ser já. Com licença”. Ele pediu licença para os três me pegou pelo braço e foi a beira da piscina, era noite e nessa hora havia dezena de pares de olhos vendo eu ali com o Jânio. Ele me disse: “Murillo, você tem muitos vínculos aqui em São Paulo?” Digo: “Tenho, tenho Assembléia, sou chefe do cerimonial, tem a Record.” “Então vá se preparando para romper desses vínculos, porque eu não prescindirei da tua colaboração em Brasília.” Eu fiquei meio assim. “Não precisa dizer nada, porque eu só quero muito sigilo, porque é um dos primeiros convites que eu formulo.” Aí voltamos para lá e a minha mulher chegou e disse: “O que é que aconteceu que você está pálido?” Mas aí passei a viver um drama, isso foi outubro, passou novembro o Jânio viajou, contei para o Dr. Paulo, só que era da Record. “Como vai ser?” “Eu não sei.” “Você deve aceitar.” Nessa conversa chegamos ao mês de janeiro, a posse ia ser dia 31 de janeiro. A Record se reúne: “Olha, você vai ter que irradiar a posse do Jânio, você é o maior repórter da Record.” E aí o Dr. Paulo: “Diante do que se falou, será que vai dar para você irradiar?” “Eu não sei.” Aí falei para o Alaor: “Alaor, como é que eu vou fazer, você ouviu falar alguma coisa?” “Não, o Jânio disse que você vai para Brasília, mas pra quê não disse. Aí disseram: “O Jânio hoje à noite vai na casa do Chaves Amarante, que é um deputado, é seu amigo, você vai lá também e pergunta para ele.” Eu cheguei lá, isso era 4 ou 5 de janeiro, e o Jânio cumprimentado, aquela coisa. Então eu cheguei: “Presidente, parabéns. Presidente a Record está querendo que eu transmita a sua posse. E diante daquela nossa conversa de três meses passados não há uma incompatibilidade?” “Não, muito pelo contrário, isso só vai dignificar as suas futuras funções.” E passou, todo mundo saiu, e eu disse: “A proposta agora é irradiar.” Aí eu fui para Brasília para a irradiação, irradiei tudo aquilo, e às quatro horas da tarde do dia 31 de janeiro de 61, na hora do beija-mão, eu entrei na fila também. Na hora em que chegou a minha vez: “Parabéns!” Ele me disse: “Já está aprontando as malas?” Um jornalista que estava atrás: “Oh, Murillo, o que é que você vai ser?” “Eu não sei.” “O presidente não falou com você?” “Eu não sei.” E não sabia mesmo. Mas daí eu recebi um telefonema para ir no dia seguinte ao Palácio do Alvorada, e aí depois ele formalizou o convite, queria que eu fosse para o cerimonial da presidência. Mas eu fiquei nessa angústia. Fui para Brasília, demorei para tomar posse, porque eu fui com uma exigência de ter um apartamento. O apartamento só ficou pronto em fins de maio. Eu fui para Brasília em fins de maio e quando foi no dia 25 de agosto aconteceu a renúncia, eu até que limpei o gabinete, trouxe até a última agenda, com a última programação do derradeiro dia dele na presidência da república.
P/1 - O senhor ficou três meses lá?
R - Quase, não chegou a três meses, dois meses e uns dias. Depois só tive contato com o Jânio um pouco mais tarde e fui chefe do cerimonial dele na prefeitura também.
P/1 - Bom, o senhor tem uma longa carreira como chefe de cerimonial também.
R - Mais de cinquenta anos.
P/1 - Na Assembleia, depois do governo do estado...
R - Eu fui do Legislativo, do Executivo, do Judiciário, Federal, Estadual e Municipal. Fui da presidência com o Jânio, fui da Assembleia trinta e cinco anos, aposentado lá, fui da prefeitura com o Jânio, fui do governo do Estado com o Laudo Natel, fui do Tribunal de Justiça com o Dílio José Porto e atualmente sou da Câmara Municipal.
P/1 - Bom, eu acho que fecha um pouco esse lado paralelo aí à televisão. Para a gente entrar no encerramento, o senhor poderia talvez fazer uma avaliação da sua participação na televisão, quer dizer, quais foram os momentos mais importantes que o senhor viveu e uma avaliação, assim, o que te marcou mais, o que é que o senhor ficou com mais saudade, a grande reminiscência que o senhor tem desse tempo da televisão.
R - Evidentemente em poucos minutos e colhido quase que assim de surpresa não é fácil assim sintetizar as experiências vividas ao longo de quase meio século. O que ocorre evidentemente é que eu sempre me senti atraído pelo rádio e pela televisão, sempre gostei, nunca deixei, porque faço com gosto. Então o que a gente gosta a gente faz. Agora, eu tive fatos marcantes, uma vida bem vivida, praticamente já dei a volta ao mundo, só falta um fuso horário, eu já fui para a Europa, até Jacarta na Indonésia, já fui para os Estados Unidos, até Tóquio, falta só um fuso horário para fechar a volta ao mundo. Então é uma vida bem vivida, presenciei todos os grandes acontecimentos, as eleições, o Ano Santo, o casamento do Príncipe Charles, a eleição na Argentina. Se você perguntar eu tive... talvez até pudesse ir para o livro do Guiness. Uma coisa curiosa aconteceu quando da morte do Tancredo Neves, porque foi feito um “pool” de emissoras para a cobertura do sepultamento dele, o corpo saindo desde aqui perto do Hospital das Clínica até São João Del Rei, até o sepultamento. E a Record me encarregou, porque nós tínhamos a imagem, mas a locução era feita no estúdio. Eu fui na Record às oito horas da manhã e comecei a descrever as primeira imagens, quando o corpo ia ser removido para o aeroporto, e fui descrevendo até onze horas da noite. Eu fiquei quinze horas falando com pequenos intervalos, evidentemente, uma água, tomar alguma coisa, mas eu falei durante quinze horas, durante vários meses depois eu recebia cartas de telespectadores de vários pontos do Brasil cumprimentando, porque além de eu estar emocionado, como todo povo brasileiro estava, a experiência do cerimonial, o vocabulário que eu sempre dispus, me ajudaram a fazer a cobertura. Que eu não me limitava a dizer: “Estão vendo ali o corpo, agora passou.” Não era isso. Por exemplo, eu me lembro na hora de São João Del Rei, havia um plano, um contraplano, assim, com as palmeiras, o pôr do sol: “Pois é, a natureza também parece adorar, nesse pôr do sol, quase no ocaso com a morte de um grande brasileiro...” E ainda, quando chegou lá: “E agora vão se prestar as honras militares com o coronel, se apresenta.” E eu fui descrevendo tudo aquilo e foi de grande repercussão. Então, esses acontecimentos todos, se você fizer uma pergunta direta depois de tantos anos vividos, se eu tivesse a opção de voltar aos primeiros anos, se eu ia repetir a experiência, eu gostaria de repetir. Eu me senti gratificado pela repercussão daquilo que eu realizei no rádio, na televisão, também pelas minhas atividades no cerimonial e procuro ter correspondido às expectativas de todos. Eu talvez pudesse concluir: “Finus corones ti opores”, dizendo mais ou menos, eu evocaria Camões perguntando para mim, por exemplo, se eu não realizei mais, se eu não fiz mais daquilo que eu gostaria, ou talvez pudesse ter feito, é que possivelmente não me ajudaram engenho e arte. Acho que é isso.
P/1 - Então muito obrigado.Recolher