P/1 – Bom, nós sempre começamos com o seu nome, o local e a data de nascimento. Nome completo, por favor. R – Gilberto Alcântara Barreto. Nasci em 25 de novembro de 1947, na cidade de Ituiutaba, Minas Gerais. P/1 – Qual o nome de seus pais? R – Jarbas Barreto da Cunha e Guiomar Alcântara Barreto. P/1 – E onde eles nasceram? R – Meu pai nasceu em Monte Alegre, em Minas. É uma cidade próxima de Ituiutaba e minha mãe é de Ituiutaba mesmo. P/1 – E como eles se conheceram? R – Na cidade de Ituiutaba. Meu pai nasceu em Monte Alegre, mas menino, ele já foi para Ituiutaba, tá? Se conheceram lá. P/1 – E quais eram ou quais são ainda as atividades dos seus pais? R – Não, o meu pai é alfaiate, mas, recentemente, a gente o levou a aposentar. E aí ele hoje é aposentado. E minha mãe cuida da casa só. P/1 – E o senhor tem irmãos? R – Tenho. Tenho um irmão, três anos... eu sou o mais velho da família, três anos mais novo... aliás eu sou o do meio. A minha...eu tenho uma irmã 11 meses mais velha do que eu, que eu sempre falo para os meus pais que eles estavam muito afobados, né? 11 meses só. E tem um irmão três anos mais novo. P/1 – E como era a relação, ou melhor, como é a relação do senhor com seus irmãos? R – Muito bom. É ótima. P/1 – Durante a sua infância, onde o senhor morava? R – Morei em Ituiutaba. Aliás, eu sempre falo para os meus filhos que eu tive o privilégio de morar em uma cidade do interior, de ser criado em uma cidade do interior, sem qualquer tipo de preocupações de sair na rua ou de assalto ou de qualquer tipo dessas coisas. P/1 – E como que era a casa onde o senhor morava? R – A casa? P/1 – Isso. R – Não, a casa ainda é, até hoje. Teve algumas reformas, mas meus pais ainda moram lá. Mas é típica para uma casa do interior. 50 metros de fundo de quintal, então...
Continuar leituraP/1 – Bom, nós sempre começamos com o seu nome, o local e a data de nascimento. Nome completo, por favor. R – Gilberto Alcântara Barreto. Nasci em 25 de novembro de 1947, na cidade de Ituiutaba, Minas Gerais. P/1 – Qual o nome de seus pais? R – Jarbas Barreto da Cunha e Guiomar Alcântara Barreto. P/1 – E onde eles nasceram? R – Meu pai nasceu em Monte Alegre, em Minas. É uma cidade próxima de Ituiutaba e minha mãe é de Ituiutaba mesmo. P/1 – E como eles se conheceram? R – Na cidade de Ituiutaba. Meu pai nasceu em Monte Alegre, mas menino, ele já foi para Ituiutaba, tá? Se conheceram lá. P/1 – E quais eram ou quais são ainda as atividades dos seus pais? R – Não, o meu pai é alfaiate, mas, recentemente, a gente o levou a aposentar. E aí ele hoje é aposentado. E minha mãe cuida da casa só. P/1 – E o senhor tem irmãos? R – Tenho. Tenho um irmão, três anos... eu sou o mais velho da família, três anos mais novo... aliás eu sou o do meio. A minha...eu tenho uma irmã 11 meses mais velha do que eu, que eu sempre falo para os meus pais que eles estavam muito afobados, né? 11 meses só. E tem um irmão três anos mais novo. P/1 – E como era a relação, ou melhor, como é a relação do senhor com seus irmãos? R – Muito bom. É ótima. P/1 – Durante a sua infância, onde o senhor morava? R – Morei em Ituiutaba. Aliás, eu sempre falo para os meus filhos que eu tive o privilégio de morar em uma cidade do interior, de ser criado em uma cidade do interior, sem qualquer tipo de preocupações de sair na rua ou de assalto ou de qualquer tipo dessas coisas. P/1 – E como que era a casa onde o senhor morava? R – A casa? P/1 – Isso. R – Não, a casa ainda é, até hoje. Teve algumas reformas, mas meus pais ainda moram lá. Mas é típica para uma casa do interior. 50 metros de fundo de quintal, então a gente tinha um quintal enorme para poder se divertir lá. E o meu pai era alfaiate, a minha mãe trabalhava junto com ele, que é dentro de casa, mas ela costurava, fazia algumas coisas para ele, enquanto a gente fazia a farra por ali. P/1 – E quais eram as brincadeiras? R – Tudo. Tudo o que menino do interior pode fazer. Andar de bicicleta, soltar papagaio – que aqui não é papagaio, é pipa – essas coisas. Depois, quando tinha lá uns sete, oito anos, aí tinha fundado um clube em Ituiutaba e nós fomos também para o clube. Começamos a nadar e tal, né? Nadei muitos anos, inclusive em competições. P/1 – O senhor aprontava muito, era tranqüilo, como que era? R – Não, eu era... a minha mãe, normalmente, me sentava no colo e começava a chorar. Não sabia se ia conseguir me criar, de tanto que eu machucava. (risos) Eu tombava com carroça, de bicicleta, (__) caía de bicicleta, me machucava todo. Estava sempre... caía de árvore, estava sempre meio ralado. P/1 – Infância feliz, então? R – Então, infância ótima. P/1 – E como era o cotidiano da casa do senhor? O dia-a-dia, a relação com os seus pais, com os seus irmãos, com os vizinhos, como que era isso? R – Não, era muito bom. A minha mãe sempre é uma... o pai da minha mãe era um homem muito enérgico. Então a minha mãe é sempre uma mulher certinha, gostava das coisas muito certinhas, mas ela dava algumas liberdades para a gente, né? E o meu pai era de uma família completamente diferente. A família do meu pai é uma família muito aberta, muito... que gosta muito de conversar, de passear e tal, e a minha mãe um pouco presa. Mas essa fusão dos dois deu um ambiente, um lar muito gostoso. A gente vivia muito bem. E vizinho, no interior, é quase que de casa. Você estava na casa do vizinho, o vizinho na sua casa, está sempre conversando, está sempre por ali. Até hoje, embora boa parte dos vizinhos não more mais lá ou já morreram, mas os filhos dos vizinhos a gente conhece, os filhos dos filhos. Então essa relação é muito boa no interior. P/1 – E quais são as lembranças mais marcantes desse período? R – Desse período? Olha, é... tem um tio que já faleceu, tinha um tio que faleceu, ele tinha uma fazenda de abacaxi. Uma das coisas que eu gostava muito era de ir para esta fazenda de abacaxi com ele. Porque eu devia ter o quê? Uns nove anos, por aí? E a gente ficava carregando caminhão de abacaxi lá e eu ficava dirigindo esse caminhão, coisa que eu adorava. Mudar o (___) para poder carregar esse abacaxi. E depois, a gente começou a nadar, aprendemos a nadar, o meu pai colocou a gente para nadar e tinha um técnico lá, e ele ia lá com o técnico e fixava o quanto é que nós tínhamos que aprender realmente a nadar. E aquilo, eu acabei gostando daquilo e a gente fez aquilo muito tempo. Então, a vida era assim: de segunda a sexta-feira, escola. Trabalhava um pouquinho com o meu pai, sempre fazia algumas coisas para ele; e fim de semana tinha que fazer treinamento para nadar, então o clube. A gente ia na missa lá, ficava na missa que era a mais rápida possível, que era um padre que a gente conhecia lá que ele rezava a missa em cinco minutos. Então era a missa ideal para menino, né? A gente ia nessa missa e corria para o clube. P/1 – E aprenderam a nadar, então? R – Eu fui quarto lugar em Minas em nado livre, naquela época. P/1 – E o período na escola, era só meio período ou era período integral? R – Não, meio período. Meio período. P/1 – E hoje, o senhor é casado? R – Sou. P/1 – E qual é o nome da sua esposa? R – É Neuza Eliana Ferreira Barreto. P/1 – E o senhor tem filhos? R – Três filhos homens. P/1 – E qual a idade de cada um deles? R – Um tem 32, o outro tem 27 e o outro tem 21. P/1 – E a atividade deles? R – O mais velho é engenheiro elétrico, como eu. Trabalha hoje na Alstom. O do meio está terminando engenharia elétrica e o novo é um problema, não quer estudar. Está no colegial ainda. P/2 – O senhor nasceu em Minas, né? R – Nasci em Minas. P/1 – ... como o senhor acabou de relatar. Quando o senhor veio para São Paulo? R – Quando eu vim? P/1 – Isso. R – Eu vim para São Paulo... bom, lá no interior, o último nível, o nível mais alto de estudos que existia lá era o primeiro ano colegial. Não tinha o segundo. Então eu já vim para São Paulo com uma idéia... a minha avó, a mãe do meu pai, morava em São Paulo e eu vim para cá para continuar os estudos. Quando eu vim para cá, eu tinha 17 anos, aí precisa fazer as contas porque eu não lembro mais o ano. E 17 para 18, que era a época de iniciar o serviço militar. Aí não dava para trabalhar, então eu comecei a fazer o segundo científico e também fui para o CPOR aqui em São Paulo, lá na Alfredo Pujor, né? Comecei a fazer CPOR que era... e no meio do trabalho do CPOR veio uma diretriz do exército liberando o pessoal que nasceu em alguns meses e calhou que nasceu... que eu era de novembro e novembro liberou. Aí o pessoal queria me segurar, eu falei que não, que precisava fazer, estudar e tal e eu acabei saindo. P/1 – E como que foi essa mudança para o senhor? Sair da casa dos pais e ir para casa da avó... R – Não, foi horrível, né? Foi horrível. Porque eu estava acostumado a morar em uma cidade do interior muito gostosa, né? Vim para São Paulo e você não conhece ninguém, você conhece a tua avó, até aí ela tem o círculo dela, mas não seu. Até a gente conseguir fazer o círculo de amizade da gente, é muito difícil. P/1 – Retomando um pouquinho alguns aspectos da sua infância, queria que o senhor me falasse como que foi o início dos seus estudos. Quando, como e onde o senhor começou a estudar? R – Bom, eu comecei a estudar em um colégio lá em Ituiutaba, que se chamava (Marlim?), esse colégio não existe mais. E eu... é um colégio particular e eu tinha uma tia, irmã do meu pai, que era professora nesse colégio. E ela conseguiu para nós – não só para mim, para os três irmãos – bolsa de estudo nesse colégio. Então nós estudamos com bolsa de estudo até o ginasial, tá? P/1 – E como que era essa escola? R – Era ótima. Era muito gostoso... P/1 – Como eram os professores, os colegas, o dia-a-dia na escola? Tem algum professor em especial que o senhor guarda na lembrança? R – Tem um... o diretor da escola, que era um homem muito conhecido lá em Ituiutaba, e que se chamava Álvaro Brandão de Andrade, já faleceu. Ele, logo depois que eu entrei, ele começou a se afastar e entrou um filho dele como diretor, que é um engenheiro que hoje ele está até na Usiminas. Um engenheiro da Usiminas. E ele, como eu era muito bom em matemática, em física, essas coisas, embora eu fosse muito levado, dava muito trabalho, estava sempre na diretoria lá, ele gostava muito de mim. Então o relacionamento entre mim e ele era muito gostoso, porque a gente gostava muito da matéria dele. Então, na aula dele eu tirava aquilo de letra. Fora as brincadeiras de escola, futebol, essa coisarada toda que tinha lá. Como diz o meu pai, eu nunca fui bom em futebol, mas... meu pai, uma vez, foi ver eu jogar futebol e falou: "Pode parar, meu filho. Você vai matar os outros." (risos) P/1 – Por que? Você chutava a canela? R – Chutava o que tivesse na frente. P/2 – E o senhor trouxe alguma amizade deste período de escola para os dias de hoje? R – Tem, tem algumas ainda. P/2 – E tem alguma lembrança em especial deste momento da sua vida escolar que o senhor gostaria de relatar aqui para a gente? R – Não.Que fosse assim marcante, não. P/1 – O senhor é formado em engenharia elétrica. Alguém influenciou na escolha desta profissão? R – Não, eu mesmo. Eu sempre gostei de mexer com as coisas. Então eu sempre gostei de desmontar as coisas, tinha curiosidade por essas coisas, né? Então sempre quis fazer engenharia. Aí, quando eu fui para o colegial, que a gente começou a mexer com física e tal, que eu achei que elétrica era a área que eu gostava, eu fui para engenharia elétrica. P/1 – O senhor fez faculdade onde? R – Em Sorocaba. P/1 – Em Sorocaba. R – Eu comecei a fazer faculdade em São Bernardo, na FEI. Logo depois que eu terminei o colegial, eu prestei vestibular por aí, não passei na USP, que eu queria, e no ITA. Uma, que eu sou péssimo em línguas. Português... aí você tinha que fazer português, inglês... inglês, por exemplo, no ITA eu não conseguia saber nem o que eles estavam perguntando porque era um texto literário que eles colocaram lá, né? Então não deu certo. Então acabei entrando na FEI. Aí fui fazer a FEI. A FEI era paga, tinha uma despesa relativamente alta porque eu morava em São Paulo, tinha que deslocar todo dia até a FEI, então eu tinha uma despesa de locomoção, de refeição lá, e a faculdade era o dia inteiro, você ficava o dia inteiro lá e não dava para trabalhar, né? Aí eu tinha... esse irmão mais novo meu entrou em medicina em Botucatu, que é uma escola estadual da... esqueci o nome da universidade lá. E aí eu fiz uma opção: ou ele ou eu. Porque meu pai não dava conta de sustentar os dois. Aí como eu tinha já o terceiro ano de engenharia, eu resolvi fazer um teste na Light. Aí, o engenheiro que fez o teste para mim, ele aplicou um circuito elétrico lá para eu resolver para ele e eu resolvi usando uma matemática que eu estava acostumado a usar na faculdade. Ele olhou na resolução e falou: "Olha, não entendi nada do que você fez, mas o resultado está certo. Pode trabalhar." E eu fui trabalhar. P/1 – Então quer dizer que o senhor começou a trabalhar enquanto ainda fazia a faculdade? R – Não. Aí eu saí da faculdade e fui trabalhar, não tinha como, né? Porque a faculdade era durante o dia e você não tinha essas opções de hoje, trabalha em meio período e tal. Então eu fui pra Light. P/1 – Mas aí depois o senhor retomou os estudos? R – Retomei 20 anos após, quando a CBA me mandou para Itupararanga. Aí eu terminei os estudos em 2003. Me formei engenheiro. P/1 – Que ótimo. E com quantos anos o senhor começou a trabalhar na Light? O senhor tinha quantos anos? R – Na Light, eu tinha 22 anos. P/1 – 22 anos. R – Eu entrei cedo na faculdade. P/1 – Foi o seu primeiro emprego. R – Primeiro emprego. P/1 – Tirando a sua experiência de motorista enquanto criança lá, ajudando o seu tio. R – Na realidade, lá em Ituiutaba, não era bem um emprego, mas eu ajudava o meu pai, fazia as coisas para o meu pai, entregava roupa de bicicleta, sujava as roupas dele, perdia roupa no caminho, era uma confusão danada, mas trabalhava lá também. Nunca fiquei sem fazer nada. P/1 – Então o seu primeiro emprego remunerado... R – Formal, é isso aí, né? P/1 – ...Formal, foi na Light. R – Isso. P/1 – Tá. E o senhor poderia falar do primeiro dia do teu trabalho? Como é que foi? R – O primeiro dia foi uma lástima. Porque eu cheguei na Light, a Light tinha um pessoal um tanto estranho, um pessoal meio gozado, né? Aí eu fui fazer um teste de óleo isolante e, no fazer esse teste, eu queimei um aparelho, entende? Porque tinha uma determinada informação do aparelho que não me foi passada. Aí um senhor antigo que tinha lá, ele me deu um esculacho danado, me deixou muito sem graça. Aí um colega meu, que é meu amigo até hoje, chegou para mim e falou assim: "Gilberto, esquece esse rapaz aí e continua fazendo o teu negócio." Aí eu esqueci, toquei em frente... P/1 – E quais eram as suas expectativas dentro da empresa neste primeiro momento? R – Na Light? P/1 – Na Light. R – Nenhuma. Nunca tive nenhuma expectativa na Light, porque eu achava que uma firma que você não sabe quem é o dono não é uma boa firma de trabalhar. E você não tem... sei lá, eu não tinha muita perspectiva. O que que eu queria? Eu sabia que a Light era uma excelente escola. Se você quisesse aprender eletricidade, tinha que trabalhar na Light, tá? Então, o que eu aprendi na Light, eu aprendi muito. Eu mexia com tudo. Eu fazia plantão, todo dia, até 10 horas da noite para poder enfrentar problemas e, depois de algum tempo, a minha própria chefia me colocava nos problemas sérios, né? Então eu aprendi muito lá, foi uma escola excelente. Quando eu vim para a CBA, eu já entendia de eletricidade, embora eu não fosse engenheiro elétrico. P/1 – E qual era a sua função dentro da Light? R – Na Light, a gente, especificamente, no início, manutenção de disjuntores. Disjuntor é um equipamento pesado que abre os circuitos de alta tensão em uma subestação. Posteriormente, eu comecei a trabalhar com transformadores, inspeção de transformadores. E mais para frente com toda a subestação. Aí eu fiquei um especialista em problemas de subestações. Então, se tinha, por exemplo, um evento sério em uma determinada subestação, transformador pegou fogo, alguma coisa não entrava e tal, eu atendia isso aí. E, no fim, quando saí da Light, eu estava fazendo calibrações de equipamentos que regulam a tensão de rede, a tensão das linhas que vão para subestações que distribuem na cidade, né? Mas sempre na área da subestação, nunca na rua, nunca na distribuição em si. P/1 – E o senhor ficou quanto tempo na Light? R – De 69 a 73. Quatro anos. P/2 – O senhor disse que fez grandes amigos aí. R – Tenho, tinha... tenho até hoje amigos lá. P/2 – Conta um pouquinho aí desse misto de relacionamento de amizade, dos contatos... R – Até então, eu tinha muito pouca amizade em São Paulo, porque São Paulo é uma cidade, já naquela época, um tanto difícil de você se relacionar. Eu conheci o pessoal da escola onde eu fiz o nível médio, depois tinha alguns amigos que entraram na faculdade comigo, um deles era... o pai dele era fiscal do Ministério da Saúde em um frigorífico em Osasco, daí é que eu encontrei a minha esposa, porque a minha esposa morava lá na Cidade de Deus, no Bradesco, lá em Osasco e o frigorífico era pertinho eles eram amigos e no fim eu que acabei casando lá com ela. Então tinha alguns amigos da faculdade e lá na Light, como trabalhei lá alguns anos, tem um pessoal muito legal lá que... esse Ivan que é um rapaz lá do Rio de Janeiro, um rapaz muito interessante porque ele tinha sacadas legais, era muito alegre. P/1 – E como que foi a saída da Light e a entrada na CBA? R – Então, a saída da Light foi o seguinte: um dia lendo o Estadão, eu descobri que... eu queria... era uma das minhas perspectivas que eu fosse para uma hidrelétrica. Eu achava que trabalhar na geração era um negócio muito gostoso, como acho até hoje, né? E aí, lendo o Estadão, eu vi que a CBA estava procurando gerente para hidrelétrica. Aí, naquela época o Carlos Mazzali, que você já entrevistou, foi o que me... ele tinha seis meses de CBA e estava procurando. Aí eu vim fazer entrevista com ele. Mandei um currículo, não é? Aí ele me disse o seguinte: “Ó, o teu currículo é o currículo mais simples que tem aqui, o que menos fala.” Aí ele começou a conversar comigo e me contratou. Aí depois eu falei para ele que currículo é um negócio muito perigoso, porque, se você fala muito e fala aquilo que você não sabe, você dá chance da pessoa te... então eu só falei daquilo que eu sabia, que eu tinha certeza que eu sabia. Aí ele passeou em mais algumas coisas e eu acho que eu consegui atendê-lo, né? E aí comecei a trabalhar na CBA. P/1 – Isso nos anos de... R – 69. 1969. P/1 – 1969. R – Aliás, 1973. P/1 – 73. De 69 a 73 o senhor esteve na Light. Então, a partir de 73, o senhor se vincula na CBA. R – Isso. P/1 – E qual foi a primeira impressão dentro do grupo, dentro da... P/2 – O senhor já ouvia falar sobre a Votorantim? R – É, a Votorantim não era nada disso que é hoje. A Votorantim era relativamente pequena. Para você ter uma noção de como era a Votorantim naquela época, o pagamento da usina, eu tinha que vir buscar aqui no escritório central. Eu levava em um pacotinho enrolado em jornal. A caixa, naquela época lá, ficava abismada comigo que eu tinha que trazer uma sacola. Eu falei: "Não quero sacola. Ficar carregando dinheiro em sacola? O cara fica... então eu levo em um pacotinho de jornal aí.” E levava isso para lá. Quer dizer, a Votorantim era completamente diferente. O próprio doutor Antonio me dizia que, naquela época, se pagava... aliás, em 58, ele me falou que ele tirava coisa do porto para poder ir para a usina hidrelétrica, tinha que esperar algum tempo para poder arrumar dinheiro para poder liberar o equipamento no porto. Quer dizer, a Votorantim estava bem iniciando, não é? Não tinha... pagava todas as coisas no cartório. P/1 – E o senhor se lembra do seu primeiro dia de trabalho, já na CBA, na Votorantim? R – Lembro. Lembro. P/1 – Como foi? R –Não tem muita coisa especial não, porque o primeiro dia de trabalho eu esperei em casa, um cara chamado Carlos passou lá e me pegou e fomos para a usina. Aí me apresentou a usina, me apresentou ao pessoal que trabalhava lá e tal, né? P/2 – Qual era a usina? R – Usina França. Foi a primeira usina que a CBA construiu. Rodou em 58. E aí a gente conheceu a usina, fui lá ver o que que tinha, achei que aquilo era mesmo o que eu queria. Como local... aliás, foi um local excelente para criar filho, porque longe de toda essa confusão de cidade. Foi um período muito gostoso, inclusive, na França. Aí logo depois a CBA já estava, já tinha a usina Fumaça e estava construindo a usina de Alecrim. A usina de Alecrim entrou em serviço e eles tiveram um problema lá com o chefe da hidrelétrica de alecrim e perguntaram se eu queria ir para lá. Falei que sim. Já não é problema, que eu estava lá para trabalhar. Aí fui lá para Alecrim. Um lugar difícil de morar. Lá era difícil. P/1 – Difícil por quê? R – Porque a cidade mais próxima ficava a 47 quilômetros em estrada de chão e não tinha quase praticamente nada. Para você ver como era difícil, naquela época eu tinha uma Caravan, a minha mulher saía com os meninos para poder fazer compra em Juquiá, eu não tinha as vezes tempo para acompanhá-la, ela levava o meu carro, uma enxada porque se encravasse, ela se virava lá com a enxada lá e passava, né? E ela reclamava muito porque a Caravan tinha um problema no trambulador de marcha, aquilo pegava barro e travava, não conseguia... mudava a marcha com as duas mãos. P/1 – E qual era a sua função na usina de França? R – Mesma função de hoje, é um chefe de usina. É um gerente administrativo, técnico, você tem que fazer parte elétrica, parte mecânica, a parte civil, pessoal, todas essas coisas aí. P/1 – Bom, como o senhor falou, a usina de França foi a primeira a ser construída pela Companhia Brasileira do Alumínio. Quais foram os principais desafios o senhor encontrou e quais os principais aprendizados tomados a partir destes desafios? R – Nessa hidrelétrica? P/1 – Nessa hidrelétrica. R – Não, olha... o principal desafio para mim era a parte mecânica, porque como eu tinha uma formação elétrica, eu tinha algumas restrições na parte mecânica, né? E durante este período que eu fiquei na França, eu me desinibi nessa parte mecânica, vamos dizer assim. Comecei porque... embora uma hidrelétrica, ela seja considerada uma instalação elétrica, ela é, fundamentalmente, uma instalação mecânica, porque você tem tubulação, você tem turbina, você tem gerador, tem mancal, tem não sei o quê e, no finalzinho, tem a parte elétrica. Embora a parte elétrica seja realmente importante, mas ela é fundamentalmente uma instalação mecânica. Então eu tive que me desenvolver bastante nessa área de mecânica. P/1 – Então depois que... o senhor ficou de 73 até que ano na usina de França, o senhor se lembra? R – 73 a 76. P/1 – Aí de 76 o senhor, para entender... o senhor foi para usina, para a hidrelétrica de Alecrim.... R – Alecrim, de Alecrim. P/1 – E lá o senhor ficou por quanto tempo? R – Bom, lá eu fiquei até 83. Porque de lá eu auxiliava o doutor Mazzaro na construção das outras hidrelétricas, né? Em volta lá, nós construímos: primeiro Serraria, depois Porto Raso, depois Barra. Então entrava nessas hidrelétricas a partir da cotação do equipamento. A gente entrava conversando com o fornecedor e tudo nesse negócio da parte de cotação de equipamento. Depois entrava na parte de construção, de montagem. Daí pegava a hidrelétrica e botava ela para operar. Entrava com a operação, né? Então eu partia a operação de quatro hidrelétricas da CBA naquela região. Depois eu participei um pouco menos na hidrelétrica de Iporanga, que aí já estava em Itupararanga. P/1 – Hoje, o senhor é responsável por quatro usinas. R – Quatro usinas. Naquela época também era quatro. P/1 – Sim. R – Eram quatro. P/1 – Hoje pela usina de Jurupará, Itupararanga, Votorantim e Santa Helena, né? R – Hoje eu sou dono do museu da CBA. Itupararanga é uma usina de 1914. Votorantim é uma usina de 1912. Santa Helena é uma usina de 1936 e Jurupará de 1947, parece. A de Votorantim não foi construída pelo grupo. A de Votorantim foi uma... o grupo... na realidade, naquela época era o comendador Pereira Inácio, o avô do doutor Antônio. Ele, eu acho que comprou aquilo lá da massa falida de um banco que chama banco União. E aí montou o começo do grupo ali, que é a fábrica de tecidos, né? E essa hidrelétrica de Votorantim, ela é dentro de uma fábrica de tecidos, é dentro da cidade, né? Recentemente a Votorantim vendeu a Votocel, que era uma empresa que consumia a energia dessa hidrelétrica e o doutor Antonio determinou que a gente fizesse a recuperação dessas hidrelétricas, que ele achava que isto aí estava no... foi o início do grupo, né, e que valia a pena a gente recuperar e botar para funcionar esta hidrelétrica que é o que nós estamos fazendo hoje. Estamos há um ano com obra nessas hidrelétricas. P/1 – Todas as quatro, não... A de Jurupá... R – Jurupará. P/1 – Jurupará. Itupararanga, a de Votorantim e Santa Helena, todas elas estão na ativa? R – Todas elas estão na ativa. Não, Votorantim ainda não, porque nós estamos fazendo a recuperação e nós devemos colocar uma máquina este mês. P/1 – Ah tá. E a de Santa Helena? R – Está rodando. Está gerando para a CBA. Já está fazendo alumínio. P/1 – Dentro de todo esse histórico e essa bagagem que o senhor foi acumulando ao longo desses anos, partindo lá dessa primeira experiência em zona de França e a experiência que o senhor tem hoje, como é que... o senhor pode contar para a gente um pouquinho dessa trajetória, sabe? Quais foram os principais aprendizados ou dificuldades, e quais são os novos desafios que estão sendo colocados? R – Bom, como a gente pode colocar? A Votorantim vem mudando continuamente, mudando, crescendo e, na área de hidrelétrica, as modificações, na realidade, elas são poucas. A gente tinha desafios técnicos que a gente ia enfrentando sempre. Hoje estou operando a hidrelétrica, amanhã tem que... a gente está montando outra e depois entra em operação, aí já está construindo outra e a minha vida foi assim até 86, por aí. Daí a gente foi para Itupararanga e, posteriormente, o grupo começou a mudar muito, né? Hoje, administrativamente, o grupo é muito diferente daquela época. Ele perdeu, ganhou muita coisa e perdeu muita coisa. Ele perdeu em velocidade, por exemplo, de definição, né? Antigamente as coisas eram definidas, aí tinha doutor Miguel, o doutor Antonio no caminho só, e definiam as coisas muito rápido. Hoje as coisas são um pouco mais lentas, mas talvez mais seguras, com outras técnicas de gerenciamento e tal. E a gente está tendo que aprender também essas técnicas de gerenciamento, é SAP daqui, e não sei o quê dali, é 5S, é parariparará, mas a gente está... P/1 – E como que é o seu cotidiano no trabalho? Dentro dessa função, como que é o seu cotidiano, como é o seu dia-a-dia, a relação que o senhor estabelece com o pessoal no trabalho, como é que funciona? R – Bom, a relação parece ser boa. Eu entro todo dia, às sete horas da manhã eu estou no trabalho. Hoje, por exemplo, a gente tem uma turma nossa que está trabalhando na recuperação dessas hidrelétricas. Então, às sete e pouquinho eles estão descendo para as hidrelétricas que são próximas,15 minutos de distância, a gente determina este trabalho, vê como é que está isso aí diariamente, visita estas obras três, quatro, cinco vezes por dia, entende? E o resto é operação, né, de hidrelétrica, problemas técnicos com a fábrica, o que está acontecendo, quer dizer, liga linha para lá, liga linha para cá e tal, entende? Mas a operação, a interação com a equipe tem que ser muito grande, porque você não faz nada sozinho. Você tem que ter uma equipe boa senão você não vai em frente não. P/1 – E o senhor está sempre em trânsito também, né? R – Sempre. Sempre em trânsito, é difícil me achar. P/1 – É mesmo. P/2 – E do ponto de vista técnico, o senhor percebe muitas mudanças? Assim, na sua trajetória aí de todos esses anos? R – Do ponto de vista técnico, o quê? De conhecimento técnico ou de... P/2 – De tecnologia, de mudanças... R – Não, é lógico. Antigamente, por exemplo... P/2 – Fala um pouco... R – ...em 1969, quando eu entrei na CBA, não existia eletrônica dentro de uma usina. Não existia. A eletrônica não cabia dentro de uma hidrelétrica porque ela não tinha segurança, ela não nos dava segurança. E aí, a partir da década de 80, ela começou a aparecer em algumas coisas, alguns equipamentos, algum equipamento de proteção e tal, né? Hoje a eletrônica é a que faz o controle da hidrelétrica. Para você ter noção, nós estamos montando Votorantim e Santa Helena para serem controladas remotamente de Itupararanga via cabo de fibra ótica, via sistema digital. Então já tem um comando digital na usina, tá? Então a evolução técnica é enorme. Neste aspecto, no aspecto de controle. No aspecto de máquina pesada, da maquinaria pesada, não. Até ao contrário. A gente força para que os parâmetros de cálculo das nossas máquinas sejam conservadores. Porque isso a gente garante que a gente tenha temperaturas de mancais mais baixas, a máquinas com temperaturas mais baixas, e vida da máquina muito maior. Tanto é que a usina de Itupararanga tem 90 anos. Se alguém quiser uma hora ir lá visitar, vai lá para ver como é a hidrelétrica. Como é que a velhinha está lá. P/1 – Eu vi algumas imagens, o prédio é lindíssimo. Tem uma arquitetura bastante interessante mesmo. E, senhor Gilberto, desde o início das atividades a CBA e o grupo Votorantim têm tido uma preocupação e tem adotado políticas estratégicas de geração da energia que é gasta dentro do seu contingente. O que significa, para o grupo, produzir 60% da energia que é consumida? R – A CBA é uma que nós chamamos de eletro-intensivo. Eletro-intensivo é uma fábrica que tem como insumo básico a energia. E a fábrica de alumínio hoje nossa consome 750 megawatts. Quer dizer, é maior do que Bolívia, Paraguai, esses negócios por aí, né? Então a energia dentro da fábrica é um negócio fundamental. E a CBA principalmente sempre tentou, o doutor Antônio sempre tentou manter um certo parâmetro entre o que você está comprando e o que você está gerando por uma questão estratégica, de segurança da planta fabril. E, quando eu entrei, nós tínhamos aí rodando 80 megawatts. Não eram nem 80, eram 50 megawatts. Hoje nós temos, na região de Juquiá e Sorocaba, 300 megawatts instalados, fora àquilo que você implantou fora: Piraju, Canoas, as participações que tem... estou falando Piraju porque é uma... e Ourinhos, por exemplo, que são hidrelétricas operadas pela CBA, embora não esteja nesse sistema do Juquiá e Sorocaba. O Juquiá e Sorocaba, eles têm linhas de propriedade da CBA, que vão direto para a fábrica. E estas outras hidrelétricas que a gente tem fora, elas utilizam o sistema de transmissão do estado, né? Então esta evolução da energia na CBA, ela foi um negócio muito rápido, né? Como foi rápida também a evolução da fábrica. Naquela época eles faziam 80 toneladas de alumínio, 80 mil toneladas de alumínio por ano. Hoje são 380 mil toneladas. P/1 – E quais são as projeções para o futuro? R – Olha, essa só o doutor Antonio sabe, ele não pára nunca, né? Já estão fazendo uma nova sala-fornos, né, deve chegar a 400 e poucas toneladas já. Ele está falando em chegar a mil megawatts de consumo não muito longe, já tem uma subestação de 460 que deveria já estar entrando, já está quase para entrar já. Não pára, né? Ele é impressionante. P/1 – E o senhor, enquanto responsável por essas usinas, eu queria que o senhor trouxesse uma história, algum caso pitoresco mesmo, que pudesse ser... R – Pitoresco? P/1 – É, que nós pudéssemos registrar. P/2 – Alguma história interessante que o senhor lembre... P/1 – Um “causo”. R – Não, tem muito, mas é que... P/1 – Então conte. R – ... eu não sei o que é interessante, né? Eu lembro quando a gente... P/1 – Tudo é interessante. R – Eu lembro quando a gente rodou Porto Raso, tinha uma... lá tem um chanfro, que é um buraco que tem 40 metros de profundidade. Lá embaixo passa o conduto forçado e tem uma válvula. E eu lembro um dia que era um domingo, deu um problema nessa válvula, fazia mais de uma semana que a hidrelétrica estava operando, deu um problema nessa válvula e eu não tinha ninguém na hidrelétrica e eu fui lá para resolver. Então você tinha que... tem uma escada de marinheiro, você desce 40 metros lá para baixo lá e tinha que levar umas ferramentas, né? E eu sempre carregava na caminhonete, carrego até hoje uma mala de ferramenta, porque se eu chegar no lugar e tiver algum problema, a gente já taca logo e resolver aquele negócio lá e pronto. Aí eu peguei e botei essa mala de ferramenta nas costas e desci essas... naquela época eu era novinho e eu dava conta dessas coisas. Desci 40 metros lá embaixo. Cheguei lá e resolvi o que tinha sido resolvido e voltei. Cheguei lá em cima pregado, escapou a mala de ferramenta e caiu lá embaixo. Tive que voltar lá e catar... E uma outra vez também estava eu na França, a gente tinha feito uma manutenção na França e tinha um vazamento lá em um sistema lá embaixo que, quando você ia fazer um enchimento do conduto, você demorava para poder encher o conduto. Então a gente fazia uma abertura maior lá em cima para poder encher este conduto. E aí nós reparamos este negócio e foi eu e um funcionário antigo lá da França lá fazer a abertura desse negócio lá. Também um chanfro. Descemos lá nesse chanfro e ele tinha uma cobertura de alumínio e, na frente, logo para a frente da válvula tem um tubo de alívio que vai acima dessa cobertura. E a gente abriu esta válvula, só que esquecemos de reduzir a abertura em função do vazamento que a gente tinha eliminado lá embaixo. Então a tubulação encheu muito rápido. Quando ela encheu muito rápido, ela carregou bolsas de ar e essas bolsas de ar subiram para essa tubulação paralela ali e jogou água em cima daquela estrutura. Eu acho que nós não levamos dois minutos para sair lá em cima, né? Quando chegamos lá em cima é que a gente lembrou o que é que poderia ter acontecido. Aí já estava com o joelho todo roxo de bater naquele negócio lá... P/1 – Senhor Gilberto, solidez, empreendedorismo, responsabilidade, ética e união são os valores do grupo Votorantim. O senhor identifica esses valores no seu dia-a-dia? R – Identifico. Lógico. P/1 – E esses valores estão presentes no seu trabalho? De que forma eles aparecem? R – Bom, a solidez do grupo nos dá uma segurança muito grande para a gente trabalhar. Isso, sem dúvida. Responsabilidade nessa área, não tem jeito. Tem que ter responsabilidade. O que mais? P/1 – Empreendedorismo. R – O empreendedorismo do grupo é impressionante. A gente tem que acompanhar isso aí. Na área de hidrelétrica eu acho que eu consegui acompanhar o grupo nessa área aí. P/1 – Ética? R – Ética, não tem nada sem ética. Sem ética você não faz nada. P/1 – E a união. R – E a união com a equipe. União com a equipe também é outra coisa fundamental no trabalho. P/2 – Eu queria fazer uma pergunta: o que o senhor conhece sobre as ações do grupo relativas à preservação do meio ambiente? Porque eu acho que isso é uma questão... R – Eu sempre... o grupo sempre, principalmente a CBA, sempre foi muito criticado em termos de meio ambiente. E eu sempre achei, sempre falei para o pessoal nosso que a CBA não estava sabendo utilizar aquilo que é feito com o meio ambiente. Haja vista, por exemplo, o rio Juquiá: se a CBA não tivesse entrado no rio Juquiá na época que entrou, aquilo tinha virado tudo carvão. Que, quando eu entrei na França, o que saía de caminhão de carvão ali de regiões próximas ao terreno da CBA. A CBA ali, naquela região, tem 10 mil alqueires. São 10 mil alqueires preservados de mata, mata, mata pura. Outro dia eu estava voando lá em cima das usinas, e aí um outro chefe de usina nosso que é o César falou: "Gilberto, a gente parece índio aqui, né? Você vê ali umas cabaninhas aqui, umas cabaninhas ali e o resto é mato, mato, mato, mato." aquilo existe porque a CBA está lá, porque senão não existia. P/2 – Teria acabado. R – Teria acabado. P/2 – E dentro dessa sua trajetória e ainda em relação ao meio ambiente, o que o senhor consegue perceber de diferencial entre os anos lá de 1973, quando o senhor estava iniciando essa trajetória e hoje, 2006? O que mudou, quais foram as melhorias, quais são os cuidados do grupo em relação ao ambiente? R – Não, hoje... bom, naquela época, você fazia uma hidrelétrica sem muitas preocupações ambientais. E aí houve algumas falhas em construção de hidrelétrica no Brasil que aceleraram esse processo de melhoria no controle ambiental. Uma delas é aquela usina de Balbina lá em cima que tem 10 centímetros de lago e uma área enorme, alagada. Mas a CBA, naquela época, por exemplo, ela tirava madeira do mato ali em torno para poder construir a hidrelétrica, naquela região do Juquiá. Embora este ataque ao mato já tenha sido... não é visível mais, porque ele é muito restrito na área lá, era uma atividade que não era adequada, né? Aí na serraria já, a gente... a CBA já começou a utilizar outros processos, já começou a comprar mais madeira e tal e ter mais preocupação com essa questão ambiental, né? Mas essa questão ambiental foi evoluindo, foi virando também um negócio muito radical. Hoje o setor hidrelétrico sofre muito pelos erros que cometeu no passado e pelo radicalismo do presente. Esse radicalismo, realmente, tem criado algumas dificuldades muito sérias. Parece que existe um pessoal que ganha muito dinheiro em criar problemas ambientais. Eles não procuram apresentar soluções. Você tem um projeto hidrelétrico, por exemplo, ele tem um passivo ambiental, mas esse passivo, ele pode ser minimizado, ele pode ser também compensado de outras maneiras, através de um monte de coisa e você não consegue. Eu vejo, por exemplo, na Europa, aquelas hidrelétricas encaixadas dentro da cidade, integrando toda a área da cidade, colocando a cidade até bonita, né? Aqui no Brasil esse negócio é meio complicado. A gente tem uma série de dificuldades ambientais para poder construir. O governo te vende, por exemplo, uma concessão. Você vai lá e compra a concessão e depois você não consegue implantar a hidrelétrica. Até a ministra do meio ambiente, que é a Marina, ela tinha como projeto vender a concessão já com a licença de instalação pronta. Quer dizer, com toda a obra de mitigação ambiental já discriminada. Quer dizer, para você poder construir, você tem que fazer isso, isso e assim e a obra tem este parâmetro. E até hoje a gente não conseguiu isso aí. Então isso aí está... não é bom. P/1 – E queria que o senhor me dissesse também qual é importância da energia hoje para o grupo Votorantim? R – Olha, o grupo... eu não conheço muito as outras áreas do grupo. Eu tenho, como eu falei para Inês, eu tenho muito pouco tempo, por exemplo, para ficar estudando outra área do grupo. A parte de hidrelétrica realmente consome muita gente. Eu começo às sete, normalmente, e não paro antes das oito, todo dia. Então, eu não tenho muito tempo, mas na CBA é visível, né? É um intensivo. Agora, qualquer tipo de indústria hoje depende de energia, tá? Não tem jeito. Energia é insumo em qualquer área de trabalho. Então nós estamos aqui em uma salinha cheia de energia para tudo quanto é lugar. Se não tivesse energia você não fazia aqui, né? Então a energia é fundamental em qualquer tipo de operação industrial. Não tem jeito. P/1 – E senhor Gilberto, na sua opinião qual é a importância do grupo Votorantim para a história da indústria no Brasil? R – A Votorantim e a Matarazzo é um negócio muito interessante, né? Infelizmente a Matarazzo não deu certo, não teve sucessão e é isso que a Votorantim acertou. A Votorantim teve sucessão. Está tendo uma sucessão fenomenal, quer dizer, ela... agora é que ela está realmente explodindo. E eu acho que na indústria brasileira, a Votorantim é um marco. Ela é um marco, doutor Antonio é um marco. Você não consegue conversar, por exemplo, com um industrial que ele não fale: "Oh, você trabalha para o doutor Ermírio de Morais. Eu gosto muito dele..." não tem. Ele é sempre uma referência e o grupo inteiro é uma referência. P/1 – E hoje, se o senhor fizesse uma pequena reflexão e buscasse qual o principal aprendizado pessoal, profissional, que o senhor obteve ao longo desses anos junto ao grupo Votorantim, quais seriam esses aprendizados? R – A gente aprendeu tanta coisa aqui que é difícil você destacar um aspecto, né? Vamos ver... Tecnicamente tem muita coisa que se aprendeu, né? Em termo de pessoal também, a gente tem muita coisa. O relacionamento da gente com a chefia da gente, com os subordinados da gente é uma relação muito boa. É um ambiente de trabalho gostoso, principalmente na área de hidrelétrica. P/2 – O senhor tinha dito que o senhor tem dois filhos engenheiros elétricos. R – Dois filhos. Não, um está formando, o outro... P/2 – Qual é a sua participação na escolha de seus filhos? R – Isso que é interessante. Nenhuma. P/2 – Nenhuma? R – Nenhuma. Eu sempre achei que os meus filhos deviam fazer aquilo que eles quisessem. Mas como é que... por exemplo, o Renato, que é o mais velho, ele... sempre que eu tinha, por exemplo, uma máquina aberta, alguma coisa, ele queria ir lá ver, como é que é, discutia comigo e tal. Hoje eu ensinei muito para ele, hoje estou começando a aprender, tá? P/2 – Que ótimo. R – Ele... a meninada hoje, a meninada tem uma capacidade de desenvolvimento muito maior do que a gente que tem um pouco mais de idade e eles desenvolvem em uma rapidez... ultimamente nós fizemos um curso juntos que é um curso de proteção que a CBA pagou o curso para mim e eu paguei o curso para ele. Eu falei assim: "Se a CBA pagou para mim, eu pago para você." Tá? E o negócio não era muito barato não, e nós fomos fazer. E eu ficava impressionado com a velocidade com que ele pegava as coisas, entende? Pega muito rápido. Então eu não tive participação. Eu fiquei fazendo porque, realmente, acharam que aquilo era o... O do meio está fazendo curso de elétrica, mas eu acho que não é a aptidão correta dele. Ele gosta mesmo é de equipamento digital. Então eu acho que ele vai fazer elétrica. O que eu falei para ele: "Você começou a fazer, termina. Porque engenharia elétrica vai te dar muita base para você, depois, migrar para o que você quer. Depois você se especializa na área de equipamento digital." P/1 – E quais são as suas expectativas para os próximos anos? R – Em termos de quê? P/2 – Como o senhor sabe, a Votorantim completa cem anos daqui a 12 anos, né? R – É. P/2 – Assim, qual a sua expectativa em relação, como o senhor vai estar lá? R – Daqui a 12 anos? P/2 – É. R – Provavelmente eu não vou estar. P/1 – Imagina. R – 12? Não. P/1 – O que é isso, senhor Gilberto. P/2 – Então como o senhor imagina a Votorantim. (risos) R – A Votorantim, eu tenho a impressão que ela vai explodir. Eu admiro muito a Votorantim porque, nas épocas de crise, toda vez que eu leio, por exemplo: "Tem crise." Tem crise em alumínio, não está vendendo alumínio, a fábrica está crescendo, está investindo. Tem crise de cimento, estou lá do lado de uma fábrica de cimento, tem crise no cimento, a fábrica está sendo ampliada. Quer dizer, quando sai da crise, ela estoura. E a Votorantim sempre está fazendo isso. Então daqui a doze anos, ela deve estar alguma coisa fenomenal. P/1 – E os seus principais desafios profissionais? O senhor tem uma bagagem enorme... R – Bom, eu acho que já estou começando a ficar meio difícil de aprender, entende? Muita coisa já... às vezes eu já tenho alguma dificuldade. Eu vejo lá com o meu filho, às vezes ele pega um negócio lá, eu levo duas horas para saber o que ele está falando lá. Então, profissionalmente, em termos de evolução, eu acho que a gente vai começando a ficar limitado, não é? Mas eu pretendo, assim que aposentar da CBA, é partir para outra coisa. Partir para uma firma de elétrica. Nós já estamos mexendo com isso aí, não é? P/1 – Bom, como o senhor já deve saber, a Votorantim Cimentos está comemorando 70 anos de existência. O senhor gostaria de deixar alguma mensagem? R – O que eu poderia falar para Votorantim Cimentos? Bom, é interessante que o início do cimento é ali do lado, né? Do lado de Itupararanga. A gente... na realidade, aquilo lá parece que aquilo lá começou como uma fábrica de cal, alguma coisa assim desse tipo. Mas e o pessoal do cimento é um pessoal que é muito especializado naquela área e que teve um início dessa nova gestão, dessa nova maneira de gestão antes da CBA. Eles começaram a se preocupar mais com o meio ambiente, se preocupar mais com a administração do negócio, com a evolução da administração do negócio antes da gente, que é um negócio muito interessante. Eu sempre achava que aquilo era uma meta para a CBA também, que estava indo para lá, como foi, como já está indo... então eu acho que eles foram desbravadores nessa época, nessa área administrativa. P/1 – O senhor tinha dito que, quando eu te perguntei sobre as quatro usinas as quais o senhor é responsável, o senhor tinha dito que, na realidade, o senhor toma conta do museu do grupo... R – Do museu. Exatamente. Mas é um museu mesmo. P/1 – Queria que o senhor resgatasse um pouquinho a história da usina de Itupararanga, de Votorantim... R – Bom, a usina de Itupararanga, que eu conheço um pouco mais da história dela, ela iniciou da seguinte maneira: tem um grupo canadense, que é o grupo Brascan, que era o próprio grupo da Light, que estava querendo investir no Brasil nessa área de energia. E veio para o Brasil um americano que se chamava Piercen, um engenheiro civil, para poder examinar um aproveitamento da hidrelétrica que chamava (Paudalho?), que fica na região ali de Edgard de Souza, por ali. Eu não sei exatamente qual o posicionamento, já procurei e não consegui. E aí, nesse período, ele foi informado que existia esse aproveitamento na região de Sorocaba. Tinha até uma pequena hidrelétrica e tem vestígios dessa pequena hidrelétrica lá ainda e nós temos fotografias dessa hidrelétrica, como falei para Inês, a gente tem fotografias em vidro, com negativos em vidro, desde o início da hidrelétrica Itupararanga, a recuperação dessa pequena hidrelétrica lá para poder fornecer energia para a obra de Itupararanga. E aí ele se interessou por aquilo lá e comprou, do próprio Banco União, que era dono da hidrelétrica de Votorantim, que o grupo tinha _____ lá, né? E ele começou a trabalhar naquilo lá, fazer a... projetar aquele negócio. E o interessante é que a hidrelétrica, eles começaram a montar a hidrelétrica, e esse pessoal é muito organizado, não é? Eles já venderam a energia que quando a hidrelétrica entrou, aquela energia já estava vendida para São Paulo, tinham umas aplicações em São Paulo. E ela entrou em um período de seca terrível. Ela entrou em abril de 1914 em um período horrível de seca. E aí eles tinham, em 25... depois já melhorou, eles começaram a fornecer energia e eles compraram, estava previsto cinco máquinas iguais, são turbinas Voith com equipamento americano da Westinghouse. Aí veio a Primeira Guerra. Turbina Voith não dava para comprar. Aí eles compraram um gerador (_____Electric?) da Inglaterra. É um conjunto (_____Electric?): é gerador, turbina, tudo da (______Electric?). Eles tiveram uma dor de cabeça terrível para colocar este equipamento em serviço. Eles levaram quase cinco anos para poder ter segurança no equipamento. É uma máquina de 20 megawatts, então eles, em vez de botar mais duas, eles colocaram uma máquina com a potência das outras duas. E, em 25, eles entraram com essa hidrelétrica. Outra seca. Entraram em 1925 com uma seca também brava. Então eles não tiveram muita sorte lá na entrada de Itupararanga não. Mas depois as coisas se assentaram. P/1 – E o senhor enfrentou períodos de seca ou inundações? R – Não, recentemente. Essa última seca que houve no sudeste aqui, deu um trabalho danado para nós, porque o reservatório de Itupararanga, ele é hoje um reservatório de uso múltiplo, ele não é só para geração de energia. Ele tem abastecimento público, abastece Sorocaba, abastece Mairinque, abastece Ibiúna, entende? Então você tem uma série de... tem lazer em um reservatório. E o nível começou a cair muito e o pessoal começou a “lincar” a perda de nível do reservatório com o aumento da produção de alumínio na fábrica. E na realidade, Itupararanga, em si, é 1%, não chega a 2% do total de energia da fábrica. Nós não aplicamos nenhuma energia de Itupararanga na fábrica para aumentar a produção. Na realidade a gente sempre operou em Itupararanga em função do lago mesmo, como nós operamos todos os lagos, porque se você não fizer isso, você perde o largo para o ano que vem. Então nós tivemos grande dificuldade. Felizmente este período de seca parece que terminou, nós já saímos desse vale e estamos começando a subir de novo. A geração, no ano passado, já foi boa. Este ano parece que vai ser uma geração boa também e o lago está bem posicionado. Mas isso é cíclico, né? P/2 – Todos os anos o senhor enfrenta. R – É. Essa seca fez com que a gente desse, sei lá, umas 30 entrevistas para aquele pessoal da mídia lá de Sorocaba, porque... P/2 – Para justificar. R – Para justificar essas coisas aí. Itupararanga é sempre a causa de tudo. Se tem seca, você não pode mandar muita água para o rio, o rio fica poluído porque não tem tratamento de esgoto nem nada, morre peixe. Se tem enchente, o pessoal fica preocupado que você vai soltar muita água, que vai alagar tudo lá porque todo mundo já invadiu... como tem uma usina em cima, que é um reservatório relativamente grande, as cheias são... 90% das cheias são moduladas pela instalação, tá? Então o que acontece? Fica dez anos, 15 anos sem cheia. O que acontece com a calha do rio? Todo mundo vai ocupando a calha do rio. Quando tem uma cheia, o problema é sério. Porque aí você não tem mais a calha do rio para passar aquela água. Hoje... P/1 – E já aconteceu isso? R – Semana passada... sexta, sábado, né? Sábado deu uma... não, segunda-feira deu uma chuva pesada lá. Choveu 70 milímetros no dia, tem uma média de umas cinco, seis horas. Sorocaba ficou debaixo d'água ali na marginal, entende? Mas Itupararanga não contribuiu com nada. Só foi a drenagem da barragem de Itupararanga para baixo. Quer dizer, nem isso mais o rio suporta. Que dirá as cheias que vem de montante, que chegam a 200 metros cúbicos por segundo. P/1 – Bom, para finalizar, queria que o senhor expressasse a sua opinião sobre o projeto Memória Votorantim. O senhor... R – É muito, muito interessante. Eu até não conhecia ele. O doutor Mazalli me falou que ia dar entrevista para vocês quando ele esteve aqui, um pouco antes, né, e eu não conhecia. Aí, conversando com a Inês, ela me falou: "Não, tem um site lá e tal..." Aí é que eu fui... ontem, que eu arrumei um tempinho à tarde para dar uma entrada no site e eu achei muito interessante. Aliás, eu acho que valorizar a pessoa é um negócio que tem que ser feito, né? O grupo Votorantim não seria nada se não fossem as pessoas. Eu conheci muita gente no grupo Votorantim que realmente vestiam a camisa. Pessoal que não se preocupava até muito com a vida particular dele, porque ele tinha que atender alguma coisa lá que estava pendurada, tinha que fazer as coisas dele na Votorantim. Não precisava você solicitar, ele não precisava ser solicitado a fazer alguma coisa. O pessoal pulava na frente mesmo, né? Eu acho que isso foi uma das vantagens que a Votorantim teve em relação aos grupos por aí. E isso demostra a boa relação que tinha entre a empresa e o empregador, que tem ainda, né? P/2 – E de que maneira o senhor acha que esse projeto, o projeto memória, pode interagir com a unidade de trabalho do senhor? O senhor tem alguma sugestão, de que forma o senhor acha que a gente pode fazer essa conexão? R – A maneira que vocês podem interagir é divulgar o trabalho lá dentro, mostrar essas coisas que estão acontecendo, o pessoal que está trabalhando, principalmente o pessoal que está ligado, que eles conhecem. Porque isso aí motiva o funcionário. Motiva o pessoal novo aí a trabalhar, saber que ele está sendo valorizado, né? É muito importante que o funcionário se sinta valorizado, se sinta importante dentro da empresa, senão ele... aliás, é todo este projeto da Votorantim, que tem tentado fazer isso, né? P/1 – E que ele se reconheça na empresa. R – Exatamente. Que ele se reconheça na empresa. P/1 – Verônica, você tem alguma pergunta? P/2 – Eu gostaria de saber o que o senhor achou de dar o depoimento? R – Eu achei bom, tranqüilo. Eu achei gostoso. P/1 – Eu acho que a gente pode encerrar então. Bom, então em nome do projeto Memória Votorantim e do Museu da Pessoa, gostaria de agradecer o seu depoimento e a sua contribuição. Muito obrigada. R – Eu que agradeço. (Fim do CD 1/1)
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