P1 - Ereni, você podia começar dizendo o seu nome inteiro, a data e o local de nascimento. R - Sim, mas é que eu tô aqui como representante do Movimento dos Trabalhadores Desempregados, eu não cato. P1 - Tudo bem, não tem problema. R - Ah tá, então tá. Meu nome é Ereni Diniz Poerschke, ...Continuar leitura
P1 - Ereni, você podia começar dizendo o seu nome inteiro, a data e o local de nascimento.
R - Sim, mas é que eu tô aqui como representante do Movimento dos Trabalhadores Desempregados, eu não cato.
P1 - Tudo bem, não tem problema.
R - Ah tá, então tá. Meu nome é Ereni Diniz Poerschke, sou natural de São Pedro do Sul, quer dizer, Passos do Anjico, São Pedro do Sul.
P1 - E qual é sua data de nascimento?
R - É... Sou de 12/10/1954.
P1 - E como a senhora foi parar em Canoas?
R - Ah, em Canoas... Primeiro a gente foi morar em Santa Maria de São Pedro, de lá de Passo de Anjico a gente veio pra cidade de Santa Maria. Só que em Santa Maria os trabalhos são poucos, né? Pouco trabalho, naquela época. Daí eu me casei lá, o meu esposo achou melhor nós virmos para cá, que ele via uma proposta grande de trabalho aqui em grande Porto Alegre, e tinha um cunhado que trabalhava aqui. Daí: "Ah, vamos pra lá, vamos pra lá. Lá tem bastante emprego..." E tinha, naquela época. Em 78, aqui, tu chegava, tinha vários empregos, tu podia escolher; não é como hoje, né? Hoje tu batalha e tu não encontra, mas naquela época tu escolhia. E daí o meu esposo pegou de ... Como é que se diz? Uma firma que faz ... Firma de ... Metalúrgica Metalúrgica, é. E eu, daí, batalhei também e consegui de uma ... Uma lancheria, naquela época, de balconista. Trabalhei um tempo na lancheria, meu marido continuou trabalhando na metalúrgica, ele foi ... Os caras foram fazendo serviço, pagando curso pra ele lá, e daí ele foi crescendo na firma; e a firma dele começou a... Ele nunca trocou de serviço; desde de 78 ele estava no mesmo serviço. Só que daí a firma começou a trocar de dono, de endereço; começou a trocar de dono e de endereço. E eu trabalhei um pouco em casa de família, trabalhei em lancheria, trabalhei em firma de pesagem, em várias coisas. Daí foi passando o tempo, a gente teve uma filha, continuei trabalhando, a gente já estava construindo a nossa casa, a gente queria construir uma casa, ainda não tinha, morava de aluguel, então eu ajudei a batalhar bastante pra conseguir fazer a casa. A gente construiu a casa, daí nós tivemos uma guria - o nome dela é Michele, ela tá com vinte e dois anos hoje - e daí... A nossa vida foi tranqüila, a nossa vida era boa, eu trabalhava, ele trabalhava, né? Aí aconteceu que...
P1 - A senhora trabalhava com o quê? R - Trabalhava... Eu sempre trabalhei, inclusive eu te falei, em vários trabalhos, não tinha assim ... Trabalhei em firma de pesagem, trabalhei em casa de família, trabalhei de balconista de padaria, de lancheria; trabalho que eu conseguia, eu trabalhava. Daí, quando a nossa guria tinha sete anos, e o salário dele já estava melhor, já tinha construído a nossa casa, a gente concordou que eu ia parar de trabalhar por causa do colégio, o colégio... A gente não morava numa vila muito boa, a gente morava mais pra baixo, não é nesse endereço que eu dei aqui. Daí eu decidi que eu ia parar de trabalhar pra tomar conta dela, do colégio, do estudo dela. Daí parei, fiquei uns quinze anos sem trabalhar. Nesse meio tempo, pra ocupar o meu tempo, eu fazia campanha contra a fome e o frio, arrecadava doações pra doar para as pessoas. Durante quinze anos trabalhei nisso. Doava alimento para essas pessoas que estavam na maior miséria, né? E foi. Mas daí, de repente as coisas ficaram feias. A firma do meu marido... Ele ganhava novecentos reais por mês, livre, passagem, tudo, daí de repente a firma quebrou, o cara não pagava o salário dele, pagava uma semana cinqüenta reais, outra semana não pagava nada, e assim foi, até que quebrou. E ele adoeceu, ficou desesperado, adoeceu, e eu sempre dizia pra ele: "Olha, se as coisas apertarem eu arregaço as mangas, vou trabalhar, vou te ajudar." Mas só que a minha idade já é avançada, né? Daí eu batalhei, fui pro mercado de trabalho, procurei serviço em casa de família, de faxineira, de... qualquer serviço, de fábrica... Nada. Daí eu digo: "não, mas eu tenho que trabalhar, de um jeito ou do outro eu preciso trabalhar." E a gente teve que até depender de parente, que a gente nunca precisou; eu, que tinha coisa pra doar pros outros, de repente fui ter que pedir ajuda pra parente, pra nós isso aí foi muito desesperador, mas a gente teve que passar por isso. Mas aí eu... Um dia eu saí de manhã, só com o dinheiro passagem, procurar serviço, passei o dia inteiro em Porto Alegre. Nada. Nem almoçar almocei, porque eu não tinha dinheiro pro almoço. Daí fui pra casa, eram cinco horas da tarde, umas quatro horas, acho, cheguei, daí fui pra Canoas. Cheguei lá no banco do trabalhador, disse pra eles... Tinha um banco do trabalhador que arrumava emprego, né? Só tinha nome de arrumar emprego, porque nunca consegui nada ali com eles. Mas daí eu disse pra eles: "Olha, eu quero voltar ao mercado de trabalho, eu preciso." Contei a situação, daí eles falaram: Nós temos cursos, vai fazendo os cursos." Daí eu disse pra eles: "Qual é o curso que vocês têm?" "Ah, nós temos datilografia." Eu digo: "Não me interessa, porque quando eu era nova eu não consegui. Eu não consegui, eu tenho curso de datilografia, eu não consegui emprego porque a gente não tendo, não sendo bonita, é difícil arrumar emprego." Principalmente na minha época, que era "assim" de gente pra trabalhar. Eu fiz o curso de datilografia, de auxiliar de escritório, secretária comercial, mas nunca ninguém me deu emprego desse tipo. Então trabalhava nesses outros serviços. Só que nem esse tinha mais. Daí ela disse pra mim que tinha todos esses cursos, eu digo: "Não." "Tem cabeleireiro, também." Eu digo: "Não quero cabeleireiro, não quero esses cursos, porque não adianta. Eu vou fazer... Eu quero alguma coisa em que eu consiga trabalhar e que já dê dinheiro." Porque eu precisava de. Daí ela disse pra mim: "Senhora, nós temos confeitaria." E eu sabia que uma boa confeiteira ganha bem. Qualquer confeiteira que tenha um curso e que tenha sorte de arrumar serviço de confeiteira, é na base de setecentos, oitocentos reais. Eu digo: "Não, então me inscreve nesse curso." Ela disse assim pra mim: "Não, não é assim que inscreve. Vai ter que vir lá pelas quatro horas da madrugada, ficar na fila." "Tá, eu dou um jeito e eu venho." Daí fui, me inscrevi, fiz o curso, aprendi todos os doces; se tu chegar numa confeitaria, se tu olhar, assim, todos aqueles doces eu aprendi a fazer. Mas daí... Peguei, com a ilusão, meu diploma, fiz o currículo, peguei, xeroquei meu diploma, mandei nas agências, mandei em todas as agências de Canoas, Porto Alegre... Nada. Fui de porta em porta, de padaria em padaria. Nada. Daí, minha última chance, eu dizia assim: "Bom, agora eu vou conseguir." Fui pelo jornal, né? Olhei, assim: "Preciso de confeiteira." Daí eu olhei, setecentos reais. Eu digo: "Ué, isso que eu queria. É isso que eu quero." Daí a idade, né? Até quarenta e cinco anos. Digo: "Tá, então me mate, né? Então acaba comigo, porque ..." O marido doente, foi ver o negócio do INPS dele, o cara fazia cinco anos que não descontava o INPS. Ralou totalmente o meu marido aquela firma. E o pior de tudo é que ela não deu baixa na carteira dele. O cara sumiu, e ele não pôde arrumar emprego nenhum aqui no Rio Grande do Sul porque o cara não tem carteira. Tirou carteira nova, na carteira não tem experiência. Um cara que trabalha vinte... desde de 78 em metalúrgica, o cara não tem como provar a experiência dele. É da pessoa enlouquecer, né? Nesse meio tempo, eu estava naquele desespero, não conseguia nada, daí eu recebi um convite do Movimento dos Trabalhadores Desempregados pra participar da reunião, pra ver. Daí eu disse: "Bom, vamos ver o quê que é, né, porque nós estamos... Vamos ver o quê que é. A gente não tem nada a perder mesmo." Estava ... Nós fomos lá, e eles falaram, né, que eles organizavam os trabalhadores desempregados em grupos de produção, daí nós fomos os dois. Mas nesse tempo, assim, acho que uns quinze dias depois, um ex-colega do meu marido, que fazia tempo que eles não se viam, eles se encontraram e ele disse que estava trabalhando por conta, que tinha uma firma. Aí ele falou pra ele que estava passando esses problemas... Ele disse. "Não, não te assusta porque eu tô pra ir pra São Paulo, agora, pegar um serviço grande lá em São Paulo, e se eu pegar eu vou te chamar." E nesse meio tempo ele chamou, né? Mas assim, sem carteira assinada. Mas eu estava, eu já estava com a minha decisão tomada. Nessas reuniões eu soube que tinha uma marcha, que se fazia uma marcha, eu não sabia nem pra onde, sabia que era de um movimento, mas eu achava que era tudo igual. Bem nessa época, o MST [Movimento dos Sem-Terra] conflito em São Gabriel. E eu não conhecia o movimento, via só na TV, eu digo: "É aí mesmo. É aí mesmo que eu vou." Mas a minha intenção era assim: era ir pra deixar me dar um balaço na testa, porque estão brigando mesmo, né? Porque eu não queria viver aquela vida, não gosto nem de falar nisso. (pausa) Já passou, graças a Deus.
P2 - Você estava contando que você estava na marcha...
R - Mas aí houve uma preparação pra ir nessa marcha. E eu tinha decidido, na minha cabeça - mesmo o meu marido tendo arrumado esse trabalho, mas eu sabia que podia ser poucos dias -, e eu digo: "Eu prefiro morrer do que ter que estar dependendo dos outros." Que eu nunca tinha dependido. Pra você ter uma idéia, quando eu tinha oito anos eu trabalhava por dia pra comprar meu vestido de primeira comunhão. Daí, de repente, eu ter que depender dos outros? Então eu disse: "Não, se é assim, eu não aceito essa vida, então não tem outro jeito. Batalhei, procurei serviço, não encontrei, então eu vou pra esse movimento lá deixar que me dêem um..." Que eu sou de frente, linha de frente, eu não sou de me esconder atrás dos outros, sabe? Eu sempre fui de estar na frente, né? Então eu digo: "Vou deixar que me dêem um tiro na testa, já que estão brigando mesmo..." Só que daí, eu tenho uma filha, ela estava grávida, e ela tem dois filhinhos, né, agora ela tá com três. No dia em que eu estava arrumando, já tinha arrumado tudo, minhas bagagens, tudo, para ir, a minha guria começou a ter início de perda do bebê. Daí meu genro me chamou no quarto, nessa época eles moravam na nossa casa ainda, tinham casado, estava construindo no fundo, mas deu azar que
perdeu serviço dele, trancou também, e o cara parou o trabalho dele... Os dois, pior é que estavam os dois assim, né? Então pra você... E tinha as crianças, tudo junto, né? Acontece que daí ela ... Ele me chamou no quarto e disse assim: "Ô dona Ereni, a Michele quer falar com a senhora." Daí eu fui lá ver o quê que ela queria. Ela disse assim: "Não, não." Daí eu digo: "Michele, quê que tu quer?" Ela disse: "Eu não quero nada." Mas só que aí ela começou a derramar o choro, né? Daí eu digo: "Ué, mas tu tava... Eu achei que tu tava aceitando tão bem, até estranhei...." Porque a gente é muito junta, é muito unida, sabe, eu e a minha filha, graças a Deus, desde de pequenininha, ela sempre foi unida comigo. Mas daí, como eu tinha botado no meu coração que eu ia, decidi, não tinha ... Mesmo ela sentindo as dores, ali, o meu coração estava determinado a ir, sabe? Eu tinha ... Já tinha tomado uma linha que era aquilo e pronto. Só que aí, como ela viu que não... que mesmo ela com dor, eu não voltei na minha decisão, daí ela secou, sentou na cama, secou as lágrimas, assim, com raiva, e disse: "Tá bom. Tu quer ir, tu vai - diz ela -. Mas quando tu voltar, tu não tem mais filha e tu não tem mais neto." Aquelas palavras dela me fizeram voltar e pensar, né? Daí eu pensei: "Bom, se eu vou e se eu morro, não tem problema; tô morta mesmo, né? Que adianta? Eu não vou ter um neto mesmo, nem nada. E se eu não morrer? (pausa) E daí?" Daí, então, naquilo ali foi que eu não fui pra tal de marcha. Mas a marcha, depois que eu soube, era de Gravataí até Porto Alegre, mas eu não entendia nada dessas coisas. Daí houve a marcha, mas só ... Nós pleiteávamos as terras urbanas, né, em frente ao Ministério do Trabalho, mas só ia conseguir, pra se inscrever, só quem fosse para essa luta, nessa marcha, e eu não fui. Aí me desesperei, aí eu digo: "Bom, agora sim, agora não fui, perdi a chance..." Mas aí passou um tempo, uns dias, daí veio de novo um rapaz lá em casa, que era do MTD [Movimento dos Trabalhadores Desempregados], dizer que ia recomeçar os núcleos nas vilas, e que ia fazer os núcleos nas vilas. Daí que surgiu o primeiro núcleo lá do MTD. A gente juntou trinta e quatro pessoas, fez três grupos de produção. Daí, como tinha o negócio da confeitaria, que eu tinha aprendido, e eu queria trabalhar fora, que não consegui, daí a gente fez um curso de confeitaria, um curso, desculpe, um grupo de confeitaria, um grupo de artesanato e um grupo de reciclagem. E pleiteava com o governo as frentes no Ministério do Trabalho estadual; o governo se comprometeu com 2510 frentes no Ministério do Trabalho, que é o pé inicial, mas junto ia um pacote de ... - como é que se diz? - juros, subsídios. É um dinheiro a longo prazo aí, que o governo tem, e formação para as pessoas e a executora. Só que o governo viu que isso é um plano bom, que ele organiza as pessoas que estão lá, à margem do desespero, dá esperanças para elas, ele organiza para isso, e o governo sabotou o nosso projeto. Até agora ele não terminou com as 2510 vagas. Tá devendo 500, o Rigotto. Agora, diz ele que vai assinar agora no fórum, diz que vai ser agora no fórum. E esses grupos estão trabalhando, eles ganham doações de panos, de coisas assim, e estão se organizando; fazem as roupas, vendem. O meu grupo, da confeitaria, nós recebemos a nossa frente do Ministério do Trabalho; a gente recebeu durante seis meses, e a gente continuou, terminou, mas a gente continuou fazendo nossos pães, pães e cucas. Agora veio um pedido pra nós fazermos de trezentos pães pra aqui, pra esse evento, mas não conseguimos pegar - trezentos pães por dia, durante três dias -, porque nós não temos forno, forno industrial. Nós temos um forno que é do meu fogão, de seis bocas, a gente não... Como é que vai fazer um monte de pão desse num forno de coisa? E o meu marido, graças a Deus, agora ele tá trabalhando, só que assim, a gente tem que ficar longe bastante tempo, tem ficar às vezes dois meses longe, né? Ele continua trabalhando em São Paulo, agora mesmo ele tá em São José dos Campos - era ele que ligou ali, que eu desliguei, agora. Tá em São José dos campos trabalhando. Nós continuamos fazendo os pães, e eu, através do MTD, eu aprendi, porque chegaram na época que estava bem crucial da minha vida; então eu tive formação de povo, vários movimentos, né? E hoje eu organizo, faço exatamente o que eles fizeram comigo. Lá em Canoas nós temos dois, três grupos de padaria, dois grupos de artesanato e um de reciclagem. Reciclagem tá bem forte, o grupo já tá vendendo pro caminhão, só que não tem nada, não tem prensa, a gente não tem... As costureiras não têm as máquinas... Porque não tem ninguém que ajude a gente, não tem. Eu precisava desse forno. Aí eles falam em Fome Zero, não sei o quê; Fome Zero, pra nós dos grupos do MTD lá de Canoas não chegou nada, mas nem... E tem pessoas ali, que a gente tá organizando, que às vezes não têm um quilo de feijão pra comer, não têm. E a gente organiza, pleiteia, a gente luta, vai pra luta, e o governo sabota ainda, diz que nós somos vagabundos, que nós não... É assim. A gente tá brigando pra trabalhar, nós somos, no Rio Grande do Sul
somos agora umas três mil pessoas organizadas em grupos de produção, e o MTD já tá em cinco estados. E esse Rigotto aí chama a gente de vagabundo. De vagabundo. O povo lá, procurando um jeito de se organizar, de trabalhar, e ele chama de... Por que eles não apóiam? Por que em vez de dar sacola de comida pra um monte de gente que eles dão por aí, pra pessoas que não estão trabalhando, que não estão fazendo nada... Agora, os grupos estão produzindo; como esse grupos de reciclagem, esse pessoal aí tudo. Olha, não sei se vocês prestaram atenção, vocês não participaram das reuniões, como esses governos, quase todos, de município, perseguem essa gente.
P3 - E o que você acha de estar hoje aqui nesse congresso?
R - O que eu acho? Eu tô, olha, eu tô maravilhada, tô achando tudo maravilhoso, e tô aprendendo muito com eles, porque no MTD tem um grupo de reciclagem também. Tô aqui, tô representando o MTD e aprendendo com eles cada vez mais. O que eu aprendi aqui vou levar pra lá pra ajudar aquele pessoal, que lá na nossa vila tem bastante pessoa que trabalha individualmente. O que eu aprendi aqui, que puder fazer pra chamar, pra organizar esse pessoal, eu vou fazer. Isso aí é um aprendizado muito grande, olha... Agora mesmo eu estava pensando ali, estava vendo eles falarem: "Essas pessoas aí, eles estão aí, estão aqui hoje, mas eles foram catar lixo, por quê? Por causa desses governos corruptos, sem-vergonha, e por causa desse maldito FMI." São pessoas que perderam o emprego, graças a Deus que não foram roubar, nem matar, eles foram catar o lixo. Porque eles não foram lá ... Tem grupos que nós organizamos, que eles escolhem; mas no início, essas pessoas que estão aí hoje, organizadas, lutando, eles foram porque esses governos sem-vergonha ... Entra um, sai outro, entra um, e essa imundície. É só lutando, e o povo unido. Somos nós, o povo unido, que vamos mudar isso aí. Já tem uma coordenação dos movimentos sociais no Brasil, já. E somos nós que vamos mudar, é o povo; porque nós somos a maioria. Os que têm, os ricos, são minoria, nós somos a maioria. No momento em que se conscientizar todo o povo.... Nossa luta é bonita aqui no Rio Grande do Sul. O Rigotto, os cachorros e os policiais, eles babam pra bater na gente, mas não encostam um dedo na gente, sabe por quê? Porque nós não somos agressivos, nós somos um povo organizado pra querer trabalho. Mas não queremos trabalhar na prefeitura, como tem em São Paulo; em São Paulo tem frentes do Ministério do Trabalho, mas ficam trabalhando igual os apenados, nós não queremos isso. Por isso que o MTD, em 2003, pleiteou pra fazer grupo de produção. Porque no ano 2000 teve o coletivo de trabalho, que era, fazia trabalhar o mesmo que os apenados. Sabe qual é o apenado, né? Os caras que fazem alguma coisa errada, não vão presos, daí prestam serviço pra comunidade, se não têm dinheiro pra pagar a corrupção da lei, também, né? Daí eles vão lá e trabalham. A mesma coisa aquele projeto lá em São Paulo, tá assim. Foi muito difícil agora, no seminário em que estivemos em São Paulo, de explicar pra eles que o que eles têm lá nós não quisemos aqui, que é... Não é não quisemos. É que terminou. No ano 2000 teve, mas não terminou, não adiantou nada. O pessoal tinha que trabalhar nas valas, limpava vala, e pra comunidade. Aí se eu tivesse, vamos supor que eu tivesse uma faxina pra fazer na minha casa, eu chamava eles, iam lá, limpavam pra mim, e eu não pagava nada. Vai receber o salário que eu recebi; terminou, terminou. E nós, no nosso programa... Mas o governo sem-vergonha, sabendo disso, que é uma coisa que pode ser um.... Pode ser não, é, do jeito que tá, pode ser até projeto pro país, é tu gerenciar teu próprio trabalho, teu próprio negócio, ser dono do teu próprio trabalho. E esses sem-vergonhas sabotaram tudo. Mas nós estamos na luta. Nós chegamos a ficar doze dias acampado na Harmonia, e ficamos, a gente ocupa a secretaria lá deles. Nós temos feito lutas ferozes e vamos fazer mais, só que eles não conseguem nos bater. E quanto mais... Eu tô, cada vez mais, quero ajudar cada vez mais esse povo, organizar esse povo e pleitear. E vamos conseguir.
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- Esse é o sonho da senhora?
R - É o sonho e tem que ser a realidade. Tem que ser. Esse povo não tá aí? Não pode estar abandonado. Esses aqui já têm, esses aqui são do movimento dos catadores, já estão organizados no movimento dos catadores. Mas os movimentos, existe a coordenação do movimento. Porque nós pleiteamos as 2510 vagas de frentes do Ministério do Trabalho, os catadores, a Resistência Popular e o MTD. E nós temos apoio do outro movimento, da CUT [Central Única dos Trabalhadores], agora, porque eles também estão vendo que esse é um projeto diferente. É grupo de produção. Tu vai produzir o que tu quiser produzir. Seja costura, seja artesanato, seja produto de limpeza. Só que a gente precisa de ajuda, e ninguém ajuda. O governo sabota o nosso projeto, não libera as frentes do Ministério do Trabalho... Nós temos acho que uns dez grupos, mais, acho que temos doze grupos. Desde o início do ano passado, ele se comprometeu, no ano de 2002, com essas vagas, só que ele ainda tá devendo, tá devendo ainda. Seiscentas e trinta e oito. Nós temos grupo tanto dos catadores, como da Resistência Popular, também. Ele tá devendo para nós essas seiscentas vagas; é uma parte do MTD, uma parte dos catadores e uma parte da Resistência Popular. Só que ele tá aí, ó, fazendo isso com o povo. E a gente tá... É a única maneira... Porque emprego, pra haver emprego mesmo, nosso presidente agora, que é o Lula, ele vai ter que fazer ruptura. Ele vai ter que romper com alguém. Quando ele fez o conchavo lá, eu lá na minha casa disse: "O presidente Lula, agora, ele vai ter que romper com alguém. Ou com o povo, ou com os caras lá em cima" Só que ele foi colocado lá e deixaram ele quase sozinho, né? O movimento que lutou pra botar ele lá se afastou, esperando que ele fosse fazer tudo. Mas eu acredito ainda no nosso governo, no nosso presidente, que ele possa fazer muita coisa por nós, ainda. Mas se nós estivermos lá na luta. Não só nós desempregados, mas todos que estão empregados, estudantes, os professores, vocês que estão fazendo esse trabalho aí, também. Não é só o desempregado ou os catadores, não. Somos todos nós, é o povo todo. Se nós todos nos unirmos, a gente consegue mudar esse país, não terminar em guerra. Será que vai ter que ter uma revolução pra melhorar? Eu acho que é nós todos nos unindo; porque existe já essa coordenação. Olha esse povo aí, de fora aí, junto com a gente, né? Eu acho que eu falei demais, vocês desculpem, tá? Obrigada pela oportunidade.
P2 - Imagina, foi ótimo.
P1 - Obrigada.
R - Que é isso. Não tem mais não, falei demais.Recolher