IDENTIFICAÇÃO Marcelo José Barbosa Teixeira. Recife. Data de nascimento? Vinte de setembro de 1952. FAMÍLIA Clarisse de Lima Barbosa Teixeira e José Natálio Teixeira. O meu pai era comerciante e minha mãe o ajudava, mas era doméstica. No início ela foi professora, mas de...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO Marcelo José Barbosa Teixeira. Recife. Data de nascimento? Vinte de setembro de 1952.
FAMÍLIA Clarisse de Lima Barbosa Teixeira e José Natálio Teixeira.
O meu pai era comerciante e minha mãe o ajudava, mas era doméstica. No início ela foi professora, mas depois deixou de lecionar e foi ser prenda de casa.
Sou descendente de portugueses. Eles nasceram no estado de Alagoas e, posteriormente, foram pra Recife, mas a origem é portuguesa. Até o nome Teixeira, se você for até Lisboa, vai ver só tem Teixeira lá.
Eu tenho cinco irmãos. Eu perdi uma irmã, agora só tenho quatro. Eram dois homens e três mulheres. O total era seis e agora a somos cinco. Tem duas mulheres e mais dois homens. Na escala, deixa eu ver, primeiro tem uma mulher, depois o meu irmão, e eu sou o terceiro dos mais velhos. Depois veio uma outra irmã, uma outra mulher, e o mais novo é o músico. Eu tenho um músico em casa, ele é violoncelista, toca na sinfônica. Começou a tocar violão comigo, mas eu parei e ele continuou. A gente aprendia violão clássico. Cheguei a tocar, mas parei. É a minha frustração.
INFÂNCIA / CASA A minha infância foi ótima, numa casa muito ampla. Tínhamos várias empregadas e todas as condições de uma classe média. Estudamos em boas escolas. A nossa casa era num subúrbio de Recife, entre Recife e Olinda, num bairro de classe média normal. Não tinha grandes diferenças. Como se fosse aqui na Tijuca, tudo é parecido. Eu acho que é mais como o Grajaú. Várias casas. Sem muito edifício, sem concreto. Sem comércio.
BRINCADEIRAS DE INFÂNCIA Ah, jogar bola, aquela coisa. Eu tive uma infância muito boa. Eu sabia jogar pião. Tinha bola de gude, tinha pipa, tudo. Eu tentei passar isso para os meus filhos, quer dizer, eu ensinei a eles jogar búlica e soltar pipa. Hoje, é diferente. Eles gostam mais de joguinhos de computador, e tudo fica difícil. Mas incentivei o quanto eu pude com atividades lúdicas, brinquedinhos de montagem, para eles terem mais habilidade manual. Mas, hoje, a habilidade é com o joystick, né?
Com o irmão a gente brinca, mas briga. Mesmo assim brincávamos muito. Jogávamos bola. O mais novo não, porque já tínhamos uma idade mais avançada e tinha uma defasagem muito grande. Mas eu tenho um irmão, que a diferença é apenas de dez meses. Não perdeu tempo, né? É o Murilo. Dez meses depois dele, eu nasci. E nós caminhamos juntos, caminhamos na escola. Os amigos no bairro eram os mesmos. Posteriormente, eu passei para o Aplicação, uma escola mais rígida, e ele perdeu o ingresso. Então, com isso a gente ficou com os amigos separados. Porque aí cada um procura a sua turma. Ele foi pra outra escola e eu fui pra Aplicação.
FAMÍLIA / EDUCAÇÃO Na realidade, quem manda na casa é a mulher. O homem traz só o conforto daquela presença, tudo, mas está sempre fora. Quer queira ou não, quem fortalece a educação é a mãe. Mas a convivência em casa era boa. Eles procuravam não discutir na frente dos filhos. Isso é interessante. Eu nunca vi o meu pai brigar com minha mãe. Eles brigavam dentro do quarto. Mas com a gente eles brigavam sim, muito. Eram seis crianças em casa. A minha mãe tinha ciúme de suas plantas. Eu jogava bola dentro de casa, quebrava vasos e levava umas pancadinhas de vez em quando, uns corretivos. Mas nada sério.
Naquela época, tinha um problema sério. Hoje em dia meu filho sai à meia noite e chega às seis horas da manhã. E, naquela época, eu tinha que chegar dez horas da noite em casa. Se não chegasse levava um “chega pra lá”, porque era uma ordem e tinha que ser cumprida. Já com o mais novo não houve tanto controle, porque era outra época e ele chegava de madrugada. Tocava violão, ia para as serestas e chegava mais tarde. E, uma vez ou outra, havia alguma desobediência. O pai era mais rígido. Aí batia mesmo. Mas isso não causou nenhuma revolta, o amor sempre foi forte. Hoje, se você bater em filho é mais complicado. Tem a psicologia.
Eu tive uma babá que ainda está viva. Posteriormente, ela foi babá do meu pai quando ele teve uma trombose. Ela é como uma mãe preta. Espetacular. Eu levei os meus filhos uma vez para Recife. O mais velho, era pequenininho, chegou a bater no meu rosto. Ela disse: “Devolva com a mesma moeda”. Aí eu devolvi numa outra vez e nunca mais ele fez aquilo. Quer dizer, as pessoas têm um feeling de educação, mesmo não tendo instrução. Isso é muito interessante.
EDUCAÇÃO / RELIGIÂO Tivemos uma educação católica. Eu estudei sempre em colégio católico, no Nóbrega, que é o Salesiano. As minhas irmãs estudaram em colégio de freiras, sempre. E tinha aquilo de ir à missa e ir namorar. Ia à missa aos domingos para ver as gatinhas e tudo, mas assistia. Mas não era aquela coisa rígida. Não havia obrigação.
Os meus filhos agora estão no São Bento. O mais velho estudou no São Bento, da terceira até a segunda do segundo grau. O meu outro filho estudou da primeira até a oitava. Saiu porque não tinha mulher. “São Bento não tem mulher”. Então, botei no Santo Agostinho. E você pergunta: “Eles praticam?” Uma vez por mês, eu digo: “Vamos todos à Igreja, pelo menos uma vez, uma hora de meditação”. A gente
não fica jogando, porque não faz uma hora de meditação? Não sai para tomar um chopinho? Não gasta duas, três, quatro horas, passando a noite na night ou mesmo aí, passando a noite bebendo. Porque não vai para a Igreja, concentra uma vez por mês nisso aí. Aí é isso, a religião da gente é essa.
É difícil você fazer uma comparação de colégios. O São Bento é um colégio de uma rigidez grande, muito organizado, que prepara o aluno para vida. Na minha época não tinha tantas matérias assim, porque eles massacram os alunos. Tem leitura. O que é ótimo, porque é semi-internato. Então lêem clássicos. A gente lia porque a minha mãe lia muito. Na minha época era obrigado a ler livros, literatura. Em casa, a minha mãe lia os livros dela, tinha muitos livros em casa. Cronin, Gilberto, Jorge Amado. Tinha toda essa literatura, tinha muitos livros em casa. Dostoievski. Agora, incutir isso em um adolescente, obrigar a ler esses clássicos é um negócio complicado. Mas como sempre a gente via a minha mãe lendo, procurávamos também ler um pouco.
ENSINO FUNDAMENTAL / COLÉGIO DE APLICAÇÃO Eu estudei no Colégio de Aplicação. Era o início do Colégio de Aplicação, que era ligado à Universidade. E nós fomos uma espécie de cobaia, porque a Universidade em todo o país estava criando esses colégios. Mas foi excelente. Não que fosse interesse da família, mas o meio que a gente convivia levou a gente a fazer uma prova. Primeiro, porque era gratuito. Em segundo lugar, não era fácil de passar, porque tinha 30 vagas para “n” candidatos. É igual à hoje. Se você quiser que o seu filho entre no Cap, Colégio de Aplicação – tanto da Tijuca quanto da Lagoa –, vai sei complicado. Mas isso foi no Ginásio. Posteriormente eu fui para o chamado científico, que hoje é segundo grau. Eu fui para um colégio de padre. Era outro colégio muito bom. No Aplicação não tinha ensino de segundo grau, acho que só foi criado três anos depois. Mas não tinha saída.
Você escolhia inglês ou francês. No inglês, a gente tem uma certa fluência na língua, a preparação foi no ginásio mesmo. Era muito bom. Tinha uma professora que era inglesa. Morou muito tempo na Inglaterra e não permitia que falasse português dentro de aula. Era rígida, fazia todos os exercícios. Eu estudei todos os livros de Dickenson, que na época eram os livros didáticos. E era obrigado a fazer os exercícios todos. Se não fizesse levava uns “parachutes”. Cada falha levava um “parachute”.
Se acumulasse quatro “parachutes” , tirava zero.
ENSINO MÉDIO
Fiz o segundo grau num colégio salesiano. A preparação foi boa para o vestibular. Tanto é que eu fui aos Estados Unidos. Também por meu interesse eu busquei fazer uma prova para os intercâmbios que era aquela coisa que todos onde eu estudava queriam fazer. Aí fiz prova. Eu passei e fui para os Estados Unidos com 17 anos. Fiquei seis meses lá.
EDUCAÇÃO / INTERCÃMBIO NOS EUA Fiquei em Wisconsin, lá no norte, numa cidadezinha pequenininha de cinco mil habitantes. Era no interior mesmo. E eu fiz a High School nos Estados Unidos. Aí foi uma experiência fantástica. Essa experiência, eu passei para os meus filhos: um se formou em Ohio. Eu fui buscá-lo em 2001, antes do september 11. Aí fui para a sua formatura, foi fantástico. E o outro voltou agora da Austrália, onde passou cinco meses, três semanas na Nova Zelândia. Depois do atentado houve uma retração muito grande e a Austrália se tornou a opção. Geralmente, o estudante vai em janeiro. E, nessa época, nos Estados Unidos há nevascas e muito frio. Eu fiquei no norte, quase fronteira com o Canadá. Chegava a fazer menos 20 graus. Depois de menos zero, o desconforto é grande. Isso aí foi muito bom. Logo, me ambientei com a turma. No início, como acontece, você tem saudades. Saudade é um negócio sério, e você acha que não vai se acostumar.
Mas eu tinha uma família americana, meu pai era químico. E, ainda hoje, eu falo com a minha mãe, ligo para ela. Passei um tempo sem ligar. Minha mãe verdadeira já faleceu – minha mãe e meu pai. Mas todas as vezes que eu vou aos Estados Unidos, eu ligo para a mãe americana, me comunico com ela. Eu perdi o contato durante anos com o irmão, com ela, não dei continuidade. Aí, posteriormente, eu consegui resgatar isso. E há três, quatro anos, eu tenho ligado pra ela. Ela me chama de Mark. Ela é um barato, é psicóloga, está fazendo doutorado em psicologia. Eu me lembro que ela pedia pra gente interpretar as músicas de Simon & Garfunkel, porque ela estava fazendo um trabalho de psicologia. E cantávamos “Mrs. Robinson” e aquelas músicas deles. A gente se deu muito bem. Eu me acostumei. Tinha um irmão pequeno. A Cíntia era a menor. Tinha um outro, o Big Bob, um cara enorme. Isso foi na época da doideira, em 1969. O Woodstock foi em 70.
JUVENTUDE / EUA Não fui hippie. É interessante. Era a explosão do movimento e foi uma coisa muito bonita. Mas, devido a uma formação mais rígida, eu fiquei com um pé lá atrás. Era uma família católica. Não tinha nada a ver, mas o filho já transava outras coisas. Eu fui orientado: “Tem que tomar cuidado com droga.” Hoje, você fala também para os teus filhos. E a gente já foi assim com um pé na frente outro atrás. Mas tem colegas meus que estão viajando até hoje. Tínhamos muitos amigos e a gente se encontrou na universidade, fizemos uma bagunça tremenda. Ninguém suportava os brasileiros. Mas era uma época muito bonita. Não tinha essa violência que tem hoje. Até as drogas eram mais leves, em comparação ao que tem hoje, que é muito sério. Hoje é ecstasy, crack, essas coisas pesadas que arrasa qualquer um. Aí é complicado. Mas foi interessante viver aquela época.
Em Wisconsin era bem rígido. Califórnia, Nova York, não tem nem comparação. É igual a Ohio. Hoje em dia você tem, é recente. Eu fui nesse lugar que o meu filho ficou. São alienados. Você não sabe por que aconteceu isso, o ataque às torres, ninguém sabe. Até a CNN lá passa diferente. Não existe a cultura do mundo, existe cultura americana.
MODA O surgimento do jeans foi em 60 e poucos. Era a época da boca de sino e de muitas flores. O que até está voltando, né?
VIDA NOTURNA Tinha aquelas festinhas, como hoje. Você bota um disc jóquei, bota um DJ e faz suas festas. Mas não era permitido. Você não podia beber. Você comprava cerveja escondida através do teu irmão mais velho, porque menor não podia beber. Só com 18 anos. Para você ter uma idéia, eu tive uma namoradinha, e ela estava com 17 anos e eu 17. Ela fez 18 antes de mim, e eu fiquei com raiva porque não pude sair, mas ela saiu. Tomou um pileque danado. Quer dizer, eles queriam chegar aos 18 para sair e beber.
MÚSICAS Eu sempre gostei de todo tipo de música: rock, rock pesado, rock leve, clássico. Rolling Stones, Beatles, Led Zepelim.
O violão clássico, eu aprendi antes de viajar. Eu tinha um professor, quando eu tinha uns 14 anos. O meu pai tinha um comércio. E tinha uma farmácia próxima, onde todo mundo se juntava nas quintas feiras. A gente fazia uma roda intelectual lá. Era para falar francês, inglês e alemão. Então tinha uma galera que gostava. Aí meu pai ficava: “Você tem que ir lá”. Porque eram todos conhecidos, eram universitários, e esse farmacêutico era muito culto. Ele reunia o pessoal para falar línguas e discutir política. Meu pai não participava. Ele trabalhava e dizia: “Você tem que ir lá, porque eu não tenho tempo. Tem que ir lá porque isso é importante para você.” Ele incentivava. Aí eu disse: “Mas eu vou fazer o que lá?” Eu era menino. “Eu quero brincar”. “Não, você vai ter que ir lá. Aprenda inglês”. Aí você perguntou o negócio do violão. Eu comecei a conviver com um dos conhecidos desse farmacêutico que era um professor de violão lá no bairro. “Você topa aprender violão?” Aí eu disse: “Pô, vamos.” Ele era professor e eu comecei a aprender. Depois eu queria mais.
ENSINO SUPERIOR / ESCOLA DE MÚSICA Fiz um vestibular para escola de música. Passei. Quando cheguei na escola de música, o negócio era sério, eu tinha que estudar solfejo. “Ih, rapaz, que isso?”. Depois eu queria fazer Engenharia Mecânica e deixei a escola. Já estava tocando. Mas tinha que estudar muito, porque violão clássico tem que estudar aqueles harmônicos e fazer estudos de dedilhado. Já estava tocando alguma coisa, mas parei. Eu tentei retornar os estudos agora. Comprei um violão e comecei. Mas chego em casa, depois de trabalhar em média 12 horas. Então não dá tempo. Saio de casa umas oito horas para o trabalho. É muita coisa. Mas a escolha da música foi minha. A expectativa não era música. Eu sempre falei que ia ser engenheiro mecânico. Desde pequeno. E fui fazer engenharia mecânica.
OPÇÃO PROFISSIONAL Foi como fiz com os meus filhos. Eu nunca forcei nada. Um está fazendo direito e outro está fazendo engenharia de produção. Eles escolheram. Se quisesse fazer filosofia, escolhesse filosofia. Mas tem que escolher uma carreira que, pelo menos, você goste. Você tem que fazer o que gosta, isso é importante, e que ganhe bem. Não é só ganhar bem, mas é o que gosta de fazer. Porque senão é um tédio. Já pensou passar oito horas numa coisa que você não gosta, esperando o tempo passar? Dei sorte de fazer uma profissão que gosto, conseguir ingressar na Petrobras e continuar aplicando.
ENSINO SUPERIOR / ENGENHARIA MECÂNICA Fiz vestibular para engenharia. Eu desisti da música, porque não dava para conciliar as duas faculdades. Desisti e fui para engenharia mecânica. Foi quando eu voltei dos Estados Unidos, quer dizer, depois desse intercâmbio. Eu já voltei para fazer vestibular. Eu fui com 16 e voltei com 17 anos. Perdi meio ano da escola, mas consegui validar as matérias da escola americana aqui. Passei de julho até dezembro estudando. Por sorte, não caiu uma matéria braba, que era da parte de ótica. Ótica era uma matéria muito difícil e ainda é chata. Mas eles tiraram do vestibular e foi ótimo, porque eu tive que aprender toda aquela matéria em seis meses. Eu estava perdido, não queria perder aquela matéria. Mas me dei bem. Eu queria passar na Federal, e passei.
A faculdade correspondeu às minhas expectativas. Foi dentro do normal. A faculdade era boa. Puxava um pouco. Toda Federal é boa. Eu acho que é uma experiência interessante. Tanto é que eu falei para os meus filhos, até em relação à convivência heterogênea. Você pega uma PUC, onde o meu filho estudou, ele estava fazendo comunicação na PUC, mas depois resolveu fazer Direito. Ele passou para Direito na PUC. Eu disse: “Agora faz vestibular para UFRJ ou para UERJ”. A UERJ ele perdeu, por causa da cota. Tirou 75 e não passou. E teve cotista que passou com 50. Ele só conseguiria entrar se tirasse nota 78 ou 80, mas tirou 75. Mas eu sempre fui adepto a estudar na UFRJ, mesmo com esse medo que a gente tem de passar na Linha Vermelha. É importante você conviver com o pessoal, ver as dificuldades. Eu acho que é muito importante para formação de todos.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / ESTÁGIOS Eu comecei a faculdade e procurei logo fazer estágio. Hoje, você pensa que não é importante, mas você não pode deixar terminar a tua faculdade para só então conseguir um emprego. Desde o segundo ano, eu fui fazer um trabalho completamente diferente no escritório de um amigo. Eu fui trabalhar com a parte de estradas. Era mais para pegar prática e tudo. Posteriormente, eu fiz concurso no Instituto Evaldo Loíde, um instituto nacional, que faz provas para admissão de estagiários. E eu consegui fazer estágio na fábrica de lâmpadas da General Electric. Consegui também um estágio em oficina mecânica na área portuária, com manutenção de embarcações. Consegui estagiar no Grupo Klabin, na área de celulose. Eu me virava. Tudo em Recife. Eu trabalhava sábado e domingo. Todo mundo ia para praia e eu ia trabalhar. No sábado, ia para fábrica porque eu só tinha aquele dia pra estagiar. Então perguntavam: “Ah, você vai trabalhar sábado?” “Vou. Vou trabalhar no sábado, depois eu vou para praia”. Todos esses estágios foram no início de faculdade. Eu comecei a estagiar em escritório. No terceiro ano, eu já peguei um estágio numa oficina mecânica para fazer toda a parte de usinagem de peça e para atender navios e reparos navais. Depois eu fiz estágio na fábrica de lâmpadas e fiz ainda outro estágio também. Eu peguei dois estágios no mesmo ano. Trabalhava sábado e não me importava. Se precisavam de mim no domingo, eu ia. Depois eu fiz um concurso para Atlantic, isso já foi no final da faculdade. Aí foi um barato, porque eu recebi um carro. Eu era técnico em lubrificante. Na Atlantic, eu trabalhei quando já estava para me formar. Era 1975. Eles me admitiram. Tinham químicos e engenheiros, e eles me admitiram como técnico e me deram carro, um fusquinha vermelho. Era muito bom, eu viajava. Aí eu comecei a ter contato com os hotéis. Pedia uma comida maravilhosa. Eu lembro de Maceió, onde pedi um prato, um camarão flambado ao whisky. Foi um barato. Eu era novo e tinha tudo pago. Eu disse: “Ah, me dá um camarão flambado”. Aí veio aquela labareda. Era um barato.
CONCURSO PARA PETROBRAS
Eu fiz o concurso da Petrobras, mas já estava pleiteando outro emprego na Alpargatas. Eu lembro que estava trabalhando, mas via que eu queria uma coisa melhor. Aí eu fiz uma entrevista na Alpargatas, no último ano da faculdade. Eu tinha feito o concurso para a Petrobras também e estava aguardando. Aí fui entrevistado. Cheguei lá na fábrica, eu tinha trabalho, mas passei e vi uma placa ‘precisa-se de engenheiro mecânico’. Eu passei, entrei com o carro. Eu não tinha nenhum receio de nada. Cheguei, e disse: “Eu vi a placa aí e gostaria de saber se dá para fazer uma entrevista”. A moça olhou para mim: “Eu vou falar com o chefe pra ver quando é que o senhor pode fazer a entrevista”. Ele era um engenheiro elétrico, um paulista. Ela ligou e disse: “Dá pra ele fazer a entrevista agora?” Eu disse: “Agora mesmo”. Eu fiz a entrevista. Aí disse: “Olha, sou engenheiro elétrico, estou vindo aqui, etc.” Eu fiz o currículo lá. “Você trabalhou nessa, nessa, nessa, nessa, em manutenção? Eu estou precisando de um cara aqui assim como você. Topas?” Aí eu abri o jogo pra ele, e disse: “Olha, só para semana”. “Você começa na outra semana se quiser”. E era para ganhar bem. Aí disse: “Não, eu tenho que receber uma resposta da Petrobras.” Eu já tinha feito o concurso e estava para receber o resultado da Petrobras. Aí eu fui bem sincero com ele e disse: “Olha, eu vou deixar em aberto, mas eu venho aqui para lhe comunicar se eu passei no concurso ou não. Eu vou deixar em aberto. Você me aguarda?” Ele disse: “Aguardo”.
INGRESSO NA PETROBRAS Eu tive um professor na faculdade que trabalhava na Petrobras. Quando eu estava fazendo o concurso, que havia a possibilidade de ficar na Petrobras, eu fui conversar com ele. A orientação foi plena. “Você está indo para uma empresa que investe no funcionário, uma empresa sólida. Se você passar, não tem que pensar duas vezes. Você está preso aqui a alguma coisa?” “Só à família”. “Você tem que ir”. Aquilo eu guardei. Já era um homem com experiência, era professor na universidade. Não sei se ele se aposentou ou viu que tinha que cuidar das coisas da família. Mas eu guardei aquilo e foi uma boa orientação. A decisão era minha. Aí não pensei duas vezes. Para você ter uma idéia, eu me desliguei da Atlantic numa sexta feira. No domingo, eu estava no Rio. Eles me deram tudo. “Vou te livrar do aviso prévio.” A minha carteira de trabalho foi dada a
baixa no dia 20. No dia 21 de janeiro eu estava na Petrobras assinando novamente a carteira. Não teve nem um dia de paralisação na carteira, eu vim direto. Eu estava em Recife, vim pro Rio. A Petrobras pagava uma estadia. Ficamos num hotel durante um período. Eu vim com mais três amigos. Nós três passamos. Eles estão na Bahia e eu fiquei no Rio direto.
CURSO DE ESPECIALIZAÇÂO
Fiz um curso de seis meses. Era o CEIC, era o Curso de Engenharia de Inspeção em Caldeiraria. O curso é escolhido. Logo na tua inscrição eles perguntam se você quer fazer manutenção, quer fazer equipamentos na parte de caldeiraria ou quer fazer naval. Nós escolhemos. E o edital saiu, passou este tipo de curso. Eu não recebi um telegrama, eu não sabia que tinha passado. Os meus colegas que me falaram na faculdade. “Você passou.” E eu: “Onde foi que saiu, no jornal?” Aí eu fui olhar o edital, estava no jornal. Eu peguei aquilo, fui na Alpargatas, falei com o engenheiro, agradeci a ele, e viajei.
Foram seis meses de curso, especificamente, de caldeiraria de equipamentos. Na época, existia a necessidade de engenheiros de todas as áreas de equipamentos, voltados para inspeção em refinarias e fabricação. Estavam ampliando as refinarias na parte de lubrificantes, em tancagem, em esferas de gás. No meu curso existiam os primeiros engenheiros da área naval, mas depois nos separamos. Tinha curso de inspeção em caldeiraria e tinha a parte naval. Então, foram três meses separados. Foi uma turma de naval e uma turma de inspeção.
O curso é o seguinte. Devido à necessidade de classificação, é uma guerra lá dentro, porque há uma pontuação. Você tem que estudar, porque um quer derrubar o outro. E você tinha que se manter numa média alta para poder fazer uma escolha boa. Senão era jogado lá em Urucu. Aí foi a guerra. Tinha os paulistas que queriam ficar em São Paulo. Eu dizia: “Estuda, cara, porque senão eu vou lá para São Paulo.” O povo gosta de cidade grande. Era guerra mesmo.
INGRESSO NA PETROBRAS / TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Estava surgindo a Bacia de Campos. Quer dizer, eu fiz o curso em 1976. A primeira descoberta foi em 1974. E foi criado um grupo especial da Bacia de Campos, o GECAM – Grupo Executivo de Desenvolvimento da Bacia de Campos. Em 1976, quando eu terminei o curso, eu fui ver aonde poderia ir. E fui parar nesse GECAM. Eu queria ficar aqui no Rio. Foi legal, porque eu fui para a Rua Senador Dantas – o GECAM era ali – fazer umas perguntas. Entrei numa sala e tinha uma pessoa, que hoje é um grande amigo, o Carlos Soligo Camerini. Ele estava lá com um estagiário e tinha uma outra pessoa, que já se aposentou. Eu perguntei a ele, que disse: “Oh, isso aqui vai ter muito futuro, porque estão descobrindo coisas aí. Vem pra cá.” E eu fui pra lá. Hoje ele está no CENPES. Já foi superintendente do CENPES. Ele foi um dos meus primeiros contatos na Petrobras. Estava lá também o Roberto Mascarenhas, que já se aposentou. E tinha os outros. Mas foi com esses dois que conversei mais de uma hora e eles que me deram um toque, que falaram sobre aquilo. Tinham visão. E aquela visão a gente pega.
Eles falaram que aquilo tinha desenvolvimento. A gente teria que ser criativo. E isso é que eu gosto: desafio. A época era de grandes desafios, porque a gente passava por um período de importar muito óleo. O país precisava ter mais produção. A coisa estava complicada, porque a gente precisava produzir mais. E com os indícios de 1974, com a primeira descoberta na área de Garoupa, e depois as descobertas dos campos de Enchova, Pargo, Bonito, começou uma nova etapa. Isso estava ali. A gente tinha que tirar aquilo. Era muito desafio porque ninguém conhecia. Na época, 100 metros era considerado água profunda. Existia produção em 30 metros, que era o universo das plataformas do Nordeste. E você partiria para a construção de grandes estruturas e desenvolvimento daquela área. Eu sempre gostei de desafio.
GECAM Tinha uma certa expectativa de não ficar em uma atividade rotineira, numa coisa do dia-a-dia. Sair do trabalho para o escritório. Aquilo cansa. Para quem gosta de criar, para quem gosta de conhecer coisas novas, trabalhar numa refinaria é um tédio. Seria pegar um ônibus, chegar lá e voltar. Todo dia a mesma coisa. Mas no mar não, num dia está em obra, o seguinte está no outra, está sempre fazendo uma coisa diferente. Então, aquilo é que me movia, me dava ânimo. O desafio estava ali latente, e a gente tinha que enfrentar.
Teve um amigo interessado em ir para o GECAM. O problema é que essa área não era a menina dos olhos. A menina dos olhos era as refinarias. Na época, tinha muita obra de refinaria. Ela se tornou a menina dos olhos da Petrobras devido ao volume de investimento. Depois houve o declínio dos investimentos na área de refino, isso eu acho que foi na década de 80. E houve esse boom que já tinha tido no Mar do Norte. O boom começou com o grande geólogo, Carlos Walter, que acreditou naquilo. Na época, tinham que perfurar até certa quantidade de poços, mas ele disse: “Vai em frente”. E acharam. Quer dizer, ele foi um dos grandes homens. E a gente pegou isso. Então eu fui para obra. Eu fui para o GECAM Passei e escolhi porque, você perguntou se todos tinham esse interesse. Eu guardei aquilo para mim, porque aquilo era importante. Guardei aquela vaguinha. Eu tinha um colega do lado: “Vamos para lá, cara”. Ele saiu da Petrobras, agora está como contratado, porque tinha um comércio em São Cristóvão. Aí eu digo: “Vamos pra lá”. “Você acha uma boa, Marcelo?” Eu digo: “É excelente”. “E depois?” Eu digo: “Vamos pra lá pra ver”. Aí foi ótimo. Eu achei maravilhoso. E desde aquela época a gente trabalha, acompanha a própria história da Bacia de Campos. Se você verificar, eu vou fazer 29 anos agora no dia 21. A história da Bacia se confunde com a minha história. A gente participou de quase todos os projetos. Estou dizendo todos, mas a maioria que se refere à parte offshore. Eu permaneci o tempo todo ligado à estrutura da Bacia de Campos.
GECAM – CONSTRUÇÃO DAS PLATAFORMAS FIXAS O GECAM era na Rua Senador Dantas e em outros lugares. Eu trabalhei na Rua da Alfândega e na Senador Dantas. Foram criados empreendimentos das primeiras plataformas fixas da Petrobras. A primeira plataforma a ser construída foi Garoupa. A segunda foi Namorado, a terceira Enchova, a quarta Cherne I, Cherne II e Pampo. Foram as primeiras plataformas de grande porte, depois veio o Pólo Nordeste. Mas essas foram as primeiras. E deu-se o início. Mas, antes, nós tínhamos que fazer um sistema antecipado para conseguir, em tempo recorde e a menor custo, colocar esses poços em produção. Esse sistema antecipado do GECAM já era ligado a outro órgão, porque, antes de 1976, tinha o chamado Dexpro, o Departamento de Exploração e Produção. E, posteriormente, houve uma separação da produção, da completação e da perfuração.
TORRES ARTICULADAS PARA GAROUPA No GECAM, foi feita a primeira estrutura offshore em termos de estrutura projetada para o campo de Garoupa. Eram duas torres: a torre de processo e uma torre de exportação. Essas torres foram fabricadas aqui, em Mangaratiba. Quando eu fui designado para ir para Mangaratiba. Passei quase um ano em Mangaratiba. Depois do curso, eu fui logo acompanhar a obra. E existiam essas duas estruturas. Eu cheguei até a assumir a obra lá no final, porque antes era o Roberto Mascarenhas. E nós fizemos duas grandes estruturas para levar para Bacia de Campos. Foi a primeira estrutura a ir para Garoupa. São as torres articuladas. Essas estruturas foram projetadas pela Chicago Brigde. Tinha um petroleiro, que até hoje existe, o Presidente Prudente de Moraes – o PP Moraes –, que antigamente se chamava Juscelino Kubitschek. Eu acho que a mudança de nome foi uma determinação do presidente. O navio foi para Garoupa, para o sistema antecipado, levando essas torres. Nesse sistema antecipado existiam manifolds, câmaras hiperbáricas submarinas, que foi um sistema projetado pela
Lockheed. E tinha um manifold central que pegava umas árvores secas que eram encapsuladas em vasos, e que você tinha acesso lá dentro. Já existia a arvore de natal molhada, mas esse era um projeto inovador que serviria para ser uma opção. Tinha uma parte seca que você acessava através de um navio, que tinha um sino de acoplagem. Você descia 100 metros, 120 metros de profundidade, fazia a acoplagem, renovava o ar, e o homem descia lá embaixo para fazer as operações.
O mergulhador é saturado para trabalhar em 100 metros. Então, quer dizer, ele desce com a roupa normal e é feita a pressurização com uma mistura de hélio e oxigênio. Mas, nesse caso, você descia. Tem um sino mesmo. Usávamos um navio dedicado, que tinha esse sino, o qual descia num guincho e que acoplava em cada chamada de wellhead cellar. Era com pressão atmosférica. Ele descia, acoplava, dava o sinal e renovava. Tinha uns cabos que eram chamados de umbilical, e se fazia a renovação do ar contaminado lá dentro. Renovava o ar e o homem descia como se estivesse aqui, com a pressão atmosférica. Senão eu teria que pressurizar para profundidade de 100 metros. Navio dedicado é um navio que fica só para fazer aquela operação.
NAVIO P.P. MORAES O P.P. Moraes era um navio graneleiro. Eu não vou contar a história do P.P. Moraes, porque é anterior. Mas com esse projeto, o P.P. Moraes foi transformado em um FPSO, um navio de tancagem para sistemas antecipados, e ele armazenava o óleo advindo dos poços, O óleo passava pelo manifold central e ia para ele. Por isso que ele ficou acoplado. Nesse projeto do PP Morais, a gente usou um sistema de forquilha, chamado de yoke, que foi projetado pela mesma companhia, quando fiquei em Mangaratiba acompanhar toda a obra, como eu já comentei. E depois dessa obra, de feitas as torres em Mangaratiba nós rebocamos essas torres para o mar. A modificação do PP Morais foi feita no Japão e terminada aqui no Arsenal da Marinha. Trabalhei no Arsenal da Marinha para botar justamente a interface no navio com a torre. E nós levamos o navio para o mar e fizemos a acoplagem e ele ficou um período lá, acho que um ano e meio ou dois anos. Teve um problema sério nessa estrutura e esse sistema foi desativado. Depois, o PP Moraes foi para outros sistemas flutuantes, de ancoragem flutuante, que seriam as monobóias.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Só para dar continuidade, eu participei de toda a construção das torres. Terminada essa construção, eu fui para fazer a interface do navio com o sistema de Yoke com as torres, que é o sistema que acoplava a torre ao navio. E, posteriormente, me convidaram para ir participar, não havia ainda, da construção das plataformas fixas, quando estavam iniciando esse processo em 1978. Estava se iniciando a contratação de consórcios para fabricação de jaquetas desse porte para Bacia de Campos. E eu fui para Escócia. Eu passei quase um ano na Escócia acompanhando a construção de uma jaqueta para Namorado. Na época, o Brasil ainda não dispunha de tecnologia, mas estava-se credenciando como a Montreal e outras empresas, para fornecer esse tipo de estrutura.
DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO A Engenharia já estava acompanhando todo esse processo da tecnologia, de como projetar uma estrutura de um porte de 100 metros com toneladas a mais do que uma jaqueta pequena. Sem contar outros projetos que resistissem às condições do mar, projetos adequados para resistir às ondas centenárias. Não esperamos tsunamis, mas uma onda centenária, que nem chegou a ser uma centenária. Aí nós fomos para Escócia, passamos uns dez meses e voltamos. E eu fui chamado pra construção de Garoupa. Eu vim da Escócia com um background bom. Os escoceses já dominavam a tecnologia de jaquetas para o Mar do Norte. Eu acompanhei a construção da jaqueta da Petrobras.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu trabalhei só com escoceses e com ingleses, trabalhei com o pessoal da Lloyd’s Register. Eu era o engenheiro de campo com mais outros cinco. E tinha um chefe brasileiro, que trabalhava com o pessoal inglês e escocês. A gente volta com outra idéia. Tanto é que quando você vem com muitas idéias, elas causam até impacto. Quando você é muito novo e demonstra um certo conhecimento, você bate com uma pessoa mais experiente, ai tem um certo conflito. A gente sente. Quando você quer expor a tua idéia, para essa idéia vingar, às vezes, vai depender de como ela será colocada. Com a experiência de vida, a gente vê como é que a coisa se processa. Mas é interessante, porque agora que estou comandando umas 52 pessoas, com uma gerência grande, isso é um aprendizado muito bom. É preciso ouvir muito novos e captar o que é bom e criativo, o que pode contribuir. Porque é uma oxigenação. E a gente precisa de oxigênio. Até os peixinhos precisam.
TECNOLOGIA / CONDIÇÔES CLIMÁTICAS E AMBIENTAIS O CENPES, o Centro de Pesquisas, sempre acompanhou os trabalhos em termos de inspeção. Essas estruturas são chamadas de juntas TKY, juntas de interligação. São estruturas onde existem concentrações de tensões maiores. Então, tem que ter cuidado no projeto, levando em conta a parte de vibrações. O conhecimento foi sendo adquirido durante o tempo de estudos e, até hoje, você ainda estuda a relação das condições meteorológicas agindo sobre as estruturas. Isso aí nunca vai terminar porque sempre você vai ter variações. Naquela época, por exemplo, para dar uma idéia, em 1978, o boletim meteorológico era enviado pelo pessoal da Califórnia. Para fazer um reboque numa estrutura a gente precisava contratar uma firma grande da Califórnia para repassar essas informações de previsão de tempo com 24, 48, 72 horas. Você requisitava de acordo com o tempo que iria precisar para rebocar uma estrutura até a Bacia de Campos e não ser surpreso por condições de tempestade e tudo que poderia influenciar o transporte do reboque. Você tem que estudar tudo.
TRANSPORTE DO REBOQUE Tem rebocadores que a gente chama rebocadores auxiliares. Se qualquer coisa acontecer, se quebrar um cabo de reboque, você resgata. Isso aconteceu com a estrutura que a gente fez, com a balsa que a gente rebocou da Escócia para cá. Por causa das condições adversas do mar perdemos o reboque. Veio um helicóptero da Espanha para resgatar. Isso é outro papo. O cabo partiu, aí teve que vir helicópteros para recuperar o cabo e re-conectar ao rebocador. Eram ondas enormes, ondas de 20 metros, maior que essa que teve agora.
Essa parte do reboque das torres foi feita pela Chicago Brigde com a nossa supervisão. Contrataram a firma da Califórnia, e que mandava via rádio todo o boletim meteorológico para que a gente confrontasse. Na época, os boletins da Marinha estavam sendo implementados. E não existia aquela freqüência diária, eu estou falando de 1978. E isso foi, o conhecimento a Petrobras treinando oceanógrafos, tudo estudando. Porque você tinha que ter relatórios para calcular toda a estrutura. Você tinha que criar as tuas medições, as tuas estatísticas para poder dominar o conhecimento e calcular melhor as suas estruturas, que hoje está bem aprimorado.
HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Eu acompanhei o transporte dos rebocadores do Mar do Norte para cá. Eu não estava querendo partir, porque era uma época de inverno. E a gente sabia do grau de dificuldade que é atravessar o Mar do Norte naquela época, entre dezembro e janeiro. Eu peguei o mar, a travessia. O pessoal que entende de força de mar, eu peguei força dez. O máximo de força é 12. E eu cheguei a pensar que eu não ia retornar, porque tinha uma estrutura, eu estava trazendo a balsa da Petrobras, que é a BGL II. Ela veio para lançamento de jaquetas. E estava com o rebocador da Petrobras. Ele tinha vindo do Japão, onde foi construído. Na época a gente tinha dois rebocadores, um era o Ouro Fino. E enfrentei dificuldades. Quer dizer, no início de reboque houve um encalhe da balsa. Houve um corte estrutural. Eu tive que docar. Eu saí de Herma Ness, onde trabalhei na Escócia e fomos costeando até uma cidadezinha, chamada Peterhead. E a gente entrou onde tem as unidades de plataforma do Mar do Norte, todas as manutenções eram feitas lá. E, depois, eu segui até a Bélgica, fui até a Antuérpia, enfrentando o Mar do Norte. Pensamos até que não íamos voltar mais. Estava um mar enorme, revolto. Pra ter uma idéia, eu não via o deck do rebocador. Quer dizer, a água cobria tudo. Só via o cabo de reboque. Às vezes, ele se acomodava nas áreas de proteção em bombordo ou boroeste, porque existiam variações. E o cabo às vezes prendia. A gente tinha que ligar o thrusters e o rebocador pra voltar o cabo para a parte central, porque tinha o que eles chamavam de steering heading do cabo, que é uma estrutura no meio do rebocador para guiar o cabo. Mas, com a correnteza e a condição do tempo, para você atravessar uma área, não podia soltar muito o cabo. No oceano você deixa lá um quilômetro e meio. Mas ali eu tinha que encurtar muito para controlar a balsa em relação ao rebocador. E isso provocou uma coisa horrorosa. Mas a gente saiu dessa. Da tripulação, não lembro. Só tinha eu de engenheiro. Tinha um tow master, o capitão, que era um holandês, chefe de máquina da parte de manutenção. Eu acho que tinha umas dez pessoas.
Aí eu fui para Bélgica. Nós seguimos para Antuérpia. Eu estava com receio de enfrentar Biscaia, que se abria ali na costa da Espanha. A gente teria que ir para o Golfo de Biscaia, depois costear a África e seguir, e tira uma reta para Recife. São essas portas de navegação. Essa época a gente sabe que tem ondas de uns 20 metros. Maiores que esse tsunami. Como estava, não tinha mais sentido. Eu tinha acompanhado aquilo. Aí eu solicitei aos superiores que me tirassem dessa tarefa. “Pelo amor de Deus, me tirem”. Eu voltei da Bélgica e peguei um avião para Londres, depois eu vim para o Rio.
TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Quando cheguei tinha o GECAM e estavam construindo Garoupa. Eu fui designado para ir a São Roque do Paraguaçu para acompanhar a fabricação da jaqueta e, posteriormente, para fazer instalação. Foi quando eu saí da Escócia. É até interessante isso, porque Salvador hoje está uma beleza. Salvador, São Joaquim, Pelourinho, está tudo limpo. Mas estou falando em 1979. Aquela feira era muito suja. Até hoje é um pouquinho sujo, mas, em comparação, a feira está maravilhosa. Antigamente, era aquela mistura de ferry-boat
com feira, com tudo. Aquilo foi um choque pra mim porque, quando eu estava na Escócia, via os açougueiros, os butchers, com roupas de linho branco, tudo engomadinho, e os mercados todos limpos. Quando eu cheguei foi um choque cultural. Mas a gente adora a Bahia e tudo, quer dizer, agora a Bahia está bem tratada. Mas é aquilo mesmo, foi o choque de sair de uma Escócia para um São Joaquim. Eu vim de lá, e fui passar um ano em São Roque do Paraguaçu. Tinha que atravessar o ferry-boat e atravessar o canteiro da Petrobras, que estava se formando e formando as jaquetas de Garoupa. Foi maravilhoso ficar lá, embora isolado e tudo. Mas a gente pôde contribuir com toda a construção.
GAROUPA Acompanhei a construção da plataforma e a instalação também. Eu fui para o mar, para a instalação com a balsa e tudo. Aí foi um ciclo completo. Fiz Garoupa, depois fiz Namorado. Depois houve mudanças na estrutura e até da Empresa. Eu era do DEPRO – Departamento de Produção e depois a Engenharia passou a tomar parte das construções. Era uma época das refinarias, das obras grandes, mas elas estavam terminando. E a Engenharia era o órgão da Empresa com capacitação para obras e tudo. Aí houve uma mudança e o DEPRO não continuou na construção dessas estruturas, que ficou por conta da Engenharia. Então, depois da construção de Garoupa eu fui para o mar e fiquei embarcado. Eu embarquei nove anos, acompanhando a parte de instalação.
Eu acompanhei a instalação de Garoupa toda, bem como a de Namorado. O que é a instalação? A ida da jaqueta na balsa de lançamento, o seu lançamento no mar, a verticalização, o assentamento no fundo do mar, a cravação de estacas, a fixação da jaqueta no solo. É feita uma cimentação da estrutura na estaca, quer dizer, existem duas estacas em volta das pernas principais, e que você coloca estas estacas para que ela fique afixada no fundo do solo marinho. Quando você cimenta aquilo, ela fica fixa sem nenhuma condição de se movimentar em relação à estaca, porque foi cravada. Assim foi feito em Garoupa e depois Namorado. Participei também dos içamentos. Garoupa e Namorado estão em lâminas d’água de 120 metros e de 170 metros, respectivamente. Esses números estão aproximados. Mas é em torno disso. Em Garoupa, a gente participou de toda a instalação, fizemos a parte de fiscalização. Tivemos mergulho saturado, e todo o trabalho com a empresa de mergulho Comex. E, na parte de instalação dos sistemas, depois do sistema antecipado, que eu já falei, teve um outro sistema que foi o SAGA - Sistema Antecipado de Garoupa, colocado para receber uma maior produção.
SISTEMA DE ANCORAGEM EM UNIDADES FLUTUANTES Depois dessa fase das instalações nós fomos para a parte de sistemas antecipados em unidades flutuantes, em semi-submersíveis. Foi um salto. A Petrobras começou a incrementar também esses sistemas. Nos campos não tiveram só jaquetas, isso foi inicialmente, em Garoupa. Depois veio Enchova, Namorado, Cherne I, Cherne II e Pampo. Então houve vários sistemas para atender aqueles poços, que estavam em campos como Bonito, como a própria Garoupa mesmo, e Pampo. Todos tiveram sistemas antecipados.
Esse foi um grande avanço para Petrobras, porque foi aí que surgiu todo um conhecimento inicial de como lidar com os agentes flexíveis. E ela servia de interligação, que é chamada de satélite do poço à plataforma. Daí surgiram “n” estudos quanto a essas estruturas. Nós participamos da parte chamada de pull-in riser, que antigamente se fazia em QCDC – Quick Connection/Disconnection Coupler –, que seriam os conectores projetados pelas firmas italianas. O famoso QCDC, em caso de algum problema, automaticamente, fecharia as válvulas e cairia no mar. Isso foi desenvolvido para todo esse sistema. Outros sistemas de pull-in foram feitos e, posteriormente, com a segurança, o estudo do próprio sistema de ancoragem. A Petrobras começou a estudar sistemas de ancoragem mais a fundo. E começou a ter uma confiança nesse sistema de ancoragem, porque não necessitaria mais da utilização desses grandes sistemas de acoplagem na plataforma. A gente tem que lembrar de uma coisa: esses sistemas poderiam subir com duas linhas, duas raias ou quatro. Ou ainda apenas com uma só. Inicialmente, se partiu de 100, 200, 300. Depois, a gente já foi pra 400 metros, para 500, 600, 700, agora até 1800 metros. Com o aumento da profundidade, as cargas aumentam assustadoramente. Então você começa a ter sérios problemas de carga. E você não tem como lidar com o peso. A carga que eu estou falando é o peso da própria linha, que a gente chama linha em catenária. Ela é calculada, o comprimento dela mais todo o peso dela na água. Fora d’água a gente tem esses cálculos todos em empuxo. Qual é o peso para içar uma linha dessa? Essa é chamada carga de içamento ou peso de içamento. Se você coloca uma, duas, três, quatro, você começa a aumentar. Então, os cabos para içar iam se tornando maiores, diâmetros maiores com dificuldades de manuseio. E guinchos maiores. E a gente desenvolveu os conectores fixos nas plataformas. Por quê? Você já tinha mais segurança no sistema de ancoragem, não precisaria desconectar esta unidade de riser automaticamente, porque a tua segurança estava ali. A gente tinha certeza que plataforma não ia mover de posição, porque os tubos foram acoplados para que a embarcação tendesse ao passeio, que a gente chama de offset. E a estrutura do riser quando se desloca nessa posição tem que resistir. A gente estuda uma posição mais afastada. Tem dois agravantes. É a tensão de topo, o peso todo do próprio elemento, e fadiga dos conectores e na interação da estrutura com o conector. E tem um problema com pressão também, porque o riser trabalha lá no fundo numa região que é o touchdown point, a região onde o riser toca no fundo do mar. Então ele pode se comprimir. Esse foi o início do desenvolvimento dessa tecnologia de sistemas antecipados, que foi brilhantemente conduzido com o Dr. Zephyrino, o Salim Armando e outros. Nós também participamos e eles tinham grupo específico, o Gespa.
TECNOLOGIAS PARA ÁGUAS PROFUNDAS O Gecam cuidou da parte das estruturas, foi criado para desenvolver estruturas fixas. E tinha um grupo para as instalações marítimas, o Getimp. Esse grupo é que lidava com toda a parte de tecnologia para águas profundas, inicialmente, considerada até 100 metros, depois foi pra 200. A gente passou a considerar que o limite de água rasa seria o limite do mergulho, até 300 metros. Águas profundas seriam de 300 a mil, e de mil em diante, ultraprofundas. Então, houve uma divisão quanto essas profundidades. A gente chegou a fazer um mergulho no manifold de Albacora a 310 metros. Foi o único mergulho comercial a essa profundidade, um dos mais profundos do mundo. Houve mergulhos, mas de teste, pela Comex. Nessa profundidade, com mergulhador descendo a 310 metros, quando foi preciso recuperar o manifold, hoje em dia não se faz mais. Não se faz mais porque a própria fisiologia, o próprio Sindicato dos Mergulhadores ou a própria medicina não recomenda. E é um mergulho muito caro e pela própria exigência de segurança. Durante os anos, a Petrobras passou a fazer desenvolvimento de robótica para fazer toda a parte da diverless, ou seja, as conexões em que não precisasse de mergulho. Houve um grande desenvolvimento de conexões verticais. E esse processo, eu acompanhei todo até também as decisões. Porque as árvores – uma árvore de natal é o conjunto de válvulas que comanda o poço submarino. A gente tem três linhas de produção, que são as linhas de coleta. É a linha que a gente chama de umbilical de controle, que a plataforma aciona essas válvulas para limpeza de poço. Como é que funcionam essas válvulas? E tem a linha do anular que vai fazer esse trabalho de limpeza ou fazer esse trabalho de acesso ao poço. Se der problema no poço, teria amortecer esse poço. E tem a linha de produção mesmo, aonde o óleo vai à plataforma. Então, essas três linhas antigamente eram lançadas por um navio. A gente participou também do desenvolvimento desses navios, e eram lançadas três linhas. Porque, com as profundidades menores, é mais rápido você lançar três linhas do que lançar cada um de uma vez. Como as profundidades estavam aumentando... Eu estou falando de Marlim. Já tínhamos até monobóias para 400 metros da linha d’água e fomos a partir de mil metros. Já tivemos Roncador, o recorde da Petrobras de 1780 metros. Aí nós verificamos que era extremamente difícil lançar as três linhas de uma só vez, e desenvolvemos conectores simples, porque as árvores foram modificadas. As últimas árvores tinham conexão dupla ou tripla foram as árvores de Barracuda. Acho que as últimas foram em Barracuda e Caratinga. Estou falando de 1997, que é quando a gente começou a mudar essa filosofia de linhas lançadas para uma singela. E hoje, fazendo uma comparação do tempo que você perde para re-arranjar as linhas, lançando tripla e lançando uma linha singela, é mais vantajoso você lançar a simples e sair com o barco, lançar de novo, do que você fazer a operação de pré-abandono e recuperação. E todo esse desenvolvimento nós acompanhamos. Tivemos uma patente. Esses sistemas que foram usados já passaram. Aí surgiram os FPSOs, ou FSOs, que são o grande avanço da Petrobras. Por que utiliza-los? É devido ter um sistema que você consegue armazenar e não ter que, necessariamente, lançar uma linha de exportação do óleo, passar por aquela unidade e exportar. Então, o que é que você faz? Você recebe esse óleo, processa, separa o gás da água, faz o processo, e faz o alívio. Vem o navio aliviador, que é conectado a outro navio, e através de uma linha de transferência, se transfere todo o óleo produzido em intervalos que são calculados de acordo com a produção e dali já se exporta o óleo.
SISTEMAS DE ANCORAGEM A plataforma P-34 foi em 1995. Foi o primeiro estudo de como fazer uma unidade com um FPSOs. Eles podem ser utilizados com sistemas de ancoragem com Turret e sistemas DICAS. O sistema de ancoragem DICAS foi até desenvolvido patente pelos engenheiros da Petrobras, o Maurício Sampaio e Fernando Caster. Nós participamos também desta concepção.
A amarração com turret é uma coisa bem simples. O navio é cortado e feito um orifício na parte de proa e colocado um eixo naquela parte, que é o turret, que vai prender as linhas e os risers, para ser ancorado no fundo do mar. E o navio, através de mancais de escora, mancais de rolamento, ele consegue girar. Isto é, o turret permite que o navio gire em torno das linhas. Tem uma peça chamada swivel que recebe várias linhas, swivel elétrico, swivel de gás, swivel de produção, e que joga para a planta. Com a condição que ele está sempre, quando o mar, atuando sobre ele, que responde girando 360 graus.
É chamado Sistema de Ancoragem Complacência Diferenciada. O DICAS é uma concepção desenvolvida por experiência de observação em quadros de bóias, para ver como o navio poderia ser ancorado e receber todas as linhas amarradas a ele. Então, a Petrobras usou duas concepções desse sistema: SYS – small yaw system – e LYS – large yaw system. E nós participamos desse desenvolvimento.
Tivemos que desenvolver como chegar com esses risers através de um tubo guia e fixar. Não pode ter um, porque o riser tem uma peça chamada de restritor de curvatura. É como um fio de telefone, é bem simples. O fio do telefone tem uma parte mais rígida quando você pega junto da conexão. Por quê? Porque quando você se movimenta, a tendência é quebrar aquela parte. Então, em todos os risers, existem as peças que foram desenvolvidas para resistir ao movimento, como um envoltório. É como esse riser vai trabalhar. E ele vai poder trabalhar na condição mais afastada.
Então, ele vai ter que resistir a esses momentos atuantes naquela estrutura. E tem estudos de fadiga, porque ocorrem danos naquele ponto. Nos sistemas antecipados, por ser lâminas d’água menores, a carga de momento atuando num riser e a carga de tração, são os pontos críticos para fadiga. Mas, nesse sistema DICAS, a gente colocou, abaixou essa carga de momento, o enrijecedor. Ele ficava em baixo da condição de mar, sendo mais favorável. Embaixo da quilha da embarcação. Então, o que provocaria? A filosofia era essa: dividir a carga, todos os esforços atuantes de momento, para aquele ponto, a força de tração para aquele ponto lá de cima. Houve uma divisão de pontos de atuação.
PATENTES Nós tivemos que desenvolver, nós fizemos uma pesquisa mundial para ver se existia uma patente mecânica, para bolarmos uma peça que servisse de interface. Se existiam patentes mais hidráulicas, com cilindros hidráulicos, porque isso provocaria interfaces grandes, e as estruturas cresceriam muito. E a gente bolou uma peça mecânica, que foi a boca de sino, que todas as unidades da Petrobras estão utilizando para recebimento de interface do riser com a unidade. Nós participamos da elaboração de um protótipo. Levou um ano para ser desenvolvido. E foi gratificante quando a gente foi colocar a P-34, em setembro de 1997. A gente participou desse evento e viu que funcionava. Quer dizer, você bola a peça, projeta, há o desenho. Houve a participação de outros técnicos também, que contribuíram para essa patente. E é interessante ver todo um sistema, não é só o acoplamento em baixo da unidade, mas a continuidade do riser, que ela prende a unidade embaixo da estrutura dos navios. E depois o riser sobe, porque tem uma folguinha para deslizar o riser por dentro dessa peça. E ele sobe para uma região de superfície para fazer uma conexão seca. Porque a Petrobras, também, nos sistemas flutuantes de produção, teve desenvolvimentos de conexões de riser molhado. Então, tinha problemas de mar, problemas de paralisação e de stand by lá no mar, que levou a gente pensar nessa peça para facilitar a operação no mar e minimizar os custos de não colocar imediatamente aquele poço em produção. Hoje, as operações estão bem rápidas. Estamos conseguindo fazer sistemas muito eficazes para essas operações, porque não se pode mais esperar tanto tempo para colocar um poço para produzir por causa das condições. Existem condições de mar para fazer a operação, porque a gente não vai por em risco a integridade da estrutura dos risers.
Eu participei de uma outra patente. Quando a gente foi lançar um gasoduto em Salema-Bijupirá, que era um outro campo. Eu lembro que teve um grande acidente no Mar do Norte, na plataforma Piper Alpha. Houve uma explosão nessa plataforma. E, posteriormente, houve uma determinação da superintendência para que todos os gasodutos da Petrobras tivessem uma válvula de segurança. A gente teve que desenvolver uma válvula, a partir de uma especificação, e pensar como lançá-la em pouco tempo. Nós bolamos um sistema híbrido. Eu tinha uma linha rígida lançada. Precisava bolar como ia interligar aquela linha rígida com um riser. Como é que eu ia fazer isso. A gente bolou um sistema híbrido de lançamento com válvula mais uma sessão de linha flexível que, e o próprio barco lançador da linha flexível conseguiria içar e se poderia restabelecer o sistema. Não tinha tempo hábil da gente colocar, porque o duto rígido já estava lançado. Tinha que colocar uma válvula naquele sistema utilizando essa sessão de duto flexível. Então o que a gente fez? A gente colocou e abandonou o duto rígido com uma sessão. Então, foi bolado um sistema de recuperação com pontos que absorvessem toda a carga durante o içamento. E a gente patenteou esse sistema híbrido.
OUTRAS PATENTES PIG LOOP
Teve ainda outro sistema desenvolvido, que contou com a participação de outros engenheiros. Como algumas árvores de natal deveriam ter um pig*, a gente desenvolveu uma peça para ser lançada pela embarcação, uma peça extra para que fosse colocada antes da chegada da linha, antes da árvore. Quando se limpa a linha, você passa um pig de limpeza. Com essa peça, eu conseguiria fazer com que esse pig viesse por uma linha de anular e saísse pela linha de produção, limpando a linha para ter o fluxo de produção maior. Então, esse foi um outro invento, chamado de pig loop.
FERRAMENTA DE DESCONEXÃO AUTOMÁTICA DE MANIFOLDS
A outra patente foi uma instalação de manifolds. A gente bolou uma peça mecânica que desconectava o manifold do fundo do mar sem o auxílio de mergulhador. Ah, essa foi ótima porque nós tivemos manifolds menores na época dos sistemas antecipados. E com isso a gente teve que especificar a embarcação com pórticos que a gente chama de a-frames, pra adaptar esses manifolds a serem lançados. Eles seriam desconectados numa lâmina d’água maior, independentes do mergulhador. Ele se desconectar. A gente teve que bolar isso, coisa simples. Mas foi como colocar o ovo em pé. É simples, mas fundamental. Então, fizemos umas dez instalações com sucesso. Foi um trabalho que saiu de uma observação, quando se levou uma balsa pra lançar quatro manifolds ao mesmo tempo. Nós estávamos perdendo tempo para esperar um barco de mergulho. Aí a gente olhou e: “Que tal a gente colocar uma haste enorme, uma tubulação, e que ela tivesse uma conexão nessas ligadas?”. Quando a peça chegasse ao fundo do mar, eu deslocaria uma peça rígida e conseguiria retirar. Porque o guindaste tem um gancho. E nesse gancho, às vezes, você tem uma chapinha de proteção para a linha ligada não sair. Aí eu tirei essa chapinha de proteção, porque não ia haver movimento que soltasse aquela peça. E quando chegava ao fundo do mar, ligado aos cabos, eu tinha uma peça rígida. Quando essa peça tocava o solo, ela impulsionava. Tinha uma força contra essa ligada, reação do solo com essa peça, essa mão do cabo, como se ele fosse retirado através dessa força. Aí aconteceu. A gente fez um teste e desenvolveu para as embarcações menores. Surgiu de uma observação e por uma necessidade. A gente estava lá participando. E foi feita para mitigar custos.
PROJETO DE BARRACUDA E CARATINGA O último projeto gratificante foi de Barracuda e Caratinga, que nós participamos. Nós tivemos a responsabilidade de toda a área subsea. Eu e um outro engenheiro da Petrobras conseguimos desenvolver todo o sistema submarino, tanto o lay-out submarino, como a adequação desse lay-out submarino para as condições de lançamento, de pré-lançamentos. Foi um marco. Agora, as linhas estão sendo içadas com a maior rapidez. Em todo o sistema. Passei um ano e meio com a empresa KBR - Kellog, Brown & Root – que é subsidiária da Halliburton, porque a unidade já estava sendo produzida, tanto a P-43 como a P-48. Participamos de toda a concepção do projeto de pull-in risers. Lá tem uns carrinhos para que sejam içados pela parte lateral da embarcação. É um sistema DICAS. Ele não é pela proa, é feito pela lateral da embarcação. Tudo está na parte bombordo, todos os risers. São 113 risers. Na P-48 são 78 risers. E nós pré-lançamos tudo. Quer dizer, quando chegamos agora no mar foi só pescar e içar. Então, lá tem vários poços já içados e está pronta, e com rapidez. Quer dizer, mais uma outra, devido à ida da unidade não ter ido antes, foi postergada a ida dela. A gente teve que inovar de novo, porque a condição não permitia que fosse pré-abandonada. Nós analisamos e permitimos. Isso foi um ganho tremendo de tempo, o barco já lançou. E não se precisa mais perder aquele tempo todo com lançamentos, ao longo de quilômetros.
GERÊNCIA DE DUTOS DE INSTALAÇÕES Atualmente, eu estou na gerência de dutos e instalações. Da parte de engenharia de dutos e instalações. E nós cuidamos de todos os projetos, de dutos de exportação, rígidos. Então, eu parti da área de flexível para a área de rígida. É um novo desafio.
E também com esse conhecimento, porque é uma área com uma diversificação de matérias. Eu cuidava da área de geofísica, da área de geotecnia e oceanografia, de instalações de jaquetas. E voltei para área de projetos de dutos. Quer dizer, nós projetamos os dutos. Temos uma equipe com 53 técnicos. Tem uns 13 ou 14 com mestrado, outros com doutorado e pós-doutorado. A equipe está bastante focada em todos esses projetos, que são desafiadores. Temos linhas de grandes diâmetros a serem lançadas em profundidade de 1800 metros. Linhas de 18 polegadas. Temos participação também na área de risers alternativos porque, quanto maior a profundidade, é mais difícil ter uma estrutura que atenda as cargas para essas unidades. Estou participando ainda desses projetos que a gente chama de PDET – Plano Diretor de Escoamento e Tratamento de Óleo da Bacia de Campos e do PDEG – Plano de Escoamento da Produção de Gás, que é a parte de todo o escoamento de óleo e gás da Petrobras. Tem também projetos no Rio Negro, em Manaus, o que é fantástico. A gente levantou todo um perfil de correnteza, as variações de marés no Rio Negro durante um ano. E tem um projeto brilhante, que é um projeto de gás de Urucu Manaus, numa área que está crescendo. E vai ser muito rico ver a nossa balsa lançando um gasoduto no próprio Rio Negro. Tenho orgulho de participar de projetos com esse e em toda a área da Petrobras, em terminais como Tramandaí etc. É uma área bem abrangente, que pega desde o sul até o norte. Desde o Oiapoque, que eu já fui. Quer dizer, está sendo muito bom.
É um conhecimento que eu já tinha, mas não sabia da riqueza. O que um sonar pode trazer para riqueza do fundo marinho. O que isso representa para a análise estrutural do duto. Por que uma linha flexível é diferente? Ela contorna as variações, mas é muito cara. Então, o duto rígido substitui plenamente, desde que se faça, previamente, uma análise de toda a rota desse duto. Então, precisa da geofísica, das análises de solo, para fazer a parte de cravação de unidade. Quer dizer, com essas mudanças climáticas, quanto mais informação, melhor embasamento terão os técnicos.
Não é do mar para terra. Nós estamos sempre no mar, eu só estou falando que, como eu tratava muito com linhas flexíveis, agora eu estou trabalhando com linhas rígidas. Eles foram sempre competidores, quer dizer, uma competição saudável. Porque o que interessa é fazer tudo dentro da segurança, da preservação do meio ambiente. E é o que Petrobras está fazendo. São projetos que seguem as normas. A gente até discute isso, você sabe que pode confiar naquele projeto, que não vai ter nenhum risco. A Engenharia convive com o meio ambiente, sempre conviveu, e a Petrobras sempre trabalhou muito nesse aspecto.
FILHOS Tenho dois filhos o Leonardo e o Daniel. O Leonardo está com 21, vai fazer 22 anos agora. Ele está fazendo Direito na UFRJ. E o Daniel está fazendo Engenharia de Produção.
ESPOSA A Maria Célia é jornalista e trabalhou na Petrobras. Está aposentada. Nós nos conhecemos na Petrobras, em São Roque do Paraguaçu. Ela foi fazer uma matéria e eu estava acompanhando o superintendente. Na época, o governador era o Antônio Carlos Magalhães. Houve uma visita de todos lá. Ela foi pela assessoria de imprensa. E houve um click. Ela é carioca. Tinha uma amiga dela que era casada com o chefe da obra. Elas se conheciam, fizeram jornalismo juntas na UFRJ. E essa amiga disse: “Eu tenho um negócio para você levar para sede”. Eu vim fazer um curso no Rio e a procurei. Por sinal, nós nos encontramos na Cinelândia. Ela estava passando, tinha que acontecer.
Aí a gente se conheceu, e depois eu vim para o Rio. A gente começou a namorar e pronto.
PROJETO MEMÓRIA Eu acho fantástico. Eu vou dizer porque. Porque a gente está resgatando isso e é importante ouvir.Recolher