A minha infância em Buenos Aires (mas essa não é Buenos Aires lá de fora, é daqui do interior mesmo) foi muito boa. No começo até que eu pensei que não. Mas graças a Deus, quem pensa em Deus tudo tem. Sempre eu tive o sonho de alguma coisa. Eu nunca saía de casa porque eu era privado, a mi...Continuar leitura
A minha infância em Buenos Aires (mas essa não é Buenos Aires lá de fora, é daqui do interior mesmo) foi muito boa. No começo até que eu pensei que não. Mas graças a Deus, quem pensa em Deus tudo tem. Sempre eu tive o sonho de alguma coisa. Eu nunca saía de casa porque eu era privado, a minha mãe não deixava. Me deram o tempo para estudar, eu não quis. Não quis. Lutaram para mim estudar, eu digo: \"Eu não quero aprender ler.\" \"O que é que você quer?\" Eu digo: \"Eu não quero nada.\" Foi depois botei na cabeça de acompanhar maracatu. Mas ela não deixava eu sair de casa para ir olhar maracatu.
Mas um dia e teve um maracatu distante da minha casa e eu fui dormir. Quando eu acordei uma faixa de 10 horas da noite eu vi tocando, a zuada pelo mundo. Eu abri a porta devagarzinho, saí, fechei, joguei a chave por baixo, fui embora. Quando eu chego no maracatu estavam dois mestres sambando. Cheguei entre um e outro fiquei. E ali só saí quando terminaram de manhã. Eu decorei tudinho no juízo. Quando eu cheguei em casa estava tudo brabo me procurando, porque eu não estava em casa. A rede estava armada mas eu não estava. Aí me procurando, aí vou chegando. Já com medo de apanhar. Porque a véia era malvada para mim. \"Você estava aonde?\" Eu digo: \"Eu estava no maracatu.\" \"Sozinho?\" Eu digo: \"Não, estava meio mundo de gente e eu estava no meio.\" \"Isso é bonito?\" Eu digo: \"É bonito e eu sei cantar.\" Aí disse: \"Sabe nada, meu filho.\" Eu digo: \"Eu sei, eu sei cantar.\" E fiquei com aquilo no juízo: \"Eu sei cantar o maracatu.\" Pela tarde lá nesse lugar ia ter maracatu novamente. Tomei um banho, tomei um cafezinho, me deitei mas não pude dormir, choqueado. Pedindo a Deus que chegasse meio-dia para eu ir para lá. E pedindo a Deus ela deixar eu ir. Pai, deixa eu ir.\" Ele disse: \"Eu quebro o galho, vá-se embora.\" Quando eu fui saindo ela me freiou: \"Prá onde?\" Eu digo: \"Eu vou para o maracatu.\" Ela disse: \"Ó o dedinho.\" \"O pai deixou.\" Ele disse: \"Vá.\" Eu disse: \"Graças a Deus, meu Deus.\" Eu fui embora.
Subi no tamborete, cantei maracatu até a hora de terminar. Cantei o que eu decorei do cara eu cantei todinho, que o mestre ele não sabia, foi uma valha para ele. Tinha um sargento lá na cidade, ele era muito encapetado. Se o cara soubesse cantar ciranda, maracatu, cavalo-marinho, coco-de-roda, coco-de-pandeiro, ele chamava. Não tinha dia. Podia ser segunda, terça, quarta, qualquer dia. Aí ele disse: \"Eu vou fazer um maracatu para você.\" Eu digo: \"Graças a Deus.\" Realizei porque o sargento que vai fazer. Ele arrumou um bombo lá, um terno de maracatu e eu comecei brincando. E fui ensaiando com o mestre, sambando com os outros mestres: pá, pá, pá, pá, depois passei a pronto. Quando eu passei a pronto eu digo: \"Agora eu não tenho medo de mestre não. Agora é pé de parede mais eles. Seja o que seja.\" Aí eu digo: \"O que é que eu faço? É fazer para mim. - eu digo - agora eu vou ver se o meu juízo dá.\" Botei o juízo para funcionar e foi a maior tranquilidade para mim. Eu segurei o baque. Segurei o baque e aí no dia que eu completei 10 anos meu presente de aniversário foi eu tirar um carnaval. Maracatu. O cara me entregou o maracatu pronto. 36 caboclo, acompanhado. Bonito todo. Aí disse: \"O mestre é você.\" Eu desse tamanho. Que eu com 10 anos era do tamanho de jumento, pequeno. Tirei o maracatu.
Quando eu saí no domingo de oito horas do dia de casa, cheguei na quarta. Quando eu cheguei em casa ela disse: \"Gostou?\" Eu disse: \"Gostei.\" Ela disse: \"Foi o primeiro e o derradeiro que você brincou.\" Eu falei: \"Por quê? Eu não morri.\" Ela disse: \"Porque eu não quero que você brinque.\" Eu disse: \"Meu pai do céu, meu Jesus, dá-lhe no juízo dela para ela deixar eu brincar.\" Aí o pessoal caiu para cima dela: \"Dona Eulália, deixa o seu filho brincar. É um signo que ele trouxe e ninguém pode cortar.\"Foi uma promessa para São Severino para eu deixar de brincar. Mas que lá em casa, casa de taipa, a parede era capaz de ninguém ver a parede. Toda qualidade de retrato de santo tinha. Então tinha São Severino. Ela tramou tudinho, fez a promessa e
foi pagar. Aí eu comecei a chorar escondido. Aqui, acolá, estava chorando. O povo perguntava: \"O que é que tem Zé Duda?\" \"Nada não.\" Mas a língua engrossava porque eu não podia dizer
o que era. E lá vem se aproximando o sábado, e eu tinha um ensaio de maracatu com outro mestre para dar no sábado. Quando chegou a sexta-feira, eu disse: \"Agora eu vou ver.\" Aí o pessoal que brincava comigo: \"Como é, a gente vai ou não vai?\"
Eu digo: \"Vai.\" O pessoal tudo sabia. Eu fui. Quando cheguei lá sambei a noite todinha. Nada faltou no meu juízo.
Quando foi no outro sábado, de novo. Aí comecei a cantar e coisa, e ela lá. Com uma toalha grande enrolada no pescoço. Aí chegou bem perto de mim. Eu fiz um samba para ela. Eu disse: (CANTA) \"Mamãe fez uma promessa para eu deixar de sambar. Abalando todo mundo conquistando o pessoal. Ralando o joelho pelo chão, só para me atrapalhar. Quando ela foi no altar chorando e acendendo vela. E o santo foi, gritou: \'velha deixe seu filho vadiar\'.\" Ela botou a mão para cima e disparou no choro. Não pode me parar não. Aí eu disse: \"Tá vendo quem tem fé em Deus o que é que faz? Agora, a senhora não pode me bater-me, e nem São Severino. Porque q senhora é devota dele e eu sou também. A senhora tem fé nele para parar de eu brincar, e eu tenho fé nele para ele aumentar para eu brincar.\" Aí ela liberou. Liberou e eu toquei a vida até hoje. Disse: \"Se prestar eu fico, se não prestar eu saio.\" Que pena que eu já fiz 58 carnaval, agora em 2007.Recolher