P - Eu queria começar perguntando o seu nome completo, data e local de nascimento. R - Luís Fernando Miot, eu sou de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, e nasci em 26 de novembro de 55. P - E quando foi a sua entrada no Aché, Miot? R - 22 de agosto de 83. P - E como aconteceu isso? Como...Continuar leitura
P -
Eu queria começar perguntando o seu nome completo, data e local de nascimento.
R - Luís Fernando Miot, eu sou de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, e nasci em 26 de novembro de 55.
P -
E quando foi a sua entrada no Aché, Miot?
R - 22 de agosto de 83.
P -
E como aconteceu isso? Como você foi parar no Aché?
R - Bem, na época eu tinha um armazém, e não estava satisfeito com aquilo, e estava procurando uma outra atividade, encontrei onde vender aspirina, mas era um projeto para vender aspirina de bar em bar, vender somente onde não tinha o produto exposto. Então era extremamente difícil, sair com uma sacola carregada de aspirina em caixa, e tentar localizar bares, restaurantes, postos de gasolina, para colocar o produto. Casualmente ficou no Ramo de Medicamento, mas foi mera casualidade. Porque logo em seguida eu conheci o pessoal que trabalhava nesse ramo, e um disse para mim assim: "Olha, eu estou saindo de um laboratório, estou indo para outro. Tu não quer te candidatar?" Digo: "Já estou indo." Na mesma hora eu desci a Porto Alegre, de Caxias... é na Serra, a gente descia a Porto Alegre, e me candidatei à vaga, e depois de três dias horríveis de entrevistas... ou nem havia entrevistas, depois de três dias de espera, eu acabei ingressando efetivamente no Aché. Isso é até interessante, porque na época, como eu fui lá fazer uma entrevista, para voltar para casa, chegou no final da tarde, ficou para o outro dia. Aí eu, sem roupa para mudar e sem dinheiro, pegava o ônibus para voltar para Caxias, eram duas horas e pouco de viagem. Então, durante três dias foi essa maratona. Mas era uma sistemática na época, uma sistemática para ver também a persistência. Então, como parte de um treinamento para ver se você realmente era persistente valia a pena, porque na verdade nem todos eram persistentes a ponto de ficar. Então, acabei ingressando no Aché nessa época, em 83.
P -
E você lembra dos seus primeiros dias de trabalho?
R - Eu acredito que ninguém esquece, porque na época eu fui contratado para fazer uma região do interior de Caxias do Sul, nem era na cidade de Caxias, que hoje é a segunda maior cidade do Estado, na época era a terceira. Era só interior. Eu lembro perfeitamente que fui a Bento Gonçalves, que era a primeira cidade do roteiro para fazer as propagandas. Mas como naquela época eu estava entrando num aumento de equipe, não tinha supervisores suficientes para acompanhar todos os novos. Então, eu fui um dos que ficou sozinho. Nos primeiros dias, alguns desistem, nem todos, poucos, porque é terrível você no primeiro contato entrar no consultório e você ainda não estar bem preparado com o que vai dizer. Então, isso foi terrível, os primeiros dias foi terrível. Hoje mudou completamente, mas na época foi terrível. Tão terrível, que eu acabei entrando no mesmo consultório três vezes no mesmo dia, achando que... (risos) Três vezes no mesmo dia
P -
(risos) Estava meio desnorteado.
R - Desnorteado, sem saber, e as amostras. E você não sabe bem as amostras, porque você não tem o primeiro contato. Você vai ter o contato das amostras em casa, no final de semana, o primeiro final de semana depois de você voltar de curso, então você vai entrar em contato. E daí procurar na hora as amostras, isso é difícil. Então os primeiros dias, eu acredito que todo representante lembra os primeiros dias e o primeiro médico.
P -
Como foi o primeiro médico?
R - O primeiro médico eu achei a médica muito brava. E ela foi quem eu visitei três vezes no primeiro dia, até que ela me ajudou e disse assim: "Mas, escuta, o que está acontecendo, você de novo aqui?" Então, isso aí tudo me ajudou a desenvolver esse primeiro dia. Claro, no início tem muitas histórias. Nesse primeiro dia, eu puxava uma literatura, começava a falar sobre aquele assunto, esquecia, botava de volta. Como eu estava treinando em Porto Alegre, na filial, como a gente treina. Se você erra, você começa de novo. Ah, não teve dúvida, se eu esquecia eu botava de novo. Lá pela terceira ou quarta vez, o médico: "Não, espera aí, senta aí que eu vou te ajudar, vou te ensinar." Então, todos ajudam, o médico ajuda no início. No início era muito mais camarada. Hoje em dia não é tão camarada assim a coisa. Hoje em dia é muito mais complexo, você tem que estar muito mais bem preparado, você não pode tomar o tempo do profissional. Nós estamos falando de coisa de 18, 19 anos atrás.
P -
E era na época que também vendia e cobrava? Conta um pouco. Como é que era essa rotina de propagar, vender, cobrar?
R - Esse foi um período que ajudou bastante a quem permanece, ou mesmo que tenha saído da empresa, levou uma experiência muito forte disso, porque nós visitávamos os médicos e visitávamos todas as farmácias. Então, a filial em Porto Alegre, como todas as filiais do Brasil, comprava a mercadoria do Aché, o Aché vendia porque era Prodoctor, não era Aché. Em Porto Alegre era uma Prodoctor. Comprava mercadoria. O diretor dessa filial, ele era o responsável pela compra da mercadoria e a venda da mercadoria para as farmácias. Então, nós vendíamos, tirávamos o pedido, e esse pedido tinha que ser numa quantidade suficiente para durar 30 dias, porque evidentemente nós não passávamos duas vezes. Depois de vender, então, tinha sempre a duplicata para cobrar. Então, se cobrava a duplicata, tinha que cobrar, não podia vender se não cobrasse. Então, nós fazíamos a vez de vendedor, cobrador e propagandista. Então, PVC, propagandista, vendedor, cobrador, essa era a função. E a gente fazia também essa tarefa. E o Aché não tinha distribuidor, só nós que vendíamos. Como a propaganda é massificada, o médico prescrevia, a farmácia se obrigava a ter o nosso produto. Então, esse termo "se obrigava a ter" ao longo dos anos criou uma série de problemas de relacionamento para a gente, do "se obrigar a ter" a nossa mercadoria. E isso trouxe muitos problemas... Hoje em dia ainda se convive com esse problema em alguns poucos casos, mas ainda tem.
P -
Relacionamento com a farmácia?
R - Com a farmácia. Em função... hoje em dia em função também de prazos, descontos. Sempre tem esse problema, porque o nosso negócio é fazer a farmácia vender o produto que o médico receita, que é o que a gente faz. A farmácia gostaria de vender o que o médico receita e ganhar um pouco mais. Então, isso é questão de comercialização. Mas na época era duro, você tinha que vender e cobrar.
P -
Essa cobrança das duplicatas nem sempre era muito tranquila, às vezes pagavam com as coisas mais variadas, não é?
R - É, ao longo dos anos tem histórias. Então, assim, se por um motivo ou outro a duplicata foi emitida em São Paulo e a mercadoria demorou para chegar no cliente, às vezes você chegava para vender, não tinha recebido a mercadoria. Então, você fazia uma conta que iria ficar desabastecido, você precisava vender de novo. Mas para isso você precisava levar o cheque da duplicata que estava em aberto. Mas eles diziam assim: "Mas eu ainda não recebi a mercadoria." "Mas vai receber." Então, era complicado. Você tinha que levar... nem sempre acontecia isso, mas é um caso. Tinha que levar um cheque da duplicata que ia vencer para poder levar um pedido junto, para que o gerente pudesse aprovar um novo pedido somente mediante o cheque daquela. E, claro, tinha vezes que acontecia de tudo. Eu lembro perfeitamente de uma oportunidade que... um hospital de uma cidadezinha do interior, a farmácia do hospital, a madre não estava lá, não tinha quem pagasse, pegava um pouco de dinheiro daqui, dali, e uma parte do pagamento foi em ovos e queijo. Então, eu ia acabar comprando ovos e queijo, uma parte foi em ovos e queijo, porque eu sempre levava dali. Então, a gente tinha que fazer de tudo. Isso, se a gente explorar, vai encontrar várias coisas. Uma cobrança em Gramado uma vez foi em dólar. Porque lá pela quinta ou sexta vez que eu cobrava o farmacêutico, o dono da farmácia, e ele... uma vez ele disse assim: "Mas eu não tenho dinheiro." E abriu o cofre para mostrar, mas tinha um monte de dólar. Eu digo: "Sim, mas me dá em dólar, então." Peguei em dólar. Isso foi uma cobrança que depois não tinha como pagar a duplicata na filial, porque como é que eu vou pagar em dólar? Então, foi uma outra história, que é vender dólar um pouco para cada um lá para fazer dinheiro. Era uma situação na época interessante, interessante, quando não estressante, cobrar.
P -
E as andanças, isso de viajar e pegar as estradas também rendeu histórias boas, não é?
R - Rendeu, porque na época, se a gente analisar Caxias do Sul, que é um pólo metal-mecânico muito grande, o representante ficava somente em Caxias do Sul. O que fazia os arredores é que viajava bastante. Como na época eu fazia os arredores, era onde tinha vaga quando eu entrei, então eu realmente tenho histórias. Porque os carros que se usava na época eram carros muito velhos, então eram carros que viviam dando problema. Como eu comecei com uma Brasília 77, deve ser, e ela tinha problemas, problema de motor, problema de lataria, problema de tudo, andava atravessado, ela me deu muito trabalho. Porque não andava, então demorava muito para chegar nos locais. E como você tem um compromisso não só de horário, mas de visitar os médicos, senão você não consegue fazer toda a tua volta, e todas as farmácias, então tinha que acordar muito cedo. E essa Brasília, ela deu história, por um bom período. Depois as coisas se modificaram.
P -
E a história do tatu, como é que acontece?
R - Nesse período aí mais ou menos, logo no início, que eu entrei numa época... vendia-se, naquela época, vendia-se na beira de estrada. Não tinha essas leis que tem hoje, e tal. E vendia-se muita coisa. E numa época compramos, eu e um colega da outra linha, andando, nós estávamos no mesmo carro, compramos um tatu na beira da estrada. E o vendedor nos vendeu esse tatu com uma cordinha amarrada na perna, e colocamos o tatu dentro de um saco atrás do banco. Chegando numa cidade de Vacaria, fomos lá para fazer a venda, porque nós estávamos voltando para Caxias, para vir a Porto Alegre, tinha reunião, nós comentamos com a freira lá da farmácia do tatu, que tinha morrido. E ela dizia: "Não, não morreu. É só dar água que ele se reanima." Mas dito e feito. Foi dar água para o tatu e ele ressuscitou, como se estivesse morto. Mas assim quando bebeu água, saiu à disparada pelo canteiro de horta das freiras no hospital, que veio mais um e mais outro, e um daqui, atacando dali, até que conseguimos pegar o tatu. Pegamos o tatu, botamos ele dentro do saco, largamos atrás do banco, amarramos bem o saco, e saímos em direção à Caxias do Sul. No meio do trajeto, o Chicão, que era o meu colega do Novoterápica diz assim para mim: "Luiz, tu tem medo de tatu?" Eu digo: "Não, tenho medo não. Por quê?" "Porque ele está te cheirando." Eu olhei para trás, o tatu tinha roído o saco, saído, subiu em cima do banco e estava encostado no meu banco me cheirando. Quando eu vi o tatu, imagina, eu me virei de costas e naquilo a Brasília se foi mato adentro, numa capoeira. E o Chicão correu. Quando correu, eu disse assim: "Não corre, que o bicho vai..." Não deu outra. O Chicão saiu e o tatu saiu atrás. Bom, ali foi outro corre-corre, até que depois de mais de uma hora conseguimos pegar o tatu, levamos, amarramos bem em uma corda, amarramos dentro do porta-mala na frente, cheguei em casa. Em Caxias, eu digo assim: "Chicão, vamos pegar, trocar aqui, vamos para Porto Alegre." "Ah, vamos." Peguei o tatu, coloquei dentro de uma caixa, botei um pote com água e disse para o meu irmão: "Quando o pai chegar, pede para ele tratar o tatu. Está bem?" "Está bem." Fui para a reunião em Porto Alegre, que era reunião de dois dias. Na volta, quando voltei, no dia seguinte, fui olhar o tatu. Fui olhar, a caixa vazia. Eu digo: "Mas cadê o tatu?" Procurei, procurei, não achava o tatu. Lá pelas tantas, disse assim para o meu pai: "Mas e o tatu?" "Comi o tatu." "Mas como comeu?" "Mas não foi isso que você disse? Come o tatu?" Foi o que o meu irmão passou para ele, disse para ele que eu tinha trazido um tatu para ele. Olhei, estava o casco do tatu enterrado num palanque da cerca. Então, todo o trabalho não deu em nada. Ficamos na vontade. Mas hoje temos que preservar esses bichinhos. E um urubu atravessou... ele estava atrás de um caminhão, e um urubu deu um rasante na estrada e deu de cabeça na carroceria do caminhão, e caiu. Quando caiu, o caminhão foi embora, ele parou o “fuca”, juntou o urubu, abriu o porta-mala do “fuca”, botou lá na frente, fechou e foi embora. Chegou em Uruguaiana, na fronteira, chegou lá e disse para a mulher dele: "Nega, eu tenho um presente para ti." E ela foi lá correndo para ver qual era o presente, ele abriu o capô... porque o urubu não morreu, ficou tonto. Quando ele abriu, o urubu levantou aquelas asas enormes, e ela aos gritos. Então, ele pegou dali o urubu, soltou o cachorro, pegou a corrente do cachorro, amarrou no urubu. Amarrou a corrente no urubu. E foram lá para dentro conversar. E o urubu ficou amarrado na corrente do cachorro. Lá pelas tantas, vira aquele griteiro na rua, aquele griteiro, saíram porta afora para olhar, o que aconteceu? O urubu voou, onde ele amarrou escapou, o urubu voou com a corrente do cachorro, só que era muito pesada, ele caiu na rua, mas caiu em cima de um carro a corrente, foi um estrago, uma confusão no meio da rua.
P -
E esse quem era? Um propagandista?
R - Propagandista. Histórias nesse ramo... tem umas que são mentiras, que não são verdadeiras, que contam umas piadas, que a gente do Aché tinha fama de visitar... era de branco, visitava, estava de branco, visitava. Então, que às vezes visitava açougueiro, essas coisas. Então, isso... estava de branco, pegava e visitava todo mundo, enfermeira, o que tinha... tem muita história...
P -
Uma coisa que se diz muito é isso de que o Aché foi uma escola, o Aché fez escola. O que é isso?
R - É assim: o Aché sempre foi um grande laboratório, desde seus primórdios, sempre teve uma grande quantidade de representantes. Mesmo na época que não era tão grande mas tinha bastante representantes. Então, todos os laboratórios acabavam se servindo dessa fonte natural do Aché para pegar seus representantes. E isso ocorreu até bem pouco tempo atrás. Essa coisa que acabou, que encerrou, que diminuiu quase a zero, faz coisa de três, quatro anos. Mas há coisa de dez, quinze anos atrás era a coisa mais comum. O pessoal entrava no Aché com a idéia fixa de arrumar uma oportunidade de sair para um laboratório grande, que é o que se chamava na época, laboratórios grandes. Então, todo mundo fazia escola no Aché para depois sair para outros laboratórios. E isso foi por muitos e muitos anos, foi assim, dessa maneira que funcionou. E esses desafios com certeza foi uma das pilastras que deu todo esse potencial que é o Aché hoje. Então, se você verificar o Ramo Farmacêutico, a maioria passou pelo Aché. Porque assim como nós buscávamos o novato, o neófito, nos bancos, que era a nossa fonte de pessoal, os outros laboratórios tinham no Aché a sua fonte. Então, essa escola foi exatamente isso. Como nós temos um Departamento de Treinamento muito bom e uma técnica de entrevistas muito boa, que até hoje são muito boas para se escolher pessoal, a gente pegava, escolhia, treinava, e depois de estar treinado, aí então ele, quando tinha oportunidade, saía e ia para outros laboratórios. Há três, quatro anos isso reduziu praticamente a zero. A gente praticamente não tem mais isso, até porque não tem mais tantos empregos aí fora aguardando. E também hoje a nossa empresa não deixa...
P -
A rotatividade é bem menor hoje?
R - Quase zero, a gente pode dizer. De um ano a gente pode dizer que um ou dois por cento de rotatividade, é pequeno.
P -
E no começo era enorme?
R - No começo, isso... para alguém ficar um ano era bastante. Ficar um ano no Aché era bastante. Hoje não, hoje mudou completamente. Hoje se faz carreira, hoje é diferente.
P -
E ao mesmo tempo se diz muito que o Aché abria caminhos. Quer dizer, ia aonde os outros laboratórios não iam, e os outros Laboratórios até seguiam os passos do Aché. É isso mesmo?
R - Na época o Aché tinha, assim, a sua venda maior era no interior e não nas capitais. Então, nós visitávamos o interior, que dava um retorno muito bom. Um laboratório que não era tão grande e precisava de venda, ia lá no interior buscar. Apesar de todas as adversidades e custos, ia no interior buscar, porque muito mais fácil era vender nos grandes centros que não tinha custo nenhum. Mas com o passar do tempo os outros laboratórios passaram a visitar também o interior e buscar suas fontes de rendimento também nessas mesmas cidades. Então, hoje é o contrário: nós tentamos de todas as maneiras ganhar mercado é nos grandes centros. E isso são várias estratégias que se utiliza, estamos montando, para que se ganhe mercado nos grandes centros. E não ser conhecido somente como um laboratório que se dá bem no interior. Então, isso realmente é uma verdade.
P -
As estratégias de trabalho do propagandista, quer dizer, o material de literatura, as amostras, os brindes, isso foi mudando muito no decorrer do tempo, as estratégias de conquista do médico, do receituário?
R - Olha, na verdade, a amostra grátis, a literatura, é praticamente... o trabalho não é tão inovador, não muda tanto. Mudou evidentemente, porque na época bastava-se trabalhar. Na época era assim: "Em terra de cego, quem tem um olho é rei." Então, bastava você realmente trabalhar que o retorno vinha. Porque o médico, ele correspondia à altura com as tuas visitas, com as tuas amostras, com as literaturas. Hoje, apesar de na época a gente trabalhar com a cobrança, com a venda, e carros não tão bons como os de hoje ou, diga-se de passagem, muito piores dos que o de hoje, na época se precisava era de trabalho. Hoje o material pode ser... tem a literatura, tem a amostra, os tópicos das literaturas são mais modernos, evidentemente, se modernizou, mas o trabalho junto ao médico hoje ele é bem mais profissional, hoje ele é muito mais aperfeiçoado, você precisa estar mais bem preparado. Então, eu acredito, assim, que o pessoal de hoje é mais exigido do que na época, na época que eu fazia propaganda. Hoje ele precisa se qualificar. E isso é uma tendência do mercado, uma necessidade que não tem volta. Quem não se qualificar está fora do mercado.
P -
Você tem saudade da sua época de propagandista?
R - Tu sabe que às vezes eu me lembro, quando alguém comenta, mas não dá tempo para se lembrar, é bastante tempo isso tudo, né?
P -
Quando é que você deixa de ser propagandista? Como foi a segunda fase?
R - Quer dizer, eu vou te dizer, a gente nunca deixa de ser propagandista porque a gente faz isso a vida inteira. A profissão é propagandista. Você pode, como nesse momento aqui... eu ser gerente, gerente regional, mas você não deixa de ser propagandista. Então, eu passei ao cargo de supervisor, dois anos depois de entrar na empresa eu passei ao cargo de supervisor. Então, aí já fazia a região de Caxias do Sul e a região nordeste do Estado, como supervisor.
P -
Aí ficou como supervisor até quando?
R - Como supervisor eu fiquei seis anos. O que, diga-se de passagem, foi bastante tempo. Às vezes você era promovido mais cedo. Mas como eu morava no interior, então até demorou um pouco mais. Mas deu uma base muito grande, uma base muito grande na supervisão, porque essa função do supervisor na época, hoje gerente distrital, é uma função importantíssima dentro da empresa, porque ele é o elo de ligação da empresa, do gerente, com o representante. Então, fiquei uns três anos lá no interior, quatro, e depois vim para Porto Alegre, como supervisor. Em Porto Alegre com outra linha. Assim fui passando todas as linhas de produtos da empresa.
P -
Essas linhas de produtos tem algum produto que tem alguma história marcante, que você tem um desafio maior de trabalhar?
R - Tem. Praticamente, toda vez que você lança um produto, os produtos tradicionais, eles são queridos até hoje porque evidentemente aquilo ali te deu muita base. Mas todo o produto que você lança, esse é de tua responsabilidade. Somente tua. Então aqui até se costuma dizer que é um filho que o cara cria, porque a empresa fornece todas as armas iguais para todos os representantes, o mesmo material, o mesmo treinamento, e cada um sai a fazer o seu trabalho. Nem todos vencem, nem todos. Então, quanto mais você acredita nos produtos, maior é o teu resultado. E eu posso te dizer, assim, que um produto que até hoje ele tem uma certa dificuldade, é o Leucogen. Esse é um dos produtos que eu lancei na época e até hoje ele é um desafio para quem trabalha com ele. Porque é um produto que estimula as defesas orgânicas. Não é um produto tão barato, porém você convencer o médico das oportunidades em que ele deve usar, então isso tudo... Esse é um produto interessante. Mas um produto em especial não tem, assim, um marcante.
P -
E da sua época de supervisor tem alguma história especial?
R - De supervisor? Bom, quando eu morava em Caxias, porque eu agora moro em Porto Alegre há doze, treze anos, que eu estou em Porto Alegre. Quando eu morava em Caxias eu tinha seis representantes, três de Caxias e três de Bento Gonçalves, da região, todos morando em Caxias. Então, eu reunia os seis toda sexta-feira na minha casa, toda sexta-feira lá. Tinha um salão embaixo que ficava cômodo para a pessoa fazer relatórios, contar um pouco de mentira, falar da semana, essas coisas. E tinha um lá que, muito meio doido, o Jorge, Jorginho, que ele, sabe, um período ele começou a chegar... um dia ele trazia queijo, pão e vinho, em outro dia ele chegou com um garrafão de whisky... Garrafão de whisky, imagina Whisky em garrafão, aquilo era uma porcaria. Queijo de porco, ele sempre vinha com alguma novidade. Todo mundo gostava muito, final da tarde, todo mundo com fome. Mas passados, assim, uns meses, dois meses, uns dois meses depois, um dia, o cara que tinha um armazém na frente de casa lá, um dia me disse assim: "Escuta, tchê..." Eu fui comprar uma coisa, ele: "Marco junto?" "Marca junto com o quê?" "Aqui com a tua conta." "Mas eu não tenho conta contigo. Eu não compro nada para marcar." "Não, mas o teu rapazinho, aquele gordinho, ele está marcando..." Eu olhei, estava tudo na minha conta. Queijo, pão, salame, vinho, whisky. Mas era uma época boa, porque daqueles representantes, três deles... eram três linhas, então eram dois de cada linha. Três deles por um bom período foram, assim, os melhores representantes da filial. E imagina, também... entra no clima.
P -
Um agrado.
R - É, entra no clima. Então, um deles ainda permanece na empresa até hoje.
P -
E a fase seguinte qual foi? Depois de supervisor, que hoje é chamado de gerente distrital, você se tornou gerente regional?
R - Gerente. Na época era gerente, gerente do Estado. Como gerente de Estado, então assumi uma linha, a linha Aché propriamente dita, porque na época era dividido entre Aché, Parke-Davis, Prodome e Novoterápica, ou Novoterápica e Prodome, que foi a última. E como eu estava na Prodome, assumi a gerência na divisão Aché. Na divisão Aché até tem uma história interessante, porque como a rotatividade era muito grande, eu acabei, a gente acabava entrevistando... os supervisores entrevistam, e a gente ajudava, tal, depois que ficava dois, três, quatro, então tinha que decidir. A gente, então, como gerente, tinha obrigação de ali bater o martelo, ajudar o supervisor a... qual é o mais qualificado. E com isso foi se tornando uma equipe, como eu fiquei muitos anos nessa divisão, foi se tornando uma equipe quase toda admitida por mim. Então, se você admite o representante, fatalmente, com a saída de um supervisor, você promove um representante que você contratou, você promove um supervisor. E depois de um período lá, eu tinha, então, 80 a 90% da equipe admitida por mim, o restante, os outros 10, 20%, totalmente do meu lado, e os três supervisores que me auxiliavam na condução de liderar essa equipe tinham sido contratados e treinados por mim. Então, isso é uma equipe que funciona por música. É difícil você ter uma equipe nessas condições. Muito difícil você, ao longo dos anos, manter essa equipe. Talvez seja uma história única de você ter, assim, essa equipe. E as lembranças são muito boas, porque praticamente 90% daquela época, coisa de dez anos atrás, estão aqui hoje. Estão aí. E dos supervisores da época, os três supervisores, dois hoje são gerentes regionais da empresa. Então, isso... não resta a menor dúvida que é um orgulho, você ter... Mas essa é uma fase. Porém, essa equipe, no momento que houve um concurso chamado “Viajandão”... Esse “Viajandão” era uma viagem, na época um prêmio muito bom, que esse prêmio era cinco mil dólares, o dólar na época era um por um. E ia ser essa viagem para o gerente que fosse o campeão Brasil. Como eram quatro linhas, cada gerente competia com a sua linha. Eu era gerente do Aché, competia somente com os gerentes do Aché do Brasil. E cada gerente sucessivamente. Mas o concurso era um concurso duro, era um concurso difícil, porque ele durou muitos meses, durou oito ou dez meses, foi um concurso demorado. E era sempre marcar pontos. Então, você... hoje tinha lá tantos produtos que estavam no concurso, esse produto você vendeu hoje 10 mil unidades, se você vender 11 mil unidades no mês seguinte você vendeu 10% a mais, então o que era feito? Era verificado todos os gerentes do Brasil, quanto por cento ele fez a mais de um mês para o outro. Esse gerente marcava... os três primeiros colocados marcavam pontos. Dez pontos, oito pontos, cinco pontos. Cada vez que a filial conseguia um crescimento, seja em produto, seja em venda versus cota, seja em venda em reais, os representantes ganhavam um prêmio de 10% em dinheiro. Isso era um estímulo muito grande. E o gerente, o representante e o supervisor ganhavam o prêmio em dinheiro. E o gerente marcava pontos para o seu concurso. Eu não lembro se o gerente também ganhava o prêmio de 10%. Mas que eu me fixei era que eu concorria ao prêmio. Essa equipe estava tão entrosada que só no primeiro mês eu fiquei em segundo lugar, quando eu acordei tinha um rapaz do Espírito Santo em primeiro. Ali foi uma briga terrível. Todos esses meses estimulando e tentando crescer, chega uma hora que você tem seus limites. Então, você tinha que jogar muito para marcar pontos, e a equipe se motivar. Então, nesse ponto eu devo muito a eles, porque evidentemente eles também tiveram que se empenhar. Moral da história foi que no final do ano conseguimos bater o primeiro lugar e ganhar o concurso. Isso evidentemente que eu pude optar. Dos quatro gerentes que ganharam o concurso, eu lembro perfeitamente que um foi para Disney, o outro foi para Cancun, e um terceiro lá do Rio de Janeiro, numa reunião em São Paulo, disse assim para mim: "Miot, vamos para a Europa?" Eu digo: "Você está louco" O máximo que eu saí do Rio Grande do Sul foi aqui em São Paulo. Nem Santa Catarina eu não conheço, que é do lado. "Não, vamos para lá." Acabamos fazendo a viagem para a Europa. Então, esse aí também tem histórias, fotos, filmagens, faz parte daquela equipe que até hoje está aí, é uma vencedora.
P -
Eu queria te perguntar sobre essas linhas que você citou, as várias aquisições. Cada aquisição nova do Aché era um desafio novo em relação à venda?
R - Ah, sim. O Aché é muito arrojado nesse ponto, é muito arrojado. Quando eu entrei na Companhia, entrei na ampliação da linha Parke-Davis. O Aché já tinha adquirido a Parke-Davis a nível Brasil, e estava ampliando. Eu entrei na ampliação, então já tinha a Novoterápica, que era a antiga Bracco-Novoterápica. Então cada aquisição dessa aí era um desafio muito grande, porque ela precisa, acredito, que a gente não sabe nos detalhes, mas ela precisa se pagar também. Ela tem que vender o suficiente. E essas linhas são muito importantes. Agora, um grande negócio do Aché foi com a linha da Prodome, da Merck Sharp & Dohme. Então, comprou na Merck Sharp & Dohme essa linha, formando-se a Prodome, também outro grande desafio. Então, cada linha... a história da empresa é uma história bastante interessante de comprando, de negociando, e todos têm que dar resultado. Você sabe que... eu lembro perfeitamente que em um período que o Novoterápica foi fechado. Por motivos que eu não lembro exatamente, o Novoterápica... a gente precisa dar um passo atrás para dar dois passos na frente amanhã. E por um motivo ou outro uma das linhas teve que ser fechada. Então, eu lembro perfeitamente que eu estava lá em casa com os seis, que era uma turma, era sensacional aquilo, quando o gerente de Porto Alegre me ligou, porque eu levava o telefone junto lá para baixo. Ligou e disse assim: "Você está sentado?" Eu digo: "Estou." Não estava sentado coisa nenhuma, estava de pé. "Você está sentado?" "Estou." "Não está. Senta." Sentei. "Fechou o Novoterápica. Você vai ter que demitir três representantes." Imagina a situação de cada setor, que eu tinha nove, tinha que demitir três, um de cada setor, porque fechou uma linha. Então, isso foi... Quer dizer, tem histórias aí, não é só de aquisições. Teve essa história de ter que fechar uma linha inteirinha. Claro que a gente não fechou a linha, saiu representante de várias linhas. Mas saiu esse pessoal. E um tempo depois, que eu não sei precisar quando, essa linha voltou novamente, aí com mais produtos, tal, ela acabou voltando novamente. Então, a gente passa por algumas. E esse pessoal que estava ali é um pessoal amigo. Você tinha que tirar, não tinha alternativa. E isso foi no Brasil inteiro, não foi só comigo. Mas você vê que... você perguntou de cada nova aquisição, é um desafio. E cada vez precisa tomar uma atitude também.
P -
Qual a característica que mais te agrada do Aché, mais marcante da empresa?
R - A característica mais marcante? Ah, essa força do Aché, não tenha dúvida. Eu apostei, o Aché apostou em mim, nós dois ganhamos. Eu ganhei, talvez mais até. Mas imagina hoje. Hoje, claro, o representante tem uma série de dificuldades muito maiores do que antigamente. Mas coisas que a gente... vender, cobrar, não existe mais. Claro, hoje você tem viatura locada zero quilômetros para você rodar, tem muita história. Então, o Aché é bastante arrojado. Apesar de todas as mudanças que ocorrem na empresa, sempre é uma empresa arrojada, que fica sempre a marca Aché. Independente de quem está comandando a marca ali, a marca Aché é muito forte. Essa talvez seja a maior característica.
P -
E para você, na sua trajetória, na tua vida, o que representa esse trabalho no Aché?
R - Praticamente uma coisa não se separa da outra. Porque... eu tinha te comentado anteriormente... Os meus filhos tinham lá um ou dois anos quando eu comecei. Hoje estão com dezenove, vinte. Então, praticamente faz parte da minha vida, assim como faz parte da vida de todos que estão aí, até dos mais novos também, eles também encaram da mesma forma. Claro, talvez a gente um pouco mais enraizado em função dos anos, mas essa é uma característica. Você não tem como separar mais. E sabe que a partir do momento que você trabalha 12, 13, 14 horas com uma empresa, seja a empresa que for, e um dia tem 24 horas. Se você tirar seis horas para dormir, te sobra pouco tempo para as outras coisas, ou para estudar ou para ler. Então, se você não gostar do que tu faz em 14 horas, você já começa não sendo uma pessoa feliz, porque boa parte do teu tempo está mal aproveitado. Então, o Aché é tudo isso, é você gostar também do que faz, independente de ser do Aché. Mas gostar. Gostando fica mais fácil.
P -
A nossa pergunta final é sobre essa experiência. O que você acha do Aché ter decidido contar a sua história?
R - Pois é. O Aché tem surpreendido não só a mim, mas a muitas pessoas esses últimos tempos. Então, o fato de se profissionalizar. Se profissionalizar contratando alguém, um profissional da área para contar a sua história é algo fantástico, porque nós vamos ver histórias aí de tudo quanto é tipo. Porque a gente ouve quando vai a São Paulo as histórias do Norte, do Nordeste, a gente houve história do pessoal que vai de avião, que volta de barco, que dorme em rede, que carrega as caixas. Todo Estado tem suas histórias, então... mas principalmente a maneira como está sendo montada a história. Então, o simples fato de contratar uma empresa especializada, profissionais dessa área, para contar a história, você observa por aí que as mudanças realmente são significativas. E isso vai ser bonito, de poder ver o todo, a história toda, que você vai colher informações por tudo quanto é lugar, né?
P -
Você queria dar mais algum relato, alguma coisa que você gostaria de completar?
R - Olha, praticamente já falamos bastante sobre esse assunto, e eu diria, assim, para você que esse ano de 2002, particularmente, é o que nos interessa hoje. Porque nós mudamos completamente, está mudado o Aché, mudou novamente, hoje extremamente profissionalizado, desde a sua direção geral ele está profissionalizado. Então, esse é um caminho que acredito que não tenha volta. Essa profissionalização que começa lá com a diretoria responsável, a diretoria geral, essa profissionalização. E 2002 vai ser um ano do crescimento, da maturidade, de crescer profissionalmente. Esse com toda a certeza é um ano que nós vamos ter que crescer, porque nós temos todas as armas, as ferramentas, as condições. E cada ano que passa as coisas vão ficando mais difíceis. O Ramo Farmacêutico está passando por momentos difíceis. E crescer é a nossa meta. Então, se eu te dissesse, assim, alguma coisa de pessoal minha é com relação à nova sistemática de trabalho para 2002, que é agora, com esse cargo de gerente regional que exerci uma época, mais ou menos o supervisor é a primeira vez que é chamado gerente distrital. Então, hoje tem uma outra... as atribuições são as mesmas, mas com outra responsabilidade, a responsabilidade agora de tocar para frente. Então, eu estou acreditando muito, muito, muito que 2002 a gente volte com uma nova... com a filosofia de treinamento de se profissionalizar. Isso é importante para quem tiver ouvindo, qualquer representante, saber que vai ser necessário. Muito bem.
P -
Muito obrigada pela participação.
R - Eu é que agradeço também poder participar. Obrigado.Recolher