Projeto Memórias do Comércio de Ribeirão Preto
Entrevista de Mariana Cardoso Furtado Silva - Elétrica Brechó
Entrevistada por Cláudia Leonor Oliveira e Luís Paulo Domingues
Ribeirão Preto, 18 de junho de 2021
Entrevista MC_HV055
Transcrita por Selma Paiva
Conferência por Ana Eliza Barreiro
(00:43) P1- Bom, Mariana, pra começar, eu gostaria que você dissesse o seu nome completo, a data de nascimento e o local que você nasceu.
R- Meu nome é Mariana Cardoso Furtado Silva. Nasci em primeiro de setembro de 1992. Eu nasci em São Paulo. São Paulo, capital. 00:43
(01:03) P1- Legal. Qual é o nome do seu pai e da sua mãe?
R- Herbert Furtado Silva, o nome do meu pai. O nome da minha mãe é Cremilda Maria Cardoso.
(01:13) P1- Legal. Você conhece, teve conhecimento, assim, dos seus avós? Você ainda tem os seus avós vivos?
R- Eu tenho os meus avós dos dois lados. É, né? Os meus vôs, né? Os meus vôs dos dois lados. E as minhas avós faleceram antes de eu nascer, as duas, né?
(01:35) P1- Ah, você não conheceu. Você quer dizer o nome delas, pra ficar gravado? Como história de vida é legal ter o nome dos avós.
R- Eu não sei. Eu não sei o nome das minhas avós.
(01:45) P1- Não conheceu, né? Está certo.
R- Não conheci. Elas faleceram muito antes da gente nascer, eu a minha irmã nascermos. Eu não sei nem o nome.
(01:52) P1- Não, mas tudo bem. Mariana, e você sabe o que os seus avós faziam, assim, profissionalmente?
R- Não.
(02:00) P1- Eles moravam em São Paulo, também? Como que era?
R- Não. Tanto o materno, quanto o paterno, são do interior de Minas Gerais. Mais da região norte. Patos de Minas, mais ou menos naquela região ali. E ambos moravam num contexto mais rural, não era urbano. Eles fizeram essa migração pra cidade quando eles foram pra Brasília. Ambas, também, as famílias, tanto do lado da mãe, quanto do lado do pai, fizeram essa migração nesse contexto aí, de inauguração de Brasília, né?
(02:33) P1- Brasília. Olha, uma aventura, né? E, Mariana, você sabe como o seu pai conheceu a sua mãe?
R- No trabalho. O meu pai trabalhava no Carrefour, em Brasília. A minha mãe também. E eles se conheceram lá.
(02:49) P1- Que legal. Você sabe se a sua família tem alguma ascendência de fora do Brasil, de afrodescendência ou de imigração, também?
R- Olha, de imigração, não que eu saiba. Do lado paterno é uma família negra, né, afrodescendente. Do lado da minha mãe, a minha mãe é branca. E ela tem uma ascendência acho que é portuguesa e indígena, se eu não me engano.
(03:22) P1- Sim. Você lembra, na infância, alguma tradição que venha dessa sua origem indígena ou afrodescendente? Alguma coisa de comida?
R- Ah, não.
(03:35) P1- Não? Não teve?
R- Não. Acho que, assim, tanto a cultura indígena, quanto a afro-brasileira, está muito presente na nossa cultura, como um todo, né? Mas assim, especificamente, num resgate mais focado, assim, nessas ambas etnias, eu acho que não. Mas permeia muito, né? Eu acho que é uma família bem brasileira, né? Permeia muito a nossa cultura, que é bastante, principalmente, indígena e negra, africana.
P1- Muito bom. Ô, Mariana, e como é eles foram parar em São Paulo? Você nasceu em São Paulo, né?
R- (03:54) Eu nasci em São Paulo. Por conta do trabalho do meu pai, eles se conheceram. Ambos são mineiros que se conheceram em Brasília. E, por conta do trabalho do meu pai, ele era bastante transferido. E a minha mãe ia junto. Ia todo mundo junto. Então, de Brasília, eles moraram em Goiânia, onde a minha irmã mais velha nasceu. De Goiânia, foi São Paulo, onde eu nasci. E daí a gente veio pra Ribeirão. E ainda o meu pai mudou pro Rio de Janeiro, morou em Niterói também. E depois também voltamos todo mundo, aqui pra Ribeirão. Mas foi por conta do trabalho, a gente foi fazendo um tour aí pelo Brasil.
P1- Legal. E a tua infância mais remota, assim, que você lembra, é São Paulo ou Ribeirão?
R- Eu lembro um pouquinho de São Paulo, que eu saí de lá, eu tinha uns quatro anos. Mas eu acho que grande parte, com certeza, é Ribeirão.
P1- Certo. E onde que você morava, quando você era criança, aí em Ribeirão? Que bairro que era? Você lembra da rua? Como era?
R- Eu moro no mesmo prédio de quando a gente mudou. (risos) A gente saiu de Ribeirão e voltou e voltou pro mesmo prédio. Então, eu mudei pra Ribeirão em 1996. Eu moro aqui na Campos Salles com a Barão de Amazonas, bem aqui no Centro de Ribeirão. Eu moro aqui desde que eu moro em Ribeirão. (05:11)
P1- Ai, que bom. Mariana, e como é que foi a sua infância aí em Ribeirão? O que você lembra? Você morava em prédio, né? Então não é casa.
R- É.
(05:43) P1- Onde que você brincava? Aonde que você ia, em Ribeirão?
R- Eu lembro, mas num contexto mais de escola, assim. De passar muito esse tempo na escola. Tanto o tempo do estudo, mas o contra-horário escolar também ser bastante na escola. Acho que, por conta de por mais que eu vinha de uma cidade grande, eu vim pra um contexto bem urbano, também: centro da cidade, prédio. Então, eu acho que não tinha tanto esse espaço da rua, né? Eu nunca morei em casa, não sei como é essa experiência. Então, eu acho que eu ficava bem ou no térreo, prédio, né, onde se reuniam as crianças lá embaixo, pra brincar. Ou nesse contexto da escola, mesmo, que a gente ficava, às vezes, o dia inteiro lá, fazendo atividades, esportes.
(06:21) P1- Certo. E vocês brincavam do quê? Você lembra das brincadeiras? Porque as brincadeiras mudam, né, ao longo das décadas. Do que você brincava, quando você era criança?
R- Olha, brincava de corda, de pular corda. Eu adorava. A gente brincava muito de pique-esconde. O que mais, gente? Jogo de tabuleiro. A gente gostava bastante, também, de jogo de tabuleiro. É, eu acho que era algo nesse sentido, assim.
(06:51) P1- Sei. Legal. E nos finais de semana, assim, os passeios, o que você lembra aí de Ribeirão? Que lugares o seu pai e a sua mãe te levavam? Onde que você passeava? O que você tem dessa memória, de passear em Ribeirão Preto? Onde são os lugares legais que você ia?
R- (07:11) Eu lembro, eu lembro bastante do Museu da Cana. Eu lembro que a gente tinha que tirar o sapato, colocava aquelas, tipo, pantufinhas. Eu lembro que era, assim, um super passeio. Eu adorava aquela experiência, então me marcou muito aqui em Ribeirão, esse passeio. De resto, eu acho assim: por conta dos meus pais morarem em muitas cidades, muitos finais de semana a gente ia, tipo, visitar família. O meu pai tem família em Uberaba. A gente acabava saindo de Ribeirão, bastante, assim, em férias, feriado, finais de semana, por conta de ter família em todos os lugares, visitar todo mundo. Mas eu lembro muito da gente passear em parque, andar de bicicleta. O meu pai levava a gente pra andar de bicicleta. E acho que sair pra comer, assim, no geral.
(08:00) P2- Onde vocês iam comer, Mariana?
R- Ah a gente ia bastante... (8:08).
P1- Onde que são os lugares legais?
R- Oi? Desculpa.
P2- Pode falar.
P1- É a mesma pergunta.
R- (08:16) Eu lembro de uma churrascaria que ficava ali na Presidente Vargas. Eu acho que ela chamava Porto Alegre. Era isso? A gente ia bastante lá. Eu acho que era isso, esse nome. Acho que é no mesmo lugar que tem aquela churrascaria, lá, só que daí foi mudando, mudando...
P2- Foi mudando o nome, mudando os nomes, os nomes das pessoas...
R- É. Mas era bem um programa de domingo, assim.
(08:44) P2- Mariana e, assim, esse trabalho do seu pai se consistia no quê? Você sabe?
R- O meu pai é administrador de empresa, né? Daí, no Carrefour ele trabalhava enquanto diretor de lojas, por isso as transferências também, né? Então, saía de dirigir uma loja em Ribeirão, ia dirigir no Rio, enfim, ia mudando. E agora o meu pai trabalho no Savegnago.
(09:06) P2- E, assim, era sempre na inauguração da loja? Ou era, assim, dentro de uma loja já estabelecida, assim? Como era esse trabalho?
R- Eram os dois. Acho que ele pegou mais, o perfil dele era mais de inaugurar, ou de reformar lojas. Mas ele já ficou também bastante tempo em lojas que não estava passando inauguração, nem reforma. Variava. Mas, normalmente, nas mudanças, era porque ia abrir uma nova loja, ou porque ia reformar alguma loja que já tinha.
(09:40) P1- Legal. Mariana, e na escola, o que você lembra? Você estudava aonde? Você ia a pé ou o teu pai te levava? As matérias que você gostava mais? O que você lembra da sua vida na escola?
(09:50) R- Eu estudei no COC, aqui em Ribeirão. Desde pequenininha também, desde que eu mudei pra cá. Ah, eu lembro de um contexto, assim, de pequenininha ainda, muito gostoso, assim. Sempre fui boa aluna, assim, sempre adorei estudar. Eu gostava bastante desse ambiente escolar, assim, no geral. Então, o COC, na época, tinha bastante atividades curriculares, né? Tanto quanto, sei lá inglês ou muito esporte, era uma área do COC que tinha muito investimento, na época. Então, eu lembro que eu gostava muito desse ambiente, assim, quando criança. Tanto da parte dos estudos tradicionais, assim, que eu sempre gostei e essa parte de esporte, que me interessava bastante.
(10:37) P1- Legal. E você tinha alguma matéria que já sugeria o que você ia escolher depois da escola? O trabalho de vocês é comércio, né? O que te sugeriu que você seria, a escola?
R- A escola? Deixa eu pensar. Eu sempre fui muito de Humanas, assim, uma negação pra Biológicas ou Exatas. (10:57) Eu sempre fui muito de Humanas. Eu acho que eu relaciono mais a isso, né? Então, eu acho que, no comércio, se a gente pensar, o contato interpessoal, essa visão de mundo que a gente tem que ter, que é muito importante, que traz História e Geografia, né? Com certeza eram as minhas matérias favoritas. Então, eu acho que, no nosso comércio específico, que é um brechó, um consumo consciente, essa visão crítica, então, com certeza, o que indicava na escola, era o meu fascínio, assim, por História e Geografia.
(11:36) P1- Certo. E quando terminou o segundo grau, você prestou vestibular? Você fez, pra alguma faculdade?
R- Fiz. Eu fiz Ufrj, a federal do Rio. Fiz Comunicação Social, com habilitação em Publicidade e Propaganda, lá.
(11:54) P1- Ah, sim. Em Ribeirão, antes de você ir pra faculdade, você não chegou a trabalhar?
R- Aqui em Ribeirão, não.
(12:03) P1- Onde foi seu primeiro trabalho (12:04)?
R- Já foi no Rio. Já foi no Rio, no contexto de faculdade, mesmo, estágio. E eu já comecei a trabalhar com marketing de moda, que é a área que eu ainda atuo, hoje, com brechó. Eu sempre quis atuar nessa área, assim.
(12:21) P1- Sim. Lá no Rio, o que você lembra, da sua época de faculdade e desse seu trabalho com marketing de moda? O que você pode contar pra gente, do Rio de Janeiro?
R- Ah, foi bem intensa, assim, a experiência de fazer faculdade lá, né? Eu saí de casa tão nova, eu tinha dezoito anos, dezoito pra dezenove. Mas foi muito bom. E uma cidade de dois lados, né? Então, tem aquelas partes maravilhosas, que a gente adora, da cultura, da natureza. Mas também é uma cidade muito difícil, muito cara, com uma mobilidade urbana muito difícil pra você se deslocar pela cidade. Então, acho que foi um choque de realidade, também, né, sair de Ribeirão. Porque eu falo que Ribeirão é uma cidade quase de brinquedo, assim, né? Tem (13:11) sempre uma paz, nada de mais acontece, uma tranquilidade, assim. E o Rio, aquele caos. Então, eu acho que, com certeza, foi aquele choque de realidade, que me ensinou bastante. Eu acho que em pouco tempo eu entrei nesse ritmo também, então, conciliar morar sozinha, com faculdade, com os estágios que vão chegando. Mas eu acho que você fica tão dentro dessa nova realidade, que você não percebe. Acho que hoje, eu olho pra trás, eu falo: “Gente! Como que alguém dá conta de fazer tudo isso? Que horas eu dormia?” (risos) Eu fico, assim, meio incrédula, assim, ver as coisas que acontecem. Eu acho que é a idade, a gente está no pique, está animada, quer descobrir. (13:52)Essa área da moda, especificamente, sempre foi um sonho, assim. Então, eu queria, eu tinha muita sede, assim. Tanto de aprender dentro da universidade, né, os caminhos. Então, pensar a moda enquanto ferramenta de comunicação. E também no comércio, no sentido da “hora do vamos ver”, né? Então, era muito interessante ver construindo junto essas duas experiências, né? A experiência realmente prática e a experiência acadêmica se construindo ali. Muita coisa não sendo da forma que eu imaginei. Todas essas aventuras de faculdade.
P1- Legal. Você lembra o que você fez com o seu primeiro salário do estágio, aí?
R- Nossa, eu tinha muita conta já pra pagar no Rio. (riso)
P1- Já tinha?
R- É. Eu não lembro. Acho que foi, acho que eu devo ter dado, assim, meio pro meu pai, né? Ou melhor, o meu pai descontou do dinheiro que ele me ajudava lá no Rio. Não foi pra nada especifico, especial, não. Boleto, mesmo.
P2- O que você gostava de comprar, Mariana, essa lista que você tinha com o seu pai?
R- De comprar?
(15:02) P2- É. De consumir, assim? O que era, nessa tua idade, assim, o que você...
R- Eu acho que nesse momento da faculdade lá no Rio, eram as contas, despesas, mesmo, de casa. E mais a vida cultural do Rio, né? Então, tem muita coisa, né? Teatro, exposição, saídas à noite. Eu acho que o meu gasto era mais de experiência do que como consumidora.
(15:25) P2- Consumir.
R- É. Naquela época.
P2- Era mais consumir cultura?
R- É. Aquela época e efervesce o Rio, né? Não tem como.
P2- Onde você gostava de ir, ali?
R- (15:35) Ai, o meu lugar favorito no Rio é a Lapa. Eu morei lá. E, meu Deus, assim. Pra mim, não tem lugar mais mágico, no Rio de Janeiro, assim. É muito. Eu tenho até uma tatuagem dos arcos da Lapa. Eu não sei se vai dar pra ver, aqui.
P2- Ai, que lindo!
R- Mas, com certeza, assim, eu acho que é o lugar que mudou a minha vida, assim, no Rio. Porque não faz parte da zona sul do Rio, que é um contexto também bem novela, né? Que não é real.
P2- Novela da Globo, né?
R- Exatamente. (16:10) Então, é uma ponte, ali, no Centro da cidade, a Lapa, que ela mixa muita gente. Você conhece o mundo inteiro, né, porque é um ponto turístico também, muito forte. Eu acho que é de um crescimento, assim, você sai da sua bolha, total. E vê outras pessoas e conhece outras realidades, você aprende muito, assim. Então, eu acho um lugar muito especial do Rio de Janeiro.
P1- Legal. E, durante a faculdade, você já tinha, assim, em mente, que você poderia trabalhar nesse seu ramo aí de brechó? Ou foi depois?
R- Sim. De brechó, não. Mas trabalhar com moda em geral, era o sonho, assim. Eu já queria muito trabalhar com essa área, assim. Então, quando eu pesquisei os primeiros estágios, pra onde eu mandava currículo, era sempre focando nessa área, com certeza.
(17:07) P1- Legal. E depois, acabou a faculdade, você resolveu voltar pra Ribeirão? Como foi essa decisão da volta, né?
R- Então, como eu já adiantei um pouquinho, né, (17:21) o Rio é uma cidade difícil. Então, assim, pra mim foi muito natural a volta, no sentido de que depois dos meus quatro anos lá, a cada ano que passava, eu falava: “Gente, não é normal essa realidade”. O dinheiro não dá, tipo: pra você ter um mínimo de qualidade de vida lá, você tem que ganhar muito, assim, é muito desproporcional as coisas, né? E eu via, eu tenho acho que essa sensação que, dentro dessa classe média aqui em Ribeirão, dos meus amigos, muitos, a gente vai fazer universidade fora, né? Então, eu tinha outros amigos, de outras realidades, em outras cidades e eu via a diferença do dia a dia deles pro meu, sabe? E eu acho que eu decidi muito nova ainda que, tipo, eu não queria fazer parte dessas grandes cidades e desse caos, onde a gente se mata de trabalhar pra ter o mínimo, né? E eu queria viver uma vida um pouco mais equilibrada, com um pouco mais de calma, assim. Onde o meu dinheiro valesse, onde eu tivesse um serviço de qualidade, uma boa infraestrutura, é lógico. E Ribeirão é esse lugar, né? É uma cidade que tem defeitos e qualidades. Mas é esse lugar, que a gente consegue ter uma ótima estrutura, sem estar nesses grandes centros, como essas super capitais, né?
(18:41) P1- Sim. Mariana, e aí? Você voltou pra Ribeirão e aí você já conheceu a Esther? Ou como foi esse encontro, pra vocês montarem a loja? Ou você trabalhou com alguma coisa antes de montarem?
R- Então, no Rio eu fiz esses estágios, né, em marketing de moda. Volto pra Ribeirão, realmente, sem nada de bom (19:04). O meu foco era sair do Rio, a princípio. (19:08)E aí, voltando pra cá, eu fiquei, acho que quase um ano procurando algo nessa área de moda. Mas especificamente aqui em Ribeirão, essa área é muito difícil. De fato, é uma área que tem mais efervescência, assim, nas capitais, né? E por conta também, acho que principalmente de questões raciais, assim, foi muito complicado ter uma abertura nesse nicho específico da moda, que é muito elitista, que é um ambiente racista, né? Então, mesmo com a preparação que eu tinha, que era exigida, muitas vezes, pros cargos, como inglês fluente, uma boa universidade etc, eu via, às vezes, pessoas não tão capacitadas, assumindo esses cargos. E foi uma época bem complicada, mesmo, assim, meio de choque de realidade, né? Porque a gente escuta muito que, se a gente fizer tudo certinho, as coisas vão dão certo, né? Então: “Se você estudar, se você se formar, se você se preparar”. E não é bem assim, né? Eu acho que o racismo estrutural e até o machismo perpassam essas ideias de que, se a gente se esforçar, a gente consegue. Então, eu acho que, pra mim, foi ali o maior choque de realidade que eu tive, quando eu me formei, que é aquela sensação de tipo: “Pronto. Eu cumpri tudo o que me falaram que eu deveria cumprir, pra eu alcançar certos lugares” e eu vi que outras coisas impediam o meu acesso. Então, eu fazia bastante entrevista em São Paulo. Aqui em Ribeirão foram poucas. Eu cheguei a fazer um mini estágio de férias numa agência aqui em Ribeirão. Eu esqueci o nome, ela era bem grandinha, na época. A W3. NW3? É isso, né? E aí fiquei nisso quase um ano, assim, sem nem... [incompreensível] (21:07): "Ah. O ano que vem. Vamos. Vamos ver. Vamos ver”. E nisso, eu conhecia a Esther já da época do colegial. A gente se conheceu um ou dois anos antes, no máximo, de eu mudar pro Rio. Até quando eu morei no Rio, a Esther chegou a ir na minha casa algumas vezes e tal. Voltando pra Ribeirão, que a gente se encontrou; eu acho que num evento. A gente estava um pouquinho afastada, assim. E a gente retomou essa amizade, fomos conversando. A Sté também foi entendendo que momento eu estava, aqui em Ribeirão, né? E aí foi a Sté mesmo que trouxe essa ideia da gente empreender, da gente abrir um brechó. Que eu acho que eu trago esse lado mais de marketing de moda, mas a paixão específica por brechó vem muito da Sté.
(21:58) P1- Legal. E, Mariana, quais foram os primeiros passos, assim? Vocês decidiram, então, o ramo de negócios que vocês teriam, né? O que vocês precisaram fazer primeiro? Começar a arrumar roupa, né? Ir atrás, né? Como foi o pontapé inicial?
R- Eu acho assim: (22:17) enquanto publicitária, a gente cuidou bastante do branding da marca, antes mesmo de ter roupa. Então, a gente já sentou pra fazer o processo de naming, de escolha do nome. A gente contactou um amigo meu do Rio, que era designer, pra fazer a nossa identidade visual. Então, acho que antes da gente estruturar o negócio, de ter a matéria-prima do brechó, né, a gente já tinha essa parte aí do marketing, do branding, mais estruturada. Acho que, com certeza, esse foi o nosso primeiro passo. Mas o segundo foi garimpar essas peças. O resto, a gente foi entendendo no caminho. Mas de sólido, a gente tinha essa parte do branding, o que a gente queria ser enquanto brechó, o que a gente queria ser enquanto uma empresa. Os nossos valores, nossos ideais, sempre foram muito fortes. E a outra parte muito forte, que estava solidificada desde o começo, é o nosso garimpo, a nossa curadoria, né, a nossa seleção das peças, o que a gente escolhe pra vender no nosso brechó, assim. Acho que todo o resto foi no caminho, foi errando. Tem coisa que só agora, a gente está, realmente, entendendo como fazer.
(23:37) P2- Mas, assim, Mariana, por que um brechó?
R- Na época, foi por ser acessível empreender com brechó. No sentido de, tipo assim: o seu primeiro investimento pra você ter algumas peças, né, pra você começar as suas vendas, não é alto. Diferente da gente comprar peças novas ou mandar fazer algumas peças. Então, ele era possível naquele contexto onde eu não tinha emprego, onde eu não tinha nenhum dinheiro guardado. (24:09) Então, tipo, dava pra iniciar o brechó com pouco. E o on line também, além disso, a gente não teria custo. Desde o começo, a gente trabalha aqui na casa da minha mãe. Então, assim, o preço muito baixo, assim, desse primeiro investimento, com certeza foi o que fez ser possível. Mas a ideia do brechó vem muito dessa paixão da Sté por brechós e da minha vontade, que sempre existiu, de trabalhar com moda. Então, assim, acho que a gente juntou tudo isso nessa ideia.
(24:43) P2- E como é que vieram as primeiras peças?
R- Você lembra?
R2- Foi lá no Mercatudo, a primeira compra.
R1- Foi num brechó muito clássico aqui de Ribeirão, que a gente chama... existem categorias de brechó, né? Daí tem uns que a gente chama de brechó bagunça que, normalmente, é onde a gente garimpa as peças pros nossos. Que são esses brechós...
(25:01) P2- Brechó o quê?
R- Bagunça.
P2- Bagunça?
R- É. São esses que não estão... que é roupa pra todo lugar, que nem o próprio dono sabe o que tem ali, de tanta peça, né? Então, a gente visitou um aqui no Centro, que chama Brechó Mercatudo. Bem clássico, aqui. Quem ama brechó, conhece bastante esse brechó do Centro. E acho que ali foi onde a gente comprou as nossas primeiras peças, que a gente ia revender.
(25:31) P2- E como é isso? Tem que garimpar, escolher, ver o que... como é? Eu não tenho ideia.
R- (riso) (25:37) Então, como eu disse, são muitas categorias de brechó, né? O brechó bagunça, normalmente, ele recebe, ele compra também de outros lugares, mas ele recebe muita doação; ele não tem uma curadoria. O que diferencia o nosso tipo de brechó é a curadoria, né? Que a galera chama mais de um brechó mais brechó on line, brechó gourmet, que é um brechó que vai ter essa seleção, ele vai ter esse conhecimento, esse valor agregado, da curadora de estilo, né? Então, isso que vai diferenciar. E tem muita gente que compra de outros clientes. Não é muito o nosso perfil. A gente pega algumas peças, de vez em quando. Mas o grosso, mesmo, a gente gosta de garimpar, tanto nesses brechós-bagunças, ou em bazares. Esses clássicos bazares de igrejas são os nossos favoritos. A gente prefere adquirir, nesses bazares ou brechós, porque a gente gosta, é mais fácil de achar peça vintage legal, que a gente gosta bastante. E também porque ele não te limita ao estilo do guarda-roupa do seu cliente. Então, ele vai ter muitos estilos diferentes, muitas opções de tamanho. Porque, às vezes, a gente vai comprar de um cliente, se o cliente veste P, tudo o que ele tem pra vender pra gente é P. Então, a gente gosta mais dos bazares e dos brechós, por essa pluralidade que ele dá pra gente em relação tanto a estilos diferentes, tanto a peças vintages e tamanho, principalmente, pra gente sempre ter uma grade legal, aqui no brechó.
(27:12) P1- Sim. Ô, Mariana, o brechó... não sei, eu sou leigo nesse assunto, mas teria a vantagem de que você não precisa seguir a tendência da moda do momento, né? Você acabou de falar das peças vintages, né? Então, qualquer coisa que remeta aos anos sessenta, setenta, também vale, né? O pessoal procura por isso.
R- É.
(27:33) P1- Ou você, como profissional da moda, procura adequar ao que está na moda no momento? Como que é?
R- Então, isso vai variar dentro da curadoria de cada brechó. Tem brechó que gosta de estar mais de acordo com a moda atual. Então, está usando mais jeans rasgado, então ele vai fazer essa curadoria, essa busca por essas peças. Tem esse estilo de brechó. (27:59) A gente tenta mais um equilíbrio entre o que é tendência no momento e a curadoria do que a gente acha que é bonito, independente da tendência atual. A gente acaba ficando mais nesse lado de coisas mais atemporais, que a gente acredita que não sai de moda, né? Tem muitas categorias de estampa, de modelagem, que a gente acha que é atemporal. E a gente gosta bastante dessa área, de não ficar presa a alguma moda muito específica do momento.
(28:32) P2- Agora, tem, assim, alguma coisa, assim, de marcas famosas, reconhecidas, assim: “Nossa, eu fui na igreja, lá no bazar da igreja, achei uma Gucci”, sabe, assim? Alguma coisa, assim, que você fala: “Uuulll”?
R- Existe. Existe bastante. Existem brechós que só focam nisso, só em grifes, né? Brechó de grifes. Mas existe, às vezes, cai na nossa mão também alguns super achados desses, assim. É comum, até. (29:02) Às vezes, um lenço que está lá por dois reais no bazar da igreja e é um lenço Chanel. Acontece. Acontece bastante isso, assim. Porque nos brechós que não têm curadoria, igual a gente falou, esses bagunças, bazar, as pessoas que estão manuseando aquelas peças, não têm muita leitura de moda ou conhecimento de moda. Então, às vezes, elas nem sabem quais são essas marcas famosas, o que é, o que não é, o que vale mais, o que vale menos. Muitas das vezes, eles não sabem, não é o modelo de negócio deles. Por isso que é capaz de a gente achar esses tesouros nos nossos garimpos, porque não passa por um processo de curadoria dos donos desses lugares ou das pessoas que organizam esses bazares.
(29:52) P1- Certo. E é unissex? Vocês vendem pra homem e pra mulher?
R- É. O nosso é unissex. (29:57) Na verdade, a gente defende que não existe gênero pra roupa, né? Roupa é tecido, não é gênero. Mas a gente entende que a gente, que as pessoas olham por essa modelagem das lojas, né, que é dividida entre feminino e masculino. Então, pensando nessa padronagem que existe, né, a gente tem mais peças femininas. Mas a gente sempre tenta garimpar tudo o que a gente gosta. Independente se ele se encaixa numa moda feminina, devido o padrão dizer feminino ou masculino, a gente garimpa peças que a gente gosta. E a gente tenta muito incentivar os nossos clientes a verem as peças assim, né? Então, às vezes, tem uma menina que fala: “Ah, mas essa camisa não é masculina?” A gente fala: “Não. Experimenta. Vê como fica no seu corpo”. E mesma coisa com os meninos: “Ah, mas essa camisa não é assim, não é assado?” e a gente tenta sempre incentivar, pra gente ver além da peça, ou melhor, pra gente enxergar a peça, né? E não enxergar as convenções sociais que estão na frente dela, tampando o potencial daquela peça, né?
(31:08) P1- Sim. Legal. E o que vocês vendem mais? O que é campeão de vendas, pra vocês? Ou não tem, vocês vendem de tudo? O que o pessoal mais procura, assim?
R- (31:20) É camisa. A gente não vende mais, porque é um garimpo que vem ficando difícil de achar: jaqueta jeans, macacão jeans vintage, são peças que a galera é enlouquecida, assim. E acho que, por conta desse crescimento dos brechós, cada vez é mais difícil a gente achar essas peças nos garimpos. Mas com certeza é o que a galera mais procura: camisa vintage e essas peças jeans bem, bem old school, assim, também.
(31:52) P2- Caracteriza pra gente o que seria uma peça vintage.
R- Ah, tá. Vintage, a gente até tem um “vidinho” no Instagram, que a gente fez explicando. (32:00) O vintage é uma peça que tem, no mínimo, uns vinte anos de idade. E a gente consegue reconhecer isso, quando a peça tem a etiqueta, né, aquelas etiquetas de informação, a gente consegue reconhecer pelo número do CGC. O CGC é o antigo Cnpj. Mudou pro código Cnpj faz vinte anos. Então, a gente sabe que tudo o que tem CGC e não tem Cnpj tem, no mínimo, vinte anos. Então, o vintage, de fato, é uma peça que é de outra época. É diferente do retrô. O retrô pode ser uma peça fabricada agora, mas que ele tem um estilo de uma outra época. Só o estilo, mas ele é atual, foi fabricado agora e tudo o mais. Agora, o vintage não. O vintage, de fato, pertence à outra época, foi fabricado em outra época e a gente coloca mais ou menos essa idade de, no mínimo, vinte anos. Então, às vezes, assim, se vocês tiverem a curiosidade, tipo: “Ah, eu tenho uma peça bem antiga”, ou que foi de alguém da família, dá uma olhada que, normalmente, tem a etiquetinha lá, CGC, que é o antigo Cnpj.
(33:08) P2- Ótimo.
P1- Muito bom.
(33:14) P2- E gente que se veste assim, que você fala, assim: “Essa pessoa usa roupa de brechó”, sabe, assim? Tem gente que, assim...
R- Essa carinha? (33:21).
(33:21) P2- É. O jeito, o estilo.
(33:23) P1- Que você vê na rua.
R- Ah, tem. Ah, tem. (risos) (33:27) Normalmente, são camisas e peças jeans que vão denunciar esse look, assim. Acho que o mix de estampas também. Usar tons terrosos, é algo que a gente acha muito em brechó, também. Mas acho que é necessário um brechozeiro, pra reconhecer outro.
(33:46) P2- É?
R- Eu acho difícil, quem não é muito do meio de brechó, reconhecer. Mas assim, quem é de brechó consegue ver, falar: “Não. Essa pessoa ama brechó. Está vestindo brechó”.
(34:00) P2- Entendi.
(34:01) P1- Mariana, e qual é o perfil dos consumidores da loja? Quem compra de vocês, mais, assim?
R- (34:10) Grande parte são mulheres. E mais ou menos na nossa faixa etária, minha e da Sté, também. Então, é mais ou menos uns vinte, vinte e quatro, vinte e cinco até uns trinta e cinco. É o grosso, né? Mas tem mulheres mais velhas, tem jovens novíssimos que também consomem. Mas a grande maioria...
R2- [fala terceiro- incompreensível]
R- Ah, é. É porque (34:38) dentro do nosso brechó, a gente tem as peças de brechó e tem também uma linha de camisetas, que chama Revolts. A Revolts já tem um outro público, essa galera mais jovem também, uma galera mais crítica. São camisetas estampadas com frases de teor político, racial. Então, é também, a gente tem um público masculino também muito grande, dentro da Revolts. Agora, as peças de brechó mesmo é mais feminino que a gente atende.
(35:10) P2- E como é que surgiu a ideia da Revolts?
R- (riso) (35:14) A Revolts nasce de um problema que surgiu das nossas peças de brechó. A gente garimpava algumas camisetas, camiseta lisa mesmo, em ótimo estado. E a gente achava, tipo: “Ah, superlegal, baratinha, a galera vai querer comprar”. Só que essas camisetas começaram a ficar encalhadas. Não vendia, não saía por nada. E daí a gente reuniu algumas e falou: “Gente, vamos fazer alguma coisa pra elas venderem? Vamos estampá-las, dar uma outra cara aí, pra gente fazer algo com elas”. Porque, pra gente, enquanto é um consumo sustentável, a gente não imaginava a ideia, também, de a gente simplesmente se desfazer dessas peças, né? Às vezes elas retornam, nem pros brechós, elas viram um lixo, né, um lixo têxtil. Então, a gente tem essa preocupação do descarte. Então, como a gente não queria simplesmente descartá-las e elas não vendiam por nada, ficaram super encalhadas, a gente decidiu fazer uma coleção chamada Revolts, que a gente escolheu, na época, quatro frases e estampou essas camisetas de brechó, com as frases. Inclusive, eu estou usando uma da primeira coleção aqui, que é “Leiam mulheres negras”, que é dessa primeira leva das Revolts que a gente fez. E foi, assim, um grande sucesso, que hoje, até, a gente tem tanto de camiseta de brechó, quanto de camisetas novas, porque a gente teve que ampliar essa linha, porque a galera ama muito.
(36:54) P1- Legal.
(36:54) P2- Que tipo de frases tem, assim, Mariana?
R- (36:56) A gente tem frases de cunho racial, social, político. Então, a gente tem: “Leiam mulheres negras”. A gente tem: “Ele não é meu presidente”. A gente tem: “Descolonizar”. O que mais, amiga? “Sai, hetero”.
R2- “Liberdade é não ter medo!”
R- “Liberdade é não ter medo”, que é uma frase da Nina Simone.
(37:18) P2- Qual a frase?
R- (37:19) “Liberdade é não ter medo”.
(37:20) P2- Ai, que lindo. E aí está assinado: Nina Simone?
R- Não. No da Nina não está. Mas a gente coloca na nossa comunicação, explica.
(37:28) P2- Tá.
R- (37:31) Tem “Autocuidado é resistência”. “O capitalismo desequilibra meus chacras”. Tudo nessa linha. Meio divertido, meio sério. A gente gosta de fazer esse mix, assim. A galera ama.
(37:47) P2- Vocês que criam essas frases?
R- A gente que cria. Ou a gente reproduz algo que a gente já ouviu alguém comentando.
(37:58) P2- Genial, a ideia.
(38:00) P1- Ô, Mariana, e como é que vocês... gira tudo em cima de rede social, né? Como é que vocês fazem propaganda? É o seu negócio, né? Você é formada nesse ramo. Mas o que dinamiza mesmo, as vendas? Como é que vocês fazem?
R- (38:19) Ah, é o ditado, né? “Casa de ferreiro...”. Foi complicado, viu, assim. A gente é muito tímida. E a gente odiava ter que aparecer, né? Então, é diferente quando, sei lá, se eu pego a conta de uma marca e tal, eu vou falar pra pessoa: “Você tem que aparecer. Você tem que se mostrar”. Mas aí, quando é comigo, eu não quero. Então, a gente ficou muitos anos assim. Acho que foi mais a nossa rede mesmo de consumidores que ajudavam mais a gente, compartilhando, comentando. E eu acho que desse ano - esse ano foi muito decisivo pra gente - pra cá, a gente resolveu tirar a vergonha de cena e realmente mostrar a nossa cara e falar mais, explicar. E mostrar quem somos, qual é a nossa história. Então, com certeza, a partir desse ano, mudou muito. Mas acho que o que segurou e até ajudou a gente a crescer, até a gente conseguir chegar nesse ponto, hoje, foi o trabalho da Sté, de fotografia. Eu sou publicitária e a Sté é fotógrafa. Então, é uma área que a gente entregava um trabalho muito bom mesmo, mesmo a gente sendo muito pequeno. (39:35) Mesmo a gente não tendo grana nenhuma, a gente conseguia entregar um trabalho de fotografia de moda muito bonito, muito moderno, muito atual. Uma qualidade excelente. Então, eu acho que, com certeza, foi esse trabalho da Sté, de fotografia, que conseguiu segurar, até a gente perder a vergonha de estar ativa nas redes sociais, estar falando sobre os nossos trabalhos, os nossos processos criativos, os nossos bastidores. (40:05) Então, eu acho que, com certeza, em termos de publicidade, no primeiro momento, foi a qualidade do nosso trabalho fotográfico, assim, dos modelos. A gente sempre tinha uma premissa de chamar modelos diversos. Então, no mínimo, a maioria era modelos negros, de corpos reais, que a gente chama. Então, não era só todo mundo magro, PP, né? Então, tinha modelos plus size. Toda essa diversidade, eu acho que chamou muito atenção, nessa época de crescimento do Elétrica, que a galera conheceu a gente. E se encantavam, eu acho que a princípio, por esse nosso trabalho de fotos, de imagem de moda.
(40:41) P2- Ô, Mariana, e como você chegou, assim, na sua mãe, falou assim: “Oi, eu vou montar um negócio na sua casa”? (risos)
R- (40:50) Eu acho que até hoje, assim, quatro anos de Elétrica e ainda é complicado, assim. Os meus pais não são os maiores fãs, assim, com certeza. Mas acho que eles viram que não dava pra lutar contra o inevitável. Foram deixando, foram deixando. Hoje, assim, o espaço que a gente está aqui, era uma sala de TV que foi desfeita. A gente foi aos poucos. Passo de formiguinha, sabe? Na hora que você vê, você...
P2- Como começou, então?
R- Como começou?
(41:22) P2- No seu quarto?
R- Não. Você lembra?
R2- A gente ficava mais em casa.
R- (41:25) Ah, é, a princípio, a gente ficava mais na casa da Sté. E daí a gente foi vindo pra cá, foi vindo pra cá. E agora não tem volta, assim. (risos) Eu acho que foi na força da insistência que a gente conseguiu ganhar, assim, esse espaço.
(41:43) P2- Mas o pessoal vai provar? Ou a venda é toda on line?
R- (41:50) Então, antes da pandemia, de vez em quando, assim, os clientes mais próximos, a gente até agendava aqui pra eles provarem. Mas a gente fazia muita feira também, que era, com certeza, nosso maior canal de troca com os clientes. Então, era um espaço onde eles conseguiam pegar em todas as peças, experimentar. Então, a feira era, pra gente, um ponto crucial, né? E daí, com a vinda da pandemia, a gente começou a intensificar algo que a gente já fazia, que era levar pros clientes experimentarem nas suas próprias casas.
(42:20) P2- Ah, tá.
R- É. E daí, sem custo. A pessoa só paga taxa de entrega, se ela for ficar com alguma peça. (42:26) Então, a gente já oferecia isso antes, mas acabava não rolando tanto, porque a galera tinha a oportunidade de ir na feira, né? E aí, com a pandemia, a gente intensificou mais isso com os clientes que precisam experimentar. Eles escolhem as peças, a gente leva. Eles experimentam com calma. Funciona bem legal, assim, de uma maneira muito boa. Mas a nossa venda on line também é bem tranquila. Porque a gente coloca todas as medidas das peças, a descrição mais detalhada possível, pros clientes conseguirem fazer a compra mais segura que dá pra se fazer, on line, né? (43:03) A gente grava vídeos, tira fotos, descreve as peças, medidas. Então, a gente também não tem grandes problemas, assim, de troca, da pessoa não ter gostado, não era o que ela imaginou. Porque a gente explica bem direitinho antes.
R2- E as fotos disso (43:18).
R- É. E as fotos também, né? Antes da pandemia, a gente fazia as peças, ou melhor, fotografava as peças com modelos que eram do tamanho das próprias peças, pra não ter que ajustar. Então, às vezes, senão a gente tem uma calça G, tira na modelo P e, enfim, fica essa confusão se serve ou se não serve, né? Então, a gente sempre tentava ter os modelos com os tamanhos reais das peças. (43:45) Agora, que só eu e a Sté, a gente virou as modelos, por conta da pandemia, a gente teve que virar, além de tudo, modelo também, então a gente também tenta fazer isso, né? Se a pessoa falou assim: “Ah, o meu corpo é parecido com a da Mari. Mari, experimenta pra mim, por favor, pra ver como fica em você?” ou: “O meu corpo é mais parecido com a Sté”. A gente tenta facilitar, assim, da melhor forma, pra pessoa que não consegue experimentar as nossas peças, ter uma experiência de tipo: “Não. Isso vai servir” ou “isso não vai servir”.
(44:18) P1- E qual é a rede social mais interessante pra vocês fazerem a divulgação? É Face? Instagram? Diretamente no Whats? Quais são as melhores?
R- (44:30) Ó, quando a gente começou, era o Facebook e o Instagram. Hoje, com certeza, o nosso principal é o Instagram e a segunda é o Whatsapp. O Whatsapp virou um canal de vendas pra gente, tipo, indispensável, com certeza, assim. E acho que dá essa relação de proximidade com o cliente, né? Onde ele se sente à vontade pra perguntar mais coisa: “Qual tamanho? Como é essa cor? Qual é esse tecido?”. Então, é um canal bem próximo, assim, com o cliente. Mas, com certeza, o Instagram é a nossa grande plataforma, é por lá que a gente faz lançamentos, que a gente comunica promoções, divulga os produtos. A gente tem o nosso site, né? Mas normalmente a gente tem esse primeiro contato através do Instagram e do Whatsapp, daí a gente encaminha o cliente pro site, tipo: “Você pode finalizar a sua compra aqui no link” ou "Entra no site, pra você ver mais modelos”. Mas, normalmente, os primeiros contatos se concentram no Instagram e no Whatsapp.
(45:30) P2- No Whatsapp, como vocês fazem? Vocês fazem aquela lista que dispara para uma série de pessoas? Como é que você opera, assim, esse cotidiano? É a sua área, né, Mariana?
R- (45:43) É. Olha, o Whatsapp, assim, ainda faltam ferramentas pro uso profissional do Whatsapp. Tem muita melhor... a gente vê tantos aplicativos, né, que já se adaptaram pra ser uma plataforma de vendas, eu acho que o Whatsapp ainda está atrás. A gente já tentou de tudo, a lista de transição, inclusive, mas é muito difícil a lista porque, se a pessoa não tem o seu contato salvo no celular dela, ela não recebe a lista. Então, assim, ficava furos ali, né? E pra ficar tendo controle também, de qual cliente você já adicionou na lista, cliente novo, era bem difícil. Então, a gente faz da maneira mais simples, talvez trabalhosa, mas que nos garante que todos vão receber a nossa mensagem que é, de fato, ir encaminhando a mensagem. Só que o Whatsapp tem um limite de cinco encaminhamentos, né? Então, a gente vai de cinco em cinco, de cinco em cinco, de cinco em cinco. Mas, assim, a gente já tentou outras coisas. E os próprios clientes falam pra gente que preferem dessa forma, que funciona melhor dessa forma. Porque, senão, nem todo mundo recebe, é gente que troca o número do celular, não recebe mais. Então, dessa forma é a mais garantida que ninguém vai perder nenhuma mensagem e a gente consegue controlar clientes novos de uma forma mais organizada. (47:01) Então, a gente faz no braço mesmo, o famoso braço. Mas estamos, assim, ansiosas pro momento onde ou o Whatsapp ou alguma outra plataforma vai lançar uma maneira mais dinâmica, né, da gente conseguir trocar essas mensagens com os clientes, por Whats.
(47:16) P1- Sim. E pro negócio de vocês, vocês nunca pensaram em fazer uma mídia, uma propaganda mais tradicional? Tipo folheto, outdoor, talvez uma propaganda na rádio?
R- (47:32) A gente nunca pensou. (47:34) O on line sempre foi o nosso foco. Quando a gente pensa em mídias pagas, elas são on lines também. Pensar em entrar como pago no Instagram, ou até pro site, né, o SEO do Google. Então, sempre os nossos esforços e o nosso foco é pro on line, que é onde está o nosso público, assim, em massa. Eu acho que a gente tem amigos que não escutam rádio. E até num contexto, se a gente pensar, de pandemia também, a mídia física cai muito, né? Quem está saindo? Quem está nos lugares? Quem vai ver o outdoor? Quem sai na rua pra ver o outdoor? Então, o nosso público é um público cem por cento conectado e com certeza é onde vão todos os nossos esforços, que a gente consegue encontrá-los ali, on line e eles encontrarem a gente, também, de uma forma muito mais fácil, né?
(48:26) P1- Certo. E depois que vocês fazem a venda, você fez uma venda, agora, vamos dizer assim. Aí você tem que pegar e entregar na casa do cliente? Ou ele vem buscar? Como que é?
R- (48:38) Então, a gente tem três opções, né? Se for fora de Ribeirão, a gente usa a plataforma Melhor Envio, que a gente manda ou pelo correio ou por transportadora, está funcionando muito bem pra gente. E aqui em Ribeirão, são duas opções: ou a pessoa vem pegar aqui na portaria do prédio, ou a gente leva pra ela, com uma taxinha de entrega. Então, ela tem essas duas opções. E como a Elétrica fica na casa da minha mãe, que é aqui no Centro, é uma rota muito estratégica, assim, pra gente. Então, assim, normalmente as pessoas falam assim: “Ah, não. Eu vou ter que ir no Centro amanhã, eu já passo aí na portaria e pego”. Mas também, quando a gente se organiza pra fazer, quando as pessoas preferem que a gente entregue lá, também é supertranquilo. Normalmente, a gente organiza um dia da semana e vai, faz uma rota e a Sté que dirige. A gente vai no carro e faz a entrega de todo mundo, assim, que a gente... (49:30). E a gente cobra o mesmo valor pra qualquer lugar de Ribeirão, né?
(49:36) P1- Ô, Mariana, antes que eu me esqueça, eu não posso esquecer de perguntar isso: por que vocês escolheram esse nome, “Elétrica”?
R- (riso) (49:46) Então, né, a publicitária chata, recém-formada na época, né? Então, eu estava com tudo muito fresco na minha cabeça, sobre os processos de construção de marca, né? E o naming era um deles. Então, a gente fez um processo bem clássico, que quem for um pouquinho dessa área, conhece, que vai jogando nomes que você acha que tenha a ver com a ideia do que você quer com o brechó. E você vai fazendo uma grande lista de nomes, né? Então, o nosso brechó tem a ver com consumo consciente, com empoderamento feminino. Você vai colocando todas essas palavras e aí você vai fazendo um filtro. Então, você tem vinte? Você reduz pra dez. Das dez você seleciona cinco, até você achar uma palavra principal. Essa é uma ferramenta muito comum, que a galera usa. E a nossa palavra principal ficou “empoderamento”(50:38). Aí, dela, a gente foi, mergulhamos nessa palavra, ali que ia estar o nosso nome, né? Então, de “empoderamento” a gente foi pra “força”. A gente foi pra “luz”, daí de “luz” a gente foi pra “eletricidade”. Era importante pra gente que fosse um nome no feminino. Então, a gente foi construindo esse caminho, que sai da palavra empoderamento e que ele cai na “elétrica", nesse sentido da energia, da força, do movimento. E de ser uma palavra feminina, já que é um empreendimento feminino. Mas assim, especificamente, o “Elétrica” sai do grupo semântico aí da palavra “empoderamento”.
P1- Sim.
P2- Por que essa palavra é importante no negócio de vocês?
R-(51:27) Olha, eu acho que, se a gente fez algo certo, foi chamar a Elétrica de Elétrica, (risos) porque é um nome simples, em português, é muito forte. E quando a pessoa lê “Elétrica” e vê o nosso trabalho, ela entende tudo. Então, a gente se comunica dessa forma. A gente se comunica de forma forte, assertiva, com energia, com posicionamento, com crítica. Então, a gente gera um choquezinho, a gente gera incômodo, a gente gera uma energia. Então, assim, traduz cem por cento tanto quem eu e a Sté somos, que a gente é muito parecida em muita coisa, então a gente tem esse jeito forte de tratar tudo, assim e também traduz as nossas peças, o estilo das nossas peças, o grau de moda que elas têm, né, que passa na nossa curadoria e normalmente são sempre estilos fortes, né? Então, uma modelagem, uma cor, uma estampa e tudo o que marca, tudo o que tem uma energia, assim, é muito nosso estilo, assim. Eu acho que casa completamente. Todo mundo que conhece, também fala que é um casamento perfeito.
(52:48) P1- Legal. Mariana, e que fontes vocês costumam ir buscar inspiração, né? Porque vocês devem estar sempre se atualizando, né? Vocês procuram revistas, são sites? Onde vocês bebem? A fonte de vocês é o quê? Filmes?
R- (53:09) Também acho que entra nesse contexto on line, de outros sites, outras plataformas, de outras marcas. (53:17) Eu acho que o mundo musical é muito uma fonte pra gente. Então, artistas dessa cena de novos artistas brasileiros, dessa cena negra, como uma Tássia Reis, a Lineker, Pabllo.
R2- Majur.
R- Majur. Então, eu acho que a cena musical talvez é algo que nos influencie muito, assim, que a gente bebe muito dessa fonte. Então, quando eles trazem clips ou ensaios fotográficos, é uma estética que a gente sempre está atento. Também de fora do país, com certeza. Do movimento hip hop, do “I’m and Bee”** [ desconhecido] (53:55). A gente bebe, acho, muito dessas fontes. E talvez as nossas referências sejam mais musicais do que referências, propriamente, só do mundo da moda, né? Porque a música e a moda são universos quase indissociáveis, né?
(54:13) P2- E tem um espacinho pro rock and roll?
R- (54:17) Tem também. Acho que a Sté traz mais essa estética do rock and roll, com certeza. (54:23) A gente junta os nossos estilos, né? Eu acho que, por isso, talvez, a gente tenha conseguido ter um brechó múltiplo, né? Onde pessoas que têm diferentes gostos estéticos, conseguem achar peças superlegais, que elas se apaixonam, dentro da nossa curadoria. Porque tem peças que eu falo assim: “Ah, amiga, essa daqui eu acho maravilhosa”. E a Sté fala: “Ah, pra mim é mais ou menos. Mas eu confio no seu estilo”. E vice e versa. Eu falo assim: “Ó, amiga, essa eu não levaria, não. Mas se você quer levar, eu confio” e vamos, entendeu? A gente consegue achar esse equilíbrio e essa diversidade de estilos, assim, dentro do nosso brechó.
(55:04) P1- Certo. E, Mariana, aí em Ribeirão Preto, a cena musical - já que a gente está falando sobre essa identificação com a música - é bem variada, assim? Tem bastante lugar pra ir ver show, assim? Bandas alternativas, né, que combinam com vocês? Como que é Ribeirão?
R- A gente sente que é uma cena aquecida, aqui em Ribeirão, né? Tem muitas bandas independentes.
R2- Até o Armazém traz gente de fora, o Sesc traz.
R- (55:36) É. O próprio SESC, né? A gente é frequentadora nata do Sesc, que traz muita gente que ainda não está no ápice da sua carreira, muita novidade, muitos novos artistas. E acho que casas como o Armazém Baixada, aqui em Ribeirão, também, trazem bastante, tanto bandas de Ribeirão, quanto região, assim, que estão em ascensão. Eu acho que Ribeirão tem cada vez mais. Eu acredito que não era muito, tipo, na época que a gente era menor, assim, até adolescente ainda, né? Então, eu acho que da época que eu e a Sté se conheceu, então dez anos, pra hoje, Ribeirão já mudou bastante nesse quesito, de se abrir pra novos estilos musicais, novos talentos da música. Tem uma artista aqui em Ribeirão, chamada Avine, que a gente é muito fã. E que nasce desse contexto, desses novos espaços de cultura aqui em Ribeirão. Então, eu acho que é um lugar que está produzindo música, música nova, música fora da roda, assim.
(56:45) P1- Muito legal. O que vocês gostam de fazer, quando vocês não estão trabalhando? Qual é a curtição aí?
R- (56:58) Pergunta difícil, assim, porque a gente é meio louca do trabalho. Não com orgulho, assim. Estamos, assim, em terapia, muita desconstrução pra gente, realmente, aprender a dar uma desligada, que se deixar, a gente passa dos limites saudáveis, assim. Mas eu acho que a gente gosta de tudo que a gente não pode estar tendo agora, na pandemia, né? Eu, particularmente, amo sair. Amo sair pra dançar, pra escutar música. A Sté ama reunir amigos. Então, a gente sentar numa mesa de bar, bater um papo. Acho que é muito do estar com as pessoas. A gente não é muito de se isolar, que é o que a gente está fazendo nesse período, assim. Acho que também, culturalmente, a gente gosta muito dessas novidades, por isso a gente é super frequentadora do Sesc. A gente gosta de aglomeração, gente. A gente gosta de cultura e de reunir os amigos. E não é muito assim: ficar em casa, de ‘boinha’, não. Só se for com os amigos, fazendo uma janta, alguma coisa assim.
(58:07) P1- Legal. E, Mariana, como foi pra você e pra Sté, passarem pela pandemia? Talvez o negócio de vocês não sofreu tanto, por ser on line. Mas conta um pouco, o que vocês fizeram pra passar por esse desafio.
R- (58:25) Olha, assim, está sendo ainda um desafio, primeiramente, pessoal, pra cada uma de nós, muito difícil, né? Igual a gente falou. Tanto o nosso negócio que a gente, antes da pandemia, o nosso canal principal eram as feiras, não era nem tanto a venda on line. O on line era mais a vitrine. Mas a venda acontecia mesmo nas feiras de cultura que existiam aqui em Ribeirão. Então, pessoalmente, já foi um grande desafio a gente ter cabeça pra continuar o negócio, né, ter sanidade, ter pique, vislumbrar algum futuro, pra gente, realmente, conseguir falar: “Não. Vamos trabalhar, porque vale a pena. Uma hora isso vai acabar”. Então, eu acho que esse primeiro desafio foi muito difícil, lidar com isso. E segundo ponto: o primeiro ano da pandemia, a gente foi no fluxo, tipo assim: “A gente não pode parar. Vamos. O que dá pra fazer? Vamos fazer liquidação? Vamos fazer liquidação. Vamos nananã? Vamos fazer nananã”. E eu acho que, assim, isso cansou muito a gente, porque a gente não tinha um planejamento. Acredito que poucas pessoas tinham, né? Ninguém esperava que a gente fosse passar por algo assim. Então, a gente não tinha um planejamento, foi um grande susto. E a nossa maior renda fechou, que eram as feiras. Então, foi uma reinvenção muito na marra. E eu acho que isso gerou uma estafa emocional, psíquica na gente que, no fim do ano, ali depois daquele Natal louco, a gente falou: “Cara, vamos parar. Vamos fechar nesse recesso de fim de ano, porque a gente precisa pensar. Tipo: não está saudável a maneira que a gente está construindo”. Porque a gente tentou trabalhar mais, pra compensar o fato da pandemia. Só que trabalhar mais num contexto de pandemia, onde a gente está emocionalmente esgotada. Então, foi muito difícil, mesmo. E aí, no fim do ano, a gente fez um recesso longo, que eu voltei com a Elétrica no final de janeiro. E depois a Sté voltou em março, né?
R2- Quase no fim.
R- (01:00:25) Quase no fim de março. Então, em janeiro eu já fui voltando e tal. E daí eu mergulhei nos estudos. Fui estudar mais sobre a área de marketing digital, né? Que, mesmo formada na área, é algo que muda a todo instante, toda hora. Piscou, é tudo novo. Então, eu fui retomar esses estudos. E fui estudar sobre gestão financeira, que é um curso até, que eu acabei recentemente, que foi um divisor de águas, assim. Então, eu acho que, agora, a gente está num modus (1:00:56), mais consciente dos passos que a gente está dando e sabe o que a gente está fazendo, agora, do que nesse primeiro ano de pandemia, que foi de março a dezembro, onde a gente agiu no desespero, com medo do negócio fechar, o nosso sonho acabar e foi se embolando, né? (01:01:21) E acho que agora a gente está num lugar onde a gente está com mais aprendizado, mais bagagem, mais calma, pra ter passos mais assertivos e que vão durar com o retono da vida normal ou não. A gente não está mais, agora, agindo por conta só da pandemia. A gente está vendo o negócio de uma outra forma, onde a gente tem uma rotina de trabalho, um plano de negócios que respeite os nossos horários, os nossos limites, os nossos ideais. E que a gente consiga caminhar sem desesperar, mais. Então, eu acho que foi isso, o momento da pandemia. A princípio foi um grande desespero, que esgotou muita gente. E agora, depois de uma pausa aí de alguns meses, que a gente fez, do fim do ano pro início deste ano, a gente retomou com muito mais estrutura e mais gás.
(01:02:11) P1- Legal. Mariana, uma coisa que é certa, apesar de ser muito ruim essa pandemia que está acontecendo, é que um dia ela vai acabar, né? A gente sabe disso, né? No futuro, todo mundo, todo comerciante pensa pro futuro, né? O que vocês imaginam que o seu negócio pode virar? Vocês já fizeram planos de abrir uma loja física, num lugar legal ou em outra cidade? Ampliar o negócio? O que vocês pensam do futuro, você e a Esther?
R- (01:02:43) Nosso grande sonho, com certeza, é a loja física, assim. A gente pensa num formato de loja física que seja bastante convidativa, que não seja, simplesmente, nós, lá, com as araras expostas e as pessoas indo comprar. Mas um local onde as pessoas se encontrem. Um local onde a gente tenha um espaço de fotografia pra Sté fazer tanto os trabalhos da Elétrica, quanto trabalhos pessoais. Então, a gente pensa num espaço mais multidisciplinar, assim, onde aconteçam mais coisas, pra além da simples venda do brechó.
R2- Cursos.
R- (01:03:18) É. Um espaço onde a gente possa dar cursos ou trazer pessoas pra dar cursos. Tenha esse espaço de fotografia, que eu acho muito imprescindível pra gente, que a gente sonha bastante, pra além do brechó, assim. Que ele seja, com certeza, o carro-chefe, nossa estrelinha ali no meio, mas que a gente agregue mais do que a gente acredita, nesse mesmo espaço. Com certeza, desde o começo, esse é o nosso sonho. A gente gosta bastante do formato de feira. Agora, do formato on line, a gente está entendendo melhor como funciona, gente está gostando bastante e a gente não quer abandonar isso, quando a gente tiver a oportunidade de ir pro físico. Mas com certeza, desde o começo, o espaço físico, que fosse um espaço que integrasse nossos ideais pra além da venda das peças do brechó, era, é o sonho ainda.
R2- A gente olhou.
R- (01:04:13) É. Teve uma época, antes da pandemia, inclusive, tipo no ano anterior, em 2019, que a gente olhou muito lugares, prédio comercial. A gente olhou, olhou, olhou. E a gente ficou com medo, a gente falou: “Cara, acho que não é a hora, ainda. Talvez essa conta não vai fechar. Talvez seja um passo maior. Vamos segurar”. Decidimos por segurar. E, no ano seguinte, começou a pandemia. E a gente agradeceu por não ter dado esse passo, nesse momento, assim. Mas é um sonho, com certeza, assim que a gente tiver mais condições financeiras. Porque o espaço físico, a questão é o gasto, que é muito alto, difere muito do on line, né? O on line é mil vezes mais barato, é incomparável. Então, quando a gente estiver mais estruturada pra dar esse passo, é o próximo passo, assim, é o sonho.
(01:05:05) P2- Eu queria que você falasse, principalmente pra gente deixar registrado, né? Você falou assim: um espaço de fotografia, né? Aonde entra a fotografia com o brechó, com a moda, com as roupas?
R- (01:05:18) Ai, que difícil falar aqui, no lugar da Sté. Me corrija, amiga, aqui, qualquer coisa. (risos) Mas eu acho que, assim, (01:05:24) a gente pensou num espaço de fotografia, tanto pra que a Sté consiga exercer as ideias criativas dela porque, às vezes, ela traz ideias que a gente não tem espaço pra fazer isso acontecer. Então, a gente acaba tendo que recorrer muito à cidade, né? O que não é um problema, porque é uma das especialidades da Sté, com certeza, essa foto mais documental, mais jornalística, mais rua. Então, assim, a gente não perde nada com isso. Mas eu acho que também a gente deixa de ganhar mais coisas, sem ter uma estrutura, uma estrutura mínima de um estúdio, assim, onde a gente poderia ter mais liberdade criativa de fazer tanto fotografia de moda, como os trabalhos da Sté, né? Trabalhos, às vezes, de um projeto, de retratos, enfim, dela ter essa liberdade e um espaço onde ela pudesse fazer isso. Ou também de expor trabalho que ela já fez, né? Ela tem uma série de uma viagem pela América Latina.
R2- Chile, Peru e Bolívia.
R- (01:06:27) Chile, Peru e Bolívia. Ela tem uma série de fotos dessa viagem, que são incríveis. Então, assim, também buscar, ter um lugar onde a gente possa expor esse trabalho, ter essa troca. Como a gente falou, de cursos, às vezes, receber pessoas interessadas em fotografia. A Sté deu, agora no começo do ano, um curso de fotografia que é muito incrível, acho que muita gente tem interesse. Então, talvez, ela ter esse espaço, onde a gente conseguisse produzir isso. Enfim, a gente acha que são mundos muito próximos, né? Até, se a gente pensa numa equipe fotográfica, normalmente tem um produtor de moda junto, né?
P2- Porque a Sté é fotógrafa profissional, né?
R- Isso. A Sté é fotógrafa profissional, há mais de dez anos. Então, a gente queria unir esses dois trabalhos, né? O brechó e essa primeira profissão e paixão dela.
(01:07:23) P2- Maravilha.
P1- Claudia, você tem mais alguma pergunta?
P2- Não. Só aquela, pra finalizar.
(01:07:34) P1- Antes, eu ia perguntar pra Mariana, se a gente pegou toda a história. Se não faltou nada que vocês pensaram, assim: “Pô, queria que eles perguntassem tal coisa e eles não perguntaram”? Passamos por tudo, será?
R- Ah, eu acho que passou. Eu acho que passou, sim.
(01:07:52) P1- Legal. E a Claudia sempre faz uma última pergunta. Faz aí, Claudia.
(01:07:56) P2- É pra gente começar a encerrar, né? São as perguntas mais de encerramento, de avaliação, né? Então, assim, é uma entrevista um pouquinho diferente, né, Mariana, assim, de você falar do brechó pela sua história de vida, né? O que você achou desse processo, assim, de contar a sua história, a sua narrativa e deixar pro Museu da Pessoa?
R- (01:08:17) Gente, assim, não estava esperando. A gente não estava esperando. Mas eu acho muito importante, né? Eu acho que todos nós, sempre que tiver a oportunidade, compartilhar as nossas histórias. Porque eu acho que o pessoal se funde muito com o coletivo, né? Então, a minha história também é a história de muitas outras Marianas, de muitas pessoas com uma história parecida com a minha. E eu acho que o poder da identificação traz muito força, às vezes, pra pessoa acreditar também num projeto que ela tem, num sonho. (01:08:50) Então, eu acho um privilégio muito grande poder compartilhar a história do meu brechó através da minha história pessoal, um privilégio muito grande. Eu acho que tem uma potência muito grande atrás disso, que é dessa identificação e também da diferença, né? Às vezes, uma pessoa que teve uma realidade muito diferente da minha, conhecer realidades diversas, né? A gente não ficar preso numa única história, numa única história de vida, num único modelo de se ter um negócio, de se ter um comércio. E a gente ver como é amplo e como cada um, do seu jeito, consegue transformar o seu sonho, fazer o seu percurso dentro do que você acredita, de quem a gente é, né?
(01:09:40) P2- Contar história empodera uma pessoa?
R- (01:09:43) Nossa, com certeza. Talvez é o que mais faça isso, né? E contar várias histórias, eu acho que empodera. Contar uma história eu acho que não empodera ninguém. Agora, contar várias histórias é o que, de fato, transforma. Assim, aumenta a nossa visão, aumenta a nossa percepção. A gente não fica acreditando em algo único, né? A gente vê, de fato, a diversidade, principalmente, assim, do nosso país, né, de quantas possibilidades, de quantas pessoas a gente pode ser, admirar ou não. E, enfim, eu acho que o plural é que traz mais senso crítico pra gente.
(01:10:22) P2- Quando você faz essa fala, Mariana, você tem alguma referência, assim, de leitura, de posicionamento?
R- A mais recente aqui, é a Chimamanda, que foi até no Roda Viva. Nigeriana, a Chimamanda. Viveu entre a Nigéria e os Estados Unidos. Mas com certeza, assim, é a autora do meu livro favorito, no mundo e uma grande potência que nos ensina muito isso, né? Ela, enquanto uma - ai, gente exatamente - uma escritora e quase uma historiadora, né? Profunda é a pesquisa que ela faz nas escrituras, nos livros dela. Eu acho que um dos maiores ensinamentos que ela traz, é isso, assim: a importância da gente contar várias histórias pra pessoas diferentes, pra gente, de fato, construir uma visão mais crítica do nosso mundo, né? E não ficar preso na capa desse livro, né, dessa história única que, normalmente é o que tentam fazer com a gente. Então, eu acho muito disruptivo sempre que a gente puder, todo mundo puder, contar a sua história e ouvir as histórias de outras pessoas. (01:11:32)
P2- Nossa, lindo.
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