Depoente: Arnaldo Poffo Garcia (Peixinho)
Entrevistado por: Itamar e Renata
São Paulo, 07 de dezembro de 1993
Entrevista nº 021
P - Nós estamos aqui nos estúdios da Oficina Oswald de Andrade, entrevistando Peixinho, ex-jogador da Ferroviária, do São Paulo e do Santos. Peixinho, onde que você nasceu? Como é que era a sua infância... Seus irmãos, a cidade que você morava? O que você fazia quando você era criança? Conta aquela coisa assim, lá mais do fundo do baú!
R - Eu nasci na Lapa, em São Paulo. Meu pai Arnaldo Alves Garcia e minha mãe Norma Poffo Garcia. Tenho dois irmãos, Tereza e Emílio, e nossa infância foi uma infância praticamente normal, com sacrifícios. Eu aos onze anos já trabalhava, estudava e jogava futebol aos domingos. E continuamos a vida assim e... Certa ocasião o São Paulo Futebol Clube foi jogar no Oratório Dom Bosco, onde eu comecei. O clube chamava-se Sport Clube Tibiriçá, no Alto da Lapa, e o Sr. Hélio Geraldo Caxambu me levou pra integrar as equipes inferiores do São Paulo. E até hoje eu sou grato a ele por ter iniciado no São Paulo, como todos vêem hoje, um dos maiores clubes no mundo, tanto na parte futebolística como na parte social. E dando sequência a cadeia. Certo?
P - Mas como que era a Lapa, o Alto da Lapa, quando você...
R - O Alto da Lapa era um bairro... Quando eu fui morar no Alto da Lapa, havia um Colégio Salesiano dos padres salesianos e duas casas apenas, a terceira seria a nossa, certo? E uma torre, naquele tempo da rádio América, que era defronte, no caso, onde é hoje o Pão de Açúcar. Quer dizer, construímos com sacrifício lá aos domingos... Sábados e domingos, meu pai foi a família... A nossa família é muito unida, tanto a parte do meu pai, como da parte da minha mãe, e aos poucos fomos construindo a casa. E hoje todo mundo sabe o que é o Alto da Lapa, o que é... O bairro, a Ci...Continuar leitura
Projeto: História em Multimídia do São Paulo Futebol Clube
Depoente: Arnaldo Poffo Garcia (Peixinho)
Entrevistado por: Itamar e Renata
São Paulo, 07 de dezembro de 1993
Entrevista nº 021
P - Nós estamos aqui nos estúdios da Oficina Oswald de Andrade, entrevistando Peixinho, ex-jogador da Ferroviária, do São Paulo e do Santos.
Peixinho, onde que você nasceu? Como é que era a sua infância.
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Seus irmãos, a cidade que você morava? O que você fazia quando você era criança? Conta aquela coisa assim, lá mais do fundo do baú!
R - Eu nasci na Lapa, em São Paulo.
Meu pai Arnaldo Alves Garcia e minha mãe Norma Poffo Garcia.
Tenho dois irmãos, Tereza e Emílio, e nossa infância foi uma infância praticamente normal, com sacrifícios.
Eu aos onze anos já trabalhava, estudava e jogava futebol aos domingos.
E continuamos a vida assim e.
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Certa ocasião o São Paulo Futebol Clube foi jogar no Oratório Dom Bosco, onde eu comecei.
O clube chamava-se Sport Clube Tibiriçá, no Alto da Lapa, e o Sr.
Hélio Geraldo Caxambu me levou pra integrar as equipes inferiores do São Paulo.
E até hoje eu sou grato a ele por ter iniciado no São Paulo, como todos vêem hoje, um dos maiores clubes no mundo, tanto na parte futebolística como na parte social.
E dando sequência a cadeia.
Certo?
P - Mas como que era a Lapa, o Alto da Lapa, quando você.
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R - O Alto da Lapa era um bairro.
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Quando eu fui morar no Alto da Lapa, havia um Colégio Salesiano dos padres salesianos e duas casas apenas, a terceira seria a nossa, certo? E uma torre, naquele tempo da rádio América, que era defronte, no caso, onde é hoje o Pão de Açúcar.
Quer dizer, construímos com sacrifício lá aos domingos.
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Sábados e domingos, meu pai foi a família.
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A nossa família é muito unida, tanto a parte do meu pai, como da parte da minha mãe, e aos poucos fomos construindo a casa.
E hoje todo mundo sabe o que é o Alto da Lapa, o que é.
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O bairro, a City, City Lapa, entendeu?
P - Vocês brincaram do quê além de futebol? Vocês pescavam no Rio Pinheiros, como é que era? Tinha peixe lá?
R - Aquele tempo havia uma lagoa do lado do rio Pinheiros, e a gente de vez em quando ia passar um tempo lá, mas era coisa rara.
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Assim, só no feriado ou domingo que não tinha futebol, porque a gente trabalhava desde os onze anos, então não havia esse tempo todo.
P - Mas e a molecada brincava de quê, assim, na rua? Pião.
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R - Ah, jogava pião, bolinha, golfinho, que hoje chamam.
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Aquele que joga com o taco, certo? Era uma brincadeira normal, né? Só que hoje acho que a molecada não faz isso viu, mudou muito.
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P - Por quê?
R – É, tem.
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Ou é discoteca, esse.
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Como é que chama?
P - Vídeo-Game.
R - Vídeo-Game.
E mudou muito.
P - E como é que você começou a jogar futebol? Você jogava com bola de capotão?
R - Não, comecei com bola de meia mesmo.
P – É? Quem que fazia a bola?
R - Eu mesmo fazia a bola! Pegava a meia da minha avó, certo? Aqueles “meião” com jornal e fazia a bola de meia.
Aí eu comecei assim, tanto eu como a meninada toda pobre, não tinha.
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Bola de capotão era uma raridade, quando aparecia uma, era uma festa.
P - Agora, o seu pai jogava futebol também.
R - Meu pai jogava, meu pai jogou no Ipiranga, no Santos, no Palmeiras.
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Aliás foi o único artilheiro que o Ipiranga teve na divisão especial, em 1940.
P - Como que era o nome, o apelido do seu pai?
R - O apelido era Peixe, daí veio Peixinho.
Apesar de que quando eu cheguei ao São Paulo, o Sr.
Hélio Geraldo Caxambu de toda maneira queria que eu jogasse com o nome de Garcia, mas quando ele ficou sabendo que eu era filho do Peixe, então virou Peixinho mesmo, não teve saída.
P - E como é que era a sua.
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A sua relação com o seu pai, não é.
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R – Eu.
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Eu tenho um bom pai.
Meu pai está com 76 anos, vive com saúde, graças a Deus, pai e mãe.
E o nosso relacionamento sempre foi bom.
Meu pai nunca ergueu a mão pra me bater.
Aquele tempo usava, era só olhar e não precisava falar mais nada.
Eu fui educado assim, certo? E o nosso relacionamento é excelente.
Meu pai nunca interferiu na minha carreira com diretor nem nada, comigo sim, ele me aconselhava, me orientava, e eu agradeço muito a ele.
P - Com relação ao futebol, ele.
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Vocês conversaram? Como é que era?
R – Conversávamos.
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Ele apontava os defeitos e eu procurava me corrigir.
P - Seu pai jogava de que, Peixinho?
R - Eu?
P - Seu pai jogava em que posição?
R - Ponta direita.
P - Ponta direita também?
R - Eu comecei como meia no São Paulo, e quando o seu Feola me viu treinar.
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Comecei treinando aqui no Bom Retiro, o São Paulo nem campo tinha aquele tempo, a gente treinava aqui no Sul Americano do Bom Retiro, aí passarmos depois a treinar no estádio da Aclimação.
Foi onde o Feola um dia, vendo os treinamentos, me levou pro Morumbi.
Morumbi que tinha duas estacas e um campo de terra, onde são as piscinas hoje.
Eu vi o São Paulo nascer.
E dei a grande sorte de ter feito o primeiro gol no Morumbi, é uma coisa que.
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Que marcou pra mim, e toda vez que eu chego perto do Morumbi eu sinto mesmo alguma coisa diferente.
P - Que dia que foi isso? Contra quem foi.
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Como é que foi esse gol?
R - Foi dia dois de outubro de 1960, contra o Sporting de Lisboa.
P - Era inauguração do estádio?
R - Inauguração do estádio e foi um a zero mesmo.
P - Como é que foi o gol? Que mais que aconteceu? Você lembra?
R - O gol é falado até hoje, “gol de peixinho” porque foi feito num mergulho, um cruzamento do Jonas, já falecido, e eu mergulhei e ficou batizado, e como era o Peixinho, ficou gol de peixinho, e é falado até hoje quando o pessoal faz o gol nessa maneira.
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Faz o gol de peixinho.
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P - Antes disso ninguém costumava chamar.
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R - Não, ninguém costumava falar.
De forma que eu me sinto gratificado até hoje.
Toda vez que eu vejo um gol de peixinho, eu me lembro daquilo.
P - Você está na história duas vezes então, por ter feito o gol e por ter criado o gol de peixinho?
R - Aí é que está, hein? A gente sempre que é lembrado, ou de uma maneira ou de outra, a gente se sente contente.
P - Então, conta melhor pra gente como é que foi a emoção de fazer o primeiro gol? Se você tinha pensado nisso, já tinha sonhado com essa possibilidade.
R - Eu acho que inaugurar o Morumbi, principalmente os jogadores do São Paulo, todos eles sonhavam certo? E quando eu fiz o gol, sinceramente, o que eu me lembro é que eu fui parar quase dentro do vestiário, na boca do túnel, fui levado, carregado, sinceramente não deu a emoção, não dá pra transmitir a emoção, você.
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Porque é uma coisa que todo mundo queria, e a gente conseguir, pra mim, e eu menino, tinha 20 anos, e era o jogador da casa, feito no São Paulo.
Eu acredito que pro São Paulo também.
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P - Foi importante a.
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R - Foi importante e válido.
P - Me fale um pouquinho desse jogador Jonas.
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Parece que foi um grande jogador, acabou morrendo jovem.
R - O Jonas era um menino de Barueri, o pai dele era um funcionário da estrada de ferro, um menino humilde, e não resta a menor dúvida que seria um grande jogador.
Infelizmente ele teve um problema no joelho, depois virou um tumor, sabe? Maligno, e ele veio a falecer.
Sinceramente, eu não tive coragem de visitar o Jonas no hospital, tanto que eu gostava dele, e lembrando que ele foi que me cruzou a bola pra eu fazer o primeiro gol.
Isso não vai sair da minha cabeça nunca.
P - E parece que esse problema no joelho dele, Peixinho, o pessoal julgava que era máscara.
Como que é essa história? Parece que ele não queria jogar.
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R - Ele era um jogador.
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O pessoal achava.
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Ele era humilde, uma pessoa humilde, sabe? E eu não sei o que achavam nele de máscara, sabe? Então, pensavam que ele tava fingindo, não queria jogar, não era.
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A coisa era verdadeira, sabe? Infelizmente quando constataram a verdade já era tarde demais, e ele, o Jonas, teimou em não cortar a perna, falou: “não, eu não vou cortar”.
P - Voltando um pouquinho lá na Lapa.
Quando é que você.
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Quando é que alguém viu que você jogava futebol? Qual foi o primeiro time que você jogou na várzea? Conta um pouquinho da vida na época.
R - Eu comecei jogar futebol no oratório mesmo, Salesiano Dom Bosco, campo de terra no Alto da Lapa.
Um oratório humilde.
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Tinha uma casa que era feita como igreja, e ali eu dei os primeiros passos no futebol, certo? E um dia o São Paulo foi convidado pra jogar lá, porque o Domingo Sávio era uma equipe famosa na várzea, era tudo menino, mas era famosa.
P - Quem que era o Domingo Sávio?
R - Domingo Sávio é um santo, era aluno de Dom Bosco, certo? E o São Paulo foi convidado para participar de uma partida lá, e nesse jogo eu me saí bem, fiz dois gols, e o Caxambu me convidou pra ir treinar no São Paulo, que treinava, como eu falei, no Sul Americano do Bom Retiro.
Eu me lembro muito bem que, “pô”, saía do Alto da Lapa a pé pra pegar o bonde, descer na Avenida São João e descer até o fim da rua até a Lapa, certo? E trabalhava, hein? Mas como meu patrão era são-paulino, me dispensava, tive sorte também nisso.
P - Você trabalhava com o quê?
R - Como tapeceiro, auxiliar de tapeceiro depois me tornei tapeceiro.
P - Agora, como é que foi esse dia, depois que o Caxambu te fez o convite você foi pra casa, como é que.
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R - Ah, uma alegria imensa, né?
P - E o seu pai?
R - Meu pai também ficou contente, não tem dúvida.
E porque justamente quando eu comecei a treinar nesse Sul Americano do Bom Retiro, já havia Silva, que era um craque na ocasião, e eu treinei no meio desse pessoal, isso já.
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Naquela ocasião era difícil, porque naquele tempo existiam bons profissionais pra treinar no São Paulo e chegar ao time de cima não era fácil não.
Eu tive sorte.
Muita gente me ajudou.
Eu me lembro perfeitamente quando o seu Feola começou a me concentrar com os profissionais, levava café na cama pro Canhoteiro, Poy, De Sordi, Mauro, isso me ajudou muito.
Quando eu entrei no time de cima, que foi na Colômbia, aliás.
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Perdão, foi no Parque Antárctica que eu estreei no São Paulo, num jogo com o Nacional, veja como é a vida, o Cláudio Cristovam de Pinho jogou com meu pai e eu estreei com Cláudio Cristovam de Pinho no São Paulo, o Cláudio jogou com meu pai e jogou comigo, certo? E esse jogo no Parque Antárctica contra o Nacional nós saímos na frente de um a zero, o Nacional empatou e eu machuquei o joelho direito.
Aquele tempo não tinha banco e eu continuei jogando, Dr.
Dalzell Freire Gaspar me deu uma infiltração pra amortecer um pouco a dor e eu voltei a jogar, no fim do jogo fiz o gol de pé esquerdo, gol da história, certo? Aí fiquei duas semanas e o São Paulo ia viajar pra Colômbia e pro México, menino, louco pra viajar.
P - Que idade você tinha?
R - Ah, eu era novinho ainda.
Tinha dezessete anos por aí.
Eu precisava pedir autorização naquele tempo pro delegado pra poder viajar.
E eu machucado, querendo viajar, né? México, Colombia, e o São Paulo ia fazer.
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P - Nunca tinha saído em excursão?
R - Não, par fora do Brasil não, era a primeira vez.
Aí o pessoal falou: não, vamos ter que levar o rapaz.
Pela amizade que a gente tinha, né? E o que aconteceu? Eu fui à viagem, eu fui até machucado, lá me recuperei e vim como titular do São Paulo nessa excursão.
Aí não saí mais do time.
P - Quem que era o time? Você se lembra?
R - Lembro.
Era Poy, De Sordi e Mauro; Dino, Victor e Riberto; eu, Amauri, o Juracy, Gino, Celso, Canhoteiro, jogava o Roberto também, certo.
P - Um timinho bom de bola.
R - Era um time bom (risos).
Eu tive a felicidade de jogar nesse time e a felicidade de nascer dentro do São Paulo.
P - O São Paulo já tinha, que você está falando dessa organização que tem hoje ou.
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Como que era na época, Peixinho?
R - Olha, na ocasião, como eu falei, nem campo tinha pra treinar, mas já tinha um começo de estrutura.
Era o seu Laudo Natel, o Manoel Raymundo Paes de Almeida, Marcel Klazcko.
Aí veio aquela.
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Lembro que o Laudo Natel, quando o São Paulo, que eu falei pra você, veio com duas estacas no chão, o Laudo Natel lançou o Paulistão, o carnê do Paulistão.
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Aquele tempo era um fusca 59, se não me engano importado.
E o São Paulo, com a ajuda também do seu Laudo, que era um dos maiores acionistas do Bradesco e com o lançamento do Paulistão, o Morumbi em cinco anos.
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Quatro anos o São Paulo conseguiu inaugurar o Morumbi, coisa inacreditável, porque nós mesmos, que.
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Naquela ocasião o São Paulo.
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Que víamos lá só terra, duas estacas, a gente mesmo falava: “Ah, isso aqui não tem condição, é muito grande pra ser erguido, e hoje você vê aí o que é o Morumbi.
P - E como era o bairro na época?
R - Nada, ali era uma várzea perfeita, era um atoleiro, o Adhemar de Barros que doou esse terreno pro São Paulo.
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Jardim Leonor na ocasião era.
P - Leonor era a mulher dele.
R - A mulher do Ademar.
P - Você jogou quanto tempo no São Paulo?
R - Eu joguei no São Paulo de 55, 56 até 60, começo de 61.
P - Você pegou a fase meio brava, que o São Paulo.
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R - Peguei, peguei o São Paulo.
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Que o São Paulo não era campeão, não tinha condições de contratar, então lançou mão das pratas da casa.
Tinha o Sérgio Lopes, o Bazani, irmão do Bazano.
E o São Paulo se aguentou porque não tinha mesmo condições de contratar, não havia de onde tirar dinheiro com a construção do estádio.
E hoje a gente viu que o São Paulo agiu certo aí vem se estruturando cada vez mais.
P - Você jogou com o Dias, o Roberto Dias?
R - Joguei.
O Dias no meu tempo, eu era juvenil e ele era infantil.
Foi um dos maiores jogadores que passaram pelo São Paulo.
O Dias, em minha opinião, foi um jogador bem injustiçado, não no São Paulo ali, na Seleção Brasileira.
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O Dias merecia melhor sorte, como pessoa e como jogador.
P - Ele, por exemplo, não foi para a Copa de 66, na Inglaterra.
R - Isso que eu digo, ele foi injustiçado e muito.
P - Ele ficou em boa companhia, que não foi o Carlos Alberto, não foi o Djalma Dias.
R - É não foram vários que tinham condições.
Infelizmente na Seleção Brasileira às vezes impera essa.
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Essa política.
P - Por que você acha que ele acabou não indo? Ele era muito humilde?
R - Era humilde.
O Dias sempre foi uma pessoa humilde como é até hoje, que ele está mais no Morumbi, sempre vejo o Dias lá, e às vezes o jogador tem falar alguma coisa, sabe? E o Dias não é disso até hoje?
P - Você, por exemplo, como é que você resolvia os problemas no futebol? Você era de reclamar, de.
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R - Não, não.
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Você vê que eu não tive problema, que eu nunca fui expulso na minha carreira.
P - Nunca foi?
R - Não.
Era um jogador que levava também deixava, sempre “desculpa e tal”, o juiz vinha: “não, tudo bem”.
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Nunca reclamar, xingar, porque não adianta.
Jogador de futebol profissional tem que pôr uma coisa na cabeça: depois que o juiz apitou não volta atrás, é difícil certo, por isso que eu, esse problema do cartão amarelo hoje, eu sou contra isso.
P - Por quê?
R - No meu tempo não tinha cartão amarelo, você deu um pontapé, ofendeu, ou.
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Ia direto embora, certo? Então havia mais disciplina.
Hoje o juiz quer dialogar com o jogador, não pode.
Eu acho.
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Eu me ponho na posição do juiz, eu acho que não deve haver diálogo.
Ele está ali, ele é que manda, ele erra mesmo, isso não tem a menor dúvida, ele apitou não adianta reclamar.
E você tem que pensar que você está defendendo o clube, você não pode prejudicar esse clube, certo? No meu tempo, a gente fazia questão de honrar a camisa que vestia, hoje em dia mudou um pouco a coisa.
P - Você era um galã.
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R - Isso é a opinião minha, hein? Particular.
P - Como que era a sua relação com as namoradas? O que você fazia quando você começou a ficar adolescente? Aonde vocês iam se divertir, os seus colegas?
R - Eu não fui um jogador assim de noitada, essas coisas não.
A gente tinha, lógico, a meninada sempre se interessou por jogador de futebol, sempre há aquele interesse, há mais agora ainda, sabe? A gente nota que há mais agora, mas no meu tempo também tinha alguma coisa.
P - Quem foi a sua primeira namorada? Você lembra?
R - Lembro.
Foi Miriam.
P - Como é que você a conheceu?
R - No Alto da Lapa mesmo.
P - Conheceu.
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Como que você a conheceu?
R - No Oratório também, no cineminha que passava ao ar livre.
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P - Não era rezando, né? (risos).
No cinema que você conheceu?
R - Era um cinema ao ar livre assim, como que é? No Oratório, eu falei.
P - E como que era essa questão, nas excursões, assim.
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Como que era o relacionamento, as mulheres sempre assediam os jogadores mais famosos, como que.
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R - Não tem dúvida nenhuma.
P - Como que é? Como que ocorre isso?
R - Era o caso do Pelé no Santos.
O Pelé, por exemplo, não podia sair do hotel, todo mundo queria pegar no negão para ver se ele era de verdade mesmo.
Isso eu vi não foi uma vez.
O Pelé podia só sair do hotel quando eles faziam aquela barreira de guarda e ele passava no meio.
O pessoal procurava tocar ele, pra ver passar, o que é que é, não, isso é uma coisa.
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Isso é verdade, não to.
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Não, isso não é brincadeira não, é sério.
De forma que ele não podia sair do hotel, então o pessoal se apresentava no saguão e ele escondia, a verdade é essa.
E o Pepe brincando, sempre falava: Ó, Peixe, vamos ficar perto do crioulo, quem sabe sobra alguma coisa pra gente.
(risos).
Entendeu?
P - Você se lembra de algum fato curioso assim nessa questão do Pelé, tipo se maquiar, se esconder.
R - Não, eu me lembro de um fato que ele se recorda que foi uma das poucas vezes que eu vi o Pelé nervoso.
Nós estávamos disputando um Octagonal em Santiago.
Já tínhamos sido campeões em 64 e fomos pra segunda etapa em 65.
O Pelé não podia sair do hotel, como eu falei.
E ele sempre se queixou: “É, você vê, vocês têm liberdade, eu não posso nem ir ao cinema e tal”.
Aí nós falamos: “Negão, nós vamos armar uma aí”.
Isso fui eu, o Pepe, o Toninho Guerreiro, o Ismael.
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O Dorval tava.
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“Vamos armar uma pro crioulo aí”.
O Lima que ficava com ele no quarto sempre.
Sabe, eu ficava sempre com o Pepe e ele com o Lima.
Vamos ajeitar pra você ir ao cinema.
Aí combinamos de sair pelo elevador de serviço do hotel, isso pra ver o matinê, durante o outro dia.
Almoçamos e saímos, e fomos no cinema.
E estávamos lá, em uma comédia no Chile, em Santiago.
P - Você lembra que comédia era?
R - Tava gozada a.
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Uma comédia (risos).
Se não me engano era do Cantinflas, sabe? E todo mundo se divertindo, o crioulo dando risada, e a gente tava contente porque ele pode sair e tava se divertindo.
Então nós assistindo, dando risada e tal, de repente vimos o crioulo: “é, aqui não pô”.
E, poxa se nos assustamos, né? O crioulo bravo: “Não, porque eu vou pregar a mão, não sei o que, não sei o que lá”.
Quando olhamos tinha um cara sentado do lado dele com um microfone, entrevistando o negão dentro do cinema.
Aí nós saímos atrás do cara, né? Brincadeira.
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Dentro do cinema, entrevistando o crioulo.
P - E no escuro ainda.
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R - No escuro.
Tivemos que sair do cinema com o crioulo e ir embora.
P - Isso era assim no mundo inteiro, né?
R - No mundo inteiro.
P - Qualquer país.
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R - Era Alemanha, França, México.
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No México e Chile, Deus me livre, se soltasse o negão, eles iam morder o negão inteiro, não tinha condição.
P - E nos países que não tinham muita tradição no futebol, como vocês chegaram a jogar? Acho que China, Japão, Coréia.
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P - Não, você diz o caso do Pelé?
P - É, como que esses povos se relacionavam com o Pelé? O futebol era menos desenvolvido nessa época lá.
R - Era menos desenvolvido, mas o Pelé todo mundo conhece, é incrível, mesmo a gente participando de outras.
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De outras equipes, todo lugar que você chega, era uma viagem muito cansativa com a Ferroviária pelas Américas aí, com o São Paulo também, e todo lugar que você chega eles perguntam: e o Pelé? Mesmo não sendo do seu time.
E.
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E ele merece tudo isso.
Como jogador não se discute, agora fora do campo o Edson é uma pessoa simples, humilde.
Eu, eu posso falar isso porque eu tive, assim, fora, extracampo, um contato mais.
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Mais íntimo com o Pelé, com a família dele, porque eu era tapeceiro e o meu irmão decorador, e ele nos convidou para fazer os móveis estofados de uma casa que o Santos deu pra ele, e ele passou aos pais dele, em Santos, no Canal 5, se não me engano.
Então nós tivemos mais um contato íntimo, depois ele.
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Contato íntimo que eu digo de amizade com a família, e tal.
E quando ele se casou com a Rose, então tivemos mais ainda assim uma aproximação, porque a gente pedia o palpite dele, porque a gente era tapeceiro e decorador, mas o palpite do cliente sempre é importante, às vezes ele está mais certo que a gente.
Então, tivemos, assim, mais diálogo, fora, fora do futebol.
Então aí que a gente nota como o Pelé é humildade.
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Uma pessoa.
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Eu nunca vi, sinceramente, eu nunca vi o Pelé falar não pra alguém, seja quem for, na minha frente, eu nunca vi.
Por isso que eu tenho uma grande estima, não.
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É lógico pelo Pelé, Deus me livre, agora pelo Edson como pessoa, né? Não só eu, como quem conviveu com ele.
P - Pelo que você está falando, você acompanhou na carreira dele, a sua carreira seguiu mais ou menos junto.
Vocês tinham a mesma idade, jogaram no exército.
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Como foi isso?
R - É, nós servimos, eu tive a felicidade até nisso, por isso que eu digo, na minha carreira eu não ganhei muito dinheiro, mas eu fui feliz na minha carreira.
Servi o exército com o Pelé em 59 na Seleção Brasileira Militar.
P - Onde vocês serviram?
R - Nós ficamos primeiro no Segundo QG aqui em São Paulo, porque ele servia em Santos e eu em Quitaúna, depois juntou tudo.
Então ficamos no segundo QG aqui no Ibirapuera, depois fomos todos lá pra, lá pro Rio de Janeiro, pra Escola do Exército.
P - Isso foi quando, Peixinho?
R - Foi em 59.
O Pelé já era campeão do mundo.
P - Você não serviu junto com o Lamarca em Quitaúna?
R - Lamarca é do meu tempo em Quitaúna.
P - Você o conheceu?
R - Conheci assim esporadicamente, porque o meu coronel, eu trabalhava direto com o coronel, meu coronel era o irmão do seu, desse falecido, o Zerbine, o seu Eurídes, né? O irmão chamava Euricledes de Jesus Zerbine.
Esse era o meu coronel, são-paulino doente, esse também dispensava pra ir treinar, certo? Por isso que eu digo, e isso ajuda muito, sabe, você vê, joguei futebol por vinte anos, eu tive apenas duas distensões musculares em vinte anos, quer dizer, praticamente não parei, no máximo aí quinze dias.
Tudo isso é válido e ajuda o jogador de futebol e amizade, né? Graças a Deus todos os clubes que hoje eu vou pra cumprimentar o.
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A gente é bem recebido, esse é um grande orgulho íntimo que eu tenho, porque sempre me dei bem com todo mundo, sabe?
P - Depois do São Paulo você foi para onde, Peixinho?
R - Do São Paulo eu fui pra Ferroviária, eu fui trocado pelo Faustino e o Pimentel, o meu passe foi dado pra Ferroviária.
P - Por quê?
R - Porque eles queriam o Faustino e o Pimentel.
O Sr.
Laudo Natel não queria me ceder, mas como o treinador da Ferroviária, na ocasião era o Sr.
José Guilherme Agnelli, ele falou: “não, eu faço negócio só se o Peixinho vier pra Ferroviária”.
E pra mim, pra minha carreira, foi bom, certo? Eu, logo no primeiro ano, fui vice-artilheiro do campeonato paulista, porque com o Pelé não tinha artilheiro, era ele mesmo, eu fui o vice-artilheiro.
P - Ele foi artilheiro por oito anos seguidos.
R - E nos três anos que joguei na Ferroviária, fui os três anos artilheiro.
P - Tinha um grande time a Ferroviária, por sinal, nessa época.
R - Tinha, tinha um grande time sem dúvida.
P - Quem eram os jogadores de mais sucesso na época?
R - O time completo jogava o Toninho no gol, às vezes jogava o Fia; o Ismael, que depois jogou no Santos; o Antoninho, que jogou no Palmeiras e depois no XV de Piracicaba; Rodrigues, era um quarto-zagueiro que não apareceu muito, mas foi um dos melhores do futebol paulista, marcava inclusive muito bem o Pelé; tinha o Jurandir, outro jogador que jogou no Palmeiras, um lateral esquerdo; o meio de campo é conhecido, o Dudu e o Bazani; na frente jogava eu, o Laerte, o Parada e Beni.
Esse time foi vice-campeão paulista.
P - E depois como você acabou indo pro Santos?
R - Depois dos três anos na Ferroviária, na minha carreira jogando pela Ferroviária eu sempre fui feliz contra os times grandes, fazia sempre gol, sabe? E justamente contra o Santos é que eu fazia mais, era dois, três sempre.
E o Santos acabou me contratando em 64.
P - Vocês ganharam de cinco a um do Santos de Pelé na Vila Belmiro, não foi isso?
R - Ganhamos de cinco a um.
P - Como é que foi esse jogo?
R - No primeiro turno ganhamos de quatro a um em Araraquara.
Eu fiz dois gols na ocasião.
Depois aqui na Vila ganhamos de cinco a um, eu fiz três gols.
P - Isso é importante registrar porque muita gente acha que o Santos naquela época não perdia, não é? Era difícil, mas.
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R - Era difícil.
Naquela ocasião, naquele tempo, quem fazia frente pro Santos era o Botafogo do Rio, o Palmeiras e a Ferroviária de Araraquara.
P - Por que esse negócio da Ferroviária, um time do interior?
R - Tinha um bom time, né? Um time armado, não era um time corredor não, era um time que tocava bem a bola.
E o Santos, como tocava bem a bola, sempre dava jogo bom.
Já chegamos a ganhar do Santos de sete a dois na Vila, com esse mesmo time, e chegamos a ganhar de cinco.
P - Mas aí quem te levou pro Santos? Alguém que insistiu.
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Foi o Lula?
R – Quem?O Santos desde 62 queria me contratar, mas a Ferroviária não queria ceder.
Eu estive para ir pro Atalanta da Itália também, a Ferroviária não queria me vender também, por intermédio do Sérgio Cléris.
P - Que foi pra lá inclusive, né?
R - Foi pra lá, jogou vinte anos na Itália, se não me engano.
De forma que acabei vindo pro Santos.
Simplesmente compraram meu passe, sabe? Foram lá uma madrugada, a Ferroviária pediu “X”, eles deram “X” e.
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P - E a emoção de jogar no time do Pelé?
R - Eles treinam no Santos e no Peru, sabe? E de fato a emoção é grande, sabendo que o Santos era bi-campeão do mundo.
Eu fui pra lá um mês depois, e o Santos contratava praticamente um jogador por ano.
Olha, jogar no Santos naquela ocasião não era brincadeira, sabe, são coisas que acontecem na vida da gente que você nem acredita.
Eu quando me vi jogando no Santos, estreando no Peru, eu sinceramente, é uma coisa inacreditável.
P - Você jogou no time que era considerado o maior do mundo.
R - Era o maior time do mundo, né.
E eu fui feliz no Santos, praticamente me tornei internacional, campeonato paulista e bi-brasileiro, tetra-brasileiro, eu não fui tetra, fui bi, mas participei do tetra, certo? O Santos já vinha com dois campeonatos, e eu tive a felicidade de completar mais dois.
P - Qual que era esse time que você jogou?
R - Era o Gilmar, Ismael, depois Carlos Alberto.
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Vem em seguida, Mauro, Orlando, Geraldinho, Zito e Mengal, eu, Coutinho, Pelé e Pepe.
Aí ainda tinha Lima, Haroldo, Oberdan, Edu, Abel, Noriva, Almir.
Era.
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O Santos na ocasião tinha um plantel com 33 jogadores, mas 33 craques.
Foi.
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Coisa que a gente não esquece, principalmente as viagens, que eu nunca joguei com o Santos sem ser a casa lotada, são coisas que às vezes a gente sonha, hoje sonha e quando você acorda dá uma tristeza tremenda, sabe?
P - É interessante isso aí, como é que você se relaciona com essa tua realidade de hoje, você ser uma pessoa de certa forma comum, anônima, e você se lembrar dessa época que você era de certa forma.
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R - A gente sente saudade, sabe, por isso que eu falei pra você, quando eu cheguei perto do Morumbi.
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P - Você tem crise?
R – (.
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) Estádio Cícero Pompeu de Toledo me dá um nó aqui, porque aí volta, isso é normal, você.
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Eu ver o Santos jogar, pô, e você lembrar que jogou no Santos nessa fase.
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P - Qual foi o fato que mais marcou a sua vida? Foi ter jogado com o Pelé? Foi.
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R - O que marcou minha vida foi o primeiro gol no Morumbi, depois jogar ao lado do Pelé, isso não tem.
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Eu vi, quem jogar ao lado do Pelé e conviver mais com ele.
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Por isso que eu digo, essa outra parte extracampo que eu aprendi muito com o Pelé, apesar de ter a mesma idade, mas o Pelé é uma pessoa iluminada.
Então eu aprendi muito com ele.
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P - Teus filhos perguntam.
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R - De tudo viu, tanto no futebol, como fora do futebol.
P - Teus filhos perguntam pra você como que era a relação com o Pelé? Eles têm curiosidade sobre isso ou não?
R - Não só os filhos.
O pessoal que cerca a gente sempre quer saber do Pelé mesmo, não quer saber do Peixinho, quer saber do Pelé! Mas tá certo.
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Tem que perguntar dele.
Então a gente ilustra da melhor maneira.
P - Não, mas a gente quer saber do Peixinho agora.
E talvez você pudesse contar pra gente um pouquinho como é que foi a sua juventude, o seu casamento, como que você conheceu sua mulher.
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R - A minha juventude foi.
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Eu trabalhava de jogar futebol, certo, quando tinha uma folga, eu tinha dois amigos, João e Pedro, no Alto da Lapa, então a gente saía em três assim pra comer uma pizza, tomar um refrigerante, esse era o maior divertimento, e dançar.
Nem dançar eu sei até hoje, pra dançar a valsa no casamento foi uma briga, um pisava no outro (risos)! Eu, aliás, só pisava.
E eu conheci a minha senhora quando fui pra Araraquara em 61, e é um fato interessante porque a minha senhora não sabia que eu jogava futebol, começou a olhar e tal.
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No interior naquele tempo tinha o foot.
Então a mulher andava por um lado e o homem andava pro outro sabe, não sei se você conheceu isso, mas tinha.
E foi simpática, então.
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E começamos a conversar e namorar.
Aquele tempo não tinha negócio de pegar na mão não, na mão de longe e olha lá, quando pegava na mão, certo?
P - Quantos anos você tinha?
R - Eu tinha 21.
P – Vinte e um?
R – É, 20 pra 21 anos.
E aí começamos a namorar.
Depois de uns três meses que eu tava namorando a Ana Maria, eu vinha passando do lado de cá da rua e ela tava vindo do colégio com três amigas do lado de lá, isso ela me contando depois, diz que as amigas falaram: “Olha lá o Peixinho da Ferroviária, vamos mexer com ele, olha lá, vem vindo do lado de lá”.
Aí minha senhora falou: “Que Peixinho, aquele lá é meu namorado”, certo (risos).
Ela não sabia que eu jogava futebol.
P - Ela não gostava de futebol, não se interessava?
R - Ela não gostava, não entende até hoje de futebol, parece brincadeira, mas não entende (risos).
Ela vê tudo, me viu jogar uma vez só, eu jogava no Comercial de Ribeirão Preto, que o pai e a mãe dela foram juntos.
Queriam me ver jogar, e foram juntos, a única vez.
E.
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As meninas começaram a brincar: “que nada, num sei que, num sei que lá”.
Eu não, aquele lá é meu namorado mesmo.
Aí é que ela ficou sabendo, e os pais, a princípio, foram contra, sabe?
P - Por quê?
R - Porque não queriam que namorasse jogador de futebol e tal, mas aos poucos foram me conhecendo, aí não teve problema nenhum.
P - Mas como é que foi? Quando você a conheceu você já sabia que ela era a mulher da sua vida? Você pensou.
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R - Eu achei mesmo que ia dar certo, sabe? Como deu certo.
Apesar de eu ter namorado a primeira, quatro anos, sabe?
P - Quatro anos.
R - Quatro anos, mas eu sou casado há 29 anos, quer dizer que deu certo.
Eu me sinto feliz, sem problema nenhum.
P - E o primeiro filho?
R - Primeira filha.
Essa nasceu em Araraquara, eu já estava no Santos.
É a Viviane.
Nasceu em Araraquara, foi dia primeiro, foi no carnaval, primeiro de março de 65, e a segunda, agora com 18 anos, é piracicabana, 20 de maio de 75, 10 anos depois.
P - Qual que é o segredo pra um casamento de 30 anos estar aí perdurando.
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R - Olha, o segredo meu é o seguinte, eu quando comecei a namorar Ana Maria, depois que ela soube que eu era jogador de futebol, eu já fui, ela já foi prevenida como é a vida de jogador de futebol.
Primeiro não pode ter ciúmes, começa por aí, apesar de que ela tem até hoje (risos), mas não é pra ter.
É uma vida, embora muita gente pense que é uma vida folgada, não é.
Vocês têm exemplo dos jogadores do São Paulo, você que tá sempre no meio deles, então toda essa prevenção foi seguida à risca por ela, então foi um casamento feliz.
São 29 anos de união, sem problema nenhum, graças a Deus.
Não, briga sempre tem, lógico, quem não briga? Não tem lua-de-mel sempre, é ou não é? Então tem que ter uma briguinha, mas uma coisa normal, normalíssima.
P - E nunca houve problema nenhum?
R - Grave nenhum.
P - Teve conhecimento com a.
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Relação com a Filhinha, torcedora assídua do São Paulo? Como é que foi essa amizade?
R - Filhinha, Filhinha.
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Essa o São Paulo merecia fazer uma estátua pra Filhinha.
P - Quem que era ela?
R - Filhinha era uma pessoa.
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Uma mãe pra gente, jogadores de futebol, eu me lembro muito bem dela desde o juvenil.
E sempre que vinha aqui fazia questão.
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Jogar contra o São Paulo, fazia questão de ver a Filhinha.
Depois eu fiquei um tempo afastado, fui pro exterior e tudo, e fiquei eu acho que praticamente 5 anos sem ver a Filhinha.
E quando veio, o São Paulo me homenageou aqui no Morumbi, não tenho bem certeza se foi vinte anos de Morumbi, ou vinte e cinco, acho que foi vinte anos.
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Eu voltei a ver a Filhinha, ah, me emocionei muito, sabe? A mesma coisa que não ter.
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A minha mãe há quantos anos que eu não via.
Quando eu vi a Filhinha, pra mim foi uma emoção tremenda, pra ela também, porque ela.
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Ela gostava, não de mim, de todos os jogadores do São Paulo.
P - Como você explica essa coisa do futebol, Peixinho, essa paixão? O que é o futebol pra você?
R - O futebol foi a minha vida, né, e é a minha vida, porque eu lido com garotos lá no Clube Atlético Piracicabano, na faixa de doze a dezessete anos, tem praticamente uns 150 a 200 meninos, e a gente é, uma paixão, é uma coisa, é a mesma coisa que você gostar de uma mulher.
E quando você fica sem, eu, por exemplo, quando voltei do Canadá, em Toronto, quando parei de jogar futebol, eu fiquei praticamente afastado uns dois anos, aí começou a morder, sabe? E parece brincadeira, mas é uma coisa que.
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É um vício, e começa a cutucar que você acaba voltando.
P - Mas fala um pouquinho então dessa tua ida pro Canadá, do Alto da Lapa pra morar no Canadá (riso).
R - Você vê como é que é.
Na ocasião inclusive eu tinha disputado uma excursão, feito uma excursão pelo .
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(?) da Europa, o Mauro era treinador do Curitiba, jogou comigo no São Paulo, jogou no Santos, e me convidou pra ir fazer uma excursão na Europa.
p - O Mauro Ramos de Oliveira?
R - O Mauro Ramos de Oliveira, pessoa que eu tenho em alta conta, também eu aprendi muito com ele na minha carreira.
E ele me convidou pra fazer uma excursão pro Curitiba.
Eu fui, fiz uns três meses com ele, depois voltei, falei: “bom, agora vou, vou parar de jogar futebol, eu vou montar alguma coisa e vou encerrar minha carreira”.
Antes disso eu tinha encaminhado um cunhado meu pro Canadá pra Toronto, hoje ele se encontra em Windsor estabelecido, mas a princípio foi Toronto.
E o Santos passando por lá, num restaurante, tomando um chá, ouviu a conversa do meu cunhado, ouviu uma conversa na delegação, que um treinador brasileiro tava querendo um jogador pro time dele e tal, e nesse papo meu cunhado gostou, conversou com o treinador, pô, meu cunhado joga.
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E o Pelé endossou tudo, sabe, falou: “Não, tem o Peixinho mesmo, é verdade e tal.
E ficou combinado entre eles, sem eu saber, que eles iam me levar pra lá, veja como é que é.
Aí meu cunhado me ligou e tal, eu falei: “não, eu não vou mais jogar futebol, eu.
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”.
Aí ele falou: “Não, mas o Pelé teve aqui e falou isso, falou aquilo e tal”.
Você vê como é que é.
Em consideração, eu falei: “Bom, será que o crioulo.
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” “Pô, eu não posso, tanto que ele me ajudou e tudo, principalmente nos bichos que ele ganhava”, bichos, é ou não é.
E ele fazia (risos).
Cortar só um pouquinho isso aí pra falar uma coisa que eu fazia no Santos, coisa que era gostoso fazer.
Eu era ponta, né? Batia escanteio, lateral, abraçava o negão, ele servia o bicho (risos) certo? Quatro coisas que muita gente queria fazer, né, certo? Então voltando ao assunto do Canadá.
Eu acabei aceitando a proposta e o Pelé deixou a camisa dele pra que eu entrasse, no dia da minha estréia com a camisa dele no campo, e aí fosse dada a camisa do clube que eu ia defender.
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P - Que time que era? Que cidade que era?
R - Era o First Portuguese de Toronto, no Canadá, e aconteceu isso, foi uma das coisas que marcou também na minha vida, que o estádio estava cheio, houve uma propaganda muito grande na minha estréia, justamente porque eu tinha jogado ao lado do Pelé.
P - Tua família foi junto, sua mulher.
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R - Não, não, eu fui sozinho, nessa ocasião eu fui sozinho.
E de fato eu adentrei o campo, as duas equipes se perfilaram e nós jogamos contra o representante da colônia italiana no Canadá, era rivalidade, a colônia italiana e a portuguesa, sabe.
Então, eu entrei com a camisa do Pelé e a madrinha do clube me esperando com a camisa do time que eu ia defender.
Aí eu tirei a camisa do Santos, entreguei pra ela, pra deixar pro clube como uma homenagem.
Aí vesti a camisa do clube, do First Portuguese.
Aí foi aquela festa.
P - E como é que foi morar um ano, quase um ano no Canadá sozinho? Naquele frio.
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R - Bom, eu quando fui pra lá, era verão ainda, eu já tinha estado no Canadá, jogando assim em excursão e tal, mais ou menos eu sabia que o clima era.
Agora, em Toronto que me pegou desprevenido, que as últimas partidas foram jogadas a dez graus abaixo de zero, sabe? Agora, eu me dei bem no Canadá.
Eu fui feliz no Canadá.
P - Você morava com quem, onde? Como é que era.
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R - Eu morava, eu morava com uma família portuguesa lá, que lá é costume no Canadá, num sobrado de três andares, por exemplo, uma família morar embaixo e outra no meio, outra em cima, e eu morava em cima e essa família morava no meio.
Fui muito bem tratado no Canadá.
Eu não tenho queixa nenhuma.
P - Você fez muitos amigos.
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R - Muitos amigos.
Por exemplo, toda semana eu fazia gol e lá então, a “portuguesada” lá, a colônia portuguesa tem.
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É uma faixa da cidade, então todos eles tinham comércio, loja, sapato, então era camisa, disco.
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Disco do.
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P - Padaria também ou não?
R - Padaria, açougue.
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Sabe o que eu ganhei muito lá? Disco do Teixeirinha (risos).
É duro.
A portuguesada adora o Teixeirinha, você sabe disso, né? Roberto Carlos, mas do Teixeirinha que eles gostavam mais.
Veja bem, vê lá como a vida é.
P - Como é que era ficar longe da família?
R - Ah, não é fácil não, sabe?
P - Sua filha tinha.
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R - Eu tinha uma filha só.
P - Na época você tinha.
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Pequenininha.
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R - É difícil, mas é como eu digo, a minha senhora foi educada pra isso, pra esse costume, quer dizer, eu viajava, ela ficava na casa dos meus pais, em São Paulo, com minha filha, quer dizer, não tinha problema nenhum.
P - Dava muita saudade? Vocês se falavam.
Escreviam-se?
R - A saudade dá.
Eu telefonava sempre.
Eu tinha esse, esse privilégio no clube lá.
P - E a dificuldade de comunicação, fora os portugueses, o pessoal falava o quê? Francês e inglês?
R - Não, não, inglês e francês.
P - E você falava o quê?
R - Eu falava alguma coisa de inglês, sabe? Eu enganava.
Não, porque você, um mês que você fique no meio deles.
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Porque não é difícil aprender inglês, por exemplo, você vai num supermercado, que lá supermercado são em cinco, seis andares, vai da caixa de fósforo ao avião, e eu fazia isso mesmo, dia de folga, eu ia no supermercado e ficava o dia inteiro rodando o supermercado, no começo, depois já .
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, né? Então eu via o que é aquilo e marcava, o que é.
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Então você vai indo.
Automaticamente, sem menos você esperar você está falando inglês, não é difícil, como eles vêm aqui e falam o português logo, você vê, o japonês não fala português.
Agora, eu acho que o japonês deve ser difícil, eu conversando com o Pepe outro dia, ele veio aqui com um clube do Japão, o Miuri (?).
Eu me dou com o Pepe muito até hoje.
Ele tava quase falando japonês, é brincadeira? Ele ficou um ano lá.
P - E a tua vida hoje, Peixinho?
R - Eu hoje trabalho na Camar.
É uma.
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É uma representação de peças para usinas e destilarias.
Trabalho com o Laudir, com o Henrique, com o filho dele.
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Somos em quatro, só.
Muito bem empregado, eles me tratam como um irmão, sabe? Toda vez que eu venho ao Morumbi, eles vêm comigo, me trazem, quer dizer, eu levo uma vida, graças a Deus, tranquila.
Eu não sou rico, mas o que eu tenho dá pra viver bem, moro numa casinha simples em Piracicaba, como você viu, uma edícula, um belo jardim da frente.
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Quer dizer, eu não tenho problema, churrasquinho, quando a molecada deixa de domingo, certo? Quando eu saio do Atlético à tarde, ou no sábado à tarde.
Eu levo uma vida normal, uma vida normal, sem luxo, mas com comodidade.
P - O que você acha do futebol brasileiro hoje? Qual é a tua relação com o futebol hoje?
R - A gente sempre acompanha porque está no sangue e houve uma melhora no futebol brasileiro, acentuada agora, há uns três anos atrás.
Eu não sei o que houve, a indisciplina tava muito grande.
Agora parece que tão querendo melhorar alguma coisa, certo? Em minha opinião, o Brasil continua sendo o maior celeiro de craques, e uma Seleção Brasileira, se os cartolas não atrapalharem, deixarem o treinador, seja ele quem for, treinar três meses, o time brasileiro é imbatível, mas que deixe o treinador trabalhar e ele também use a cabeça e convoque os melhores.
Sem política, porque o que estraga o futebol é a política.
Porque, não tenha a menor dúvida, o melhor futebol do mundo está aqui.
Dizem que o campeonato italiano é o melhor do mundo, mas é feito com jogadores estrangeiros, certo?
P - Agora, conta um pouquinho pra gente então desse seu trabalho com a meninada lá em Piracicaba.
R - É uma coisa que eu faço na faixa de doze a dezessete anos.
Eu procuro passar o que eu aprendi de certo dentro do futebol e na vida, porque o jogador de futebol aprende muito, sabe? Não é porque eu sou jogador, mas o jogador de futebol tem a vida, não uma vida normal, ele sempre sabe, não a mais que os outros, ele aprende mais que os outros, pelo sofrimento, porque é uma vida sofrida, não é beleza.
Todo mundo vê hoje um Müller, um Palhinha, tão em cima, mas veja o que eles passaram.
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Ninguém chega ao estrelato de graça.
P - Como é que é isso?
R - Nem sem sacrifícios.
P - Como é que foi, na sua experiência, isso?
R - Na minha foi assim, até levando café na cama pros jogadores, certo? Comecei assim, porque a maioria da meninada hoje.
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Por isso que eu gosto de ilustrar os meus, os meus meninos lá, por que.
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Mas olha não sei quantos mil dólares.
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Isso aí tudo bem, mas pra chegar nesses mil dólares, a gente passa por maus bocados.
p - Como é que era assim, você.
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O que você sentia na época? Você sentia que você podia ir longe.
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R - A gente quando é menino e vê os astros na frente da gente, a gente sempre almeja chegar, então a gente procura fazer de tudo.
Eu procurei fazer de tudo.
Eu trabalhava, mas eu treinava.
Podendo treinar sozinho, também treinava sozinho, porque a gente via no meu tempo, via um Canhoteiro, via um Mauro, e eu tava junto com eles, pra mim era inacreditável isso, de eu estar junto.
Então eu falava: “Puxa vida”.
Então eu pedia: “como é que faz, como é que não faz.
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”, e eles me ajudaram muito.
P - Você sentia que era uma oportunidade mesmo levar café na cama pra eles ou você se sentia.
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R - Não, eu me sentia não na obrigação não.
Eu, pra mim, era uma glória levar café pra eles na cama.
E eu me esqueço muito, perdão, eu não me esqueço do que o Canhoteiro falava pra mim, porque o Canhoteiro era um jogador que gostava muito da noite, foi um dos maiores jogadores que eu vi no mundo.
José Ribamar de Oliveira, Canhoteiro, quem viu pode falar.
Foi um que eu devo muito também da minha carreira, porque o Canhoteiro chegava pra mim, ele me chamava de baixinho: “Olha baixinho, você vai fazer de tudo na vida, você só não vai andar comigo” (risos), “porque você vai ser um bom jogador.
Se você andar comigo, você vai se perder e eu não quero isso pra você, porque eu gosto de você.
Então quando tiver aniversário da minha filha, meu aniversário, da minha senhora na minha casa, você vai lá tomar um guaraná, que eu mando te buscar”.
Quer dizer, porque.
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Isso deixava a gente grande pra burro: “ele gosta tanto da gente”, e era o Canhoteiro, pô, eu não era ninguém perto dele.
Quer dizer, tudo isso me ajudou muito.
Isso são as coisas que marcam na vida da gente.
O Gino.
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O Gino foi o.
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Hoje é o supervisor do Morumbi, quer dizer, a gente, quantas vezes eu pegava ônibus na Lapa, pra descer ali no Jardim Europa e pegar aquela perua velha que o São Paulo tinha pra ir treinar no Morumbi - que não era Morumbi - era terra só.
O Gino quanto me ensinou também, que era do meu bairro.
P – O que ele te falava? Você lembra alguma.
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R – Lembro! Ele falava: “ô, Peixe”, ele já tinha, ele era mais velho que eu uns quinze anos mais ou menos, doze, quinze anos.
Sempre aconselhava: “vai porque você vai ter futuro”.
Que às vezes nós próprios não enxergamos o futuro, porque ele não está lá ainda.
Agora, ele não.
Ele já tinha aquela visão.
Então, toda essa orientação do pessoal, desse pessoal que era mais.
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Mais antigo no São Paulo foi fundamental pra mim, quer dizer, eu aprendi com gente de experiência.
De Sordi já era Campeão do Mundo, Mauro.
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São pessoas vividas no meio e eu tive a felicidade de encontrar isso no São Paulo.
P - E o Vicente Feola, Peixinho?
R - O Feola foi outro pai pra mim, como o Caxambú que também foi.
P - Fala um pouquinho deles.
R - O seu Vicente.
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O seu Vicente era uma pessoa pacata como todo mundo, sabe? Muito amigo dos jogadores, conselheiros.
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Ele teve a pachorra de ficar me treinando chutar com o pé esquerdo, eram duas horas por dia, não é brincadeira.
Quer dizer, tudo isso me incentivava cada vez mais.
Por quê? Porque eu via do meu lado só craque, pô, e eu não era ninguém.
Agora, o seu Feola me dando essa atenção, era treinador da seleção campeã do mundo, pô.
Eu aprendi a chutar com a perna esquerda graças ao seu Feola.
P - Quais que eram seus sonhos de menino, assim?
R - Era ser jogador de futebol.
P - Aos quinze anos, assim?
R - Era ser jogador de futebol, mas nunca, nunca esperava chegar o dia.
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Nunca pensava que um dia ia ver um Pelé, e jogar ao lado do Pelé.
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E muito menos fazer o primeiro gol no Morumbi, certo?
P - Você nunca foi convocado pra Seleção Brasileira, né?
R - Não, eu treinei uma.
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Uma ocasião houve um treinamento em Serra Negra.
Então eu tive.
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Não, praticamente na Seleção, eu estava na Ferroviária, mas eu estava relacionado.
Inclusive eu tenho até jornais da Itália que eu estava entre os quatro pontas, que eram o Garrincha, o Julinho, na ocasião, o Jair da Costa, que era da Portuguesa, e eu.
P - Era covardia também, né?
R - Mas, não dá.
Eu era o menor, menor era mesmo por causa do meu tamanho.
Eu estava na Ferroviária, estava surgindo, e o Garrincha não preciso falar mais nada.
Foi o melhor ponta de todos os tempos, e tinha o Julinho em grande forma.
Eu tinha que bater mesmo, como eu bati palma mesmo.
P - Ela te perguntou do sonho de criança.
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E qual o seu maior sonho hoje?
R - Hoje? Hoje é passar o que eu aprendi de bom pra essas crianças que eu oriento em Piracicaba, no Clube Atlético Piracicabano.
P - O que você diz pra eles?
R - Eu sempre falo que futebol é um sacrifício de vida, mas desde que comece pela disciplina, pela vontade.
Jogador de futebol tem que ter vontade, precisa saber jogar, é lógico, mas tem que ter vontade e disciplina, e hoje em dia que há facilidade, não abandonar os estudos, mesmo jogando futebol.
Eu, por exemplo, se no meu tempo, houvesse a facilidade de hoje pra fazer o vestibular, pra fazer um curso de inglês, que hoje é uma facilidade, eu gostaria, mas eu não tive essa oportunidade.
Por isso que eu sempre aconselho essa meninada de hoje que tem, eu se tenho um diploma hoje, vamos dizer de preparador físico, pra mim era bom.
Eu não tive essa chance, essa meninada hoje tem.
Então a gente procura fazer isso: trabalhar dentro do campo o menino e o homem fora do campo, porque amanhã, se você encaminhar pra um clube, por exemplo, que nem você sabe, eu encaminho pro São Paulo, às vezes pro Santos, agora mais pro São Paulo.
Então a gente quer que esse menino chegue ao São Paulo como jogador de futebol, mas também como homem, que amanhã não venham reclamar: “Ô Peixe, você mandou um menino aqui, ele é bom dentro do campo, mas fora não”.
Eu não quero isso, então eu procuro passar isso pras crianças.
Jogador tudo bem, mas tem que ser homem o primeiro.
O futebol é o complemento de um sonho.
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P - E essas crianças o que elas te ensinam? A gente sabe que você tem muito pra ensinar pra elas, né?
R - Bom, a criança pra gente sempre ensina, parece mentira, mas é verdade.
Porque as crianças, por exemplo, elas sabem que joguei futebol, elas perguntam sempre do Pelé, certo? Então, a gente procura passar: “o Pelé era assim e tal”.
Pra eles verem.
Então, você nota aquela vontade, não é todo mundo que tem a felicidade de amanhã ser jogador de futebol, mas a maioria você nota, então você vê naquilo: “Mas eu também era assim?”.
Então você pensa e você aprende.
Aprende a humildade, aprende o amor, que é importante, certo? E a gente se sente recompensado dele olhar pra você e falar: “Puxa vida.
.
.
”.
E você nota que ele está pensando naquilo.
Não é que sou eu, pode ser qualquer outro jogador, mas só do fato de falar: “Não, pô, jogou com o Pelé”.
A gente sabe que por dentro ele está falando isso.
Então, isso é.
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Vem aqui dentro.
Então aí você procura dar mais ainda.
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Mais não, tudo que a gente sabe, certo? Eu vou procurar fazer isso até a hora que eu puder.
P - E o que você pensa do Brasil hoje, do nosso país?
R - Olha, sinceramente, eu sou muito patriota.
Eu quando vejo o Senna ganhar uma corrida que toca a música e ele sai com a bandeira, me reina.
Porque eu gosto disso aqui.
Quem viveu fora daqui é que dá valor às amizades, e no Brasil, falem o que quiser, mas o brasileiro sabe, o brasileiro tem o que os outros não tem, que é o amor, essa amizade, certo? Eu posso falar porque eu vivi fora daqui, então o que eu queria? A gente queria um Brasil bom, agora parece que tão querendo fazer alguma coisa.
P - O que é ruim no Brasil de hoje, Peixinho?
R - Está tudo aí, não? Esse aqui é o país mais rico do mundo, isso não é palavra minha, são eles lá fora quem falam.
Isso eu vi na França, vi na Alemanha, vi no Canadá, onde eu vivi, certo? Isso é uma opinião deles.
Apenas uma boa administração, mais nada.
A riqueza está aqui gente.
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P - Você acha, Peixinho, que foi importante você ter registrado aqui pra nós a história da tua vida?
R - Eu quero em primeiro lugar agradecer você Itamar e à Renata, me deixaram muito à vontade, isso vai marcar a minha vida também.
Isso é uma das coisas que vão ficar marcadas, certo? Eu me sinto muito agradecido, vocês me deixaram à vontade.
P - Nós que agradecemos muito, foi uma entrevista muito boa, contou coisas muito bonitas aí!
R - A gente faz o que pode.
P - Ficou bom porque você é pessoa que fala com emoção, assim.
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R - Eu falo o que sinto.
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P - Tem emoção.
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R - Eu não posso fingir, eu não posso porque está em mim.
P - E ficou uma entrevista bonita por que .
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(?), que faz parte de dentro.
R - Tem muita coisa ainda que a gente poderia lembrar.
P - Peixinho, como é o seu relacionamento com as suas filhas? Como que é ser pai, ser avô?
R - Ah, eu sempre me dei bem com as minhas filhas.
A Viviane, que é mais velha, é casada agora, inclusive agora me deu um netinho.
P - Como é que ele se chama?
R - Guilherme.
Vamos ver se vai sair um craque aí, a gente espera! E a Daniela, que é a mais nova, dezoito anos, é mais pra frente, porque a coisa mudou muito agora.
Mas a gente procura acompanhar, entender, orientar.
P - A mais velha viveu muito tempo sem a tua presença.
Isso atrapalhou de alguma forma o relacionamento de vocês, a atitude de você em relação a ela?
R - Não, não atrapalhou em nada não.
Eu, graças a Deus, tenho duas filhas muito boas.
Eu procurei seguir a linha da educação que meu pai me deu, certo? Não é nada rígida, é uma coisa mais amigável, com diálogo, então de forma que não há problema nenhum.
A gente vem, diz assim: “Olha minhas filhas.
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”
P - O fato.
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Para elas.
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Um dia alguém comentou com você alguma coisa, o fato de pai dela ser um ídolo, ser uma pessoa famosa, de alguma maneira atrapalhou a vida dela ou ajudou.
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Enfim, interfere, ou interferiu, na formação dela?
R – Sempre.
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A curiosidade das colegas sempre há, né? Então ela.
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Graças a Deus, eu na minha carreira eu fui feliz.
Então ela sentia uma ponta de orgulho, não tenho dúvida, ela sempre falava pra mim: “Ah, papai, o pessoal fala bem do senhor”, e tal.
A gente gosta, não quer que fale mal.
P - E no dia que você perdia, que você jogava mal, que seu time perdia?
R - Ela era pequena ainda, então ela já não entendia muito.
Agora, eu digo assim, depois, mesmo quando eu parei, que o pessoal sempre comenta, né? Então, quando comentário era favorável, graças a Deus, a maioria era favorável, ela sempre me falava que sentia orgulho, e a gente gosta disso, é lógico.
P- Mas teve algum dia que você teve uma tristeza muito grande no futebol, que fez você, sei lá, chorar, por exemplo?
R - Não, eu volto a repetir, eu fui feliz na minha carreira.
De tristeza do futebol, eu sinceramente, não guardo nada.
P - E da vida?
R - Nem da vida.
P - Um dia assim que você ficou muito decepcionado com alguma coisa.
R - Quer dizer, eu senti um pouco em sair do São Paulo, certo? A realidade é essa.
Essa foi uma das coisas que me marcaram de modo muito direto, mas o resto não.
Eu, por exemplo, na minha carreira como atleta.
Eu, praticamente, em dezenove anos parei apenas quinze dias, foram duas distensões só.
O resto eu joguei todas as partidas, normalmente era titular e isso era uma grande coisa, porque o jogador que, não se machucando, estando sempre em atividade, está sempre em evidência.
Porque o jogador pode ser bom, mas se não estiver em evidência jogando, sai fora mesmo, isso não tem dúvida nenhuma.
Um exemplo é agora, porque depois que você para de jogar.
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Eu, graças a Deus, tive esse privilégio de fazer o primeiro gol no Morumbi, então todo ano há aquela renovação: “Quem fez o primeiro gol?” “Foi o fulano.
” Então a gente sempre é lembrado, mas tem muitos craques que eu conheço que nem citam o nome hoje.
P - Por exemplo.
R - Ah, muitos viu.
P - Canhoteiro, por exemplo? Porque que ele não foi pra Seleção, não virou um ídolo?
R - Ele não foi porque ele próprio dizia que a Seleção não era o lugar dele, que ele queria liberdade, certo? Foi o que ele não quis, quis pra mim, e ele estava certíssimo, né?
P - Agora, como que é hoje em dia? O que você sente quando você é reconhecido pelas pessoas, quando acontece de você ser reconhecido pelas pessoas mais jovens?
R - A gente sente.
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Porque, por exemplo, no Atlético Piracicabano o pai fala pro filho lá, deve falar e tal, e o menino: “é verdade que você jogou com o Pelé, não sei o quê?” Quer dizer, a gente intimamente fica orgulhoso, puxa vida que.
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É gostoso, olha, não há dúvida, seja quem for, quando é reconhecido, principalmente em público, a gente fica contente.
Vem tudo aquilo de volta.
P - Você se lembra de alguma história de reconhecimento que você possa contar pra gente, que foi, que marcou, que foi interessante?
R - Houve uma passagem na minha carreira que marcou muito, pra mim principalmente.
Eu quando jogava na Ferroviária, o Bangu tinha um presidente que era o Castor de Andrade, nome de um bicho aí.
E ele tentou me contratar umas duas ou três vezes, quando eu estava na Ferroviária.
Aí eu vim pro Santos e ele também fez uma tentativa no Santos, mas também não houve negócio.
Aí do Santos eu fui pro Comercial de Ribeirão Preto.
Em 67, o Bangu foi convidado, por ter sido campeão carioca, pra disputar o primeiro campeonato norte-americano de futebol nos Estados Unidos, representando a cidade de Houston, no Texas.
E ele veio a Ribeirão Preto e me convidou.
E o Comercial em definitivo não queria me ceder, tudo isso porque um dia o Santos foi prestar uma homenagem aos clubes cariocas no Maracanã jogando contra o Flamengo, se não me engano, e cada jogador do Santos entrou com uma camisa diferente.
Eu recordo que o Pelé na ocasião entrou com a do Vasco, eu entrei com a do Bangu.
E ele voltou a afirmar: “qualquer dia, haja o que houver, você vai jogar com a camisa do Bangu”.
P - E você gostava do Bangu ou foi por acaso?
R - Não, eu.
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Não é que eu gostava do Bangu, eu queria ver um desejo meu satisfeito e satisfazer o desejo do Castor de Andrade.
P - Não, mas porque você foi com a camisa do Bangu?
R - Fui escolhido na hora pra representar a camisa do Bangu.
E eu, de ver tanto o interesse do Castor de Andrade, o Bangu tinha sido campeão, mas pra mim foi orgulho ele ter me convidado.
E de fato ele conseguiu um prazo de três meses pra eu disputar esse campeonato em Houston, onde nós jogamos no primeiro estádio encoberto, com ar condicionado e grama de nylon, que é considerada a oitava maravilha do mundo.
Uma das outras coisas que marcaram na minha vida.
Por isso que eu digo e repito, eu fui feliz na minha carreira.
P - Como que era São Paulo nessa época? Como que era viver em São Paulo? Hoje todo mundo tem medo de assalto, enfim, o perigo da cidade, a poluição.
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Naquela época como que era morar em São Paulo?
R - Ah, São Paulo.
Não tinha problema nenhum, você podia ir da Penha à Lapa a pé, de madrugada, dificilmente alguma coisa acontecia.
Quer dizer, a gente vivia sem problema nenhum.
p - Quais eram as coisas boas da cidade? O que você gostava de fazer? Onde é que você se divertia?
R - Olha, aquele tempo era o cineminha ao ar livre no Colégio Dom Bosco.
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P - Que filme passava? Você se lembra de algum filme.
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R – “Gordo e o Magro”, a preferência era o “Gordo e o Magro”, como é que é? George Roger (Roy Rogers?), “Tarzan”.
P - Mazzaropi.
R - Mazzaropi.
Mazzaropi estava começando, me lembro bem do Oscarito, Grande Otelo, falecido recentemente, Anselmo Duarte, Eliana, tinha outra.
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Adelaide Chiozzo, que tocava acordeão, esses eram meus preferidos.
P - Qual era a atriz dos seus sonhos? Aquela que a gente não esquece.
R - A gente gostava da Eliana naquele tempo.
Lembro-me de um seriado, rapaz, que assisti no Cine Nacional, onde hoje é Olímpia, seriado do Homem Foguete.
Rapaz, isso me lembro perfeitamente.
Na ocasião não tinha nada que tem hoje, discoteca, não existia isso aí, era só cinema praticamente, parque de diversões.
P - Aonde que você ia?
R – Circo, a minha vó me levava muito no Piolim, no Simplício que tinha circo também.
Eu gostava muito de circo, por sinal meu avô Poffo tinha um circo.
P - Esse Poffo o que é? Italiano?
R - É italiano, é tirolês.
Puffo é do Tirol, que pertencia a Áustria, hoje se eu não me engano é possessão italiana, era divisa da Itália.
P - Mas os seus pais nasceram no Brasil?
R - No Brasil.
P - Qual cidade que eles nasceram? Você não sabe?
R - O meu pai nasceu em São Paulo, minha mãe em Rocinha, hoje Vinhedo.
Daí que começou o circo do meu avô.
P – E você estava contando a história do circo do seu avô, como é que.
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R - O meu avô começou trabalhando em circo.
P - O que ele fazia?
R - Ele era.
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O pessoal que engole fogo, ele enfiava aquelas agulhas no braço sem sair sangue.
P - Comia Gillette?
R - Não, Gillette não, porque naquele tempo não tinha Gillette pra comer.
(risos) Gillette não.
Era prestidigitador que eles falavam naquele tempo, aí depois ele adquiriu um circo próprio.
Aí ele contratava Simplício, esse pessoal aí.
P - Você já era nascido? Já era.
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R - Já, meu avô me acompanhou muito, ele é falecido hoje.
O pai do meu pai eu não cheguei a conhecer, mas o pai da minha mãe sempre me acompanhou no futebol.
Ele inclusive era meio garganta, italiano, sabe? E falava pra chuchu, rapaz.
P - O orgulho, né?
R - Sempre arrumava rolo, não pro meu lado, pro lado dele mesmo, né?
P - Você invadia o circo? Pagava ingresso ou passava por baixo da empanada?
R – Não.
O circo era do meu avô, né? Então eu entrava de graça.
P – E os outros circos?
R - Os outros a minha avó me levava, minha avó gostava, então.
P - E como é que era estar no circo?
R - Naquele tempo era um dos principais divertimentos, né? Eu gostava, admirava muito o Piolim, o Simplício, esse que trabalha ainda no SBT, do meu tempo.
Simplício era impagável na parte cômica, e ele quando fazia uma encenação do.
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Do fim do ano, como que chama? Não Natal, paixão de Cristo, ele fazia o papel de Cristo, mas era perfeito.
Lembro-me porque o circo era.
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Ele fazia no circo dele e fazia no circo do meu avô.
E a cabeleira dele as minhas tias, que eram manicure e cabeleireira, que penteavam, e eu via tudo isso.
P - E aquelas tragédias que passavam aquelas peças de teatro, você lembra-se de alguma coisa no circo?
R - Ah, lembro.
O Simplício às vezes fazia o papel meio sério sabe, mas a gente dava risada com a cara dele, não adiantava nada (risos).
O São Paulo também quando, na maioria das ocasiões o São Paulo concentrava, treinava de manhã, concentrava à tarde, e à noite sempre nos levava no teatro.
Sempre o São Paulo fez isso, e é muito bom pros jogadores isso, deixa a mente bem clara.
P - E essa história de o jogador ser vigiado na sua época, passava um cara na sua casa pra ver se você tava lá?
R - O São Paulo tinha isso.
P - Como que era isso?
R - Era um tal de.
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Não sei se era Machadinho, era um pequeninho, sabe? E ele ia às 10 horas na casa do pessoal pro pessoal marcar o ponto, o São Paulo fazia isso.
P - Algum dia você foi pego?
R - Não, não.
Nunca.
Ele nunca apareceu na minha casa, mas eu sabia que na casa dos outros ele ia (risos).
P - Mas o Luizinho parece que tinha alguma dificuldade com isso.
R - Tinha um par deles que tinha problema.
Agora, aí é que está, são jogadores que fora do campo tinham uma vida desregrada, gostavam.
Agora, dentro do campo produziam, sabe?
P - Você acha que é fundamental a concentração antes do jogo.
R - Concentração acredito que um dia antes do jogo não é mal.
P - Mesmo pros casados?
R - Agora, dois ou três dias não.
Eu não aconselho.
P - Por quê? O que era ruim?
R - Eu acho que é monótono pro jogador e fica.
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Na própria palavra, concentra demais, sabe? Então, você vindo só pra dormir na concentração, jogando no dia seguinte, tudo bem.
Eu acho que o jogador tem que ter responsabilidade porque ele está ganhando do clube e, mentalizando isso, ele tem que ter uma consciência de trabalho.
É o que a gente procura passar desde doze anos, sabe? Pra ver se chega, quando chegar ao ponto, já chega preparado pra isso.
É a melhor profissão do mundo, Então, sendo a melhor, você tem que encarar ela com seriedade e hombridade.
Para tirar proveito disso, né? Os dólares tão aí rolando.
P - Você viu algum jogador, um craque da sua época, que esteja ou que tenha ficado na amargura na vida? Na pobreza ou que esteja hoje pobre, teve glória e que hoje está passando dificuldade?
R - Eu, sinceramente, assim, eu não sei, sabe? E mesmo se soubesse eu não teria assim coragem de.
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Porque isso é uma coisa muito triste, sabe? Agora, em parte, o jogador é culpado.
Porque o jogador de futebol pensa que ele nunca vai precisar trabalhar na vida.
E ele tem vergonha de trabalhar.
E o trabalho não é vergonha pra ninguém, certo?
P - Agora você.
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R - Muita gente que pensou que ia ser sempre aquele ídolo hoje pode estar se dando mal.
P - Você jogou com o Ferrari, que foi lateral do Palmeiras?
R - Joguei.
Era um dos maiores marcadores que eu tive, foi um dos melhores laterais-esquerdos que eu vi jogar também, certo?
P - Como é que ele está hoje? Você sabe?
R - Não sei, não sei.
Porque as pessoas vêm falar certas coisas pra gente, mas precisa ver se é verídico, entendeu? Então, eu acho que não fica bem a gente passar uma coisa que você não constatou e eu não faço esse tipo de coisa, porque pra mim machuca e.
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Sabe? Se eu souber que o cara está mal, eu não vou ficar contente.
P - Você nunca foi expulso, mas e o Almir Pernambuquinho, você jogou com ele?
R - Aí, está vendo? O Almir era um excelente amigo, agora, o Almir se transformava muito dentro do campo.
Então o Almir, no afã de defender os colegas, ele se prejudicava.
Fora do campo às vezes também era a mesma coisa.
Ele comprava briga, você vê que ele foi morto bestamente pra defender uma moça, com um tiro nas costas, porque pela frente era difícil.
P - Ele brigava muito, Peixinho?
R - Brigava, pra brigar ele era bom de briga.
P - Conta uma briga aí que você se lembra dele, dentro ou fora do campo.
R - Tem uma passagem, dentro do campo, nós fomos pra disputar a Libertadores da América contra o Independente e a.
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E o Almir teve uma passagem pelo Boca Juniors.
E eu tava jogando na ponta e ele na meia-direita, o Pelé, se não me engano, não jogou esse jogo.
E o lateral-esquerdo, na primeira bola que eu peguei ele me jogou na pista, na segunda a mesma coisa.
Aí o Almir encostou em mim, e ele falou: “Baixinho, deixe.
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” Ele me chamava de “Baixinho”, no Santos era só Baixinho, não era Peixinho, era Baixinho mesmo, era o menor de todos.
Ele falou: “Baixinho, deixa eu jogar um pouco na ponta mas que não, já abusou demais”.
E eu o conhecia, falei: “Deixa pra lá, não tem nada não, vou em cima de novo”.
“Não, não, não”.
E eu fui e tudo bem.
E o jogo, você vê, o lance estava na nossa área grande, quando a bandeirinha acenou desse lado.
Aí, nós fomos ver, o lateral-esquerdo tava com isso aqui tudo rachado, depois nós ficamos sabendo que ele sem bola sem nada, ele foi e deu, arrebentou o rapaz todo, estourou mesmo, sabe? Aí, ficamos sabendo que ele tinha dado cotovelada sem bola e tal.
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P - Foi expulso ou não?
R - Tirou o cara do jogo também.
P - Mas ele foi expulso?
R - Ele foi expulso.
Na saída, a.
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É um campo, não é grande, sabe? Pra sair ali, é outra coisa que eu não vou esquecer, era só moedinha que você.
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P - Da torcida?
R - A torcida jogava, e moeda machuca, né? Era só moeda quando o Almir saiu, mas encheu o campo de moeda, rapaz.
Era uma coisa que.
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São passagens que a gente não esquece.
P - E aquela briga dele no Flamengo contra o Bangu? Você lembra? Você não jogava lá.
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R - Não, só vi na televisão.
Eu tava na Ferroviária nesse tempo.
P - Foi uma briga feia.
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R - É, ele pulou em cima do Ladeira, se não me engano.
P - É o mesmo que jogou no Guarani?
R - É o mesmo.
É de Limeira.
Adailton Ladeira ele chama.
Eu quando fui com o Bangu nessa excursão pros Estados Unidos, ele estava saindo do Bangu.
P - Você vê alguma semelhança do Almir com o Edmundo, por exemplo? Fora de campo é amigo de todo mundo, uma pessoa dócil, dentro de campo ele se transforma, tem alguma semelhança com o Edmundo do Palmeiras? Esse lado, assim, de personalidade?
R - Eu acho que o Almir era um pouco mais violento fora do campo, violento pra defender os amigos, certo? Não que partisse dele.
Ele era um cara tranquilo, ele era de poucas palavras, mas ele.
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Se mexesse com alguém perto dele, ele comprava na hora.
Agora, como jogador, foi um dos maiores jogadores que eu já vi na minha vida.
P - Muito habilidoso, não é?
R - Demais, habilidoso, cabeceava muito bem apesar de ser de pequena estatura.
Esse foi outro jogador injustiçado, em minha opinião, mas injustiçado pela parte disciplinar, né? Como jogador de futebol, muito bom, não jogava no Santos porque o Pelé era o titular.
Aí não tinha jeito.
E quando entrava cumpria o papel, você vê que ele deu o bicampeonato para o Santos.
P - Inventou até o pênalti não é, Peixinho?
R - Ah, ele pra essas coisas era um artista.
P - Foi pênalti, aquele lance contra o Milan, ou não?
R - Não sei, eu não estava lá, eu fui um mês depois pra lá.
P - Peixinho, bom, como a gente pode ver, futebol acaba sendo a sua vida mesmo.
Eu queria que você dissesse pra gente assim, se você não fosse jogador de futebol, o que você.
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Na verdade, o que você não fez na sua vida que talvez você gostasse de fazer ou ainda tem esse plano pro futuro?
P - Não, eu o que eu sempre sonhei mesmo foi jogar futebol sabe.
Fora disso eu não tinha pensado em nada, né? Então, quando eu parei de jogar futebol, eu, por exemplo, comprei um restaurante em Piracicaba.
Como eu falo pra você, o jogador de futebol ele sempre pensa que vai ser o ídolo a vida toda, e não é nada disso.
Um dia ele vai ter que voltar a trabalhar, principalmente na nossa época, que a gente não ganhava tudo isso que estão ganhando hoje.
Então, eu procurei aproveitar o meu nome, usar o meu nome pra esse fim, de restaurante.
E poderia estar com o restaurante até hoje se não tivesse que ceder o prédio pro dono do prédio, certo? Senão, caso contrário, não saía.
Estaria com o restaurante até hoje, estaria usando o meu nome ainda, que a gente tem boa amizade, e no interior, você sabe, é mais fácil viver.
As amizades são boas, a gente é considerado.
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Então, você mantendo um nível de vida, de amizade boa, no comércio funciona muito bem.
Então, você pode tirar proveito disso.
Agora, como eu tive que parar aí, estou muito bem empregado na Camar e trabalhando com as crianças que é o meu ideal, né?
P - Agora, você tinha algum sonho infantil que fosse fora do futebol? Alguma coisa que quando você era muito pequeno você pensava, sei lá, sonhava em ser médico, alguma coisa assim ou não, desde o começo sempre foi futebol?
R - Era futebol.
Primeiro porque eu não ia ter condições de estudar certo, meus pais sempre foram pobres.
Meu pai foi jogador de futebol, já estava no sangue, meu sonho era aquele, né? E um dia jogar no São Paulo.
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Eu sempre fui são-paulino, desde pequeno, não é porque eu comecei no.
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Sempre fui.
Agora, você imagina tudo isso, você estando no São Paulo, quer dizer, é um sonho realizado.
E ter feito o primeiro gol no Morumbi, ainda.
P - Fala um pouquinho.
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R – O que eu posso me queixar, me diga?
P – ( ___ ) dessa mágoa.
R - Só me queixo de não ter ganhado muito dinheiro, só isso.
Ainda bem que o dinheiro não é tudo.
Ajuda, é um mal necessário.
P - Então fala um pouquinho mais dessa mágoa que foi sair do São Paulo.
R - É por que.
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Então, eu sou são-paulino, não é? Quer dizer, nada melhor que defender uma coisa que você gosta, mas obrigado eu não fui, certo? Quer dizer, eu não gostaria de sair, mas eu tive que pensar na carreira também.
Eu vi uma possibilidade, conversando com esse José Guilherme Agnelli da Ferroviária, que eu podia ter uma ascensão, porque eu ia jogar mais tranqüilo, a pressão num clube pequeno sempre é menor que um clube grande, era um time armado.
Isso ele me explicando, porque eu era ainda novo na profissão.
E eu me dei bem.
Agora, que é lógico que eu não gostaria de ter saído do São Paulo, não gostaria mesmo.
P - Te pegou de surpresa, você ficou triste? Como é que foi?
R - A princípio fiquei, mas depois começaram a vir os gols, e na estréia contra o Sport Clube Bahia, na Ferroviária, eu estreei fora de Araraquara.
Mas na minha estréia na cidade nós ganhamos de cinco a dois, eu fiz um gol de bicicleta, então aquilo me deixou mais entusiasmado.
E o apoio que eu recebi da imprensa, eu sempre me dei muito bem com a imprensa, amizade, tratando os outros bem.
Esse foi o meu.
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Sempre o meu feitio.
E a torcida me apoiou muito em Araraquara.
Eu não pagava cinema, refrigerante, eu não pagava nada em Araraquara.
Tudo isso me ajudou muito, que eu fui pro Santos, que na ocasião era o melhor time do mundo.
Quer dizer, o primeiro sonho foi jogar no São Paulo.
O segundo foi inesperado.
Foi, não sonhava, em fazer o primeiro gol no Morumbi, depois tive uma boa passagem pela Ferroviária e culminar com o Santos, que é o maior time do mundo.
De forma que.
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Certo? Só faltou ir pra Seleção Brasileira mesmo.
P - Quem foi seu primeiro técnico no Santos?
R - No Santos foi o Lula, que contratou.
P - Fala um pouquinho do Lula.
R - O Lula, excelente pessoa.
O Lula era mais um.
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Assim, uma pessoa que fazia mais um ambiente entre os jogadores do que propriamente um treinador tático.
P - Verdade que ele dormia no banco de reserva quando o jogo estava correndo?
R - Não, quem dormia de vez em quando era o Feola.
P - O Lula também, dizem que o time jogava tão bem que ele dormia no banco, é verdade?
R - Não, o Lula, o interessante do Lula.
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A preleção do Lula, que era interessante.
P - Como é que era?
R - Então, ele chamava a gente no quartinho lá dele, um quartinho que cabia.
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Cabiam, os onze mesmo e ele, porque ele era gordão, né? Cabiam os onze e ele.
Então a gente punha lá a mão uma em cima da outra.
Então começava ele e o Gilmar, fechava ele e o Gilmar.
Isso era a preleção dele, falou: “Vamos lá nossa Senhora Aparecida e Deus nos ajude e o bom somos nós e o problema é deles”.
Essa era a preleção do Santos Futebol Clube.
P - Hoje o técnico fica uma hora falando.
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R - E o problema era dos outros mesmo, porque era de cinco, seis, sete, sempre, quer dizer, ele tinha razão, né? E ele sempre falava: “o que eu vou falar aqui? Falar pro Gilmar pegar a bola de que jeito, pro Zito jogar de que maneira”, quer dizer, não tinha.
P - É verdade que o Zito xingava o “Negão”, mandava no Pelé? Mandava assim, o Pelé obedecia o Zito?
R - Não, o cabeça do Santos era o Zito, como é até hoje, até hoje.
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Agora o Zito era um jogador de muito sangue, craque.
Nem preciso falar.
Agora, ele inflamava o time todo.
Ele e o “Negão” brigavam o jogo inteiro, mas a questão é que no fim do jogo era cinco ou seis pra gente, o importante estava aí.
Saiu do campo, acabou.
P - Mas o “Negão” aceitava as ordens do Zito?
R - Aceitava e retrucava.
Isso era uma coisa quase normal sabe, não é? Você xingar pelo bem, ninguém.
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No Santos não tinha esse negócio de ofender.
Xingar assim, normalmente, né? Agora aquilo era pra haver produção e a produção vinha em grande escala, viu?
P - Vocês praticamente não treinavam, jogavam dia sim, dia não?
R - Não, o Santos praticamente não treinava.
O pessoal fala: “É, o Pelé se arrebentava de treinar”.
Não, não é nada disso.
O “Negão” tinha um condicionamento físico fora de série, uma saúde extraordinária.
Você vê que o nosso treinamento, do nosso coletivo, às vezes dois toques o “Crioulo” treinava no gol, foi o melhor goleiro que eu vi na minha vida.
É o Pelé, melhor goleiro que eu vi na minha vida.
P - Ele jogou várias vezes no gol, né?
R - Pegando pênalti e tudo.
Nosso.
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Nós tínhamos no fim do ano um time na praia, jogavam os jogadores dos outros times também, o goleiro era o “Crioulo”, na linha era covardia, mas no gol jogava ele.
P - Por que o Santos ganhou tanto dinheiro e é um time, de certa forma, pobre, sem patrimônio até hoje? Pra onde foi o dinheiro do Santos, Peixinho?
R - O Santos ganhou dinheiro sim.
P - Pra onde foi esse dinheiro?
R - Eu também queria saber, viu? Para os jogadores é que não foi.
Você tira uma base, o Santos cobrava por excursão - tem outro detalhe aí - com o “Crioulo” 40 mil dólares livres, isso em 1964.
Sem o “Crioulo”, 12.
500 dólares.
E aí vem a outra parte humana do Pelé e de companheirismo, quantas vezes o Pelé viajou com o tornozelo inchado, machucado, pra ajudar os companheiros, porque com o Pelé a nossa diária era de cinco dólares, sem o Pelé era de 2,5 dólares.
O bicho com o Pelé era 250, sem o Pelé era 125.
Então, você veja até aonde ia a consciência do negrão.
P - E com ele no time a chance de ganhar o bicho era maior, né?
R - Marcava três vezes, não sobrava gente, entendeu? Por isso que eu falei aquilo pra você, pra bater escanteio e lateral, abraçar o “Negão” e receber o bicho, certo? (risos).
P - E conhecer o mundo, você é pessoa humilde, pobre.
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Você conheceu quais países?
R - É o que eu digo, eu fui feliz aí também, porque eu conheço cinqüenta e quatro países.
P - Qual o mais estranho, mais exótico, mais diferente que você conheceu? Que te marcou, assim, você não imaginava ter um país daquele tipo? Você lembra?
R - Assim diferente conheci a Argélia, pro lado do Oriente lá.
Deserto e tal,era diferente mesmo.
P - Você jogava no deserto, nos países.
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R - Eu joguei, joguei na.
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Arábia.
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P - Riad.
R - Não, em Riad não joguei.
Joguei na capital da Argélia, Argel, joguei em um campo de areia.
E lá é bonito, porque o pessoal vai todo de branco no campo, todos eles vão com aquela manta branca, sabe? Onde as mulheres usam o véu, então a mulher vai na frente e o marido vai atrás.
E a maioria usa o.
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A sola do pé pintada, as mulheres, cada um pertence a uma religião deles lá, uma pé roxo, outra pé vermelho, outra pé azul.
E a gente ficava na porta do hotel só olhando.
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Brasileiro já viu, né? “Vamos ver que pé que vem aí!” (risos).
“Lá vem o pé roxo”.
P - Até porque não dava pra olhar outra coisa, né?
R - Brasileiro já.
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Não dava pra ver nada, só o pé.
Então, os detalhes que a gente ficava apreciando na porta do hotel.
P - Peixinho, conta aquela.
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Você deve saber disso, pode abrir aí, aquelas histórias de gafe famosas de jogadores humildes que chegam naqueles hotéis grã-finos, aeroporto, aquelas gafes históricas, tipo do Garrincha que quis devolver o rádio porque só falava sueco na Suécia, entendeu?
R - Isso acontece mesmo, viu? É, tem as figurinhas sempre.
R - Sabe, coca-cola é coca-cola em qualquer lugar, aí já vem “cueca-cuela”, entendeu (risos)? Isso é próprio da pessoa que nunca viajou.
P - Ele pediu “cueca-cuela”?
R - É, “cueca-cuela” (risos).
No avião, esse negócio do saquinho, saquinho de.
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Que a gente fala pros caras: “tem que comprar isso aí”; “vai ter que pagar o almoço”, mas isso entra mesmo, viu?
P - Teve algum deles que pagou almoço no avião.
R – Ah! E dois dólares e cinqüenta o almoço.
P - E o cara foi pagar?
R - Ah, foi.
Que.
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Mas isso não é um nem dois, são vários.
P - Conta de um que.
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R - Ah, eu não quero citar nome.
Por que.
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P - Não, isso não tem problema nenhum.
R - Ah, tem.
P - Foi pagar pra quem, pro piloto?
R - Não, pra aeromoça.
(risos)
P - Pagou dez por cento ainda, ou não?
R – Isso, o cara estava sentado atrás, o malandro sempre fica no meio, o cara está lá e você está no meio do avião.
P - Quem que era o malandro, que era.
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R – Figurinhas, sabe? Pepe, Coutinho.
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E na Ferroviária eu era o mais.
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Um pouquinho mais viajado, né? Na segunda vez isso, aí a gente vai na frente.
Vai no meio do avião ou na frente, não tem.
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Os primeiros, os marinheiros, vão sempre atrás, porque a gente fala: “o avião, se cair, a parte de trás sobra, a da frente não”.
Então, os “Miguel” vão todos atrás.
E, de fato, é normal isso mesmo, aí você já: “quando ela vier aí você já deixa o dinheiro preparado”.
Ah, mas não dá outra, você só fica aqui pra trás e vai mesmo.
P - Vai pagar.
R - Se você fala, eles obedecem, isso é, na primeira viagem.
Obedecem cegamente ainda.
P - E tinham alguns deles que morriam de medo de avião?
R - Hã?
P - Aqueles que tinham medo.
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O Gerson, que não viajava.
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R - O Canhoteiro! O Canhoteiro, Nossa Senhora!
P - Dizem que é um dos motivos de ele não ter vingado, porque não viajava também.
R - A verdade é a seguinte, viu? Falar que ninguém tem medo de avião é mentira, pelo menos um pouquinho todo mundo tem.
Porque você sobe e não sabe se vai chegar, ninguém te garante que você vai chegar.
Nós passamos.
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Eu passei uma vez no São Paulo, uma vez no Curitiba, e uma vez no Santos.
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P - Como é que foi?
R - Três vezes que a coisa ia embora.
Primeiro foi no México, o São Paulo, o tempo do quadrimotor, era.
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Não era, não tinha jato ainda, as primeiras viagens que eu fiz pelo São Paulo.
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Isso foi em 60 ou 59, não estou bem recordado.
O avião quase despenca, mas na hora “H” ele conseguiu levantar, a coisa veio aqui.
O Coritiba foi na França, em Nantes, uma cidade do interior da França, olha, eu vi as casas de perto, viu? Olha, é duro, viu velho.
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P - O avião perdeu a altura?
R - Perdeu a altura.
Estava um nevoeiro muito grande e veio, vinha vindo então.
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Eu não sei, é por Deus mesmo, por que.
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P - Em que você pensava nessa hora?
R - Ah, você pensa.
A vida te passa, num segundo, inteira, parece mentira.
Você se lembra de todos e de tudo na hora e, olha, parece um filme na hora.
P - Você tem medo de morrer, Peixinho?
R - Não, não tenho medo não.
P - Nem com o avião meio querendo cair?
R - Não, você tem medo de.
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Não sabe se é de morrer ou do quê, mas que dá medo dá (risos).
Outra vez, foi aqui, o mais feio foi com o Santos, parece que quando o Pelé está no avião não cai, o Crioulo estava.
P - Quem que falava?
R - Se o Crioulo estiver junto, tudo bem.
O Crioulo não viajava, o pessoal ficava cabreiro, sabe? Esse dia.
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Foi aqui em Minas, em Minas tem muito bico, né? Esse dia o avião desligou e ficou tudo escuro.
Ah deu.
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Aí você vê os valentes, viu? Aí, meu Deus do céu.
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(risos) A gente dá risada agora, mas na hora.
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P - O que acontece dentro de um avião que está pra cair?
R - Ah, a pane é duro, viu? Ô, dá pane geral.
P - Muita histeria?
R - Ah, você vê nego rezando, chamando Deus do céu, chama de tudo, né?
P - Até quem não acredita em Deus.
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R – Hã?
P - Até quem não acredita em Deus.
R - Ah, aí você vê.
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Valente nessa hora, meu.
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É triste, viu, é desagradável mesmo.
P - Tem várias histórias do Santos, jogando no exterior.
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Chegavam lá os empresários desapareciam com o dinheiro, não pagavam.
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R - Não, na minha época não.
P - Você não lembra?
R - Não.
P – (_____________) fazia de dez jogos e ia rodando.
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R – Não.
Ma minha época, inclusive, no meu tempo a gente jogava, por exemplo, vou te citar um.
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Exemplo não, é uma verdade.
Na Europa, naquele tempo, não se jogava aos domingos.
Então, por exemplo, nós jogávamos em uma sexta-feira à noite, vamos dizer, contra o (__________) da Alemanha.
No dia seguinte.
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No dia seguinte não, na segunda-feira, a gente ia jogar na fábrica da Mercedes, ganhando o mesmo bicho, contra os funcionários e tal, entendeu? E o Santos ganhava a mesma cota.
Aí na terça já tinha jogo contra outro clube e tal.
Você jogava praticamente todo dia.
P - Jogava muito por prazer também, não é Peixinho? É diferente do jogador de hoje? O que você acha disso?
R - Eu acho que a gente jogava com mais amor, sabe? Mais amor.
O jogador tinha responsabilidade, e outra, não se falava em perder.
O Santos não perdia quase, né? Mas mesmo em outros clubes a gente, quando perdia, o jogo ficava aborrecido, coisa que eu não vejo hoje, sabe? O pessoal perde é a mesma coisa que não tivesse acontecido nada.
Assim eu vejo, ao meu modo, eu vejo pelos meninos.
Eu quando perdia jogo quando era criança, Deus me livre, ficava louco da vida! Hoje perdeu, tá, daí dez minutos, boa, tá tudo sorrindo: “ah, vamos no baile e não sei o que”.
Aquele tempo não, quer dizer mudou, a vida mudou muito.
P - E o futebol mudou, Peixinho? O futebol dentro de campo, táticas, opção de jogo.
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Você acha que é muito diferente da época que você jogava?
R – Mudou.
Eu acho que mudou, mas o futebol é um só, velho.
Você tem que meter lá pra dentro, entendeu?
P - Mas você acha que você seria o mesmo Peixinho se jogasse hoje? Você teria o mesmo nível técnico, a mesma qualidade?
R - Como extrema (?)?
P - Sim, como.
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R - Tudo bem, porque eu vejo.
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Eu vejo comentarista, comentarista não, eu vi o Mário Sérgio falar que o Pelé não jogava hoje.
O Pelé hoje faria cinco, seis gols por partida, tranquilo.
Como não vai jogar? Joga sossegado, admiro um rapaz, que foi jogador de futebol, jogador de categoria ainda, falar que um Pelé não joga futebol hoje.
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Brincadeira.
Eu quero ver se esses que jogam hoje jogariam naquele tempo, isso que eu quero ver, não menosprezando ninguém.
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P - Algum dos jogadores, por exemplo, do São Paulo hoje.
Os onze jogariam no time hoje?
R – O São Paulo tem.
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O São Paulo tem craque, não tenha dúvida, certo? Mas naquele tempo não ia ser fácil não, viu? Houve até um Müller, que eu admiro muito, Palhinha, o.
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Esse menino que está começando agora.
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P - Juninho.
R - Que tem tudo pra ir pra frente.
O São Paulo tem, o Palmeiras também tem um belo plantel.
P - Mas, por exemplo, o Müller jogaria no time que você jogou? Que jogava o Canhoteiro, Gino Orlando, você.
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R - Pode ser que jogasse, viu?
P - Ou ficava no banco?
R - Pode ser que jogasse.
P - Quem foi melhor? De Sordi ou.
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R - Por exemplo, no Santos, esses jogadores de hoje, acho que era difícil jogar nesse Santos.
Não estou falando nem um nem dois, estou falando todos.
P - O time inteiro era genial, né?
R - Era difícil.
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P - Quem que foi melhor, por exemplo.
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R - Agora, veja bem, os adversários eram bons, hein? Você pega um time do Palmeiras daquele tempo, pega um Botafogo do Rio, pega um Corinthians, um São Paulo, você vê que não era brincadeira.
O Santos jogava bem aqui em Pirituba, mas jogava bem na Alemanha.
Era sempre um time humilde, certo? O Santos, a grande virtude, em minha opinião, o Santos não olhava a camisa.
Se estivesse dois [o jogo] a gente queria empurrar dez.
Não tinha esse negócio, foi.
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“Vamos defender”.
Não, nada disso.
Podia tomar dois lá, a gente ia fazer lá na frente.
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P - Quem que eram os grandes jogadores do Palmeiras nessa época? O grande time do Palmeiras.
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R - Ah, o Palmeiras tinha o Djalma Santos, Valdir, o Moraes, que hoje é do Palmeiras, Djalma Santos, Djalma Dias, o Ademar Carabina, Ademar.
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O Geraldo Escopa, o Ferrari, Ademir da Guia, Dudu, Tupanzinho.
Pô! Quem via o Tupanzinho jogar, Deus me livre! Era um craque! Servilho, Gil, Julinho, Reinaldo, Américo, vários.
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Ênio Andrade, Chinesinho.
Olha aí, só craques, pô! Na acepção da palavra.
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P - E o Botafogo?
R - Botafogo? Garrincha.
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Olha, joguei com o ataque do Botafogo: Garrincha, Didi, Amarildo, Quarentinha e Zagalo, é brincadeira?
P - Pega a Seleção, né?
R - Entendeu? Por isso que eu digo, pode ser que algum jogasse, mas não ia ser fácil não.
P - Você acha que o futebol está muito voltado pro interesse econômico, Peixinho, e menos voltado pra dentro de campo?
R - Não, hoje há o interesse econômico, não resta dúvida, e também eu sou do lado que jogador deve aproveitar a carreira dele e quando está no auge, porque pra ser esquecido no futebol basta cinco, seis meses e você é esquecido.
Então eu sou do lado do jogador aí.
Está em boa fase, tem que aproveitar e exigir o quê ele merece, né? Quer dizer, é uma coisa normal.
Hoje está podendo se pagar bem, então o jogador tem que querer ganhar bem, desde que ele esteja produzindo.
P - Você chegou a ver Leônidas jogar ou não?
R - Eu vi o Leônidas no fim.
Eu tinha oito, nove anos.
P - E o que você achou?
R - O meu pai que sempre fala muito do Leônidas.
O meu pai sim, esse já o viu jogar, eu não posso ter assim uma noção perfeita.
P - E você via o seu pai jogar?
R - Eu vi o meu pai no Internacional de Limeira jogar, e depois aqui do Santos ele foi pro Inter de Limeira.
P - A influência do futebol foi o seu pai ou foi outra coisa?
R - Não, não.
Meu pai não teve influência no futebol, meu pai inclusive nem foi atrás de nada pra me pôr no futebol.
Isso foi uma coisa que me ajudou muito indiretamente.
Fora do campo e em casa sim, ele me ajudou demais em casa.
Porque se ele fosse lá conversar com o treinador, diretor, acho que o prejudicado seria eu, porque aí eu poderia ver a coisa por outro lado, seria uma coisa forçada, aí do meu lado já não foi forçado.
Caxambu me levou do Oratório, eu fui ao São Paulo e segui a minha carreira, sempre às ordens, seguindo os conselhos dentro de casa.
P - Agora, a paixão pelo futebol, aí isso seu pai tem influência.
R - Ah, paixão sim.
P - E como que era ver ele jogar?
R - O meu pai.
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Eu vi o meu pai jogar em 1947, certo? Eu tinha sete anos quando eu vi meu pai jogar, mas eu já tinha noção, porque meu pai me carregou pro campo com três anos.
P - Pra ver que jogo? Você sabe?
R - Não, não.
Pra bater bola quando ele treinava.
Então eu o vi jogar com sete anos, mais ou menos.
P - Como é que foi esse.
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R - E eu queria ser aquilo que ele é.
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Eu queria, eu queria ser aquilo, e gostava.
P - Você se lembra desse jogo? Ela perguntou, e esse jogo que você tinha sete anos, você lembra que jogo que era?
R - Me lembro.
Foi contra o XV de Piracicaba, em Limeira.
Eu lembro que o Inter de Limeira ganhou de quatro a um, meu pai fez dois gols.
Esse.
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Esse dia eu lembro.
Me lembro de um goleiro da Inter, um tal de Caju, que eu gostava de ver o goleiro voar, sabe? E esse aí pra isso era excelente, quer dizer, isso também marca.
Depois não vi mais meu pai jogar.
P - Ele parou cedo ou.
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R - Ele parou cedo.
Meu pai parou com vinte e sete anos.
P - Por quê?
R - Ele desistiu mesmo, não foi contusão nada.
Ele se aborreceu e aí nós voltamos pra São Paulo.
P - Seu pai é vivo hoje ainda?
R - Ô, meu pai está com setenta e seis anos, com mais saúde que eu.
P - Como é que vocês se relacionam? Vocês são amigos? Como que é a vida de vocês dois?
R - Ah, meu pai é meu amigo, sempre foi, sempre, sempre.
Eu sou aquele que ainda pede a benção e beija o rosto.
P - Vocês assistem futebol juntos, comentam?
R - Ô, ele está sempre em Piracicaba.
P - Ele mora em que cidade?
R - Mora aqui em São Paulo, na Lapa, no Alto da Lapa.
P - Mora na.
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R - Aonde nós construímos a casa, mora perto lá.
P - Você voltando na casa dele, na rua, você fica emocionado ou não? O que você sente quando você volta pro Alto da Lapa?
R - Me sinto em casa outra vez (risos).
Não, eu sempre.
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P - E ver a torre ao invés da Rádio América, em vez da Rádio Transamérica, hoje aquela torre.
R - Agora lá, a Transamérica é mais na frente, ali agora é esse telefone celular, torre de telefone celular e ao lado o Pão de Açúcar.
P - Como é olhar pra trás, assim, pro passado e ver o lugar que você andou, você brincou, o que você sente?
R - Não, eu.
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Me sinto feliz, porque eu vejo meus pais bem, certo? Bem na vida, tranquilos, sem aborrecimentos, o que é muito importante.
Eu, o que eu pude fazer dentro do que ele gostava que era o futebol, eu fiz, não decepcionei, a minha família gosta muito de mim.
Quando eu jogava eles sentiam orgulho, que é uma coisa que intimamente a gente fica gratificado.
E que olhando pra trás me sinto bem, sem arrependimento de nada.
E agradecendo a Deus a vida que eu tenho, não é uma vida.
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É uma vida simples.
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P - Você é uma pessoa religiosa, Peixinho?
R - Sou, eu não perco uma missa desde que comecei a frequentar o colégio, mesmo jogando futebol como profissional, a minha licença pra eu ir a missa isso eu sempre tive.
Mas eu tenho a minha fé, não sou contra nada, nem contra religião nenhuma, acho muito bonito esse movimento aí atleta de Cristo, certo? Porque tudo que a gente faz pra agradecer, certo, porque a gente tem que agradecer sempre.
Nós estamos aqui graças a Deus, então o alimento que a gente recebe, o que a gente foi na vida ou é, o que eu fui, tem que agradecer.
Quer dizer, não agradecer quando eu estou em evidência, agradecer pelo resto da vida.
Isso.
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Eu penso assim.
P - Quando você vê uma criança na rua, na esquina, pedindo.
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Você é uma pessoa que não é rica, mas você acabou de falar que está bem com a vida.
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R - Graças a Deus.
P - Tem uma vida normal, o que você sente quando uma criança na esquina, no farol, que bate no vidro do teu carro pedindo comida, pedindo.
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O que passa pela tua cabeça?
R - O que me passa, rapaz, que se a gente pudesse ser todos iguais, sabe? Por isso que eu digo, eu queria um dia morrer pra ver o Brasil bem, certo, isso eu queria, acho que não vai dar tempo.
P - Quem sabe?
R - Isso sim, porque eu falei pra você, quando eu vejo o Senna ganhar uma corrida ou qualquer brasileiro lá fora erguer a bandeira do Brasil, quando você ouve o hino, eu sinto dentro mesmo, aqui dentro, eu gosto disso aqui, então eu queria ver isso aqui bem.
Pode acontecer isso.
Vamos ver se vão conseguir dar um jeito.
P - O que você sente quando você vê um empresário ou, enfim, alguém que desviou dinheiro, alguém que usa mal o dinheiro público, que de certa forma é responsável por essas coisas no país?
R - Eu não sou uma pessoa revoltada, sabe? Agora, essas pessoas deviam olhar um pouco mais pra esse lado, porque pode ser que não pague aqui, mas pode ser que pague também.
Porque não é, eu falei pra você, não é o dinheiro, as pessoas podem ter dinheiro, mas uma outra parte da vida que ele queria ter uma certa coisa, ele não vai ter nunca, porque Deus é justo.
Não existe felicidade completa se você não ajudar alguém.
Eu penso dessa maneira.
O Pelé eu sei, ele não fala pra ninguém, mas o Pelé ajuda muita e muita gente, muitas instituições, você nunca vê ele falar: “eu ajudo”.
Não, ele nunca põe o eu na frente certo, quer dizer, é um cara que está sempre em paz, e vai estar a vida inteira, porque é uma pessoa assim.
Eu tivesse condições de poder fazer uma coisa a mais, faria tranquilamente, como tem muita gente que tem essa condição e não faz.
P - Mudou muito a relação das pessoas, a convivência das pessoas, da época que você era mais jovem pra cá?
R - Ah mudou, mudou muito.
P - Em que sentido?
R - Havia mais confiança e mais amor pelo próximo.
Hoje, eu tenho a impressão, quem vê o outro mais ou menos, não bem, mais ou menos, já não.
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Ela mesma não se sente bem, eu não vejo o porquê disso.
Se você vê uma pessoa bem, você tem que ficar “mais bem” ainda.
A pessoa está bem, Deus que ajude ele.
P - E a relação entre pais e filhos?
R - Ah, mudou também.
P - O que é diferente entre seu pai e você e você e seu filho?
R - Não, eu acho que se um pai desde o começo orientar seu filho em uma linha de vida, porque a vida é uma linha.
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Agora, as coisas evoluíram.
É lógico que a gente tem que acompanhar.
Acompanhar dentro da lógica, não você querer sair da lógica, acompanhar a lógica de vida.
Agora, se o seu filho é viciado, você não vai incentivar ele a continuar no vício, você vai procurar querer tirar ele do vício.
Agora, eu vejo uns pais que nem ligam: “Ah, nós temos dinheiro, problema dele”.
Não é.
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Eu penso que não é assim, quer dizer, então não existe o amor aí, não existe aquele interesse de você, por exemplo, de ver o cara drogado, ver o cara bem, ver o cara curado.
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“Ah, nós temos dinheiro, o problema é dele”.
Então a pessoa não procura querer ajudar.
Então enfia cada vez mais no buraco.
P - Você falou de droga.
E aquelas histórias que de certa forma alguns dirigentes colocavam algum tipo de estimulante na bebida dos jogadores do Santos, porque jogava muito, dormia pouco.
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Enfim, é verdade?
R - Não.
Eu, por exemplo, no Santos não tomei nem café, não tomei (risos).
P - E a laranjada tinha estimulante ou não?
R - Não, o estimulante não joga futebol.
Isso aí pode acontecer, o cara ficar eufórico e correr, mas não adianta, a cabeça não funciona.
Eu não vejo o porquê disso, sabe? Eu joguei por dezenove anos futebol e joguei sempre, como eu falei pra você.
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P - Nunca viu um jogador se.
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R - Ah, tem.
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Tem, não vou falar pra você que não.
Tem cara que, ele mesmo pode se dopar sem a gente saber, você nota no adversário que você vê nego com os olhos desse tamanho.
Agora, você não prova isso.
Vou chegar pra ele: “Ô, você.
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”.
Não, em absoluto.
Ele que faça o dele, eu faço o meu.
P - E homossexualismo, Peixinho, tinha, tem no futebol?
R - Não, no meu tempo não existia isso, no meu tempo não, sinceramente que não.
Hoje é uma coisa quase normal aí.
Não sei, porque no futebol eu acho meio difícil, sabe? Fora do campo eu não sei, mas no meio do futebol, quando você está.
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Isso aí não pode existir.
Eu não acredito nisso.
Agora, se você me falar em outras partes, diretor, treinar, eu não sei.
A gente para falar tem que saber e ver.
Sem ver eu não posso falar.
Dentro do futebol.
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Não acredito assim, na parte profissional.
P - Quando você jogava o jogador saía da várzea, né? Normalmente da várzea.
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R - Da várzea.
P - Hoje não tem mais campo de várzea, o jogador sai da escolinha e de certa forma tá mudando.
O garoto pobre acaba não indo pra escolinha porque é influenciado pelo dirigente, tem que pagar alguma coisa, a escolinha é longe de casa, tem que ter dinheiro pra ir.
Você acha que isso está mudando a qualidade do futebol, Peixinho?
R - Eu acho que daí vem a falta de craque, sabe? Porque na várzea você sempre tem oportunidade de jogar, agora, uma escolinha, como você falou, não é qualquer um que pode frequentar, porque normalmente é pago.
Lá no Atlético, onde eu trabalho, não é pago.
Tem os sócios, filhos dos sócios e os não sócios, que são aceitos da mesma maneira, a gente faz uma escolha e tal, sempre partindo daquele princípio: vamos fazer o homem e o atleta.
Então, como por exemplo, em São Paulo, os campos de várzea são bem poucos, certo? Então há escassez de jogadores, porque o craque mesmo vinha da várzea.
Agora, hoje é aquele negócio.
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Então o menino sabe jogar futebol, por exemplo, aqui em São Paulo, como ele não vê campo, não vê nada, ele vai à danceteria ou vai no.
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E gosta.
Esse não volta mais pra jogar bola.
Então é de onde vem o vício, vem aquilo, e perde o menino.
A batalha que eu acho que o pessoal devia encarar é justamente essa, puxar, igual o que a gente faz em Piracicaba, ver se tira a criançada daí, ocupa, dá uma ocupação sadia pra criança.
Porque o vício está em todo lugar.
Agora, você procurando levar as crianças para outro lado, o lado mais de hombridade e também o lado do esporte, estaria colaborando e ajudando muito.
P - Legal, a gente agradece! Pô, duas horas falando, hein rapaz!
R - Vocês vão puxando vai (risos), se for pra eu falar sozinho não vai nada!