IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Estellito Rangel Junior, eu nasci no Rio de Janeiro em 21 de julho de 1956. FORMAÇÃO Eu sou engenheiro eletricista. INGRESSO NA PETROBRAS Eu ingressei na Petrobras em 6 de setembro de 1983, através de um concurso público e a minha primeira ...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Estellito Rangel Junior, eu nasci no Rio de Janeiro em 21 de julho de 1956.
FORMAÇÃO Eu sou engenheiro eletricista.
INGRESSO NA PETROBRAS Eu ingressei na Petrobras em 6 de setembro de 1983, através de um concurso público e a minha primeira lotação foi exatamente a Bacia de Campos. Na verdade, foi um processo, eu soube que a empresa era a Petrobras no dia da prova. Na verdade foi feito um anúncio fechado num jornal de grande circulação. Eu respondi esse anúncio de oferta de emprego. Era para enviar currículo para uma determinada caixa postal. Depois, eu recebi um telegrama de que haveria uma prova, onde eu identifiquei que a empresa seria a Petrobras. Era uma prova de conhecimentos técnicos e depois veio um processo. Houve uma entrevista em Macaé e lá que eu soube que eu estava dentro dos aprovados. Logo depois vieram os exames médicos e eu ingressei na companhia.O concurso foi exatamente para prover profissionais com experiência para a Bacia de Campos, para as plataformas de petróleo. Então eu já fui contratado por experiência. Eu entrei como engenheiro de utilidades, no caso sistemas elétricos na plataforma de Namorado 2. Essa plataforma já estava em fase final de montagem, já estava em alto-mar, nós ingressamos na Companhia em setembro e começamos um treinamento que foi feito em Cabiúnas, que é próximo ao centro de Macaé. Nesse treinamento nós ficamos conhecendo sistemas elétricos previstos para a plataforma, os equipamentos e nós também tivemos muita interação com as equipes de operadores e profissionais de manutenção que também dividiam as salas de treinamento com a gente. Até que veio o nosso primeiro embarque.
VIDA DE EMBARCADO O primeiro embarque foi novembro de 1983. Eu já fiz um primeiro embarque para conhecer a plataforma. Lembro porque foi a primeira vez que eu andei de helicóptero, o acesso até a plataforma foi feito através do aeroporto de Macaé, através de helicóptero, então já foi uma experiência diferente. E também demorou consideravelmente, quase uma hora de vôo. Chegando na plataforma, realmente houve uma surpresa muito grande porque a visão, todo o mar à volta e algumas plataforma próximas, realmente algo diferente. Uma coisa muito impactante foi que o acesso aos vários andares da plataforma – a plataforma era uma estrutura metálica com vários andares, vários pisos – as escadas eram com o piso gradeado. Então, o que acontecia, você via através da grade o mar lá embaixo. Você descendo e vendo o mar lá em baixo, dava uma sensação de muita emoção, diferente de pisar num piso fosco que você não vê o que está em baixo. Você pisar no piso gradeado, e a altura em que a gente fica, é uma sensação. Muito bom. Nós fazíamos parte do staff de gerência da plataforma. Nesse nível, havia um respeito muito grande, nós não fomos, digamos assim, submetidos a algum tipo de trote ou brincadeira, mas nós soubemos de vários trotes de pessoal de nível de execução que eles faziam, principalmente quando o pessoal fazia o primeiro embarque. Uma das brincadeiras no primeiro embarque era que a pessoa que acabou de embarcar era notificada: “Olha, você faz jus a um adicional de primeiro embarque, mas é necessário que você preencha essa ficha e pegue a assinatura dos responsáveis. Está aqui o formulário.” A pessoa preenchia com seus dados e depois tinha que colher a assinatura de mais seis pessoas, que era o chefe da plataforma, o sub-chefe, o chefe da manutenção, várias pessoas que ele tinha que procurar. Sempre que ele ia procurar a pessoa, os operadores se comunicavam pelo rádio e já avisavam: “o candidato a primeiro embarque está indo aí procurar o fulano. Quando ele chegar aí, você diga que ele está lá em cima.” Aí: “ah, ele acabou de ir lá para cima.” E a movimentação da plataforma é através de escada, não havia elevadores. Então, ele descia vários andares, chegava lá embaixo: “eu vim procurar aqui o Senhor Fulano.” “Ah, ele acabou de subir, está lá em cima”. Aí, a pessoa ficava subindo e descendo o dia inteiro e cada pessoa já sabia que ele ia chegar lá procurando a pessoa para assinar e sempre diziam: “ele está em baixo, ele está lá em cima”, ficava o dia inteiro subindo e descendo escadas até que algumas vezes achava uma ou outra pessoa. Essa brincadeira era muito comum com o pessoal do primeiro embarque. Outra também que havia era o baile do sábado. O pessoal chegava lá, 14 dias embarcado, então tinha toda uma estrutura de vida em terra. Quando chegava lá plataforma que era isolado, ficava um pouco deslocado. Então o pessoal falava: “ah, aqui tem o seguinte: tem um lá em Macaé aos sábados. Então, vem uma lancha por volta de nove, dez da noite. O pessoal vai na lancha, chega lá em Macaé mais ou menos meia-noite, então dá para pegar a festa até umas três, quatro da manhã. Aí, a lancha traz de volta, você chega aqui umas seis e meia e sete horas você já vai para o batente.” Aí, a pessoal achava a idéia sensacional: “Pôxa, vou para terra, vou lá, vou dançar” Já estava tudo esquematizado, o pessoal acabava de jantar, tomava banho, se arrumava, ficava ali na sala de jogos. A gente já conversava com o operador do radio e ele passava o aviso no auto-falante da plataforma: “atenção senhores passageiros da lancha, a lancha está a dez minutos fora, favor comparecer ao heliponto para o baile de Macaé.” Aí o pessoal ia, já subia as escadas, as vezes estava ventando, estava chovendo e eles ficavam lá esperando o barco e tinha sempre um “Ah, eu acho que eu estou vendo, está chegando um barco ali...” Não estava chegando barco nenhum, o pessoal às vezes ficava ali horas esperando a tal da lancha e quando eles desciam era aquela risada geral. Então, havia esses trotes. Com o tempo, a gente conseguiu fazer uma integração muito boa da equipe. O pessoal embarcado tem essa característica. Como é uma atividade que independe do nosso calendário, nós estamos ali em sistema de escala, às vezes tem feriados que nós passávamos trabalho como Natal. Eu já passei Natal trabalhando, eu já passei Ano Novo trabalhando, já passei carnaval trabalhando, aniversário de filho, aniversário de parente trabalhando. Isso gera uma interação com as pessoas que estão embarcadas muito grande e gera um clima muito bom. Na época em que eu estava embarcado, havia o cinema. Havia uma televisão grande no auditório, de cerca de 40 polegadas, e eles passavam a novela e depois passavam geralmente um filme. Havia pouca disponibilidade de filmes, alguns filmes eram repetidos, eram todos em VHS, vídeo cassete. Na época, eu conseguia com alguns colegas aqui em terra, fitas de conjuntos musicais e concertos, shows ao vivo que eu gravava e levava para a plataforma. Então, havia o filme da programação da plataforma, que eles faziam cada dia um filme diferente e eu conseguia fazer um acerto que depois desse filme passasse o filme de show musical que eu tinha trazido naquele embarque. Aí, o pessoal gostou muito porque naquela época não havia essa disponibilidade de shows musicais como hoje nós temos em DVD’s, era muito difícil. Eu conseguia as fitas importadas, fazia cópias em aparelho doméstico e levava a bordo e o pessoal gostava muito, foi uma atração bem diferente porque os filmes que passavam eram filmes de circuito normal, drama, comédia ou suspense, não havia essa opção dos shows musicais. Então, eu dei uma pequena contribuição para o lazer da plataforma naquela época.
DIVERSIDADE CULTURAL Era muito interessante, nós aproveitávamos muito essa diferença. Eu já embarquei numa plataforma em que uma boa parcela do pessoal de contato direto era pessoal do Rio Grande do Sul. Eles levavam cuia de chimarrão, tomavam chimarrão, a gente participava de roda de chimarrão. Ali que eu tomei conhecimento do ritual para você exatamente conversar provando o chimarrão e passando a cuia para todos os presentes, derramava a água quente. Isso foi muito interessante. Nós aqui no Rio de Janeiro nós não temos esse hábito, então nós passamos a ter. Outra coisa também interessante é que muitos colegas traziam no embarque algumas particularidades de sua terra, alguns artesanatos. Então, nós passamos a conhecer, alguns colegas também traziam, por exemplo, doces. Comprava doces de outras regiões e fazia um intercambio muito interessante. Então, essa diversidade cultural fica muito próxima, muito íntima porque nós estávamos num sistema que favorecia muito essa interação. Nós estávamos ali isolados e teríamos que cumprir a nossa jornada, então, esse contato era muito forte. É diferente daqui, no nosso sistema urbano a gente vem trabalhar a tal hora, em determinada hora a gente sai, vai para casa e a gente não tem mais o contato. Lá não, a gente ficava realmente o dia inteiro, tanto nas horas de trabalho quanto nas horas de folga num convívio, então, o relacionamento era muito mais intenso e a gente consegui realmente explorar todas essas características muito interessantes mesmo.
VIDA DE EMBARCADO Essa situação de estar embarcado, varia de pessoa para pessoa. Eu tive colegas que não suportaram esse regime durante algum tempo. Eu tive colegas que foram afastados do trabalho por motivos psicológicos, colegas que naquela época estavam impedidos de embarcar porque naquela época estavam sofrendo uma sobrecarga emocional muito grande, então, isso varia realmente de pessoa para pessoa. No meu caso, eu tive uma adaptação que considerei boa, porque a minha família soube levar de uma forma adequada o meu afastamento. Então, muitas vezes, a pessoa que está embarcada consegue, digamos assim, suportar esse tipo de regime, mas as pessoas com quem ela convive, não suportam, não entendem. Isso é um fator interessante, porque não depende da pessoa, digamos assim, gostar de embarcar, a pessoa gostar de ficar numa plataforma com aquele isolamento no mar e desempenhando suas funções, de certa forma, isolado. Depende muito das pessoas com as quais ele convive de aceitar, entender e dar apoio. Se realmente você não tiver esse tipo de apoio, a relação familiar é deteriorada e existem conseqüências desagradáveis. Então, depende realmente desse contexto, da pessoa em si e do ambiente, da família que precisa dar esse suporte durante essas ausências, especialmente nas datas festivas como Natal, Ano Novo, aniversário. Isso é uma diferenciação importante.
COMUNICAÇÃO Em 1983, para casa nós não tínhamos telefone a bordo. O que nós fazíamos era usar a sala de rádio. Então, na sala de rádio você usava o sistema de radio transmissor, falava com uma base, que era a Base Vitória. Então, nós falávamos no microfone e lá na base Vitória eles faziam a distribuição da chamada via rádio para o sistema de telefonia. Então, a pessoa na casa recebia a ligação telefônica, falava, mas toda a conversação era transmitida via radio até chegar a plataforma. Então, o que acontecia? Toda a nossa conversa via radio era captada em todas as plataformas que estavam na mesma freqüência. Então, na verdade, a pessoa tinha que se conscientizar que, embora ela estivesse falando numa cabine, com um microfone e um alto-falante, aquela conversa não estava limitada àquela cabine, todos os que estavam sintonizados na mesma freqüência, estavam ouvindo a conversa. Você tem que se policiar em relação a isso. Só depois de alguns anos é que eram as cabines telefônicas para as plataformas e que realmente a comunicação passava a ser via telefone, não havia essa, digamos assim, colocação pública da conversa. Alguns anos depois é que veio esse sistema, mas eu peguei o sistema de rádio e às vezes não havia comunicação por questões meteorológicas, a gente às vezes ficava sem comunicação nesse início da Bacia de Campos. A implantação do telefone deve ter sido por volta de 1987, 1988, nessa época mais ou menos, começou. Sempre as novidades vinham de forma escalonada. Algumas plataformas receberam o primeiro link, o primeiro lote, depois essa capacidade foi sendo ampliada. Então com essa ampliação outras plataformas passaram a receber também. A mesma coisa com a televisão também. A nossa televisão a bordo não era sistema por satélite. No início era sistema via antena VHF e UHF, então a imagem era com muito chuvisco, não era uma imagem adequada. Hoje, você já tem recepção via satélite nas plataformas, é uma realidade diferente da realidade daquele momento.
MUDANÇAS Estrutura tecnológica é um crescente. Até hoje, nós temos inovações em relação a equipamentos e processos. Agora, há também progresso em relação à arquitetura. As plataformas originais, as primeiras da Bacia de Campos, do tipo fixo, apoiada sobre jaqueta, que é Namorado I, Namorado II, Cherne I, Cherne II, Pampo, Garoupa e Enchova, possuem uma concepção dos quartos: os camarotes eram fechados e possuíam apenas uma escotilha. Depois veio uma concepção com o Pólo Nordeste em que os camarotes faziam uma concepção chamada suíte canadense em que um banheiro dividia para dois camarotes. Eu fiquei sabendo que a concepção de arquitetura dessas plataformas do Pólo Nordeste, chegou a ser cogitado de se fazer umas varandas nos camarotes, como hoje nós encontramos em apartamentos nos grandes centros, onde você tem uma varandinha pequena. Mas essa idéia durante o desenvolvimento não foi aprovada. A gente nota que desde a década de 80 até hoje vários conceitos foram melhorados desde a parte de equipamentos como também a parte de acomodações. No início da Bacia de Campos, por exemplo, nós não tínhamos quadra de esporte, não havia isso no projeto. Então, o que o pessoal fazia? O pessoal pegava o deck de carga e, com a permissão da gerencia da plataforma, fazia-se a marcação de uma quadra e construía-se as traves para fazer futebol ou mesmo os postes para colocar as redes de vôlei num local que era destinado a movimentação de carga. Então, ali você criou uma quadra de esportes, mas era uma quadra, digamos, pirata. Então, isso foi sendo feito. Lógico, quando havia alguma necessidade de usar o deck de carga, alguma remessa adicional, uma coisa grande, eles ocupavam a nossa quadra, e não havia esporte naquele período, mas sempre era feito o máximo possível para haver disponibilização. E, o mais curioso foi a plataforma de Cherne I, que foi a primeira plataforma que teve uma piscina abordo. Foi também uma piscina construída de forma não oficial. O pessoal começou a pedir chapas de aço para obras, chapas de aço, chapas de aço, e começaram a montar uma piscina de sobrepor, com uma escada, com um pequeno deck e com água salgada, fazia o bombeamento, fazia o desvio de água salgada e ali você tinha a piscina com água corrente. A água era salgada e ficava sempre circulando. Não havia o sistema de água parada e tratada porque não havia sistema para tratar a água da piscina. Então, nós fazíamos com água salgada circulante. Então, ali nós tínhamos uma plataforma com uma piscina que também foi construída de forma assim não oficial. Isso era fantástico porque como na plataforma trabalha o pessoal de turno, então o pessoal que trabalhava à noite, largava no início da manhã e já ia para a piscina. E isso gerou uma situação interessante, porque as pessoas vinham embarcar brancas e chegavam em casa bronzeadas. A primeira coisa que a esposa perguntava era: “Peraí, você estava aonde?” (risos) Até explicar que havia sido feita uma piscina na plataforma e que o pessoal tomava sol na hora da folga... Era um pouco difícil. Eu sei de outras plataformas que já foram construídas, já foi colocado no projeto a execução de uma piscina. Essa é outra parte da evolução. Então necessidades que nós tínhamos naquele tempo, hoje já estão incorporadas nos projetos. Isso denota uma evolução não só tecnológica, mas também de cultura, de você entender que o homem embarcado precisa ter certo conforto, precisa ter recursos para ele exatamente se sentir de certa forma confortável e dessa forma produzir mais, porque o pessoal embarcado tem uma série de necessidades especiais, não só de comida. Nos primeiros anos, isso foi [dado] uma ênfase. O pessoal tinha que comer bastante. Depois começaram a surgir os problemas de obesidade, problemas advindos desse ganho de peso. Ai teve um acompanhamento nutricional, hoje as dietas são balanceadas, há todo um trabalho. Então isso é uma evolução. Ao invés de você contratar uma empresa para fornecer comida, hoje você contrata uma empresa para fornecer um plano de alimentação e você tem acompanhamentos para que as pessoas devido à tensão e ansiedade não comecem a ingerir uma quantidade muito grande de alimentos e entrem no sobrepeso, gerando outros problemas. Tudo isso é uma evolução; teve uma evolução tanto de processo quanto de cultura e também com essa relação apoiada sempre numa relação de respeito e conforto pro pessoal embarcado, isso é muito importante.
SEGURANÇA A segurança sempre foi um ponto importante. Nós tínhamos técnicos de segurança a bordo. No início, os técnicos de segurança tinham, vamos dizer assim, uma sobrecarga no serviço, porque geralmente era um técnico embarcado. Ele fazia todo o acompanhamento dos trabalhadores embarcados, principalmente contratados e serviços. E isso até hoje está mantido. Nós temos ainda o técnico de segurança embarcado, cuidando de uma série de atividades. Eu acho que nesse ponto a Empresa vem se mantendo dentro de uma política adequada de prover a segurança a bordo. Existem algumas limitações, muitas vezes o pessoal de segurança e até incompreendido, porque eles precisam fazer cumprir certos dispositivos legais e técnicos para a execução de tarefas. Às vezes, eles são mal compreendidos, como se eles estivessem dificultando a execução das tarefas, mas isso é feito à luz de procedimentos aprovados. Então, realmente, o pessoal de segurança tem um trabalho muito grande a bordo.
VIDA DE EMBARCADO Eu embarquei até 90, com embarques regulares, com escala normal, sempre embarcado. A partir de 90, eu comecei a fazer embarques eventuais, mas eu sempre fazia parte da equipe de manutenção. Eu fazia embarques eventuais para cumprir planos de manutenção – no caso da minha área é manutenção elétrica, baterias, manutenção elétrica de sistemas. Então, eu fique embarcando eventualmente até 95. Eu fiquei embarcando direto até 90, entre 90 e 95 eu fazia embarques eventuais, dentro de uma necessidade para cumprir o programa de manutenção.
PLATAFORMAS Uma característica básica nesse trabalho é que o número de pessoas embarcadas veio diminuindo ao longo dos anos. Hoje você tem uma automação de processos muito maior do que outrora existente. Você tem hoje os sistemas de comando e monitoração que possuem muito mais variáveis do que os iniciais, então hoje você tem uma equipe menor a bordo. As plataformas hoje em relação à quantidades de sistemas, elas possuem um efetivo menor. Essa é uma característica interessante, isso talvez daqui a alguns anos a gente possa falar melhor a respeito. Por que o que acontece? Quando você tem menos pessoas a bordo, mesmo com o sistema de automação, você tem uma necessidade muito grande de que aquela pessoa tenha um conhecimento dos vários sistemas aos quais ela está supervisionando. E naquela época, na década de 80, nós tínhamos uma equipe maior. Com uma equipe maior, você pode dividir tarefas, você pode fazer com que cada um cuide de uma determinada parte do processo, então você tem uma carga de trabalho menor com mais pessoas do que hoje com menos pessoas. Isso é uma diferenciação interessante que está acontecendo no processo do embarque desde aquela época até hoje.
DESAFIOS O meu maior desafio foi colocar a primeira plataforma que eu embarquei, no caso a PNA2, em produção, porque eu embarquei numa época de final de montagem. Então nós estávamos com uma plataforma auxiliar que é chamada de flotel, hotel flutuante, colocado ao lado da plataforma e havia uma passarela em que os trabalhadores faziam diversos serviços durante o dia – serviço de soldagem e pintura – e ao final da tarde voltavam para o flotel, onde eles dormiam. Havia uma equipe na plataforma e uma equipe no flotel. Então o grande desafio foi pegar nesse fim de obra, em que havia algumas pendências, alguns sistemas estavam pendentes, e nós estávamos concentrados em fazer a plataforma produzir, fazer a primeira produção de óleo. Então havia uma carência de sistemas que não estavam prontos, carências de algumas informações técnicas também. O grande desafio foi concatenar esses esforços para promover a primeira produção de óleo. Isso nós conseguimos em janeiro de 84. Isso foi realmente um grande desafio porque eu era recém egresso na empresa, eu entrei em setembro, e em janeiro eu já estava na linha de frente para fazer a primeira produção de óleo da plataforma. Isso foi um marco realmente fantástico. Na plataforma, também é bom explicar, embora nós tenhamos um horário de trabalho similar ao horário de trabalho em terra, mas como nós não nos afastamos daquele ambiente de trabalho, as noites nós tínhamos reuniões, nós tínhamos discussões técnicas com o pessoal da montagem. Então esse foi o grande desafio: é você entrar nem ambiente em que o trabalho é praticamente 24 horas, porque você no caso descansa as suas horas de sono, mas tem outro colega que está trabalhando, enquanto você descansa, então é um regime de 24 horas. E todos voltados para um determinado objetivo, que foi a produção e no menor espaço de tempo. É uma ambiência extremamente desafiadora. Isso realmente ficou marcado. Nós conseguimos o sucesso com todo aquele ambiente, digamos assim, um pouco precário, porque estava no final de obra. Nós conseguimos fazer a produção em janeiro de 1984, da PNA2. Foi uma festa, marcamos até um churrasco especial no domingo foi uma comemoração muito importante, muito marcante.
DIFICULDADES Acho que a maior dificuldade é você nesse ambiente de embarcado, nesse ambiente que você está de certa forma isolado dos amigos – muitos amigos ficam aqui em terra – e da família, é você se manter com o astral elevado, é você se manter com serenidade e concentrado nas suas atividades. Acho que esses são grandes desafios porque a cada dia você tem um problema novo, uma dificuldade. Você tem uma necessidade de algum sistema e os recursos são limitados. Esse é um grande desafio: é poder balancear essas necessidades de bordo com as necessidades do pessoal que ficou em terra e diante de todas essas exigências você mantém equilíbrio , acho que é um grande desafio e é um desafio permanente. Várias vezes eu presenciei colegas que perderam o controle emocional a bordo porque em casa havia problemas com a família, havia problemas com os negócios que eles mantinham. Essa é uma questão interessante. Agora tem pessoas que conseguiram passar por essa fase de uma forma muito interessante. Por exemplo: eu tive colegas que, graças a essa facilidade de ficar a bordo e ter uma folga contínua de 14 dias, um dos colegas passou a fixar residência em um condomínio em Miami. Era muito interessante por ele embarcava e depois “tchau gente tô indo para Miami.” E voltava de Miami para embarcar. Um outro colega era casado, mas ele morava num trailer. Então ele falava: eu embarquei estava em Salvador, mas agora eu não sei para onde vou depois que desembarcar, eu tenho que ligar para a minha esposa, saber para onde ela vai, porque ela vai par outro acampamento, e é para lá que eu vou. Então esse regime de embarcado tem esses desafios também porque é uma situação inusitada. Você não tem uma casa fixa, na verdade, ele tinha um trabalho fixo. Ele sabia onde vinha trabalhar, mas não sabia para onde ia voltar quando acabasse o trabalho. Eram experiências interessantes.
FATOS MARCANTES As fases marcantes sempre são as fases em que um novo campo entra em operação uma nova plataforma entra em operação. Porque nós passamos a ter muito contato. Por exemplo, o pessoal da Bacia de Campos, das primeiras plataformas, nós podíamos nos comunicar via rádio com as plataformas vizinhas pegando a freqüência. O radio portátil tinha alcance. PNA2 e PNA1 a distância era só de oito quilômetros, então era fácil você fazer uma comunicação via radio. Nesse caso havia essa questão. Sempre que havia uma plataforma nova, o pessoal entrava em contato com a gente, pedia orientações, sobre alguns problemas que estavam vivenciando perguntavam como nós havíamos superado aquele problema. Naquele tempo, nós não tínhamos e-mail, a nossa comunicação era unicamente por rádio e memorandos escritos. Você podia fazer comunicação com outra plataforma, havia um malote, era colocado num helicóptero destinado unicamente para recolher malotes nas plataformas e você fazia a comunicação. Então, não havia e-mail naquele tempo. O e-mail só veio na década de 1990. Havia toda essa vontade de fazer uma integração. Então, o pessoal de outra plataforma nos comunicava através do rádio para pedir orientação: “Oh, queria falar com o pessoal de elétrica aí. Vocês têm algum problema assim...Nós estamos tendo um problema com o motor. Como é que vocês resolveram?” Então, esse que foram verdadeiramente momentos marcantes. Sempre quando havia uma plataforma nova na área, a gente era acionado, eles pediam ajuda. Era muito interessante. E momentos, digamos assim, de tensão, de ansiedade, nós tivemos uma vez em Namorado II, um navio que perdeu o controle de máquina e ele abalroou a plataforma. Foi uma sensação realmente marcante, porque esse navio era um navio de grande porte, um navio que fazia apoio. Ele perdeu o controle e se chocou contra a plataforma, mas foi a noite, de madruga. O pessoal dormindo, começou a ouvir aquele barulho muito alto de ferro sendo arrastado, retorcido, um barulho muito alto. E quando alguns começaram a sair dos camarotes, chegar na parte da frente e ver aquele navio, muitos começaram a ficar preocupados e foi acionada a equipe de emergência. Foi um momento muito de muita tensão. O pessoal às vezes estava sujeito a essas situações. Nessas horas é necessário, realmente, ter sangue frio, ficar atento ao pessoal da segurança e recomendações.
MULHERES NA PETROBRAS Eu embarquei com engenheiras. A primeira engenheira embarcada, se não me engano, foi a engenheira Júlia. Ela embarcou comigo na PNA2. Inclusive, a estrutura dos camarotes era uma estrutura única, não havia um camarote feminino, então ela dividiu o mesmo camarote comigo, que era o camarote dos engenheiros de operação. A engenheira Júlia está embarcando até hoje. Hoje nós já temos camarotes femininos. É outra evolução, camarotes só para as meninas, porque hoje não temos só engenheiras, mas temos várias pessoas, temos enfermeiras, temos nutricionistas, temos administrativas que embarcam. Isso já foi uma evolução. Na primeira etapa, digamos assim, as engenheiras embarcavam com a gente e dividiam o camarote com os engenheiros a bordo. A cabine só feminina foi na base de 1986. Em 1985, já começou o pensamento em se designar um camarote para a equipe feminina porque começou a aumentar. Antes, em Namorado II, havia apenas a engenheira Júlia, mas logo depois começou a vir o pessoal administrativo, o pessoal nutricionista começou a embarcar. Então, conforme foi aumentando o contingente feminino eles foram achando interessante criar, já havia condições para criar um camarote feminino. Então, foi assim.
SUCESSO Eu percebi já no primeiro embarque porque a idéia de se construir plataformas foi uma experiência de engenharia muito forte. Você fazer uma determinada obra em terra, é uma coisa, você tem todo o apoio, você tem estradas, você tem a condição de fazer um planejamento. Agora, você fazer uma obra no mar, isso aí realmente exige uma disposição muito grande e capacidade tecnológica também. Então, essas plataformas de jaqueta, elas possuem uma jaqueta metálica e são estaqueadas no fundo do mar, então, é como se fosse um prédio a partir do fundo do mar, só na superfície acima da linha d”água é que você faz as acomodações, faz toda a estrutura. Aquilo ali já é um desafio. E você ali, garantindo que tinha petróleo, nossa Desde o início eu já vi que aquilo ali já tinha dado certo, já era nosso caminho. Naquela época, nós tínhamos uma produção de uns 300 mil barris por dia, nessa base, em terra. Você vê, hoje nós já conseguimos chegar a dois milhões de barris por dia, então, é fantástico Realmente, a gente já via que aquele ali seria o caminho. Desde o início eu já vi que aquele era um projeto vencedor.
TECNOLOGIA Todas as plataformas da década de 1980 foram baseadas em tecnologia estrangeira, foram inspiradas em projetos de plataformas existentes no Mar do Norte, que era uma experiência vivida pela Inglaterra – principalmente – e Noruega. Os projetistas dessas empresas foram ao Mar do Norte, verificaram como eram os projetos e trouxeram essa tecnologia para serem implementadas nas plataformas brasileiras. Então, toda a tecnologia foi toda importada, a concepção foi toda importada. Mas, logo depois, nós já passamos a ter uma concepção de plataforma. Por exemplo, Pólo Nordeste foi uma concepção desenvolvida já aqui no Brasil. Já foi uma concepção que foi extraída e melhorada das primeiras plataformas inspiradas na estrutura do Mar do Norte, então foram realmente estruturas muito mais reforçadas porque o Mar do Norte tem uma condição extremamente adversa, climatológica, tanto em relação à velocidade das ondas, quanto ao próprio clima. Então, essas plataformas foram muito mais, digamos assim, robustas. Agora, uma etapa posterior já se adequou melhor às situações encontradas no nosso mar. Nós fizemos uma “tropicalização” da tecnologia, isso é importante.
ATIVIDADE ATUAL Eu trabalho hoje na UN-Rio, que é a unidade de negócios responsável também por plataformas na Bacia de Campos. Todas essas novas plataformas grandes como a P-50, 48, 43, todas essas plataformas estão sob a gerencia da UN-RIO. Então, eu ainda estou ligado à exploração marítima, nossa produção em alto-mar porque eu estou locado exatamente num órgão que cuida de unidades off-shore.
FUTURO O resumo é que o futuro é a nossa realidade. Se a gente voltar no tempo: “Puxa, nós estamos produzindo tantos mil barris, nós temos que produzir mais tantos mil barris.” Nós já passamos, já atingimos, já passamos. Então, realmente toda a tecnologia envolvida no campo de exploração de petróleo é uma atividade de extrema tecnologia. Quando a gente faz uma meta: “Vamos produzir a mil metros de profundidade”, nossa, já passamos, já cumprimos, já estamos querendo produzir para três mil metros de lâmina d’água. Realmente o futuro é esse: o futuro é a nossa realidade. Nós aqui trabalhamos pensando no futuro, e esse futuro a cada dia vira passado. É uma constante superação de metas. Essa é a nossa tônica desde que eu entrei na Companhia até hoje. Esse é o resumo da história.
SER PETROLEIRO Ser petroleiro... É fazer parte de um grupo de profissionais extremamente dedicado. Um grupo de profissionais que ama o que faz, que se identifica com o que faz e se dedica extremamente a essa atividade. É realmente uma categoria unida, uma categoria esclarecida, uma categoria que realmente contribui para o progresso do país. Nós temos profissionais destacados na comunidade técnica nacional e internacional que são da Petrobras. Hoje, quando você fala em Petrobras, o mundo já ouviu falar nesse nome. E não é só pelo marketing, só pelos produtos, é também pela sua competência técnica, pelo valor dos profissionais que estão nessa empresa. Então, ser petroleiro hoje é fazer parte de uma comunidade de profissionais reconhecidos pelo mercado nacional e internacional.
BACIA DE CAMPOS Dessa experiência na Bacia de Campos, muita coisa nós vivemos, muita coisa nós trazemos na memória. E, no caso, na época em que eu embarquei, era uma época de início, nós tínhamos muita autonomia. Então, nós tínhamos uma liberdade para fazer programas de ação muito grande. Porque nós é que conduzimos o dia-a-dia da plataforma. Anos mais tarde é que se estruturou melhor os departamentos de terra e as atividades ficaram orientadas pelo pessoal de terra. Então, o pessoal de terra define as diretrizes, define os programas. O pessoal de plataforma hoje é um pessoal que cumpre as diretrizes dos programas traçados pelos órgãos de terra. Na época em que eu embarquei, nós tínhamos mais autonomia porque os órgãos de terra estavam, digamos assim, começando a se estruturar, porque tudo foi o início do grande boom da Bacia de Campos. Essa autonomia que nós tínhamos no início dos trabalhos, nos deu uma experiência muito grande, uma capacidade de lidar como novo, uma capacidade de lidar com metas muito marcante, Nós definíamos metas para as equipes, nós definíamos programas de treinamento, nós conduzíamos as pessoas para um encaminhamento de uma carreira na empresa. Então, vivência e num momento de necessidade da gente produzir petróleo muito forte, porque nós estávamos totalmente dependentes do petróleo externo, isso foi uma lição aprendida de muito valor e que fica realmente para a vida inteira. Esta é realmente uma síntese do que foi participar do início dos trabalhos da Bacia de Campos com todas as dificuldades. Por exemplo, no início das plataformas, quando eu comecei a embarcar, a plataforma era por módulos de acomodações e constituída de diversos camarotes com ar-condicionado, só que no início da montagem, o ar condicionado não estava pronto. Então, nós embarcávamos com os camarotes de portas abertas porque não estava ligado o sistema de ar-condicionado e ventilação. No verão, era extremamente quente. Nas salas de trabalho, nós colocamos alguns ventiladores, mas à noite, às vezes, não tinha nem espaço para colocar ventilador no quarto e dormia com as portas abertas. Foi muita dificuldade. Muitas instalações no início produção de Namorado II, as obras ainda estavam por terminar. Então, foi uma situação de alguns recursos precários, mas o pessoal estava todo unido e conseguimos fazer a produção rapidamente. Acho que toda essa exposição a essas dificuldades traz uma união do grupo e traz uma vontade de superar essas dificuldades muito grande. Acho que isso aqui é a química que existe com essa variedade de pessoas de diversas culturas de diversas regiões e tudo isso é harmonizado para a gente atingir o objetivo. Muito interessante.
MEMÓRIA PETROBRAS Eu acho muito importante porque toda essa memória, você vê, são experiências individuais, então aqui participando do programa, eu posso transmitir um pouco do que eu vivi, passar para outros colegas que virão ainda e eles vão poder exatamente conhecer o que nós vivenciamos, as dificuldades, as superações, as alegrias. Eu acho que a gente só tem a aprender com a história, conhecer, saber a origem das coisas e saber pegar dessa experiência e poder nos posicionar de uma forma mais vantajosa para desafios semelhantes no futuro. A gente preservando a história, na verdade, a gente garante um futuro mais tranqüilo. A manutenção da memória é fundamental para que nós tenhamos um futuro melhor. Isso é importante...Recolher