Projeto: Morro dos Prazeres – esse morro tem história
Realização Museu da Pessoa
Depoimento de: Rubens Barbosa dos Santos
Entrevistador por Alex Michel Gomes
Rio de Janeiro, 6 de julho de 2002
Código MP_CB016
Revisado por: Ticiana Werneck
P/1- Boa tarde.Qual o seu nome completo e data...Continuar leitura
Projeto: Morro dos Prazeres – esse morro tem história
Realização Museu da Pessoa
Depoimento de: Rubens Barbosa dos Santos
Entrevistador por Alex Michel Gomes
Rio de Janeiro, 6 de julho de 2002
Código MP_CB016
Revisado por: Ticiana Werneck
P/1- Boa tarde.Qual o seu nome completo e data de nascimento, por favor?
R - Rubens Barbosa dos Santos. Eu nasci no dia 2 de fevereiro de 1948.
P/1- Onde o senhor nasceu?
R – Na cidade de Rio Grande. É uma cidade do litoral do Estado do Rio Grande do Sul.
P/1 – Quando a sua família veio para o Rio de Janeiro, ou o senhor veio para o Rio de Janeiro sozinho?
R – Eu vim para o Rio de Janeiro... Eu tentei três vezes. A última vez foi no ano de 1989, quando eu fiquei.
P/1 – E essa última vez, o senhor veio para Santa Teresa especificamente, ou para morar em outros lugares do Rio?
R – Eu vim pra morar no Encantado, um bairro lá da Zona Norte.
P/1- E como é que o senhor veio pra Santa Teresa?
R – Eu vim vindo aos poucos da zona Norte. Eu saí do Encantado e fui pra Tijuca. Depois da Tijuca estive alguns anos na Lapa, onde eu tive o Café Bela Dance (?) e depois de dois anos, eu vim morar em Santa Teresa.
P/1- E com que idade o senhor começou a participar de danças?
R – Comecei a participar com 17 anos, logo após sair do Seminário, porque eu ia ser padre.
P/1- E se profissionalizou com que idade?
R – Aos 22. Eu cursei na Argentina, em Buenos Aires, na escola do Balé Contemporâneo de la Ciudad de Buenos Aires, que na época era dirigida pelo grande Oscar Arai (?).
P/1- Hoje, o senhor é dono de uma companhia?
R – Sou. Da Rubens Barbôt Danças.
P/1- Por que Barbôt? De veio o Barbôt?
R – [risos] Barbôt não é um sobrenome francês. É metade de Barbosa. O sobrenome é Barbosa dos Santos. Então, quando eu comecei a dançar, meus tios, me aconselharam que eu trocasse de nome porque eles tinham medo que eu enxovalhasse o sobrenome,
fizesse feio com
o nome deles. Então eu parti
pela metade, ficou “Barbo” e botei um “tezinho” dos Santos, pra não ter problema.
P/1-
Como foi esse caminho até você chegar na comunidade do Morro dos Prazeres e trabalhar no Casarão?
R - Quando vim para Santa Teresa, pela última vez, morei bem pertinho daqui, a 150 metros, na Almirante Alexandrino, essa casa me chamou a atenção. Mas eu não conhecia. Aí, no ateliê do Portas Abertas de 2001, eu tive o prazer de subir aqui com a Bisa Viana e os _____- (?) Aí me
impressionei com a casa, aquela coisa toda, fui ficando com essa casa na minha cabeça. Eu gosto desse morro, eu moro cerca, mas eu me considero desse morro e acabei vindo ensaiar aqui, consegui um espaço para ensaiar com a minha companhia e aí já pedi pra Bernadete se tinha um horário, se tinham pessoas interessadas em começar algum trabalho. Assim eu comecei. Só não trabalho com crianças porque o chão é muito duro e criança com um físico se formando é bastante complicado porque pode danificar a coluna, os tendões, essa coisa toda. Então, eu estou trabalhando só com o que eu chamo de “burros velhos”.
P/1- Já que você falou “burros velhos” eu gostaria de saber um pouco mais dessa história de “burros velhos”
R – [rindo] São pessoas, tem gente de 21 até 50 anos. Pessoas maravilhosas que tem um bom ritmo para trabalhar. Elas têm vontade de trabalhar dançando. Não dançavam antes, e alguns achavam que dança era coisa pra rico, no caso do homem, aquela velha história: homem que dança é aquilo que eu não vou nem falar, e eu acho que eu estou mexendo com as pessoas e as pessoas
também estão mexendo comigo porque eu estou perante a uma realidade que eu não conhecia no Rio de Janeiro. Eu não tinha contato.
P/1 - Assim que você chegou aqui, qual foi sua impressão quando viu uma comunidade tão grande. Quais são os seus projetos daqui pra frente, além do que está acontecendo?
R - O que eu senti, já mesmo antes de eu começar a desenvolver esse trabalho aqui, foi o lance de que parece que ser favelado é ser traficante, assassino, ladrão, seqüestrador. E eu notava a comunidade daqui um pouco acanhada. Uma pessoa já bastante conhecida, um artista que está trabalhando aqui junto comigo, sabe que eu tenho um filho que é ator famoso e foi isso que chamou a atenção. Como eu sempre falo, quando a gente der com a cola na cerca, a gente vai apodrecer igual: branco, rico, negro, favelado, não-favelado. Somos todos seres humanos independente de nossas profissões e de nossas causas. Cada um tem uma história pra contar . E isso foi o que me levou a vir pra cá e estar aqui. Vou penetrar nessa comunidade, inclusive eu tenho a ideia de, quando sair um dinheiro que estou esperando, comprar uma casa pra mim. Quero viver aqui. Eu gosto, eu confio na comunidade daqui.
P/1- Quantos filhos você tem?
R – Dois. Eu tenho um que é de sangue mesmo, o Marcos Aurélio Pereira dos Santos, e outro que é o Sérgio Menezes, que não é meu filho de sangue. Ele é meu filho de educação artística.
Eu fui a pessoa que descobriu ele, quando nós estávamos ensaiando lá na Escola XV, lá na zona Norte, em Quintino. Ele estava fazendo teatro e começou dançando comigo. Depois que ele parou de dançar comigo, ele passou pela mão do Sergio Brito, trabalhou com o Aderbal Freire Filho. Foi se fazendo, fazendo, e acabou dando esse – eu não tenho vergonha de dizer – esse belo ator que ele é. Porque meu filho é um bom ator.
P/1- Você saberia dizer a razão do nome Morro dos Prazeres?
R – Não sei. É um furo na minha cultura [risos]. Não sei.
P/1- Então você imagina que pelo fato de ter esse furo, conforme você entrar mais na comunidade, um dia vai descobrir?
R – Eu tenho que descobrir. Eu tenho que saber, porque é um nome muito bonito e muito real. Estar aqui em cima é um prazer. Muita gente bonita, muita gente simpática. Todo mundo muito aberto. Eu estou em casa.
P/1- Gostaria que você desse um depoimento sobre o que você achou dessa entrevista e o que você acha do nosso projeto que estamos restaurando a história da comunidade e do Casarão.
R - Acho super interessante porque o Brasil é um país praticamente sem memória. As coisas não são registradas ou bem registradas. Se não são os griots, pessoas de uma certa idade que conhecem a história, e nesse caso, conhecem, no Rio de Janeiro, a história das comunidades, conhecem a coisa da cultura negra, do candomblé, do carnaval, ficaríamos sem saber. Acredito que o dia em que, daqui a milhares de anos, quando os arqueólogos encontrarem nossos restos, talvez essa entrevista aqui ainda exista, para que eles possam ter ideia do que foi esse nosso centro.
P/1- Foi um prazer entrevistá-lo. Muito obrigado senhor Rubens Barbosa.Recolher