Projeto Memórias do Comércio de São José do Rio Preto - 2020-2021
Entrevista de Kátia França Lopes
Entrevistada por Luis Paulo Domingues e Cláudia Leonor Oliveira
São José do Rio Preto, 20 de maio de 2021
Entrevista MC_HV081
Transcrita por Selma Paiva
(00:52) P1 – Kátia, então, para começar eu gostaria que você dissesse seu nome completo, a data de nascimento e o local que você nasceu.
R1 – Eu sou a Kátia de França Lopes, eu nasci em 30 de dezembro de 1983, eu nasci em Piracicaba, aqui no interior de São Paulo, morei pouco tempo lá, mas eu sou natural de Piracicaba.
(01:18) P1 – Legal, e qual o nome de seu pai e de sua mãe?
R1 – Eduardo... completo ou só o primeiro nome?
(01:25) P1 – Completo, por favor.
R1 – Eduardo Pereira de França Filho e Elizabete de Jesus França.
(01:33) P1 – Legal. E seus avós? Você ainda convive com eles?
R1 – Tá, os meus avós... a minha família é de São Paulo, né? Eu só tenho uma avó viva, avó materna. Começar por ela, então: ela é Luzia Gonçalves Lima, era esposa de Francisco Antunes Pereira, então, meus avós maternos e avós paternos: a minha avó era Maria Dulce Pereira de França e meu avô era Eduardo Pereira de França.
(02:03) P1 – Legal. E você sabe se eles têm alguma origem, vieram de alguma região? Porque seus avós eram de São Paulo, né? Você nasceu em Piracicaba...
R1 – Não, eles são migrantes, né? Eles, os meus avós maternos são mineiros, do norte de Minas Gerais, da região de Montes Claros e os meus avós paternos são de Pernambuco. Eles eram do interior, não me lembro exatamente a cidade no interior de Pernambuco e vieram numa época muito parecida para São Paulo, eles se instalaram numa cidade da Grande São Paulo que chama Itapevi, acho que faz uns... é uma cidade pequena ali e aí, depois de um tempo, morei por ali e vim criança para São José do Rio Preto, meu pai veio a trabalho, né? E aí a gente veio, eu vim na década de noventa, voltei... vim para Rio Preto em 92.
(03:01) P1 – Sei. Legal. Você teve, ao longo da sua infância, adolescência, algum costume que a família trouxe do nordeste? Comida, música ou eles já se integraram em São Paulo, mesmo?
R1 – Acho que a comida é muito presente, muito presente nas nossas famílias, assim, é a maneira que as minhas avós mais se expressavam em relação ao amor era cozinhando para gente, então a culinária é algo que mais manteve presente. Acho que música nem tanto, mas a culinária, com certeza, até hoje, eu faço questão de mesclar o tempero das duas, assim, tanto de Pernambuco, quanto ali de Minas Gerais. Então, é muito presente, eu faço questão que as minhas filhas também conheçam esses temperos. Então, seria por aí.
(03:56) P1 – Você tem algum prato predileto, desse que veio de herança?
R1 – Das duas seria o frango, frango cozido, cada uma com seu tempero específico, mas é o sabor da minha infância, é aquele frango de domingo. (risos)
(04:13) P1 – Sei, da família mesmo? Muito legal.
R1 – Isso. Todo mundo se reunir ali, para comer.
(04:20) P1 – Sim. E aí você nasceu em Piracicaba, né?
R1 – Exato.
(04:24) P1 – Você lembra de alguma coisa lá da sua infância ou você era muito pequenininha?
R1 – Não, eu morei muito pouco tempo mesmo em Piracicaba, meus pais foram para lá por uma questão de recomendação médica, pelo clima de Piracicaba, né? Então, moraram pouco tempo e, logo após eu nascer, eles passaram por uma situação bem complicada, assaltaram a casa deles e a gente... eles acabaram voltando ali para capital, né? Estive em Piracicaba em algumas situações da minha vida, mas não tenho, assim, memórias de morar em Piracicaba, não tem.
(04:59) P1 – Sei. O seu pai e sua mãe tinham qual profissão?
R1 – O meu pai era contador, perito judicial, voltado para essa parte de números, (risos) gosta também. A minha mãe... eles tiveram restaurante quando eu era bem criança, assim, também e depois que a gente foi crescendo, ela... quando eles acabaram com o restaurante, ela começou só ficar em casa mesmo, então, minha mãe é do lar.
(05:28) P1 – Sei. Esse restaurante era em Itapevi ou já em Rio Preto?
R1 – Não, não, era em São... era em Osasco? Osasco.
(05:37) P1 – Osasco.
R1 – Exatamente, quando a gente morava em Osasco, do lado de São Paulo, isso! Era um restaurante, principalmente... era uma cozinha industrial, na verdade, né? Eles tinham uma cozinha industrial e aí atendiam em grandes volumes, assim.
(05:52) P1 – Sim, sim. Legal.
R1 – Me lembro de andar (risos) pela cozinha, enquanto criança, sair da escola e ir direto e acompanhá-lo nessa rotina que não ___ (06:02).
(06:03) P1 – (risos) Imagino. E, Kátia, você foi para Rio Preto com quantos anos, mesmo? Você lembra?
R1 – Tinha oito ou estava fazendo oito, coisa assim, Luís, mais ou menos uns oito anos de idade, oito ou nove... isso, oito anos.
(06:20) P1 – Então, sua infância foi meio compartilhada entre próximo da capital, né e Rio Preto. A gente sempre pergunta para os entrevistados se eles lembram de como era a rua da infância, o que eles faziam, né? Então, você tem como...
R1 – Luís, para mim é um pouco complicado. Os meus pais mudaram muito. Eu sou uma pessoa que já morei em muitas casas. Então, assim, eu tive... estudei em muitas escolas (risos), tanto em São Paulo que depois, quando vim pra cá também, mudei bastante... eu não tenho tantas... eu acho que, se eu for pensar na memória de infância, são principalmente as casas de meus avós, que isso sempre foi no mesmo local, então eu tenho uma referência de pessoas, então... principalmente a casa de meus avós em Itapevi. Se eu for pensar a rua da minha infância que eu vou mais lembrar, com certeza... tenho memórias soltas...
(07:17) P1 – De outras.
R1 – ... em lugares que eu morei, em bairros, cidades e tal, mas é principalmente casa de meus avós.
(07:26) P1 – Sim. E lá em Itapevi dava para passear na rua, assim, era uma infância, assim... porque em Rio Preto, no começo dos anos oitenta, as pessoas andavam de bicicleta e tudo. Em Itapevi dava para fazer tudo isso? Jogar bola na rua?
R1 – Não. Na verdade, para mim, assim, libertador foi morar aqui no interior, né, porque ali em Itapevi a gente ficava mais no quintal da casa da minha avó, que era bem grande, assim, porque a rua... é uma cidade perigosa, já era bastante perigoso ali, na época. Eu me lembro, quando morei por pouco tempo em Itapevi, morei por pouquíssimo tempo, antes de meu pai vir para cá. Ele veio primeiro, né, se estabeleceu na cidade, a gente ficou morando em Itapevi por alguns meses, ali. Eu me lembro de situações de violência, assim, na rua mesmo. Então, não é... para mim, vir para o interior e poder brincar na rua, a minha vida de brincar na rua começou depois que eu vim para (risos) Rio Preto e ter contato com natureza e ver árvores e...
(08:31) P1 – E com oito anos você deve ter uma lembrança gostosa de Rio Preto e do bairro. Como que era o lugar que você veio morar em Rio Preto?
R1 – Quando eu morei, mudei para Rio Preto, eu morei aqui num condomínio de prédios, delicioso, que... não sei se você conhece a cidade, mas é um condomínio... na época era muito novo, chama Piazza Dei Fiore e é um condomínio que tinha uma área de lazer grande, uma convivência com outras crianças, né, então, parque de diversões. Era um sonho para mim, aquilo ali. (risos) Foi a memória mais gostosa, assim, da minha infância. Não só a minha, quando meus primos viam nos visitar, né, ___ (09:09) interior e eles todos têm essa mesma memória, de uma região gostosa, tranquila e a gente ia visitar com o meu pai, muito curioso, ele gosta sempre de... eu falo que ele conhecia mais Rio Preto que os rio-pretenses. Então, a gente... ele sempre nos levava para passear aqui na região, aqui tem vários rios, né? E o pessoal faz as prainhas de água doce. Então, a gente conhecia todos, todo final de semana era indo conhecer algum lugar novo. Então, foi muito gostoso.
(09:40) P1 – Ah, que legal! E você tem irmãos? Eu esqueci se você falou.
R1 – Tenho, tenho irmãos, bem bom, eu tenho três irmãos: dois irmãos homens e uma irmã mulher, eu sou a segunda filha.
(09:56) P1 – Sei. E aí vocês brincavam juntos, saíam... condomínio é legal, porque dá para brincar ali dentro, né, mas na rua... na rua, em Rio Preto, assim, qual que era o passeio?
R1 – É, depois que nós saímos do condomínio, né, depois que a gente saiu do Piazza, a gente foi morar em casa, eu morei em algumas casas e também mantive essa coisa de brincar na rua com os amigos. Qual que era... não entendi sua pergunta, desculpa, Luís, eu te cortei.
(10:28) P1 – O passeio, assim, em Rio Preto, qual que era o legal de fazer? Seu pai te levava aonde? Lá no Centro, tinha algum parque ___ (10:38)?
R1 – Olha, primeiro lugar que me lembro de brincar em Rio Preto, ainda antes de mudar, meu pai estava naquele Hotel Augusta, que fica numa região central e tinha uma praça, na época não tinha... uma praça muito gostosa, então, a gente sempre ia para praça. Clubes não, frequentei... o único clube que eu frequentei foi do Sesi aqui, numa época que eu morava bem próximo ao Sesi. A gente não frequentava tantos clubes, era mais essa exploração de natureza, de ir para os lugares, restaurantes distantes. Então, a gente explorava bastante a região, né? Rio Preto sim, me lembro de ir ao bosque da cidade, delícia, uma delícia, ver os animais, onde é o nosso zoológico, lá tinha um parquinho delicioso (risos), me lembro que tinha uma espécie de um labirinto ali, era muito legal, então... a Cidade das Crianças, que era um sonho, aqui em Rio Preto a gente tem um parque que chama Cidade das Crianças, era um sonho, um lugar enorme, enorme, acho que, na minha geração vai estar na lembrança de todo mundo que viveu em Rio Preto naquela época. Era incrível, um sonho, realmente uma Disneylândia (risos) e é legal que não são brinquedos que são eletrônicos, os nossos pais... tinha uma roda gigante, meu pai que tinha que movimentar a roda gigante, até ela funcionar. Então, essa interação de família, incrível, uma memória maravilhosa, assim, acho que seria a Cidade das Crianças.
(12:08) P2 – Era um parque?
R1 – Oi? Oi, Claudia?
(12:11) P2 – Era um parque, a Cidade das Crianças?
R1 – Chama Cidade das Crianças, se um dia vocês pesquisarem, é um parque enorme, é uma área verde enorme, grande mesmo, não sei te precisar e com brinquedos espalhados por toda essa área. Vale a pena, eles restauraram recentemente a Cidade das Crianças, está com bem menos brinquedo, mas eles restauraram, restauraram, né, acho que...está fechado agora, por conta da pandemia, todos os parques aqui estão fechados, mas é legal, já levei minhas filhas também e é importante, seria, eu acho, a maior memória de diversão, seria a Cidade das Crianças.
(12:55) P1 – Muito bom. Kátia, e a escola, como que era a escola em Rio Preto? Você ia a pé, ia de ônibus? E onde que ela era? Que você lembra da escola, de bom?
R1 – As escolas, né, Luís. (risos) Eu, de verdade... a minha família é quase cigana, meu Deus! Eu estudei em muitas escolas. A primeira escola que eu estudei era muito gostoso, que ela ficava na represa municipal, ela fica exatamente dentro da... chama Pequeno Príncipe, é uma escola particular, uma escola de madres, né? Escola pequeninha. Então, assim, lá em São Paulo são aquelas escolas grandes, ali era uma escola pequena, então foi uma experiência muito legal, uma escola... a turma tinha oito, nove alunos e ficava exatamente ali na represa, eu me lembro que algumas vezes a gente até ia com a professora ali, andar, nos arredores da escola. Então, a primeira escola que eu estudei foi ali e aí, depois, a gente... eu mudei para uma escola pública, primeira vez que eu estudei numa escola pública e também gostei muito da experiência, porque tinha uma liberdade que, nessa escola particular de madres não tinha, então eu gostei muito, eu como criança adorei, adorei também que tinha... descobri que existia merenda escolar (risos), eu achava muito legal aquela coisa de você estar no refeitório com outras crianças. Então, eu estudei... depois disso eu comecei a estudar em escolas públicas, né? Eu estudei mais, durante a infância, em duas escolas públicas. E fui!
(14:25) P1 – Legal. E na escola você já tinha alguma disciplina que mostrou que você ia para esse ramo do comércio ou você pensou em ser outra coisa, assim, pensou em fazer faculdade de outras coisas que não tinham a ver com comércio? Como foi essa descoberta?
R1 – Luís, não foi na escola, eu vou te dizer que não foi nem na primeira faculdade. (risos) A minha história com comércio veio depois, né? Eu sempre gostei muito de História, sou muito da área de Humanas: História, Psicologia, essa coisa que envolve ser humano, eu sou... eu descobri que eu sou apaixonada por ser humano, né? Então, assim, na escola eu sempre... me enxergava professora, por exemplo (risos), uma professora de História e depois eu pensei em ser psicóloga e lidar diretamente, agregar na vida das pessoas, acho que essa necessidade de agregar na vida das pessoas é a minha essência, né? Então, comecei ali e depois eu comecei... eu sempre gostei de trabalhar, de ter minha independência. É minha característica, comecei trabalhar cedo. Eu me lembro que eu comecei... eu também sempre gostei de viajar e lembro que eu comecei fazer um curso de Francês bem cedo, aqui tem um centro de línguas, então eu fiz Francês, fiz Espanhol e, por conta desse Francês, meu primeiro emprego foi ser secretária de um médico que estava fazendo uma tese e aí tinha que traduzir um texto em francês, (riso) Então, meu primeiro emprego foi esse como secretária, traduzindo do francês. Foi o que eu consegui na época e depois comecei trabalhar com meu pai, meu pai tinha um escritório, né, de perícia judicial e ele queria que eu fosse advogada e tal e eu não queria tanto e eu descobri, me vi na possibilidade de trabalhar com... fazer Economia, sabe? A minha primeira faculdade comecei fazer Economia aqui em Rio Preto, porque tinha... eu gosto dessa parte financeira. Gosto, né? Tenho facilidade, meu pai era uma pessoa... aprendi muito, fazia parte da minha vivência. E tinha essa questão social, na Economia também você tem essa questão de observação da sociedade. Então, eu me vi, eu achei que tinha, comecei fazer Economia, gostava, não era apaixonada... e o meu pai era uma pessoa que viajava muito a trabalho, muito, muito, muito e, sempre que possível, ele levava a gente na mala. (risos) Como eu trabalhava com ele, muitas vezes eu conseguia ir, né? E, em uma dessas viagens, já voltando, indo para esse meio... para vocês entenderem a minha vida e de onde veio... numa dessas viagens ele foi ao Rio Grande do Sul e aí eu estive com ele e a gente ficou uns 15, 15 a vinte dias viajando ali, fomos conhecer Serra Gaúcha e eu me apaixonei por aquelas pessoas que trabalhavam com vinho, descobri que o vinho não nascia na garrafa, eu falei: “Meu Deus do céu! Tem todo um universo”. E fiquei encantada e eu comecei a pensar e descobri que existia uma profissão de pessoas que faziam vinho, né? Então, a primeira coisa foi isso. Então, existe a faculdade de Enologia. Não sabia que tinha no Brasil. Então, depois que eu me apaixonei por isso, que eu comecei pesquisar e descobri que tinha esse curso, que eu não precisava ser dona de uma vinícola, nascido ali para trabalhar com vinho, eu descobri que tinha a faculdade de Enologia, mas eu achava que era só fora do Brasil e quando eu descobri que tinha aqui no Brasil, em Bento Gonçalves... nessa época eu tinha o escritório, tinha largado o trabalho com o meu pai e tinha montado meu próprio escritório de perícia judicial, né? Não era formada em Economia, mas eu já trabalhava muito tempo com isso e aí eu decidi largar tudo e descobri que tinha essa faculdade pública lá em Bento Gonçalves, é um instituto federal no Rio Grande, em Bento Gonçalves e aí eu decidi fazer cursinho, então eu parei a faculdade de Economia, aí eu fui fazer um cursinho, porque era uma faculdade pública, era um pouco concorrido e eu comecei fazer o cursinho de seis meses, aquele semiextensivo e eu passei (risos), simplesmente passei, tranquei tudo, mudei minha vida e fui morar no Rio Grande do Sul, em Bento Gonçalves, fazer a faculdade de Viticultura e Enologia e eu já não fui tão nova, tinha vinte e poucos anos, 22, 23 anos, sei lá, que eu tinha na época e eu já estava acostumada ter o meu próprio trabalho, a minha própria renda, não conseguia me enxergar dependendo do meu pai e a faculdade de Enologia é uma faculdade... Oi?
(19:24) P1 – Desculpe te cortar, te cortei, mas...
R1 – Imagina.
(19:28) P1 – Fiquei curioso. Você já tinha saído da casa de seus pais aí em Rio Preto? Ou...
R1 – Não, morava com eles, morava com eles.
(19:37) P1 – Então, foi ___ (19:38) ...
R1 – Mas eu sempre quis... foi, mas essa coisa de morar fora sempre esteve em mim. Eu tinha muita vontade de ir para a França, por exemplo e eu sabia que em algum momento eu ia sair, eu tinha vontade de fazer faculdade fora, mas eu não fiz por conta que comecei trabalhar com o meu pai e aí eu fiz uma faculdade aqui e para continuar, né? E aí eu fui, me mudei para lá. Então, o curso de Enologia é um curso integral, então as aulas eram tarde e noite, né? E aí, para eu não ficar dependendo do meu pai, eu já fui procurar alguma coisa para eu fazer, (risos) ter minha fonte de renda e lá tem muitas vinícolas, Luís, muitas vinícolas e essas vinícolas recepcionam os turistas, né? E fazem a parte de enoturismo. Então, nos finais de semana tinha muita demanda de pessoas para trabalhar e aí eu comecei trabalhar em vinícola, primeiramente, assim, o que a gente chama de varejo, que é a loja de vinhos, que é o complexo... e aí eu comecei a trabalhar nessas lojas de vinho, recepcionando essas pessoas, apresentando para eles o processo produtivo. Então, já que eu estava começando a fazer Enologia, eu já tive que ir atrás de... não tinha muita noção desse universo, então eu tive que estudar, aprendi com muitas pessoas que trabalhavam nesses varejos e foi onde eu comecei, tive meu primeiro contato direto com o comércio, porque ali a gente primeiramente vendia a empresa, vendia a cultura do vinho, né? Essas pessoas iam para lá buscando essa experiência e aí eu recepcionava essas pessoas, apresentava toda a empresa e eles se encantavam, né? Porque é... tanto é que eu me apaixonei dessa forma, indo visitar vinícolas e aí eu apresentava essa vinícola, o processo produtivo e depois fazia a venda, né? Começava apresentar... primeiramente a venda vinha... era uma venda, sim, o foco principal era apresentar, apaixonar essas pessoas pelo produto e aí eles acabavam comprando e tal e, para isso, eu tive que buscar muito conteúdo para poder... existem pessoas que chegam, que não têm muita noção, a maioria, mas tem algumas pessoas que já tem um certo conhecimento e uma vivência do mundo dos vinhos, então, a minha...a Entrenós, eu posso dizer que a Entrenós Vinhos do Brasil começou ali, nessa minha vivência de apresentar e conversar com as pessoas, de agregar o meu conhecimento, que ainda era restrito, pequeno, no mundo dos vinhos na época, para essas pessoas. Então, assim, e essa experiência foi muito importante para mim. Para você entender o que é o mercado, né? O que as pessoas se interessam, qual o nível de intimidade das pessoas com o mundo dos vinhos. Então, isso: para eu me manter, para eu ter minha independência financeira, eu fazia essa loucura de trabalhar. (risos) Assim, a minha vida foi muito... eu não tinha folga e, assim que eu entrei na faculdade, eu descobri que existia uma... um intercambio da minha faculdade com a faculdade na França, na região de Bordeaux, que... acho que não sei a cada quantos anos, eles... você podia ir fazer um intercâmbio lá nessa faculdade, fazer teu estágio de conclusão. Então, assim que eu entrei na faculdade, eu voltei a fazer Francês. Assim, eu tinha... no meu único dia de folga, _______ (23:12) pensar, eu ia fazer, voltei a fazer Francês, porque eu queria muito, eu falei: “Eu quero ir para a França”. Sempre quis ir, eu acho que o meu sobrenome é França, França sempre me instigou, né?
(23:23) P1 – Verdade.
R1 – Então, eu trabalhava e já voltei a fazer Francês. Nesse meio tempo, lá em Bento Gonçalves, eu conheci o meu esposo, o Aleandro...
(23:35) P1 – Como foi? Conta um pouquinho.
R1 – Então, o Aleandro é daqui de Rio Preto, Luís, ele é daqui de São José do Rio Preto. (risos) Então, como a gente era da mesma cidade, a gente se conheceu ali: “Nossa, uma pessoa...”. É como achar uma agulha num palheiro. (risos) Só que o Aleandro também fazia Enologia, só que ele era de uma turma antes, ele era meu veterano.
(24:06) P1 – Hum.
R1 – Então, assim, a gente se conheceu, começamos a namorar, ele também, na época, trabalhava em vinícolas e também fazia estágio na Embrapa lá, tinha uma Embrapa em Bento Gonçalves, a Embrapa Uva e Vinho. Então, assim, a vida das pessoas... ele também não era tão novo, ele é mais velho que eu e também não foi a primeira profissão dele e ele também se apaixonou pelo mundo dos vinhos e caiu lá em Bento Gonçalves. (risos) A nossa vida se encontrou, éramos dois jovens, né, apaixonados e descobrindo aquele universo e querendo se manter, então, trabalhando com mil coisas ao mesmo tempo e a gente se casou, né, rapidamente, eu acho que um ano e pouco depois eu já estava casada e eu morava com uma amiga nessa época e aí a gente morou todo mundo, ele veio morar com a gente. Então, assim, a gente se casou numa república, praticamente. E foi assim, né? Eu comecei, então no... primeiro, recapitulando toda essa história, para falar como eu tive contato com o comércio, né? Foi por conta da minha profissão, por conta da minha necessidade de ter independência financeira e por eu me apaixonar, por ser apaixonada por pessoas, eu sou... eu não sei se sou uma vendedora nata, (risos) eu não posso te dizer isso, mas eu sou apaixonada por pessoas e por agregar na vida das pessoas, né? Então, assim, o nosso foco... e a nossa ferramenta é o vinho, tá, a nossa paixão e a nosso meio de comunicar com as pessoas é através do vinho. Então, não sei se vocês conseguiriam entender, mais ou menos...
(25:55) P2 – Eu quero voltar um pouquinho, eu quero voltar um pouquinho, Kátia. Então, assim, quando a ferramenta é o vinho, aquela primeira viagem pelo sul que você fez com o seu pai, assim, o que te encantou, assim, porque é um universo muito lindo, você está falando e estou lembrando de algumas coisas minhas também, mas o que te encantou nessa viagem, assim, passando por essa região de vinho, de plantação, de vinícola?
(26:20) P1 – De montanhas.
(26:21) P2 – É diferente, né? Uma paisagem diferente.
R1 – Claro que a paisagem, as videiras, a uva, esse contato, a natureza agindo, né? Você entender que o vinho é algo que vem da natureza, né? Mas eu, de verdade, acho que me apaixonei por aquelas pessoas que trabalhavam, de viver... porque não sei se já foram à Bento Gonçalves, mas são todas empresas familiares, desde a menorzinha, até uma empresa grande como Salton, por exemplo, que foi uma vinícola que eu trabalhei, são vinícolas familiares, de estrutura familiar, são pessoas que trabalham no dia a dia ali, sabe? Então, assim, essas pessoas simples e extremamente apaixonadas e dedicadas, porque é uma vida dura, difícil. Eu me apaixonei por essas pessoas, por isso que eu pensei em ser uma dessas pessoas. Então, assim, de trabalhar com isso, me apaixonei pela região, é apaixonante, até hoje o meu coração é bastante dividido, (risos) eu falo que é um pouco gaúcho e paulista. Então, eu me apaixonei principalmente por essas pessoas que trabalhavam com vinho, que viviam o dia a dia nesse universo, é uma questão... é uma cultura, é muito mais do que um trabalho, gente, é uma cultura, né? Que envolve a vida dessas pessoas de uma forma que você não consegue mais separar o que é vinho, o que é família; o que é vinho, o que é trabalho; o que é vinho, o que é paixão. E foi isso.
(27:57) P1 – Eu até anotei aqui.
(27:58) P2 – Maravilha! Desculpa, Lu...
(28:01) P1 – Eu até anotei essa frase: “Eu me apaixonei pelas pessoas que estavam lá trabalhando”, né? É bonito.
R1 – É bem isso. (risos)
(28:11) P2 – E a outra paixão, o Francês, assim, o que te atraía estudar Francês, assim? É uma língua muito especial, que poucas pessoas, hoje, estudam Francês, assim, né?
R1 – Então, primeiro contato que a gente tem, né, com a França, eu não sei, acho que todo mundo é através da televisão, é sempre muito apaixonante quando mostra imagens da França, né? Aparece uma Torre Eiffel ali, ao som de uma música francesa, então ela já instiga uma coisa assim na gente, uma coisa poética, né? Então, assim, eu enxergava a França como algo poético e eu sempre fui muito curiosa de viajar, meus pais sempre viajaram, ele sempre me levava na mala, né? (risos) Então, eu viajei muito, assim, pelo Brasil eu já rodei bastante com o meu pai e eu me apaixonei por essa coisa do viajar, de descobrir outras culturas porque, quando a gente viaja, meus pais, a gente sempre, não viajava muito como turista, né? A gente gostava sempre de se misturar, entender como essas pessoas viviam. Então, meu pai me ensinou isso. Foi essa curiosidade, essa vontade de descobrir mais sobre outras formas de viver, outras formas... e aí juntou que, assim, para eu poder viajar eu entendia que eu teria que estudar outras línguas, eu teria que me comunicar, tenho uma necessidade muito grande de comunicar, né? Então, assim, a primeira coisa foi: eu vou fazer um idioma. E aí, nesse curso, eu não tinha meus pais não tinham dinheiro para pagar um curso particular de línguas, então tinha esse curso da prefeitura e uma das opções: tinha espanhol, italiano e francês, eu era... gente, eu tinha 12 anos, era uma criança, (risos) recém-saída da infância ali, quando comecei fazer esse curso e eu me toquei por essa coisa, essa imagem poética que eu já tinha da França, né? Eu falei: “Vou fazer Francês”. Eu nunca fui muito movida a essa parte financeira, dinheiro. Se eu fosse pensar nisso, naquela época já tinha uma certa consciência, teria feito Espanhol primeiro, né? Eu falei: “Não, Espanhol fala mais, é mais usado no mundo”, mas eu falei: “Não, mas eu vou fazer Francês”. Aí fui fazer Francês e me apaixonei, porque é um idioma lindo e quando você estuda uma língua, você estuda sobre a cultura local e eu fiquei cada vez mais apaixonada e a França ficou na minha cabeça, aqui ó: “França, França, França”. (risos) E eu sabia, em algum momento da minha vida eu sabia que eu ia para fora do país, eu tinha vontade de viver isso e de conhecer e de descobrir, de viver outras possibilidades. E deu certo, né? Então, voltando ali na faculdade, eu consegui ser uma das selecionadas a ir para França e eu fui fazer meu estágio de conclusão do curso lá em Bordeaux, né? Então, assim, eu tinha que arcar com a passagem, né, mas, assim, a hospedagem, alimentação já estava incluso ali nessa parceria e aí, nesse estágio era muito bacana, porque a gente tinha a oportunidade de ficar um tempo em cada região, não era um só. Existia um centro, que era ali em Bordeaux, na cidade ___ (31:37) na verdade, ao lado de Bordeaux, uma cidade que fica a vinte quilômetros, que chama Blanquefort. Linda, cidade pequeninha, apaixonante. (risos) Então, eu fiquei uma parte em Blanquefort, num château, mas também fui para outras vinícolas ali da França, para outras regiões. Então, fui eu e essa minha amiga, gaúcha, que morava comigo, eu consegui apaixoná-la também (risos) no meu sonho e ela também começou fazer Francês dali a um pouco depois, junto comigo e nós fomos juntas para a França. Eu já estava casada, nesse época, né, que foi no final do curso. Então, nós fomos para a França e aí a gente ficou ali em Bordeaux, em Saint-Émilion, fui para Sauternes, que é uma região, uma cidadezinha de 500 habitantes, mas uma coisa maravilhosa. E existia um casal de professores que eram responsáveis por esses estagiários, que normalmente eram pessoas mais jovens, mais novinhas ali, saindo da faculdade. Como era minha segunda faculdade, eu não era tão novinha assim, mas tem que ter essa responsabilidade, né? Só que esse casal, incrível porque, além, nos finais de semana eles nos levavam para passear pela França. Então, a gente viajou para várias regiões ali. Foi incrível, foi lindo, uma vivência também de você entender uma outra forma de fazer vinho, né? De você ter esse conceito de terroir e o que que é e na França é muito forte. O mundo do vinho existe esse conceito do terroir, que é essa interação entre o clima, o solo, a variedade de uva e o homem, como que o homem lida com isso. E na França isso é muito forte. Então, para mim, assim, você... foi uma experiência maravilhosa. Na faculdade também, durante minha graduação, a faculdade também tinha essa...a gente viajou muito ali, com a própria faculdade. Então, assim, depois que eu saí das vinícolas comecei trabalhar num restaurante, não comentei, mas eu trabalhava de manhã e de final de semana, mas mesmo assim, às vezes eu conseguia uma folguinha para ir com a faculdade, a gente viajou bastante ali, o Rio Grande do Sul, fomos para o Uruguai, né? Santa Catarina, para conhecer outras regiões, entender um pouquinho mais sobre essas outras regiões produtoras de vinho.
(34:06) P1 – Kátia...
R1 – Oi?
(34:08) P1 – Nesse estágio na França e também na faculdade, o foco é saber fazer o vinho, entender como ele nasce, na natureza e fazer o vinho ou entender de vinho, para vender vinho?
R1 – Não, é o fazer, é o fazer, é o plantar e é o fazer. A faculdade de hoje, naquela época... não sei te falar hoje, Luís, mas é principalmente o fazer. A gente tinha teoria de marketing e tal, envolve na graduação, mas a vivência está muito focada no fazer, no trabalhar a uva e fazer o vinho. A minha vivência com o vender o vinho veio dessa minha busca por trabalhar nessas vinícolas, nesse atendimento. Então, assim, nem todos os enólogos, quer dizer, a maior parte dos enólogos não têm essa vivência de vender o vinho, eles estão muito mais... por isso que é muito difícil, assim, achar enólogos que estão vendendo os vinhos, a maioria foca muito na parte de elaboração, né, na parte de elaboração. Eu fui ter essa bagagem por conta desses meus trabalhos, né? Lidando com a parte de comércio do vinho. Como eu fiquei, durante todo o tempo que estive no Rio Grande do Sul, eu na faculdade ou nos estágios que trabalhavam com a parte de elaboração, depois da faculdade também trabalhei com elaboração, mas o grande impacto desse meu período no Rio Grande do Sul eu estava trabalhando principalmente com a parte de comércio, né? De vender, de mercado de vinhos.
(35:52) P1 – Sim.
R1 – Entender essa parte de demanda, né? Seria aí, na faculdade...
(35:57) P1 – Aí você já...
R1 – ... era muito restrita, muito restrita essa parte de venda.
(36:04) P1 – Sim, sim. Mas...
R1 – Era: “Vamos fazer o vinho” (risos)
(36:08) P1 – Sim. Mas aprendeu na raça, trabalhando na vinícola, né? Deixa te fazer uma pergunta: eu também morei no Rio Grande do Sul, só que eu morei lá embaixo, lá em Rio Grande e todo mundo gostava de vinho, só que os gaúchos de lá gostavam de vinho doce, eu achava muito doce, né? E lá na Serra? O brasileiro, como você define?
R1 – A Serra Gaúcha é um universo à parte no Rio Grande do Sul, Luís. Eu conheci outras regiões viajando, né? O Aleandro morou em... como é o nome da cidade que você morou, Alê? Pantano Grande, região mais central ali do estado, né?
(36:47) P1 – Sei.
R1 – E é muito diferente a cultura porque, assim, você tem os imigrantes, né? Então, você vai ter grande parte de italianos, os alemães, poloneses e tal. Então, assim, onde está muito focado essa cultura europeia, principalmente de italianos, os italianos não tomam o vinho doce, praticamente todos... todas as cidades onde tem uma colonização italiana vai ser vinho seco, não precisa ser vinho fino, pode ser aquele vinho comum, vinho de mesa, é um Bordeaux, um Isabel, mas é um vinho seco. Quando você está em regiões que você tem, por exemplo, colonização alemã, você vai ter um gosto muito grande de cerveja, por exemplo, né? A Alemanha tem essa pegada forte da cerveja e aí você já começa ter um consumo de vinho mais doce em regiões de colonização alemã, por exemplo. Agora, quando você vai indo ali, você vai lá para o sul ou regiões de fronteira ali com o Uruguai, Campanha Gaúcha, aí a coisa já dá uma misturada, das influências que você recebe ali, mas aí já são... em geral, saindo, vão ser regiões...você vai ter bastante consumo de vinho doce, sim, dentro do Rio Grande do Sul, quando você foge daquele miolo de Serra Gaúcha, você tem um grande consumo de vinho doce e as vinícolas, principalmente vinícolas pequenas, que não chegam em outros estados, elas se baseiam em vender ali para o próprio estado mesmo e o vinho de mesa, o vinho comum, vinho suave. Então, se comercializa bastante, tem gente que fica: “Ai, o Rio Grande do Sul”. Não, não é o Rio Grande do Sul não toma só os vinhos finos e vinhos secos, de jeito algum. Em muitas vinícolas elas estão estabelecidas na venda de vinho doce, até hoje. É verdade, gente, não sei se vocês têm essa informação, mas, assim, 80% do vinho que é consumido no Brasil é um vinho de mesa e um vinho doce.
(38:47) P1 – Sim.
R1 – Essa é a qualidade...
(38:52) P1 – Você acha que a pessoa que entende mais de vinho, já vai para esses vinhos mais secos, né? Vinho doce é mais popular, seria? Ou não tem nada a ver? Eu não entendo.
R1 – Olha, eu sou meio polêmica, (risos) mas vamos lá! Eu acho que... eu não sei, eu acho que existe uma diferença entre o entender e ser uma pessoa que tem o hábito de tomar. Eu acho que existem pessoas ali, velhas, oitenta, noventa, que tomaram vinho a vida inteira e até hoje tomam vinho, sempre, uma vez na semana, todos os dias e que tomam vinho doce, a vida inteira. Eu não posso dizer que essas pessoas não entendem de vinho. Eles têm uma intimidade muito grande com esse vinho, mas o paladar dele está formado, certo?
(39:37) P1 – Sim.
R1 – Eu acho que é assim: o Brasil é o país da cana de açúcar. (risos) Vamos começar por aí, né? Nós fomos criados com acesso muito fácil a aquilo que é doce, né? Então, assim, a gente come bastante açúcar, a gente come bastante sal, a gente come bastante gordura. Isso faz parte, esses sabores muito acentuados, né? Eu acho que, assim, a maior parte das pessoas que consomem vinho no Brasil, consomem vinho suave, tá? Agora, quando a gente vai para o nicho, um nicho num segmento de pessoas que consomem vinhos finos e quando a gente fala de vinho simples, vinho de mesa e vinhos finos é, principalmente, a origem dessas uvas, tá? As origens. Os vinhos de mesa são vinhos, cujas uvas vieram de origem americana, que esse nome que a gente... que é a uva que a gente come, que a gente faz suco, que a gente faz geleia, que a gente faz chimia, né? Então, essa uva vai ter uma graduação alcoólica menor, concentra menos açúcar, é um vinho que vai ter um aroma mais frutado, aquele suco de uva gostoso, né? E muitos desses vinhos, você faz tanto vinho seco, quanto vinho suave. O vinho suave é que, no final do processo, você adiciona açúcar, né? O que mais vende é o de mesa suave, mas existe também produção e consumo de vinho de mesa seco, tá? Tem gente que toma vinho seco, mas não gosta de vinho fino, gosta de vinho de mesa, porque ele é mais leve, menos alcoólico, não tem aquela pegada da madeira...
(41:13) P1 – Sim.
R1 – O que eu posso te dizer, Luís: quem entende de vinho toma vinho seco? Vamos dizer que quem é mais curioso de provar e quem vai buscando mais... experiências mais complexas, é uma tendência natural você tomar um vinho seco, por uma questão muito lógica: o açúcar mascara o nosso paladar, né? Então, assim, tudo que a gente toma muito doce, a gente não sente muito outros sabores, além do açúcar. Então, quando a pessoa quer ter uma experiência um pouco mais completa e realmente sentir todos os sabores daquele vinho, se aquele vinho tiver muito açúcar, isso vai atrapalhar sua experiência. Então, assim, é um... não sei se você consegue me entender. Então, quando você quer sentir todas as sensações, numa experiência mais completa, eu vou sempre te indicar que você tome quanto menos doce possível. Então, assim, existem pessoas que começam tomando vinhos de mesa suave, depois aquele açúcar começa já incomodar, né, porque ele pesa na boca. Começa ter uma degustação mais consciente daquilo que você está fazendo, que o vinho te convida a isso, não é simplesmente ahhhhhh, tomar vinho. Não, você olha para ele, com aquela cor linda, aí você põe perto da boca e você vai sentir aquele aroma: “Nossa!” Não é uma bebida que deixa tomar assim como se fosse água, ele te obriga: “Opa, presta atenção em mim”. E, quando você começa prestar mais atenção em vinho e você vai descobrindo essas experiências, então, a tendência é que você vá diminuindo o nível de açúcar, né? E aumentando a estrutura desse vinho. Todo mundo passa por esse processo? Não! Tem pessoas que vão tomar a vida inteira vinho suave, certo?
(42:55) P1 – Sim.
R1 – Mas existe uma tendência muito grande de pessoas que começam a tomar um vinho... porque não é porque ele é suave, que eles são todos iguais. Não! Tem vinhos mais ou menos doces, vinhos mais leves e vinhos mais encorpados, que têm mais estrutura. E existe uma migração, dentro do vinho suave, aquele vinho mais leve, mais docinho, para um vinho que tem um pouquinho mais de estrutura, uma uva que proporcione... existe uma uva chamada Bordeaux, por exemplo, que é uma uva que tem uma casca preta, ela é bastante estruturada, tem uma acidez alta. Então, sua percepção de açúcar diminui. Quando você começa tomar um Bordeaux, que é um vinho um pouquinho mais estruturado, menos doce e, às vezes, você já se arrisca tomar um vinho fino, suave, e aí já...
(43:38) P1 – Sim.
R1 – E aí sua experiência vai mudando, mas eu não vou dizer que quem entende de vinho toma vinho seco, mas vamos dizer quem quer uma experiência mais completa, sim, esse vai tomar vinho seco. (risos)
(43:49) P1 – E é um universo grande, né, o universo dos vinhos, né? Então, são muitos países, são muitas tendências, vamos dizer assim...
R1 – E tem essa questão cultural, né? A questão cultural, o hábito de um país, das pessoas desse país, determina muito do mercado, né, na produção daqueles vinhos. Então, que é assim: a maior parte das pessoas realmente vão continuar aquele processo de tomar aquele vinho mais doce e eu acho que existe uma coisa muito séria em relação ao vinho, de elitizar demais e de você realmente falar que essas pessoas que tomam vinho doce não sabem tomar vinho. Eu jamais, você não ouvir eu falar isso, nunca, nunca.
(44:26) P1 – Sei.
R1 - A minha loja tem desde atendimento... então, assim, como... é muito mais do que vender garrafas de vinho, né, eu acho que é a gente agregar informações e tentar fazer com que as pessoas tenhas experiências melhores. E eu não posso te dizer que um vinho doce é ruim e um vinho seco é bom, porque não é isso que define a qualidade de um vinho. É como ele é feito, as uvas que deram origem a esse vinho, né, Luiz? Então, assim: “Ah, vinho suave é ruim”. Não vou te dizer isso, não aceito... (risos).
(45:00) P1 – A Claudia saiu...
R1 - E me cortem, se eu começar a viajar muito aqui na conversa, não dão... dar um corte.
(45:06) P1 – Não, não, o que é isso? Para a gente, quanto mais o entrevistado desenvolve conhecimento, é mais legal ainda. Mas, viu, aí a faculdade terminou em que ano, mais ou menos, assim? E você continuou lá?
R1 – Eu terminei em 2011? 2011. Aí, nisso, Aleandro voltou para Rio Preto, nessa época a gente já tinha feito uma parceria com um colega de faculdade meu, o Eduardo Arbugeri, que a família dele é da família Arbugeri e a gente já tinha decidido voltar para São Paulo por saudade da família, eu sou muito apegada a essa parte de família, a gente falou: “Vamos voltar pra São Paulo, mas a gente vai voltar lá, a gente não tem produção de vinho, a gente vai trabalhar com comércio, né? O Aleandro também, nesse época já estava trabalhando com comércio ali, com vinícolas, nessa parte da área comercial e aí a gente fez essa parceria com essa vinícola de amigos nossos, vinícola pequena, familiar, que a gente ia trazer esses vinhos deles para distribuir aqui na região, né? Então, quando a gente voltou, a gente voltou assim: “Vamos fazer o quê? Vamos distribuir os vinhos da vinícola Arbugeri”. E isso ele veio... ele voltou um pouco... deve ter voltado acho que no final de 2010, o Aleandro, para cá e eu vim depois, né? Eu continuei lá ainda trabalhando e depois eu voltei para a gente... depois de comprar nossa casa e tale e aí...
(46:37) P1 – E aí a loja de vocês...
R1 – ... em 2011, então, já estávamos firmando como distribuidores, uma vinícola pequena, a gente... o Aleandro, principalmente, focou em vender para estabelecimentos menores, né, mercados menores, porque a vinícola Arbugeri tinha uma produção muito grande de vinho de mesa, né? Eles trabalhavam com vinho fino, mas como eu comentei com vocês, a maioria parte das vinícolas ali estão focadas, que é o que o mercado pede, o vinho de mesa e a gente começou a trazer, né? Começamos bem pequeno e a gente fazendo um trabalho... e como é uma vinícola com uma marca que ninguém conhecia, a gente fazia um trabalho muito forte de degustação, a gente ia nos estabelecimentos e fazia... servia uma degustação para as pessoas provarem e, com isso: “Nossa, meu Deus, que vinho diferente, você sente o gosto da uva”, porque realmente é um vinho feito com muito cuidado, né? Você tenta, realmente... uma uva bem... uma uva madura, você pode trazer esse sabor, é um vinho que não tem defeitos, que o foco não é o açúcar, né? A gente começou distribuindo, principalmente os vinhos de mesa, o Aleandro mais à frente da distribuição e aí começou aqui em Rio Preto, aqui na região. Eu trouxe também, nessa época, a distribuição de uma linha de cosméticos, lá de Bento Gonçalves, chama Essência de Flor e Cosméticos, feitos à base de uva e vinho, né?
(48:09) P2 – Nossa!
R1 – Aí eu trouxe também, na época e aí eu comecei a vender para... fazer parcerias com salões de beleza, aí tive algumas revendedoras, mais ou menos como Avon, né, mas elas distribuíam para... e foi ali, mas eu sentia falta de trabalhar direto. Eu, Kátia, sentia falta de trabalhar diretamente com vinho, né? Eu ajudava o Aleandro, mas ele sempre esteve à frente da distribuidora, eu ajudava ali no dia-a-dia, parte administrativa, uma coisa ou outra, nesses eventos de degustação, sabe? Quando a gente tem que ter um pouco... mas na verdade a distribuidora sempre foi um projeto do Aleandro, né? Nosso projeto familiar, mas é onde ele estava à frente. E aí começamos essa distribuição ali em 2011 e fomos seguindo e a gente foi... a vinícola Arbugeri começou a investir na linha de vinhos finos, né, a trazer... eles já tinham uma linha mais simples, depois eles começaram a criar produtos da linha premium, de vinhos mais trabalhados, vinhos de safras especiais, né? Mas o nosso comércio estava muito focado na parte de vinhos de mesa, os nossos clientes estavam acostumados (risos) a vender vinho de mesa e tinham um receio e medo de não saber vender o vinho fino e realmente é um problema, é um problema mesmo, para quem... para esse foco... esse mito que a gente colocou... oi, desculpa.
(49:44) P1 – Desculpa, é que é muito interessante saber: os clientes dessa fase de vocês era mais supermercado, mesmo? Era isso?
R1 – Minimercados, não era nem super, não.
(49:57) P1 – Mini?
R1 – Porque a vinícola, a gente não atende até hoje, estamos em negociação, mas grandes redes não, sempre redes menores, por conta de que é mais fácil de trabalhar o nosso... a gente começou com os pequenos e foi vendo que foi dando certo e a gente continuou trabalhando com pequenos, não focamos em vender para grandes redes não, sempre foi aquele trabalho miudinho e aí começou vender aqui para região, né, de Rio Preto e as coisas... as pessoas foram descobrindo: “Ah, um primo que veio para Rio Preto provou o vinho”. E o cara lá de Franca descobria e entrava em contato com a gente. A gente começou a atender a região, indo até para algumas cidades um pouco distantes. Nós temos distribuidores hoje em cidades, aqui, maiores na região, mas sempre do pequenininho, Luís, sempre do pequeno, sempre o foco em... eu acho que é por aí. Onde a gente... o Aleandro se sente confortável, ele gosta, viu que deu certo, aquela coisa pequenininha e foi assim que veio a distribuidora e que a gente ficou todos esses anos. Mas por conta da gente... a empresa começar trabalhar com esses vinhos premium e a gente via que tinha uma dificuldade de fazer com que os nossos clientes comprassem a ideia do vinho fino, porque eles tinham esse medo, né, de vender, mas a gente percebia que o mercado estava se preparando para isso, que os consumidores estavam querendo experiências assim, mas existia... como nós vendíamos para pessoas jurídicas, a gente não tinha muito contato, a gente foi perdendo contato com o consumidor final, que a partir do momento que a gente parou de fazer aquelas degustações, a gente não tinha mais esse contato com o consumidor final, exceto aqueles que a gente fazia venda direta, festas e as pessoas ficavam sabendo, mas nunca foi o nosso foco ali, com a distribuidora, a venda pra pessoa física. E isso foi nos incomodando, nos incomodando, né? Porque a gente percebia que existia uma demanda do mercado que a gente não estava conseguindo atender, foi onde a gente pensou: “A gente precisa lidar direto com o consumidor final”. Só que o Aleandro, atropelado no trabalho, (risos) porque quando você faz venda de pequenininhos, a tua rotina de trabalho é muito, não existe folga. A gente trabalha direto. E aí, nesse meio tempo, a gente pensou, veio a ideia de ter filhos, né?
(52:24) P2 – Uhum.
R1 – Aí, em 2016, a gente... nasceu a minha filha Olivia, minha filha mais velha, né, que está com quatro, vai fazer cinco aninhos. Então, a partir do momento que a maternidade entrou na minha vida, foi tirando pele, né? Eu me dediquei mais as minhas filhas, fiquei mais na parte administrativa da distribuidora, porque meu foco naquele momento era, principalmente, ser mãe, viver com as minhas filhas e viver intensamente a maternidade e foi um processo lindo, maravilhoso, de grande crescimento na minha vida. (risos)
(53:01) P1 – Você tem duas?
R1 – Duas. Em 2018 nasceu a Malu, que é a caçula. Então, tenho duas filhas (risos) bebês: uma de quatro e uma de dois...
(53:13) P1 – Que legal!
R1 – E foi.. e coincidiu muito dessa questão da vinícola Arbugeri, foi exatamente nessa época que começou a... e a gente foi se incomodando, né? Foi se incomodando, aquilo ficou: “Ah, meu Deus”, a gente precisa dar esse passo, atender esse público também, eu acho que merece, que o produto era bom, o produto era muito bom, tinha um preço acessível, só que a gente não estava conseguindo colocar no mercado como ele merecia, né? E a nossa... naquele momento a gente pensou: “A gente precisa ter um contato, voltar a ter contato direto com o consumidor, trabalhar melhor esse mercado”, só que a gente não tinha tempo, porque o Aleandro super ocupado com a distribuidora, eu me virando em duzentos, para conseguir lidar com questões de... do trabalho, das filhas. Então, a gente não conseguiu naquele momento, né? Já identificamos o desejo, já tínhamos o desejo, víamos a necessidade, mas a gente não tinha tempo para isso, não tinha tempo para montar nossa loja e a gente falou: “Então, tá”. Fomos deixando ali na gavetinha aquele projeto e as minhas filhas foram crescendo, eu fui começando a ter um pouco mais de tempo para pensar e falar: “Opa, eu acho que já consigo”. E a vontade de trabalhar diretamente me consumindo porque, assim, eu gosto de trabalhar, eu gosto de ter essa independência, eu gosto, eu tenho muito prazer em trabalhar, eu gosto, é algo da minha essência e eu sentia muita falta disso, né? Enquanto mãe, mulher e estar ali, só nos bastidores? De não estar tomando a frente, me responsabilizando diretamente por algo. E nisso elas foram crescendo, a Malu começou ir para escolinha e começou a sobrar tempo...
(55:01) P1 – Sei.
R1 – Aí eu falei: “Não, agora a gente vai onde a gente decidiu, vamos fazer, montar o nosso negócio”. Inicialmente a gente não tinha muito formatado de que forma que seria. A gente pensou primeiramente... o nosso estoque fica em Bady Bassitt, que é uma cidade aqui do lado, a gente pensou em fazer primeiramente um varejozinho, uma loja, mas também trazer mais experiências, atender, fazer como se fosse um _______, (55:27) lá no sul tem bastante disso, muita gente vai ter não só venda, mas consumo também ali, a gente pensou em fazer na beira da BR, mas por questões de... a gente foi até na prefeitura, licenças e lá também está em processo de desapropriação, porque vai ter um... fazer uma nova faixa de aumento da rodovia, a gente abortou a ideia de fazer ali e começamos a pensar em fazer uma loja aqui em Rio Preto, inicialmente pensando em fazer uma loja exclusiva da vinícola Arbugeri, né? Onde a gente trabalharia com o... ali vai ter todos os produtos e, se o cliente não consegue achar, porque os clientes: “Mas eu quero aquele vinho fino, não consigo achar em nenhuma loja”. (risos) E realmente era muito difícil, os clientes entravam em contato com a vinícola, com a gente e não tinha esse lugar. Então, tá, vamos fazer uma loja da vinícola Arbugeri aqui em Rio Preto.
(56:18) P1 - Certo.
R1 – O primeiro projeto foi esse, trabalhar apenas com aquela marca que a gente já distribuía a muito anos, né?
(56:25) P1 – Hum.
R1 – Mas em algum momento a gente pensou: “Mas se a gente trouxer... tem tantos amigos lá, que têm um vinho tão bom e que não chega aqui”. E a gente sempre identificou, porque a gente tem amigos em muitas vinícolas, não só donos, mas que trabalham, né, enólogos e tal e a gente falou: “Nossa, mas seria tão bacana trazer aquele vinho daquele pessoal, daquele nosso colega que não chega... um vinho tão bom, preço acessível”. E aí veio vindo essa: “Nossa, mas...”. E aí veio essa vontade de trabalhar com outras coisas também, com outras coisas, com outras vinícolas e esse foi o start: “Oh, vamos trazer o vinho, esses vinhos bacanas, que não chegam aqui em Rio Preto e que nunca vão chegar”.
(57:07) P2 – Uhum.
R1 – Porque são empresas que não têm um trabalho de marketing. Vocês não têm ideia, mas tem vinícola que o cara planta a uva, o cara faz o vinho, o cara faz a área comercial e ainda faz entrega.
(57:21) P1 – Sim, pequenininha.
R1 – “Bom Bril”, assim. (risos) São pequenos, mas são metragens importantes, Luís, essa é a realidade, é a grande realidade das vinícolas brasileiras, tá? É uma ou outra que tem uma área comercial já, sabe, bem estruturada, mas a maioria são empresas familiares e pequenas, em que todo mundo se rala para conseguir fazer o vinho e vender, né? E outras que estão um pouquinho mais estabelecidas, né, esses setores, mas também não chega, por quê? Porque o mercado trabalha, você não tem noção de logística, você não tem o preço. Então, fica sempre as vinícolas grandes que chegam nos mercados, nas grandes redes, quando pensa em vinhos brasileiros, né, com as linhas de entrada apenas, porque você não acha as linhas mais trabalhadas em redes de supermercado, é muito difícil. As lojas especializadas aqui, vinho importado, não tem espaço. A gente tinha, a gente conseguiu colocar em algumas aqui, mas poucos produtos, como distribuidores, né? Essas linhas, então, a gente conseguiu colocar, mas ainda é muito pouco representativo. Então, existiu uma... um receio, um preconceito muito grande com o vinho fino brasileiro, né?
(58:40) P1 – Sim.
R1 – Existia muito forte. E, no ano passado, coincidentemente, a pandemia virou o mundo do vinho brasileiro de pernas cabeça, mudou tudo.
(58:53) P1 – Melhorou.
R1 – Melhorou muito. A pandemia, o que fez com o vinho brasileiro foi algo incrível. Então, assim, a gente já ia trabalhar com vinho brasileiro, sempre foi, porque a gente já tinha, é a nossa intimidade, é a nossa rede de contato, é o que a gente mais conhece, é a nossa vivência e coincidiu de 2020 as coisas mudarem completamente, as pessoas começarem a procurar. Então, assim, aquilo que eu pensava que eram só com nossos amigos, eu comecei a ver que não, tinha demanda para várias outras empresas, outras vinícolas bacanas e aí eu comecei a procurar, eu falei: “Opa”. Quando a gente decidiu que ia fazer a loja e aí veio a primeira coisa, que é aquela coisa: “Vamos montar a nossa seleção? Com quem a gente vai trabalhar?”. Aí o ano passado, no começo do ano me foquei nisso, de buscar e entender mais sobre outras vinícolas, outras regiões produtoras. Então, fazer essa captação: o que a gente vai trabalhar? Quem está produzindo coisas legais e diferentes? E o mundo do vinho, no Brasil, mudou muito nos últimos anos, assim, nos últimos cinco, sete anos explodiu outras regiões produtoras, outras vinícolas, projetos novos, trabalhando com vinhos de altíssima qualidade e eu não estava tão a par disso, né? Acho que a gente meio que se acomodou um pouco ali, com aqueles vinhos e tal, da região. Então, assim, no começo do ano passado a minha busca foi isso, conhecer e buscar e provar vinhos, tudo que estava acontecendo na viticultura brasileira. Então, assim, foi fazer isso: com quem eu quero trabalhar, como, de que forma? A gente foi desenhando, né? E o nosso projeto original da loja era ser uma loja e ___ (1:00:30). A gente começou procurar locais que comportassem essa estrutura. Só que, nisso, a pandemia piorou e veio aquele ___ (1:00:41), eu falei: “Não, não dá, não vou investir, porque é muito caro, né? Não dá, não consigo me enxergar agora, não sabe se abre ou se fecha, não dá”. Então, a gente abortou o plano de alibar e falou: “Não, mas a loja a gente vai, com pandemia ou sem pandemia”. E a gente foi, foi demorado, porque realmente a gente teve que achar o espaço, buscar, né? Que lugar a gente quer colocar, né? Aonde? A gente sabia que tinha que ficar em um lugar de fácil acesso, bem localizado, mas a gente não queria que fosse algo, também, uma grande avenida, que tivesse uma certa tranquilidade, né? Então, assim, achar o local foi o nosso primeiro desafio, que atendesse nossa necessidade e primeiramente a gente pensando em alibar...
(01:01:25) P1 – E como...
R1 – Desculpa, não entendi.
(01:01:28) P1 – Como vocês... desculpa te cortar, mas como você...
R1 – A gente estava bem decidido por zona sul, né? Por zona sul, que tivesse fácil acesso às rodovias, para atender ali também... a gente pensou assim, focou por região e fomos procurando os imóveis, procurando, né? Não estava muito definido: “Eu quero nesse bar”. Tinha uma noção de bares e fomos procurando e aí a gente, depois que acho que já tinha, já sabia mais ou menos o projeto que eu queria, né, já tinha feito um trabalho de branding, porque eu quero... eu não quero ter uma loja, eu quero ter um conceito, eu não quero somente ter uma loja, quero ter um conceito, quero ter um espaço que as pessoas entendam que não é só sobre vender garrafas. Então, a gente foi atrás de criar uma identidade de marca, fiz parceria com uma profissional da área de marketing que trabalha com branding e aí... é muito importante que as pessoas gostem de vinho, (risos) para que ela entenda o meu sentimento, o meu amor, né? Então, assim, nossa linguagem está toda baseada nessa coisa da paixão, no afeto, no amor, porque é isso que eu quero passar para as pessoas, é a minha maneira de me expressar, é fazer com que elas consigam sentir, quando elas pensarem no Entrenós, se apaixonem tanto quanto eu sou apaixonada e as pessoas são e eu estou descobrindo pessoas até (risos) que são extremamente apaixonadas e a gente está trazendo essas pessoas, assim, então a gente foi atrás de criar uma identidade, uma logo, um conceito que tem essa leveza, eu não quero uma loja de vinho. Eu foquei muito no público feminino, né? Eu sempre pensei. Uma porque eu sou mulher, uma porque eu tenho certeza que as mulheres são as grandes apaixonadas por vinho, mas apaixonadas de uma forma simples, sem ficar colocando: “Ah, porque vinho tem que ser...”. Não, elas são apaixonadas, as mulheres são apaixonadas por vinho, ponto. Que vinho é? Não interessa, são apaixonadas, não é? Assim como eu. (risos) E aí eu quero... normalmente o universo dos vinhos é muito machista, né? Eu passei por algumas situações nessa... (risos) eu, mulher, pequena, assim, já fui não tão levada à sério muitas vezes por conta, por ser mulher, nesse universo tão intimamente masculino e a parte de... principalmente de venda de vinho, né, ainda era... hoje está mudando muito, mas, assim, eu quero... você vai num ambiente de loja de vinho, geralmente é aquela coisa escura, carregada, você já até imagina aquele senhor de cinquenta anos, cheio de dinheiro, que vai lá, compra a garrafa. Não, minha loja não é essa, essa não sou eu, não é isso que eu acredito, não é assim que eu enxergo vinho, a minha loja não vai ser assim. Eu quero uma coisa leve, alegre, simples, que tenha uma elegância, porque o vinho tem uma elegância, mas uma elegância natural, não colocada, uma elegância que traga essa naturalidade e que imprima sentimento, que seja aconchegante, acolhedor. Então, o nosso projeto é esse: envolve desde a marca, até o espaço, né? Então, eu fui atrás de um pessoal que eu via realmente que eles tinham projetos bem fora da casinha, não era aquela coisa comum, que conseguiu entregar uma coisa mais moderna, mais contemporânea, eu falei: “Eu não quero aquelas cores escuras. Não, eu quero uma loja que tenha leveza”. Então, eu ainda escolhi o pessoal que eu queria que fizesse o meu projeto de móveis, de... e aí, esse foi o segundo passo. Então, o local, depois a marca... primeiro a marca e depois o local e depois o projeto do espaço e aí eu achei um pessoal bacaníssimo numa região aqui próxima, um estúdio de marcenaria, fizeram um projeto... acho que a projetista, com uma sensibilidade enorme, assim, conseguiu entender exatamente o que eu queria passar e eu já tenho bastante experiência com venda de vinhos. Eu já sabia, né, não queria só que fosse estético, queria que fosse funcional e que as pessoas tivessem autonomia para circular pela loja e olhar os rótulos e entender, então, o projeto. Esse era o foco: que elas tivessem autonomia de olhar; que elas se sentissem confortáveis ao entrar na minha loja, que as pessoas não se sentem muito confortáveis, a não ser que sejam aquelas pessoas, realmente, o foco das lojas especializadas, tipo já vai lá procurando rótulos e não experiências, né? Então, eu falei: “Não, eu quero que as pessoas se sintam confortáveis, que minha loja vai ser para todo mundo que ama vinho, desde aquele cara que toma o vinho de mesa suave, até aquele cara que procura os vinhos mais exclusivos, aquelas experiências mais complexas. Eu quero conseguir conversar com todo mundo, porque são essas pessoas. Você é apaixonado por vinho, como eu? É? Então, vamos lá”. Então, assim, a Entrenós veio para isso. Não é fácil, porque a gente tem que conseguir se comunicar com pessoas muito diferentes, né? Então, assim, existe, é um problema que eu estou sofrendo, né? Eu preciso divulgar a loja, mas eu tenho uma dificuldade de saber que meios, de que forma que eu vou conseguir me comunicar com esse público tão amplo. Fala, Luís, desculpe.
(01:06:40) P1 – Não, nesse ponto que você falou é interessante a gente saber como que você... porque, você falando tudo isso que você está falando, dá vontade de eu ir aí para... eu e a Claudia, quando a gente for para Rio Preto de novo, que a gente estava aí.
(01:06:58) P2 – Vai passar. (risos)
(01:07:00) P1 – De conhecer, já deu vontade. Como você explica isso na sua publicidade, para você chamar seu público, para eles entenderem isso que você está falando para a gente?
R1 – É, eu acho que é... e essa minha necessidade de me comunicar, né? Eu tenho essa necessidade. É um problema, Luís, vou ser bem sincera, a gente ainda não conseguiu ajustar isso. A primeira comunicação que eu tive foi com as redes sociais, eu fui atrás de uma profissional, né? Eu falei: “Olha...”. Eu não entendia, gente, eu criei o Instagram no ano passado, quando eu comecei pensar em loja, falei: “Preciso ter Instagram”. Eu não tinha. (risos) Então, eu não domino, assim, eu não tinha essa necessidade de... eu sou muito do contato direto, da ligação, sou muito, sabe, essa coisa mais próxima, mais quente e eu não enxergava o Instagram dessa forma, né? Mas é, é extremamente importante. Então, foi primeiramente ir atrás. Essa mesma pessoa que fez a minha identidade visual, me ajudou, né, a criar a identidade visual da minha página no Instagram. Então, a nós... não sei se vocês chegaram a ter a curiosidade de olhar o nosso Instagram, mas é isso, as comunicações que tragam essa... que tragam conteúdo, tragam os produtos que a gente vende, mas que tragam esse afeto, esse amor. A gente tenta se comunicar dessa forma. Nem sempre eu consigo porque hoje eu tenho pouco seguidores, então, não estou... eu queria me comunicar com mais pessoas. Então, o principal problema é esse: essa divulgação de trazer quem ainda não, de alguma forma, entrou em contato com a Entrenós. Quem entrou eu sei que se apaixonou, (risos) porque é apaixonante, né? Então, a gente se comunica, a gente tem a mesma língua, a gente se comunica, eu sei que eu consigo me comunicar com essas pessoas. E quem chega na loja ou quem... a gente ainda está muito o boca-a-boca, o cara que gosta de vinho brasileiro ou que gosta de vinho fala: “Nossa, uma loja com uma proposta diferente: você chega lá e eles te explicam e tem um monte de vinho, que eu nunca ouvi falar na vida”. E isso vai circulando, essa informação vai circulando, mas a gente ainda precisa... somos uma loja nova, né, gente? A gente está completando agora sete meses de existência, nessa pandemia maluca aí. Mas é... (risos) temos grandes pretensões, mas a gente ainda precisa divulgar melhor a nossa loja, é algo que a gente até... hum... quando entrei em contato com o Sebrae, acho que foi a partir deles que vocês descobriram a gente, né?
(01:09:31) P2 – Foi.
R1 - É justamente por conta dessa minha dificuldade, exatamente, de divulgar e de que forma me comunicar, né? Eu topei nessa... eu sei que a gente é novo, mas a gente quer apresentar o nosso projeto para outras pessoas, que as pessoas descubram que a Entrenós existe, que a gente tem um monte de vinho bacana aqui, que eles tenham essa experiência bacana aqui, de quem já veio e que mais pessoas também venham. Então, essa é a minha busca, esse é o momento atual: eu conseguir trazer, manter minha loja interessante, para que as pessoas também: “Ah” e que a experiência não seja sempre a mesma, cada vez que a pessoa vem aqui tem um vinho diferente, de uma região diferente. Então, a gente em essa busca, de sempre estar... ser uma loja interessante, mas a gente está nesse momento que precisa divulgar, né? Precisa divulgar mais e aí entender melhor, né, como as nossas personas, como que a gente vai atingir e trazer nossa identidade, nessa divulgação. Eu estou nesse momento, eu estou nessa necessidade. Sim, Claudia.
(01:10:32) P2 – Kátia, você falou muito, assim, né, desse cuidado todo na criação da loja, do espaço, né? Essa preocupação com a publicidade, né? Criar essa empatia com seu público. Mas de onde veio o nome Entrenós e, assim, como foi pensado a logomarca de vocês, assim, porque eu achei muito bacana.
R1 – O nome era algo exatamente... demorei para conseguir (risos) pensar, né, pensei em algumas opções, mas um nome que remetesse à ideia da loja, que fizesse elo de ligação, né, entre produtores e vinhos e o consumidor final. É assim que a gente se define, como elo de ligação entre quem produz e quem compra, ambos são apaixonados, mas a Entrenós tem essa ousadia de querer ser esse elo de ligação. Entrenós, Claudia, é uma das partes da videira, né? Não sei você já viu uma videira, mas ela tem gemas, né? Então, assim, a cada... entre um espaço entre cada gema da videira, aquele galhinho é chamado de entrenós, aquela gema é chamada de nós também. Então, a Entrenós tem essa função de ligação, né? E também a gente quer estar... eu não estou acima, eu acho que o vinho tem muita essa coisa de: “Ah, quem fala sobre vinho é um cara que tem muito conteúdo”, está sempre com uma posição de superioridade, isso me irrita e eu acho que é um desserviço para o mundo do vinho e a Entrenós não veio aqui para estar acima de ninguém, mas para a gente estar junto e trocar informações, porque não é porque você tem um pouco mais de conhecimento de uma certa coisa... você tem uma outra vivência. Então, a ideia é essa: é estar juntos, todo mundo no mesmo patamar e descobrindo, se apaixonando, cada um com a sua experiência. Veio dali, Entrenós Vinhos do Brasil, né? Exatamente, a nossa... nosso elo de ligação é principalmente o vinho brasileiro, é o amor ao vinho brasileiro. Veio daí. E aí a pessoa, a parte visual foi essa moça que fez, né? As cores, a palheta de cores, os traços, tudo tem... nosso símbolo, não sei se você... vou mostrar o símbolo aqui para vocês, o símbolo da nossa logomarca... é que está meio bagunçado... depois eu... mas é uma taça, né?
(01:13:00) P2 – Aham.
R1 – É uma taça de vinho, dentro dela tem a parreira, tem o traçado da terra, né? A plantação, né? Você consegue perceber. Então, assim: é a terra, é a natureza, aí tem um coração em formato de vinho. Então, assim, tem amor, essa ligação, esse amor de quem produz, de quem compra. Então, assim, é uma coisa muito simbólica, é o nosso... e uma folha de parreira. Então, assim, a natureza agindo e esse amor, esse ciclo, essa é a nossa... a pessoa que criou entendeu bastante que a gente queria passar e tem... ah, na saída você vê melhor.
(01:13:52) P2 – Ai, que lindo!
(01:13:55) P1 – É bonito e também combina com tudo que você falou, né? Porque...
R1 – Está tudo casadinho.
(01:14:02) P1 – É brasileiro, é moderno, né? Né? Muito bom.
(01:14:10) P2 – Ele é lindo. Kátia, sabe o que eu ia perguntar para você, assim? Você acabou, né? Entrenós Vinhos Brasileiros, assim. Hoje, pensando no que você falou que foi estudar, né, quem são os outros produtores de vinho, além daqueles que eu já conheço, assim. Quais são as regiões produtoras de vinho, assim, no Brasil hoje?
R1 – As principais, né? Porque...
(01:14:34) Isso.
R1 – ... está despontando para todos os lados, Claudia, uma coisa realmente surpreendente, mas as principais...
(01:14:40) P2 – Porque, inicialmente, se você pensar Brasil produzindo vinho é só no sul essa influência, tanto dos alemães, como dos italianos, mas como a questão do clima, né? Eu sei que se ampliou muito. Então, eu queria que você falasse isso.
R1 – A história do vinho no Brasil vem desde o descobrimento, né, Claudia? Os portugueses, quando vieram e se instalaram, já começaram a produzir uva, né? Aqui em São Paulo, né? Mas, assim, comercialmente falando, isso se fortaleceu com a vinda dos imigrantes italianos para a Serra Gaúcha. Por isso que lá realmente é onde foi consolidada a história do vinho brasileiro, mas já existia antes, só que assim, o Brasil é um país que tem imigrantes espalhados pelo Brasil todo, né? Então, essa cultura, a gente, de repente, perdeu em algum momento, em algumas regiões, mas já está em nossas raízes, está na nossa ancestralidade, né? Mas, assim, pensando principalmente onde se consolidou: Serra Gaúcha, principalmente ali na região de Bento Gonçalves, ali, Caxias do Sul, que é forte na parte de imigração italiana. Então, assim, quem, realmente, os italianos. Ali continua sendo o grande centro, principalmente quando se pensa em vinhos finos, mas dentro do Rio Grande do Sul você tem outras regiões produtoras também. Então, você tem ali Serra Gaúcha, você tem uma região chamada Campanha Gaúcha, que eu comentei com vocês, que faz divisa com o Uruguai, então, principalmente divisa com Uruguai e Argentina, é uma região de pampas, região bastante importante hoje, vinícolas que estão na Serra Gaúcha, hoje também têm vinhedos na Campanha Gaúcha, porque é um outro clima, é um outro solo. Então, as uvas que eles não conseguiam amadurecer bem na Serra Gaúcha, eles amadurecem ali na Campanha. Existe uma outra região no Rio Grande do Sul também que chama Serra do Sudeste, região também mais plana. Região da Grande Porto Alegre já está produzindo vinhos interessantes também, região metropolitana ali você tem. E uma outra região importante no Rio Grande do Sul é fazendo divisa com Santa Catarina, é a região do Campos de Cima da Serra, região de Vacaria, faz fronteira ali com Santa Catarina, região alta, fria, tinha produtora de maçã, também está despontando, fazendo grandes vinhos, já tem uma importância. Depois Santa Catarina, principalmente Serra Catarinense. A Serra Catarinense, vinhos de altitude, regiões altas. Então, a Serra Catarinense fazendo grandes vinhos e, nesse momento atual, despontando com a produção de uvas de origem italiana, né? Assim, a gente ficou muito tempo só com uva de origem francesa, mas a Serra Catarinense, resgatando a produção de uvas italianas e tem uma tipicidade muito diferente por conta da altitude, um outro tipo de maturação de uva. Então, assim, Serra Catarinense... existe, em Santa Catarina também, na região no Vale do Goethe, que a gente chama, também é uma região importante para os vinhos. No Paraná você vai ter uma produção um pouco menor, mas também tem no Paraná a produção de vinhos finos, de mesa principalmente, mas vinhos finos. Aqui em São Paulo, há muito tempo, a região ali de São Roque, Jundiaí, por muito tempo, só com vinho de mesa, mas agora produzindo vinhos finos de alta qualidade. Por que, o que aconteceu? Todas as outras regiões que eu vou falar, exceto o nordeste, só está sendo possível produzir vinhos finos de qualidade, porque um brasileiro, muito criativo, como somos, fez uma adaptação (risos) ali, na época de colheita da uva, toda uva do mundo amadurece no verão, mas aqui o nosso verão, no sudeste, é muito úmido, isso é muito complicado para uvas finas, que são sensíveis, então a gente, geralmente, não conseguia colher uvas com maturidade tão boa e aí uma pessoa foi lá e fez o que a gente chama de dupla poda, ele foi lá e mudou, inverteu o ciclo da videira e essas uvas estão sendo colhidas no inverno, onde a gente tem clima quente, seco. Quente, assim, dias quentes, noites frias, uma ótima amplitude térmica, seco que a uva amadurece perfeitamente, por conta desse ciclo invertido dessa colheita de inverno. Hoje você tem regiões produtoras dentro de São Paulo, tanto essas ______ (1:19:27) como Jundiaí, fazendo o ciclo invertido, mas regiões que já fazem fronteira ali com Minas, região do sul de Minas, que é região da Serra da Mantiqueira, vinícolas importantíssimas, trazendo e produzindo grandes vinhos na região da Serra da Mantiqueira, tanto paulista, quanto mineiro. Então, Minas Gerais despontando ali. Já tinha produção em Minas? Já, já tinha, mas essa parte de grandes vinhos e, principalmente, na questão da colheita de inverno, então, Minas Gerais você tem. No centro-oeste está tendo produção, em Goiás. Rio de Janeiro tem produção de vinhos. E depois... Espírito Santo, né, mas, assim, outra grande região, realmente importante, que já está há muitos anos, há mais de vinte anos, é a região do Vale do Rio São Francisco, lá no nordeste, lá divisa entre Pernambuco e Bahia, né?
(01:20:20) P2 – É.
R1 – Então, ali é uma região onde já colhiam, já tem de duas a três colheitas por ano, né? Já tem uma viticultura estabelecida, bastante para uva de mesa, para uva de exportação, uva de consumo in natura, mas também, há muitos anos, com a produção de vinhos, vinhos finos. É uma região quente, então um vinho com uma outra característica, são outras uvas que são plantadas lá, uma uva principalmente que tem uma acidez mais marcante, para que o vinho continue tendo frescor. Então, seriam essas as principais regiões produtoras, né? Mas está tendo para todos os lados...
(01:20:55) P2 – É, eu já tive...
R1 – A videira é extremamente adaptável, ela se adapta a vários climas. Claro que cada região vai dar uma identidade, mas ela é extremamente adaptável.
(01:21:04) P2 – Hum hum. Eu já tive oportunidade de provar esses vinhos do Rio São Francisco, assim, mas eles não são fáceis de achar mesmo, né? Eles são muito diferentes, a gente acha em alguns supermercados em São Paulo e no interior a gente não acha, é impressionante, né?
R1 – É complicado, Claudia. Essa é a realidade quando a gente pensa em vinho brasileiro, pensa em vinhos finos, o que mais chega são as linhas de entrada de grandes vinícolas, que já têm uma parte logística bem estabelecida, né, porque não é fácil o sistema de logística dentro do Brasil, acho que a minha loja (riso), eu falo: “Por isso que é uma ousadia a gente trabalhar com vinho de todas as regiões”, eu sou a loja que tenho muitos rótulos em pequena quantidade, não tenho condição de ter grandes estoques, nem espaço, minha loja não é grande. Então, assim, a gente tem esse critério da qualidade, mas dentro daquilo que é possível também. Eu preciso conseguir trazer o vinho e isso não é fácil, não é fácil mesmo a gente ter essa pretensão de tanta diversidade, de regiões diferentes, vinícolas pequenas, vinícolas grandes, é um desafio. Mas tem muita coisa bacana sendo feita e vou dizer vinícolas novas que têm cinco, sete anos, já estão com uma qualidade de vinho que fala: “Meu Deus, daqui a dez anos, o que vai acontecer?” (risos) Já está com um nível altíssimo na produção de vinhos. O Brasil sempre foi muito... há muito tempo que o Brasil já se destaca na produção de espumantes, acho que o mundo já descobriu o espumante brasileiro, a qualidade do espumante brasileiro, mas sempre tivemos produção, problemas, assim, com relação aos vinhos tintos que, aqui no Brasil, o que a gente mais consome é vinho tinto, né? A produção de vinho tinto é gigante em relação a brancos e rosés, mas a gente, na parte de vinhos finos, não tinha... tinha alguns anos... principalmente se focar em Serra Gaúcha, Claudia, que é uma região que alguns anos chove bastante no verão também, então, em alguns anos a gente tinha uma dificuldade de maturação das uvas, mas agora, com essas outras regiões, com essas outras técnicas, com muito trabalho, hoje se foca muito no campo, né, na uva, o que que a gente vai plantar, de que forma que o manejo, né, como que a gente vai cultivar, para extrair o máximo de potencial dessa uva. Então, isso está fazendo com que o vinho brasileiro cresça muito em qualidade. Então, cresça novas regiões, outras variedades de uvas surgindo, né, sendo testadas. Então, está sendo muito bacana, está um momento muito bom para o vinho brasileiro.
(01:23:42) P2 – Agora, deixa eu te perguntar uma coisa. Você falou assim que, lá no sul, tem todo esse traço da economia familiar, né? Assim, essas organizações seriam muito familiares, assim, que a pessoa agrega toda família no negócio, desde plantar, colher, vender, envasar. No Rio São Francisco é diferente, assim, é uma produção mais em larga escala?
R1 – Olha, existem duas grandes vinícolas do Rio Grande... lá no nordeste: uma delas é a Miolo, que é uma vinícola que é do Rio Grande do Sul, uma das plantações deles é lá no nordeste, eles investiram a fazenda Terra Nova, então é uma grande empresa, que é uma empresa familiar, Miolo é uma empresa familiar, mas é uma grande empresa. E outra grande vinícola é a Rio Sol, que é um grupo, né, que eles têm origem portuguesa, é um grupo português, eles fazem vinhos também em Portugal e aqui eles têm a fazenda Rio Sol. São grandes empresas, mas também têm produções menores, têm produções menores também. Outros produtores menores ali estabelecidos nessa região, que margeia ali o Rio São Francisco, tanto para o lado de Pernambuco, quanto proo lado da Bahia, mas tem. O que eu posso te dizer hoje, que essas empresas, essas regiões novas, né, uma coisa que eu identifico com as novas regiões produtoras, principalmente aqui no sudeste - Santa Catarina aconteceu bastante isso também - eram pessoas que tinham... apaixonados por vinho, pessoas que já tinham renda e tinham um sonho, sei lá, gostavam de tomar e descobriram que podiam fazer, são pessoas que investiram, que não nasceram no meio do parreiral, mas gostam de vinho, tomavam vinho no mundo todo e resolveram investir na produção de vinhos. Então, assim, é uma tendência hoje essas novas vinícolas, são pessoas que não são dessa área, não são enólogos, não têm família... mas são apaixonados por vinhos, descobriu que está dando para fazer vinho fino aqui no sudeste, mais fácil, perto do mercado consumidor e estão enxergando não só uma questão da paixão, mas uma possibilidade financeira também, né, de você... então, assim, são investidores -a maior parte dessas outras regiões aí, tirando o Rio Grande do Sul - que estão ali, começando a desbravar essas outras terroir, essas outras regiões, investir e está conseguindo um estado bacana, claro que se cercam de profissionais capacitados, principalmente (risos) os enólogos lá do Rio Grande do Sul estão indo para outras regiões e aí trazendo seu conhecimento. Claro que eles deparam com situações, por exemplo: a faixa do plantio, do manejo, dificuldades, pessoas que não têm conhecimento, precisa fazer um treinamento, eles encontram dificuldades, por não fazer parte da cultura local, né? Mas é a tendência atual. Esses investidores que não são do mundo do vinho, que estão investindo e começando a criar novas vinícolas.
(01:26:59) P2 – E também gera empregos, né, assim...
R1 – Gera emprego...
(01:27:01) P2 – Eu achei genial a faculdade ali em Bento Gonçalves, de Enologia, né, assim, ele acaba...
R1 – E agora a gente tem aqui em São Paulo, né?
(01:27:10) P2 – ... oficializando, dando formação, né?
R1 – É. Agora nós temos aqui em São Paulo, ali em São Roque, que tem curso de Enologia, já tem alguns anos, né? Então, agora (risos) não precisa ir mais para o Rio Grande do Sul, dá pra você fazer aqui no sudeste mesmo. Já hoje temos... na época que eu fiz, gente, tinha lá em Bento Gonçalves, é um curso muito antigo, a gente nem sabia, né, na época quando eu descobri, depois... e depois criaram lá no Vale do São Francisco, a segunda faculdade de Enologia do Brasil foi lá no Vale do Rio São Francisco, né, na região de Petrolina e agora você já tem em outras regiões, outros locais, você já está tendo outras opções para fazer Enologia, para cursar Enologia no Brasil, já tem outras faculdades. Graças a Deus!
(01:27:58) P2 – (risos) Maravilha!
(01:28:01) P1 – Kátia, será que a gente não perguntou algo que seja importante nesse percurso seu aí? Alguma coisa que você gostaria de falar, que a gente não perguntou?
R1 – Ai, falei tanto! (risos) Vocês devem estar, até...
(01:28:23) P1 – Muito legal!
R1 – Ah, eu acho que deu para entender mais ou menos, né, como que a gente chegou até aqui, né? Foi uma trajetória, não foi... diferente de pessoas que estão, sei lá, se arriscando, o mundo do vinho já está com a gente há muitos anos, essa parte, claro que não como... é diferente, gente, você trabalhar numa vinícola, trabalhar no varejo, ser distribuidor e agora esse desafio de você... essa parte do comércio, do lidar com pessoas, é um desafio muito grande, né? Eu tenho esse conhecimento? Tenho, mas é muito dinâmico também essa coisa do dia a dia do comércio. Então, está sendo muito desafiador para a gente, né? Porque a gente tem tantas vontades e tantos desejos e como colocar isso, né, como se cercar, essa rotina realmente da divulgação, do planejamento, é um desafio bem grande nesse momento que a gente está vivendo, que não sabe se compra ou se não compra, se vai abrir, se vai fechar, as pessoas, hoje... outra questão, né, de você... a minha loja é muito focada no atendimento, Luís, acho que vocês já deram para perceber, né, (risos) que a gente é muito focado nesse contato, nessa coisa quente e hoje, por conta desse distanciamento, a gente precisa conseguir passar essa mesma experiência que a pessoa teria aqui na loja, à distância, né? Então, eu nunca pensei de ter um e-commerce e aqui na loja trabalhei com e-commerce, mas não é, em geral, onde eu gosto, não sei, ainda não consigo, não tenho esse... eu não consegui ainda, acho que a gente não tem essa aproximação que eu goste de ter com as pessoas, né? Mas hoje o mundo nos coloca nessa situação, não tem como você não se preparar para fazer venda à distância. Então, assim, é um desafio também, para que a gente consiga ter esse mesmo nível de experiência que eu tenho aqui na loja física, com as pessoas que estão na casa delas, entrando em contato e querendo comprar. Então, é um desafio muito grande para a gente, né? Acho que para o comércio como um todo, essa aproximação. Então, acho que é momento de todo mundo se reinventar, apesar de ser uma loja nova, né? Eu achava que isso ia passar mais rápido e não está passando. Então, a gente realmente precisa ter, então é muito trabalhoso. Eu não tenho funcionário, só eu e o Aleandro, assim, nesse momento, aqui na loja, Aleandro mais participa, mas ele me ajuda, mas é, então, bastante trabalhoso para a gente estar se comunicando à distância, redes sociais e montar conteúdo e divulgar, fazer o atendimento porque, para mim, não é só ter um catálogo de vinhos e colocar, a gente quer passar essa mesma... o nosso foco é ajudar na experiência dessas pessoas, né? Imprimir um pouco de conteúdo. Então, o meu maior desafio hoje é esse: conseguir me comunicar com essas pessoas com a mesma qualidade que eu teria comunicação aqui na loja presencial. Então, seria isso, o meu desafio é esse, de conseguir ter essa mesma... esse contato próximo, né? Passar essa mesma paixão, entender o que essas pessoas querem, né? O que eu posso... em que que eu posso ajudar e conseguir me comunicar com essas pessoas. É isso o meu desafio do momento. (risos)
(01:32:06) P2 – Eu tenho duas perguntas, antes do Luís Paulo encerrar. Você tem uma paixão por vinho, né? Então, eu fico imaginando, né? O que você gosta de consumir, assim, que tipo de vinho... você falou milhares de tipo de uvas, o que você gosta? Do seu gosto pessoal.
R1 – Claudia, olha...
(01:32:24) P2 – E que horas você bebe, assim? Você bebe no almoço também, né? Como que são seus hábitos?
R1 – Ah, eu gosto de tomar uma tacinha de vinho na hora do almoço. Vinho está presente não só profissionalmente, mas eu tenho que estar provando sempre, né? Então, eu não provo sempre os mesmos vinhos, Claudia. Eu preciso, eu acho que é muito importante, uma dica que eu dou para todo mundo: que é a gente abrir nosso paladar e não focar sempre nas mesmas sensações. Faço questão de estar provando estilos de vinho direto, diferentes e gosto de me surpreender com sensações de vinhos que nunca tinha tomado antes. Mas, assim, eu gosto muito de vinhos brancos, acho que os vinhos brancos atendem, atingem uma qualidade muito grande, em preços até mais acessíveis que o tinto, eu me surpreendo, eu me irrito menos (risos), né, com os vinhos brancos, acho que... gosto. Eu gosto de vinhos que não percam a fruta, que a madeira não domine, que esteja extremamente equilibrado, que a fruta, aqueles aromas e sabores da fruta, né, da uva, né, que a uva trouxe para o vinho, acho que têm que estar ali, presentes. Eu gosto de tomar aquele vinho e que aquilo fique, que a madeira venha também, mas que ela não... que nada domine, que tenha equilíbrio, elegância. Eu gosto de vinhos que tragam essa experiência e que me surpreendam, que me surpreendam. Meu Deus, é por isso que mudei a minha vida toda, por conta desse líquido aqui. (risos) Quando os vinhos conseguem me... o vinho tem que te emocionar, tem que te trazer um algo a mais, né? E acho que é essa que é a pretensão, quando a gente consegue ter isso.
(01:34:00) P2 – Maravilha!
R1 – Seja no aroma, uma sensação na boca...
(01:34:04) P2 – O aroma, né, muito importante também.
R1 – Aroma é muito importante, mas eu tomo vinho diariamente, né? Tomo vinhos do dia a dia, quando... vai muito da alimentação, eu penso muito: “O que eu vou comer, né?” Então, eu gosto de: “O que eu vou comer?” E aí eu penso na comida e depois eu penso no vinho: “Ah, eu vou comer isso, então, que vinho eu acho que vai ser uma experiência legal?”. Mais ou menos por aí.
(01:34:29) P2 – Que maravilha! E, Kátia, você falou: “Nossa, passou tanto tempo”, né? O que você achou de ter feito essa entrevista conosco e ter deixado sua trajetória de vida, sua experiência, sua história registrada aí, para o Museu da Pessoa, para o projeto do Sesc?
R1 – Ai, eu fiquei muito feliz, muito feliz e honrada, né? Porque somos uma loja tão pequena! É um projeto lindo, mas é uma loja pequena, que a gente está começando ali e eu acho que essa tendência de humanizar as coisas, é uma tendência que eu acho que não vai voltar mais, acho que todo mundo tem que trazer a sua humanidade naquilo que faz, para se realizar, nós somos seres humanos, né, não somos máquinas. Então, eu acho que essa tendência de humanizar todas as profissões, se colocar como ser humano ali, aquilo que te move. Então, eu acho que a gente é um dos exemplos disso, de seres humanos aqui, colocando a nossa... o nosso trabalho, a nossa paixão, a nossa dedicação. Então, somos sim, acho que somos exemplo disso.
(01:35:34) P2 – Maravilha!
R1 – Gostei muito de conversar com vocês, de falar um pouquinho de onde... como a gente chegou aqui, porque não é da noite para o dia, né? Todo mundo tem uma bagagem e a gente vai fazendo escolhas e a nossa escolha é algo que a gente sempre quis e a gente está começando a colocar em prática e isso é muito dinâmico, foi mudando também, eu fico muito feliz, né? Existe uma ideia original e ela foi... a vida foi nos apresentando outras possibilidades e isso vai continuar acontecendo, com certeza.
(01:36:06) P2 – Maravilha!
(01:36:06) P1 – Que legal! Kátia, eu gostaria de te agradecer, em nome do Sesc e do Museu da Pessoa. Eu achei muito interessante a sua entrevista, uma aula, me deu vontade de tomar vinho...
R1 – Importante! (risos) Essa é a ideia. (risos)
(01:36:28) P1 – Essa é a ideia, né, Kátia? E o nosso fotógrafo, aqui do Sesc de São José do Rio Preto, vai entrar em contato com você daqui a umas duas semanas, mais ou menos, para marcar um dia que você puder...
R1 – Perfeito.
(01:36:40) P1 – ... para fazer uma sessão de fotos aí, para poder aparecer nos produtos que o Sesc lança, né, exposição, quando vier o livro aparecer as fotos de vocês e, se você tiver foto, você e o Aleandro, antigas, de quando vocês estavam na faculdade, do casamento (risos), pode ser qualquer coisa que conte essa...
R1 – Nós fomos unidos pelo vinho, na nossa história...
(01:37:09) P2 – Então!
R1 – ... de amor está toda, toda pautada no vinho.
(01:37:13) P1 – No vinho. Então, aí essas fotos ele só copia e te devolve e aí ele faz a sessão de fotografia com vocês aí, tá bom?
(01:37:21) P2 – Aí faz a sessão de foto, você e o Aleandro também, tá?
R1 – Ótimo, ótimo.
(01:37:27) P2 – É, vai ser importante.
(01:37:27) P1 – Então, combinado. Muito obrigado, agradeço, foi muito legal.
R1 – Está ótimo, foi um prazer.
(01:37:33) P2 – Obrigada, Kátia. Eu vou pedir para o Caio encerrar. Eu vou só te falar uma coisa...
R1 – Tá.
(01:37:39) P2 – Você desliga
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