Projeto Qual é o seu centro? - CCBB
Realização Instituto Museu da Pessoa
Entrevista de Affonso Celso Prazeres de Oliveira
São Paulo, 19 de maio de 2001
Código: CCBB_CB194
Transcrito por Erica Bortolotte
Revisado por Carolina Araujo Forleo
P/1 – Boa tarde!
R – Boa tarde!
P/1 – Por fav...Continuar leitura
Projeto Qual é o seu centro? - CCBB
Realização Instituto Museu da Pessoa
Entrevista de Affonso Celso Prazeres de Oliveira
São Paulo, 19 de maio de 2001
Código: CCBB_CB194
Transcrito por Erica Bortolotte
Revisado por Carolina Araujo Forleo
P/1 – Boa tarde!
R – Boa tarde!
P/1 – Por favor, seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Affonso Celso Prazeres de Oliveira, Rio de Janeiro, 25 de junho de 1939.
P/1 – O senhor Affonso é morador aqui do centro de São Paulo, é síndico do Edifício Copan, né?
R – Correto.
P/1 – Senhor Affonso, como é que é viver aqui, morar aqui no centro de São Paulo?
R – Olha, eu estou no centro da cidade desde... Voltando atrás, por volta de 1960. Sou caipira, vim do interior, ________ ter nascido no Rio de Janeiro, eu fui criado até os meus 17 anos em Valinhos, aqui no interior de São Paulo, junto de Campinas. Vim para cá como missionário, porque eu pertencia a uma igreja. Acabei indo para a Vila Matilde para ser professor, então eu dava aula no período da manhã. Eu entrava às 5 horas da manhã. Eu era revisor de uma revista da igreja. Às 8 horas eu dava aula para o primário, naquela época chamava de primário. E às 12 horas eu vinha para o centro da cidade, eu vinha para a Getúlio Vargas. À noite, no fim da tarde, eu voltava, dava curso à noite para o pessoal ali da região. Era um serviço voluntário. Eu vim para o centro da cidade por volta de 1960 e fui morar na Rua Capitão Salomão, ali no Paiçandu. Logo em seguida, em 1962, 1963, eu fui morar no Copan. Sempre achei ótimo nas minhas vindas do interior quando criança. Nós vínhamos comemorar nossos aniversários, era uma tradição de família: a gente vinha comemorar no salão de chá do Mappin, que era, para nós do interior, algo extraordinário.
P/1 – O pessoal falou muito desse salão de chá, mas a visão de mocinhos. O senhor disse que era criança quando frequentava. Como é que era esse salão de chá visto por uma criança? Como é que era?
R – Para mim é coisa de sonho. Ser acostumado no interior, uma vida muito mais simples. Inclusive na nossa época, quando fomos para Valinhos, nós fomos morar numa chácara bem no centro da cidade. Porque Valinhos era um bairro de Campinas. Então a gente tinha uma vida muito frugal, de uma simplicidade a toda prova. O papai administrava uma indústria, que era da família, e que mais tarde foi vendida para o Grupo West Virginia, para os americanos. Então, daquela vida de interior, às vezes, até pé no chão, empinar papagaio, de repente você vinha para aquele deslumbramento, aquilo encantava. O que eu me recordo eram mesas muito fartas, com doces, salgados. E eu me recordo um pouco da decoração, que era estilo inglês, todo em madeira. Era muito lindo!
P/1 – E o senhor chegou no Edifício Copan como morador ou já foi escolhido síndico?
R – Não, não. Síndico se tornou um acidente de percurso. Eu fui para o prédio entre 1962, 1963; eu tinha saído então da Vila Matilde, como eu disse para a Capitão Salomão, fui morar com uma tia. Lógico que chega uma idade em que você quer sua liberdade, foi quando eu aluguei um apartamento no Copan, como morador. Eu tinha pouca identidade, na época, com o Copan porque eu tinha uma atividade muito grande, estudava e trabalhava. O fato de eu vir a ser síndico do Copan aconteceu... O início foi em 1992, a convite de moradores, eu tinha tido uma participação nos dois anos anteriores, eu tentei mudar as coisas dentro do Copan. Nós fomos derrotados na assembleia, de última hora fomos derrotados, e resolvi abandonar. Mesmo porque a gente já tinha um projeto, eu e minha esposa, de irmos para o interior. Estava na fase já de aposentadoria e eu queria voltar às minhas origens. Eu vi a degradação do prédio e tinha pouco a fazer porque ele é realmente um grande dinossauro, um elefante branco, e precisava de muito recurso. Eu tinha alguns projetos, alguns sonhos que eu achei que poderiam ser realizados, mas achei que era inviável naquela época. Mas em 1992 eu fui convidado para conferir as procurações e a partir daí houve um grande envolvimento. Nós começamos a rever essas procurações a partir das 14 horas e terminamos às 22h30. Como a assembleia teria que acontecer de qualquer jeito nesse mesmo dia, em função de se invalidar o edital. À meia-noite o edital deixaria de ter valor, a assembleia acabou iniciando por volta de mais ou menos 23 horas e... Não sei dizer o porquê, mas na época acabaram me escolhendo como presidente da assembleia e daí pra frente o movimento foi aumentando. Os projetos que eu tinha na época começaram a ser apresentados, começaram a ter repercussão. Até que este síndico, aí na assembleia de 1992, resolveu se afastar e aos poucos nosso grupo todo foi assumindo a administração e me elegeram síndico em 1993.
P/1 – E como é que é o Edifício Copan hoje? Descreve um pouquinho pra gente essa grande cidade que é um edifício só.
R – É, a gente que voltar às origens. O que eu quero dizer com voltar às origens... Há poucos dias atrás eu estive com o Oscar Niemeyer no Rio de Janeiro, no seu escritório ali em Copacabana, e nós conversamos sobre… Ele me falava do sonho do projeto que ele pretendia executar e que, por uma ou outra razão, ele teve que abandonar. Nesse caso específico, ele optou por Brasília e o projeto acabou ficando na mão do Carlos Lemos. Esse projeto original do Oscar é uma coisa fantástica, não para a época, para hoje. Se nós pudéssemos ainda traduzi-lo __________ das origens, ele seria único nesse país. A visão que este homem teve há mais de 50 anos, idealizando alguma coisa para o futuro... Inclusive, por incrível que pareça, para alguns ele pensou até nos deficientes. Então o Copan, se ele não tivesse sido modificado, seu projeto na origem, porque a origem é do Oscar Niemeyer, seria um fator único arquitetônico no Brasil. Ainda o é, pela expressão, pela sua massa: são 115 mil metros quadrados, uma fachada de 165 metros de largura por 115 de altura. Ele é muito representativo para o modernismo no Brasil. Hoje, o prédio praticamente está reconstruído internamente. Nós estamos ainda agora cuidando das garagens, do primeiro e do segundo subsolo. A galeria vai aguardar uma segunda fase. São seis blocos, são 1.160 apartamentos, originariamente ele teria só 900, então veja o quanto foi deturpado esse projeto. Os blocos E e F eram para ter um apartamento por andar. Tiveram o capricho de no bloco E fazer quatro apartamentos no lugar de um até o 12o andar. Não contentes com a deformação que já tinha, ampliaram, visando o lado financeiro, econômico. Do 13o ao 32o colocaram seis apartamentos, o que cria problemas sérios de energia elétrica e de hidráulica. O mesmo aconteceu com o bloco F, o projeto de um apartamento por andar foi transformado em cinco. Então, hoje, nós estamos recolhendo os frutos lá do passado, por quê? Os elevadores do bloco E e F foram desenhados para uma frequência que hoje é completamente diferente. Já existe um projeto de restauração, estamos buscando parceiros, está numa boa fase de negociação. Com esta restauração vamos voltar, em parte, às origens e estamos criando algumas soluções para o futuro. O que são essas soluções? É fazer que o prédio seja autossustentável, ou seja, no futuro, se esse projeto se realizar, ninguém mais vai pagar condomínio. Aquilo que o Oscar tinha desenhado, que era um hotel no bloco B, 640 apartamentos com áreas de serviço, vai acontecer, ou seja, ninguém deve pagar condomínio.
P/1 – E esse hotel vai acabar sustentando os apartamentos?
R – Bom, nós procuramos outra solução, mesmo porque nós teríamos que modificar por completo, se montássemos um consórcio, uma empresa, todos seriam sócios, o que é quase que inviável. O mesmo teria que acontecer no bloco E e no bloco F, ou seja, de 800 reais o metro quadrado, nós poderíamos transformar o valor disso em 1.400 a 1.600 reais, mas seria muito complicado e muito difícil. Nós optamos por um outro projeto. Primeiro, a gente se enquadra na Lei 12.349, que é um incentivo, chama-se potencial construtivo. Se eu for explicar aqui vai complicar um pouco... Isso poderá dar um bom retorno para o prédio. O prédio tem 56 mil metros quadrados para serem vendidos, para construtores utilizarem outras áreas que a lei abriga, e isso seria o recurso inicial. E pari passu nós estamos cuidando também da publicidade. Mas com essa história agora da economia de energia, esse projeto que inclui a parte de publicidade talvez tenha que esperar um pouco mais porque vai precisar de muita energia; mas o prédio vai mudar radicalmente.
P/1 – Senhor Affonso, quantos habitantes moram?
R – Hoje, ____ gira em torno de cinco mil, residentes. Nós temos uma frequência que gira em torno de mil a 1.010, um pouco mais que isso, que são as pessoas que trabalham no prédio. Nós temos lá a Telefonica, que tem um andar completo, tem uma central de atendimento, não só de São Paulo, como também capital e interior. São 470 mais os visitantes, chega a quase 600 funcionários por dia. Fora isso, nós temos quem transita pela galeria que chega a _____ 9.200 pessoas.
P/1 – E dentro de toda essa população que frequenta o Copan... O senhor já viu aí, já teve conhecimento de algumas pessoas que já prestaram depoimentos para a gente. O senhor conseguiria falar mais alguns tipos, alguns personagens típicos do Edifício Copan que possam expressar bem...
R – Eu como síndico sou um pouco suspeito, mesmo porque eu vou invadir talvez a privacidade de algumas pessoas. Mas eu gostaria de colocar como símbolo para nós do Copan, pelo menos para mim pessoalmente, uma pessoa fantástica que foi o Plínio Marcos. No começo, nós tivemos até atrito. Ele não era uma pessoa fácil de se relacionar, pela inteligência dele, pela visão, pela capacidade humana que ele tinha. Mas acabamos ficando amigos e amigos inseparáveis. Ele descia e já me chamava pro café, e no café tinha sempre um comentário dos passantes. Ele era triste! Mas era uma pessoa fantástica e me ajudou muito com a visão que ele tinha sobre o Copan, uma visão humana, muito bonita.
P/1 – Tá certo então, Senhor Affonso, a gente vai procurar chamá-lo para mais uma entrevista para falar com mais detalhes sobre o Edifício Copan aqui no centro de São Paulo.
R – Não Acredito que já esgotei [risos]. Acho que não teria muita coisa para ser falada.
P/1 – E para terminar, Senhor Affonso, o que o senhor está achando dessa exposição que é baseado, principalmente hoje, com os moradores do centro?
R – Olha, é um resgate de cidadania. Esse centro perdeu tanto a sua qualidade. Hoje, faço parte do Viva Centro, sou presidente da Ação Local e então a gente tá se esforçando. Mas o que falta é vontade política para mudar as coisas. Os empresários estão aí disponíveis, querem investir e entendem que esse resgate é importantíssimo, por que aqui está o quê? A melhor matéria que nós temos. Qual o outro local de São Paulo tem os serviços que existe aqui? Nós só temos um teatro de porte, que é o Theatro Municipal. Existe algo semelhante? Acredito que não. Então só falta vontade política, porque o empresariado está disponível. Um exemplo: o Anhangabaú, o Shopping Light está aí, o investimento que foi feito no Mappin, então existe “n” investidores aguardando um sinal positivo do poder público. Cabe a ele talvez o fator mais importante para essa recuperação.
P/1 – Está certo então, Senhor Affonso, muito obrigado pela sua colaboração.
R – Eu que agradeço a oportunidade.
--- FIM DA ENTREVISTA ---Recolher