P1 – Marlon Chaves
P2 – Maria Heleni
P1 – Pra começar, eu queria que você falasse o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Zuleica Ferreira Passini. Eu nasci em 25 de setembro de 1960, em São Sebastião da Bela Vista, em Minas Gerais.
P1 – Os ...Continuar leitura
P1 – Marlon Chaves
P2 – Maria Heleni
P1 – Pra começar, eu queria que você falasse o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Zuleica Ferreira Passini. Eu nasci em 25 de setembro de 1960, em São Sebastião da Bela Vista, em Minas Gerais.
P1 – Os seus pais?
R – João Ferreira da Silva e Jandira Evaristo de Faria.
P1 – Onde nasceram seus pais?
R – Eles nasceram no município de Santana, atualmente Silvianópolis.
P1 – E qual a atividade deles?
R – Meu pai tem uma história de atuar na área de agropecuária. Durante muito tempo foi administrador de fazenda e ultimamente ele tem trabalhado no ramo do comércio. Ele é comerciante. E a minha mãe, já falecida, era do lar, mas colaborava muito. Ela trabalhava muito com ele, ajudava muito nas atividades, sobretudo quando ele administrava fazenda. Ela fazia toda a parte de contabilidade, de pagamento dos funcionários.
P1 - E os avós? Tem lembrança?
R – Tenho. Meu avô paterno, meu avô materno, minha avó materna e minha avó paterna.
P1 – Quem eram?
R – Então, meus avós eram o Joaquim Evaristo de Faria, pai da minha mãe, e Maria Rita de Jesus. Eles eram também lá de Minas. Moravam no município de Santana. E a minha avó, que eu conheci a mãe do meu pai, Maria Rita também de Jesus e Benedito Ferreira da Silva. O Benedito faleceu muito jovem, por volta dos 40 anos. E os meus avós, pais da minha mãe, eles tiveram uma vida um pouco mais longa, mas faleceram quando eu ainda era criança, na minha primeira infância.
P1 – E os irmãos?
R – Ah, os irmãos são muitos. São 15 no total. Minha mãe teve 12 filhos. Foram 9 filhas e 3 filhos. Doze. E o meu pai se casou novamente e teve mais 3 filhos.
P1 – E você aí no meio é a caçula?
R – Não, eu sou a do meio. Eu sou a sétima filha mulher. Então tem uma história interessante porque acho até um pouco uma coisa religiosa. Eu era a sétima filha. Minha irmã mais velha teve que me crismar. Tem uma história aí que eu não tenho muito domínio, um pouco mais religiosa. Era a sétima filha. Então, a irmã mais velha tinha que crismar. Eu fui crismada pela minha irmã mais velha. E abaixo de mim, da minha mãe, tinha mais 4 irmãos.
P1 – E você tem lembranças dessa sua infância?
R – Tenho.
P1 – Ainda em Minas?
R – Em Minas. Eu morava nessa fazenda, onde meu pai administrava. E eu tenho a lembrança boa de brincar, de correr e de brincar de casinha em cima da árvore. A árvore tinha uma flor. Uma árvore que tinha umas flores bonitas, então a gente brincava lá em cima. Brinquei de boneca de pano e também andando sempre em curral, andando a cavalo. Andava muito a cavalo com meus irmãos até os dez anos. Eu morei até os 10 anos na fazenda. Minha mãe faleceu quando eu tinha 9 anos e depois do falecimento dela, passado um ano, nós nos transferimos pra cidade. Mas eu lembro da minha infância estudando na cidade e morando na fazenda. Em alguns momentos, o meu pai nos levava na perua kombi, porque eram muitos irmãos. Então, meu pai nos levava cedo pra escola. E assim, no sul de Minas, principalmente nessa década de 1960, era muito fria, fazia muita geada. Então eu me lembro brincando ainda com pauzinho, quebrando o gelinho da grama, aquele orvalho que amanhecia congelado. Então eu tenho uma lembrança do frio. Essa região era muito fria. Pé da Serra da Mantiqueira, uma região bem fria. E eu indo pra escola. Da minha mãe eu lembro muito pouco, mais ou menos quando eu tinha 7 anos ela adoeceu e fez todo um tratamento que durou uns 3, 4 anos, e que depois, infelizmente, veio a falecer. Mas até os 7 anos eu tenho uma lembrança assim de muita brincadeira, muita criança. E a partir dos 7, quando ela ficou doente, aí já veio uma marca. Ela tendo que se deslocar, ficando muito tempo internada, inclusive aqui em São Paulo. Década de 1960, meu pai trazia ela pro Hospital das Clínicas, aqui em São Paulo, naquela região de Pinheiros. Então tenho lembrança daquele prédio que fica bem na Rebouças.
P1 – Vocês vinham junto?
R – Vínhamos. Meu pai nos trazia de kombi e a gente fazia essa viagem pela Fernão Dias.
P1 – Família inteira?
R – Família inteira pra vir visitar a mãe e ela ficava. Então eu tenho essa lembrança dela chegando e ficando de novo ruim, porque ela teve um problema. E operando, tomando remédio e se deslocando da fazenda pra cidade pra tomar injeção. Ela tinha que tomar uma injeção todos os dias. Então eu tenho essa lembrança desse período.
P1 – Você lembra da casa?
R – Lembro.
P1 – Como era?
R – Era uma casa muito bonita, muito grande. Era uma sede de uma fazenda muito bonita e ela era toda avarandada. Ela tinha o alpendre, então era uma casa com varanda, bonita, grande. E a entrada dela, a fachada, muito bonita. E lembro dos meus irmãos, mas um período assim ______ triste. Muito triste.
[pausa]
R - ______ então, aí quem cuidava de todas as crianças eram as irmãs mais velhas. Eu tinha um irmão mais velho, 18 anos. Esse também foi um braço direito, uma referência pra nós. Ele era muito atencioso conosco. Foi um período assim ______. E o que eu lembro disso tudo? Da minha mãe dizendo pra gente estudar muito, que nós tínhamos que ir pra escola, não faltar. Porque imagina essas ausências dela. Ela se ausentava muito. Então a preocupação maior dela era: “Filhos, vocês estudem. Estudem bastante”. Ela dizia que pra gente, que o estudo era o tesouro da alma. Isso ficou marcado.
P1 – E a escola?
R – Eu estudei numa escola pública, a única escola da cidade. E assim: primeira série, segunda... Não havia educação infantil, não existia a pré-escola. E aí eu fui pra primeira série, segunda, terceira. Também não foi fácil, porque sem a mãe. Porque por mais que os irmãos ______. Os irmãos faziam aqueles trabalhos básicos de alimentação, de banhos e de cuidados pessoais. Mas a escola mesmo, não tinha como. E eram muitos. Então tinha a irmã mais velha, a mais nova. E é um período que também as moças, de 15, 16 anos eram muito jovens também. Então, não tinham muito o que colaborar, mas eu sempre fui muito dedicada, muito estudiosa. E o que eu sentia é que faltavam as coisas, faltava. A professora pedia as coisas e nem sempre elas estavam disponíveis e, justamente, porque a mãe não estava presente. Então, nesse sentido, a escola ______ não tem o que crucificar a escola. Escola muito rígida na década de 1960, a professora rígida. Ela queria retorno, queria resultado. Então ela exigia o livro que nem sempre estava naquele momento disponível, até porque meu pai não estava com cabeça pra cuidar de livro, de material didático pra filho. Ele estava preocupado com a saúde da esposa e com os 10 filhos. Porque de 12, 2 faleceram muito novinhos. Então, na verdade, ele ficou com 10 filhos. Ele estava mais preocupado com a saúde, com o restabelecimento da esposa. Então foi muito estressante, porque ele também, de uma certa forma, coitado, foi deixando até as atividades profissionais dele. Não tinha muitos recursos. A cidade mais próxima era Pouso Alegre, onde tinha o hospital e tinha médicos. Ele levava. E ele correu muito. O único grande centro era São Paulo, a 240 quilômetros daqui, da cidade. Então ele: “Não, então agora vai pra Belo Horizonte. Em São Paulo não tenho médico pra fazer o tratamento”. Não foi muito fácil porque a gente ia pra escola, era mais uma criança, e a professora cobrava muito: “cadê isso? Cadê aquilo?”. Aí eu fui superando e eu fui ______. “Não, eu preciso estudar e vou estudar”. E na terceira série, então ela faleceu e aí que a vida virou bastante, porque meu pai, coitado, ele também se perdeu um pouco. Ele era muito jovem, 42 anos. Ele ficou viúvo e com 10 filhos, ele ficou bastante atordoado. E nós ficamos lá, morando ainda nessa fazenda, com o irmão mais velho e as irmãs. Logo em seguida, a irmã mais velha se casou, porque ela já estava namorando. Tinha 18 anos e se casou. E nós ficamos com a de 17, a de 16 e aquela escadinha. Cada um nascia num ano. E até que ele saiu, acabou se desvinculando. Ele administrava essa e mais 5 fazendas em várias localidades. Ele acabou saindo também do trabalho, não aguentou. E aí nós fomos pra cidade. Era um período também difícil, porque ele
casou novamente. Ele casou com uma moça de 18 anos, que era da idade das minhas irmãs. Não tem outro jeito. E aí alguns conflitos com a madrasta, mas eu particularmente não tinha muito conflito com ela não. Eu sempre fui muito da paz naquele tempo que era criança. Agora minhas irmãs adolescentes tiveram alguns atritos.
P1 – Ter uma madrasta quase da mesma idade ______.
R – Você imagina. É inevitável. E aí foi o convívio. E depois eu fui estudando a quinta, sexta, sétima e oitava. E esse irmão mais velho que sempre, também, nos apoiava, em todos os sentidos. O apoio financeiro. Ele foi trabalhar com o meu pai. Nessa época, o meu pai foi trabalhar com transporte. Meu irmão tinha um outro caminhão, então eles foram trabalhar com transporte. E até que eu tirei a oitava série. Na época, a minha cidade não ______. Só existia o primeiro grau, só tinha até o primeiro grau e pra fazer o segundo grau, você tinha que ir pra outra cidade. Na outra cidade, só havia também o magistério, que já era um curso que ninguém queria muito. Na década de 1970 o magistério também já tava começando a cair.
P1 – E você já tinha?
R – Eu tinha 15 anos.
P1 – Como era a cidade quando você mudou? Pouso Alegre?
R – Não, Careaçu. Então, é um município pequeno ali. É uma cidade pequena. Ainda é muito pequena. Por volta de 5 mil habitantes.
[pausa]
R - ______ então eu fui pra cidade por volta dos 10, 11 anos. Acho que 11 anos, assim, eu já estava morando na cidade. Então a cidade era a que eu conheci, porque na verdade eu ficava a 2 quilômetros da cidade. A fazenda era próxima. Dava pra ir a pé, inclusive, eu ia a pé pra escola. Quando meu pai estava ele nos levava, quando ele não estava íamos a pé. E a
cidade era pequena. Até hoje muito pequena, de 5 mil habitantes, e fui morar lá. Mas ela já era conhecida nossa. A gente já ia.
P1 – E como foi sua adolescência lá?
R – Então, a minha adolescência, eu estudando. Eu lembro até os meus 15 anos, eu estudando, indo pra escola e com os afazeres de casa. E sempre dividindo as tarefas. Uma faz aquilo. Muitas filhas e tal. E eu não tenho muita lembrança também desse período, mais de estudar.
P1 – E na escola? Tem algum professor, alguma lembrança que te marcou, fato que aconteceu. A cidade?
R – Não. As séries iniciais por conta da rigidez da escola, que era muito forte e a gente sempre com aquela dificuldade. Criança e tal. Mas dificuldade de material, não de conhecimento. Conhecimento eu não tive essa dificuldade nunca. Graças a deus eu sempre tive muita facilidade. Mas a cobrança era grande pra levar material: “Cadê o livro novo? Cadê o caderno novo? Cadê isso?”. E daí nem sempre tinha. E de quinta a oitava, normal. Fui tendo uma trajetória e não fui reprovada. Sempre me destacando. Eu sempre gostei muito de estudar. Então ______, e, assim, eu praticamente que alfabetizei minha irmã caçula. Eu gostava dessa coisa de ensinar. Ia trabalhar com educação depois, ser educadora. Então eu praticamente alfabetizei minha irmã caçula. Gostava de ensiná-la, então eu acompanhava nos estudos dela. Quinta, sexta, sétima, oitava, sempre com as coleguinhas. A cidade recebeu muitos imigrantes japoneses, então tem umas amiguinhas com quem eu estudava. Tinha um pouco de contato com a cultura japonesa. Comia doce de feijão. Aquela coisa toda muito diferente. E eles também chegando.Tem essa história aí. E até que terminou a oitava série e a saída era somente estudar numa outra cidade. E aí eu fui fazer o magistério lá. E quem nos apoiava muito nessa época era esse irmão mais velho. Ele gostava muito e apoiava muito. Acho que aquela preocupação com os irmãos mais novos. E o meu pai, nessa época, estava mais voltado para o casamento dele. Novo casamento, nova família. Ele naturalmente nos acompanhava, mas não era mais de perto e a gente se distanciou um pouco. E aí o contato maior era com esse irmão que apoiava: “você vai estudar lá”. Eu fiz um ano de magistério lá e aí o meu irmão tinha um amigo que tinha vindo pra São Paulo e já estava trabalhando. E aí esse amigo trabalhava no Banco Bradesco. Trabalhava aqui no banco, morava aqui. O banco tinha as dependências onde as pessoas vinham do interior e se alojavam. Aqui era o alojamento. Tinha o alojamento masculino e o feminino. E esse colega do meu irmão, ele já estava trabalhando na área de informática. A área de informática estava dando aquele boom. Isso, na década de 1970, então tinha aquela efervescência. Os bancos trabalhando, investindo fortemente na área de informática. E esse amigo dele veio trabalhar na área de informática. Trabalhava aqui nesse prédio, no DPD [Departamento de Processamento de Dados]. E a Fundação Bradesco já estava oferecendo cursos técnicos de processamento de dados. E ele comentou com esse colega dele: “Olha, tenho uma irmã lá, Zuleica, e ela vai muito bem na escola. Só que ela está fazendo magistério e magistério não tem muito futuro aqui. Fala pra ela ir lá fazer o teste na Fundação Bradesco. E ela vai fazer o teste pra estudar, pra fazer esse curso de informática”. Então eu vim. Eu tinha feito em 1976 o meu primeiro ano de magistério na cidade de São Gonçalo de Sapucaí, que é uma cidade próxima. E aí que o meu irmão que marcou tudo. Mandou fazer a minha inscrição aqui e essa inscrição foi feita. E no dia 4 de dezembro de 1976 eu vim fazer esse teste pra ver se eu podia vir aqui estudar na Fundação Bradesco. E eu vim. O meu pai me trouxe. O meu irmão tinha caminhão, ele estava viajando e meu pai estava lá com outras atividades. Nós levantamos muito cedo no dia 4 de dezembro e viemos pra São Paulo. Acordamos de madrugada, 4 horas da manhã e viemos. Eu vim fazer esse teste. O colega dele morava aqui dentro, um deles. Eram dois. Um trabalhava no banco, o outro trabalhava na Fundação. Ele era secretário lá. E eu fiz esse teste. Só que nesse dia, esse meu irmão sofreu um acidente e faleceu, 4 de dezembro.
P1 – O mais velho?
R – O mais velho, aquele que nos apoiava. E ele faleceu nesse dia e meu pai foi embora. Deixou-me aqui com outro colega dele, porque naquela época era muito comum. Vinha um, o outro ia trazendo, ia apoiando. E eu fiquei aqui. Aí esse outro colega que se encarregou de me levar até a rodoviária, me colocar no ônibus. E eu fui embora com 16 anos. Tinha acabado de completar 16 anos. E eu cheguei em casa e meu irmão já estava sendo velado, à noite, e aí mudou tudo. Era 4 de dezembro. Os sonhos então ______. Que não eram bem sonhos. Imagina uma menina de 16 anos, o irmão falar: “Você vai pra São Paulo e tal”. E aí aquela coisa. Em janeiro eu falei: “Não, eu vou. Não vou ficar mais aqui. Eu vou pra Pouso Alegre”. Minha avó morava lá, a mãe do meu pai. Eu falei: “Não, eu vou arrumar um emprego e não vou ficar mais aqui também”. E fui pra Pouso Alegre. Foi quando eu fui admitida em janeiro, fevereiro. E fui lá no hospital procurar trabalho e aí fui trabalhar como auxiliar de enfermagem. Trabalhei 1 mês na pediatria também. Sempre com criança. E nesse período todo, tinha um outro irmão mais velho que já tinha vindo pra São Paulo. Meu outro irmão já havia trazido. Ele já estava trabalhando aqui no banco. Acredito que ele tenha sido admitido em 1976. Preciso fazer o resgate dessa memória. Ele já estava trabalhando. Ele falou: “Não, você vai sim, porque o Joaquim queria que você estudasse em São Paulo. Você vai. Você passou no teste. Então você vai se inscrever e vai estudar na Fundação”. Eu falei: “Tá bom”. Tive que pedir demissão lá do meu trabalho e tava trabalhando há 1 mês. Pedi demissão e vim pra São Paulo, tinha 16 anos. Comecei então a estudar na Fundação Bradesco. Fiz meu primeiro ano de processamento de dados em 1977. Inscrevi no curso de datilografia que o banco também oferecia e aí já me candidatei lá na escola pra ocupar o ______, eu queria trabalhar. E aí teve todo um processo seletivo e em 23 de dezembro de 1977 eu fui admitida no Bradesco.
P1 – No banco?
R – No banco. Nesse prédio aqui, no primeiro subsolo. Do lado de lá no primeiro andar.
P1 – Antes da gente começar nessa trajetória aqui, antes de você entrar na Fundação, antes de você ser aluna da Fundação, o que você sabia da Fundação?
R – Eu não sabia nada. Sabia nada.
P1 – Foi assim ...
R – Foi assim, as coisas foram acontecendo. Imagine, eu deixei ______. Eu havia cursado o primeiro ano, vim pra cá, tive que voltar a fazer novamente o primeiro ano porque as grades não eram compatíveis. Lá era um curso de magistério, aqui era um curso técnico. Então eu tive que fazer tudo novamente o primeiro ano.
P1 – E como foi essa chegada de uma aluna do interior para a Fundação Bradesco?
R – Fundação Bradesco. É aquela adaptação de sotaque de mineirinha, porque o pessoal de São Paulo brinca muito com os mineiros. E aí eu me adaptei facilmente. Eu sempre fui muito comunicativa, mas com destaque numa classe formada por 90% de homens, porque eram os meninos que iam pra área de exatas. Sempre teve essa tendência. E na época acho que eram 3 ou 4 meninas. Então eu vim pra um grupo novo, pra um estado novo, pra uma cidade nova, para um grupo eminentemente novo, porque eu sempre ______. Principalmente no magistério. A minha classe era sempre composta 99% por mulheres, tinha 1 ou 2 homens. Aí eu vim para o contrário, eu fui pra uma classe masculina.
P1 – E as aulas como eram na Fundação?
R – As aulas eram muito boas, professores excelentes. Um ensino bem estruturado, muita disciplina. Eu me adaptei facilmente a esse novo modelo. Era a noite. Eu estudava durante o dia. Então, também teve essa mudança de turno, de tudo. E eu estudava à noite. Eu gostava. Um estilo bem puxado.
P1 – Os professores dessa época você lembra?
R – Alguns professores eu tenho lembrança. Eu tive um professor de inglês que, me parece que é hoje embaixador no Canadá. Ele foi o meu professor, Carlos Alberto. E eu sempre gostei muito da língua inglesa. Tinha muita facilidade. Eu tinha uma empatia muito grande com ele. Um professor que me marcou, o professor Carlos Alberto, de inglês. Professor Marco Antônio de português. Foi muito bom também, que eu sempre gostei muito de português.
P1 – E a história do banco?
R – Aí história do banco. Eu comecei a trabalhar no banco dia 23 de dezembro. Vim trabalhar na área de processamento de dados, DAD [Departamento de Alimentação de Dados]. Eu era digitadora e trabalhava aqui. Trabalhava meio período, 6 horas. E quando eu já estava no 2º ano, eu percebi que não era aquilo. Eu não gostava da área de informática. Eu fazia, eu estudava, eu falei: “Poxa, eu fiz o primeiro ano de magistério, tive que fazer novamente o 1º, eu estava no 2º e não gostava”. Então já era pra estar me formando lá em Minas. Eu falei: “Não, não posso parar agora também. Tenho que me formar. Terminar bem feito e depois ver o que eu vou fazer”. E foi isso que eu fiz. No segundo ano já percebi que eu não gostava dessa área. A gente tinha uma programação bem próxima da máquina, linguagens de máquina. Então era uma coisa muito fechada, muito estruturada. E o meu pensamento sempre foi muito mais largo. Eu ______ e aquela coisa mais fechando e eu querendo abrir a cabeça. Mas aí eu fiz o curso, um curso muito bom. Usava muita lógica. E aí fiz o 2º ano, fiz o 3º. Quando estava no 3º ano, já em 1977, 1978, 1979. E aí em outubro de 1979 eu vim a conhecer meu atual marido, meu primeiro namorado. Eu estava terminando já o 3º ano e tinha percebido que não ia trabalhar nessa área. E fui pensando na época, final da década de 1970, na cidade de Osasco não tinha muita oferta de curso superior, hoje que se tem uma gama enorme. Tem várias universidades, vários centros instalados aqui na região, na época só havia uma única faculdade, a Faculdade de Direito e de Administração. Não eram áreas também que eu queria. No final do curso eu percebi: “Não, eu vou pra área de educação”. Aí eu descobri que na Lapa havia uma faculdade bastante tradicional, uma escola bem organizada que é o Colégio Campos Sales, a Faculdade de Campos Sales. Ela já estava instalada. Uma faculdade boa. E aí eu me interessei, mas falei: “Não, primeiro eu vou fazer um ano de cursinho. Vou tentar a USP”. Porque não tinha outra opção. Ou você fazia aqui, ou... E aí eu fiz um ano de cursinho aqui no Objetivo e tentei no final do ano. Aí não consegui e aí fui fazer em 1981. Então, comecei a estudar na Lapa. Fui fazer pedagogia. E lá eu me identifiquei plenamente com o curso. E à medida que eu fui fazendo o curso, eu sabia que queria ir pra área de educação. Fiz o 1º ano, o 2º e no 3º eu falei: “Eu tenho que procurar alguma coisa”. E estava muito próxima aqui. Fui até a escola e fui até a Fundação, mas a Fundação também tinha seu quadro todo completo. Falei com o Almir, que é uma pessoa que eu acho que vocês irão entrevistar. Era o diretor. Na época, quando eu estudei, ele era o coordenador. Então lembrava dele. Fui lá e conversei com ele. Conversei com a dona Regina. Não sei se vocês vão entrevistar a dona Regina. Mas os quadros já estavam assim todos meio definidos. E aí eu fiquei sabendo que o banco tinha esse departamento de treinamento e que eles contratavam pedagogas. Então eu fui ter com o Sr. Gerson que trabalhava no departamento de treinamento do banco. Era o Center Four, Centro de Treinamento e Formação Profissional. Então eu havia concluído todas as provas. Tinha feito todo o curso. Já tinha muito claro que eu queria trabalhar nessa área mesmo. Sempre gostei muito de falar e de me comunicar. Eu fui lá e ele falou: “Olha, interessante. Você já trabalha no banco, então a gente pode fazer essa transferência”. Quando foi em 1984, eu me transferi do banco para a Fundação Bradesco que trabalha na área de treinamento. Trabalhei entre 1984 e 1985 estruturando a área de planejamento. Montava cursos, sentava com os departamentos, com os setores, formatava os cursos, dava todo o apoio didático e acompanhava esses instrutores. No final de 1985, eu, nós ______ assim muito próximos um do outro, eu sabia que a Fundação tinha um trabalho com escola. Falei: “Não, eu quero ir pra escola”. Eu fui então procurar ver como que eu poderia fazer pra fazer parte do grupo que trabalhava com educação básica. Foi quando eu procurei a Fundação Bradesco, escola mesmo. Aí fiz todo um processo de transferência. Foi só transferência de um departamento para outro e em 1985 eu já estava na Fundação Bradesco mesmo. Depois de 3 meses já saí viajando. Fui ocupar o cargo de Supervisora e o meu objetivo era visitar as escolas. Digamos levar daqui as orientações pras escolas, dar suporte e apoio. Sempre com o objetivo de levar a cultura daqui da matriz de Osasco ______. Não é bem a cultura, mas os princípios e a estrutura institucional pra essas localidades. Assim começou essa trajetória em 1985. Fui visitando num primeiro momento as escolas mais próximas. Eu fui a primeira supervisora mulher
da Fundação Bradesco. O grupo era pra ser formado por homens, porque o homem era desbravador. O homem poderia ir pra Canoanã, pra Bodoquê. O acesso é muito difícil. E esse superintendente, o professor Joaquim Monteiro, que foi meu diretor na escola e depois ele veio para o Centro Educacional, falava: “Mas, dona Zuleica, a senhora vai viajar? Como a senhora vai viajar, dona Zuleica? A senhora toda em saltinho, precisa ir pra esses lugares de difícil acesso”. Eu falei: “Senhor Monteiro, mas eu quero ir. Quero fazer parte”. E eu fui. Então eu fui a primeira supervisora mulher. E aí eu comecei. Eu me lembro que o grande desafio ______. Eu tava viajando pra São João del Rei, Itajubá, sul de Minas e tal. Aí surgiu uma necessidade em Macapá. O Amapá para mim era visto somente na geografia, na disciplina de geografia. Eu me lembro que era território aquela coisa toda. Como que é isso? E eu fui pra lá. E eu fui pra fazer uma supervisão e acabei ficando quarenta dias, porque a diretora teve que sair e eu assumi uma direção interina. E acabei ficando lá bastante tempo. De lá não parei mais. Fui para Manaus, fui em São Luís, fui pra Teresina e fui para todas as outras escolas: Sul, Norte, Sudeste. E aí, coincidindo com essa década de 1980, que foi a década de expansão da Fundação Bradesco, porque a Fundação Bradesco mais cresceu foi nessa década. E aí eu peguei essa década inteira e fomos construindo escolas, instalando, fazendo processo seletivo e implantando escolas. Digamos, entregando a chave nas mãos do diretor e vindo embora. Eu e toda uma equipe que existia.
P1 – Então aí que a gente vai seccionar toda sua fala agora, mas antes de tudo ela tem uma pergunta que ela está se remoendo.
P2 – Eu tenho uma pergunta que ficou aqui na minha cabeça. Quando você veio pra cá, que você veio estudar na escola da Fundação, você morou na Cidade de Deus?
R – Morei. Tem essa história aí. Então ______. Eu fiquei na época numa pensão que era também desse conhecido desse meu irmão que era aqui na Vila Iara. Eu morei um tempo nessa pensão. Um tempo, não. Bastante tempo. Eu devo ter morado uns 3 a 4 anos. E depois, o banco tinha uma estrutura que abrigava as pessoas, os jovens solteiros que vinham do interior. Então tinha um alojamento de mulheres e um alojamento de homens. Eu fui pra esse de mulheres, que eu fiquei bastante tempo.
P2 – Como era morar no alojamento?
R – Num primeiro momento eram casas que existiam aqui de famílias, e as famílias foram saindo. E essas casas foram cedidas para a equipe de moças que moravam aqui. Então eram instalações muito simples, com toda estrutura que sempre teve. Porque o Bradesco tem toda essa história da simplicidade, de não ostentar muito. Mas eram instalações muito cuidadas, muito zeladas. Eu morei num apartamento, num bloco que hoje é um departamento. Morei num prédio e morei numa casinha. E as casas sempre gostosas, com clima de interior. Porque a Cidade de Deus, quando ela tinha as casas, seguia aquela mesma linha do interior: aquelas casinhas simples, mas muito bem construídas. Então foi gostoso. Eu morava aqui dentro. Eu já não estudava mais aqui, mas já trabalhava. E também tinha estrutura. O banco mantinha cooperativa, então onde a gente fazia compras. Tinha supermercado, loja. A cooperativa que a gente chama era o supermercado e a loja que existiam e que a gente fazia as compras. Tem também esse centro de recreação que é a piscina. Então eu frequentava também. Tinha uma estrutura gostosa. E depois essa estrutura foi sendo substituída por conta do crescimento do próprio banco e da desativação da Cidade de Deus, enquanto uma comunidade residencial pra mesmo se firmar, como comunidade empresarial. Ficou com essa cara mesmo só de banco. Mas foi muito gostosa. Foi tranquilo e muito cômodo também, porque a gente só dava alguns passos e já estava ali no trabalho.
P1 – E o Center Four? Explica pra gente. O que se fazia no Center Four?
R - Nesses dois anos, esse trabalho era um trabalho de planejamento em que a gente sentava. Por exemplo, o banco tinha uma demanda, uma necessidade de repassar aquele conhecimento que existia ali pra todas as outras agências. Então um curso de atualização de Fundo de Garantia, porque os bancos é que faziam toda a gestão do Fundo de Garantia. Tinha um conhecimento que tinha que ser multiplicado pra todo o Brasil. Então esse conhecimento
______. Qual era o nosso papel? O meu papel? A gente tinha que ir até a pessoa que detinha o conhecimento. Ali a gente delineava: “Olha esse conhecimento, nós vamos, digamos, transferir pra outras pessoas de que forma? Quanto tempo?”. Aí a gente dimensionava a carga horária: “Vou precisar de 8 horas”. Ou: “Vou precisar de 24 horas pra transferir esse conhecimento”. Então o meu papel era sentar com especialistas e delimitar o conteúdo. Aí a gente entrava também com as estratégias, com a metodologia: “Qual a melhor forma de se transferir esse conhecimento? Como a gente vai avaliar? De que jeito? Que recurso nós vamos utilizar?”. Então a gente formatava os cursos e depois os cursos iam sendo administrados. E a gente fazia num primeiro momento um acompanhamento do primeiro curso, o curso piloto, e depois esse curso saía e ia sendo oferecido centenas, enfim
______.
P1 – E eles tinham, por exemplo, alguns cursos que se realizavam aqui ou as pessoas vinham do Brasil pra cá?
R – Vinham.
P1 – Tinha curso regular?
R – Tinha. Tanto é que esse Center Four foi construído com essa finalidade, para ser o centro mesmo de treinamento. E depois do Center Four, você descendo lá embaixo, que é atualmente a previdência privada, ali eram alojamentos também. O banco, na década de 1980, tinha essa visão. Você tinha que trazer todo mundo pra cá pra dar os treinamentos. E aqui era um polo somente, era o polo matriz. Mas, no Rio de Janeiro, tinha também uma estrutura. E em algumas diretorias regionais existiam essas estruturas. Agora toda a formatação saía daqui, porque aqui emanam as diretrizes para todas as localidades. A exemplo do banco, a Fundação também. Da Fundação Bradesco daqui saíam as grandes
______. Os princípios, os objetivos. Naturalmente quando chega à escola, a escola adapta à sua realidade, insere mais... digamos os parâmetros saem daqui da matriz. Então, no Center Four era assim: a estrutura do curso então eram dados... Muitos cursos eram oferecidos somente aqui. Outros já poderiam ser, digamos, oferecidos em algumas regiões, que eram as regionais. Eram chamadas as Diretorias Regionais. Elas tinham esses espaços, salas de aula. Tudo organizado.
P1 – E a Fundação tinha essa estrutura que era ligada ao Center Four?
R – O Center Four é ligado à Fundação. O oposto.
P1 – E você me falou de outros também. Como que era essa estrutura da Fundação?
R – Então, a Fundação Bradesco tinha essa estrutura de Pronam
[Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor], Center Four, Pecplan, e a Fundação Bradesco mesmo, a escola, o Centro Educacional, como a gente chama.
P1 – O Cetag [Centro de Treinamento em Artes Gráficas] também entrava?
R – O Cetag estava dentro da Fundação. O Cetag, o Cecap [Centro de Empreendedorismo e Inovação].
P1 – E aí como que se organizava isso tudo?
R – Então ______. E dentro da Fundação existia toda uma outra divisão. Então tinha as escolas com a educação básica e tinha esses cursos profissionalizantes. Então na verdade se dividiam: educação básica, ensino formal, que é o ensino que o MEC rege, e esses cursos de qualificação, de preparação das pessoas para o mundo do trabalho. Na verdade não eram pessoas, eram alunos, jovens num primeiro momento – que é essa história
que eu acho que o Marcos contou do Cetag. e pros alunos, os adolescentes que queriam se profissionalizar e ter um conhecimento pra ingressar no mercado de trabalho. Então a Fundação se dividia aí na educação básica, ensino formal, ensino obrigatório e o ensino profissionalizante.
P1 – O Sr. Marcos falou de uns cursos para a comunidade.
R – Isso. E a Fundação também começou ______. Primeiro ela começou oferecendo para os alunos e depois abriu pra comunidade. E hoje os cursos para a comunidade têm uma representatividade muito grande nos mais de 100 mil alunos da Fundação. Eles representam 35 mil alunos. Então é muito grande isso aí também e esses cursos para a comunidade. E a Fundação também. A Fundação Bradesco não oferecia só ensino e educação para os seus alunos regularmente matriculados. Mas ela oferecia cursos de curta, média e longa duração para a comunidade. Então ela também se consagrou com esse projeto que foi, digamos, o último projeto com o qual eu trabalhei. Depois vou contando um pouco da minha trajetória e vou chegar nisso aí. Vou chegar nos cursos da comunidade que, na verdade, foi um segmento que eu abracei. Depois que o Marcos saiu, eu assumi esse projeto pra comunidade. Eu fiquei 2 anos, 1 ano e meio com esse projeto, que é um projeto belíssimo também que visa oferecer cursos de qualidade pra que a comunidade possa enfrentar esse mundo todo exigente, competitivo, que se apresenta. E o objetivo dessa educação profissional básica é oferecer um conhecimento para que as pessoas possam obter renda. Renda, trabalho, emprego, porque hoje em dia nem se fala mais em emprego, mas em renda, em ocupação. Então esse é um segmento da educação profissional da Fundação Bradesco que é muito significativo. Eu particularmente acho que esse é um segmento extremamente importante dentro da Fundação Bradesco, porque se trabalha com todos os públicos: a partir de 16 anos até 1980, 1970. Em Garanhuns mesmo, eu me lembro de um aluno italiano que veio pro Brasil e tava fazendo um curso de agropecuária, um curso de manejo de bovino. E ele foi fazer esse curso porque ele precisava desse conhecimento pra ter uma ocupação na cidade. Então esse segmento, que a gente chama de segmento da Fundação Bradesco que é dar educação profissional.
P1 – Então, agora, vamos na sua trajetória e você vai explicando tudo. Tudo o que você fez lá e explicando pra gente porque a gente não sabe de nada.
R – Nada. Então tá. E aí eu comecei a fazer supervisão. Fui supervisionar as escolas. Na verdade, supervisão é você ver se as escolas estão seguindo aqueles objetivos. Sobretudo, eu penso assim, que o supervisor é o guardião da instituição; é aquele que zela, que cuida pela filosofia, porque tem uma filosofia, a Fundação Bradesco. E a filosofia toda, digamos, ela está centrada aqui. Porque aqui é o órgão; a matriz é o órgão que emana todas as diretrizes, porque senão cada um faz uma coisa e acaba não tendo uma instituição com aquele objetivo, com aquela missão, com aqueles princípios. Então eu fui fazer um papel extremamente importante que era levar isso até lá. Que uma coisa é você contratar uma pessoa, colocar a pessoa pra trabalhar lá em Manaus. Mas ela tem a vida dela. Até porque a Fundação não tem essa questão de carreira, como o banco tem. Eu sou uma ex-funcionária de carreira. Entrei aqui com aquele primeiro emprego e fui galgando. Em escola isso é diferente, porque você não pode contratar o diretor que ainda está construindo sua trajetória. Tem de ser uma pessoa, principalmente, experiente. Ele tem de ser experiente. Então, como você vai contratar o diretor pra dirigir a escola de Manaus? Ele já tem que vir formado. Agora ele vem formado, ele vem com toda a história dele também. E ele tem que conhecer essa instituição na qual ele vai trabalhar. Então, naturalmente, quando ele é contratado, passava por um treinamento. Ele vinha pra São Paulo e aqui ele conhecia todos dos departamentos, todas as rotinas, todas as estruturas. Só que aí ele voltava pra lá. E o supervisor tinha e ainda tem esse papel: ele percorre o Brasil e vai lá pra verificar se aquilo está sendo cumprido, se aquilo que se diz aqui, que se publica, está efetivamente ocorrendo lá. Porque a gente fala que dá curso de qualidade, mas será que lá está tendo essa qualidade que foi imaginada, que foi, digamos, elaborada, que está sendo efetivamente cumprido lá? Então era esse o papel. Eu fiz isso durante muito tempo. Eu comecei em 1985. Fiquei até 1991 como supervisora e aí supervisionando. Não só supervisionando, porque na época não tinha ainda uma estrutura no setor que cuidava só de implantação de escolas. Então, além de fazer supervisão, a gente também fazia seleção, aprendia junto com os outros lá a fazer seleção. Eu fiz muitos processos seletivos juntamente com uma psicóloga, que era responsável. Mas então a gente passava por todas aquelas etapas de entrevista, de divulgação, de. _______. Enfim, _______. Passava por aquele processo de contratação, embora ia sempre alguém pra lá pra fazer a contratação das pessoas, mas a gente acompanhava: “O que que precisa?”. Aquela rotina de departamento pessoal que a gente acaba também se apropriando e fazendo. E depois implantando e fazendo reunião com professor, junto com a equipe, pra fortalecer a equipe lá e a equipe dali tocar o barco. Então a gente participava de tudo isso e voltava pra cá, também fazendo processos de divulgação. Enfim, de fazer um pouco de tudo nessa época aí que a estrutura era mais enxuta. Era menor. Então eu tive esse privilégio. Eu nunca vi como uma coisa, um fardo: vinha mais como uma atividade. Eu via sempre como uma grande oportunidade: “Eu vou conhecer isso e que bom! Vou ter que fazer regimento escolar, mas não sou especialista em regimento”. “Ah, mas tem que pesquisar”. Eu vou perguntar e vou, vamos fazendo. Montar processo de escola. Eu me lembro de Aparecida, de Goiânia, o processo pra dar entrada lá no Conselho Estadual. Eu nunca tinha feito: “Mas vamos fazer, vamos juntar”. Que eu sou muito disso: “A gente não sabe fazer esse trabalho aqui. Mas você um pouco, ele um pouco, eu um pouco e a gente faz, a gente constrói.”
P1 – Nessas viagens você percebia, por exemplo, o impacto? Porque você chegava antes das escolas estarem ______ o impacto da chegada da escola da Fundação?
R – Muito.
P1 – O que acontecia com a comunidade?
R – Nossa! Era um impacto muito grande, primeiro o projeto arquitetônico. O projeto arquitetônico era fantástico: bonito, moderno, arrojado, bom, de primeira qualidade. Porque a Fundação prima por isso, qualidade em todos os processos, a começar dos processos físicos, da estrutura. Isso sempre foi assegurado. E era o melhor, a melhor escola mesmo. O melhor ambiente de aprendizagem. Então a gente sempre trabalhou muito pra isso, pra evoluir. Faz-se uma biblioteca com esse formato. Aí a gente descobria que uma outra estrutura era melhor, favorecia mais a aprendizagem. Então, a próxima construção, a gente já aperfeiçoava aquilo que tinha sido feito, começando do projeto arquitetônico. Chegava na cidade: “Ó, vai construir uma escola do Bradesco”. Tinha o laço institucional que é o Bradesco, uma marca forte, consagrada no imaginário do brasileiro, pujança, riqueza que é mesmo. O banco Bradesco é líder, mas as pessoas ligavam sempre com muito dinheiro, com muita coisa. Então a gente chegava ali e falava: “Não, é a Fundação Bradesco. Não é bem o banco, é o braço social do banco. É uma instituição que o banco tem, mas não é banco”. Então começava daí, porque as pessoas viam aquela coisa de que era do banco, e até mesmo aquela coisa: “Você paga porque é do banco. Você tem que pagar pra estudar”. Então surgiam muitas histórias: de que ia ser uma escola paga. Porque viam o banco lá, normalmente instalado no centro da cidade, aquele banco rico, poderoso, e ele agora _______. E onde ia a Fundação, uma coisa que também as pessoas acabavam não entendendo muito, porque a diretoria da Fundação sempre escolhia o lugar mais distante, mais pobre pra ir se instalar.
P2 – E como era essa escolha?
R – Essa escolha normalmente era de uma equipe que... Eu nunca fiz parte desse processo de escolha do terreno não. Mas era o seu Jorge, o seu Antônio Peres. O seu Antônio Peres vai contar bem essa história, com muito detalhe. Seu João Carielo sempre mandava o seu Jorge, o seu Antônio Peres, essas pessoas que faziam essa escolha. Eu, particularmente, desse processo nunca participei. Mas eles faziam. Eles faziam contato com a prefeitura. Sempre era doado o terreno pra coisa toda. E aí ia a escola pra lá. Então a escola ia pra esse terreno. E assim, eu lembro muito bem de Natal, o bairro de Felipe Camarão. A escola encravada no meio da pobreza. Aí a comunidade ficava assustada com aquela pujança, com aquela coisa magnífica que a Fundação Bradesco sempre em uma área boa, muitos metros quadrados, muito espaço. Porque tinha as salas de aula, biblioteca, o núcleo profissionalizante pra oferecer cursos pra comunidade, a horta, porque a matéria _______. A Fundação Bradesco até no meio da década de 1990, até 1995, ainda tinha na sua estrutura curricular a disciplina de técnicas agrícolas. Olha que interessante: técnicas agrícolas. Alunos da 5ª e 6ª iam pra horta aprender. Então, essa coisa de educação ambiental, que hoje está muito em voga, a Fundação já trabalhava, já oferecia isso há muito tempo atrás com aquela preocupação de olhar pra sua realidade, de olhar pro meio ambiente pra valorizar as coisas naturais, pra ter esse contato com a terra. Isso era muito forte, então essa disciplina de técnicas agrícolas motivava a Fundação a ter sempre uma área muito grande. A gente tinha que ter área pra horta, área pro pomar, área pro jardim. Vocês vão visitar as escolas, todas elas têm, exceto a do Rio de Janeiro, que a do Rio de Janeiro foi uma doação do Patrimônio Histórico, o antigo Instituto Lafayette, que ficou muito tempo abandonado no Rio, na Tijuca. Depois foi oferecido à Fundação e ela ia construir uma escola mesmo lá. Então a Fundação fez toda a reconstituição, recuperação do prédio. Um prédio belíssimo. O Rio de Janeiro vale a pena vocês visitarem também porque é uma estrutura maravilhosa. Mas voltando pras demais localidades. Então era feita e chegava esse projeto arquitetônico, toda bonita a escola. Então preparava o processo seletivo, saiam os editais em jornais falando que a Fundação ia fazer o processo seletivo e muita gente se lançava e a gente participava desse processo. Contratava as pessoas. E aí abria o processo de inscrição dos alunos. Aí vinham os alunos, que era a etapa mais difícil. Sempre muito difícil, porque sempre muito mais alunos do que _______. Mais procura do que vaga. Exceto em algumas escolas em que a comunidade não acreditava muito que aquilo ia ser de graça e pra eles. Eu lembro de Cuiabá que precisamos sair com a perua kombi chamando crianças: “Estão abertas as inscrições”. Porque a comunidade ainda não acreditava que aquilo tudo ia ser de graça e pra eles. Então, em algumas localidades, foi difícil a população entender que aquilo era pra eles. A gente fazia todo o processo seletivo de procurar aquela criança que morasse mais próximo e que tinha condição social e econômica mais desfavorável.
P1 – Era sempre essa _______.
R – Sempre essa premissa: moradia e condição sócio-econômica. Esses foram os dois grandes critérios.
P1 – Dessas escolas dessa primeira fase sua de visita, tem alguma que marcou? Sabe aquela escola que quando você lembra vem no coração? Uma coisa que aconteceu? Por exemplo, você contou de Macapá.
R -
Então.
P1 – O que te vem na memória assim _______.
R – Manaus, nesta década de 1980, foi pra mim muito significativo, porque depois a gente foi fazendo, foi formando toda uma equipe lá. Lembro-me do professor Carlos, de Manaus. Se vocês forem em Manaus, vocês podem conversar com ele. Fala pra ele contar um pouco das histórias. O professor Carlos é o atual diretor da escola de Manaus e ele era professor aqui. Ele era professor da dona Regina, daqui da escola. Professor de história, professor do Colégio Rio Branco. E aí, um certo dia, nós estávamos precisando de uma pessoa pra ir pra Manaus e ele se ofereceu, passou por todo o processo seletivo. Eu me lembro muito de lá com o Carlos de Manaus. A gente com aquele processo de dar uma revigorada na escola. A escola estava passando por algumas dificuldades. Mas muito trabalho e gosto, porque a escola é grande. O Carlos está até hoje lá. Muito legal. Deixa eu ver as outras passagens. E aí eu fui visitando muito, porque expandiu demais. Então na verdade eu nem acabava tendo, digamos, um contato muito forte com a escola, porque eram sempre de 10 a 15. Eu supervisionava de 10 a 15. Dividiam em regionais. Eu tinha 10 a 15 escolas.
P1 – Por ano?
R – Não, por bloco que eu tinha que visitar. E, nossa, por ano eu nunca cheguei a fazer esses cálculos. Eu não conseguia lembrar quantas viagens, mas eram muitas. Muitas.
P2 – E como isso entrelaçava com a tua vida pessoal?
R – Então, a vida pessoal era um pouquinho _______. Eu deixava um pouco, porque o trabalho era muito edificante, muito gostoso. Você imagina: você trabalhando num local que você gosta. E eu sempre gostei muito de trabalhar com pessoas, então era aquilo tudo. Era uma coisa que entrava na _______. E eu gostava muito e ia. E fui protelando. Protelei também a minha vida.
P2 – Mas você tinha casado?
R – Não, não. Por que eu fui protelando? Porque eu vivi esse boom da década de 1980 e começo da década de 1990. Eu falei pra vocês: eu fui até 1991 como supervisora e aí eu fui deixando. Namorando sempre a mesma pessoa, o mesmo homem, o Washington Luiz. E eu falei: “Pô, agora não dá. Agora a gente tem que trabalhar e viajar. Trabalhar e viajar”. E em 1991 eu fui designada pra gerenciar esse setor, porque o setor cresceu muito e eu fui destacada pra ser gerente. Aí que não deu também, porque aí você tinha que formar pessoas, contratar mais gente. E a vida foi levando.
P1 – E aí você ficou mais aqui?
R – Entre aspas. Porque aí eu contratava, aí eu levava, fazia questão de levar a pessoa, mostrar e tal, pra desmistificar aquela ideia de que: “Você vai se empolgar. É difícil”. Não é difícil, é muito gostoso. É muito gratificante. Então a grande dificuldade que eu me lembro de formar essa equipe é que eles achavam sempre que era muito ruim. Eu falava: “Não, não é muito ruim”. Lembro de uma supervisora que ia pra Conceição do Araguaia, ela falava: “Zuleica, mas lá é um horror.” Eu falei: “Não é um horror. É muito gostoso”. Porque aquilo me fascinava, aquele mundo. Era diferente, uma comida diferente. Muito peixe, muita coisa. O hábito diferente, o hotel diferente, tudo diferente, mas pra mim. Pra vocês terem uma idéia, eu ficando no Saint Paul, em Brasília, naquela coisa magnífica que é aquele prédio lá, e ficando no Taboquinha, em Conceição do Araguaia, pra mim era apaixonante. Era a Fundação Bradesco, porque a hora que eu saía do hotel, eu ia pra dentro da escola. E escola, criança, é aqui que meu filho estuda no Bradesco. Ou lá em Bagé, no Rio Grande do Sul, lá na fronteira quase, ou lá em Conceição do Araguaia, era tudo escola. Então eu não conseguia entender porque as pessoas tinham tanta dificuldade. E tinham. Essas pessoas saiam daqui: ”Ter que viajar”. Eu não. Eu saía do avião, eu pegava o carro, eu pegava o _______. Enfim. E aí você falou da vida pessoal: eu protelei muito. Só vim me casar mesmo em 1994. Porque aí eu vi que o tempo estava passando bastante rápido e falei: “Olha, eu vou perder o bonde da história”. O bonde da história é que eu tinha um desejo: eu queria ser mãe. E aí em 1994 eu falei: “Não, eu tenho que dar uma parada. Pausa aí pra casar”. Aí me casei em 1994 e tudo. E querendo casar e no ano seguinte já engravidar. E daí não veio a gravidez. Aí você pensa que as coisas vão acontecer do jeito que você tá programando. E aí eu tinha essa consciência e o tempo passa muito rápido. Ele é implacável. Ele não passa, ele voa. E aí fui fazendo. Em 1992, eu acredito, tem uma passagem pitoresca. Você pediu pra lembrar. São tantas as passagens. Mas em 1986 eu inaugurei a escola de _______. Olha que eu entrei em 1985 na Fundação, Fundação mesmo, escola. Em 1985 comecei a viajar, foi quando eu tirei a fotografia com o Márcio Cipriano lá em São João del Rei. E aí eu comecei, virei uma itinerante. Viajava demais. Aí em 1986 eu inaugurei a escola de Brasília, que pra mim foi um grande desafio também. Viajei com o seu Jorge, que era um gerente dessa área de construção, e com o seu Monteiro, e eu fui pra lá com a incumbência de estruturar com a diretora. A escola já estava funcionando mas, oficialmente, a diretoria queria fazer a inauguração. Na época era o presidente Sarney, que era o presidente do país. E o seu Amador Aguiar era o nosso presidente em 1986. E eu fui pra lá e de lá a gente foi organizando. E eu organizei toda _______.
[pausa]
P1 – Brasília.
R – Brasília.
Eu fui em 1986. A inauguração foi definida pra ser no Dia das Crianças, no dia 12 de outubro, então eu fui. Foi um grande trabalho. Mais de 40 dias lá pra organizar tudo, pra concluir uma série de atividades. Então na época eu recepcionei os 2 presidentes. Eu achei um marco muito grande na minha vida, porque era o presidente do Brasil com toda aquela coisa,o Plano Cruzado, aquela euforia do José Sarney, a população gritando nos alambrados, gritando: “Eeeeeeeeee!”. Então veio ele, veio o ministro, vieram também alguns representantes do governo, e o Sr. Amador Aguiar, que era o presidente do Bradesco. Então tem essa história aí. Eu lembro dessa inauguração. Depois voltei pra cá, mas era tudo muito rápido. Não dava muito tempo. Daqui já ia pra outra missão. Daqui pra lá e tal. E eu acredito que tenha sido em 1992, aconteceu um fato bastante interessante também. Eu tinha ido pra Cacoal, Rondônia, fiz um trabalho lá e aí já emendei. Fiquei 1 semana lá, voltei e tinha que ir pra Pinheiro, no Maranhão, interior do Maranhão, onde a Fundação Bradesco tem uma escola. E eu falei: “Não, eu tenho que pegar esses 15 dias e resolver essas 2 questões.” Então, já saí de um lugar, passei só um fim de semana aqui em São Paulo, segunda então, nem fui pra Fundação. Já fui pra Pinheiro. E aí levei uma supervisora nova, que eu estava apresentando o trabalho pra ela. Porque eu gostava de mostrar as qualidades, coisas boas que existiam. E aí na segunda-feira, eu viajei. Chegando lá em Pinheiro no final da tarde bastante... imagina, saindo daqui de São Paulo, vai pra Brasília, Brasília para São Luís, São Luís pega um carro e vai pra Pinheiro. Andar 300 quilômetros, acho que quase 400 quilômetros. Chegando lá eu estava sentindo um certo desconforto. Desconforto assim, mas continuei trabalhando. Eu ia
até às 11h da noite. Ainda jantei bem, na sobremesa veio uma banana. Comi a banana porque, graças a deus, sempre tive muita saúde. Nunca tive nada. Nunca. Todas essas andanças, nenhuma dor de cabeça, nenhum desarranjo. Nunca precisei ir em farmácia, nem nada. Também nunca tomei nenhuma vacina quando fui pro Norte, Nordeste. Acho que abusei um pouco, mas enfim. E aí eu com aquele desconforto. Chegando no hotel, um hotel até bastante simples, umas acomodações bem simples, um calor muito forte, um ar condicionado que não funcionava, aquelas coisas, e foi me dando aquele mal estar, aquele desconforto intestinal, mas não era um problema mesmo. Não era um desarranjo. Era um desconforto forte. Eu sentia muita dor na barriga, dor na barriga, dor na barriga... passei a noite em claro. Indo pro banheiro achando que era um desarranjo e não era e voltava. No dia seguinte eu não estava aguentando mais, mas fui pra escola. Cheguei lá, falei pra diretora: “Nair, tô tão mal. Acho que vou ter que ir num médico, porque eu não estou aguentando. Tá doendo demais a minha barriga”. Ela falou: “É”. Daí eu já estava num estado que eu já não aguentava. Falei então: “Vamos”. “Mas aí do lado, Zuleica, tem um hospital público”. E aí eu fui no hospital público. Cheguei lá, aquela fila e aquela dor, aquela dor... Ela falou: “Não, espera mais um pouco”. Falei: “Mas eu não tô aguentando mais”. Lá fora aquela fila. E veio um médico. Falei: “Tá doendo muito a barriga”. Ele me examinou muito rápido. Ele me deu um remedinho assim, num copinho. Tomei e falei: “Vou voltar pra escola. Mas eu não tô aguentando. Acho que vou ter que ir embora. Me leva num médico particular, porque eu não tô aguentando”. Aí ela me levou numa clínica. Tinha um senhor bem velhinho: “ Minha filha, pelos sintomas, você deve estar com inflamação no apêndice. Você deve estar com apendicite já. Você tem que ir embora agora”. E aí veio aquele medo, ele falou: “Vai! Nem vou te dar outro remédio. Você tem que ir com dor mesmo, senão acaba mascarando. Vai ter que fazer uns exames. Vai pra São Luís”. E aí eu subi num carro, um chevetinho, e fomos embora. Chamei um taxista. Já não conseguia nem sentar mais, a barriga foi inchando. Fui quase que esticada no banco de trás. Aquele calor! Chegando em São Luís, aí que eu liguei pra São Paulo: “Gente, eu não tô bem.” Aí eles falaram: “Não?”. A diretora já estava me esperando lá e fomos direto pra um hospital. Dei entrada no hospital. O médico me atendeu, o Dr. Valdir, um médico muito legal. Ele falou: “Fique tranquila”. Eu falei: “Eu tô”. “Você não está grávida?”. Falei: “Não, não estou grávida”. Porque eles ficaram meio receosos. E a barriga doendo, doendo, doendo: “Então você tem que ficar aqui”. Fui pro soro, fiquei em observação: “Vamos colher exame”. Aí no dia seguinte, quando amanheceu, ele falou: “Olha, você está com uma crise violenta. Vamos ter que operar agora”. E eu nunca tinha entrado em hospital, nunca tinha feito nada. Falei: “Tá bom. Então vamos”. Aí que eu liguei pro meu noivo. Liguei pra ele. A vontade dele era pegar um avião e voar pra lá. Nunca tinha tomado uma anestesia geral, nada. E ia tomar. E o interessante, o curioso, é que a diretora que teve que assinar lá pra mim, a Nádia, que é a atual diretora, se vocês foram lá ela vai contar a história com todos os detalhes, havia perdido o pai num choque anafilático, que ele tomou a anestesia e morreu. Ela falou: “Vou ter que assinar dessa moça aqui, da Zuleica?”. Ela não me contou, mas eu vi que ela estava tensa: “Porque a Nádia está tão tensa?” Ela me contou: “Zuleica, meu pai morreu num choque anafilático”. E qualquer um está suscetível, está sujeito a isso. Mas aí eu fiz a cirurgia.
P2 – Era apendicite mesmo?
R – Apendicite. Estava piorando já. Estava num estágio já _______. Eu ia morrer se não socorresse. E eu queria vir embora: “Vou pegar o primeiro vôo pra São Paulo”. Porque na época, a irmã do Sarney tinha tido uma crise e ela veio operar aqui em São Paulo, no Hospital das Clínicas, porque o melhor médico pra quando você está fora de São Paulo é pegar um avião e vir embora. Mas aí fiz. A cirurgia foi muito bem sucedida. Fiquei lá 15 dias. E vim embora. Eu não aguentava mais. Aí marquei com um taxista: “Primeiro vôo, 5 horas da manhã. O senhor me pega?”, “Pego”. O motorista foi, só que ele cochilou no volante e o carro bateu. Quase que o carro vira. Eu segurei assim. Bati a cabeça. Bateu na guia. Ele trepou na guia. Ele bateu assim. Quebrei meu dente. A raiz desse dente da frente quebrou. Mas fiquei com medo de ter sofrido mais escoriações. Falei: “Não, agora eu vou embora. Pelo amor de deus”. Aí entrei no avião. Fui direto pro Hospital das Clínicas, mas não tinha nada. Só fraturou a raizinha assim. Depois tive que fazer _______. Mas enfim, nem por isso vou falar: “Nunca mais eu volto pro Maranhão”. Vou falar: “Volto”. Voltei lá pra São Luís. Sem problema. Mas foi o único incidente que eu tive. O único. E nessas andanças comia muito peixe na região Norte, em Manaus. Costela de tambaqui. Aqueles peixes deliciosos. Tambaqui. Como é que chama aquele outro?
P1 – Dourado.
R – Dourado ali na região centro-oeste.
P1 – E Canuanã?
R – Ah, Canuanã que maravilha, meu deus. Tem uma história, Canuanã. Então como eram muitas as escolas e a gente ia pra onde tinha maior necessidade. Então o que eu tenho lembranças de Canuanã? Quando eu entrei em 1985, o contato com Canuanã era via rádio, rádio-amador. Porque não tinha telefone naquela época, nem nada. E eu lembro que eu trabalhava numa sala, a sala seis, a sala da supervisão, e tinha um período que a gente combinava pra escola falar com a gente. Então a gente ia lá pro rádio e falava com dona Santa, que era a primeira diretora de lá. “Câmbio, câmbio, chamando. Matriz chamando”. Daí: “Canuanã daqui”. Então eu lembro desses contatos via rádio-amador. Me lembro que, na época, o seu Amador visitava muito Canuanã no Conceição do Araguaia. Ele gostava muito dessa região. Então ele ia pra lá e ficava muito sensibilizado. E ele tinha uns projetos. Uma época ele trouxe umas alunas de Canuanã pra cá. Trouxe. Ficou aqui na Cidade de Deus com a dona Esméria, que era uma inspetora de alunos que morava numa casa aqui. E ela ficou meio que cuidando dos alunos que vinham. Então eu lembro que eu colaborava muito quando chegavam essas crianças. Uma criança que tinha algum problema. Eu lembro de um menininho, o Reginaldo. Ele tinha um defeito físico grande na perninha. Ele andava só arrastando pelo chão. Eu lembro do Reginaldo, que eu cheguei a levá-lo no Hospital das Clínicas. Então eu lembro dessas crianças que vinham. O Adonilton, que era um menino lá de Canuanã, que era aluno, e tinha cirrose. Era criança e tinha uma cirrose muito forte. E fazia esse tratamento. E eu que acompanhava o Adonilton. Levava até o Hospital das Clínicas. Levava no médico, um médico muito bom, que fez todo o acompanhamento dele. Pegava o táxi _______. Então fazia também isso, de assistente social também.
P1 – E esses tratamentos a Fundação _______.
R – Custeava tudo. Trazia essas crianças pra cá. E eu acompanhei por diversas vezes muitas crianças. E assim, o destino sempre me jogando pra cá e pra lá e eu não ia muito _______. a Canuanã. E depois eu fui a Canuanã. Ai, que delícia. Aquele trajeto. Descer lá em Palmas. E como é que chama aquelas outras cidades lá? Uma época foi Palmas. Depois outra época desci uma outra região que eu já não estou lembrada.
P1 – Formoso.
R – Formoso do Araguaia. Aí a gente pega o carro e vem andando naquela poeira gostosa. Passando ali perto daquela região irrigada de arroz, de plantação de arroz. Cooperjava [Cooperativa Mista Rural Vale do Javaés Ltda]? Cooperjava não.
P1 – É o projeto Rio Formoso mesmo.
R – Projeto Rio Formoso. E chegando lá em Canuanã, dona Maria em Canuanã. Fica andando na fazenda sede, visitando os alunos. E eu ia. Eu sempre gostei muito de ir pra escola, de visitar as comunidades. Então ia para aquelas comunidades indígenas. Então atravessava o rio de canoa. Ia do outro lado de lá, visitava os índios. Então tem toda essa história de ir a Canuanã. Mas, sempre muito assim: Ia segunda-feira e voltava na sexta-feira. Correndo, andando. Porque nas últimas visitas minhas a Canuanã foi com um médico veterinário. Nós fomos lá pra cuidar. Eu já estava cuidando de um segmento de educação profissional técnica, que é agropecuária, que é o forte de Canuanã. Então, as últimas visitas ficaram mais voltadas pra esse segmento de educação. Andei ali toda a região de carro, visitando as plantações, visitando os trabalhos, os projetos dos alunos. Mas inicialmente sempre visitando a escola, a educação básica. E o que eu lembro forte de Canuanã eram as crianças que vinham. As pessoas que vinham pra cá e a gente dava uma certa assistência, acompanhava todo o processo. Tinha uma moça que vinha que tinha um problema na perna. Então eu a acompanhava, esqueci o nome dela agora. Mas o Adonilton é muito forte.
P1 – Dessa trajetória, depois das viagens, você assumiu um outro cargo aqui? Como foi?
R – Então. Em 1991 foi quando eu assumi a gerência do setor. Aí eu não viajava, digamos... Eu não ficava tanto tempo. Eu viajava _______. Eu tinha muita frequência, porque eu estava sempre formando pessoas, levando pessoas. Até 1994, 1995, 1996 que eu viajei bastante. Depois, viajei bastante implantando escolas. Em 1993, escola de Marília. Foi quando o banco fez 50 anos e ofereceu pra cidade de Marília, de presente, a escola. Nós ficamos em Marília uns 30 a 40 dias.
P1 – Essa escola, parece, tem uma característica arquitetônica um pouco diferencial.
R – É. Aí já mudou bastante. Porque até a implantação de Marília os projetos eram muito parecidos. Aí em 1993 modificou até a própria empresa que construía as escolas mudou. Foi quando a Denise Aguiar havia assumido a direção da Fundação Bradesco. Ela também trouxe essa preocupação muito forte de melhorar cada vez mais os projetos. Então Marília é um marco. Marília é uma escola diferenciada do ponto de vista arquitetônico. Essa escola começou, digamos, a ficar verticalizada. Ela já não era toda com aquele T, que as escolas têm um T, as salas e aquele corpo. Mas foi projetada um pouco pra cima, fazendo já um projeto diferenciado.
P2 – Eu queria te perguntar: Aquilo que você falou em cima de Brasília, da inauguração de Brasília, que a escola já estava funcionando, mas foi inaugurada depois. Então, nas nossas pesquisas nós vimos muito isso. Como era isso de começar primeiro a funcionar pra depois inaugurar oficialmente?
R – Então, eu acredito que _______. Aí também era uma decisão da diretoria, eu era supervisora, eu acredito talvez em função de _______. Talvez a falta de disponibilidade da presidência, algum aspecto. Aí talvez tenha que perguntar pro Sr. Carlos de Oliveira, seu João Caniello. Eles podem talvez responder. Mas é uma curiosidade mesmo. Até porque _______.
P2 – É bastante comum isso.
R – Muito comum. Porque hoje eu já vejo assim: não dá pra você começar sem criança. Como é que você vai inaugurar? Não tem nem aquela _______. Bota a criançada toda pra dentro da escola. Como é que vai fazer essa inauguração? Eu acredito até que pra pegar um pouco mais o jeito, a filosofia da escola. A escola, digamos, está funcionando harmonicamente pra fazer essa inauguração. Não se inaugura como na rede pública. Vem inaugura, bota a criançada toda pra dentro. Normalmente tem uma cerimônia, uma fala. Eu acredito que seria essa a preocupação. E o fato interessante é que as últimas escolas não tiveram essa inauguração oficial. Vocês podem perceber. O Jardim Conceição não teve. Isso também aos poucos foi sendo...
P1 – Em 2000, mais uma mudança.
R – Então, 2000 mais uma mudança, de 1991 a 2000 fiquei como gerente do setor de supervisão, abarcando processos de implantação, fazendo o todo: educação básica ao geral. Aí, em 1996, houve a mudança da legislação educacional no país. A lei 5.962 caiu e entrou a 9.396. E com essa mudança, um aspecto bastante importante nessa mudança foi a extinção daquela concepção de educação profissional dentro da educação básica. Porque na verdade, o 2º grau é uma educação profissional dentro de uma educação básica. Com essa lei 5.692, digamos, ela acabava comprometendo a formação geral do cidadão. Ao invés de você fazer educação infantil, 1ª a 4ª, 5ª a 8ª, ter um ensino médio, com disciplinas mais abrangentes, com mais filosofia, com toda essa visão de mundo mesmo, a lei 5.692 deu uma cortada, porque ela começava a trazer conhecimento específico, conhecimento técnico em detrimento de uma formação geral. E eu, particularmente, achei que essa mudança foi fundamental. Eu sou fruto da 5.692 e eu sinto isso. Eu senti isso na minha vida depois, porque eu não tive filosofia, eu não tive sociologia, não tive nada disso. Essas disciplinas todas, essas clássicas, mesmo português, tudo era meio apertadinho para dar espaço pras outras, física, química. Então, em 1996 houve essa grande mudança, mas isso impactou muito forte na Fundação, impactou fortemente. Por quê? Porque quando a Fundação nasceu e começou a se projetar na década de 1970, veio a legislação de 1972, que é a 5.692, e isso então, a Fundação começou a ter um histórico muito grande em educação profissional, tanto a básica, que é pra comunidade, quanto a técnica. Então a Fundação tem tradição em formar pessoas. Tanto é que a Fundação Bradesco tem vários cursos profissionalizantes. Eu acho que a Márcia contou, o de turismo _______. O Almir vai falar com muita propriedade desse período aí. A Márcia era de educação básica.
(troca de fita)
R – Então, parei na LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional]. Então aí houve essa mudança e eu tava dizendo que a Fundação tem essa tradição. Eu digo tradição em educação profissional, porque os cursos _______. Como a Fundação tem essa filosofia de que tudo que ela vai fazer, faz muito bem feito, os cursos técnicos sempre foram muito procurados. Tanto é que os alunos vinham da educação básica, do antigo 1º grau, e já iam automaticamente pro 2º grau. Mas muitos saíam. Então essas vagas que apareciam eram oferecidas pra comunidade. Quando eu vim, eu fiz o vestibulinho. Então, muita gente procurava esses cursos aqui. Então eram cursos de eletrônica, de processamento de dados, cursos de turismo e de administração. Então eu estava falando de 2000, quando mudou a lei. Isso impactou muito na Fundação Bradesco, porque ela tinha um histórico de educação profissional, mas isso lá... E aí, em 1996... mas a lei, ela muda e depois tem um tempo pras escolas se organizarem. E aí, nesse período, nós começamos a estudar 1997,1998, fizemos todo um projeto pra quando os alunos terminassem. Aí eles cursaram 1997, 1998, 1999, em 2000 eles iam sair, então a gente ia oferecer a educação profissional pós-médio, que a opção foi: você poderia oferecer concomitante ou pós. A Fundação decidiu oferecer pós-médio. E aí eu entrei. Em 1997, 1998, eu já fui mais ou menos me deslocando para os estudos voltados pros novos cursos, com novos formatos, com novas metodologias. Então um curso pós-médio você faz em 1 ano, 800 horas, mas só educação profissional. Então, tendo que entender a lei, tendo que adaptar a estrutura da Fundação, a estrutura física, porque você tinha que deixar uma sala pra tantos alunos, fazer processo seletivo. Aí foi um momento bastante rico em 2000. Foi quando eu me distanciei de educação básica e fiquei só com educação profissional. Apropriei-me de toda a legislação, conheci a fundo, estive no MEC levando o projeto diretamente pra coordenadora de educação profissional do país, que era a professora Cleunice Heim, então tive um privilégio muito grande. Trabalhei com professores doutores da USP [Universidade de São Paulo], com aqueles especialistas. Foi um momento assim riquíssimo, que aí você pode se dedicar ao estudo daquela área do conhecimento. Então aonde eu fui? Na área de gestão eu fui e conheci todas as áreas funcionais: RH [Recursos Humanos], marketing, finanças, produção. Porque aí você estabelece um diálogo com especialista e com ele você traça um curriculum. Foi fantástico. Implantei em 2000, 2001, 2002 os cursos em praticamente todas as escolas da Fundação, onde tinha demanda evidentemente. Porque em algumas escolas não tinha alunos que queriam fazer esses cursos técnicos e muitas tinham alunos, mas não tinha professores. Porque aí você tem que trazer o melhor para aquela área. Essa é a concepção de educação profissional. Você não pode fazer mais ou menos. Se é um curso eminentemente técnico, você tem que ter gente preparada pra aquilo. E o mercado também. Não adianta você dar curso técnico em gestão de 800 horas em Pinheiro, que é uma cidade que não tem nem como absorver aquilo. Então você está dando um curso pra quem e pra quê? Então dentro desses pressupostos que a gente foi mais ou menos dirigindo a implantação dos cursos. Aí, trabalhei com a área de gestão, área de agropecuária, área de eletrônica e área de informática. E cheguei a traçar um currículo de turismo, mas que não teve demanda. Às vezes, tinha em Natal, até chegou a pedir, mas não teve o número de alunos necessários pra, digamos, poder confirmar a oferta de um curso, porque tem também os custos. A Fundação Bradesco também tem essa preocupação: qualidade acima de tudo, mas também tem que ver a viabilidade financeira. Não adianta você querer fazer as coisas que não tem também condições. Enfim, e aí em 2003, final de 2003, foi quando a Sônia foi pro Jardim Conceição. A Sônia trabalhava lá comigo. Ela era da educação profissional básica, esses cursos pra comunidade. Aí eu assumi durante um período a educação profissional técnica, a educação profissional básica. Fiquei com as 2 áreas. E aí depois, o ano passado, houve uma definição, eu fiquei só com a básica. Foi quando eu assumi esse projeto que era do antigo Cetag, lá do Marcos Nale. Foi quando eu estava mais ou menos estruturando, dando uma reformatada nesses cursos. São mais de 100 cursos, nas mais variadas áreas. Aí entra área de artesanato. Foi um bastante muito rico também. Então, a gente pôde conversar com especialistas. Área de moda, cursos de corte e costura. Tinha uma variedade muito grande. Vocês chegaram a ler algo a esse respeito?
P1 - _________ transformação de renda.
R – Ah, é pra transformação de renda. Cursos de 30, 60, 80 horas. Dependendo do conhecimento. E são cursos eminentemente práticos. Não tem muita base teórica e nem pode ter. Curso de culinária, aprender a fazer trufa pra ganhar dinheiro. E aí os últimos grande projetos foi esse e o do Adolescente Aprendiz que eu não posso deixar de falar pra vocês que foi meu último filhinho gerado. Em 2000, final de 2000, foi promulgada uma lei dizendo que as empresas tinham uma obrigação de contratar adolescentes, quer dizer abrir uma oportunidade pros jovens. Porque com essa coisa toda de carteira assinada, as empresas foram deixando um pouco de contratar jovens. Então veio uma legislação aí dizendo que as empresas têm que cumprir uma cota. Então o banco teve essa demanda: “Eu tenho que atender a lei e contratar jovem menor de 16 anos, a partir de 14 anos”. Então aí, junto com o departamento de recursos humanos do banco, que nos passou as necessidades que eles queriam, a gente formatou um currículo de 720 horas pra ser oferecido ao longo de 2 anos. Mas, assim, o aluno não deixa o ensino médio. O legal é isso, é que o aluno está fazendo o ensino médio e ele vem, faz a parte prática no banco e uma vez por semana ele faz a parte teórica lá na Fundação Bradesco. Então esse projeto a gente formatou, estruturou. Nós levamos até o Ministério do Trabalho. Foi muito elogiado esse projeto. É um projeto fantástico. Acho que vale a pena vocês também colherem informações. E foi assim: uma coisa maravilhosa porque você vê aquele menino de 15, 16 anos _______, porque ele está na escola, mas a escola também, a educação básica também não dá, por mais que ela se esforce, ela não consegue chegar ao mundo do trabalho, que é um mundo absolutamente diferente de tudo. Você tem que pensar na sua apresentação. Então eu vejo que é uma fase fantástica pro aluno. E o aluno que tem a oportunidade _______. E eu falava isso pros pais. Eu ia na reunião dos pais e falava: “Olha, gente”. “Ah, mas meu filho ainda é muito novinho”. Que engraçado, na época, eu não era tão novinha, comecei a trabalhar aos 16 anos. Mas hoje os pais têm essa preocupação do filho muito novo. E a gente tem que tomar esse cuidado pra não passar isso. Porque o filho sempre vai ser pequeno. Não pode! Poxa, eu me lancei, eu tinha 15 anos. Então a gente precisa passar, que é o que falta hoje pros jovens. Os pais ainda estão segurando os filhos um pouquinho ainda lá dentro com a asa, um pouquinho que cercando. Então eu chegava pros pais e falava: “Ah, meu filho só tem 15, 16 anos” . “Coloca. Isso não vai prejudicá-lo. São 6 horas de atividade. Trabalhar meio período. E organiza a vida. Dá pra trabalhar, dá pra estudar e dá pra _______”. E é um programa que a gente fez o seguinte: fez um módulo básico, as primeiras 360 horas em que ele conhece tudo, a vida na empresa, como que as organizações _______, conta um pouco da história da administração e traz informações bem básicas do mundo corporativo, não falando de bancos, falando do mundo como um todo, trazendo a área de comércio, enfim, a indústria. E depois, num segundo módulo, é que aí, como ele está ligado à instituição financeira, ele vai conhecer o universo da instituição financeira, a falar de marketing de relacionamento, aquelas coisas todas. Então, esse foi o grandioso projeto, eu falo grandioso por parte da Fundação. Não estou querendo falar que eu coordenei _______.
P2 – _______ espalhado pelo Brasil inteiro?
R – Espalhado. Nós começamos inicialmente aqui em Osasco, atendendo pela Cidade de Deus, e hoje ele deve estar presente em seis, sete Estados, acredito eu.
P1 – E depois?
R – Então, depois, agora, recentemente, em junho de 2005, eu acabei me desligando. Saí da Fundação Bradesco. Eu avalio que é uma fase de mudança, de um outro ciclo na minha vida. Eu vou retomar um outro ciclo. Eu achei bastante positivo. Eu estou com 45 anos e me considero bastante jovem ainda pra traçar mais uma grande jornada. Espero aí ter mais uma jornada de trabalho.
P1 – Você gosta de desafios?
R – Gosto muito. Gosto muito de desafios. E com toda base, com toda experiência que eu acabei acumulando e acabei conquistando na Fundação. Acho que foi suficiente. Acho que chegou o meu momento. O momento de sair mesmo e descobrir novos ares. E é incrível! Porque eu saí daqui de Osasco, onde eu trabalhei a vida inteira, 27 anos e meio vindo. Primeiro morando aqui dentro; depois, quando me casei, fui aqui morar no bairro do lado. Então meu trajeto era esse. E, de repente, eu fui trabalhar na Avenida Paulista. Eu fui pro centro financeiro, pra avenida da possibilidade financeira. Aquela multidão! E estou trabalhando na Avenida Paulista hoje. Então, uma mudança rápida. É como se eu estivesse saindo de Minas e vindo pra São Paulo. Porque agora saí de Osasco e fui lá pra. De novo. E acho que essa é a minha vida. Estou vivendo um momento bastante gostoso. Pulei um pouquinho a minha vida pessoal, o nascimento do meu filho, que também foi uma conquista grande. Porque é aquilo. Você falou: “E a vida pessoal?” E eu fui protelando, protelando. Eu achei que ia me casar em 1994 e em 1995 eu ia engravidar. Mas aí não veio. Aquelas coisas. A natureza é que explica, se é que explica. Aí não veio o bebê. O bebê acabou vindo em 1998. Em 1998 eu engravidei. Em 1999 nasceu meu filho, um filho maravilhoso, com muita saúde, que está aí. Está estudando na Fundação Bradesco. Adora a escola. Tem orgulho muito grande de estudar aí na escola. E eu estou aí tocando a minha vida. Num primeiro momento quando eu saí pensei em fazer uma coisa absolutamente diferente. Queria ser empreendedora, abrir um negócio próprio. Mas aí não deu tempo. Em menos de 1 mês pra trabalhar lá. E estou gostando muito. Estou montando um projeto, agora de educação corporativa, na qual a gente vai começar já com MBA [Mestre em Administração de Negócios]. E olha que engraçada a vida, eu passei por todos os estágios. Uma sequência. A gente foi _______. E agora estou com um grande desafio: montar um MBA, que é um curso com formato bastante diferente também. Trabalhando com outras pessoas, conhecendo outras realidades, um conhecimento específico, que eu não tinha. Crédito imobiliário, que eu estava dizendo a vocês. E estou encarando com muita serenidade este novo momento da vida profissional.
P1 -
Agora, avaliando um pouco, nessa trajetória, história de transformações pessoais. Gente que você viu desabrochar. Tem alguma?
R – Nossa! Muitas! Porque eu sempre trabalhei acreditando muito no potencial do ser humano. O potencial do ser humano é infinito. Então eu sempre acreditei. Porque como eu sou da área de educação, eu acredito na transformação, na mudança, na capacidade. Porque nós temos uma capacidade enorme, que não dá, é uma coisa divina, uma coisa de deus. Todo mundo tem essa capacidade. Veja bem, na medida que você vai conhecendo as pessoas, um sai daqui, outro sai dali, você vai fazer isso, de repente você fazer aquilo que é totalmente diferente. Então a gente tem uma capacidade inesgotável, uma coisa enorme. E eu sempre fui disso: de estimular as pessoas. As pessoas costumavam brincar comigo: “Zuleica, você dá aquele empurrão”. E eu sou, meu empurrão é, às vezes, um pouco até forte. E eu tenho que tomar um pouco de cuidado, porque como eu tenho esse jeito _________. Mas no fundo, no fundo, não era um empurrão pra machucar. Era pra erguer mesmo, pra dar uma levantada. Ah, eu participei da trajetória de muita gente. Mesmo a Sônia. A Sônia foi minha funcionária. Eu era gerente, a Sônia era supervisora. Ela trabalhou comigo. Depois foi minha parceira, foi gerente como eu.
P1 – E hoje está?
R - Ela está dirigindo escola. Fiquei com um projeto e ela foi pra lá. Mas a Sônia já era supervisora. Eu digo porque ela foi minha funcionária. Mas tem muitas outras pessoas, que a gente foi formando. A diretora de Laguna, se vocês passarem em Laguna. A Laguna é a Mini. A Mini trabalhou comigo. Eu contratei a Mini. Digamos, formei, entre aspas. Porque você fala formar é aquela coisa que põe na forma. Mas, a gente fala formar é quando a gente passa. É a gestão do conhecimento. Eu lidava muito bem com isso, porque tudo aquilo que eu sabia eu passava pros outros. A pessoa era contratada, ela chegava hoje na Fundação, eu passava tudo aquilo pra ela. Tinha que tomar um pouco de cuidado. Tinha que organizar essa passagem, mas eu não segurei nada. Uma coisa que eu, graças a deus, eu acho que foi uma coisa muito boa, eu não segurei nada. Todo esse conhecimento que eu construí, que eu compartilhei dentro da Fundação, que eu aprendi com o outro, eu deixei também. Então, ao mesmo tempo que eu saio cheia, eu saio vazia. Porque eu deixei tudo. Vocês me perguntam: onde estão as _______. Tudo. Ficou tudo na Fundação. Eu consegui separar. Eu nunca tive essa preocupação de fazer uma coisa paralela, de levar. Não, a minha vida era aquilo ali. A minha vida era a Fundação, era aquilo ali. Aquele prédio, aquilo tudo.
P1 – E, avaliando, o que você acha da iniciativa da Fundação de estar buscando o resgate da história em cima da história das pessoas que fizeram essa história?
R – É a própria cara da Fundação, porque a Fundação tem isso. Ela não tem essa preocupação, pelo menos eu nunca percebi isso, nunca senti isso, nunca vivi isso. A Fundação é autêntica. A história dela foi sendo construída por quem estava ali dentro. Ela nunca foi de querer ver o modelo do outro pra copiar. Acho que esse é o pioneirismo da Fundação que mistura um pouco com o pioneirismo até do banco. Essa filosofia de você ser autêntico, você construir a sua história. Então a Fundação ela tem isso. Nós nunca fomos buscar, digamos, modelo do outro. Porque ela que foi pioneira. Porque foi ela que saiu com esse projeto de responsabilidade _________. O banco, com esse projeto de responsabilidade social. Ele teve essa iniciativa. Ele apostou nisso. E em absoluto, ele não foi copiar de ninguém. Muitas pessoas que vieram e que foram vendo e que a gente tinha o maior orgulho de mostrar esse projeto consagrado pros outros. Agora isso não quer dizer que a gente nunca foi ver o que os outros fazem. A gente sempre até fez, de compartilhar, de olhar, mas eu acho que tem a ver com a filosofia da Fundação. A Fundação sempre foi muito, não sei se estou conseguindo traduzir, ela sempre foi muito autêntica e ela mesma foi construindo sua história com base na sua própria história. Ela foi se expandindo e acreditando naquilo que ela fazia. E ela acreditava que estava fazendo o bem. E eu penso e eu tenho certeza de que ela fazia muito bem, porque sempre foi muito pautado pela ética, pela qualidade. Assim, uma coisa que eu aprendi: sempre fazer o melhor. Sempre. E isso eu aprendi no banco também, por conta dessa minha passagem pelo banco, eu aprendi que a gente tem que fazer sempre o melhor. Sempre o melhor.
P1 – Então você acha que essa história da Fundação modificou a história da educação no Brasil?
R – Certamente. Certamente modificou. É um marco, uma referência muito grande. Ela, com certeza, a Fundação Bradesco tem uma importância nesse sentido de ter contribuído para com a evolução do ensino no país. Na educação infantil, na educação básica, a Fundação sempre foi uma referência em todas as localidades nas quais ela está presente. E sempre, durante todo esse período, você andando por esse Brasil, você trabalhando na Fundação Bradesco _______. Então, o que vem sempre na mente das pessoas: uma escola de qualidade. Tanto é que meu filho está lá. Eu tenho certeza, convicção de que meu filho está tendo o melhor ensino, acesso às melhores práticas, às melhores metodologias. Isso eu tenho total _______. Senão a gente não passaria. E é um orgulho, uma coisa. Meus sobrinhos também estudaram lá. Eu sou fruto de lá, estudei lá. Meu esposo estudou lá. Então eu tenho total convicção de que a escola é muito boa e vai ser boa e vai contribuir muito pra com a formação do meu filho. Claro que a família aí tem um papel preponderante. E quando eu falo que aprendi muito no banco, na filosofia Bradesco, eu falo: “Claro, eu tenho, já também, uma filosofia forte, familiar”. E o meu pai sempre foi também, digamos, enfático em dizer que você tem sempre que fazer o melhor. Mas isso me ajudou. Quer dizer, eu, dentro do Bradesco, acabei me encontrando com esse estilo de vida. Eu me identifiquei. Que era aquilo que eu já sabia que eu tinha que fazer chegando aqui. Quer dizer, isso me ajudou muito. Ajudou na construção da minha identidade.
P1 _______ te liga quanto à infância com a coisa da educação.
R – Isso. Tem muito, muito vínculo com aquilo que a mãe deixou: “Vocês precisam estudar. O estudo é o tesouro da alma. É o estudo que diferencia, que valoriza as pessoas”. Então foi tudo _______. Acho que as coisas foram se juntando, foram se conectando. Então eu acho que isso é muito bom. E é maravilhosa essa iniciativa da Fundação Bradesco. Agora, ela contar a sua história a partir das pessoas que fizeram a história, eu acho que tem tudo a ver. Muito coerente. O que eu diria pra você é que é coerente esse trabalho que a Fundação acabou _______. essa decisão da Fundação de fazer a história a partir de quem está lá. Porque quem está lá é quem ajudou a construir, quem fez, quem acreditou no projeto.
P1 – O que a gente percebe é que todos com muito amor.
R – Muito. Não, esse é o ingrediente número 1. Não tinha dificuldade. Nunca senti isso aí. Nenhuma dificuldade. Eu costumo dizer _______. Às vezes, até nesse outro local que eu estou trabalhando agora, as pessoas falam: “Ah, mas você veio de um banco muito rico”. Eu falei: “Gente, mas eu não trabalhava em banco. Eu trabalhava em Fundação, em entidade, em instituição do terceiro setor. A gente também dependia de um orçamento”. Mas a característica nossa é sempre fazer o melhor porque você está oferecendo um ensino gratuito. E disso eu não esqueço: não é porque é gratuito que tem que ser feito de qualquer jeito. Não, pelo contrário. O que eu aprendi ali dentro é que o ensino é gratuito, a oferta, mas o ensino tem ser da melhor qualidade. Ele tem que ser melhor que aquele que é pago, aquele que é remunerado. E eu nunca tive dificuldade alguma. Pra mim sempre foi um prazer muito grande trabalhar com a população, com aqueles pais. Pra mim era uma festa.
Um orgulho você estar lá no primeiro dia de aula, no dia da seleção dos alunos, passar aquilo pros pais, falar pra eles: “Valorizem, valorizem”. Tanto pras crianças, quanto pelos adultos, porque eu também participava das reuniões com a educação de jovens e adultos, que é um segmento fantástico da Fundação Bradesco, um trabalho bastante inédito, bastante pioneiro, e de muita qualidade, que é a educação de jovens e adultos, o ensino formal, educação básica, ensino fundamental e médio e que a Fundação oferece para aqueles senhores que tem 70, 80 anos. É algo fantástico. E fazer com qualidade. Esse é o lema da Fundação Bradesco. Você fazer quase que completa. É fazer tudo isso e com essa característica. Fazer com muita qualidade e com amor. Porque sem amor você também não faz nada. Imagina você com tudo isso e sem ter esse carinho, essa identificação. Eu me identifiquei muito com tudo com todas as fases, com todos os públicos.
P1 – Então, a gente poderia continuar mais horas aqui, mas aí tem a instituição. Então em nome da Fundação Bradesco e do Museu da Pessoa, a gente queria agradecer muitíssimo a sua entrevista.
R – Ah, eu que agradeço. Eu fico bastante feliz por poder participar dessa história, desse projeto, e me colocar à disposição no momento, na hora que vocês precisarem. A gente está sempre à disposição. Quero ir logo lá conhecer o projeto de vocês, que deverá ser divulgado.
P1 – Ah, isso com certeza.
R – Esse trabalho de vocês é fantástico, esse resgate da memória é muito bom. Muito obrigada!
P1 – Olha que entrevista boa!
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