Projeto Memória, Identidade e Cultura – Grupo Pão de Açúcar
Depoimento de Antônio Andraues
Entrevistado por José Santos
São Paulo, 10/10/2003
Realização Museu da Pessoa
Entrevista GPA_HV001
Transcrito por André de Carvalho Calvanese
Revisado por Ana Calderaro
P/1 – Seu Andraues, bom...Continuar leitura
Projeto Memória, Identidade e Cultura – Grupo Pão de Açúcar
Depoimento de Antônio Andraues
Entrevistado por José Santos
São Paulo, 10/10/2003
Realização Museu da Pessoa
Entrevista GPA_HV001
Transcrito por André de Carvalho Calvanese
Revisado por Ana Calderaro
P/1 – Seu Andraues, bom dia.
R/1 – Bom dia.
P/1 – Eu queria iniciar a entrevista pedindo para o senhor falar o seu nome completo, data e local de nascimento.
R/1 – Perfeito. Meu nome é Antônio João Andraues, nasci dia dezenove de junho de 1954. O meu nome vem dessa data porque minha mãe é muito religiosa, e eu nasci exatamente no meio entre Santo Antônio e São João. Se você contar dia treze, que é Santo Antônio, e 24, que é São João, eu nasci no dia dezenove, portanto. Daí veio o meu nome, Antônio João. Poderia ser muito bem João Antônio, que é mais comum.
P/1 – É verdade. E você poderia falar quem são seus pais e que atividade eles desenvolviam?
R/1 – Bom, os meus pais sempre trabalharam com comércio. Eu sou filho mais novo de uma família de três irmãos. Nasci atrás de um balcão. Minha mãe, quando eu nasci, era dona de um armazém, e o que ela me contava é que ela me levava pra lá muito pequeno e havia umas caixas de engradado - antigamente os refrigerantes e as cervejas eram em vidro e as caixas eram de madeira - e ela forrava essas caixa de madeiras e me colocava ali deitado, atrás do balcão. Enquanto ela ficava trabalhando, eu ficava ali deitadinho, e de vez em quando ela parava pra amamentar, pra me alimentar. Então, eu acho que a coisa do sangue árabe veio da coisa do comércio, nasci praticamente atrás de um balcão, e fui criado assim.
P/1 – Que beleza.
R/1 – Então, os meus pais, os dois, tinham a mesma atividade, que era um comércio de alimento, armazém, no interior de São Paulo.
P/1 – Em que cidade?
R/1 – Em Itatiba, em Campinas... Quer dizer, teve a fase de Campinas, teve a fase de Itatiba e eles terminaram a vida se aposentando depois, mas nunca trabalharam pra ninguém, sempre foi trabalhando com trabalho próprio, com negócio próprio.
P/1 – O senhor poderia contar um pouquinho qual foi a sua formação?
R/1 – Eu estudei no interior, comecei estudando lá no interior. Depois vim pra São Paulo, estudei, fiz o segundo grau aqui. Dei início à faculdade, não terminei, acabei não terminando a faculdade de administração, parei, aí fui aprendendo com a faculdade da vida mesmo e fui ganhando experiência através da vida, porque não deu pra terminar a faculdade.
P/1 – E o senhor entrou no Pão de Açúcar em que época, em que função?
R/1 – Então, eu entrei no Pão de Açúcar em 1975. Eu me lembro muito bem que eu vim de fora da empresa, e a Norma era a pessoa que liderava o treinamento e que dava formação pra gente. Então, eu passei um ano treinando, naquela época a gente desmanchava o boi inteiro, destrinchava o frango, aprendia a fazer o corte da carne, em quantas partes se dividia o traseiro, em quantas partes se divide um dianteiro. Tinha que ser. A nossa política era que sempre que tivesse que ter... Quando você desmanchava um boi, você podia ter osso na carne, mas nunca carne no osso. E essa era a jogada nossa, porque carne no osso era prejuízo, osso na carne era lucro. Então eu comecei em 1975, treinei e a partir daí comecei com a minha carreira aqui dentro. Tenho orgulho hoje de ser um dos mais antigos aqui, porque muita gente dos mais antigos, com exceção da Norma e algumas pessoas, ou vieram de outras empresas, que a gente adquiriu, ou saíram e depois retornaram. E eu tenho orgulho, graças a Deus, de estar desde 1975, porque peguei a compra da Eletro Radio Brás, do Pegue e Pague, do Super Bom e aí por diante.
P/1 – E seu Andraues, depois do seu treinamento, qual foi a sua primeira função?
R/1 – A minha primeira função foi ser subgerente da Loja 13, do Shopping Iguatemi, que hoje é a loja 1203. Ela era gerenciada pelo Savério, que muitas pessoas ainda lembram dele, e eu fui ser subgerente dele lá, até o momento em que a gente comprou o Eletro em 1976. Na compra do Eletro, eu fui assumir uma loja do Pão de Açúcar para substituir um gerente que estava indo fazer a integração do Eletro. Quando a gente comprou o Eletro, a empresa triplicou praticamente de tamanho e eu fui ser gerente da Loja 5. A Loja 5 ficava lá na Lapa, essa loja não existe mais.
P/1 – O senhor tinha quantos anos na época?
R/1 – Eu também tenho esse orgulho de ter sido o gerente mais novo dessa companhia. Eu, quando não tinha nem 21 anos ainda, já era gerente.
P/1 – Aos 21 anos?
R/1 – É, então eu tive, graças a Deus, a oportunidade de ser o gerente mais novo. Na época, eu era o bebê dos gerentes.
P/1 – E como foi esse desafio?
R/1 – Foi muito legal porque eu tinha... Eu sempre comecei a trabalhar muito cedo e trabalhei sempre no comércio, vim da área de atacado, trabalhei na Rua 25 de Março, casei muito novo, com menos de dezenove anos. Eu ainda não tinha completado dezenove anos e já estava casado e com filho, portanto, eu tenho um filho hoje, meu filho mais velho tem vinte anos, menos do que isso, a diferença com relação a mim. E sempre trabalhei no comércio, quer dizer, como vendedor. Depois fui trabalhar como empresário, ter uma loja na 25 de março em sociedade com um cunhado. Em 1973, com a crise do petróleo, a gente acabou perdendo o negócio, porque a gente trabalhava praticamente só com derivados do petróleo, era perfumaria, brinquedos, plástico e a gente acabou destituindo a empresa. E aí fui trabalhar em uma papelaria, também de vendedor, depois eu vim para o Pão de Açúcar e nunca mais saí daqui. Criei meus filhos aqui, praticamente, a minha família toda aqui dentro do Pão.
P/1 – Então, eu queria retornar, como é essa experiência de com 21 anos ser um gerente de loja?
R/1 – Faz tanto tempo, mas eu tive, graças a Deus, muita ajuda. As pessoas com quem eu trabalhei foi que me ajudaram, me ensinaram. Primeiro, eu fiz um estágio longo, que eu acho muito importante viver muito fortemente o momento em que a empresa investe em você, te dar essa condição de você aprender. Portanto, naquela época, o trainee saia de fato preparado, ele não podia saber mais sobre uma área do que o encarregado específico daquela área. Mas ele, como noção geral de loja, ele tinha total noção. Quer dizer, a gente tinha até um lema que dizia: “Todo mundo pode saber o tanto quanto você, mas nenhum pode saber mais do que você, gerente.” Então você precisa conhecer do negócio e entender. Aí foi com muita dedicação, com muito sacrifício. Nessa época, muito novo, eu morava em São Bernardo e trabalhava na Lapa, não tinha trem, os ônibus circulavam depois de um determinado horário. Então, sempre foi uma correria pra chegar na loja antes das sete e meia da manhã, pra poder fazer toda a supervisão da loja e avaliar a loja antes que ela fosse aberta. Mas, sempre foi um desafio. A minha vida dentro do Pão sempre foi um desafio. Primeiro a começar por aí, por ser muito novo, acho que já foi um desafio. Quer dizer, tudo que eu conquistei na minha vida foi através de muito esforço e sempre enfrentando muitos desafios.
P/1 – Seu Andraues, a história do Pão de Açúcar é uma história de inovações sucessivas?
R/1 – Sem dúvida.
P/1 – A gente queria tentar fazer com o senhor um pequeno mapa de inovações que o senhor vivenciou ou liderou, então.
R/1 – É, na verdade, a gente...
P/1 – Sem se preocupar com data.
R/1 – Eu queria falar um pouquinho do setor de inventário, por exemplo, que tinha um período, logo que eu entrei, em que o inventário era feito numa listagem em que você escrevia o nome do produto, anotava a quantidade dele e mandava aqui para o escritório central. Posteriormente, a gente começou a fazer com a Facit, que lançou a Facit elétrica e a gente colocava em cima do carrinho de compras, numa tábua.
P/1 – Em cima do carrinho? (risos)
R/1 – E você ia pelas gôndolas contando o produto e lançando na ordem. Você anotava e já ia calculando praticamente o inventário. Depois veio a fase do cartão Porte Panche, que era um cartão que você perfurava, informando a quantidade de produtos que você contava. E aí foi adiante, quer dizer. Depois veio a fase do scanner, do computador, que a relação já saía pré-impressa. Hoje você faz o inventário escaneando o produto. Então, eu acho que é muito legal, eu vivi todas essas fases, tive oportunidade de participar de todas elas.
P/1 – Quer dizer, eu acho interessante... Então era uma Facit que você colocava no carrinho?
R/1 – Em cima de um carrinho de compra, você ia digitando os valores e multiplicando. Você contava o produto e multiplicava pelo valor da venda dele. Os produtos eram etiquetados, a etiqueta de preços vinha no próprio produto, então você contava lá doze catchups e lançava, doze vezes tanto. Então, quando você terminava a listagem, você praticamente fazia o seu inventário a preço de venda. E essa foi a evolução da gente chegar ao ponto hoje de fazer um inventário praticamente virtual, a gente ter controle no computador sobre os nossos estoques. Tipo, você vai lá, conta e checa pra ver se as quantidades são idênticas ou se tem algum tipo de diferença.
P/1 – Seu Andraues, você poderia falar um pouco da experiência dos mini-box?
R/1 – Posso, acho que vale a pena falar um pouquinho. Só que eu, com 21 anos, fui gerente. Eu fui gerente por alguns anos e como eu te disse, o primeiro grande desafio foi, com 21 anos, ser um gerente e depois foi assumir uma compra, fazer o que a gente chama de “apadrinhamento” de uma loja do Super-Bom, uma rede que a gente comprou. E eu, por acaso, fui ser o padrinho de uma loja, que era a maior loja fisicamente da marca Super-Bom. Tinha um posto de gasolina agregado a essa loja, não havia ninguém com expertise de posto de gasolina e veio o negócio pra a gente. Aí eu fiquei gerenciando a loja e gerenciando o posto por um bom tempo. Quer dizer, fui lá aprender como se operava um posto de gasolina pra poder entender o funcionamento desse novo negócio. E acho que isso também foi muito positivo pra mim.
P/1 – Onde ficava essa loja?
R/1 – No Ipiranga, na saída da Anchieta. Hoje onde tem todo aquele anel viário, essa loja ficava localizada bem na saída da Anchieta. Na época, só tinha a Anchieta, passava pela loja. E, por acaso, era uma loja que dava resultado muito negativo e, graças a Deus, eu entreguei ela e lá eu fiz o meu nome. Pra mim também foi uma surpresa. Em determinado momento fui fazer uma cobertura de supervisão, a liderança minha é um supervisor, que cuidava de uma região e decidiu que eu deveria ficar no lugar dele. Foi surpresa porque já havia outros colegas que já faziam esse papel há muito tempo e eu era relativamente novo ainda pra estar fazendo o papel de supervisão. Assumi dez, doze lojas. Me deram essa oportunidade, eu trabalhei durante trinta dias, aconteceram alguns fatos que não vale a pena comentar aqui, mas que demonstraram a minha capacidade de tomar decisões e tudo mais. Quando eu retornei pra loja, passado algum tempo, um dos supervisores da equipe foi promovido pra ir para Belém do Pará e aí tinham que decidir quem iam promover. Tinha uma fila enorme de pessoas aguardando e, pra minha surpresa, um dia me chamaram no escritório e disseram: “Não, vai ser você.” Aí eu me tornei o supervisor mais novo do grupo Pão de Açúcar, porque as pessoas que tinham que exercer essa função eram pessoas já com bastante experiência, com muitos anos de carreira, e eu assumi esse posto de supervisão. Posteriormente, eu fiquei um período grande, aí veio a divisionalização, que a gente criou as divisões A, B e Atacado. Aí eu vim a conhecer uma pessoa que é muito importante na minha vida, que é o
Zé Roberto Ambasco. Ele estava assumindo uma posição estratégica no negócio, de diretor comercial e de marketing. E eu, como supervisor, era uma pessoa que tinha muita relação comercial, era um dos supervisores que mais iam lá ao comercial amolar e ficar brigando para ter produto, para ter preço. E o Zé sabia disso, Ambasco sabia disso e ele propôs ao Simão, que era o líder geral, que me queria na equipe dele como diretor comercial. Como gerente geral de comercialização de perecíveis, daí eu fui cuidar de toda área de perecíveis dessa divisão A, que eram todos os supermercados e mais o mini-box, que recebia frango e alguns produtos só de hortifruti, mas a razão do negócio era supermercado. Eu fui ser o gerente geral responsável por todos os perecíveis, então era carne, padaria, peixaria, frios, então tinha que comprar, armazenar e marcar preço pras lojas. Fiz esse trabalho ao longo de uns quase três anos e tivemos o problema do mini-box. O mini-box era uma marca, foi na década de 1970 e 1980, um negócio muito importante para o grupo, o grupo conseguiu evoluir bastante com esse modelo de loja. Só que, com o passar dos anos, essas lojas foram perdendo o poder de atratividade com a chegada dos hipermercados mais próximos da população e com o crescimento tanto do supermercado quanto da especialização de padarias e tudo mais. O mini-box começou a perder a razão de ser. Ele sempre foi construído, o mini-box foi constituído para estar na ponta da periferia, a onde a população mais precisava desse tipo de recurso porque não havia supermercado, as coisas eram muito caras. E eles chegaram tomando conta do mercado, com preço de fato muito barato. Só que com o tempo a periferia foi crescendo da cidade, a população foi crescendo, a periferia foi crescendo e o mini-box não acompanhou essa evolução. Quer dizer, primeiro ele não manteve a razão de estar sempre na ponta da periferia, portanto, era alguma coisa meio que desmontável em que você, tendo a previsão do negócio, crescia na periferia. A gente deveria desmontar a loja e ir lá pra ponta da periferia e montar a loja lá, quer dizer, então você ia mudando. Só que isso não aconteceu, primeiro, porque a onde a gente estava acabava tendo um fundo de comércio forte e você não ia sair dali simplesmente porque algum concorrente ia lá se instalar.
P/1 – Então ele pode ser considerado uma inovação?
R/1 – Sem dúvida, o hard, desconto que tanto se faz nesse país, na verdade foi trazido pelo grupo pra cá por Brasil através do instituto Naldi, da Alemanha. Foi feito um trabalho de reconhecimento desse negócio lá fora, a gente implantou isso aqui e foi uma inovação dentro do grupo. Aliás, eu ajudei a montar a primeira loja, que foi a Loja 501, do Rudge Ramos, de São Bernardo do Campo.
P/1 – Ah...
R/1 – Eu me lembro muito bem que eu e minha equipe, que eu já era gerente dessa loja da Anchieta, ficamos responsáveis por montar todo o paredão de commodities. Commodities são açúcar, arroz, óleo. Tinha um paredão, então a gente ficou responsável por montar tudo aquilo. Participamos
ativamente da construção e da primeira loja do mini-box. Depois, veio aí a situação de eu ser diretor de perecíveis, e o mini-box, nessa situação, precisava de alguém que tivesse experiência, uma larga experiência operacional, mas também deveria ter comercial, já que o mini-box era tratado como uma unidade de negócio à parte, com vida própria. Então ela tinha estrutura de depósito, tinha a área comercial e a área operacional, totalmente independente da companhia. E precisava ter alguém lá, que a maior... O que você tinha que fazer de mais dentro do mini-box era trazer para dentro do modelo de perecíveis, porque a gente trabalhava praticamente sem nada de perecíveis, não havia serviço. Então, qualquer padaria que abrisse do lado, que servisse os frios fatiados e tal, te matava porque o cara ia pra lá e não vinha comprar o pãozinho aqui, não vinha comprar nada pra cá. Então precisava fazer uma revolução na área de perecíveis, primeiro dar uma enxugada, eliminar aquilo que não tinha mais razão de ser. Então, eu fui uma das pessoas que mais fechou loja nessa companhia e com certeza fui o que mais abriu loja também. E aí eu vim pro mini-box pra ser o diretor geral, cuidando então das áreas comercial, de logística e operações. Além disso, agregado ao negócio do mini-box, nós tínhamos o famoso multi-serviço, os serviços financeiros. Mas, na verdade, naquela época nem eram serviços financeiros, eram multi-serviços que envolviam toda a parte de venda de cesta básica. O atacado, que havia dentro do negócio, todos os nossos multi-cheques e multi-caches, toda essa área, por muitos anos, ficou subordinada a mim aqui dentro da companhia. Após o mini-box, então, foi um trabalho de revitalizar, a gente mudou totalmente a estrutura, centralizou. Nós centralizamos, então, depósitos, mantivemos só separada a área comercial e começamos a remodelar com o mini-box plus. Posteriormente, a gente viu que nosso negócio não era manter, a inflação era altíssima, você só trabalhava com produtos básicos, então encostavam qualquer supermercado do seu lado que tinha um mix de produtos mais completo, e ele te arrasava, porque ele pegava aqueles seiscentos produtos com que eu trabalhava, botava abaixo do custo, ganhava dinheiro com os outros dez mil produtos que ele tinha dentro da loja e eu ficava só com o prejuízo, porque os seiscentos produtos eram o meu negócio. Então, a gente tomou a decisão, o que também pra mim foi uma inovação, de transformar. Fazer primeiro uma avaliação de mercado e transformar os mini-box em Pão de Açúcar. Fechar aquilo que não tinha fundo comercial nenhum, quer dizer, não havia perspectiva de dar continuidade como negócio de supermercado. Foi aí, então, que eu fechei muitos mini-box e mantive aqueles que tinham possibilidade de ser transformados num Pão de Açúcar menor, o que a gente chamou de Pão de Açúcar compacto. E aí eu tive a oportunidade de viajar pelo mundo afora para conhecer alguns modelos e voltar com uma proposta de um supermercado Pão de Açúcar, só que num modelo menor, e o que resultou-se numa divisão Pão de Açúcar Compacto. Então, a gente juntou perto de quarenta lojas como um negócio e eu era o diretor desse negócio. Até que, terminada toda essa reestruturação de loja, essa remodelação, a empresa passou por várias etapas de alteração de estrutura e numa delas a gente tomou a decisão de que os Pão de Açúcar Compacto, a divisão “compacto”, deveria ser integrada à marca Pão de Açúcar. Então, geograficamente, a gente definiu novas regiões e essas lojas foram incluídas dentro da divisão supermercados. Eu recebi nessa época um convite pra ir trabalhar o comercial de novo, porque naquele momento havia uma necessidade grande de alguém que tivesse experiência em commodities, e eu, como vendedor de mini-box, tinha muita experiência, era o negócio do mini-box e me trouxeram pra ser diretor comercial na mercearia, subordinado a uma nova fase, ao Jorge Washington, como parceiro o Tambasco também, que era diretor de uma das áreas, e eu era responsável pelas compras de todos os commodities, arroz, feijão, óleo, farinha, toda linha de bebida quente, todos os sucos, xaropes, praticamente perto de 30%, 33 % do volume do negócio de mercearia.
P/1 – Certo.
R/1 – E foi uma fase boa, aprendi bastante também, tive a oportunidade de aprender muito nesse período, porque é um mercado diferente de você trabalhar como operador e depois você ser comprador de commodities num mercado tão instável, tão complicado como é esse mercado de commodities, óleo de soja, arroz, feijão, é terrível.
P/1 – Ah, sem dúvida. Seu Andraues, o senhor tem uma trajetória realmente riquíssima e depois nós vamos fazer uma entrevista muito maior, porque hoje a gente...
R/1 – Não sei se eu estou me alongando muito.
P/1 – Não, eu que estou aqui empolgado, queria saber muito mais coisas, mas eu queria que nessa nossa primeira entrevista de projeto de memórias, espero que a gente consiga depois fazer uma longa biográfica, era duas coisas, uma é a inovação do delivery...
R/1 – Está bom, o delivery foi uma fase, depois de trabalhar na área comercial, onde houve uma nova reestruturação na companhia e eu voltei a operar de novo, voltar a ser operador. E aí, dentro da estrutura geográfica da minha região, tinha uma loja que suportava delivery, suportava a operação do delivery, que é a loja da Cerro Corá. E o delivery nesse período, logo no início, foi um instrumento de marketing e de inovação mesmo, para que a companhia tentasse mostrar que era capaz de inovar e criar o pioneirismo no comércio eletrônico de alimento. E eu me lembro muito bem que estava tocado pelo marketing e vinha de uma situação muito ruim, porque não era coisa do marketing operar com esse tipo de coisa. Eles podiam ter a tecnologia toda controlada, mas a parte operacional é muito complicada. Então, tomou-se a decisão de que o delivery passaria a ser responsabilidade minha,
e eu aí... aí foi também uma grande inovação pra mim, começar a viver a questão da tecnologia da informação. Quer dizer, ver o pedido pelo computador, depois a compra virtual através do CD, caneta ótica, scanner... Aí, a gente começou a trabalhar com planograma, então planogramamos. Teve uma etapa enorme de transformações de atividades do delivery, para tornar o delivery algo auto-sustentável. Neste período que ele ficou na minha mão, por um bom tempo ele foi auto-sustentável, a gente tirou o delivery de uma situação que sangrava. Quer dizer, era uma coisa que passava uma imagem muito boa para o mercado, mas que internamente trazia resultados muito ruins pra companhia. A gente continuou inovando, só que fazendo alguns ajustes operacionais com que a gente conseguiu reverter a situação do Delivery. Pra pra mim isso foi muito legal, porque junto com o delivery, por exemplo, pra você ter uma ideia, eu cuidei dos sites da companhia também. Então, todos os sites das companhias, das bandeiras, eram responsabilidade minha, então davam na minha estrutura. Então, você vê que eu passei, foi na verdade um polivalente.
P/1 – Sem dúvida.
R/1 – Passei por diversos setores da companhia. E, nesse momento, a região fora de São Paulo, que eram Pão de Açúcar fora de São Paulo, já tinha uma quantidade significativa de lojas no Ceará, em Brasília, no Rio, em Santa Catarina, e estavam subordinadas aos diretores de divisão. Então, tinha uma parte que estava subordinada ao diretor, Seu Otom, que era o diretor do superbox, uma outra ao Jorge Washington, que era o nosso diretor de supermercado, e uma outra ao Marcos Caldeira, que era diretor na época do Extra. Surgiu um impasse em Brasília de uma situação muito difícil lá com resultado, e estava chegando próximo de um final do ano e nós tínhamos o superintendente, o Luiz Antônio Viana, que tomou a decisão de assumir o controle de todas essas lojas. Só que ele, como superintendente, pouco tinha de tempo pra poder se dedicar a isso, e me escolheu pra ser o braço direito dele pra fazer esse negócio. Nós começamos por Brasília, que vinha sangrando muito, eram seis lojas só. Eu comecei esse trabalho por Brasília, a gente recuperou Brasília. Depois, com essa recuperação, a empresa reconheceu esse trabalho e aí me transformou em diretor de uma unidade de negócio, que eram regionais, que eram todos os Pão de Açúcar fora de São Paulo, então eu passei a tomar conta do Ceará, Piauí, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Brasília. Aí foi uma fase gostosa, porque em quatro anos eu tive oportunidade de adquirir várias empresas. Então, eu tive a oportunidade de liderar a compra de empresas no Ceará, numa rede São Luiz, eu tive a oportunidade de comprar Boa Esperança, em João Pessoa, na Paraíba, tive oportunidade de transformar o superbox de Recife em Pão de Açúcar, comprei uma rede também no sul do país, em Curitiba, o Parati. Foi liderada a compra, quer dizer, a negociação e a integração. No papel de diretor regional, então, era uma responsabilidade minha integrar. E uma grande, também, foi o Paes Mendonça,. Toda a operação do Paes Mendonça, no início, quem fez fui eu. Depois, cada modelo de loja foi pra um lado. Quer dizer, o que era hipermercado foi ser cuidado pelo Extra, o que era super ficou comigo. Então, eu vivi também esse momento de quatro anos, em que a gente mais do que quadruplicou o número de lojas e conseguimos dar uma importância, uma visibilidade para o negócio fora de São Paulo muito maior do que a gente tinha. Até aquele momento, a gente se sentia uma empresa regional, uma empresa paulista, e eu acho que a gente deu partida dessa forma aí, durante esses quatro anos, foi um trabalho muito bom em que eu fiquei ligado ao diretor superintendente. Pra você ter uma ideia, eu continuei sendo responsável pelo delivery e eu respondia para o João Paulo Diniz e pra Ana Maria. Eu continuei cuidando de algumas lojas em São Paulo. Era muito importante eu permanecer com o pé em São Paulo, porque tudo que se fazia em termos tecnológicos e de evolução de negócio começava em São Paulo. A gente achou muito importante que eu não perdesse essa visão, aí eu tive a oportunidade de ficar responsável por três lojas em São Paulo: Panamericana, Cerro Corá e Teodoro Sampaio, em que eu era subordinado ao Tambasco, e nas regionais eu era subordinado ao Luiz Antônio Viana. Então, eu tinha mais chefe do que qualquer outra coisa. Então essa aí é minha história. Depois fiz esse trabalho ao longo de quatro anos e, há exatamente a três anos atrás, a empresa precisava fazer uma reconstrução do Barateiro, que a gente chamou de reconstrução. Esse nome foi dado pela própria Ana Maria e me convocaram pra voltar pra São Paulo e comandar esse trabalho. Eu estou indo até hoje aqui, ainda de pé, não morri nem me tiraram da minha posição até agora. Quer dizer, acho que a gente também... Isso foi marcante na minha vida e eu sempre fui Pão de Açúcar, mesmo trabalhando com mini-box, sempre ligado ao supermercado, mas nunca tirando o pé do Pão, sempre dentro do Pão de Açúcar. E o Barateiro foi a primeira vez em que eu botei a cara pra fora. Agora é coisa nova, mexer com periferia, com supermercado, com os borrachudos. Então, aprendi muito com a experiência de vender pra classe C e D. Acho que tenho muito o que aprender ainda, minha equipe também, mas eu peguei o próprio Barateiro com cem lojas e hoje nós somos 167 lojas, vão inaugurar mais quatro até o final do ano.
P/1 – Ah é?
R/1 – É, quatro nova. A gente vai terminar mais ou menos com 170 lojas Compre Bem Barateiro.
P/1 – O, Seu Andraues, a gente percebe que o senhor pode participar aí de marcos da história do Pão de Açúcar mesmo.
R/1 – Sem dúvida.
P/1 – Espero ter outra oportunidade pra gente poder conversar disso mais detalhadamente. Queria terminar pedindo para o senhor falar pra gente como se sente de estar participando do Projeto Memória, contando um pouco da sua história do Pão de Açúcar.
R/1 – Ah, eu acho que é a mesma coisa que a empresa fez nessa reestruturação, nessa profissionalização. Agora que ela fala em perpetuar a companhia. Eu acho que eu estou tendo a oportunidade de perpetuar aqui também, dentro da empresa, porque eu tenho certeza que isso vai ficar registrado e, sei lá daqui a quantos anos, talvez o meu neto esteja aqui no Pão, trabalhando aqui. E que honra ele não vai ter de, em um momento qualquer que for resgatado esse momento aqui, poder dizer: “Olha lá, meu avô!” E saber um pouco da minha história contada por mim mesmo. Então, também dentro do projeto de memória, acho que tem uma parte emocional minha que é a Norma. A Norma foi uma pessoa muito importante pra mim. Ela primeiro me reconheceu como profissional, mesmo pela pouca idade que eu tinha, me respeitou em todos os momentos que foi preciso e me orientou na minha falta de maturidade. Durante esse um ano que eu convivi com ela, eu aprendi muito não só sobre o negócio, mas sobre a vida. É uma mulher muito especial pra mim e ela hoje é que cuida dessa área. E eu queria fazer uma homenagem à Norma: Norma, que você seja muito feliz, que Deus te dê tudo o que você deseja, que você continue sendo essa pessoa maravilhosa. Eu tenho inveja só de uma coisinha de você: você não envelhece, parabéns.
P/1 – Está certo, muito obrigado pela entrevista.
R/1 – Imagina, obrigado eu por ter essa oportunidade.Recolher