Correios 350 anos aproximando pessoas
Depoimento de Antonio Max dos Santos
Entrevistado por Karen Worcman
Monte Dourado, 29/07/2013
Realização Museu da Pessoa
HVC067_Antonio Max dos Santos
Transcrito por Karina Medici Barrella
MW Transcrições
História de vida
P/1 – Max, eu queria começar perguntando de novo pra você o seu nome, local e data do nascimento.
R – Antonio Max dos Santos, nasci em Cachoeira do Arari, Pará, na Ilha do Marajó, no dia 24 de dezembro de 1966.
P/1 – E o nome do seu pai e da sua mãe?
R – Eu fui registrado sem o nome do pai e a minha mãe se chama Antônia dos Santos.
P/1 – E por que você foi registrado sem o nome do seu pai?
R – Porque na ocasião a minha mãe era mãe solteira, aí não registrou o nome do pai.
P/1 – Quantos anos tinha sua mãe?
R – 17 anos.
P/1 – Muito nova.
R – Muito.
P/1 – Você sabe qual foi a história pra ela ficar grávida de você? A história da família dela, e dela um pouquinho pra me contar?
R – Eu sei sim a história.
Ela ficou grávida, mas o cidadão já era casado e não pôde me assumir.
Já tinha outros filhos no mesmo lugar.
P/1 – Não era um namoro.
R – Não era um relacionamento estável.
P/1 – E aí, o que aconteceu com ela, você sabe?
R – Ela continuou a vida, no caso ela me criou assim, mas.
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P/1 – Ela morava com quem?
R – Ela morava com a minha avó, só elas duas.
P/1 – Só as duas?
R – É, o pai dela já tinha falecido, meu avô.
P/1 – E você chegou a conhecer seu pai?
R – Cheguei sim.
Ele nunca me discriminou, sempre me deu pequenos presentes, mas eu nunca me aproximei dele.
P/1 – Ele vinha te visitar?
R – Vinha, porque a gente morava no mesmo lugar lá na Ilha do Marajó.
No caso assim, eu me aproximei dos meus irmãos por parte de pai depois de grande já, com dez, 11 anos.
P/1 – Porque quando você era criança você não convivia?
R – Não, não convivi com eles.
Apesar da gente morar no mesmo lugar, mas não convivi com eles.
P/1 – Mas você sabia quem era ele?
R – Sabia sim, e eles também me sabiam.
P/1 – Você ficava com raiva?
R – Não, de maneira nenhuma, nunca tive raiva, não.
P/1 – E a sua mãe? Depois ela teve outros filhos?
R – Teve, tenho mais duas irmãs por parte de mãe.
P/1 – Ela chegou a casar?
R – Ela não chegou a casar, mas ela chegou a arranjar outro homem e conviver estável com ele.
P/1 – E ele foi quem te criou ou não?
R – Ele não chegou a me criar porque quando ela chegou a ficar com esse outro rapaz eu já vim morar em Belém com um tio, irmão dela.
P/1 – Com quantos anos você veio?
R – Eu vim com 15 anos pra Belém.
P/1 – Ah, então me conta um pouco como era sua infância, sua vida até os 15 anos lá?
R – Minha vida, eu fui criado parte do tempo com a minha avó porque devido as dificuldade lá na Ilha do Marajó minha mãe teve que sair de lá pra vir trabalhar em Belém, pra poder prover a gente das coisas.
Ficou morando só eu e a minha avó lá na ilha.
P/1 – Você foi criado pela sua avó então?
R – Boa parte do tempo foi.
P/1 – E como é que foi, como era sua casa?
R – Minha casa era simples, de chão de terra, cercada de madeira mesmo, muito simples, coberta de palha.
Casa típica da ilha do Marajó.
P/1 – É numa cidade ou é no meio do campo?
R – Era no meio do campo.
Cachoeira do Arari é o município, só que lá o Retiro Grande onde a gente morava mesmo, ele é um distrito do município de Cachoeira do Arari.
Um lugar muito legal, tem rio, os animais são criados soltos, búfalo, cavalo.
P/1 – E é um lugar bonito?
R – Muito.
Infelizmente eu não tenho foto de lá, mas é muito bonito.
P/1 – E como é que foi essa sua infância? O que você fazia todo dia?
R – Fazia? Ah, além de estudar a gente brincava, jogava bola, tomava banho de rio, pescava.
P/1 – E a sua avó, ela era muito brava?
R – Não, não, era só eu e ela.
Eu tenho outras duas irmãs, mas quando minha irmã mais velha nasceu eu já tinha 13 anos.
P/1 – Então você foi criado mesmo por ela.
R – É.
P/1 – Então me conta um pouquinho como era esse dia a dia.
Você acordava, como é que era? Desde sua primeira lembrança.
R – Eu lembro que acordava, a primeira coisa era a escola, geralmente.
P/1 – A escola ficava onde?
R – Eu estudei os primeiros anos do ensino fundamental numa escola que ficava distante assim, uns cinco quilômetros de casa, na beira do rio.
Então a gente tinha de ir pra lá.
P/1 – Como você ia?
R – No inverno era a pé.
P/1 – Você ia a pé?
R – No inverno, muita gente ia, entendeu?
P/1 – Iam todos juntos?
R – Todos juntos.
No inverno a gente ia com shorts, descalço, levava toda roupa, os cadernos, tudo num saco.
P/1 – Por quê?
R – Por causa da chuva, da lama, tinha muita lama lá.
Aí ao chegar lá na escola que a gente ia tomar um banho no rio mesmo, trocava a roupa pra poder começar a estudar.
P/1 – Ah, é? Você tinha que tomar banho?
R – Tomar banho, no rio mesmo.
P/1 – Que horas era isso, que horas você acordava?
R – A gente ia bem cedinho, a gente acordava às seis horas, que a gente entrava geralmente às oito horas, às seis e meia já estava a caminho, chegava lá sete, sete e quinze.
Pois é, aí às sete, sete e quinze, a gente estava chegando lá na escola.
Então tomava banho, a escola era na casa da própria professora.
P/1 – Vocês tomavam banho no rio ou na casa da professora?
R – No rio mesmo, que a casa era bem na beira do rio, como daqui a esse supermercado aí, muito pertinho mesmo.
P/1 – Você tomava café em casa antes de sair?
R – A gente tomava café em casa.
P/1 – O que você tomava de café da tarde?
R – Geralmente só café preto com bolacha, bolacha água e sal.
P/1 – Bolacha água e sal.
Aí você chegava na escola de oito e estudava até.
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R – Até onze, onze e meia, merendava lá.
P/1 – Merendava na escola? O que tinha de merenda?
R – Maioria era leite, coalhada, às vezes mingau de trigo, de fubá.
Mas sempre coisas assim, da região.
P/1 – Quem que fazia a merenda?
R – A própria empregada da professora.
P/1 – A empregada da professora?
R – É.
P/1 – Então vocês merendavam na casa da professora?
R – A escola era na casa da professora.
P/1 – Ah, a escola era na casa da professora.
R – Era tipo uma fazenda, só que a casa era muito grande, aí tinha as salas lá, a gente estudava lá mesmo.
Isso nos primeiros anos até a terceira série.
P/1 – Estudava todo mundo junto?
R – Estudava bastante aluno, faixa de 20, 25.
P/1 – Mas a escola era do Estado ou era da professora?
R – A escola tinha uma espécie de convênio, que nesse tempo a professora dava aula, só que ela optou em dar aula na própria casa dela.
Era melhor do que ela ir todo dia pra lá, pro grupo, que era longe.
P/1 – Então vocês não iam pro grupo?
R – Não, nessa época não.
P/1 – E aí vocês lanchavam isso e estudavam misturado, quem sabia ler, quem não sabia ler?
R – Estudava misturado.
Até essa época de segunda, terceira série era misturado, todo mundo junto.
P/1 – E quando foi que você aprendeu a ler e escrever, com que idade?
R – Olha, acredito que foi numa faixa de uns seis, sete anos.
P/1 – Você lembra como era?
R – Lembro.
P/1 – Conta pra mim.
R – Ah, eu não sei assim contar, mas sei que essa professora que eu lembro que foi a primeira, era Regina o nome dela, apesar dela cuidar de vários alunos, ela era muito dedicada.
Tinha aquelas cartilhas de ABC, tabuada, palmatória inclusive.
P/1 – Ah, é?
R – Isso.
P/1 – Você tomou palmatória alguma vez?
R – Cheguei a tomar também.
P/1 – É mesmo? O que fazia alguém tomar a palmatória?
R – O que fazia era, por exemplo, a tabuada.
Chegava a sabatina, aí ela ia perguntando pra gente, tal.
Por exemplo, estava um grupo aqui, oito pessoas, aí pergunta uma coisa pro primeiro, ele não sabe, pergunta pro segundo, ele acerta, ele tem o direito de bater no que não soube.
P/1 – Ah, é? Quem acertava podia bater em quem não sabia?
R – É.
P/1 – E dói a palmatória?
R – Não, porque a gente tinha medo também do outro caboclo depois pegar a gente, ir à forra.
(risos).
P/1 – Se alguém batesse forte vocês pegavam na saída?
R – Não.
Se alguém batesse forte, a hora que ele errasse também estava lascado.
P/1 – Entendi.
O que mais, além da tabuada, que vocês tinham que decorar?
R – Basicamente o que a gente decorava era a tabuada.
E verbo também.
Além da tabuada, que era Matemática, tinha o verbo, a conjugação de verbo seguia o mesmo princípio, quem errasse ia.
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P/1 – E como você fazia pra decorar?
R – Era só estudando mesmo, não tinha método.
Estudava.
P/1 – E você estudava em casa?
R – Estudava em casa e estudava na escola.
P/1 – Então vamos lá.
Aí você saía às 11 horas e caminhava de volta pra casa?
R – Caminhava de volta pra casa.
P/1 – Todo mundo?
R – Todo mundo.
P/1 – Então que horas você chegava em casa?
R – Se a gente saía às 11 horas, onze e meia, mais ou menos, numa faixa de uns 30, 40 minutos.
P/1 – Andando?
R – Andando.
P/1 – Aí você chegava em casa e tinha almoço?
R – Tinha.
P/1 – O que era o almoço?
R – Ah, a base da alimentação lá no Marajó ainda hoje é peixe e farinha.
Mas geralmente tinha em casa feijão porque a minha avó também já era aposentada na época.
E a minha mãe trabalhava em Belém, provia a gente.
Geralmente em casa tinha feijão, arroz.
P/1 – Feijão, arroz, peixe e farinha.
R – Peixe, farinha.
Carne também, mas carne com menos frequência.
Frango.
Frango porque a gente criava em casa e de vez em quando matava um.
P/1 – Agora o peixe, quem pescava?
R – Pescava a minha avó e depois de maiorzinho pescava eu, quando não a gente comprava.
P/1 – Que peixe vocês comiam? Qual é o peixe que dá lá?
R – Dá peixe de pele, traíra, aracu, piranha, essas coisas assim.
P/1 – Como vocês faziam para pescar, como é que é que se pega o peixe, é no rio de frente?
R – No rio mesmo.
P/1 – Então me conta, era de anzol?
R – Era de vara de pescar, aquelas varas artesanais mesmo que a gente fazia.
Pegava a varinha, cortava no mato e fazia.
P/1 – E o fio, onde vocês arrumavam?
R – Fio lá tinha mesmo.
É um lugarejo pequeno, mas, por ser próximo de Belém é sempre abastecido das coisas.
P/1 – E o que usava de isca?
R – De isca? Camarão.
P/1 – Onde vocês pegavam camarão?
R – Tem lagos lá, a gente ia de manhã cedo pegar o camarão pra poder pescar.
P/1 – Então como vocês estavam na escola era a sua avó que fazia isso, era o peixe do dia?
R – Mas não pescava todo dia não, pescava mais de final de semana.
Por exemplo, dia de sábado a gente já ia cedinho pegar o camarão e ia pescar.
P/1 – E aí comia aquele peixe a semana toda?
R – Não, não, pescava só pro dia.
Lá se a gente quiser pescar todos os dias a gente pesca, a gente pega pro almoço, pro jantar.
P/1 – Tem muito peixe.
R – Tem muito peixe.
P/1 – E a farinha?
R – Farinha a gente comprava porque a gente não tinha roça.
P/1 – Não tinham roça.
R – Não.
Comprava só de quem tinha a roça.
P/1 – Sua avó era aposentada de quê?
R – Pelo INSS.
P/1 – Ela tinha trabalhado fora ou não, era de idade?
R – Eu não lembro porque quando eu nasci ela tinha uma boa idade, mas acho que conseguiu por idade.
Já faz mais de 30 anos isso, 30 e poucos anos.
P/1 – Mas isso aí você estava até a terceira série.
R – Até a terceira série.
P/1 – E depois, o que foi?
R – Depois eu fui estudar lá no grupo mesmo da localidade que a gente morava, que era mais próximo, pertinho de casa.
Lá eu fiz até a quinta série, na época que eu fiquei lá, lá só tinha até a quinta série.
Aí eu estudei mais ou menos uns três anos lá, ainda fiz duas vezes a quinta série, depois parei.
P/1 – Por que você fez duas vezes a quinta série?
R – Porque não tinha outra opção, eu não tinha como ir pra outro lugar, aí repeti pra não ficar sem fazer nada.
P/1 – E quem que achava que você tinha que ficar na escola?
R – A minha avó, porque era melhor do que ficar o dia todo na rua, ou brincando.
Uma forma de ocupar o tempo.
P/1 – Então ela achava melhor você ir.
R – É.
P/1 – E você não achou muito chato fazer duas vezes a mesma série?
R – Não, eu gostava, porque também a gente tinha colegas, amigos, brincava.
P/1 – O que era de melhor na escola, que você lembra? O que você mais gostava?
R – Olha, de melhor era estudar mesmo.
Gostava.
P/1 – Você gostava?
R – Gostava.
P/1 – De que matéria?
R – Principalmente de Português.
A gente estudava só Português, Matemática, Estudos Sociais, Ciências.
Só que tudo misturado, ainda não tinha Física, Química, essas coisas, só o básico mesmo.
Escola do interior.
P/1 – Mas tinha alguma coisa que você não gostava na escola?
R – Ah, tinha!
P/1 – O quê?
R – Porque no caso eu era muito franzino, magrinho e na horas da brigas geralmente eu apanhava (risos).
P/1 – Tinha muita briga entre os meninos?
R – Tinha.
Não é briga, é tipo luta, sempre tem isso no interior.
P/1 – Vocês lutavam o que, de soco?
R – Não, não.
Era só luta de derrubar, quando a pessoa derruba o outro já venceu, acabou.
P/1 – E aí tu apanhava?
R – Sempre perdia (risos).
P/1 – E qual era a outra coisa que vocês faziam, entre os meninos, além de lutar? Qual era a principal brincadeira?
R – A principal brincadeira era a bandeirinha, queimada, bola, futebol mesmo.
P/1 – Vocês jogavam muita bola?
R – Jogava.
Eu joguei muito.
P/1 – Você era bom de bola?
R – Não, nunca fui, na média só.
P/1 – Que posição você jogava?
R – Eu jogava no gol e na zaga.
P/1 – E você era ruim?
R – Não era muito bom, mas sempre me escolhiam antes do último.
P/1 – Você era o quê, penúltimo?
R – Não, não era tanto assim, não.
Era do meio da turma.
P/1 – Entendi.
Aí até a quinta série.
Acabou a quinta série, você fez duas vezes e aí?
R – Duas vezes.
Aí uma época de outubro o meu tio foi pra uma eleição lá, aí ele disse: “O Max está aqui perdendo tempo”.
Eu estava com 15 anos na época, 14 pra 15, ia fazer 15 em dezembro.
Aí ele perguntou se a minha mãe deixava eu vir com ele pra morar em Belém, lá no Coqueiro e ela aceitou.
P/1 – A sua mãe nessa época estava morando onde?
R – Estava lá já.
P/1 – Em Belém?
R – Não, ela já estava lá no.
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P/1 – Ela tinha voltado?
R – Tinha voltado já.
Nessa época ela já tinha um outro marido e tinha mais uma filha.
Eu já estava com 15 anos, quando minha irmã nasceu eu tinha 13 anos.
P/1 – E a sua irmã nasceu lá na Ilha de Marajó?
R – Nasceu lá.
E mora lá até hoje.
P/1 – Então a sua mãe voltou pra casa, pra terra dela, quando você tinha quantos anos?
R – Quando eu tinha uma faixa de 10, 11 anos.
P/1 – E o que mudou na sua vida com a volta da sua mãe?
R – Não mudou muita coisa, não.
Porque eu já estava acostumado a viver só com a minha avó.
Depois que minha mãe voltou ela arranjou um marido, aí já teve outra filha e com pouco tempo eu já fui embora também.
Foi uma convivência de um ano, dois anos.
P/1 – Mas você já se sentia mais próximo da sua avó ou a sua mãe era a sua mãe?
R – Não, a minha mãe sempre foi a minha mãe, eu sempre tive essa percepção porque ela trabalhava em Belém, mas praticamente todo mês ela ia lá com a gente levar compra, nunca ficou muito tempo afastada.
P/1 – Você chamava a sua avó de mãe ou de avó?
R – Não, de avó.
Mãe é mãe mesmo, até hoje.
P/1 – E o marido dela? Como é que foi a sua relação com ele?
R – Muito boa.
Sempre foi.
Eu, na verdade eu conheci ele antes.
Ela morava em Belém e ele morava lá.
Então eu já conhecia ele antes dela viver com ele.
A gente saía pra pescar juntos.
P/1 – Ah, vocês se davam bem.
R – É.
A gente se dava muito bem.
P/1 – E ela voltou pra casar com ele?
R – É, ela voltou, aí como ele já se dava com a minha avó, comigo, aí eles já começaram a namorar e ela casou com ele.
Casou, ficou junto.
Ficou junto até ele falecer.
P/1 – E aí me conta, você foi morar em Belém.
R – Fui morar em Belém.
P/1 – Você já tinha ido a Belém antes?
R – Já
P/1 – E onde você foi morar?
R – Fui morar lá no bairro do Coqueiro.
P/1 – Seu tio fazia o quê?
R – Ele era mestre de obra, construção civil.
P/1 – Como é que foi a sua vida em Belém?
R – Foi boa também.
A princípio eu fui pra estudar, só que ele me botou pra estudar à noite, durante o dia eu arranjei um emprego de vendedor de pipoca na rua, desse carrinhos assim que vendem aquela pipoca pronta.
Aí trabalhava durante o dia e à noite estudava.
P/1 – E de quem era o carrinho de pipoca?
R – Era de um amigo meu, da Cidade Nova.
Pessoa conhecida lá, fiz amizade por lá e consegui isso.
P/1 – Aí você estudava de noite.
R – Estudava de noite, o supletivo eu fiz.
P/1 – Você fez o quê?
R – Eu fiz, no caso eu saí lá do Retiro Grande com a quinta série, então eu fiz a quinta e a sexta lá nesse colégio, Joaquim Viana, em Coqueiro.
Fiz a quinta, a sexta, a sétima e a oitava.
P/1 – Junto?
R – Foi.
P/1 – Primeiro você fez duas, fez a quinta série, aí depois você fez.
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R – É, na verdade três vezes porque eu fiz duas vezes lá no Retiro Grande aí vim pra Belém.
Lá a gente fazia duas séries por ano, era quinta e sexta, quinta e sexta, sétima e oitava.
P/1 – E o ensino em Belém era muito diferente do que você estava acostumado? Você levou um susto?
R – Não, porque como eu falei anteriormente pra senhora, eu sempre estudei com professora lá no lugar onde a gente morava, apesar de pequeno, mas as professoras eram muito dedicadas.
Então quando eu fui pra lá eu tinha uma boa base que eu nunca fiquei reprovado, nunca fiquei de recuperação.
P/1 – Você achava melhor ou pior do que a escola que você teve em Belém?
R – Do que a escola que eu tive em Belém? Era uma escola grande, era uma escola de cidade.
Só que, no caso, aquele ensino de cidade.
Tinha mais matérias, mas nunca tive dificuldades.
P/1 – Aí você se formou.
Você fez o ensino médio lá em seguida, a escola técnica?
R – Não.
Em seguida eu passei pra fazer o ensino médio no colégio Deodoro de Mendonça, colégio público.
Fiz o primeiro ano lá, no segundo ano eu passei pra escola técnica e aí eu cancelei lá e fui fazer a escola técnica.
P/1 – E por que você foi pra escola técnica?
R – Porque na época o próprio professor lá do Deodoro de Mendonça aconselhava a gente a fazer as provas da escola, que era escola técnica, era uma garantia maior de emprego, era um curso técnico.
Aí por isso eu fiz a prova, passei e fui fazer.
P/1 – Depois do ensino o que você fez? Depois de se formar?
R – Eu concluí a escola técnica no meio de 91.
Aí eu fiquei procurando o estágio, só que não arranjei porque era difícil.
Fazia uma coisinha aqui, uma coisinha ali, trabalhava só com meu tio na área de construção.
P/1 – Você foi trabalhar na área de construção então?
R – Eu trabalhava.
Depois que eu comecei a estudar o ensino médio eu comecei a trabalhar com ele, área de construção, carpintaria, essas coisas.
P/1 – Você aprendeu a mexer.
R – Aprendi, aprendi.
P/1 – Você passava o dia trabalhando com ele?
R – Passava o dia trabalhando.
Geralmente dava uma folguinha porque ele sabia que eu estudava.
Mas ele sempre foi muito bom comigo.
P/1 – Você gostava de trabalhar na construção civil?
R – Gosto até hoje.
P/1 – O que você gosta de fazer na construção?
R – Eu sei fazer serviço de carpinteiro, só não sei fazer de pedreiro, mas de eletricista sei fazer, de carpintaria.
Trabalhava, eu gosto de fazer até hoje.
P/1 – Então aí você se formou e ficou trabalhando na construção civil?
R – É, fiquei um tempo trabalhando com ele, só que nessa época, praticamente no mesmo tempo que eu me formei, eu fiz a prova dos Correios.
P/1 – Como você ouviu falar que tinha prova pros Correios?
R – Porque lá em Belém concurso é muito divulgado, todo mundo sabe.
P/1 – E você queria entrar pros Correios?
R – Eu queria arranjar um emprego mais estável (risos).
P/1 – Então assim, você não sabia nada dos Correios?
R – Não sabia nada, nada, nada.
P/1 – Alguém te falou: “Vai lá e faz a prova dos Correios?”
R – Na época muita gente fazia, os meus parentes faziam, fizeram, aí eu me inscrevi e fiz também.
P/1 – E como foi essa prova, era difícil?
R – Não, não, fácil.
P/1 – É? Você estudou pra entrar?
R – Não.
P/1 – Não?
R – Não.
Porque na época eu tinha o ensino médio e a prova era nível de quinta série, em 1991.
P/1 – Era prova pra quê?
R – Pra carteiro, era o atendente comercial que na época chamava executante operacional e outro cargo lá.
P/1 – E ganhava bem já?
R – Ganhava uma faixa de três salários mínimos, mais os benefícios, tíquete, o vale alimentação, cesta.
P/1 – Então era bom.
R – Era razoável.
P/1 – Aí você entrou pros Correios, quando você soube que tinha conseguido?
R – Eu fiz o concurso no meio de 91, só que era muita gente.
Na época que eu fiz foram 14 mil só pra minha vaga, pra carteiro.
P/1 – Então você conseguiu uma vaga de 14 mil pessoas?
R – É, fui o nono eu.
P/1 – Parabéns, Max!
R – Como eu disse pra senhora a prova era fácil.
P/1 – Pô, mas 14 mil pessoas não acharam fácil.
R – É, eu fui o nono.
Aí eu fiquei esperando em Belém e no final de 91, dezembro já, os Correios mandaram um telegrama pra casa que era para eu ir fazer os exames lá, aí na Presidente Vargas.
Aí eu fui.
P/1 – Os exames da Presidente Vargas de Belém?
R – É, morava em Belém, morava no Coqueiro.
Aí fiz os exames lá em janeiro, sei que no dia 6 de fevereiro de 92 eu assinei a minha carteira, os Correios assinou lá, aí no dia 12 eu já estava aqui, seis dias depois.
P/1 – Você estava onde aqui?
R – Aqui
P/1 – Aqui onde?
R – Monte Dourado.
P/1 – Então quando você entrou o seu cargo já era pra vir pra Monte Dourado?
R – Já era pra vir porque na época as primeiras vagas eram pra aqui pro interior.
Aí cheguei lá, fiz os exames médicos, aí quando estava apto, já tinha assinado a carteira, perguntou: “Tem vaga lá em Monte Dourado, você topa ir pra lá?”.
Eu digo: “Eu topo”.
Mas rapaz, nunca tinha ouvido falar de Monte Dourado, Beiradão na época, que não era Laranjal, era Beiradão, nunca tinha ouvido falar, mas eu topei e vim.
P/1 – Quando você chegou aqui onde você foi morar?
R – Nós tínhamos uma república de outros funcionários dos Correios.
Chegaram a morar sete lá, tinha um do Banco do Brasil, na época que eu vim vieram três, lá de Belém, veio mais um carteiro e um outro que era um outro cargo, já foi até extinto, era executante operacional, aí viemos os três de Belém.
Dia 12 de fevereiro de 92.
P/1 – E aí, qual foi o seu primeiro trabalho nos Correios? Como é que você aprendeu a ser carteiro, descreve um pouquinho o que é o serviço?
R – O primeiro trabalho foi ser carteiro mesmo, quando eu cheguei tinha um rapaz de Santarém aqui, que estava cobrando aqui, só tinha um carteiro na época, aí ele foi me ensinando.
A gente vai, tal, coleciona desse jeito, pela rua tal, aí termina a rua tal, em tal número pergunta a rua assim.
Ele me ensinou, com 15 dias já estava apto pra estar na rua já.
P/1 – Você ficou aqui 15 dias?
R – Aprendendo.
P/1 – Então me explica como é que é.
A carta vem pra cá.
R – É, a carta chega.
P/1 – O que chega? É carta, o que mais que chega?
R – Chegam diariamente carta, Sedex e registrada.
E malote.
Aí chega semanalmente PAC, que vem via fluvial.
P/1 – Vem de onde?
R – Vem de Belém.
Tudo vem de Belém.
P/1 – Vem de barco?
R – Vem o PAC de barco e o Sedex de avião.
P/1 – O que é o PAC?
R – PAC é esse tipo de encomenda aqui.
É uma encomenda mais barata que o Sedex.
O Sedex é esse tipo aqui.
P/1 – Segura assim, senta aqui e só segura.
R – Esse aqui é prioritário.
Tem um prazo máximo de três dias úteis.
P/1 – Então como você lida, você manda um Sedex, ele chegou.
Aí você faz quê? Você lê PAC, Sedex e normal? Como que você faz?
R – Não, isso aí é trabalho do gerente.
Ele que faz a abertura da carga que chega aí, aí ele já lança aqui.
Eu posso pegar o livrinho aqui?
P/1 – Pode.
R – Se eu achar.
Na verdade até eu estou perdido.
É isso aqui.
Na verdade é ele que faz a abertura da mala de conferência e vai separando já.
P/1 – O que ele faz? Ele abre a mala.
R – Ele abre a mala, confere se está tudo ok e vai separando o que é de caixa postal, no caso que é pra ser entrega interna, e o que é de rua.
De rua ele já lança aqui pra mim, ó: “Lista de objetos entregues ao carteiro”.
Aí já é minha responsabilidade, já tem a matrícula dele, a minha.
P/1 – Então quem preenche essa ficha é o gerente?
R – Não, ele lança no sistema de informática aí.
Aí eu faço só colocar o nome do destinatário, endereço e vou pra entrega.
P/1 – Então qual é a diferença do Sedex pro PAC? Você pega primeiro o Sedex?
R – Aqui a gente faz tudo junto porque dá tempo, mas quando não dá tempo de fazer tudo num dia, a prioridade é do Sedex, sempre do Sedex.
P/1 – Então a gente sabe que o Sedex chega mais rápido por quê?
R – Porque é o serviço mais caro.
Não tem como saber porque o Sedex vem diariamente, via área.
P/1 – O Sedex vem via área.
R – Via área.
E o PAC não, vem via fluvial uma vez por semana só.
P/1 – E mesmo via área, por exemplo, a carta que vem, ou encomenda que não vem nem PAC nem Sedex.
R – Só tem quatro modalidades aqui, a carta simples, a carta registrada, o PAC e o Sedex.
P/1 – Então conta pra mim, a carta simples é o quê?
R – A carta simples é essa que não tem registro, só que ela também é urgente.
É fatura, coisa de banco, é urgente.
Tem a mesma prioridade, praticamente, do Sedex, tem que ser feita diariamente a entrega.
P/1 – Só que o Sedex a gente sabe que é mais garantido por quê? O que muda por trás do balcão?
R – O que muda é o código de barra, que tem o acompanhamento do tempo real dele aqui, você sabe onde ele está.
P/1 – Entendi.
Então você tem que priorizar a entrega do Sedex?
R – Priorizar a entrega do Sedex.
P/1 – E depois do Sedex o que você prioriza?
R – É o registrado sempre.
P/1 – E o PAC?
R – Também, o PAC também é registrado, só que ele tem também o código de barra que acompanha.
Só que o diferencial dele é o preço.
Mas chegando aqui a gente dá a mesma prioridade.
Não aquela mesma, exata, mas.
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P/1 – Prioridade, prioridade.
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R – Sedex.
P/1 – E hoje em dia, o que chega mais? Qual é o maior número de coisas que chegam pra entrega?
R – Sedex.
P/1 – Sedex?
R – É.
P/1 – Em geral, dentro do Sedex, o que é?
R – Não tem como dizer, mas manda todo tipo de objeto porque é fechadinho.
Mas vem roupa, muitas vezes vem remédio.
P/1 – Existe muita carta ainda?
R – Muita.
Carta de pessoas físicas, infelizmente não.
P/1 – Não?
R – Não.
P/1- Muito pouco?
R – Muito raro a gente ver.
P/1 – Vem carta o quê, conta?
R – Carta é conta.
Hoje é conta, é coisa de banco, de cartão de crédito, de telefonia móvel, fixa, essas coisas.
P/1 – Isso é carta?
R – Isso é carta.
P/1 – Uma carta escrita: “Meu amor, eu estou te esperando”.
R – É raro essa daí, infelizmente.
P/1 – Quando você começou a trabalhar aqui tinha muita carta?
R – Tinha.
Era a maioria.
Não tinha, por exemplo, fatura de cartão era pouco, de telefone, de cartão de crédito, de televisão por assinatura, essas coisas.
P/1 – Isso não tinha praticamente?
R – Tinha, mas era pouco.
P/1 – O que era o maior volume de coisas que você entregava?
R – Era carta mesmo.
P/1 – Carta?
R – Carta, catálogo.
P/1 – Carta e catálogo.
R – Revista.
P/1 – E postal, tinha muito?
R – Como assim postal?
P/1 – Sabe cartão postal com foto atrás?
R – Tinha sim, principalmente na época do final do ano.
O cartão postal não é muito comum, mas ainda mandam hoje porque é um tipo de lembrança.
O cartão postal é uma lembrança de alguém que viaja, compra de onde está pra mandar pra um parente, pra um familiar.
P/1 – E isso foi mudando?
R – Foi mudando, mas o cartão postal ainda é comum.
P/1 – Agora, quando que a carta foi parando?
R – Acho que faz mais ou menos uns dez anos, desde a propagação maior da internet a carta foi diminuindo.
P/1 – Foi com a internet?
R – Acredito que sim também.
P/1 – Deixa eu te fazer uma pergunta.
Você lembra de alguma história, de alguma entrega, alguma história que alguém estava esperando muito, que deu muito certo ou que deu muito errado, dentro desses anos todos?
R – Eu não lembro porque o Sedex é sempre muito esperado.
Mas é gratificante a gente chegar.
Realmente, final do ano as pessoas esperam muito assim, tipo telefone que estão esperando, que compram.
Mas não tenho uma lembrança fixa do que tenha dado muito certo.
P/1 – De alguma coisa que aconteceu? E muito errado?
R – Já deu uma coisa errada já.
P/1 – Então conta essa história pra mim.
R – Eu fui entregar um Sedex no endereço certo.
Aí cheguei lá pra pessoa e falei: “Você conhece essa pessoa aqui?”, aí a pessoa disse: “Conheço, é daqui”.
Só que na verdade o verdadeiro dono da encomenda já tinha mudado.
Aí essa pessoa que recebeu nem era a pessoa que morava na casa, era uma pessoa que estava só de passagem lá.
Quando o verdadeiro dono veio aqui e disse: “Olha, vai chegar uma encomenda pra mim tal dia, só que eu já mudei de casa e gostaria que ela fosse entregue em outro lugar”.
Eu disse: “Não, já foi entregue, tal dia a pessoa recebeu lá”.
Aí quando o dono foi lá na casa receber, aí a pessoa já tinha ido embora e levou.
P/1 – Levou? O que era?
R – Parece que era um DVD e uma chapinha.
Submarino.
Só que eu não tinha nada a ver, eu fui entregar pra pessoa, a pessoa disse que conhecia, recebeu, assinou e pronto, foi embora.
P/1 – E aí, o que aconteceu depois?
R – Aí o verdadeiro dono veio aqui, mas ficou tudo certo aqui, que o procedimento estava correto, dos Correios.
Aí ele foi lá na delegacia.
E o parente da pessoa que levou acho que deu cem reais, fizeram um acordo lá.
P/1 – Devolveu o dinheiro?
R – É, parece que deu cem reais ainda para o cara não perder tudo.
Eu não sei se esse era o valor da encomenda.
Mas o fim foi esse aí.
P/1 – E alguma outra história de alguma encomenda muito importante ou que tenha extraviado, alguma coisa assim, que você falou: “Nossa, não vou esquecer disso nunca mais”.
R – Não, infelizmente não tem.
P/1 – Não te aconteceu nada.
R – Não.
Graças a Deus, no caso.
P/1 – E com cachorro, por exemplo, você já teve história de chegar e o cachorro correr atrás de você?
R – Não.
P/1 – Não, você não tem medo?
R – Não.
P/1 – Não tem cachorro bravo?
R – Tem cachorro bravo, mas a gente já dá um jeito de passar longe deles.
P/1 – Já tem a técnica?
R – É, já.
Mas na verdade aqui não tem tanto cachorro, não é como tem em vários interior que tem cachorro solto na rua, aqui não tem tanto.
P/1 – O tipo de pessoa, você já conhece pra quem você está entregando, você já é amigo do pessoal que você faz entrega? Ou as pessoas mudam muito?
R – Mudam muito.
Aqui, por ser uma área industrial, a rotatividade é muito grande.
Mas eu geralmente conheço já muita gente aqui.
P/1 – Você fez amigos por causa de entregas?
R – Já.
P/1 – Que amigos você fez?
R – Não amigo assim, pessoal, porque deve haver uma separação muito grande porque no caso a gente é funcionário público, a gente não pode fazer, como funcionário, favor que depois a pessoa queira cobrar da gente como funcionário.
Então a gente tem que saber separar amizade do trabalho.
Mas geralmente o que a gente pode fazer a gente faz.
P/1 – Quais são os favores que as pessoas pedem?
R – Favores pra entregar um Sedex num outro endereço.
Por exemplo, às vezes a pessoa quer dar um presente pra alguém, só que não quer que o carteiro vá entregar lá na casa.
Aí ele já diz, liga: “Entrega essa mercadoria pra mim pra outra pessoa”, ou “Eu vou pegar aí”, isso acontece bastante.
Aí é uma coisa que a gente, não é muito usual, mas a gente faz.
P/1 – Vocês fazem?
R – Eu faço.
Faço quando conheço a pessoa.
P/1 – Quando você conhece.
E aqui quantas pessoas trabalham nessa agência dos Correios aqui?
R – Hoje estão trabalhando seis.
P/1 – Quais são as funções?
R – Seis, no caso não, são cinco.
Trabalham os dois atendentes, o Gerente, seu Ademir, eu, de carteiro e mais outro carteiro, que está de férias no momento.
P/1 – Então são dois carteiros, um gerente e dois atendentes.
R – É, no momento.
P/1 – Vocês ficam atrapalhados, tem muito serviço?
R – Tem.
Ficamos.
P/1 – Qual época do ano vocês ficam mais atrapalhados?
R – Mais é no final do ano porque aumenta o volume de entrega de Sedex, PAC.
Mês de dezembro é complicado.
P/1 – É muito presente?
R – É, é muito presente.
P/1 – O material pra ir não depende do carteiro, só pra vir.
R – Não, material pra ir é postado lá na frente, aí do mesmo jeito que o gerente abre as malas quando chega, ele também é o responsável por fechar e encaminhar.
P/1 – Agora me diz uma coisa, você faz a entrega de quê? De pé, de barco.
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R – De motocicleta.
P/1 – Motocicleta?
R – É.
P/1 – Bicicleta?
R – Não.
P/1 – Motocicleta.
Você sai quantas vezes pra fazer entrega por dia?
R – Eu encho o baú de encomenda, tem encomenda que cabe uma só no baú, tem encomenda que cabe dez.
Se cabe só uma eu vou e em cinco minutos eu volto e pego outra é assim.
Se couber dez eu já levo, entrego as dez, demora meia hora, uma hora, eu já volto, encho de novo.
P/1 – Por exemplo, aquela encomenda ali não cabe num baú de motocicleta.
Aí como que você faz?
R – Esse é, aqui em Monte Dourado a gente dá um jeito de levar mesmo enganchado, dá um jeitinho de levar.
P/1 – Mesmo grande daquele jeito?
R – Mesmo grande, é, a gente procura sempre levar.
P/1 – Max, conta pra mim, há 21 anos que você está nos Correios?
R – Sim, senhora.
P/1 – A função foi sempre a mesma?
R – Foi sempre a mesma.
P/1 – O que mudou no seu trabalho nesses 21 anos?
R – Eu não sei precisar uma mudança brusca assim.
P/1 – Nada mudou?
R – Praticamente é a mesma coisa.
Não posso dizer que é um trabalho rotineiro porque sempre a gente encontra pessoas diferentes, mas o trabalho sempre é praticamente o mesmo do carteiro, não tem muita mudança.
P/1 – Quanto tempo você ainda vai trabalhar?
R – Ah, não sei.
P/1 – Mas qual?
R – A previsão, a gente se aposenta com 35 anos, agora não sei quanto tempo eu vou trabalhar.
O futuro é imprevisível.
P/1 – Me conta um pouco o que você quer que aconteça no futuro.
Não o que vai acontecer porque você não é vidente, mas o que você quer? Qual é o seu sonho?
R – Hoje, meu sonho mesmo é continuar empregado e ver os meus filhos se formarem, entendeu?
P/1 – Você quer que eles se formem em quê? Você tem quantos filhos?
R – Três.
P/1 – Fala o nome deles pra mim.
R – É a Maria Carolina, que tem 19 anos, Ana Beatriz, com 18 anos e Gabriel com 16 anos.
P/1 – Você tem filhos grandes.
R – É.
P/1 – Você casou aqui em Monte Dourado?
R – Eu estava recém-casado quando eu vim de Belém.
P/1 – E você trouxe a sua esposa?
R – Ela veio depois de seis meses.
Eu vim, me adaptei um pouquinho aqui, depois de seis meses, no caso eu vim em fevereiro de 92, ela veio em julho.
P/1 – Vocês são casados até hoje?
R – Até hoje.
P/1 – E você quer que eles se formem em quê?
R – Tenho uma filha fazendo Engenharia Ambiental e a outra fazendo Engenharia Química, em Macapá.
E o outro faz o ensino médio.
Por enquanto eu quero que eles se formem nisso mesmo, dali pra frente eles sabem.
P/1 – Então o sonho pra eles.
E pra você, o que você quer?
R – Pra mim, eu quero mesmo é continuar empregado pelo menos até o dia que eles possam andar com as próprias pernas.
Depois que eu ir pra um lugar melhor ainda penso em fazer uma faculdade, trabalhar na área que eu fiz curso técnico.
Nunca é tarde.
P/1 – Você quer voltar pra essa área?
R – Eu gostaria.
P/1 – Que área, qual é?
R – Eletrotécnica, eu sempre gostei.
P/1 – Ah, é? O que você gostaria de fazer na área de eletrotécnica?
R – Ah, é um campo vasto, desde trabalhar numa hidrelétrica como tem aí, até trabalhar numa manutenção de prédio, de eletricista residencial mesmo, é muito vasto, é uma área vasta.
P/1 – Você faria faculdade nessa área?
R – Faria, se eu tiver oportunidade eu faço ainda.
P/1 – O que precisa pra você fazer faculdade?
R – Precisa eu estar num lugar onde tenha.
P/1 – Aqui não tem?
R – Aqui não.
P/1 – Não pode fazer à distância?
R – Não.
Porque no caso como eu sou técnico de nível médio, a única coisa seria uma faculdade de Engenharia Elétrica, desse tipo não faz à distância.
P/1 – E onde tem?
R – Só em Belém.
P/1 – Em Belém?
R – É, mais próximo.
P/1 – Então você pensa que depois que você se aposentar você voltaria pra lá pra estudar? É uma ideia?
R – Eu não digo depois que eu me aposentar, depois que meus filhos estiverem adultos e se mantendo por si mesmos.
Pra eu me aposentar eu tenho um caminho longo, tenho 21 anos, tem que ser no mínimo com 35.
P/1 – Mas você iria trabalhar lá?
R – É, até lá já estou com meus 60 anos, é meio complicado.
Mas não tarde.
Complicado.
P/1 – Escuta, você sabe que os Correios estão fazendo aniversário esse ano, não sabe? Isso tem algum significado pra você?
R – É, significado por eu participar também um pouco da história dos Correios.
Quando eu fiz 15 anos eu recebi um broche, um certificado dos Correios.
P/1 – Você gosta?
R – Eu me sinto parte, eu gosto sim, sempre gostei.
Eu gostei sempre de trabalhar.
P/1 – Qual o seu sentimento, hoje, pelos Correios?
R – Ah, sentimento é assim, eu colocar pra senhora assim, eu não sei descrever o sentimento.
Mas hoje, eu trabalho depois de 21 anos, como se fosse meu primeiro dia, com o mesmo empenho, a mesma responsabilidade.
É o que eu procuro fazer pelo meu trabalho, pela empresa.
Porque tem gente que, não vou dizer que se acomode, acaba que tem tantos anos, diz assim: “Ah, eu vou deixar os que são novatos trabalharem”.
Eu não penso assim.
Se a gente chega, vai trabalhar oito horas, a gente tem que fazer o nosso trabalho como deve ser.
Eu penso assim, eu acho que a gente deve trabalhar sempre como fosse o primeiro dia, com o mesmo empenho, a mesma dedicação.
P/1 – Você tem vontade de mudar de função nos Correios?
R – Não, porque eu gosto da rua.
Só se fosse pra uma função técnica, assim, só que aqui não tem.
P/1 – Você gosta da rua, você não queria ficar aqui dentro?
R – Não, não, aqui não (risos).
P/1 – Teu negócio é bater perna?
R – Meu negócio é a rua.
Apesar do sol, da chuva, de algum cachorro, mas eu gosto da rua
P/1 – Está bom, Max, obrigada.
FINAL DA ENTREVISTA
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