P/1 - O senhor pode nos dizer o seu nome, local de nascimento e data?
R - Meu nome é Rui Fernando Ramos, nascido em Jaraguá do Sul, Santa
Catarina em 21 de novembro de 1953.
P/1 - O nome de seus pais?
R - Meus pais: Júlio Zacarias Ramos e Teresa de Oliveira Ramos.
P/1 - Eles também são de Santa Catarina?
R - Todos de Santa Catarina. Os dois são naturais de Joinville. Jaraguá é
vizinha à Joinville, 29 Km.
P/1 - Brasileiros?
R - Brasileiros, catarinenses.
P/1 - O que seus pais faziam?
R - Meu pai era fiscal da fazenda, mas faleceu com 51 anos, em 1971. Minha
mãe é viva até hoje, é do lar nunca teve profissão.
P/1 – O senhor tem irmãos, irmãs?
R – Nós somos 4 irmãos, tem outro irmão médico que é patologista clínico,
trabalha aqui, tem laboratório de análise, tem um laboratório na Higienópolis, o (Provem?), e faz o laboratório do hospital São Camilo, na zona norte aqui, né. Tem um irmão que é administrador de empresas que
trabalha em Jaraguá do Sul e tem um escritório de contabilidade. E um irmão
advogado que mora em Joinville. Todos universitários.
P/1 – Você passou toda sua infância lá, nessa cidade?
R – Nasci e fiquei em Jaraguá até os 12 anos...10 ou 12 anos, não me lembro
bem. Depois minha família mudou-se para Joinville aí acabei...na verdade
acho que era com 10 anos, porque iniciei naquele antigo tempo era o
primeiro ginasial, né, hoje é o segundo grau, iniciei em Joinville. Fiz o
científico em Joinville. Fiz o vestibular em 1972, 1971 para 1972 e fui fazer o
curso de medicina em Florianópolis, na Universidade Federal de Santa
Catarina em 1972 e me formei em 1978. Em 1978 vim para São Paulo e prestei a residência no Instituto Dante Pazzanese, e entrei em 1979. Aí fiz o R1, R2,
1979, 1980, em 1981 fiz o terceiro ano de residência mas dedicado ao setor de emergência e terapias intensivas e a partir de 1982 comecei a trabalhar em
São Paulo. Em 1981 na época...
Continuar leituraP/1 - O senhor pode nos dizer o seu nome, local de nascimento e data?
R - Meu nome é Rui Fernando Ramos, nascido em Jaraguá do Sul, Santa
Catarina em 21 de novembro de 1953.
P/1 - O nome de seus pais?
R - Meus pais: Júlio Zacarias Ramos e Teresa de Oliveira Ramos.
P/1 - Eles também são de Santa Catarina?
R - Todos de Santa Catarina. Os dois são naturais de Joinville. Jaraguá é
vizinha à Joinville, 29 Km.
P/1 - Brasileiros?
R - Brasileiros, catarinenses.
P/1 - O que seus pais faziam?
R - Meu pai era fiscal da fazenda, mas faleceu com 51 anos, em 1971. Minha
mãe é viva até hoje, é do lar nunca teve profissão.
P/1 – O senhor tem irmãos, irmãs?
R – Nós somos 4 irmãos, tem outro irmão médico que é patologista clínico,
trabalha aqui, tem laboratório de análise, tem um laboratório na Higienópolis, o (Provem?), e faz o laboratório do hospital São Camilo, na zona norte aqui, né. Tem um irmão que é administrador de empresas que
trabalha em Jaraguá do Sul e tem um escritório de contabilidade. E um irmão
advogado que mora em Joinville. Todos universitários.
P/1 – Você passou toda sua infância lá, nessa cidade?
R – Nasci e fiquei em Jaraguá até os 12 anos...10 ou 12 anos, não me lembro
bem. Depois minha família mudou-se para Joinville aí acabei...na verdade
acho que era com 10 anos, porque iniciei naquele antigo tempo era o
primeiro ginasial, né, hoje é o segundo grau, iniciei em Joinville. Fiz o
científico em Joinville. Fiz o vestibular em 1972, 1971 para 1972 e fui fazer o
curso de medicina em Florianópolis, na Universidade Federal de Santa
Catarina em 1972 e me formei em 1978. Em 1978 vim para São Paulo e prestei a residência no Instituto Dante Pazzanese, e entrei em 1979. Aí fiz o R1, R2,
1979, 1980, em 1981 fiz o terceiro ano de residência mas dedicado ao setor de emergência e terapias intensivas e a partir de 1982 comecei a trabalhar em
São Paulo. Em 1981 na época eu era R3 e já fui contratado como chefe de
plantão na equipe do professor Adib Jatene, na Beneficência Portuguesa, ele
ainda trabalhava na Beneficência Portuguesa. Iniciei como chefe de plantão.
Também em 1982, fui contratado para chefe de plantão Dante Pazzanese, já
quando acabei o R3. Iniciei outros trabalhos em outras UTIs, trabalhei no
Hospital Brasil de Santo André, trabalhei no Hospital Ipiranga que em 1982
fiz concurso pelo INPS [Instituto Nacional de Previdência Social], passei. Fui ser diarista da UTI, na época do Hospital Ipiranga que era do INAMPS [Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social] . Em 1989 viajei para os Estados Unidos, em agosto de 1989, fiquei até dezembro de 1990 nos Estados Unidos, na Carolina do Norte, na Duke University com o professor Robert (Keylef?), que hoje é uma autoridade mundial em cardiologia. Em 1990 voltei. Quando voltei em 1990, passei a ser chefe da unidade coronária do Dante Pazzanese, e sou chefe da unidade coronária até hoje.
P/2 – O senhor tem algum parente médico?
R – Nenhum.
P/2 – Como foi essa decisão?
R – A decisão de fazer medicina acho que era mais por gosto de meu pai. Nós
temos… sempre quis medicina e meu terceiro irmão… meu irmão mais velho é
3 anos mais velho que eu, queria muito ser médico aí ele fez esse concurso
e naquela época em Santa Catarina se implantou um sistema de ciências
biológicas, não de medicina. Então você passava no vestibular, cursava 1
ano e meio a universidade e após 1 ano e meio saia uma classificação. Por
ordem de classificação você optava o curso. Então meu irmão não se
classificou, na época acho que eram 80 vagas para medicina, entre os
primeiros 80, então ele optou por bioquímica. Poderia ter pego odontologia,
mas não quis. Pegou bioquímica. Eu fiz vestibular em 1972, entrei. Eu me
classifiquei para medicina. Aí fiquei...
P/1 – Mas você queria fazer mesmo, por que?
R – Acho que já estava incutido, os últimos dois lá, meu pai...Meu pai faleceu
em outubro de 1971. Fiz vestibular em janeiro de 1972, ele nem soube. Aí meu
irmão veio para São Paulo e fez estágio de bioquímica aqui no Dante
Pazzanese, no laboratório do Dante Pazzanese. Quando eu estava no 6º ano de
medicina, aquele negócio se você vai fazer especialidade, se vai cair na
vida, tem aquele problema do exército chamar você, você querendo se desviar
do exército, ele estava aqui falou com um cardiologista que acabou sendo
amigo dele. O cardiologista me indicou para o Professor Carlos Garcia,
professor de cardiologia, que tinha sido ex-presidente do Dante Pazzanese,
que era médico em Florianópolis, foi meu professor de cardiologia durante o
curso. Passei a acompanhá-lo em Santa Catarina durante meu 6º ano e vim
para o Dante Pazzanese a pedido do Carlos Garcia fazer cardiologia. Fiz
cardiologia no Dante. Vim em agosto de 1978, fiquei seis meses de estágio, até
janeiro de 1979. Fiz a prova em dezembro de 1978, fui aprovado, em janeiro de 1979 iniciei a residência. Você sempre acha que vai retornar, que não via ficar.
Como já fui contratado na R3 para ser chefe de plantão no Dante e chefe de
plantão na Beneficência Portuguesa, teoricamente já tinham surgido dois empregos. Você vai ficando, acha que vai voltar depois. Acabei ficando em
São Paulo, hoje não sei se foi uma boa [risos].
P/1 – Deixa eu voltar um pouquinho para sua infância em Santa Catarina, tem
alguma coisa que marcou sua infância, como foi sua infância?
R – Acho que numa cidade igual a Jaraguá do Sul tinha 50, 60 mil
habitantes, tinha nada, né, fazia o que os filhos não fazem hoje aqui em
São Paulo, o que dá uma pena. Mas não tinha muita coisa que nós fazíamos. O
que nós fazíamos era jogar futebol. O que existia em Jaraguá do Sul, muito bom,
na época, era um colégio de Irmãos Maristas e que era sede para o Estado de
Santa Catarina, inclusive acho era regional para o Paraná. Então a
Congregação do Irmão Marista era muito forte, era internato e muito gente
até do Brasil todo se internavam em Jaraguá do Sul. Nós éramos alunos
externos mas havia muitos alunos que iam de São Paulo, Curitiba para fazer
internato em Jaraguá. Jaraguá não existia nada, uma cidade mínima, tinha um
cinema, não tinha nada em Jaraguá. Estudávamos no colégio Marista única
coisa que tinha assim de mais importante. Mas o resto era banho de rio,
andar de canoa, porque existia um rio não poluído na época, jogar futebol,
ir ao cinema no domingo, não tinha nada assim de importante. Joinville não,
Joinville já era uma cidade maiorzinha. Quando mudei para Joinville também
era futebol, também mudei para um colégio Marista em Joinville...
P/1 - Aí você já era adolescente?
R - 10, 11 anos. Sempre gostei de futebol, jogava futebol, era da seleção
do colégio, aquelas coisas, ia jogar nas Olimpíadas Maristas, jogava em
várias cidades de Santa Catarina, mas nunca fui assim grande coisa, não
tinha nada muito importante da cidade. Hoje Jaraguá do Sul é o 3º parque
industrial, de renomado em Santa Catarina hoje existe a Weg, em Jaraguá
do Sul, que é uma fábrica monstruosa, que tem o Egon Silva, que é o
industrial do ano do Brasil, que é o industrial do ano na América do Sul,
industrial não sei o quê, tem várias ... eletromotores. Mas Jaraguá não tem
nada de especial, teve muita malharia ,aí, parece que não tem mais também.
P/1 - O senhor lembra de alguma doença que teve na infância?
R - A doença mais grave que tive na infância foi sarampo.
P/1 - Como tratava na época?
R - Isso não lembro, porque era de 6 para 7 anos, tive sarampo, fui jogar
futebol, achava que estava nascendo sarampo, mas todo mundo foi jogar
futebol, fui também. Com sarampo, aí foi aquela zoeira. Voltei para casa e estava todo empipocado. Aí tive complicações do sarampo. Hoje mesmo, como
médico, quando volto a pensar, não sei todas complicações que tive. Mas tive
pneumonite do sarampo, tive algumas complicações, fiquei muito tempo
acamado. Nessa época do sarampo fiquei 6 meses acamado, foi uma época ruim da vida. Quando completei 7 anos ainda estava acamado, mas depois nunca tive mais nada, nunca tive rubéola pelo que me conste. O que marcou minha infância como doença foi o sarampo.
P/2 - De tratamento o senhor não lembra?
R - Ah não. Não lembro nada, só sei que não fui hospitalizado, era tratado
em casa naquela época e um médico que era mais ou menos vizinho visitava
diariamente, quase diariamente, mas não tenho a mínima noção de tratamento.
Antigamente, o médico não sabia nada e era respeitado, hoje o médico sabe
muito e não é dado a mínima importância! Hoje todo mundo acha que médico
não sabe nada. Antigamente o médico não sabia nada e era super respeitado!
Isso é sério porque antigamente o médico tinha um conhecimento
generalizado, do dia a dia, e tratava com as medicações disponíveis, hoje
tem super máquinas, se você sabe o mínimo de uma coisa, também não sabe
muito do conjunto, e ainda tem as super especialidade de uma determinada
área, você sabe o máximo disso ali e não é muito levado em conta. Acho que
o respeito médico de antigamente era muito maior. Era uma autoridade, o
médico dava opiniões ... hoje é como diz o Newton Cardoso:" É igual sal,
tem em toda esquina e é branco".
P/1 - E sua adolescência como foi, paquera, amigos?
R - Não, nunca fui um cara muito...A maior época de minha vida foi a
residência, acho que a gente tinha uma turma de residentes muito unida. Mas
em termos de paquera, Joinville era a turma de futebol, essas coisas não
tinha... Eu não era alemão! Que em Joinville existe duas diferenças grandes
em Santa Catarina: o alemão de Blumenau e o alemão de Joinville. O de
Joinville é muito tradicional e o de Blumenau é mais aberto se você for a
Santa Catarina você vai notar isso, é bem evidente. O Germânico de
Joinville é super tradicional e o Germânico de Blumenau é mais
abrasileirado, mais soltinho. Em Joinville quem era alemão era alemão, mas
nós tínhamos nossa turma de sair. Eu não era de família, bem, não tinha
carro, nós andávamos a pé, fazíamos tudo a pé, ia a bailes a pé, voltava à
noite a pé, mas naquele tempo não havia perigo, tudo que você fazia era a
pé, jogava muito futebol, mas não tinha nada de anormal. Naquela época não
existia nem boate em Joinville, Joinville tinha boate?! Não tinha. Você ia
a bailes, tinha a domingueira, mas não tinha grandes coisas não.
Relacionado a hoje é muito diferente. Os divertimentos eram muito de
futebol, dessas coisas, mais para a prática do esporte.
P/2 - E no tempo da faculdade como foi o curso?
R - No curso fui bem. Na verdade passei no vestibular em 1972 para entrar em
julho, para o 2º semestre. Voltei para Joinville e o professor de
matemática do científico abriu um cursinho e eu fui secretário de
matemática no cursinho dele. A única coisa que eu tenho dessa profissão é
que fui de janeiro a julho de 1972 professor de matemática. Quando eu fui
para a universidade me classifiquei bem por causa disso. A prova era
unificada de matemática e tiveram dois dez na prova de matemática que era o
meu e de um aluno da engenharia, de média dez que dava conceito "A"
antigamente, aí multiplicava conceito "A" por nota quatro. Isso me classificou
em medicina, porque tirava na média biologia, química, física. O que o
pessoal relacionado à área de biológica é matemática, normalmente não sabe
e como fui muito bem em matemática, que até chamou a atenção na
universidade um cara da biologia tirar nota mais alta junto com os
engenheiros. Isso foi uma coisa que chamou atenção na época e que me
classificou para medicina. Agora física era um desastre, física não
conseguia, mas matemática eu era bom. Em física passei com a nota mínima
que era cinco. Mas matemática passei com conceito "A" que elevou minha média, então acho que me classifiquei em 22º, eram os primeiros 1980 que entravam para medicina, fui super bem, mas fui muito bem porque mantive a área biológica na média e sobressai em matemática. O cursinho de Joinville me
ajudou.
P/1 - Nesse período da residência você veio para São Paulo?
R - Me formei em julho de 1978, fiquei de agosto a dezembro fazendo estágio
no Dante Pazzanese, foi meu irmão que arrumou, passei um mês na seção de
radiologia, um mês na seção de eletrocardiografia, mais essas áreas assim,
né. A gente não via paciente, fazia estágio e estudava. Fizemos a prova em
dezembro.
P/1 - Como era este estágio, o que você fazia basicamente?
R - Os estágios praticamente são aulas, que são as aulas dadas por
residentes. Hoje eu recebo estagiários. Estou dando aula para os residentes
e os estagiários estão participando da aula. Existem os residentes oficiais
do Dante Pazzanese e que a gente acompanhava. Mas esse estágio ajuda muito, principalmente porque na época a prova de classificação para o Dante
Pazzanese, era uma prova cardiológica, fazendo estágio no Dante Pazzanese eu teria uma grande possibilidade de entrar, porque eu já estava na área de
cardiologia. Hoje a prova de residência não é assim. Hoje a prova é feita
pela Fundação Carlos Chagas, que o Dante participa, e é uma prova de
clínica médica. Quem se classifica em 1º tem o direito de optar, conforme
a classificação, o serviço que ele quer fazer a residência. Mas naquela
época foi muito importante para mim. Passei 6 anos na universidade em
Florianópolis e vi uma clinicação interatrial, os átrios ventriculares a
criança não fechou, nasceu. Cheguei aqui no Dante Pazzanese e à tarde na fui
dar na Beneficência Portuguesa, tinham 15 internados. É uma diferença,
passei 6 anos e vi um, cheguei no primeiro dia no estágio, na pediatria da
Beneficência Portuguesa, olhei, tinham 15 internados com aquela doença. O
número, a experiência é muito maior. Então você vê uma radiologia de estenose mitral, aí, o professor vai dar aula de radiologia de estenose mitral, ele tem centenas de radiografias para mostrar, você sobe num andar, vai auscultar um doente, tem quatro, cinco internados, então é muito diferente, dificilmente eu passaria na prova se não tivesse feito o estágio, no Dante,mas na época isso era um estágio aberto, só estagiários deviam ter uns 30, na época, no Dante Pazzanese, e tinham 12 residentes e o resto tudo estagiário. Hoje são 24 residentes, 24 residentes nacionais e 6 estrangeiros que são da América do Sul.
P/2 - A sua decisão de fazer cardiologia surgiu...
R - Eu acho que mais pela oportunidade, nem diria que estaria relacionado,
quer dizer, eu tenho meu pai que faleceu de infarto, mas não acho que porque
ele faleceu, eu acho que foi a oportunidade do meu irmão ter vindo, conhecido, ter dito: "não vamos lá, vou arrumar", eu não tinha nada em Jaraguá, não tinha familiar médico, não tinha nenhuma opção, acho que como apareceu a oportunidade de estágio eu vim fazer, já acompanhei um cardiologista em Santa Catarina vou fazer cardiologia. Uma decisão, acho, mais uma oportunidade que apareceu do que uma .... eu pensei sempre em fazer cardiologia, que eu seria cardiologista. Normalmente, os médicos decidem conforme a força da cadeira, no curso universitário. Tipo: o serviço de ortopedia é muito bom então a grande maioria daquela universidade vai fazer ortopedia; serviço de nefro é muito bom, a grande maioria decide por nefrologia. Dificilmente algum estudante de medicina entrou na faculdade dizendo: "Vou fazer ortopedia, porque gosto." Não tem o mínimo de conhecimento. As cadeiras que são fortes, organizadas, são os
paraninfos, os homenageados em formaturas e são as cadeiras que a maioria
dos estudantes optam para especialidade, isso é tradicional. Uma
universidade que tem um serviço de cardiologia muito forte, a maioria faz
cardiologia, depende da área. Mas eu acho que foi mais a oportunidade que
tive de acompanhar, como meu irmão conseguiu aqui a vaga de estágio e para
vir para cá acompanhei um cardiologista em Santa Catarina, eu fiz
cardiologia.
P/1 - Dentro da sua área, nessa época da residência, quais eram as doenças
mais comuns na cardiologia?
R - Aqui no Dante Pazzanese todas são comuns. O Dante é uma referência, como
o Dante funciona como uma referência todas patologias aparecem. Dependendo
da época, me lembro bem uma vez o Fantástico noticiou que tinha um novo
remédio para Doença de Chagas e que o Dante estava oferecendo o remédio. Na
segunda-feira tinha tanta gente dentro do ________ Dante Pazzanese, nós
não podíamos nem nos mexer, a fila era uma ...vinha aqui fora! Isso por ser
referência. No Dante Pazzanese tem uma peculiaridade, a grande maioria dos
médicos do Dante Pazzanese são ex-residentes hoje. Mas a grande maioria,
diria, acima de 90%, o corpo clínico do Dante Pazzanese é formado por
ex-residentes. Naquela época minha de residência, esse ex-residente me
encaminhou como esses 30 estagiários, garanto para você, foram todos
encaminhados por um ex-residente do Dante Pazzanese. E o Dante Pazzanese
acolhia, depois fazia prova, entravam 12. Quem não tivesse feito estágio,
não acompanhasse um cardiologista, dificilmente era aprovado no Dante
Pazzanese. O Dante Pazzanese também era um hospital que oferecia residência
para quem era de fora de São Paulo. Até hoje eu acho, mas naquela época
muito mais. Se você fosse fazer prova para cardiologia no HC [Hospital das Clínicas] jamais
entraria. Muito dificilmente você teria capacidade de competir com um aluno
que fez a faculdade de medicina no HC. A quantidade de alunos já era
superior ao número de vagas. Para você fazer a residência na Escola
Paulista de Medicina, dificilmente você entra. Manipulam, não, eles fazem
uma prova que é da universidade, do nível deles, fazem a faculdade de
medicina, fazem um cursinho pré-prova e você vem lá do seu Estado, qualquer
Estado do Brasil, concorrer com um aluno se formou ali, que fez os 6 anos
ali, que para nós quando estudávamos em Santa Catarina convive com as
pessoas que estavam escrevendo livros, né. Porque quem está aqui em São
Paulo convive com os médicos que escreveram os livros. Então é muito mais
difícil para você concorrer. Só o supra-sumo, aqueles aviões, os grandes,
que furavam mais ou menos esse bloqueio. No Dante Pazzanese dificilmente
tinha um cara de São Paulo, que a grande maioria não escolhia o Dante
Pazzanese. Grande maioria escolhia HC, Escola Paulista onde o serviço de
residência _______. Então nós abríamos uma janela para pessoas que eram
de outros Estados. Essas pessoas de outros Estados eram encaminhadas por
ex-residentes.
P/1 - Qual era a terapêutica de um infarto agudo do miocárdio?
R - Naquela época, hoje quando vejo minha prescrição da época de R1 e R2
até sinto vergonha [riso]. Porque 1972/1976, existem algumas coisas
importantes na medicina. Na época nós usávamos uma substância chamada
Substância de (Sódio Palhares?) que era de um professor do Instituto
Nacional do México. Teoricamente dizia que diminuía a ação inflamatória no
infarto agudo do miocárdio, que era muito boa. Ao final, 1978...1978 não, aí
era 1979, 1980, 1981, acho que era 1984 mais ou menos quando estava saindo, já tinha caído em desuso. Sumiu. Vieram as novas drogas. Ano passado, diria
que 1997, uns argentinos: (Rafael Dias e Ernesto Paulacio?) junto com o
professor Leopoldo Piegas aqui do Dante, fizemos um trabalho
multicêntrico revivendo a solução de Sódio Palhares associada às medicações
atuais. A surpresa foi que ela diminuiu a mortalidade de doentes que tomou
os remédios atuais e essa solução que era usada em 1978, teve uma diminuição
de mortalidade de 50% em relação a quem não usou a medicação. Isso criou
até um certo balanço internacional, primeiro que hoje a gente tem até uma
credibilidade, pode até falar depois, nós participamos de trabalhos
internacionais coma a __________ University onde estudei, com a
___________ do Canadá, com a Oxford da Inglaterra. Temos vários
trabalhos, a gente passa fax, ele passam de volta, é diário nosso
comunicado, existem telefones, a gente liga para o Canadá. Essa solução
está sendo revivida a ponto de que criou uma congestão, um mal estar
internacional porque nós estamos na época das grandes medicações, que hoje
são fabulosas, mas o custo dessa medicação é muito alto, porque a pesquisa
no ano 2000 não é a pesquisa de 1910, não é? O custo. Essa solução já
existia e é uma solução simples, que só leva soro glicosado, insulina, que
já é um remédio descoberto a anos.
P/2 - Não tem nada haver com _________ ?
R - Não. Leva potássio, que é, que é um soro com potássio. E se, isso aí for
verdade [risos] vai ser a grande contribuição da América Sul e do mundo,
isso aqui é uma garrafa de coca-cola, no infarto, salva mais que o último
remédio do laboratório. Isso vai dar um problema tão sério no mundo. Isso
aqui… Sério, está rindo é, isso não pode botar depois.
P/1 - Estou achando ótimo.
R - Não nós vamos falar de heparina depois. O professor Roberto
_______, ___________, _________ todo mundo está incluído. Eles têm
muitas ligações com vários laboratórios, só que deram um apoio muito grande
a isso aqui. Mas também, esse é um trabalho que não achou fundo, quem ia
pagar esse trabalho da América do Sul que é uma coca-cola? Ninguém quer
pagar, nem o laboratório da insulina quis pagar. É um estudo que está
correndo sem fundos, para randomizar 10 mil pacientes. Os pesquisadores
e os hospitais estão pagando, mas estão pagando um soro, porque é um soro a
insulina, não tem muito custo. Tem o trabalho dos investigadores, para
randomizar 10 mil doentes no mundo, para comparando, 5 mil com os da
medicação, 5 mil sem uso. Tem 300 doentes. Mas para vocês terem uma idéia
esse ano que acabou de 1998 com o trabalho de drogas novas, para randomizar
doentes de infarto, foram randomizados em 11 meses 31 mil doentes com
infartos agudos, dois estudos diferentes: um levou 15 mil, outro levou 16. Em
11 meses se fez esse estudo, esses dois que vão ser apresentados na American College de março. Veja o tamanho e o poder para em 11 meses você
randomizar, angariar 31 mil doentes com infarto agudo, com até seis horas de
evolução no mundo. Não sei quanto tempo vai levar esse nosso aí.
P/2 - Como é que se define essa pesquisa, como é que vocês fazendo essa
pesquisa, é só no Brasil, só no Dante?
R - Não, é mundial. Essa da insulina quem comanda é a Argentina, os dois
professores. Nós fizemos o piloto, nada passa sem um piloto, e nada passa,
porque pesquisa é fazer um, dois, três e quatro. Fase quatro, já é uma coisa de laboratório
para colocar aquilo que leva para um consultoriozinho, você pega três doentes
aqui coloca, faz a pesquisa. Mas na fase um que tem o desenvolvimento da
medicação, tal. Essa fase um de medicamento, desenvolvimento animal, rato,
cobra, porquinho guiné, aquelas coisas. Você tem a fase dois que é encontrar a
dose ideal. Normalmente essa fase dois também não é feita no Brasil. Essa fase
dois, apesar de os grandes países desenvolvidos, serem desenvolvidos, eles têm
voluntários. Existem os voluntários que se submetem ao uso da medicação e
que sobrevivem disso, são pessoas normais de diversos países que vão ao
laboratório, o laboratório anuncia nos jornais: "Precisamos normais para
tomar determinado medicação por tanto tempo". Essas pessoas se apresentam e
são os normais. Aí vem uma fase, muitas vezes, que é de encontro de doses
também, que vai na fase dois. Você começa com uma dose alta, uma baixa, qual
dá mais efeito colateral, qual que não dá, também que dificilmente faz
aqui. A fase três que é benefício da medicação, você já encontrou a dose e
precisa um número grande de pacientes. Esse benefício aí, que é a fase três,
que está sendo esse de ______ acabaram esses daí de ______, são
vários da heparina de baixo peso molecular, que você compara, randomiza,
um doente toma, outro não toma, a maioria dos trabalhos são cegos, o médico
que está investigando não sabe qual é a medicação, para evitar o (Bayer?),
o Bayer o médico é capaz de dizer: "Não, esse doente vai tomar droga, mas
ele não está muito bom para droga, então vou dar placebo para ele". Quer
dizer você desvia um doente. Então, normalmente, o trabalho é cego, você
não sabe quem é droga e quem não é, você dá para o doente e descreve os
efeitos colaterais sem saber quem é droga. Um comitê à distância é que sabe
se você deu droga ou não. E você tem um cartão, um número de vários
envelopes com cada número de cada paciente que você randomizou do lote de
droga que você está dando para eles.
P/1 - Mesmo assim só para aquele que está participando da pesquisa?
R - Lógico, ele assina um termo de consentimento.
P/2 - Ele sabe que está tomando placebo ou não?
R - Não. O que a gente diz ao paciente é o seguinte ... depois mostro isso.
Existem trabalhos que você podia fazer com placebo. Por exemplo:trombolítico, quando ninguém sabia se era bom. Primeiro estudo de
trombolítico, existe um placebo versus trombolíticos, diminuiu 30% da
mortalidade, trombolítico é bom. No infarto agudo diminuiu 30% da
mortalidade, muito bom. Vem outro trabalho, placebo, diminuiu 28, 30 e
tantos porcento a mortalidade. A partir daquele momento, que dois estudos
mostraram, você não podia mais fazer trabalho de placebo, de trombolítico.
Porque você já tem dois grandes estudos no mundo que mostravam que o
trombolítico é bom, se você faz com placebo você está sendo antiético com
o doente, está tirando a chance dele tomar o trombolítico. O que você
poderia fazer depois é o trombolítico existente com o novo trombolítico, o
que você não pode é deixar de dar droga para o doente. Quando você não sabe
se o remédio é bom então você faz placebo, está certo? Quando não existe
comprovação, mas depois que a droga comprovadamente é boa você não pode
mais. Isso é uma coisa que vou te contar! Esse negócio de o doente saber ou
não, quando não existia pesquisa médica, muitos médicos fizeram pesquisa e
nunca nem falaram para o doente, porque é aquela história: o médico era
muito respeitado. Então o médico dizia: "Vou lhe dar um remédio..." e dava.
Ele podia até estar sabendo que estava dando placebo para o doente e
fazendo a pesquisa, mas não dizia para o doente. Até que entraram essas
pesquisas internacionais, pesquisa internacional é com a liberação de
drogas internacionalmente, o órgão...
P/1 - Como é que se deu mais ou menos essa...
R - Eu acho que no mundo já existe a muito tempo. O Brasil começou a
participar a partir de 1990, 1989, 1988. Com a entrada desses trabalhos
internacionais no Brasil entrou o FDA [Food and Drug Administration]. Então não adianta você fazer
paciente sem o informe, consentimento, sem nada, sem o cara, o FDA não
aceita isso aí, não aceita. E eles fazem auditoria internacional. Então
hoje o doente é conversado, assina um documento que ele sabe que está sendo
testado, sabe que é sorteado, aceita ou não. Então, tem doente que diz que
não quer ser cobaia, para você, ótimo. Tem o doente que diz: "O que o
senhor acha, que o remédio é bom, é ruim?". Você pode até entender. Tem
o cliente que se acha o máximo de participar de um remédio novo, ele tem
aquela personalidade: "Não, eu quero!" Tem o doente crônico, você faz
pesquisa de um remédio em Aids, eu estou com Aids, o laboratório diz:
"Tenho aqui um remédio novo para Aids". Sei que todos que estão aí nenhum
presta, qual o problema de eu entrar na pesquisa? É a minha chance! Não é
verdade?
P/1 - Claro.
R - Qual é minha chance? Não existe hoje você dar um remédio, na atual
legislatura internacional, que você vai dar para uma pessoa nessa fase três,
que não é a fase um de saber qual é a dose, o efeito dele, que seja
deletério assim. A grande maioria assim, por exemplo estou correndo com três
no Dante atualmente, mas a maioria é tratamento tradicional obrigatório
para todos. Então se você chegar no Dante hoje com infarto, vou fazer o
tratamento que existe para o infarto. Estou testando uma droga, essa droga
é que pode ser a mais atual contra a melhor que existe ou se não tenho
certeza nenhuma que a droga nova tem efeito, não adiciona nada, é contra
placebo. Existem certas coisas, por exemplo assim, nós fizemos o trabalho
trombolítico ano passado, t-PA [ativador do plasminogênio tecidual]. O tratamento t-PA hoje você encontra no
Einstein, no Sírio, no Incor, é 2200, 1800 ou 2200 o tratamento. Vem o
SUS [Sistema Único de Saúde] para mim, um paciente no Dante.
P/1 - 2200 reais ou dólares.
R - O frasco.
P/1 - O frasco do remédio.
R - Vem para mim ele aqui, aí o laboratório diz: “Você vai participar” e eu
disse: “Tudo bom”. Eu nem sei hoje para mim se é anti-ético, eu hoje tenho o
t-PA que custa 2200 dólares que o doente do SUS não paga de jeito nenhum,
contra um que eles acham que é melhor. Aí eu digo ao doente: “Você tem esses
dois remédios, quer ou não quer? Ou se não toma estreptoquinase que é o
que a gente tem”. Alguns aceitam, alguns não aceitam, na verdade eu acho que
o número dos pacientes que aceitam dá numa faixa de uns 40%, 60% nega.
P/2 - 40% aceitam?
R - Aceitam, 40% aceitam participar da pesquisa, uns dizem que se é pelo
bem ajudam, se não é não.
P/1 - Tem uma coisa também de ajudar a comunidade...
R - É na verdade, no futuro pode ser bom, pode ser rotina, pode não ser
rotina. Nos Estados Unidos eu fiquei abismado, por que aqui melhorou muito,
e as coisas são muito claras, então deixa eu contar uma passagem que é até
cômica, eu conto sempre quando falo de trabalho e o pessoal... Os Estados
Unidos queriam, quer e exige que você faça o informe de consentimento, o
FDA, as drogas, você sabe que todos esses trabalhos você tem uma
salvaguarda judicial. O pesquisador tem uma salvaguarda judicial e o
pesquisado, o doente também, o doente tem o direito de sair a qualquer
momento, ele pode ter assinado, começado a infundir a droga e cinco minutos
depois dizer: "Ah não, voltei atrás, tira tudo aí, não quero". Esse é um
direito dele.
P/2 - Ele pode isso?
R - Pode, está no termo que ele assina. E se ele achar que ele foi lesado,
ou se der uma complicação que comprovadamente coisa, ele tem seguro para o
resto da vida, alguma salvaguarda para ele também, e o médico que faz a
pesquisa só tem salvaguarda legal se ele seguir o protocolo conforme foi
desenhado. Tipo: eu tenho que fazer um exame de segurança a cada quatro horas,
mas nesse doente eu esqueci, fiz de oito em oito, se houver uma complicação com o
doente eu não tenho mais amparo legal pela pesquisa porque eu saí dentro do
que foi preconizado. Se há uma chance de sangrar e o doente sangrou porque
eu fiz exame de oito em oito se eu tivesse feito de quatro em quatro, já tinha detectado a
possibilidade do doente sangrar antes das oito. Hoje é mais seguro, mas eu
acho que aqui no Dante... No Dante mesmo, tem doente que, né, SUS: "não sei
assinar", então o familiar assina e ele passa o polegar. Mas às vezes você
vê alguns que são inteligentes, então ano passado nesse aí de trombolítico
entrou economista, advogado, tive três advogados e assinaram. Você sabe quando
o cara é advogado quando ele começa a rubricar todas as folhas do informe
de consentimento. "Mas que cara é esse? É para assinar lá atrás". Esse
negócio de rubricar tudo só pode ser uma pessoa: advogado, mas participa.
Eu acho o seguinte, existe essas pesquisas internacionais que colocam muito
pouco em risco.
P/2 - Como é que o laboratório acessa o senhor no hospital para participar
de uma pesquisa, e essas normas, quatro, oito horas, isso já vem definido?
R - Todo protocolo tem um comitê que bola o protocolo, então tem os
estatísticos mundiais porque em protocolo é a nata, eu posso dizer em
cardiologia hoje são os ________, _________, qual é o problema do
Brasil entrar? Falta de credibilidade. A partir de 1981 nós começamos a criar
credibilidade e que os trabalhos da América do Sul poderiam ser confiáveis.
Hoje tem praticamente 15 anos de estrada, já temos credibilidade. Quem bola
o trabalho são as pessoas interessadas, nenhum brasileiro é contratado para
fazer um trabalho, não vem um laboratório internacional desse contratar:
"Doutor Rui, desenha um protocolo", isso é feito pelos grandes
pesquisadores que já têm fama, Duke University, as universidades Cleveland.
Eles bolam o protocolo, precisam de doentes, não adianta hoje com a
evolução mundial tecnológica você levar 10 anos para fazer um trabalho que
quando você lançar o resultado o remédio já não vale mais, então ele
precisa ser lançado em um ano, por exemplo, trombolítico foi lançado em um
ano, esses dois aí vão terminar em um ano, você precisa de um número de
doentes, então vem para a América do Sul, são vários centros, têm o Dante
que coordenava, agora o Incor com o professor Nicolau e o Ramires passou a
coordenar também. Então o que você tem? Vai um representante em Santa
Catarina, o Dante Pazzanese que coordena muitos trabalhos na pessoa do
professor Leopoldo, os trabalhos do Dante Pazzanese que caem na unidade
coronária, sou eu, que caem no ambulatório de coronária é quem está no
ambulatório de coronária, quem caem na enfermaria de coronária cada um tem
sua área mas são várias UTIs no Brasil. Paralelo a isso, por exigência do
FDA existe um comitê de segurança que não participa do trabalho, não é
envolvido em pagamento, em pesquisa, em nada, esse é extra e esse comitê de
segurança recebe os dados muitas vezes antes que o próprio laboratório que
está investigando, é passado para ele, tipo: eu vou randomizar 15 mil
doentes, cada 2 mil doentes vai para o comitê de segurança. Chegou 2 mil
doentes, o remédio está dando muito efeito colateral, encerra, está dentro
do previsto, continua, 4 mil. Então tem vários trabalhos que nós começamos
e foram cortados na metade, o comitê de segurança encerrou porque não deu
trabalho nenhum, não valia a pena ficar pesquisando mais. Chegou com 8 mil
o resultado foi pior do que a droga existente, agora tem trabalhos que a
droga foi tão boa que o comitê de segurança mandou encerrar e dar a droga
pesquisada a todos os outros doentes que eram placebo porque o benefício
era muito grande e era anti-ético continuar pesquisando, tem vários
trabalhos assim, principalmente hoje me insuficiência cardíaca, as drogas
novas para tratamento de insuficiência cardíaca dos estudos que saíram no
ano passado todos foram interrompidos prematuramente por causa que o
benefício foi muito grande. O que existiu isso foi o AAS [ácido acetilsalicílico], a aspirina, no
infarto agudo, aspirina na angina instável; o benefício foi tão grande
que os quatro trabalhos que estavam encaminhando foram todos interrompidos pelo
comitê de ética para dar aspirina para o grupo que não estava tomando,
então existe isso também. Agora, naquela fase um lá que começa com o
laboratório que eu disse que os remédios são caros, cada 10 que eles acham
que vai dar certo talvez um dê certo, 90% da pesquisa deles é jogado fora,
10% progride.
P/1 - O senhor poderia definir um pouco o que é angina instável, por
exemplo? Para eu entender um pouco qual é o prognóstico.
R - Você tem dois horizontes, um é a angina instável e o mais grave o
infarto agudo do miocárdio, são as duas pontas, então vamos dizer, na
angina estável o doente tem uma obstrução coronária e há um determinado
esforço sempre naquele mesmo esforço ele exige uma necessidade de oxigênio
que devido àquela obstrução o coração não consegue, tipo: ele tem uma
obstrução coronária, uma placa que seria isso aqui [mostra algo] dentro da
coronária isso aqui seria um vaso normal, isso aqui é um vaso com obstrução
de 50% e isso aqui é um vaso totalmente obstruído, então você tem 50% de
obstrução e eu deitado aqui conversando com você não tenho dor,
teoricamente 50% não tem dor, aí eu vou fazer um esforço, vou levantar um
peso, subir uma escada, alguns lances de escada, vou correr, vou jogar
futebol, dá um ataque cardíaco deveria ir mais sangue para o coração mas
naquela área que você tem a obstrução não vai o suficiente para o coração
acelerar porque ela está parcialmente ocluída, isso é angina precordial, ela é estável, se eu sempre desencadeio ela com o mesmo
esforço, então tem aquele doente que diz assim: "Eu ando três quadras me dá
dor", então não anda três quadras, anda só duas e você nunca mais vai ter dor,
"Eu subo 12 degraus de escada, tenho dor", então você não sobe 12, sobe 10.
Ele não vai ter dor, não tem. Mas depois essa placa vai crescendo, vai se
tornando instável, o que é instável? Instável é: hoje, subia 12 degraus,
tenho dor, um mês, dois meses, três meses, quatro meses subo oito degraus tenho dor,
estabilizei, muito provavelmente essa lesão aumentou. Instabilidade vai
desde a mudança da angina regular até mínimos esforços de repouso, você
acordar a noite com angina. Você nunca teve dor parado, agora passou a ter
dor parado. Você nunca teve dor no almoço, agora só no fato de almoçar tem
dor, então você deve estar com uma dor severa. Então isso estabilizou. E o
outro total é fechar totalmente igual essa aqui, rompeu a placa, deu um
coágulo, fechou e o doente, do que for, daqui para frente que deveria
receber sangue não vai receber. Então o doente infartou, vai dar infarto
nessa área.
P/1 - Do miocárdio agudo?
R - Exatamente.
P/1 - Não-Q?
R - Não, esse aqui com oclusão total assim, normalmente é onda Q. Veja bem, o
que é um infarto não-Q...
P/1 - Oclusão total é onda Q?
R - Normalmente. O que é um infarto não-Q? O infarto não-Q é o seguinte
é a mesma fisiopatologia da angina instável, você tem a mesma dor, só que a
dor é mais prolongada, apesar de você não ter uma obstrução total, você não
tem uma alteração eletrocardiográfica de necrose, você tem dor prolongada
igual a do infarto onda Q, mas você não tem uma alteração eletrocardiográfica
compatível com o infarto, mas você colhe uma enzima que mostra lesão
miocárdica e ela está alterada. Você fazer o critério de infarto precisa dois
de três fatores: dor prolongada mais alteração eletrocardiográfica ou
alteração enzimática, então posso ter dor prolongada, alteração enzimática
sem alteração no elétro é um infarto não-Q. Dor prolongada, onda Q no
elétro, é um infarto onda Q. Normalmente, o infarto onda Q sempre vai dar enzima
alterada, ele só não dá enzima alterada se o doente já tem um elétro, que
já é muito feio e que você não tem capacidade de diagnosticar no elétro
porque o elétro já é muito alterado. Mas se você tem infarto onda Q
normalmente você diagnostica no elétro, em caso que é onda Q e não-Q. Agora
a fisiopatologia da doença praticamente é a mesma. Qual é a grande
diferença entre o onda Q e o não-Q? O onda Q tem uma grande mortalidade
hospitalar e o não-Q a mortalidade é mais baixa porque o infarto
teoricamente é menor, já que não deu alteração eletrocardiográfica. Só que
ao final de um ano o infarto onda Q e o infarto não-Q tem a mesma
mortalidade. O que significa isso? Esse infarto onda Q aqui matou muito no
hospital, já resolveu o que tinha de resolver, os sobreviventes já são
sobreviventes, ao final de um ano ele mantém quase que a mesma mortalidade,
morre mais alguns dependendo do tamanho do infarto. O infarto não-Q é uma
oclusão parcial da artéria, quase não morre ninguém no hospital, mas ele
tem uma grande incidência, principalmente nos seis primeiros meses de
reinfartar e aí ele morre quando reinfarta e que ao final de um ano a
mortalidade dele...
P/1 - Se não morre antes, morre depois.
R - Isso. Que ao final de um ano a mortalidade é igual. Por causa disso que
hoje existe uma corrente que você seja muito invasivo, principalmente no
infarto onda Q, já que você sabe que o doente vai ter um segundo. É muito
alta a probabilidade dele ter um segundo.
P/1 - E o que representa então heparinas de baixo peso molecular nesse
tratamento?
R - Então vamos voltar atrás. Heparina de baixo peso molecular não eram
nada.
P/1 - Não existia?
R - Pois é. Heparina é de 1914, 1916... a Heparina é de 1914 acho, depois você
pode pegar essa data, 1914, 1916 foi descoberta a Heparina, ela foi iniciada
para trombose e em 1970 existiram vários trabalhos na literatura mostrando
que a Heparina diminuía a mortalidade no infarto. A possibilidade do doente
por estar muito tempo acamado, fazer embolia, que podia ser pulmonar, fazer
AVC, então ela era super benéfica. Foi usado muito para diminuição de
trombose. Em 1970, 1971 se não me engano, foi que surgiu a Heparina de baixo
peso molecular, 1970 ou 1971 por aí, e a Heparina de baixo peso molecular difere
um pouco em ação em relação à Heparina que é essa normal. Mas ela foi usada
primariamente...
P/1 - É a enoxaparina?
R - Não, sim, tá, o nome comercial do clexane é enoxaparina.
P/1 - Esse é o nome comercial?
R - Não, comercial é clexane. O farmacológico é enoxaparina. Mas tem tanta
parina no mundo, minha filha, tem dalteparina, nadroparina, trandoparina,
notoparina, são todas heparinas de baixo peso molecular concorrentes com
essa enoxaparina.
P/1 - Entendi.
R - Bom aí, em 1970, 1971 eles acharam a Heparina de baixo peso molecular aí
usaram para prevenção de trombose venosa. Então é o doente que vai operar a
bacia, o doente obeso, é o doente com varizes, e ela foi ótima em prevenção
de trombose venosa, e aí comparar a heparina endovenosa que é essa não
fracionada com a de baixo peso molecular prevenção de trombose venosa, ela
foi tão boa ou melhor. Tudo bem, vem indo, como antigamente, muito
antigamente, se achava que o doente tinha uma placa na coronária, ela ia
crescendo, crescendo e fechava. Em 1972 um médico começou a colocar
pacientes com infarto agudo na mesa e fazer cinecoronariografia, aí, ele
viu que pelo menos 90% dos doentes que infartavam não tinham uma lesão que
fechava totalmente, o que eles tinham eram coágulos que fechavam
totalmente, e é esse aqui ó: [mostra algo], certo? Aí se criou a terapia
trombolítica. O que é a terapia trombolítica? É uma terapia que não deixa
causar coágulo, então você joga o trombolítico na coronária, ele vem aqui
dissolve o coágulo, ela volta a ficar assim, o fluxo volta ao normal, o
coração que estava aqui para trás que não recebia sangue passa a receber
sangue, diminui o tamanho do infarto, o doente vive bem melhor. E a heparina
como tinha muito coágulo passou a fazer parte do tratamento com angina e
com infarto agudo. Por que? Porque chegou à conclusão que o doente não
podia formar coágulo. Hoje se sabe que a placa cresce por vários fatores,
mas um é o seguinte, um é ruptura. Então a placa é uma lesão que tem uma
grande piscina de colesterol, por causa que esse colesterol tem um papel
importante e quanto mais colesterol for a piscina. Acho o seguinte: se
você pensar em alguma coisa que eu penso para tentar exemplificar é uma
espinha, você tem aquela base, só que não é bonitinha assim, né, tão
bonitinha igual a espinha que é toda redondinha, você tem aquela base, tem
o pus quando forma na espinha, não tem? E quando você espreme não sai
aquela...mas sempre sangra não é? Você pode ter isso dentro da coronária.
Tem alguns fatores como: você correr, aumentar a frequência do coração,
aumentar a pressão, fumar, que aumentam a pressão intracoronária, rompe
aquela placa de gordura, ela sai. Dependendo da profundidade e do tamanho
dessa ruptura que normalmente é na borda entre a piscina e a base o
organismo vai lá cicatrizar, o que o organismo vai cicatrizar? O organismo
manda um monte de plaquetas, um monte de fibrina, forma uma rede, aí, todas
as células vão ficando lá, vão ficando, forma o coágulo. É igual quando
você sangra não forma um coágulo na pele? Só que aqui está na pele, está
para fora, lá é dentro da coronária. Oclui a coronária totalmente e o
doente infarta. Isso foi o que o cara descobriu com essas
cinecoronariografias. O que se faz hoje? Hoje se sabe que todo mundo
que tem angina estável, que tem infarto onda Q e que tem infarto onda Q e
morte súbita, a grande maioria 90%, a fisiopatologia é essa: rompe
artéria, forma coágulo, oclui artéria. Se oclui totalmente o doente pode
morrer subitamente, aquele doente que morre dormindo, as vezes é o doente
que está correndo no parque que infartou durante a corrida ou qualquer
outra. Esse morreu subitamente porque a isquemia era muito grande deu
arritmia, morreu, ou o doente chega com infarto para você. 40% dos doentes
de 100% que infarta onda Q, na rua, 40% morre na chegada ao hospital. O
sobrevivente que chega no hospital já é um sobrevivente, está entre os 60,
desses mais uns 15 vão morrer no hospital e vai sair 55 da população. Da
angina instável o que é que faz? Rompe, aumenta mais a artéria mas não
fecha totalmente, então o doente tem angina instável. Assim esse é um
mecanismo que cresce hoje, se você fizer estudo anatomopatológico de uma
placa hoje, você vai ver que tem uma camada de sangue, depois ela foi
crescendo, cicatrizou, depois outra camada de sangue e assim que a placa
vai crescendo. Cada vez que você tem uma angina instável tem uma ruptura,
muito provavelmente uma ruptura pequena, que não teve um grande coágulo,
que não fechou totalmente a artéria, e por causa disso que você não
infartou, mas você teve um sinal lá que a angina instável. Perigo da angina
instável: evoluir para um infarto onda Q e óbito, mas a chance de um paciente
com angina instável morrer é de 3 a 5%. Agora de infartar vai até uns 10%
se somar os dois. E o infarto não-Q a mesma coisa. Então é isso aí que é
a diferença, normalmente quem tem angina instável e infarto não-Q tem
artéria aberta. Quem tem infarto onda Q não tem artéria aberta. Você podia até
mais ou menos fazer o inverso: 90% dos infartos onda Q, a artéria está ocluída,
90% dos pacientes com angina instável e infarto não-Q a artéria está pérvia.
P/1 - Que é esse caso aqui [mostra]?
R - É esse caso aqui, mas dá dor. Se o doente está instável e tem uma
ruptura e tem um coágulo pequeno lá, você não adianta dissolver o coágulo,
porque a gente já deu o remédio para dissolver esse coágulo, no infarto onda Q,
ele é eficaz, na angina instável ele mata mais. Por exemplo se você der
trombolítico na angina instável, que tem lá um pequeno coágulo, ele ativa
tanto o rebote, a cicatrização endógena que ele aumenta a incidência de
infarto. Então o que se fez? O doente chegou com angina instável para você,
ele já não infartou, você dá heparina para ele. Por que qual é a ação da
heparina? Não deixar formar coágulos. Aquele que está lá, que já
estabilizou, já existe, mas ela faz uma anticoagulação circulante que o
doente não anticoagula mais, se não anticoagula mais, não fecha mais. A
teoria é essa. Lógico que alguns, dependendo da tamanho acaba até evoluindo
para infarto, mas o anticoagulante não permite que coagula. Heparina hoje,
em 1999, é uma droga de escolha no tratamento de angina instável e infarto
não-Q, por essa fisiopatologia. Associada a isso o AAS, que tem uma ação
de plaqueta.
P/1 - Mas hoje já é uma heparina de baixo peso molecular?
R - Não, vamos chegar lá. Beta bloqueador que é um remédio que diminui a
contratilidade cardíaca, diminuindo a contratilidade cardíaca, ele diminui a
força do coração, diminuindo a força do coração ele irrita menos as
artérias, ela já está mais estável, diminui o trabalho cardíaco, ele dá um
repouso. E nitrato, que é nitroglicerina, que é um nitrato sublingual que
vocês vêem aí, que é o dilatador.
P/2 - O AAS funciona como anticoagulante?
R - Antiplaquetário. Para você ter um coágulo, você tem a fibrina e tem
que ter a plaquetas grudadas na fibrina. O anticoagulante pega muito
fibrina e a plaqueta é pelo AAS, age nos dois: diminui a força do coração e
vaso dilata com o nitrato. Isso vinha vindo assim, tudo muito bem, aí
apareceu a heparina, acho que foi a primeira pessoa que testou a heparina de
baixo peso molecular foi um argentino chamado Gurfinkel, que eu não sei
o ano, mas acho que foi 1991. Fez um pequeno trabalho piloto e deu heparina
endovenosa contra heparina de baixo peso. Mostrou no pequeno número dele que
acho que são...não sei quantos doentes são, mas não chega a 300, que a
heparina de baixo peso, se você colocar a necessidade de cirurgia de
urgência, infarto agudo do miocárdio e óbito, foi melhor que a heparina
endovenosa. Mas isso é trabalho pequeno, nós estamos cansado, na
literatura, de ver trabalho pequenos, que tem por chance, mostram um grande
trabalho, um grande benefício, começa a dar doente, aí quando faz um
trabalho grande ele acaba não se comprovando. Tem outros trabalhos na
literatura, em outras doenças, mas eles fizeram aí um grande estudo chamado
Essence, com a enoxaparina. Fizeram o time 10A, foi feito pelo professor
Braunwald, da Havard, no 10A eles tentaram achar a dose ideal da
heparina de baixo peso, que já foi usada no Essence. O Essence mostrou que a
enoxaparina, usada na experiência de enoxaparina, diminuia muito a
mortalidade. Esse grupo, o Essence, o grupo do Braunwald, que tinha feito o
10A, fez o 11, time 11, tem grupos já famosos no mundo que ele começou a
"time um, time dois,três,quatro ..." e cada vez que ele vai pesquisando. Estou
participando agora do time 18, quer dizer já fizeram 18 grandes estudos. Se você for ver o grupo do (Gusto?) tem...
P/1 - Você está participando agora?
R - Agora no 18, mas nada de heparina. O Gusto é Gusto um, Gusto dois, Gusto três, Gusto quatro. O pessoal do (Tame?) é Tame um...Ele usa aquela sigla que já
identificou ele no mundo. Então o time11B chegou à conclusão de um
resultado muito melhor com a heparina de baixo peso molecular, batendo em
cima com o trabalho do Essence, o time11B foi mostrado no Congresso Europeu
de Cardiologia de agosto de 1998. Isso é uma coisa super recente, ano
passado, agosto, né? Fora isso existe aqui um problema sério, existe 2
estudos concorrentes um chamado FRIC e outro chamado FRISC que
utilizaram outra heparina de baixo peso, o dalteparina. Um contra placebo,
aí mostrou que era melhor a heparina de baixo peso, porque o outro não
estava tomando nada, estava tomando placebo e comparou a heparina de baixo
peso versus heparina, acho que foi no FRISC, aí, não deu diferença nenhuma.
Então tem um que não deu nada. Qual é a alegação hoje, qual é a
controvérsia mundial? A controvérsia mundial está no local de ação da
heparina de baixo peso. Existe uma controvérsia importante aqui: a Rhodia
defende que a enoxaparina é a heparina de baixo peso mais potente e por
causa disso é que ela tem esse benefício. O pessoal do dalteparin que não
mostrou esse benefício todo, e ela é menos potente que a enoxaparina
sabidamente dentro de uma razão que existe, diz que embora ele não seja tão
potente eles criaram os exames para diagnosticar anticoagulação e os
doentes estavam super anticoagulados adequadamente anticoagulados e não
tem a razão de alegar que a capacidade da dalteparina é menor, já que eles
aumentaram a dose. Se ela era menos potente, aumentando a dose teria uma
ação, mediram a ação, disseram que é igual, que também é lógico, mas isso é
uma controvérsia mundial. A única heparina de baixo peso molecular que até
hoje mostrou benefício em angina instável é a enoxaparina. Qual é o
problema disso aí? O problema disso aí é o seguinte, para o hospital, para
o médico manusear é super importante. Quando você faz heparina (EV?) num
doente, por melhor que seja sua enfermagem, por melhor que seja seu
equipamento que você está usando, a heparina precisa de muitos co-fatores
individuais. Se o doente tem um nível de proteína mais baixo que o outro
ela já oscila. Se o doente tem um fator mais baixo ela já oscila. Então é
muito difícil você anticoagulação com heparina, porque às vezes você faz uma
anticoagulação que o doente está super anticoagulado, seis horas depois ele
está mediamente anticoagulado, depois ele volta super anticoagulado,
depois ele volta não anticoagulado, depois ele sobe para anticoagulado.
Se você pegar cem pessoas que toma, heparina, e você for boa, um serviço
muito bom, muito organizado, você hepariniza adequadamente 30% dos doentes,
numa faixa estável, os outros você pode heparinizar, num estado de
anticoagulação, mas vai para cima, para baixo, oscilando. Pode ser que no
pico você fica tanto anticoagulado com hemorragia interna, aí você tem uma
complicação com anticoagulação, ou muito baixa ela não tem ação sobre a
placa, a placa acaba crescendo e fechando, está certo? Então hoje se sabe
que o doente que toma heparina EV tem uma faixa de benefício - que o tempo
de coagulação do sangue é dada em segundos. Você hepariniza 30% dos doentes, numa faixa estável, os outros você pode
heparinizar, num estado de anticoagulação, mas vai para baixo, para cima,
fica oscilando. Pode que no pico você fique tanto anticoagulado como você
faça uma hemorragia interna, aí você tem uma complicação de
anticoagulação, ou muito baixa ela não tem ação sobre a placa, a placa
acaba crescendo e fechando, está certo? Então hoje se sabe que o doente que
toma heparina EV, tem uma faixa de benefício, que o tempo de coagulação do
sangue é dada em segundos, normalmente o normal meu, seu, vai de 20 a 30.
Se você for fazer agora, me dá aqui vou ver sua anticoagulação, vou ver
aqui na maquininha seu tempo, vai dar entre 24 e 30. A gente leva de 2 a
2,5, o que seria 1,75 dependendo se for 30, mas entre um normal de 50 a 75.
Anticoagulo o doente inadequadamente, fica abaixo de 50 ele infarta mais,
morre mais. Quando anticoagulo o doente que vai acima de 75 ele faz mais
acidente vascular cerebral hemorrágico, morre por AVCH ou
reinfarto não se sabe o mecanismo. Então é muito difícil, dentro dessa
oscilação da heparina você manter essa faixa. Com a heparina subcutânea, como
ela age em outro locais, vamos dizer, mais anti-trombótico do que
anticoagulante que essa heparina EV, ela tem uma anticoagulação estável,
você não precisa fazer exame de laboratório para controlar, dificilmente
você quase não tem acidente vascular nenhum cerebral e ela é efetiva ou
mais efetiva que a heparina. Então você não precisa colocar bomba de
infusão, não precisa correr o risco de heparina endovenosa, e você coloca
essa heparina num doente com uma injeção subcutânea. Então é fácil de
administrar, fácil de conduzir o doente...
P/1 – Esses são os benefícios?
R – Esses são os benefícios, além de diminuir mortalidade, infarto, etc.,
maior facilidade de manuseio.
P/1 – E o custo?
R – O custo é uma coisa que é preciso ser levado em conta. Eu já apliquei, a turma fica brava comigo mas ... sabe que o Brasil é o ... custo no Brasil
é uma sacanagem. Porque custo no Brasil, por exemplo assim, nós temos a
estreptoquinase, que é o trombolítico, menor trombolítico vamos dizer
assim, que na Europa se usa, nos Estados Unidos se usa pouco, mas que nos
Estados Unidos é 100 dólares o tratamento, 150. E no Brasil é 540.
P/1 – O frasco?
R – O frasco. No Brasil nós não temos condição de comprar, compramos o mais
barato, é o que mais vende, não é tão eficiente quanto o outro e é mais
caro do que em relação ao mundo. Lá eles usam TPA que é 2.200, no Brasil
TPA não vende, eles vendem aqui por 1.800, 1.700 e ninguém compra porque
ninguém tem dinheiro para comprar, por causa de custo. Então nós temos o
TPA que seria o melhor trombolítico teoricamente pela literatura do
mundo, mais barato, não utilizamos e temos o outro que é pior e mais caro
do mundo. Que se tivesse vendendo a 150 para nós seria ótimo. Assim a
heparina de baixo peso molecular (fenômeno?) Europeu Áustria, porque é
desenvolvida na Europa, chega a ampola aqui no Brasil que é o dobro ou
triplo do que é vendido no exterior.
P/1 – Nossa!
R – É, nossa. Agora comparar, se você comparar a heparina endovenosa com a
enoxaparina no preço, uma é mais cara que a outra, mas se você comparar que
você não vai coletar sangue de seis em seis horas para manter a coagulação, que
você vai pegar a injeção e vai fazer na barriga do doente ela já vem com a
injeção pronta você não vai gastar uma seringa, você não vai gastar o
profissional de laboratório, você não vai medir TPA, não vai gastar luz
da máquina, você não precisa do aparelho para fazer a anticoagulação do
doente, acaba sendo mais barato. Eu acho, custo benefício. Mas o mais certo
era vender mais barato.
P/1 – Mas aqui no Brasil o clexane é o único que está regulamentado?
R – Não, a heparina de baixo peso molecular porque nós seguimos o que os
americanos dizem, talvez essa nossa unidade vigilância sanitária do Serra
funcione, tomara Deus, pode passar a ser regulamentado ou não as coisas no
Brasil. Mas liberado para tratamento de angina instável no mundo, que tenho
conhecimento, é só a enoxaparina. As outras heparinas de baixo peso
molecular não foram liberadas para angina instável, são liberadas para
prevenção de trombose venosa pós-cirúrgica, são liberadas heparinas de baixo
peso molecular para isso, mas não como tratamento de angina instável. A
única heparina que até hoje que mostrou benefício em angina instável é a
enoxaparina tanto pelo Essence como pelo time11 e, aí, o FDA liberou. Nós
não somos, existe um problema sério no Brasil, existe algumas coisas
diferenças. Se você for a um congresso americano e tu tem aqui o box da
dalteparina e aqui o box da enoxaparina, está certo? Aí, tu vai lá, a
enoxaparina está lá: "Liberado para angina instável pelo FDA”. E aqui tem
o (bobim?) também tem uma heparina de baixo peso molecular e diz para ti: "
A minha também é uma heparina de baixo peso molecular está liberado pela
angina instável, porque você sabe que a heparina de baixo peso molecular é
boa para angina instável e a minha é igual." O FDA vai lá fecha este
aqui e prende os caras. Então quando eles tem trabalho liberado para angina
instável, eles dão trabalhos da enoxaparina que não seja enoxaparina, a
dalteparina, por exemplo põe assim: "Esse medicamento é uma heparina de
baixo peso molecular não liberada para tratamento da angina instável.” Isso
nos Estados Unidos e tem fiscais do FDA que vão de estande em estande,
fazem pergunta sobre medicação, representantes para ver e tudo. Aí nós
passamos para o Brasil. Aí no Brasil diz-se assim: "Ah heparina de baixo
peso molecular, todas são iguais, todas são heparinas, é uma questão de
anticoagular ou não!" Mas o Ministério da Saúde não proíbe ou fiscaliza
propaganda. Então quem lê muito tem conhecimento, quem não lê muito ...
posso dizer: "Minha heparina de baixo peso tem vários trabalhos heparina de
baixo peso molecular que são bons na angina instável." Você pode vender.
Por exemplo, o FRISC é uma trabalho com angina instável, mas não mostrou
benefício e o FDA não liberou, mas foi feito com angina instável, mostrou
que ela é no mínimo igual à heparina. O que justificaria você usar por
comodidade. Então quem não tem um bom laboratório, quem não tem como fazer
o TTPA, quem não tem como coletar sangue, poderia usar, ela é igual, no
mínimo igual. Mas existe essas diferenças no mundo em termos de
fiscalização, propaganda enganosa, nós ainda estamos engatinhando para
propaganda de ...né? Pode ver propaganda enganosa de um monte de coisas
existe no Brasil, nós ainda estamos encaminhando para dar uma
regulamentação disso. No meio médico existe isso. Quando vai acabar isso
não sei. Agora até onde também a heparina de baixo peso, nessa razão de
potência e isso está tudo correto não sei. Você está vendo que o resultado
é de seis meses, são coisas novas, muito recente. Isso para angina instável e
infarto não-Q. Para infarto onda Q, existe trabalho começando, em paciente
com infarto pequenos não mostraram benefícios. Em pacientes que fizeram
angioplastia com heparina de baixo peso molecular não mostrou benefício. Em
paciente com angina estável não tem trabalho que tenha mostrado benefício.
Em pacientes com infartos grandes que formam trombos dentro do coração aí
tem benefício. Tu sabe que nós estamos numa sinuca, né, médico? Médico, antigamente existia esse negócio de baseado em evidência, não baseado,
Internet, com a Internet agora se você pegar e acessar o Canadá, existe um
centro no Canadá da Universidade Concordia, chama lá infarto agudo do
miocárdio, aí está lá: " O tratamento de infarto agudo é isso, isso,
isso...O trabalho mostrou isso, aquilo, esse…” Tudo lá. Você pode chegar
aqui no meu consultório mais do que eu. Só que não sei quando vai acessar,
mas a grande maioria que tem Internet, hoje você na Internet você consegue
tratamento da grande maioria das doenças no Canadá, que é por essa fundação
Concordia, a sede no Brasil é na Escola Paulista de Medicina, existe o
endereço na Internet. Mostra o que os trabalhos mostraram das diferentes
doenças.
P/1 – Nesse quadro, como é que você vê a propaganda médica, o trabalho do
propagandista que vem no consultório, através da literatura?
R – Acho que o propagandista, antigamente eles eram muito ruins, então
falava "tiriri". Mas também precisou o médico melhorar para saber que eles
eram ruins, né. Sou meio conservador, acho que com remédio novo é preciso
ficar com o pé atrás. Existe hoje a medicina baseada em evidências, que
você tem hoje, por exemplo assim, você vai ver tratamento de infarto, hoje
é fácil você pegar 30, 40 mil doentes, se você der uma droga para 40 mil
pacientes e viu que ela é boa em 40 mil dificilmente ela vai ser ruim, né.
Por outro lado os laboratórios têm trabalhinhos com 30 doentes, 50: "Ai eu
fiz essa droguinha aqui com 50 doentes, os caras ficaram tão bons..." Com
50 doentes é incapaz de você ver mortalidade, não é verdade? E coincidência
daquela doença de morrer? Melhora a qualidade de vida ele coloca na esteira
do doente que tomou, o remédio fez menos angina na esteira durante o
esforço. Você passa a prescrever. Aí, vai da capacidade do médico de
entender trabalho científico ou não entender, né. O que o trabalho é sério
e o que o trabalho não é sério. A literatura médica não publicava
insucesso, nunca! Acho que insucesso na literatura médica vem de 1992, que
hoje os grandes pesquisadores estão exigindo em contrato que se der
insucesso ele vai publicar. Isso não era cláusula de contrato antigamente.
Então a literatura médica é feita de sucesso, o laboratório não deixa
publicar o insucesso, não é verdade? Então todos remédios é bom. Porque o
que ele pesquisou e deu errado ele mostrou trabalho que deu certo. E o que
deu errado? Hoje, nos últimos anos é que os insucessos estão sendo
publicados. Hoje já existem medicações que você diz: "Tira para fora."
Agora esse trabalho do propagandista...depende muito do propagandista, né,
depende do conhecimento médico. O sucesso do propagandista depende muito.
P/1 – Tem diferenças entre os laboratórios, por exemplo, do propagandista do
laboratório "X" para o "Y"?
R – Não, acho que há diferenças de propagandista para propagandista. Tu
sabe aquele que decorou lá no laboratório e vem dizer para nós: "Doutor,
olha aqui, eu vou lhe dar esse remédio porque ele é muito bom porque salva
coração..." Aí chega um cara para falar com você, e você diz: "Pode
continuar." Aí ele diz: "Uhn..." Porque a decoreba dele foi interrompida,
né. E tem quem sabe, quem estudou. Hoje acho que melhorou os propagandista,
fisiopatologia, sabem mais coisas, mas ainda não são bons. Ainda acho que a
propaganda poderia ser mais séria. Tem muitos que tenta colocar você dando
passagem, né. Lança um novo remédio, convida você. Não tem nenhuma pesquisa
médica no mundo que não tenha um laboratório por traz, não tem. Só essas
que não vão dar lucro, né. Veja bem, se o laboratório pesquisou a droga 10
anos, achou a dose e colocou lá para a fase três de pesquisa para ver se o
remédio dele tem benefício, isso tem um custo 15, 20 anos para sair isso
aí, 15 anos em média. 15 anos de pesquisa. A uroquinase viajou na NASA
com todos esses astronautas, para purificar, quanto é que vai sair uma dose
de uroquinase para você? Morreu na casca! Não trouxe grande benefício. Era
tão cara, estupendamente tão cara que teve que jogar fora. Imagina quanto
gastou o laboratório. Tem um remédio lançado agora no Brasil que era...não
vou dizer, bom, de um laboratório que era assim o remédio revolucionário,
levou todo mundo para o Rio. Leva lá, mostra. Acho assim, depende da
crítica de quem está assistindo. O cara me levou lá para ver o trabalho
dele, tudo bem, me deu um jantar, me mostrou o trabalho dele, ótimo. Agora
acho que depende da crítica, se você não tiver um conhecimento sai de lá
contente com o jantar vai prescrever aí o cara te convida sempre. Isso é
uma coisa de cabeça. Agora toda uma propaganda é feita em cada remédio, em
cada lançamento.
P/1 – O senhor já trabalhou, já desenvolveu algum trabalho com parceria com
algum laboratório?
R – Nunca. Bom, trabalho nessas multinacionais todos são relacionados a
laboratório, mas eu especificamente não, nunca.
P/1 – Quais são os grandes desafios hoje da sua área de especialização?
R – Da cardiologia? A principal?
P/1 – É.
R – Educação do povo. Se o povo escutasse um pouco o médico em profilaxia,
em abandonar fator de risco. Existem cálculos, veja bem, hoje você tem
estreptoquinase trombolítico no infarto agudo contra um TPA que a
diferença entre um e outro é 10% e termos de eficiência. Mas que se o povo
chegasse com infarto na primeira hora, logo que tivesse a dor no peito
viesse rapidamente para o hospital e tomasse o trombolítico, muito
provavelmente eu diminuindo duas horas o tempo médio de infusão da medicação
do que tem hoje no mundo, salvaria 10, 15 mil vidas a mais, com a medicação
que tenho hoje. Com essa nossa entrada em trabalhos de multicêntricos
internacionais o mundo chamou a atenção numa coisa em pesquisa nós não
somos muito ruins não. Aí estão mandando o doente, o senhor José da Cunha,
infarto, senhor Pedro, infarto, infarto, aí o cara ligou lá do Canadá e
disse: "Vocês já prestaram a atenção em uma coisa, 50% dos infartos do
Brasil que vieram para cá tinham abaixo de 50 anos, sabia disso?" "Não
sabia." Porque manda oito, outro manda 15, a população brasileira hoje, da
América do Sul com a nossa e a da Argentina é provavelmente a população
mais jovem que infarta no mundo e nós ainda continuamos tomando muita
cerveja, fumando bastante, fazendo bastante churrasco, fazendo tudo, né.
Não fumamos bastante? A gente que é por causa do fator de risco, porque nós
não controlamos a pressão alta, porque nós continuamos fumando muito,
porque nós comemos muito churrasco com alto índice de colesterol. Nos
Estados Unidos 14% tem abaixo de 50 anos, no Japão são 12, no Brasil são
50. Aí tu diz: "Isso foi no trabalho de vocês", aí, o Dante fez um trabalho
para o Brasil agora, que muito provavelmente vai ajudar, não é um grande
trabalho, nós estamos pegando o seguinte, isso foi idéia lá do Leopoldo e
de um rapaz que estuda no Canadá, cada doente que interna infartado em 21
estados, em 101 UTIs do Brasil, pega um infartado, pega um doente que está
internado no hospital colhe colesterol, pergunta se fuma,vê se tem pressão, vê se tem pressão, isso é para quatro mil
doentes, vão ter dois mil doentes infartados contra dois mil doentes não
infartados e vamos ver o fator de risco a diferença. Isso nem o Ministério
da Saúde mal sabe, mas mesmo hoje em 2100 doentes que a gente tem ainda são
infartados abaixo de 55 anos é 50%, nessa mesma população. Agora diz para
mim, 50 anos é ativo tem filho de 15, 16, 20 não é verdade? Tem uma
experiência importante na vida da nossa população está infartado, diz que é
para parar de fumar, 53% fuma, 60 e tanto é hipertenso, então a educação do
povo: ótima. Veja bem, provavelmente a nossa cardiologia aqui é igual a do
mundo nós temos todos os equipamentos, não temos a disponibilidade que o
mundo tem, mas certos hospitais têm o que o mundo tem, mas para evitar
infarto nenhum equipamento desse evita, se o doente chegar até uma hora para
você e você abrir a artéria do doente ele vai ficar provavelmente sem
cicatriz mas nenhum doente chega, a média de chegar no hospital com infarto
é de quatro horas para cima. Então o doente deveria saber que quando ele tiver
uma dor ele deveria procurar o hospital, profilaxia, drogas que diminuem o
colesterol, que antigamente diminuíam muito o colesterol mas as drogas todas
tinham um efeitos colaterais que eram demais hoje as drogas são excelentes
mas o custo, no Brasil precisa abaixar o custo. Você toma uma droga, deu 80
reais para tomar por mês, há quantos milhões tendo 120 de salário. Isso é
outra coisa, o Brasil é um país do terceiro mundo, mas tem doenças de
primeiro, porque doença coronária patho é uma doença de primeiro mundo.
Então nós além de termos uma doença de terceiro mundo que é o valvular,
temos uma doença de primeiro mundo que é o coronário patho. E aí você diz:
"Só o rico infarta", vai ali no Dante, pedreiro... Por que? Porque é uma
dieta errada, dieta gordurosa, fumante, então eu acho assim, educação é uma
coisa que ajudava muito. No mundo, para você não ter infarto é profilaxia,
mas está diminuindo isso no mundo. Antigamente esse infarto onda Q, que matava
mais subia, hoje ele está descendo e a angina instável está subindo. Então
a gente já trata mais a angina instável pré-infarto do que infarto. No
Brasil não, né? Isso é na Suécia e nos Estados Unidos. Os Estados Unidos
está largando Mc Donalds, Pizza Hut e o Brasil importou, sorte que o dólar
subiu um pouquinho [risos]. Quando eles estão deixando nós estamos
começando.
P/1 – Na sua opinião qual foi o maior avanço da indústria farmacêutica até
agora na sua área?
R – Na minha área, farmacêutica, acho que terapia trombolítica, heparina de
baixo peso molecular é um grande avanço, as drogas hipolipemiantes é um
grande avanço, os inibidores de enzima de conversão é um grande avanço.
P/2 – Fiquei curioso com a ideia da profilaxia, que tem essa questão da
educação, utilizar remédio de forma profilática é isso, tem sentido?
R – Tem. Por exemplo assim, o paciente tem uma angina estável, você não
quer que ele se torne instável e nem infarte, qual é o remédio que diminui
isso? Exercício físico, o médico manda andar 40 minutos mas ninguém dá
bola, nem eu ando. O AAS, o betabloqueador e a droga hipolipemiante, elas
realmente diminuem, agora isso na medicina é tudo probabilidade, não é
verdade? Quantas vezes você já ouviu na sua vida dizer assim: "Ah, fulano
fumava, tinha câncer de pulmão. Fulano nunca fumou e teve câncer de
pulmão." Você nunca ouviu isso? Tem até médico que diz isso, dá vontade de
dar um...Só que se você pegar 100 fumantes, 30 vão ter câncer no pulmão. Se
você pegar 100 não-fumantes, é três. Porque a doença não é um fator, por
exemplo se você der um anti-agregante, vai resolver? Existem agora os
anti-agregantes, o ápice dos antiagregantes estão saindo, são drogas que
diminuem agregação plaquetária em fase final, o doente não anti agrega de
jeito nenhum, fica zero, não tem capacidade de formar coágulo. Isso em
trabalhos pequenos ele era excelente. Sei que dois grandes acabaram agora e
não ganharam do AAS. Porque continua sendo, remédio brasileiro, barato, bom
e eficaz. Agora não sei quando vai ser isso aí. Se você for na literatura
existem coisas que você faz que comprovadamente diminuem o risco. Essas
coisas deveriam serem iniciadas: parar de fumar, depois de 4 anos você
diminui o risco, emagrecer, caminhar, essas coisas vocês deveriam fazer,
essas coisas você só vê em cidades de praia, né, se você vai em praia todo
mundo está caminhando, mas em São Paulo não dá para fazer isso. De um modo
geral, se você for em países civilizados todo mundo faz, todo mundo anda, é
outro...
P/1 – Andar o que, uma hora por dia?
R – Andar uma hora por dia? Eu nunca sabia a quantificação, agora tem um
norte americano que quantificou isso, na verdade se deveria gastar 1.200
calorias por semana. Se você caminhar 40 minutos por dia acelerado você tem
que fazer no mínimo cinco vezes por semana. Se você fizer um esforço mais
forte, você pegar uma esteira e correr, você poderia correr dia sim dia
não. Mas na verdade ao final, para ter benefício, de algum tempo você
deveria gastar 1.200 calorias por semana, para dizer que seu exercício é
efetivo. Isso é uma teoria nova, mas o médico de uma maneira geral manda
caminhar 40 minutos, em dias alternados, no mínimo quatro vezes por semana. Todo
remédio que fosse profilático seria bom, não é. Tratar infarte é bom, mas
depois que o doente tem algum você recupera, mas tem muitos, quer dizer, o
doente sai vivo. Não é negócio hoje você tratar um doente com infarto para
ele sair vivo do hospital. O objetivo do tratamento é tratar o doente para
ele sair com a menor cicatriz possível, para que ele possa ter uma
qualidade de vida ideal, boa. Não adianta sair um doente lá com um coração
todo lesado, que vai ter insuficiência cardíaca, que vai encher a perna,
que vai tomar 15, 16 remédios qual é a vantagem disso? Quer dizer, lógico
que para a família é muita vantagem o doente sair vivo ...
P/1 – Mas os equipamentos de certa maneira melhoraram a qualidade de vida
do paciente, pode-se dizer isso?
R – Pode. Acho assim, espero estar certo, houve o tempo do cirurgião
cardíaco, que o cirurgião resolvia tudo, botava ponte, ponte é de 1968,
hoje você já tem indicações determinadas para ponte, você sabe o grupo de
doentes que vai se submeter a cirurgia miocárdica e provavelmente vai
ter benefício, tem doente que é até passível de se submeter a ponte, mas
que não vai ter benefício nenhum. O cirurgião vai lá põe uma ponte: "Botou,
jóia.", não vai mudar nada a vida dele, pode ser que ele passe a ter menos
angina, mas em termos de prolongar a vida, não muda em nada. Aí veio a
hemodinâmica, passou de diagnóstico para tratamento. Tratamento
intervencionista com angioplastia, com implante de prótese coronária, é uma
coisa que de 1981 para cá você não tem noção. O Brasil a 3, 4, 5 anos atrás
tinha um estente, um tipo, hoje tem 20 e tantos de estente diferente.
Não adianta um hemodinamicista comprar 100 catéteres, porque daqui a 6
meses saíram tantos novos que aqueles 100 dele já ficaram obsoletos, a
evolução é tão grande. Mas o que nós não tínhamos tido evolução: em
medicação, nós não tínhamos. Nós estávamos no mesmo hipolipinhante antigo,
nós estávamos na mesma eparina, nós estamos no velho AAS. O AAS tem 100
anos, também se ele tivesse sido descoberto hoje o comprimido seria um
milhão, né? [risos] Não é verdade? Sorte que ele tem 100 anos. Tu vê, o AAS
entrou na cardiologia porque um cara pensou no efeito colateral do AAS, que
era antiplaquetário e fazia sangrar, porque ele foi idealizado para ser
anti-inflamatório, como dava úlcera, dava muita coisa, aí ele pegou e
colocou para atuar no coração pelo efeito colateral dele, pensando na
fisiopatologia do doente. A partir de 1984 é que ele pegou. O AAS para o
coração é uma coisa nova e uma das melhores drogas existentes. Tu sabe que
no mundo tem mais de três toneladas de AAS por ano se usa. Sabe quantos
milhões? Não sei quantos trilhões de comprimidos, mas deve fazer três
toneladas de AAS.
P/2 – As pessoas começam a tomar isso com 18 anos para se prevenir, tem
perigo como ação profilática?
R – Não, veja bem, é isso que a medicina faz, você tomando AAS tem menor
probabilidade de infarte comprovado em quem já teve o sintoma. Você teve
angina, você tem que tomar AAS. Você teve ________ você toma AAS. Você
teve infarto, você toma AAS. Prevenção primária, você nunca sentiu nada:
"Ah, vou tomar um AAS para não ter infarto." Isso não se tem dados que
mostrem. Você controla com medicação e dá o AAS. Veja bem, você tem que ter
tido o evento coronariano, ele não entra em prevenção primária, entra só em
prevenção secundária. Existe um trabalho de médicos que tomaram AAS, um
trabalho de enfermeiras que tomaram AAS, na verdade não foi assim sorteado,
porque a grande coisa do mundo hoje é que tem que ser sorteado: um toma
outro não toma. Então se levantou as enfermeiras que tomavam AAS pela
cabeça delas e os médicos, contra os que não tomavam e mostrou benefício.
Só que como não era sorteado, não era randomizado como se chama, a gente
fica em dúvida porque a pessoa que por si só iniciou a tomar AAS será que
ela já sentia alguma coisa e negava o sintoma? Porque uma pessoa toma AAS,
se nunca ninguém falou para tomar? Algum motivo levou ela a tomar. Será que
uma população que toma AAS já não é uma população mais doente do que a
outra que não tomava? Mas mostra um benefício. Então para familiares,
dessas famílias que tem três irmãos, dois infartados, o pai infartou, a mãe
infartou, só tem um que não infartou. Descendência familiar é muito
importantes, para esses pacientes a gente está prescrevendo como prevenção
primária, sem ele sentir nada. Mas para um subgrupo de risco muito grande,
agora para os outros somente se teve o evento. Então é secundária.
Hipolipinhante tem trabalho na literatura monumentais já. Sabe que
colesterol é uma coisa que a gente ... por que o nível de colesterol é 240?
É porque provavelmente isso é do americano, ou é do brasileiro? Do
brasileiro que não é, né? [risos]. Quem é que determinou que 240 é bom? Por
que 240 é bom, por que tu vai num laboratório está lá 240? Hoje para
coronário patho a gente quer 200, não quer mais 240. 240 ainda é alto, mas
para quem nunca teve evento na família, tudo bem. Por que? Porque se sabe
hoje o seguinte: pegou um japonês do Japão, aí, diz que o problema é
genético só, aí pegou o japonês do Japão, pegou os descendentes dos
japoneses do Japão que foram para o Havaí e os descendentes dos japoneses
do Japão que foram para a Califórnia. Na Califórnia se come muita gordura,
no Havaí mais ou menos e no Japão muito menos. O japonês da Califórnia
infarta muito mais que o do Havaí e o do Havaí muito mais que o do Japão.
Embora a genética seja importante a alimentação também é muito importante.
P/1 – Fator cultural?
R – Não, de dieta. E porque eles quiseram fazer isso? Todo mundo dizia o
seguinte: "Não, porque isso aí é genético, é só genético". Não, a
hereditariedade é muito importante, mas tu vê que tem a população tem
importância se você pegou da mesma família de japonês. Então o que se fez
hoje? Já existem trabalhos de prevenção primária de hipolipinhante que
mostram que o doente que toma, para nível até normal, você já está dosando
subfrações de colesterol e atuando nas subfrações mostra que o número de
eventos é menor, agora isso é garantia 100% que você tomando não vai Ter?
Não, isso não existe. Exame que der 90% de certeza é excelente. Você fazer
um teste ergométrico negativo: "Estou garantido." Não, você está garantido
em 70, 75%. Os 25% de possibilidade você pode ter feito este teste e ter
dado negativo e duas semanas depois você estar infartado. Você caiu na menor
probabilidade. Porque às vezes o médico ... Acontece caso: "Ontem fui no
médico ele disse que estava tudo bem, hoje estou morto" [risos]. Não dá
para ele reclamar, mas acontece isso.
P/1 – Qual é seu cotidiano de trabalho, vem ao consultório?
R – Não venho ao consultório. Na verdade sou tempo integral no Dante e sou
chefe da unidade coronária e fico na unidade coronária. Venho aqui quando
tem doente. Trabalho num hospital público, né. Hospital público não é não é
um hospital que seja uma grande luz para você ter um grande consultório. O
pessoal que vai ao hospital público não tem dinheiro para pagar uma
consulta, não tem condição de pagar para um consultório. Poucos vêm,
eventualmente tem alguém que marca, amigos de outros Estados, quando a
gente vai dar aula encaminha uns doentes, para você resolver aqui, quando
vocês chegaram tinha vindo uma de Rondônia, um médico de Rondônia venho
aqui uma vez, gostou de mim e mandou essa paciente, é assim. Então meu
consultório, não é um consultório bom. Mas também não atendo convênio, acho
que minha parte do sacrifício faço no Dante Pazzanese que eu atendo de
graça. O convênio acho que a gente atende de graça. Convênio é uma coisa
que paga 20 reais a consulta, o doente acha que manda em você, acha que ele
é super particular, não atendo! Ou vem particular ou vem no Dante que eu
atendo de graça. 8 ou 80! Então não tenho doente, só faço particular.
P/1 – Fora do trabalho, quais são as principais atividades de lazer?
R – Fico o tempo todo no Dante, vou para casa. O que a gente faz muito no
Dante? É muito convidado para falar em congressos, participa desses
trabalhos internacionais, que para mim que gosto, são super bons. Existe um
contrato de...tem mais ou menos um...não um contrato, mas existe uma norma
que antes de sair um resultado de uma pesquisa dessa que você participou,
você tem que ver o resultado final. Então todos esses trabalhos que nós
participamos internacionais acabam levando você a um pré-congresso, tipo: o
(Acente?) vai mostrar o resultado final que eu participei no American
College de março. Muito provavelmente dois dias antes do congresso eles vão
pagar uma passagem para ir lá assistir a reunião, teoricamente é para você
discutir os resultados. Chega lá tem três mil médicos pesquisadores com a
equipe lá com o comitê central do estudo. Aí, mostra o resultado, alguns
levantam, alguns não levantam, pode ir para frente vai, entendeu? Então tem
gente que participa. E no Brasil, o fato de você trabalhar no Dante e ser
chefe da coronária tem convite, aí: vários congressos, vários estados,
participa do brasileiro. Então a gente tem uma reunião assim.
Final de semana faço poucas coisas, vejo muita televisão, às vezes saio com
as crianças em shopping, em São Paulo é uma dificuldade...
P/1 – Você é casado, tem filhos?
R – Sou casado e tenho duas crianças, uma de 9 anos e uma de 6. Eu sou casado com uma menina, quer dizer casei dentro do Dante, viu? A minha esposa é chefe da enfermaria de válvula, e eu sou chefe da coronária. Vim para o Dante em 1979, acabei a residência em 1981, ela veio em 1984 e acabou em 1987, mas nós casamos em 1985. E viemos, aí. Muitas vezes o próprio divertimento da família é ir conosco nessas viagens. Então eu ganhei a passagem, você paga a passagem ...por exemplo: congresso em Orlando, aí, a família vai junto, as crianças.
P/1 – Já leva para a Disney.
R - Já leva para a Disney. Vai para um hotel de encontro final, por exemplo
de um consenso de tratamento nacional de infarto, sou convidado vai a
família junto. A família fica lá na piscina, desfruta da piscina e você
fica no consenso [risos]. Se não você não tem outras coisas assim, não tem
muitos afazeres de divertimento. Agora, meu principal hobby, se eu pudesse,
é viajar, sempre. Gosto muito de viajar e viajo muito, por causa disso que
lhe citei, viajo muito. Ano passado fui ao American Congress de março, fui
no Europeu, na Áustria em...American Congress ano passado foi onde, deixa eu
pensar aqui...acho que foi em Atlanta, o Europeu foi em Viena, o American
Heart foi em Dallas. Fiz três viagens internacionais para congressos. Esse da
Áustria eu prolonguei, tirei 15 dias de férias aí fiquei eu com minha
esposa passeando, fui a Londres e Paris. Nesse tipo de coisa, mas se
não...Esse ano agora tem Campos do Jordão, Paulista em maio, tem um na
Bolívia que eu vou. Já fui falar na Bolívia. Tem um em São Luís do Maranhão
que é em abril. Mas, os filhos não viajam nesses todos não.
P/1 – O senhor tem um grande sonho, um grande desejo ainda na vida, alguma
coisa para realizar, alguma meta?
R – Não. Isso aí eu não sou assim muito...não penso muito nisso ,aí, não.
Acho assim, saí de Jaraguá, me dei até razoavelmente bem ou bem. Acho que
se eu pudesse viver mais folgado, lógico você sempre pensa em ganhar mais,
a minha qualidade de vida da onde eu vim está muito boa. Estou satisfeito.
Agora, não tenho grandes salários, não é um grande salário, mas faço o que
gosto, de modo geral faço o que gosto.
P/1 – O senhor mudaria alguma coisa em sua trajetória de vida?
R – Nunca me dediquei ao consultório. Só fiz consultório depois que voltei
dos Estados Unidos. O que acho que no Brasil não existe algumas coisas que
em outros países existem: oportunidades. Por exemplo sou médico do Dante,
não tenho capacidade de sair do Dante e ir para nenhuma...eu gosto da vida
acadêmica. Então não tem possibilidade de eu sair do Dante para nenhuma
vida, a não ser o Incor que está começando a mudar isso agora, mas você
não teria possibilidade de sair para nenhum hospital academicamente, porque
teoricamente você é público. É ao contrário nos Estados Unidos. Nos Estados
Unidos se você é um médico, que você escreve, que você participa, você dá
aula, você vai em congresso. Tem um hospital que quer fazer uma chefia,
quer mudar uma direção, contrata você. Então você muda de universidade nos
Estados Unidos, se bem também que é só em universidades particulares. No
Brasil não vejo essa possibilidade. Não tenho possibilidade nenhuma de
mudar de Estado, o cara do Estado diz lá: "Estou começando um serviço aqui,
vou buscar o Rui do Dante, ele está há 15 anos no Dante, quem sabe ele vem ser
chefe aqui e começar o serviço dele." Isso é um sonho que tinha, que
ocorresse, não que me buscassem, mas que essa possibilidade houvesse no
Brasil. Isso deveria haver. Acho que a competição era maior e o mundo
acadêmico é maior. O Brasil é muito fechado, é muito da panela, o cara é do
Maranhão, é catedrático, o filho dele nasceu o sino já toca que o filho
dele vai ser catedrático. Isso ocorre em São Paulo. Então as oportunidade é
que são poucas, acho que isso deveria haver mais no Brasil. A competição
era melhor e mais saudável, com possibilidade de se locomover. Porque os
outros lugares são ocupados, quem ocupa 20 anos é vitalício. O Incor tinha
o Fúlvio Pileggi ficou quantos anos, o Fúlvio Pileggi, agora o professor
Ramires assumiu o Incor. Quer dizer você viveu 15 anos o Incor com a
direção do Fúlvio Pileggi, que teve uma linha de conduta. O professor
Ramires assumiu com 50 anos vai até os 70 com uma linha de conduta. Quem
vier depois dele vai dirigir o Incor com uma linha de conduta. Quem não
for, qual é a possibilidade...quantas pessoas do nível do Ramires hoje que
é diretor do Incor que concorreram com o Ramires, os que não concorreram
poderiam estar indo para uma universidade outra desenvolver, não tem, né.
Então isso não existe no Brasil, isso deveria existir: a possibilidade de
fazer. As indústrias fazem isso, né. Os bancos fazem isso, as universidades
brasileiras não fazem. Isso deveria existir.
P/1 – De um modo geral, o que o senhor achou da experiência de ter dado
essa entrevista?
R – Eu não sei, quero ver o que vocês vão escrever [risos]. Depois que você
editarem. Mas antes de vocês editarem vou ver, não vou?
P/1 – Mas você gostou de falar?
R – Não sei, sempre falo bastante [risos]. ________
P/1 – Está bom, foi boa a entrevista.
P/2 – Tem alguma coisa que o senhor não falou e gostaria de falar?
R – Só gostaria de ver a entrevista antes de vocês colocarem. Você me pediu
um currículo, não é?
P/1 – É.
R – É preciso? Porque fui ver meu…
Recolher