Sou belga. Há três anos [o depoimento é de maio de 2008], eu participava a cada semana de encontros na Embaixada do Brasil em Bruxelas. Os encontros eram organizados pelo então Embaixador Jerônimo Moscardo, que é hoje o presidente de Fundação Alexandre Gusmão em Brasília, depois de ter sid...Continuar leitura
Sou belga. Há três anos [o depoimento é de maio de 2008], eu participava a cada semana de encontros na Embaixada do Brasil em Bruxelas. Os encontros eram organizados pelo então Embaixador Jerônimo Moscardo, que é hoje o presidente de Fundação Alexandre Gusmão em Brasília, depois de ter sido, por um tempo, Ministro da Cultura de Itamar Franco. Ele tinha desenvolvido um conceito chamado "diplomacia participativa". Resumindo: mesmo sendo o Embaixador do Brasil, ele considerava que cada cidadão brasileiro ou amigo do Brasil (eu, por exemplo) era também um "embaixador" do Brasil.
Então, ele organizava, às quintas-feiras, encontros bem descontraídos na Embaixada, dos quais participavam desde pedreiros ilegais até o diretor da Companhia Vale do Rio Doce na Europa, passando por pintores, músicos, cozinheiros etc. O objetivo desses encontros era valorizar a imagem do Brasil na Bélgica e organizar eventos nesse sentido.
Pouco a pouco, esses encontros ficaram conhecidos até no Brasil e nós recebíamos a visita, de vez em quando, de artistas, empresários e políticos de passagem por Buxelas, que vinham participar desses encontros. Um dia, recebemos a visita de José Sarney, na época ainda presidente do Senado.
Ele sentou com a gente, totalmente descontraído, e fez uma curta apresentação do seu percurso pessoal, da sua vida, tanto como homem político, como empresário e escritor. Ele acabou esta pequena apresentação falando de uma viagem que tinha feito, em 1986, como Presidente do Brasil, a Cabo Verde, na companhia de Jorge Amado.
Quando ele falou isso, levantei e disse:
- Senhor, eu preciso contar uma historia: em 1986, eu fui pela primeira vez ao Brasil, porque, naquela época, eu dava palestras sobre diversos países. Então, fui a Salvador, na Bahia, com um só objetivo: entrevistar Jorge Amado. Eu tinha 22 anos.
Cheguei a Salvador e liguei para Jorge Amado, pedindo uma entrevista. Ele respondeu: "concordo em lhe dar esta entrevista, mas estou saindo amanhã para uma viagem oficial a Cabo Verde com o Presidente Sarney e só estarei de volta daqui dez dias. Mas, se você ainda estiver aqui, lhe darei a entrevista com o maior prazer".
Depois de pensar um pouco, resolvi esperar a volta dele, embora, normalmente, devesse ficar só três dias em Salvador. Foi ao longo desses dez dias que encontrei a mãe dos meus dois primeiros filhos (que têm agora 21 e 19 anos). E não somente consegui entrevistar Jorge Amado como passei dois dias na casa dele e voltei para lá uns anos depois.
Então, falei para o presidente Sarney:
- Já que tenho oportunidade hoje, gostaria de agradecer ao senhor, porque se tenho dois filhos maravilhosos é porque, um belo dia de 1986, o senhor resolveu levar Jorge Amado para Cabo Verde.
Ele se levantou, apertou a minha mão e disse:
- Olha, tudo mundo falou que não fiz nada de bom quando era Presidente do Brasil. Agora, sei que não é verdadeRecolher