Eu e meus irmãos somos a primeira geração da família de São Paulo. O meu pai é mineiro, com família de Minas e também de Goiás, e a minha mãe é do Rio Grande do Sul. Então, eles se casaram e desde o início moraram aqui em São Paulo.
Na minha casa, éramos muitos irmãos, então ela ti...Continuar leitura
Eu e meus irmãos somos a primeira geração da família de São Paulo. O meu pai é mineiro, com família de Minas e também de Goiás, e a minha mãe é do Rio Grande do Sul. Então, eles se casaram e desde o início moraram aqui em São Paulo.
Na minha casa, éramos muitos irmãos, então ela tinha um convívio complexo. Éramos quatro meninos e ficávamos em um só quarto com duas beliches. No outro quarto, ficava minha única irmã mulher. Mas não lembro de ser uma coisa difícil, funcionávamos bem juntos, minha mãe conseguia disciplinar aquela turma de crianças. Minha família era um misto de sensações muito gostosas e em contrapartida, algumas muito pesadas. O meu pai era nove anos mais velho que a minha mãe e estava seguindo uma carreira executiva, enquanto ela era uma moça do interior que ainda contava muito com o protecionismo materno. Esse tipo de coisa dava choque, então ele nunca tiveram um relacionamento pacífico. Apesar disso, fazíamos muitas coisas juntos, como ir de carro para rio de Janeiro, Minas Gerais Porto Alegre... Fizemos muitas viagens, que sempre contavam com uma briga deles. A vida deles era tão tumultuada e conflituosa, que eles acabaram se separando. Só que eles se separaram e continuaram morando na mesma casa, porque eram épocas difíceis e ninguém estava com dinheiro para ir morar longe do outro. Eu comecei bem cedo na escola. Como na minha rua tinha uma que se chamava Escola dos Anjos, entrei por volta dos cinco anos nela, e acho que ainda fiz uma pré-escola ainda ainda, quando moramos em Santo Amaro, no Alto da Boa Vista. Fiquei mais ou menos um ano na Escola dos Anjos até entrar no Pio 12, onde estudei quase a minha vida inteira, contando apenas com o intervalo em que fui para os Estados Unidos.
Eu tinha uma certa inocência ao imaginar os Estados Unidos como um lugar moderno e charmoso, estava muito entusiasmado. Só que minha vida pessoal lá foi a pior possível. Durante um mês, era brasileiro, novidade e todo mundo achava graça. Depois de um tempo, não conseguia me comunicar, não conseguia conviver e acabei procurando pela turma também marginalizada. Era uma espécie de bullying. Isso existe em qualquer lugar, mas eu acho que lá é mais forte.
Ao retornar dos Estados Unidos, eu voltei ao Pio 12 e lá terminei os meus estudos. Ainda no colégio, eu não tinha noção de qual carreira seguir e acho até que posso ter escolhido mal a minha profissão. Eu sempre tive uma cabeça muito mais de exatas do que de humanas, então eu estaria muito mais para um engenheiro ou um administrador – mais pelo lado dos números do que pela parte de filosofia, letras e história – mas acabei prestando Direito por influência do meu pai, porque ele achava que eu era persuasivo. Ele falou, "olha, você tem uma característica boa para advogado, você precisa convencer as pessoas", e ele achava que eu tinha um entendimento bom das coisas do meio político, de governo e de como essa isso tudo funcionava.
Eu tentei ingressar em três faculdades, a USP, a PUC e a GV. Consegui a PUC que era a mais fácil entre elas. Na GV, acho que eu fiquei na lista de espera, mas fiz a minha redação de português em inglês, falando mal de como seria a vida de um executivo. Acho que eu tirei zero. Então, eu estava em um momento muito imaturo. Talvez eu tenha cursado Direito por conta disso, por ter sido a faculdade em que consegui entrar. Se eu tivesse entrado na GV, teria feito Administração, e acho que teria sido um pouco melhor, porque eu me dou melhor nessa área mais econômica, mais numérica. E então, eu comecei minha carreira de Direito sentindo a força dessa decisão pouca pensada. Me ressenti diversas vezes da minha escolha, mas as coisas começaram a acontecer e me encontrei em uma carreira muita gostosa e que me satisfaz.
Durante esse tempo, morei sozinho em todos os arranjos possíveis da minha vida, porque minha família estava morando nos Estados Unidos. Como meu pai não queria que eu tivesse ficado, tive que trabalhar para pagar a minha faculdade e para viver. Após algum tempo, ele começou a me dar uma mesada, mas eu precisava pagar a faculdade e dei aula de inglês por um período no CEL-LEP, que me permitia trabalhar a tarde e portanto fazer a faculdade de manhã. Isso era ótimo, pensando que em outro caso eu poderia ter que trabalhar o dia inteiro e ter aula durante a noite. Depois, trabalhei por um tempo na DuPont, e saí de lá porque eu era assistente, era uma espécie de carreira B lá no departamento jurídico, já que não tinha vaga para advogado. Então se não aparecesse uma vaga de advocacia, eu iria continuar estacionado nesse cargo de assistente.
Eu preciso ter uma certa relevância para ficar feliz. A parte do dinheiro não é suficiente, não me contenta. Eu precisava ser alguém corporativamente, queria crescer, queria ter mais relevância, queria poder oferecer alguma coisa para a empresa, queria poder sentir que eu colaborava. Uma das crises que eu tive de formado foi essa, porque a turma da carreira administrativa na empresa crescia muito rapidamente e tinha muita oportunidade. O cara do jurídico ficava no jurídico, era só dos jurídicos, ficava preso, então a chance de crescimento era pequena e isso era uma coisa que me incomodava.
Tive no total onze anos de Alcoa e dois anos de Tozzini. E dentro desses dois anos, acho que foi a época em que eu mais trabalhei em toda minha vida, era uma coisa completamente insana, a ponto de chegar na quinta-feira e eu não aguentar mais virar a noite trabalhando. Um dia, chegando em casa às cinco horas da manhã, minha mulher indagou, "isso é vida?".
Esse ano eu cumpri uma quarentena de seis meses, que acabou sendo mais sabática do que eu tinha planejado, e eu realmente percebi que eu estava precisando de uma sossegada, e aproveitei para reorganizar minha vida. Reorganizar, assim, em termos de vislumbrar uma perspectiva de trabalho, de como eu quero trabalhar, e aí o meu desejo é trabalhar como consultor, mas de forma autônoma e por projeto, não quero ter nenhuma vinculação de longo prazo.
Talvez ter sido convidado para ser embaixador do Museu da Pessoa tenha se dado através do olhar sobre mim como alguém com uma vida interessante, com diversas histórias para contar, e mesmo um conhecimento muito grande desse setor de telecomunicações, e vislumbrando que um elemento que pode ajudar nessa sustentabilidade do museu tem a ver com a garantia de uma plataforma digital importante, um formato importante.
No fundo, a vida é muito interessante, a atividade humana é muito interessante seja qual for. Então assim, o desenvolvimento, a superação, são coisas que emocionam e não importa o que seja. Então você vê trabalhos, por menores que sejam, lugares humildes, mas que você vê que extrapolam um resultado que você possa imaginar, uma coisa tão simples e gera um resultado tão valioso. E eu acho que a gente realmente precisa continuar conhecendo gente, precisa oxigenar o ambiente, trazer novas ideias. Não existe nenhuma fórmula pronta para nada, não existe ninguém que seja perfeito.Recolher