Depoimento de Simone Allechandre
Entrevistada por Fernanda
São Paulo, 03/09/2020
PCSH_HV900
Projeto Mulheres empreendedoras - Zona Norte
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Fernanda Regina
P/1 – Simone, qual é o seu nome completo, data e o local em que você nasceu?
R – Meu nome...Continuar leitura
Depoimento de Simone Allechandre
Entrevistada por Fernanda
São Paulo, 03/09/2020
PCSH_HV900
Projeto Mulheres empreendedoras - Zona Norte
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Fernanda Regina
P/1 – Simone, qual é o seu nome completo, data e o local em que você nasceu?
R – Meu nome completo é Simone Regina Alexandra da Rocha Allechandre de Lourdes. Nasci aqui em...
P/1 – Pode falar.
R – Nasci em São Paulo… E o que mais você perguntou? (Risos).
P/1 – A data de nascimento.
R – Ah, tá bom. Continua ou você quer que volte tudo?
P/1 – Pode continuar.
R – Então, eu nasci em São Paulo, em 1972, 7 de agosto de 1972.
P/1 – Qual é o nome dos seus pais?
R – Minha mãe chama Iris Maria da Rocha Allechandre, e meu pai, Sebastião Allechandre.
P/1 – O que seus pais faziam?
R – Minha mãe, como teve muitos filhos, trabalhava de empregada doméstica. Meu pai sempre foi empreendedor, ele teve quatro bancas de jornal até o fim da vida dele, quando ele passou uma banca de jornal para um dos meus irmãos, depois se aposentou e parou.
P/1 – Pensando na infância, que lembrança você tem com o seu pai?
R – De empreender, porque meu pai… Eu ficava na banca para ele desde os meus sete anos de idade. A gente subia para a banca três horas da manhã, ele me deixava lá, ia fazer as compras… As compras eram ir comprar o jornal, ir na editora para pegar as revistas… Eu ficava na banca. Tinha um ponto de ônibus lá, então os motoristas que me olhavam, ele ia buscar e chegava por volta de umas dez horas da manhã. Eu descia para casa e depois voltava para levar o almoço, então com meu pai a gente… Desde pequena lado a lado, um com o outro, sempre com ele empreendendo e me ensinando. Essa lembrança do meu pai é desde assistir a um jornal a noite, levar toalha para ele tomar banho… Então nós fomos muito colados um no outro.
P/1 – Você gostava de trabalhar na banca? Você recebia algum salário? Como que era esse combinado?
R – Não, porque ele me dava de tudo, né? Então assim, salário, eu não tinha, mas era a satisfação de aprender e a satisfação de estar com ele. Para mim foi uma maneira que ele encontrou de alguém, pelo menos um dos filhos… Ele sempre falava, "tenho tantos filhos e ninguém se interessa", então o sonho dele era que alguém se interessasse em empreender. Eu fui crescendo, aprendendo com ele e trabalhando com ele.
P/1 – E me conta um pouquinho dos seus irmãos. Você citou que tem irmãos e quero saber… Quantos irmãos você tem?
R – Nossa, eu tenho um monte. Quantidade de irmãos… Hoje nem todos estão vivos, mas a minha mãe teve 21 filhos. Eu conheci 14 dos 21, porque sou a caçula. Quando eu nasci, naquela época não tinha vacina, então ela perdeu filhos com idades entre um ano, oito meses… Não cheguei a conhecer todos. Hoje somos em sete, sete irmãos. Quer dizer, eu tenho sete irmãos, comigo são oito. Mas foi assim, a minha infância com eles foi muito boa, a gente se divertiu bastante, tinha aquelas brincadeiras que a gente não esquece e que hoje é bullying, mas na nossa época não era… Eu fazia tudo com as minhas irmãs. Meus irmãos eram mais secos, mas as minhas irmãs são tudo para mim, são mães, não são irmãs. E aí, fui perdendo um, perdendo outro, falecido, não tenho contato com um… Tem um irmão que está sumido. Inclusive quando minha mãe teve o primeiro AVC dela foi exatamente pelo sumiço do meu irmão… Mas a gente brincou demais, brincava de tudo que você pode imaginar, de encher bexiga com água e tacar um no outro, de brincar na rua, de andar de carrinho de rolimã, tudo que você pode imaginar. Depois a gente começa a crescer, fica adulto,
um casa, outro casa e vai perdendo essa essência, mas foi muito bom. Fora as brigas, né? Porque brigar é natural entre irmãos (risos).
P/1 – Tem alguma briga sua com seus irmãos quando criança que te marcou? Uma briga, algum momento...
R – Ah, marcou. O meu irmão não me aceitou, porque assim, quando eu nasci ele tinha sete anos, e desde os sete anos ele falava que ia me matar, porque ele não aceitava. Porque ele era o último, era o caçula, o último, então… Uma vez eu tinha - isso minha mãe contando - um ano, ele me colocou atrás da porta e fechou ela. Tem um quintal, ele desceu correndo o quintal e abriu a porta, para ela bater e me amassar, literalmente me amassar. Essa foi uma das maldades. Não resolveu e ele colocou vinho branco na minha mamadeira. Não resolveu, ele me colocou em um carrinho e… O quintal da minha mãe é assim, ele tem passagem para as duas ruas, a rua de cima e a de baixo, então são dois portões. Ele abriu o portão de baixo, me levou com o carrinho até o portão de cima e soltou. Eu fui para no outro lado da rua do portão de baixo, porque antes era cerca, não tinha portão. Acho que ele acabou desistindo, né? Porque ele viu que não resolveu. "Vou ter que ficar com ela mesmo, conviver com ela" (risos). Foi o único que me fez maldade.
P/1 – Mas vocês começaram a se dar melhor?
R – A gente não se dá muito bem, não. Ele mora em Fortaleza, tem os filhos e tudo mais, tem a vida dele, mas a gente não se dá. Ele não superou essa fase dele.
P/1 – E os outros irmãos?
R – Com os outros irmãos, não teve briga. Eles sempre cuidaram muito de mim, até mesmo como filha, então eu não tive nenhuma desavença assim, direta. Só com o ex jogador de futebol, que é o meu irmão, o Sebastião. Ele também é meio complicado, porque entrou nas drogas, e minha mãe o levou para morar em casa, então foi uma fase bem difícil. Eu e minhas irmãs sempre cuidamos da minha mãe, então as brigas eram constantes, mas por conta disso, por conta das drogas em que ele entrou, não por ele em si. Então assim, nada pessoal com ele. Ele é doente, porque usa a droga e a gente entende, mas a gente sempre se deu bem na infância, nada pessoal.
P/1 – E como era a sua casa de infância? Se você fechar os olhos, consegue lembrar como era?
R – A minha casa na infância era complicada, porque nós éramos em 15 dentro de um barraco com dois cômodos. Então tinha a cozinha, o banheiro era do lado de fora, tinha as beliches, a cama da minha mãe… Eram três beliches, então a gente tinha que se virar e alguns dormiam no chão. Dois dormiam na cozinha, um debaixo da mesa inclusive, porque era onde cabia o colchão. E era punk. Então assim, a gente nunca teve a… Nós crescemos sem ter a tal privacidade de ter um quarto, de sei lá, ter um quarto para os meninos e um quarto para as meninas… Era um barraco assim, até que… Meu pai falava que não dava para construir e minha mãe cansou, porque o terreno era grande. Toda vez que ele vinha da banca de jornal que ele guardava o dinheiro, ela pegava um pouco e escondia, pegava um pouco e escondia… Até o dia que ela conseguiu guardar o dinheiro, foi em um material de construção, comprou tijolo, comprou areia, comprou tudo para pelo menos fazer um cômodo. Meu pai chegou da banca e estava tudo lá para ele colocar para dentro. E depois, ele tomou gosto para construir, mas a gente viveu muito tempo dentro de um barraco e só com ele trabalhando, só com a banca de jornal.
P/1 – E com a sua mãe,
qual momento que você lembra da infância em que vocês ficavam juntas? Um momento que você lembra de vocês duas.
R – O que eu lembro da minha mãe é que a gente tinha que pegar a toalha para o meu pai, o chinelo para o meu pai (risos), a cueca para o meu pai que quando ele chegava tinha que tomar banho… Ela brigava com a gente porque tínhamos que fazer os afazeres de casa. O que eu mais me lembro da minha mãe, é mais a parte da bronca. Ela era demais nesse sentido assim, mas era a mãezona no quesito de que quando a gente precisava de alguma coisa, ela estava ali do lado para ajudar, "vou ajudar". Depois ficava falando, "ah, mas eu que ajudei, eu que fiz", ela tinha esse ladinho meio complicado, mas sempre foi essa mãe de ajudar, de cuidar, de estar presente em todas as suas situações, só que ela era meio sargentona, era bem sargentona. Mas era a mãe, com tudo isso era a mãe. Até quando eu engravidei com 15 anos, ela foi um pouco severa e falou, "não vou contar para o seu pai, você vai contar", "tá bom", e aí fui lá na banca e contei para o meu pai. Mas depois ela relaxou. Não aceitou muito bem, mas depois relaxou e voltamos a ficar grudadas uma na outra. A minha mãe era isso, sargentona da casa.
P/1 – Eu vou voltar um pouquinho. Quando você entrou na escola, como foi? Você lembra do primeiro dia de aula?
R – Não lembro do primeiro dia de aula. Eu sempre gostei de estudar. Acho que da escola, não lembro do primeiro dia. Lembro sim da minha irmã, ela que me levava e que me buscava - uma das irmãs, que sempre cuidou de mim na ausência da minha mãe. E o que eu lembro é que eu estava na fase do prezinho - porque na época era prezinho - e lembro que eu era muito bobinha. Teve uma menina que veio me bater e eu lembro que minha irmã estava do lado de fora e começou a gritar, chamou a diretora, queria pular o muro, me mandava bater na menina e eu não batia… Era isso, mas assim, não me lembro do primeiro dia. Eu lembro da quarta série, o que mais me marcou nessa fase, acho que foi na quarta série. Eu estava indo super bem, só Matemática que ficou um pouquinho… Tirei um C-. Minha mãe foi chamada e falaram, "olha, ela passou para a quinta série, e precisa melhorar um pouquinho em Matemática", e aí minha mãe falou, "então reprova", "não, não tem porquê reprovar", "não, reprova", porque minha mãe não admitia que a gente levasse nota B. Ela falava, "você tem tudo em relação aos seus irmãos, então você tem que tirar A sempre". Eu reprovei a quarta série por conta de eu ter ido um pouquinho mal em Matemática. Acho que é por isso que eu gosto tanto de Matemática.
P/1 – E você lembra de como você se sentiu?
R – Ah, me senti super mal. Nossa, super mal! Entendi o porquê, chorei… Nossa, chorei! Meu pai chegou e brigou, porque não tinha necessidade e ela disse, "tem, ela vai me agradecer lá na frente, tem sim". Não sei se ela estava em um mal dia, porque naquela época os pais não tinham o cuidado que hoje nós temos de conversar com o filho e explicar para ver se entende. Não, não existia isso. Existia, "você vai fazer isso e acabou, eu quero assim e tem que ser assim", era isso. Eu me senti super mal, porque vi meus coleguinhas todos indo para a quinta série e eu fiz uma quarta série meio frustrada, porque eu já sabia, porque sempre fui muito de estudar, então não teve novidades. Acho que é por isso que eu gosto tanto de Matemática.
P/1 – Tem alguma lembrança na escola que te marcou?
R – Tem. Lembrança na escola é uma lembrança da quarta série. Quando teve a reunião dos pais, já tinha acabado todas as provas e a professora chamou a minha mãe só para poder falar para ela que eu estava um pouquinho fraca em Matemática, mas coisa pouca, porque a nota foi C-, não chegava a ser um D. Na minha época era tudo letra. "Foi um C-, mas ela está ótima, ela é uma boa aluna, é só a senhora na quinta série atentar mais para a Matemática", e minha mãe falou, "então reprova". Ninguém entendeu nada, porque antigamente as mães que ditavam as regras na escola, e aí eu reprovei a quarta série. Porque ela fez isso, ninguém sabe. Meu pai chegou do trabalho e não entendeu também, brigou e não adiantou. Ela falou que lá na frente eu iria agradecer por isso. Chorei muito, chorei demais. Vi meus coleguinhas todos indo para a quinta série e eu fiquei na quarta. A quarta série para mim foi nada a ver, porque minhas notas eram todas A, só em Matemática mesmo que eu me enrosquei nesse bimestre. E ela não aceitava que a gente tirasse menos que A, ela falava, "você é a caçula, você tem tudo em relação aos seus irmãos, então eu não aceito que tire menos que isso". Eu não entendi, chorei, reprovei e fiz a quarta série de novo. Acho que por isso que eu amo Matemática, por conta disso, por conta de ter sido reprovada sem necessidade alguma.
P/1 – E nessa época, teve algum professor que te marcou?
R – A minha professora da quarta série
(risos). Ela me acolheu como uma filha, porque ela não queria que eu reprovasse. Ela ia lá, conversava comigo, falava que eu ia me enturmar com os novos colegas e que iria passar rápido. Então ela conversava, fazia esse… Minha mãe era ditadora. Minha mãe ditava e ela me abraçava e explicava, e eu fui entendendo. Eu gostei da turma, foi uma turma com a qual eu fui direto até a sétima série, quando eu saí e fui para outra escola para participar de campeonato. Foi bom para mim, porque eu já amava o voleibol desde os nove anos e tinha alguns amantes também do voleibol, então minha vida foi estudar, jogar voleibol na escola… Foi bom. Por um lado foi bom ter reprovado, porque a turma da quarta série em diante, a gente batia muita bola. Tinha os grêmios na escola e eu sempre participei de todos, coordenava os grêmios… Então eu tinha livre acesso na coordenação, na diretoria, e assim, por eu ter reprovado, eu ensinava alguns alunos já nessa idade. Alguns alunos sentiam dificuldades em algumas matérias e foi o meio que eu encontrei para não ficar tão chata a quarta série e aí fui. Eu sempre fui acolhedora, fui acolhendo… Então por um lado foi bom sim, eu agradeço ela por ter sido reprovada (risos).
P/1 – E as suas amizades nessa época, me conta um pouquinho de algum momento que você se lembre com alguma amigo.
R – Com amigo? Lembranças da minha amizade… Tenho, tenho amizade com três até hoje. Silvia Soraia da Silva, jogamos bola até hoje juntas. Tem a Vera Maria, que é minha vizinha, casou, teve filhos e a gente anda junto até hoje. E a Deise. Então assim, tenho três. A gente fazia muito arte no sentido de… A gente não fazia bagunça, mas a gente tinha o controle total da escola em amizade. Quem cuidava da quadra era a gente. Na aula vaga, ninguém ficava sem fazer nada, porque a gente levava todo mundo para a quadra. A gente jogava handebol, voleibol na época. As nossas brincadeiras eram sempre voltadas para a bola, tanto que a minha mãe ficava preocupada com isso, porque ela falava, "gente, isso não é uma menina é quase um moleque". E as minhas amizades…. Assim, as três são as que eu carrego, até hoje são tudo. Uma liga para a outra, em todos os momentos difíceis uma está do lado da outra, e era isso. Era jogar bola o tempo todo, estudar o tempo todo… E quando eu saí da escola, eu e a Soraia saímos, a Deise não ía e acabou indo. A gente ia participar de campeonato, e na época, nós éramos obrigados a ter pelo menos duas modalidades esportivas na escola, e o atletismo era uma delas, e um esporte coletivo. A gente acabava fazendo logo três, porque fazíamos o atletismo, eu corria 50 e 100 metros, a Deise era do lançamento de dardos e daquela bola pesada lá e a Soraia era mais no sentido de salto em vara. As três jogavam handebol e as três jogavam voleibol, então era isso, nossa infância foi isso.
Foi dentro da escola, trabalhando junto com a direção, jogando bola, estudando e eu trabalhando fora com o meu pai.
P/1 – Me conta um pouquinho mais dessa sua relação com o esporte. Como começou? Dá um pouco mais de detalhes.
R – Eu comecei com oito anos. Eu via na televisão e era vidrada no voleibol, minha paixão era voleibol e handebol. Com nove anos, eu comecei a procurar clubes, alguma coisa fora dali, só que eu não podia, por conta de ajudar meu pai na banca, então não tinha como. Aos 11 anos, eu fugi da minha mãe e fui para o DEF. Na época, era ele que preparava os adolescentes para as bases dos clubes. Eu sei que a gente teve… Eu, a Eliana e a Deise. Teve uma peneira e minha mãe não acreditava no esporte, era radical nesse sentido. Meu pai dava um pouco mais de força. A minha mãe falou, "não, não vai participar da peneira", e eu falei, "não é possível, eu vou ter que ir", pela primeira vez eu desobedeci minha mãe. Fui para a banca, levei o almoço para o meu pai, falei para a minha mãe que tinha Educação Física, mas verdade nós pegamos um ônibus e fomos participar dessa peneira. Eram 738 crianças participando dessa peneira em cinco dias e eles estavam precisando de atacante na época, e eu nunca tive altura para isso, mas como na minha época a estatura era baixo, ninguém era alto… E eu tinha um diferencial, eu saltava muito, acho que talvez pelo atletismo, então eu saltava muito e também pela explosão que o negro tem. Fui, passei na peneira, e aí vem a complicação, "passei na peneira, e agora? Minha mãe tem que assinar". Eles aceitavam a assinatura da mãe, não era a do pai. Fui no outro dia, peguei o papel, passei super feliz, cheguei em casa, fui dar o papel para a minha mãe assinar e minha mãe rasgou o papel (risos), falou que não iria assinar, que não teria futuro, enfim. Mais uma frustração. Meu pai chegou, enfim. Mas não desisti, continuei, e aí foi quando entrei no Nacional aos 13 anos. Lá eu me federei, participei de campeonatos, e ao lado do Nacional tinha um clube chamado Telesp. Telesp de ficha telefônica, aquela coisa toda, tinha um clube. E dali a gente iria para o Juventus. Fui na Telesp, fiz a peneira, passei, fui treinar lá, e de lá fui para o Juventus. Nós ficamos… Eu fiquei no Juventus pouco tempo, não foi muito tempo. Aos 15 anos, 14 para 15 anos, meu irmão conseguiu um teste no BCN. Na época eu já estava como levantadora, porque não creci mesmo, entendi que não cresci, então vamos levantar bola que fica mais fácil. Fui, fiz o teste, passei aos 15 anos, feliz, e descobri que estava grávida (risos), aí não deu (risos).
P/1 – Conta como foi esse momento da sua vida. Me conta os detalhes (risos).
R – Olha (risos), foi assim um… Eu estava até desconfiada. Falei assim, "gente, mas e agora? Será que estou grávida ou não estou?", porque eu comecei a namorar com 15 anos, e aí apaixonada, a gente vai e faz o que não deve. Quando cheguei e peguei o papel, falei, "poxa agora vai", passou um mês de treino e nada. Com dois meses, minha menstruação não veio e eu falei, "acho que já foi mesmo". Conversei na época com meu namorado, que é meu atual marido, "olha, acho que estou grávida" e fui fazer o teste. Com 15 anos, na verdade ele que comprou o teste para eu fazer e estava grávida mesmo, bem na época em que minha mãe estava entendendo que eu poderia viver do esporte (risos). Eu contei para ela, né? Falei, "mãe, estou grávida", porque ela ficava, "mas você está engordando"... Porque eu passava no nutricionista, a gente tinha tudo, nutrição… Meu regime era regime de engorda, era a única atleta que tinha regime de engorda, porque eu sempre fui muito magra e tinha que ganhar massa muscular, então meu regime lá era de engorda. Eu era a única atleta que podia comer de tudo, era liberado, as outras não, "olha, hoje você pode comer carboidrato, amanhã você não pode". Eu era liberada de tudo, podia comer tudo, porque não engordava uma grama, só queimava. Foi quando a minha mãe achou que eu estava um pouquinho gordinha e quando foi ver, eu realmente estava grávida e tive que sair do clube. Foi uma pena, né? Na minha época não tinha esse negócio de "vamos te esperar", era "perdeu a oportunidade, próximo". E eu disse, "bom, já foi", e tive a Jaqueline, muito linda, minha filha maravilhosa, e parei com o voleibol profissional, mas nunca parei com o voleibol amador. Minha mãe me deu um castigo, ela falou assim, "eu só não vou tirar de você o voleibol, porque se eu tirar o voleibol de você, você vai morrer, mas do restante, eu não te ajudo com nada," eu falei, "bom, não tirou o voleibol, o restante a gente se acha" (risos). E foi isso. Chorei bastante, foi uma frustração na época, mas depois que eu ganhei… A Jaqueline eu ganhei com 16 anos, porque eu faço aniversário em agosto e ganhei ela em outubro, então completei em agosto 16 e ganhei ela em outubro. Me conformei e também tinha um bebê no meu colo para me entreter, então não carreguei isso para a vida.
P/1 –Vou voltar para esse ponto, mas eu queria perguntar como era o seu bairro na época.
R – Como era o meu bairro na época? Rua de barro, muita cerca, né? Depois foram chegando os portões nas residências e chegando a alvenaria, mas era favela na época que falava, parecia, mas não estávamos dentro da comunidade, estávamos próximos. A rua toda era… Barraco, a maioria. A gente pegou uma foto… Um tempo atrás, meu cunhado conseguiu uma foto e era muito diferente. A escola… Porque da minha casa dá para eu ver onde eu estudei minha vida inteira, então a minha lembrança do Plínio é azul marinho, mas na verdade ele era branco na época, a rua era de terra… Quando chegou o asfalto, eu tinha dez anos. Então a gente ia brincar e voltava com a roupa daquele jeito. Tinha algumas que dava para lavar, outras tínhamos que jogar fora que não tinha como. Então era um bairro bem pobre. Hoje está bem mudado, bem diferente. Na Jardim Souza era um rio. A avenida chegou lá quando eu tinha acho que uns 12, mas era rio. A gente atravessava para ir para o outro lado, tinha pontezinhas para gente atravessar. Hoje no meio da avenida têm as galerias, e você olha pela galeria e consegue ver o rio. Só que antes, naquelas galerias eram as pontinhas, então a gente atravessava as pontes para ir para o outro lado. Era tudo de árvore, então quando a gente passava parecia um bosque, a gente passava por dentro das árvores para poder ir até a banca de jornal que era na rua de cima, na outra avenida, era assim. Era só árvore e terra, mas era bom.
P/1 – Agora eu vou voltar. Como é que você conheceu o seu marido, que era seu namorado na época?
R – Nossa! Quando eu conheci o Marcos Guilherme de Lourdes. Eu conheci o Marcos na escola. Ele estudou comigo na quinta série, e eu não sei se já era paixão na época, mas ele falava comigo e eu odiava ele. Eu não queria que ele conversasse comigo. Ele sentava do meu lado, ria e aquilo me subia um nervoso, eu ficava, "meu, do que esse cara ri tanto? Por que me enche o saco? Tanta menina aqui na sala para ele bater papo e tem que ser comigo?", e as meninas, "não, Si, mas é porque você fala com todo mundo". Mas para você ter noção, as meninas da sala gostavam dele e eu ajeitava o namoro dele com elas. Eu falava, "olha Marcos, a Telma quer ficar com você, fica com a Telma", "ah, fulana quer ficar com você, fica com a fulana". Eu fazia o cupido (risos) e eu odiava ele, não suportava. Na sexta série… Eu fazia o cupido com eles. Na quinta série… Não, ele passou para a sexta série, só que não concluiu, e aí eu não vi mais, ele parou de estudar. Na sexta série eu já fui para o noturno e ele parou de estudar. Ele passou um ou dois anos sem me ver. Um belo dia, eu fui na casa da minha irmã com a minha cunhada e encontrei com ele na rua. Ele estava lindo, maravilhoso, um gato, aquela coisa toda. A gente conversou, ele me convidou para ir ao cinema e eu aceitei… A minha cunhada, "aceita, aceita". Aceitei e falei, "e agora como é que eu vou poder ir ao cinema? Que eu vou ter que pedir à minha mãe para ir ao cinema e ela não vai deixar" (risos). Eu sei que falei com as minhas irmãs antes de falar com a minha mãe e elas, "ela vai deixar, a gente fala com a mãe" e aí nós fomos ao cinema e ele me pediu em namoro lá. Dali, estou com ele até hoje.
P/1 – A gente falou um pouquinho da sua gravidez e eu queria que você me contasse como foi ser mãe adolescente.
R – Ah, foi difícil ser mãe adolescente, difícil porque você tem que amadurecer muito cedo, então acabou o lance de arriscar, acabou o lance de se dar o direito a "eu não quero namorar com esse, quero voltar a ficar com outro", o lance de ir e vir a qualquer momento, acabou tudo isso. Você se torna mulher muito cedo, muito cedo. Tanto que hoje eu falo que estou vivendo a minha fase adulta, porque a minha vida começou de trás para frente. Hoje elas já estão grandes, então eu falei, "agora preciso fazer uma arte de adolescente", logo vou entrar nessa parte. É difícil porque você abre mão de tudo pelo filho. Você tem que parar a sua vida, você tem uma responsabilidade, você tem que trabalhar, tem que se sustentar, tem que correr contra o tempo e deixa tudo. Você não vai curtir… Na minha época era baile, então assim, eu ia em um ou outro, mas já no compromisso de uma mulher casada, então assim, você meio que para sua vida, sua melhor fase você deixa passar para cuidar de uma criança. E eu graças a Deus não engravidei de um qualquer, de um rapaz irresponsável, porque se eu tivesse engravidado de um rapaz irresponsável, eu acredito que aí a minha vida iria ficar muito mais complicada. Então ele pode ter 50.000 defeitos, mas a responsabilidade vem na frente. Então eu não tive tanto… Ele sempre foi trabalhador, sempre deu o que as meninas precisavam, a gente sempre estava ali um do lado do outro nesse sentido, então eu não senti tanto como outras meninas que eu conheço que muitas vezes têm três filhos, mas é cada um de um pai, e vive em uma vida turbulenta. Ou então o de outras em que o pai abandonou, não quis saber, e não tinha uma família ali ao lado para estar junto, ter que carregar uma criança nas costas sozinha. Não é fácil você com 16 anos acordar de madrugada porque a criança está chorando, identificar o que a criança está sentindo, porque você é uma criança, você é uma criança, então é difícil você identificar isso em outra criança. Às vezes você quer ficar tranquila, mas não pode, porque tem que fazer uma mamadeira, tem que dar banho, tem que trocar fralda, você tem que levar ao médico, tem que levar na vacina, tem que trabalhar. Você abre e fala, "nossa, a lata de leite está acabando", você já começa a ter essas preocupações, "ai, está acabando, mas o pagamento é tal dia e o pagamento do marido é tal dia". Entram os problemas do casamento no meio, então você meio que surta. Eu não surtei, mas poderia ter surtado (risos).
P/1 – E como é que foi sua vida a partir desse ponto? Você ganhou o bebê e foi morar onde? Como é que foi?
R – Eu ganhei o bebê, e fiquei… Meu pai tinha construído um quarto que seria para mim e eu fui morar nesse quarto. Como ele não tinha aberto ainda a porta desse quarto para dentro de casa, ele pôs a porta para fora de casa e eu fui morar em um cômodo. Foi a melhor coisa, porque talvez se eles tivessem me acolhido de outra forma, eu não teria tanta responsabilidade. Hoje pelo que minhas filhas falam eu sou exemplo para elas, então isso contribuiu, meus pais terem me dado essa responsabilidade, "a gente vai te ajudar sempre que precisar, mas entenda que a responsabilidade é sua" e eu fui morar em um cômodo só. Meu pai pôs um banheiro… Com o dinheiro que ele estava guardando para a minha faculdade e para ter o meu primeiro carro, ele fez o meu casamento. Eu tive que casar. Naquela época não tinha esse negócio de "não quero casar", "você vai casar". Eu casei quando a Jaqueline tinha cinco meses já. Depois, com um ano ou um ano e meio eu tive a Jennifer. Depois de dois anos, eu aluguei uma casa próxima da minha mãe e nós fomos morar em uma casa alugada.
P/1 – Você trabalhava?
R – Ah, fui trabalhar. Meu primeiro… Porque aí não estava mais na banca com meu pai, porque eu segui minha vida com o voleibol e fui fazer outras coisas. Fui trabalhar de empregada doméstica e quase matei meu pai de desgosto. Foi assim, acho que foi uma das piores fases dele… Acho que nem foi tanto o peso de eu ter falado que eu tinha engravidado, foi quando ele descobriu que para ajudar o Marcos eu fui trabalhar de empregada doméstica. Para ele foi o fim, foi o fim, ele me azucrinou, "eu não quero, não quero". Eu só fui explicar para ele, "pai, é só para ajudá-lo, eu não vou trabalhar a vida toda assim, como empregada doméstica", "não, porque para o negro é difícil, a vida é difícil, você tem que estudar, você tem que ser alguém na vida, já não basta o seus irmãos…", eu ouvi horrores e falei, "calma, eu vou ter uma profissão, o senhor pode ficar tranquilo, não é meu hobby limpar casa, então eu não vou ficar limpando casa de ninguém", "não, porque você está lavando a privada de outras pessoas", nossa, ele até chorou, porque para ele foi, "a única filha que eu ainda achava que iria para um outro caminho,
tá lavando privada", então para elr foi o fim. Ele ficou sem falar comigo para você ter noção, quando ele descobriu. "Você sabe que eu te ajudo, se falta leite, eu vou te dar, mas eu quero você estudando, eu não quero você trabalhando, ainda mais assim". Passou-se um tempo e depois eu fui fazer o curso de auxiliar de enfermagem e ele ficou mais tranquilo, bem mais tranquilo.
P/1 – Como é que foi fazer esse curso? Me conta.
R – O curso foi difícil, porque a gente não tinha um centavo. Você prestava tipo um vestibulinho para entrar na Santa Casa. Acho que uma das minhas fases mais difíceis foi a do curso. Eu fiz o curso em 95, 96. Foi difícil… Eu já tinha as duas meninas. Passei, fui fazer o curso e lembro que a minha mensalidade era R$90,00 reais. R$90,00 reais para mim era… Não tinha. Eu tinha um dilema. Ou eu pagava a mensalidade e não iria ou esses R$90,00 reais tinham que ser para alimentação, locomoção e material. Eu tinha que decidir, mas falei, "vou assim mesmo, não vou perder essa oportunidade". Fui, comecei a estudar, ia todos os dias bonitinho e sempre tirava uma das melhores notas da sala, sempre… Eu fui fazer esse curso de auxiliar de enfermagem quando minha mãe teve o primeiro AVC dela. Ela teve o primeiro AVC, eu cuidei dela e fui observando que os meus pais já estavam ficando velhos, já de idade e precisavam de cuidados. Eu sempre falei, "independente de empreender ou não, eu queria ter outra profissão", e a enfermagem sempre me chamou atenção e eu fui fazer o curdo. Na época, estudando, atrasei a primeira mensalidade, atrasei a segunda, atrasei a terceira… Pagava uma, atrasava duas, pagava uma, atrasava duas… E quem pagava o meu curso era o Marcos. Ele falou, "olha, eu só posso te dar isso, eu não posso te dar mais". Às vezes as minha irmãs me davam para a condução quando elas tinham… Foi onde eu falei, "bom, eu não vou poder parar de estudar", e foi quando eu engravidei do Marcos, tive um menino. Nessa trajetória toda engravidei do Marcos e não faltava, ia para o curso mesmo grávida. Até o dia que eu cheguei e falei, "bom, o não eu já tenho, então eu vou conversar com o ________[01:03:57], que está aqui sempre ajudando as pessoas, vou pedir uma ajuda para ele", e pedi uma reunião com ele. Falei que precisava muito falar com ele, que era o diretor da escola de enfermagem na Santa Casa. Ele falou, "fala Simone, o que foi?", e eu já falei assim, "é o seguinte, eu não tenho um centavo, não quero parar o curso, eu tenho as melhores notas, é uma coisa que eu quero para minha vida e quero saber o que você pode fazer por mim, mas eu não vou parar o curso" (risos), aí ele olhou para minha cara e falou assim, "simples assim?", falei, "simples assim. O seu não eu já tenho, então agora quero um sim. Eu pago com serviço. Quando eu terminar e vir trabalhar aqui, o senhor pode descontar todo o meu salário e já vai direto para a conta da escola… Qualquer negócio, mas eu não vou para o curso", e fiquei sentada lá na sala dele. Ele pensou, pensou e falou assim, "olha, é uma coisa que eu não faço mais, abrir essas exceções, porque eu já abri exceção uma vez e a pessoa não pagou. Eu não gostaria mais de abri essa exceção", e eu falei, "mas eu não vou faltar, não adianta nem travar a catraca lá embaixo, que eu pulo a catraca", e ele falou, "só um minuto". Ele foi lá na sala dos professores, chamou a coordenadora do curso e eu não esqueço, ela falou assim, "olha, ela é uma das minhas melhores alunas, eu não tenho o que falar, ela manda super bem, é esforçada e acho que a gente deve dar sim uma chance para ela". Entraram os dois na sala, falei "puxa, ele foi buscar a Merci" e ela era rígida demais. Ele sentou e falou assim,
"olha, eu vou ter que abrir exceção para você e vou ter que abrir exceção para outras pessoas, se não vai parecer proteção, mas eu sei que eu não vou me arrepender, né dona Simone?", falei, "jamais" e saí radiante, não sei nem como eu não tive neném naquela hora.
Ele falou, "onde você vai querer trabalhar?", falei, "em um pronto socorro", "pronto socorro só tem uma vaga, então nós vamos fechar assim, você faz o curso, não precisa se preocupar com as mensalidades, continua usando seu dinheiro para vir ao curso fazer os trabalhos, tudo que você já faz. Só tem uma vaga para o pronto socorro, então você vai ter que ter a melhor nota para ir para essa vaga do pronto socorro. É um desafio que eu vou te dar e é o que eu quero", falei "fechado", e ele "fechado?", "fechado, a vaga é minha", "tá, você vai ganhar nenê quando?", falei "eu vou ganhar nenê agora em julho", "então você vai pós formatura", e na minha formatura eu estava prestes a ganhar bebê. Ele falou, "então fechou, você vai ganhar bebê, vai passar a sua dieta com tudo bonitinho e nesse meio tempo, você vai fazer um processo seletivo. Se você passar, vai pro pronto socorro, a gente vai fazer umas prestações e vamos descontando do seu salário. "Tudo bem? Tá feliz agora?", falei "tô", e ele disse, "mas eu quero a melhor nota", e eu falei, "você vai ter", "eu não tô acreditando", "mas você vai ter a melhor nota" e fui. Terminei o curso e ganhei bebê. A minha formatura foi dia 4 de julho de 97. Antes a gente fez a prova, o processo seletivo para o pronto socorro para todas as vagas que tinha, porque assim, você terminava o curso e tinha possibilidades de já estar trabalhando na Santa Casa. Prestei só para o pronto socorro, porque a gente tinha opção, até três opções que você podia dar de setores para trabalhar, mas eu coloquei nas três opções pronto socorro, porque eu queria pronto socorro. Até o RH falou, "só tem uma vaga para o pronto socorro, você não quer colocar outra…", eu falei, "não, você não está entendendo, essa vaga é minha. Vai ser só pronto socorro, eu não vou colocar outra, é isso que eu quero", a moça do RH olhou para a minha cara e falou, "tá bom". E lá era assim, uma prova e a redação, então você tinha que ir bem na prova e tinha que estar bem em redação. Fiz a prova em um dia e redação outro dia. Acabou o curso e iria ser anunciado na nossa formatura. Ele foi chamando todo mundo, "teve nota x e tal". Chamou todo mundo e não me chamava de jeito nenhum, eu já estava ficando nervosa, falei "gente, mas será que eu fui tão mal assim? Não vou conseguir a vaga? Ele está chamando todo mundo", ele pegou e falou assim, não me esqueço, "eu vou chamar uma pessoa que posso dizer que é uma pessoa abusada. Ela fez um acordo comigo…", falei, "ah, essa sou eu", "ela fez um acordo comigo e cumpriu esse acordo", aí me chamou lá na frente. Nossa, aquele dia… Minha mãe foi na formatura… Só foi minha mãe na formatura naquele dia.
Eu já subi chorando, né? "Nossa, consegui". O primeiro obstáculo já… E ele falou para mim, "você não só conseguiu a vaga no pronto socorro, como você teve dez em redação e eu nunca dei dez em redação para ninguém. A sua redação vai ficar aqui de modelo na Santa Casa". Ele colocou minha redação de modelo lá para todo ano poderem olhar, lerem a redação. As professoras sempre preparavam para redação nas aulas, então ele deixou lá de guia para as pessoas lerem e se inspirarem para fazerem a redação. Mas não tinha um erro naquela redação, nenhum erro, nada, nada, nada. Isso para mim me marcou assim, demais. Só que ao mesmo tempo que eu explodi de felicidade, quando foi no dia 22 de julho, eu ganhei o Marquinhos, só que ele faleceu no dia 27 de julho. Eu fiquei muito mal, porque você carrega um filho todo esse tempo, e depois que ele nasce… Ele nasceu com uma má formação no intestino… E era alguma coisa relacionada à Santa Casa, porque era eu e mais quatro grávidas no curso, nós cinco ganhamos bebês e só um bebê vingou e nasceu com uma paralisia. Agora não se sabe se foi por conta dos estágios, raio X… Não se sabe o que era, mas só esse bebê vingou e com paralisia. Eu perdi o Marquinhos com cinco dias. Eu ganhei lá na parte do convênio. Eu lembro que estava em casa e quando chamaram eu falei, "se chamou…", eu quase fiquei doida, né? Porque terminei o curso super feliz, ganhei o bebê, perdi o bebê e vou fazer o que? Fui lá e falei, "preciso pegar minha vaga", "não, mas tem que esperar", "não, preciso pegar minha vaga". Com 30 dias eu fui trabalhar, comecei, 30 dias. No início de setembro eu comecei a trabalhar, precisava ocupar minha cabeça e fui trabalhar no pronto socorro. Foram dois fatos ali da Santa Casa que me marcaram. Eu fiquei lá dois anos trabalhando no pronto socorro e de lá trabalhei 22 anos na área da enfermagem, quase que minha vida toda. De lá eu fui para Bandeirantes e trabalhei com ambulância na rua, prestando socorro, e da Bandeirantes fui para o Albert Einstein. Lá no Einstein eu trabalhei durante 17 anos, só em emergência.
P/1 – Nesse primeiro emprego que você teve nessa área, como é que foi? Como você conseguia conciliar com a família? Como era essa rotina?
R – Ah, no primeiro emprego lá na Santa Casa, eu trabalhava meio período, seis horas, das 13 horas às 19 horas. Eu ficava com as meninas na parte da manhã, deixava elas na minha mãe porque eu morava perto e ia trabalhar. Saía de lá direto, passava na minha mãe, pegava elas e ia para casa. Foi assim por
ano mais ou menos. É, um ano. Depois eu comecei estudar, fui tentar fazer enfermagem, faculdade de enfermagem… Depois de lá, eu ia direto para a faculdade. Quem olhava as meninas era minha mãe e minhas irmãs. Tem a Júlia que morava na parte de cima da casa da minha mãe e mora até hoje, e a Cléia que mora perto. Então a Cléia ficava durante o dia cuidando da minha mãe, dando uma força para a minha mãe e cuidando das meninas. A noite a Júlia chegava do trabalho e ficava com elas até eu chegar da faculdade. Então a gente se ajudava assim. Final de semana, quando eu estava de plantão eu deixava na minha mãe, porque a enfermagem tem uns horários meio doidos, uma escala meio estranha. Além dos extras que muitas vezes você tem que ficar, você trabalha sábado, domingo e feriado, não tem muito vida, você mais tem trabalho. Então final de semana sempre… E o marcos quando estava de folga ficava com as meninas. Tinha umas certas briguinhas entre nós, porque eu deixava com ele e daqui a pouco quando ia ver, estava com as minhas irmãs e eu já brigava porque era dia dele ficar, mas fora isso, foi tranquilo. As duas… Com as mais velhas eu não tive muito problema, pude trabalhar bem na enfermagem. Agora com a caçula, já não. Com a caçula é já uma outra fase, a fase em que eu já estava saindo da área da enfermagem para empreender exatamente porque não tinha mais essas ajudas e hoje não dá para deixar seu filho com qualquer pessoa. Antigamente você deixava até com vizinho, hoje não dá mais. Então fui saindo da área justamente porque ela ia crescendo e iria precisar de mim realmente para poder cuidar.
P/1 – Deixa eu te perguntar mais um pouquinho dessa área que você trabalhou tanto tempo. Têm cenas que você se lembre, pacientes, histórias para contar? Uma história marcante desse período...
R – Eu tenho várias, várias histórias.
P/1 – Pode contar, eu adoro ouvir.
R – Mas têm umas histórias meio esquisitas (risos), meio picantes. Mas assim, histórias da Santa Casa… uma história triste que mais me marcou na Santa Casa foi quando chegou um menino de dez anos. Ele morava em uma comunidade ao lado de uma rodovia, empinando pipa, foi atravessar a rodovia e foi atropelado, um caminhão passou por cima das pernas. Eu lembro que levou para Santa Casa, acionou e a gente já arrumou a sala de emergência para ele chegar. Ele chegou consciente e falava assim para mim, "tia, coça meu pé, meu pé ta coçando", só que não tinha mais perna ali. A gente chama de síndrome do membro fantasma. Você perde seu membro, mas por muito tempo você ainda sente seu membro. Se você perdeu um abraço, você vai sentir tudo daquele braço ainda, até o cérebro entender que ele não está mais ali. Isso marcou. A gente teve que ligar para a mãe. Quando a mãe chegou assim, ela estava destruída dever o filho do jeito que estava. Ela tinha mais seis filhos e precisava trabalhar para sustentar os seis, e não tinha um pai ali para ajudar. Isso foi uma história assim, a gente chorou demais naquele plantão, demais. E outra história, uma história mais engraçada, foi o dia que chegou um rapaz com o pênis quebrado, entendeu? E ele estava no hotel com a amante e chegou a mulher com a faca (risos) para poder matar. Então ficamos no dilema, "deixa ela entrar? Se ela entrar…". Que aí, quando ela foi entrar para falar com ele a amante foi embora, a gente liberou a amante. "Mas como aconteceu isso?", "ah, a gente foi fazer uma brincadeira e ela se jogou do armário lá em cima", ela foi para cima dele e enfim, o negócio ficou estranho. E aí ele tinha que ir para a cirurgia, porque o médico falou, "vamos ver o que a gente salva daqui". E a mulher chegou, e o que você fala para uma esposa? Não tem… Como que a gente mente? Não tem como mentir. Ela chegou com uma bolsa e eu falei assim para a Fátima, que era minha parceira na época, "Fátima, aquela bolsa está estranha. A mulher não larga a bolsa de jeito nenhum. A gente tem que ficar de olho",
e a Fátima "será?", e quando a mulher entrou para falar com ele, ela puxou uma peixeira de dentro daquela bolsa que a gente não sabia… E o que eu fiz? Entrei na frente dela, "senhora, não adianta arrancar, não serve mais para nada, pode ficar tranquila" e ela desabou a chorar. Mas levamos ela para o nosso mocó - que a gente chama de mocó onde a gente fica, toma um café e descansa. Demos água para ela, servimos café… A gente tinha que acalmar aquela mulher, porque olha, hoje eu acho que ela não entraria com uma faca, ela entraria com um revólver, que as coisas estão mais evoluídas, né? Mas foi difícil segurar. Ela explicou tudo que estava passando e a gente entendeu. A vontade da gente era falar, "entra para ter só dez minutos de conversa e depois a gente entra para tentar salvar o que sobrou", mas foi punk. Agora mais histórias, histórias mesmo foram do Albert Einstein. Eu tive muito problema no Einstein pela cor da pele. Eu tive experiências tremendas, de fazer boletim de ocorrência até mesmo por agressão. Eu tive… Uma das maiores agressões que eu tive lá em relação a paciente foi uma mãe… Eu estava escalada na pediatria, porque lá tem o pronto socorro adulto e o pronto socorro infantil e eu fazia parte da equipe do adulto e da equipe do infantil. Então tinha quinzenas que eu és estava no infantil e quinzenas que eu estava no adulto. Eu lembro que estava fazendo 12 horas de plantão, porque estava pagando plantão para uma colega que tinha feito para mim no final de semana. Uma menina de 12 anos… Peguei a veia e sempre a mãe está do lado, para poder medicar. Assim, eu percebi que a menina… Mas para mim era nervoso de pegar a veia. Então a mãe falava assim para mim, "passa bastante álcool no braço dela", mas eu achava que era tipo uma técnica que a mãe tinha nesse sentido, que passando bastante álcool ela se sentia mais confortável. E eu passava álcool, passava e tal. E aí, antes de pulsionar, a minha colega veio e falou assim, "deixa eu pegar a veia dela, porque eu nao estou conseguindo pegar a veia de um outro paciente" e eu caí nessa, "ah, tá bom, tudo bem ela pegar?", e ela falou, "tudo bem". Saí da sala e fui pegar a veia do outro paciente que essa minha colega iria pegar, pulsionei e tudo mais. Achei estranho, porque falei, "nossa, mas o acesso não é tão difícil". Tá bom. Peguei e voltei. Eu me lembro que a mãe pediu para falar com a enfermeira de plantão e a enfermeira de plantão entrou na sala de medicação. A nossa sala de medicação lá ficava com seis pacientes, então tinha outros pais, com outras crianças. Nessa, eu fui avisar a colega que eu tinha conseguido pulsionar. Entrei com a bandeja para poder falar e avisar a enfermeira que estava okay lá e perguntar se ela tinha conseguido pulsionar a menina. Nessa que eu entrei, a mãe estava falando para a enfermeira assim, "olha, você sabe por que o Einstein se tornou esse lixo que está? Porque você contrata pessoas dessa cor, você contrata pessoa com esse tom de pele", bem na hora que eu cheguei. Eu confesso para você que minha vontade era pegar aquela bandeja e tacar, sabe? Mas eu acho que nem fiquei tão impactada com o que ela falou, porque é o perfil dos pacientes de lá. Não que a gente deva se acostumar e aceitar, mas é o perfil que tem lá. Não é a maioria, mas é um perfil. Agora o que mais me doeu foi a enfermeira não ter feito nada, foi ela não ter tomado as minhas dores, porque ela tinha… Aliás, ela era responsável pelo setor. Eu parei e nenhuma das duas tinha me visto. Eu parei e fiquei esperando a reação dela. Ela vira para a mãe e fala assim, "não, tudo bem, mas essa é uma questão que não é minha, é uma questão do Einstein", então assim, uma vez que você escuta isso, eu tenho para mim que essa pessoa também é uma pessoa preconceituosa, porque se não ela não faria isso. Por mais que ela tenha sido pega de surpresa, acho que ela… Então não falasse nada, ficasse quieta. Eu entrei, olhei e saí da sala. "Eu vou sair, porque por qualquer coisa que eu fale ou faça, eu vou estar errada, porque é assim que funciona". Só que tinha outros pais na sala, que eu tinha atendido. Inclusive tinha um pai lá que o filho dele já tinha tomado… Dois funcionários já tinham ido tentar colher o sangue, não conseguiram e eu fui com toda calma, conversei com a criança, a gente bateu um bom papo e eu consegui pulsionar. Então ele ficou indignado de ouvir isso. Ele brigou por mim. Não foi a enfermeira que brigou, ele brigou.
E foi bem na hora que eu tinha que subir para comer, porque já tinha que voltar, porque já estava com 12 horas de plantão. Eu cheguei no refeitório e a comida não descia, não descia, não descia. Eu sentei e chegaram dois colegas meus do plantão, sentaram, perguntaram o que estava acontecendo e eu contei. "Eu não sei nem se eu desço, se fico aqui, o que eu faço. Sinceramente, eu estou desorientada". Eles falaram assim, "ah, foi isso que aconteceu? Mas não pode ficar assim", eu falei, "mas não vai ficar assim". Só que no momento eu não tive muita reação, porque minha reação iria ser agressiva. E eu sabia que se eu tivesse uma reação agressiva, só eu iria ser prejudicada. Quando eu desci, já estava do outro lado… Porque assim, o que eu esperava dela? "Eu não tive reação, eu fui pega de surpresa, mas eu vou falar com a chefe de plantão". No outro lado, que era do adulto, ninguém sabia o que estava acontecendo, e isso já tinha acontecido há duas horas. Se eu não vou almoçar e conto para os meninos, ninguém iria saber. Mas quando os meninos cheques chegaram do outro lado, chamaram a Gláucia, que era a enfermeira responsável da época e contaram para ela, na mesma hora a Gláucia foi lá para saber o que estava acontecendo. E bem na hora que eu cheguei do almoço. Aí filha, eu tive que… Peguei a enfermeira e falei tudo que estava entalado, que eu não consegui almoçar porque estava entalado. Nessa, chegou o Celsinho, que é da _________ [01:27:55] e falou, "não, não vai ficar assim. Eu quero um carro agora que nós vamos fazer um boletim de ocorrência". Essa mulher me perseguiu por mais de uma semana dentro daquele pronto socorro. Ela ficou lá, a filha dela ficou internada e ela exigia que mandassem a gente embora. Eu, mais a moça da recepção… E ela foi tão feliz, que todos os profissionais que atenderam ela desde a hora que ela chegou eram negros, todos. Ela chegou, o manobrista era negro, ela entrou e na recepção quando foi fazer a ficha quem atendeu ela foi uma menina que é negra, ela entrou… A única pessoa por quem ela foi atendida que não era negra foi o médico, porque do restante, todos eram, todos eram. E isso marcou, porque assim, como eu falei não era pelo paciente. E o que mais dói nisso é que tudo entra como injúria racial e não dá nada, então assim, levar um processo adiante nesse sentido, não dá em nada, porque e injúria racial e acabou. Tiraram o racismo e o máximo que pode acontecer é pagar uma peninha de dar uma cesta básica por determinado tempo e acabou. Então eles sabem, são pacientes orientados. Logo em seguida, um paciente tacou um telefone em mim exatamente porque o médico dele estava atrasado, ele já tinha descido, o convênio não resolvia o problema dele e sobrou para mim, como se eu fosse a culpada. Xingou, falou… Só que assim, lá a gente não tem um certo apoio, tanto que passou um tempo e eu fui mandada embora. Agora mandada embora porque em si eu não quis nem saber, sabe? Depois que eu fui mandada embora também, eu nunca mais tive problema de saúde, então
(risos) foram três anos sem saber o que é um hospital, então acho que estava me fazendo mal.
P/1 – Eu vou te perguntar. Além desses acontecimentos, você enfrentou outras dificuldades por ser uma mulher negra?
R – Dificuldades por ser mulher negra, o tempo inteiro. Aliás a dificuldade é porque você é mulher, já começa por aí, então não te dão muito crédito. E segundo, porque você é negra, aí o negócio… E terceiro, porque você não tem dinheiro. Então são três coisas que andam com a gente, infelizmente. Um dia eu recebi um cliente na empresa, ele sentou lá… Assim, a confecção é voltada para o público feminino. Uniformes para a prática esportiva e para voleibol. Agora que eu estou entrando no masculino, mas na verdade sempre foi mais para o feminino. Chegou um cliente lá, conversou comigo o tempo inteiro para poder fechar o pedido, e quando chegou lá, ele não falava comigo, só falava com o meu marido, que nem manja de nada, não sabe nada. Ele fazia as perguntas diretamente para o Marcos e eu não estava entendendo. Ele fazia a pergunta para o Marcos e o Marcos perguntava para mim. Depois que ele sentou, "então vamos lá", eu falei, "vamos começar tudo de novo, porque você fez suas perguntas para ele, mas na verdade ele não trabalha aqui. Aqui ele só está de passagem. Se o senhor quiser saber qualquer coisa sobre uniforme, é comigo. Vamos começar do começo. Prazer, meu nome é Simone, e eu sou a responsável pela MS Esportes, do que o senhor está precisando?", e teve que falar tudo de novo, mas porque eu era mulher. Ele queria falar com um homem, não queria falar com uma mulher, e aí vai. Então assim, eu sinto que fecho mais negócios por telefone do que presencial. Então já forma algumas empresas sim para fechar… Por exemplo, um contrato que já estava praticamente certo, mas depois, no presencial, as coisas mudaram. E outra barreira que a gente tem é que quando a pessoa conhece, viu fotos e conversou com você, ela quer desvalorizar o seu produto. "Eu pago R$20,00 reais na unidade de um shorts para a marca X. Por que eu vou pagar R$20,00 reais para ela? Eu pago R$15,00 reais", entendeu? Então meio que valoriza e ai começa a dar preço no seu serviço, quer que você trabalhe de graça… O que eu percebo é isso. Eu fecho mais negócios por telefone do que presencialmente. Presencial é meio difícil, porque ou a pessoa não gosta de tratar com mulher, ou ela não gosta ou não confia em tratar com uma mulher negra. Essa é a barreira. E banco também, você vai conversar e não tem muita conversa, a gente não tem muito acesso a créditos, por conta disso. Porque a empresa não é nova, uma empresa que já está no mercado há dez anos não é uma empresa nova. Eu tenho como provar um faturamento, mas vêm 50.000 coisas de obstáculos que não te deixam chegar ao crédito. Não te dão crédito, literalmente. Então é difícil, empreender na periferia é difícil, não é fácil, tem que ser guerreira.
P/1 – Vamos começar do começo dessa história. Você ficou 22 anos trabalhando na área de enfermagem e depois saiu para começar a empreender. Eu quero que você me conte como foi esse momento, como você começou...
R – Quando eu estava na área de enfermagem, eu já empreendia, porque o que eu observei? Eu trabalhava com mulher, muita mulher, a enfermagem tem muita mulher. Então eu comecei a fazer roupa para essas mulheres. Uns seis anos antes de mudar realmente a profissão, eu já comecei a produzir. O que eu fazia? Eu mesma de xereta aprendi a costurar, eu mesma de xereta aprendi a modelar. Eu gosto de observar bastante, então eu vejo qual é a necessidade que uma mulher tem, qual o tipo de roupa em que ela mais se sente confortável. E eu comecei a já ir pesquisando esses nichos de mercado. Eu via qual era a dificuldade de uma pessoa que trabalha na enfermagem. A gente não tem tempo de se arrumar, a gente não tem tempo de andar todo emperequetada, não tem tempo. A gente joga uma calça jeans, joga hma bailarina no corpo, uma baby look, e esse é o nosso traje, porque é uniforme o tempo inteiro. Então eu comecei a fazer o que? Chegou o inverno e eu falei assim, "mô, vou fazer um teste". Peguei meu vale, já tinha pesquisado fornecedor e enfim, já sabia os caminhos, comprei tecido viscolycra e fiz blusinha com manga longa. Só que eu falei, "não vou fazer gola redonda, porque isso todo mundo tem. Eu não acho blusinha…", a gente usava muito gola V, que é mais prático para pôr, para tirar… Fiz as blusinhas e foi um sucesso no hospital. Não podia vender as coisas dentro do hospital, mas nada que uma conversa.... Vai ali no vestiário, a outra vai no vestiário mais cedo… "Olha, vou sair mais tarde e vou estar lá", e o boca a boca é o melhor marketing que a gente pode ter. Eu cia que saía e falei, "bom, preciso fazer uma calça confortável" e fui fazer uma calça confortável, com bolso, e as meninas adoraram. E ali eu comecei, falei "bom, agora acho que estou pronta para quando sair daqui, falar é isso que quero e é nisso que vou empreender". Eu comecei a empreender na verdade com a camicase que era de estamparia. O que eu fazia? Comprava camisetas e estampava. Comprava estampa pronta e tive uma… Abriu uma lojinha dentro de um mini shopping e estava indo bem, só que eu era sozinha fazendo tudo, então não dava. Foi logo que eu entrei no Einstein, então vai para o Einstein, volta… Eu tenho um sobrinho que é meu braço direito, mas não dava para ele sozinho, e depois fechou lá também e a gente deixou meio que de lado. Passou alguns anos e eu comecei com a MS assim, dentro do hospital, já trabalhando e vendendo roupa para elas. Eu fazia tudo… Na época de inverno era isso, já sabem tanto que eu tenho clientes lá dentro que já sabem quando chega o inverno, "Simone, quero aquela blusa", "Simone, aquela calça". Eu comecei assim. Quando eu vi que estava pronta… Teve um corte lá no Einstein e eu estava no meio há três anos, eu peguei e fui, nunca mais procurei emprego.
P/1 – E como é que foi depois, quando começou o negócio?
R – Ah, foi sofrido. Depois que eu saí, a gente se vê… Não tem mais o salário, né? Não tem mais o décimo terceiro, não tem mais… Eu sempre quis uma plooter. Na época meu marido foi mandado embora da Editora Abril, nessa leva que teve em que o pessoal saiu praticamente sem receber nada e eu vi a oportunidade de ter a minha plootwr. Eu já tinha pesquisado um tecido top, então assim, eu já tinha feito a modelgame própria para a master, por que o que acontecia? As meninas… A gente jogando e a sblusas eram muito grandes, corte masculino… A gente não queria uma coisa assim, só que ninguém fazia isso eeu comecei a fazer, já voltado para a mulherada. Ali foi onde comecei. Arrisquei, falei "não dá para trabalhar em casa, porque não tenho como receber clientes aqui". Uma amiga minha falou, "olha, eu tenho uma casa lá que está vazia, quer entrar? Entra, faz a sua empresa, trabalha lá e depois a gente vê como fica". Não pensei duas vezes, fui para Casa Verde e fiquei dois anos lá. Agora fui para a Brasilândia, porque a pandemia chegou e complicou nossa vida, mas estava indo super bem. Dali o pessoal ia me visitar e eu comecei a fazer… "Preciso agradar. Para manter meu cliente, eu tenho que ter o diferencial, porque só a modelagem uma hora alguém vai fazer também" e eu comecei a aumentar a cartela de clientes, e mulher gosta de mimo, né? A maioria tem cachorrinho, tem um ursinho, uma boneca, alguma coisa de estimação… Sei lá, alguma coisa ela tem. Eu comecei a fazer miniaturas dos uniformes. Para eu não fazer uma blusa e depois ter as modificações, porque eu vou perder tecido, vou perder tinta, vou perder papel, vou perder um monte de coisa, eu comecei a fazer as miniaturas delas e não volta mais. Então eu faço a miniatura, o cliente chega, fecho o negócio, ele leva embora a miniatura e não volta nunca mais. Ali elas tiram foto que colocam no urso, colocam no… Ou então se já é avó, coloca no bebê, coloca no cachorrinho, enfim. Mas foi bom, foi uma experiência boa. Tive mês apertado? Tive sim, mês de baixa até eu conseguir me moldar e entender que eu precisava aprender a fazer o fluxo de caixa… Foi onde chegou o curso Mil Mulheres. Isso salvou a minha vida, foi a salvação da lavoura, porque a gente fez um curso rápido de uma semana e la eles ensinaram a gente a fazer tudo, uma pincelada, mas boa. Então ali já começou o, "opa, eu preciso empreender, é esse caminho, se eu não fizer isso não vai", porque a gente mistura muito o nosso dinheiro com o dinheiro da empresa e isso quebra. Chega no final do mês, você não tem nem o seu, nem o da empresa. E eu fiz isso, confesso para você que eu fiz isso. Acho que todo empreendedor faz. Até que eu aprendi que tinha que separar tudo isso, foi sofrido, foi sofrido. Acho que o meu maior desafio foi aquilo que muito empreendedor não tem, cliente, e eu tenho muito. Tenhos clientes fiéis, eles voltam mesmo. Só que o que eu não tinha era essa parte teórica da coisa, a base de fazer o administrativo, a gestão… Eu não tinha nada disso. A gente passa a ser a empresa e você faz tudo. Faz tudo e não faz nada, na verdade, porque um dia você chega cansado… Todo mês eu começava a fazer o fluxo de caixa. Não dava três dias e eu já não anotava mais nada, "já passou, já estou cansada". Eu tinha que cortar, eu tinha que modelar, tinha que costurar… Foi difícil. Seis meses terríveis, de eu sentar e falar assim, "gente, será que era isso mesmo?", colocar em prova e falar, "gente, acho que vou voltar para o hospital", mas falei, "não, é isso que eu quero". Então eu diria para você que na melhor fase chegou a pandemia, agora tem que começar tudo de novo.
P/1 – Ainda falando um pouco antes da pandemia, como é que você conheceu o Sebrae?
R – Conheci o… Já tinha ouvido falar do Sebrae, mas quando eu procurei o Sebrae há muitos anos, era uma coisa… Não era o que é hoje. Eu cheguei lá, falei com um consultor e ele me apresentou um plano de negócios que eu falei, "gente, não vou fazer, esquece, não é assim. Não vou pro Sebrae, não dá para mim. O Sebrae acho que é já para empresários que são tops, porque para quem não é, não rola" e passaram anos. A minha sobrinha é empreendedora tmabem, sempre foi, e tem um estúdio de pilates. Ela ficou sabendo ayraves de uma colega dela que iria ter o curso Mil Mulheres, que era para mulheres de periferia empreendedoras ou que queriam empreender e não sabiam como e que teria curso de gestão. Ela me indicou, eu fui, já entrei, me cadastrei e fiz esse curso de cinco dias. Daí me abriu portas, porque foi bom esse curso, recomendo para qualquer pessoa. E aó ru fui entender que o sebrae hoje tem uma nova cara e voltada para gente. Hoje eu divulgo o Sebrae inclusive, falo e recomendo para qualquer pessoa que, "ai, eu quero empreender, eu queto fazer qualquer negócio". Até para quem não quer abrir nada, esse curso do sebrae serve para fazermos a gestão da própria casa, então eu indico o Sebrae por isso. Foi assim que fonheci o Sebrae mesmo, a fundo (risos).
P/1 – E quando é que você começou a se enxergar como uma empreendedora?
R – Faz um ano e meio que eu comecei a me enxergar como empreendedora, que eu comecei a mudar, é uma transformação. Eu comecei a me transformar como uma empreendedora, eu comecei a me posicionar como uma empreendedora. Eu fui entender que eu tenho uma empresa,ah, ela é pequena, o faturamento pode não ser gugante, mas ela é uma empresa. Faz um ano e meio que eu comecei a mudar, a virar a chave, sabe? Virei a chavinha e falei, "não, pera aí, minha postura tem que ser diferente. É isso que eu quero para a minha vida. A empresa vai andar comigo para o resto da minha vida, então eu tenho que mudar. Eu tenho que mudar a minha postura, mudar o meu perfil e preciso estudar", entendeu? Depois que eu entrei no Sebrae ficou muito mais claro para mim, mas faz um ano e meio que eu falei, "não, hoje eu vou falar que eu empreendedo". Porque antes eu falava, "ah, não, eu tenho um negocinho", nunca falei empresa, porque para quem não vira a chave, empresa são as grandes empresas. Pequenos negócios, a gente não vê como empresa, a gente vê como negocinho, "ah um negocinho aí para ver se dá", então a gente não coloca fé naquilo que a gente mesmo faz. Faz um ano e meio que virei a chavinha.
P/1 – Eu queria que você me contasse um pouco mais sobre a sua empresa e como era a sua rotina de empreendedora, e como mulher também. Como era a sua rotina antes da pandemia?
R – A MS começou de um sonho, o sonho do voleibol, então como eu não fui mais uma atleta profissional, passei depois a ser master, porque eu nunca parei de jogar, eu tinha muita dificuldade em comprar roupa mesmo para jogar, uniformes para jogar. Depois que você passa dos 30, você já ganha lá uma gordurinha a mais, você não usa mais um P, é tudo muito estranho. Então quando você chega em uma loja voltado para fitness, o tamanho GG é o que servia para mim, e eu ficava pensando, "eu sou magra e estou usando GG da loja fitness, imagine quem é mais cheinha". O que eu observava das mulheres? Muita camiseta... A gente não recorria nem à baby look, mas a camiseta e ficava aquela coisa estranha outra coisa que eu observava era uma legging, uma bermuda mostrando a calcinha. E na arquibancada tem homem e às vezes você ouvia algumas piadinhas, e isso me incomodava, porque eu participava desse cenário. Foi onde eu falei, "não,
então eu preciso mudar. Se essa é a minha dor, é a dor de muita mulher. Bom, vou unir o útil ao agradável. Eu vou jogar e ao mesmo tempo vai ser meu ganha pão", porque o master é um pouco caro, porque tudo você paga. Você paga para campeonato, você paga para viagem, você paga para tudo. E aí, você está empreendendo, não tem uma renda e tem que fazer uma renda… É uma coisa que eu gosto. Fazer exposição em uma quadra de voleibol e ainda participar de campeonato jogando é um sonho, então foi onde eu comecei a fazer as modelagens voltadas para esse público. Falei, "não, esse vai ser meu nicho. Minhas amigas, minhas parceiras vão ser minhas clientes e vai ser a satisfação de todo mundo". Foi aí que surgiu a MS para valer. Eu trabalho com uniformes voltados para o voleibol. Agora eu estou fazendo pro handebol e para o chuckbol, que é uma modalidade que eu não conhecia. Fiz para as meninas e elas gostaram, então estou voltada para esses três públicos. E faço roupa para caminhada, para pilates que são regatas, bermudas… Eu comecei a olhar as bermudas de suplex e leggings e pensei, "gente, eu preciso tirar essa transferência daqui", porque legging é o que a gente mais gosta de usar, e bermuda… E outra coisa, você pode usar isso em casa, não necessariamente para sair. Peguei a modelagem a girar no tecido. Girava e cortava, girava e cortava, girava e cortava, até que eu cheguei em um ponto do tecido que não tinha mais essa transparência, você pode usar e não vai mostrar a calcinha por aí. Você sabe que a pessoa tem uma calcinha ali, claro, mas não tem a definição dela. Você pode pôr uma calcinha vermelha? Pode, ninguém vai saber que é vermelha. Sabe que você está com a calcinha ali, mas não sabe que é vermelha. Consegui um fornecedor que tem um suplex legal, um suplex firme e isso é a MS. Eu vou sanar a dor da mulher que precisa praticar esporte, que precisa fazer uma caminhada, que precisa sair da sua rotina, e incentivo elas a isso. E é isso, MS é isso, é meu sonho, é minha vida. Eu me emociono de falar dela assim, eu sou apaixonada pela minha empresa, apaixonada. Nada me tira da cabeça, é isso mesmo. Eu sofro quando ela sofre. Quando eu vejo que não está bem, eu sofro, mas não sofro no sentido, "poxa, eu não tenho dinheiro", eu sofro porque eu quero vê-la despontando, deslanchando. Quando chegou a pandemia, eu tive que mudar, tive que criar um outro perfil, porque na chegada da pandemia, eu tinha 32 eventos para fazer. Para você entender um pouco, eu tenho os campeonatos de voleibol e o que eu faço? Eu monto um estande com as roupas, então além de divulgar o trabalho e de fechar os uniformes com as equipes, eu levo as roupas para vender. Então em alguns campeonatos as pessoas já me ligam, "Simone, o que você vai levar?", "separa para mim tal coisa", então muitas vezes e vou a um evento e já levo as sacolas separadas, porque já têm clientes certos, já estão lá esperando. Para mim foi devastador cancelar 32 eventos, porque não tem mais campeonato. Eu pagar um aluguel não muito alto, R$1.500,00 não é um aluguel muito alto e o espaço era bom, mas se ver sem crédito, sem caixa para manter e falei, "vou ter que fazer alguma coisa, não dá para sentar e ficar esperando algo acontecer". O que eu fiz? Eu peguei uma máquina, levei para a minha casa e fui fazer máscara, "vou costurar minhas máscara e isso aí, vou mantendo meus clientes assim. Vou fazer máscara personalizada para as equipes". Roupa ninguém estava comprando. Uma legging, uma bermuda para ficar em casa, uma regata, mas assim, nada porque estava tudo muito incerto, então as pessoas estavam mais poupando o seu dinheiro do que gastando. E foi trabalhar só fazendo parte da costura para o pessoal, então assim, foi eu digo que um trabalho escravo, no sentido de que se aproveitaram muito das costureiras nessa pandemia. Pagar 15 centavos para costurar uma máscara é pouco… E aí a pessoa vender por R$10,00 reais… Dava para pagar um pouco mais. Enfim, mas era o que tinha, então eu dobrei meu joelho, orei para Deus e falei, "é o que tenho, é o que eu vou fazer. Não adianta também eu ficar sentada, comendo e engordando", não iria resolver problema nenhum. E fui costurar máscara. Achei alguém que pagava um pouco melhor e tal. O que eu vi foi que muitas costureiras só fazem isso. Elas não têm outra coisa a fazer, elas mantêm a casa delas assim, não têm um parceiro para manter a casa. Eu comecei a correr atrás de pessoas que tinham muita máscara para costurar e fui montar um grupo de costureiras para ajudar essas mulheres, porque assim, o Marcos estava trabalhando. Reduziu o salário? Reduziu, mas assim, eu não iria passar fome. Ah, vai atrasar água, vai atrasar luz? A empresa está fechada, eu conversei com a dona, ela também tinha fechado o salão dela e falou, "olha, não estão me cobrando aluguel, eu também não vou cobrar de você até que a gente volte. Vamos esperar passar". Então assim, eu não rinha despesa de lá, sem ser a luz que vinha todo mês, mas eu tinha o que comer. E essa mulheres que não tinham o wue comer? Eu selpre fui de pensar nisso, tem gente que não tem, então eu fui atrás. Arrumei pessoas que tinham 10.000, 15.000, 50.000 máscaras para fazer e fui atrás de costureiras que eu conhecia e que só sabiam fazer isso, só costurar. Eu mesma pegava, deixava um pouco para mim e distribuía para elas. Não cobrava gasolina, porque já é pouco. Pagar 20 centavos, 30 centavos para costurar, eu vou tirar o que? Falei para o meu sobrinho, "você topa levar e buscar para elas, porque elas também não têm como trazer? Não têm carro, não têm dinheiro", "topo, sem problemas, não estou fazendo nada", então meu sobrinho fazia essa parte. O fornecedor trazia, eu separava para elas e distribuía. É um trabalho? É, mas está ajudando a pessoa de alguma maneira, porque dinheiro eu não tenho para ajudar ninguém, mas trabalho… Foi assim que eu me virei na pandemia. Isso foi bom para mim, foi bom para a minha cabeça. Eu posso falar para você que eu não parei um dia. Não tive um dia que falei, "não, vou dormir até tarde". Eu não sei o que foi a pandemia, esse negócio de parar e não ter o que fazer. Eu trabalhei a pandemia inteira assim, em máscara, em luva para chegar nas pessoas e falando para Deus, "cuida de mim e vamos". Então a pandemia para mim foi trabalho. Não foi dinheiro, foi trabalho, mas foi satisfação no sentido de que a gente começa olhar diferente para o próximo. Eu sei que muita gente não conseguiu ainda, mas a gente começa a olhar diferente. Eu conheci muita gente e vou colher esses frutos amanhã, porque assim, eu vou fazer parcerias, conheci muita gente que jamais imaginava. Tive contato com pessoas que se não fosse a pandemia, não teria. Foi onde eu decidi montar o site. Estou montando esse site ainda, porque vou precisar de um site, não tem jeito. Por um lado foi bom, triste pelas perdas, mas pelo lado da empresa foi bom, foi bom, quer dizer, vai ser bom.
P/1 – Eu queria perguntar como é que você desenvolveu a habilidade de costura, como foi esse processo.
R – Foi com a minha mãe, eu meio que segui a trajetória da minha mãe. Ela era costureira, e quando pequena, ela me ensinava a fazer os vestidos para as minhas bonecas. Como eu fazia festinha das bonecas, eu tinha data das bonecas quando ganhei, então eu fazia aniversário, chamava as coleguinhas para fazer aniversário, então eu fazia os vestidinhos para as bonecas, ela me ensinou. É amor, que quando você começa a costurar… A costura para mim é igual a enfermagem, é amor. Na enfermagem você pega um paciente que às vezes está nas últimas, você cuida dele e quando você vê, o paciente está ali te agradecendo, sai sorrindo e sai andando. E na costura,
é a mesma coisa, você olha para ele, não dá nada, faz uma roupa e vê no olhar da pessoa o quanto ela está agradecida, o quanto ela gostou, o quanto foi bom para ela. Para mim os dois andam juntos. Eu aprendi a costurar com ela desde pequena. Ela costurava e eu ficava ali. Às vezes ela pegava bastante vestido para fazer e eu ajudava, ia tirando as linhas… Ela deixou essa singer para eu poder a costurar e eu lembro que era tudo na manivela, você tinha que ficar rodando o negócio para costurar. Eu aprendi essas habilidades com a minha mãe, ela me ensinou a cortar, me ensinou o que era o fio do tecido… Então a costura foi a minha mãe, ela que foi responsável.
P/1 – E te levou para a sua loja hoje, né? Na sua trajetória de empreendedora, qual foi o momento mais marcante?
R – A pandemia (risos), a pandemia foi mais marcante, com tudo que já passei, acho que a pandemia foi o meu maior desafio profissional e pessoal. Foi a pandemia. A pandemia fez com que eu conseguisse enxergar a força que eu tenho. Acho que muita gente hoje consegue entender a força que tem. Foi com a pandemia.
P/1 – E como é o seu dia a dia agora em quarentena por tantos meses?
R – Meu dia é corrido. Meu dia.... Eu acordo seis horas da manhã, levanto, minha filha já levanta, porque ela não está indo para a escola… Ela estuda das 07:15 horas
às 11:45 horas. Nós nos levantamos cedo, ela já se prepara, eu já faço café e deixo para ela. Em casa fica a minha filha mais velha e o meu esposo, porque ele trabalha a tarde e minha filha mais velha ajuda a outra que é casada. Não está trabalhando, então está ajudando. Eu deixo minha filha e quando é 07:30 horas, eu vou para a empresa. Vou com meu sobrinho, porque ele trabalha comigo, ele é designer. Eu piso lá e fico até as 20:00 horas trabalhando, atendendo cliente, cortando, costurando, enfim. Saio de lá umas 20:00 horas e vou para casa, porque não está tendo treino ainda. Eu treino em alguns times a noite. Agora eu comecei a estudar, e chego em casa… É bem perto, eu chego em casa umas 20:30 horas mais ou menos, já tomo um banho e normalmente minha filha que faz a janta. Quando ela vai para a igreja ou tem os afazeres dela e não pode fazer, eu já coloco a janta para fazer. Eu já vou pelo menos fazer uma aula, uma atividade, janto e vou dar atenção. Eu converso com elas para saber do dia, a gente se fala, assiste alguma coisa juntas… Meu marido costuma chegar meia noite, porque ele sai dez horas e trabalha em Santana do Parnaíba. Até chegar em casa… Quando todo mundo dorme, eu entro lá de novo, faço mais uma atividade, mais uma aula, e quando é umas duas horas, eu vou dormir, então eu tenho quatro horas de sono, tenhk que descansar umas quatri horas só todo dia. No sábado, eu costumo não trabalhar, e nem domingo. So agora eu estou trabalhandk para pider turar alguns pedidos, algumas coisas que ficaram antes da pandemia. Os clientes disseram, "deixa para quando voltar a gente ver o que vai fazer", e agora estão voltando, então estou fazendo isso ao final de semana. Sábado eu vou lá umas 10:00 horas e saio de lá umas 19:00 horas. E domingo, eu costumo não trabalhar. Domingo é neto, é filho, fazer comida, ou ir na sogra quando não está a fim de fazer comida… E segunda começa tudo de novo.
P/1 – Você voltou a estudar? Conta um pouquinho sobre isso.
R – Voltei, tive a necessidade de me aprofundar mais nessa parte de gestão, porque eu faço tudo dentro da empresa, então na hora que eu iria começar a contratar, chegou a pandemia e eu não pude. O que eu pensei? "Bom, vai passar, no ano que vem eu quero contratar, porque não posso ficar fazendo tudo sozinha, so que ai eu preciso me aprofundar mais em gestão, saber mais, entender mais", que essa é a parte mais chata e que o empreendedor não gosta, a parte de gestão. Eu estava pesquisando alguns cursos para fazer quando vi Tecnologia e empreendedorismo falei, "ah, esse aqui é o curso que eu tenho que fazer". Ganhei uma bolsa na Anhanguera e estou fazendo 100% online, só que têm provas presenciais. Talvez nesse semestre não tenha, não seja presencial. Mas as provas são presenciais. Para mim está sendo ótimo, estou adorando. Embora tenha começado agora dia 10 de agosto, mas é tudo que eu preciso. Vai encaixar direitinho com o que eu quero. Então o ano que vem vai ser isso aí, pretendo contratar sim. Já legalizei a empresa e tudo mais, então ano que vem eu pretendo contratar, porque eu tenho um projeto para colocar o projeto que a gente fez do Mil Mulheres, eu quero pôr esse projeto para andar.
P/1 – Qual projeto?
R – Então eu participei da segunda fase do curso do Mil Mulheres. Eles escolheram algumas mulheres e nós fizemos um curso chamado Aceleradas. Nesse Aceleradas, foram 30 dias de curso. Em três semanas o curso foi meio período e em uma semana foi integral, que foi o Empreenda. Tudo gratuito. E também foi um desafio, poque eu tive qye deidar a empresa de lado e participar. Falei, "não posso perder, é gratuito, vocês se virem aí que vai dar certo, mas eu nao posso perder" e fiz esse curso. Nós éramos 25 mulheres, então para o final do curso, tinha que sair cinco projetos. Eles fizeram os grupos com cinco mulheres e cada um teve um projeto. Eu sekpre tive a vontade de ensinar a arte de cosyyrar para mulheres que não tem renda, para mukheres que muitas vezes não é nem questai de renda, mas ela precisa ocupar a cabeça, precisa de um serviço, para dar uma oportunidade também
de emprego para pessoas de baixa renda. Eu peguei um grupo muito legal, porque se encaixava o que eu queria com as ideias das meninas. A gente pegou, "bom, a Simone já tem empresa, já é do ramo da confecção, já quer isso, duas já gostariam de trabalhar com mulheres em situação de rua, mulheres vulneráveis…", então a gente se encaixou e criamos o Projeto Fênix. E esse projeto é voltado para isso, para qualificar mulheres em vulnerabilidade, em situação de rua e transgênero. Porque a gente incluiu o transgênero, pelo fato de no voleibol ter muitos transgêneros. Agora abriu e pode
E assim, o preconceito é muito grande, maior do que com o negro. O preconceito com eles é muito grande, então muitas vezes eles não têm oportunidade de emprego e não têm outra profissão, não sabem o que fazer. Então nós incluímos os transgêneros e começamos esse projeto. A gente já tem todo ele desenhado e montado, inclusive apresentamos na formatura do curso e o pessoal gostou muito e se interessou, mas o problema é que é um projeto um pouco caro, então está difícil de achar alguém que abrace com a gente esse projeto, mas nós vamos encontrar. O próximo passo da MS é entrar com esse projeto, junto com as meninas e alavancar isso, porque vai ajudar muita gente.
P/1 – Eu queria perguntar como é a sua relação com as suas filhas.
R – Ah, maravilhosa. A relação com as minhas filhas é maravilhosa, porque com as duas mais velhas, a gente se vê muito como amigas. Eu tenho essa relação com elas de amizade, além de mãe. A gente conversa sobre tudo, porque na verdade elas viram que é uma menina junto com elas, né? O tempo todo. Com todo respeito, eu falo, "eu posso ter cara e vocês acham que sou meio novinha, mas eu sou da antiga", então eu pego no pé. Mas elas não me deram um trabalho até hoje. A Jaqueline faz 31 anos agora, a Jenifer fez 29 e assim, não me dão um trabalho. A Jamile fez 13, nenhum trabalho. Nós temos uma relação de amizade, com respeito. Elas me ouvem muito. Como elas mesmas falam, "minha mãe é nosso espelho", então assim, eu tenho uma responsabilidade muito grande, não posso fazer nada de errado, porque se eu fizer alguma coisa de errado, vai pesar muito ali. É assim, nossa relação é de amizade pura, amigas mesmo, de conversar sobre tudo que você possa imaginar, tudo, tudo, tudo. Eu lembro da minha filha mais velha quando ela veio e falou, "mãe, não estou me segurando mais, vou ter que perder minha virgindade". Eu fui, conversei, expliquei e tal. Eu estava no banheiro e quando ela saiu, eu falei, "e agora, eu choro ou eu grito?" (Risos). Às vezes você quer ser tão amiga que escuta coisas que você não quer, mas assim, tanto que a Jaqueline não tem filhos, são meninas ali bem… A Jenifer casou certinho, hoje ela tem… Meus dois netos vêm dela, eu tenho o Jamal que tem dois anos e tem o Maucou que nasceu agora e tem dois meses. A gente ajuda, então nós temos essa relação, de uma ajudando a outra. Uma está na dificuldade, vamos ajudar, uma precisa, vamos ajudar. Eu criei elas assim. Tudo que é meu é seu, tudo que é de vocês é meu, sem abuso e com respeito. Eu nunca precisei esconder nada, eu nunca precisei explicar que não tenho. "Mãe, preciso de tal coisa", "vai lá na minha carteira e pega", "mãe, você está na dificuldade?", "estou", "de quanto você precisa?", "de X", "olha, não tenho X, mas tenho tanto, toma. Te ajuda?", nós somos assim, parceiras. Amigas e parceiras, essa é a relação que eu tenho com elas. Para tudo que eu preciso conversar, é a elas que eu recorro primeiro. Depois eu recorro às minhas irmãs, mas é a elas que recorro primeiro.
P/1 – E uma história em família com você, seu marido e suas filhas que você se lembre e que foi marcante para você?
R – Uma história em família marcante… O casamento da Jennifer. Você ver uma filha cadar, ser responsável… Ela é responsável ao extremo. Ela empreende também, faz tranças. Aos 16 anos, ela falou, "mãe, eu não quero bater cartão, tá bom? Não nasci para isso, preciso fazer alguma coisa", e aí ela foi testando as habilidades dela. Ensinei ela a trançar o cabelo e ela foi, é referência e inclusive até influencer em trança agora. Agora a moda é ser influencer.
P/1 – Você estava me contando do casamento da Jennifer. Queria que você me contasse mais sobre esse dia.
R – Ah, o dia da felicidade, né? O dia do casamento. Então casar uma filha nos tempos de hoje, é para poucos, é ouro. E ela é 200% responsável, ela e o marido. Ela arrumou um bom marido, porque os dois trabalham juntos. Os dois são cabeleireiros. Ele trabalha no espaço dele e ela em casa, mas eles se conectam muito bem, então assim, você casar e entregar sua filha para uma pessoa que também é responsável e está lado a lado, você relaxa. A sensação que dá é de dever cumprido, "essa fez a lição de casa, eu consegui ensinar bem e agora é a vida dela", eu não costumo entrar na vida delas. Eu respeito, então não sou aquela mãe que fica controlando ou quer saber de tudo. A vida dela… Esse dia foi tremendo, embora eu tenha ficado com ciúmes confesso, porque a gente tem filho e fica nos bastidores quando é casamento (risos). É o pai que leva até o altar, é o pai da noiva, o pai da noiva… E eu sou ciumenta com as minhas filhas. Então a mãe não é muita coisa. Para ajudar, o que a gente mais deu risada, foi que onde eu fiquei sentada no altar, tinha um vaso de quase dois metros. Então você olha as fotos e a mãe não está (risos). Eu falo para as pessoas, "ó, estou atrás daquele vaso. Atrás daquele vaso está a mãe da noiva", porque tem gente que fala, "ah, quem é sua mãe aqui? Que nessa foto não dá para ver", ela pega outra foto, "nessa foto não está", "não, vamos ver a foto em que ela está entrando na igreja, que aí fica melhor", mas foi um dia especial. Foi um dia em família e especial. Foi uma alegria imensa. Não dá para descrever esse momento. Não sei como vai ser agora com as outras duas, porque a mais velha iria casar, agora não vai casar mais… Está esperando o noivo chegar e eu estou esperando esse casamento. Eu brinco com elas, "agora eu só tenho uma casa por enquanto para ir comer dia de domingo, preciso de mais, então precisa casar". Mas foi um dia assim, excelente. Isso foi um fato em família alegre, feliz. Agora eu já tive uma história pesada em família, que foi quando eu fiz a cirurgia. Eu sentia muitas dores abdominais, fiz todos os exames e não dava nada, até que eu pedi para o médico fazer uma laparotomia exploratória para ver o que tinha ali dentro, porque não é normal você ficar sentindo dor e não ter nada. Fazer ressonância, fazer tomografia e não dar nada. Aí até que enfim ele aceitou e quando fez a laparotomia, ele viu que eu tinha vários nódulos no intestino. Pegou e falou, "olha, não é legal, o aspecto deles não é legal, mas vamos fazer biópsia, enfim". Fez a biopsia e veio positiva, e falou, "as notícias não são muito boas, e nós vamos ter que tirar pelo menos 30 centímetros de intestino e vamos ter que tirar também o útero e trompa, porque está tudo com nódulos. Vamos ter que tirar tudo e depois vamos ver a respeito de quimioterapia, essas coisas todas". Então foi um momento difícil, porque as meninas ainda eram muito jovens. A Jaqueline tinha 18 anos e a Jennifer 16. Você vê passar todo um filme, dá muito medo, você fala, "vou deixar minhas filhas assim ainda novas". A Jamile não existia. Quando eu tive a maior força do meu marido, acho que foi nessa fase e gente não estava em uma fase muito boa do casamento por diversos motivos. Mas a família meio que voltou com isso, ele veio para a família e voltou. Nós nos sentimos fortalecidos. Para você ter uma noção, eu lavava o cabelo - na época eu alisava o cabelo - e quando eu secava, via o cabelo voando, sabe? Eu estava pesando 41 quilos nessa época, e falei, "gente, acho que não vai dar para mim, acho que é game over mesmo", mas como eu nunca fui de desistir de nada eu falava, "ah Deus, não me leva agora, não. Nossa, eu nem vi minhas filhas casarem. Não. Eu preciso ter neto, preciso ver os filhos, enfim", mas mantive minha rotina, "vou jogar minha bola sim, vou trabalhar, vou manter a minha rotina", eu não fiquei deprimida, até mesmo pela força que eu tive das minhas filhas, da minha família toda no geral. Marcou a cirurgia, "vamos fazer a cirurgia agora, vamos tirar tudo", foram duas equipes. A equipe do GGO que era para tirar o útero e trompa e o cirurgião que iria tirar a parte do intestino. Ele falou, "olha, vou ter que tirar uma parte do colo do intestino", e explicou. Uma semana antes da cirurgia, que eu fui passar para levar todos os exames pré-operatórios, estava tudo certo, eu tinha feito o ultrassom, tudo certo para a cirurgia. Eu falei para o medico, "nossa, hoje eu vi minha barriga tremer, achei estranho", e ele falou, "tremer? Mas o que será? Deita aí", ele examinou e falou, "ah, pode ser o peistaltismo, desconforto intestinal", e ficou. Na porta do centro cirúrgico, no dia da cirurgia, ele virou e falou assim, "a barriga está esquisita, um pouquinho dura", eu falei, "é, então, essa semana ficou mesmo, eu tive um desconforto assim e o médico examinou". Ele foi lá, olhou os exames e falou, "é, pode ser". Bom, anestesiou e começaram a fazer a cirurgia. Eis que, "para tudo, tem um bebê aí dentro", "como assim um bebê? Não pode ter". Chamou o rapaz para fazer o ultrassom e eu anestesiada. Olha e pega todos os exames, todos os exames. Eu tenho os exames até hoje e assim, não tem nada lá dentro, nada. O rapaz qie fez o ultrassom, falou assim, "mas esse bebê está grande, esse bebê deve ter… Vamos ver a idade gestacional. Por cima, por esse ultrassom do centro cirúrgico, ela já está de seis meses", "não, não pode ser, olha aqui os exames" e ficaram discutindo. Bom, quando eu voltei da cirurgia, que eu acordei da anestesia, estavam o médico e a psicóloga para falar comigo. Ele disse, "olha, não pude fazer a sua cirurgia", aí já imaginei, "se não conseguiu fazer a cirurgia, o negócio lá dentro está feio, pronto, agora não tem mais jeito, sem volta", "porque tem um bebê aí dentro", mas eu achei que estava sonhando. Dormi (risos), estava anestesiada e dormi. Passaram algumas horas e eu acordei realmente da cirurgia e ele voltou com a enfermeira e com a psicóloga e falou, "olha, não consegui fazer a sua cirurgia e tem um bebê aí dentro. De onde saiu esse bebê eu não sei", falei "não, mas não tinha bebê aqui dentro. Eu nem estou fazendo nada para ter um bebê aqui", ele falou "cadê seus exames? Porque os exames que eu tenho de cópia eu vi. Eu quero ver os seus exames", eu desci no centro cirúrgico e, "não, te devolveram já". Aí ele trouxe e eu fui olhar com ele. Ele olhou, leu, entrou o ginecologista e o cirurgião, e ele falou, "gente, não tem nada aqui, nada, nada, nada que possa falar que era uma criança e eu não vi, uma criança desse tamanho", então foi um milagre de Deus, e essa criança é a Jamile. Eu lembro que liguei em casa e fui dar a notícia de que não fiz a cirurgia porque estava grávida e todo mundo ficou para trás. O Marcos ficou doido, "como? De onde saiu essa criança?". A gente estava em uma fase em que a gente já estava se separando, mas ela veio a cara, não tem jeito, não tem para onde fugir. Ela é a cara das meninas, é parecida comigo, é parecida com o pai, não tem jeito. Então assim, esses foram dois momentos marcantes da minha família. Foi a cirurgia em que surgiu a Jamile do nada, e foi um milagre de Deus, porque quando eu fui fazer o exame novamente,
não tinha mais nada de câncer. Eu tive sim que fazer a cirurgia, retirar os nódulos que estavam lá, tirei o útero e as trompas, mas não deu nada, nada, nada, nada, nada. Eu fiz a cirurgia quando ela tinha oito meses. Esses foram os dois momentos mais marcantes da minha família, o surgimento da Jamile e o casamento da Jennifer.
P/1 – Essa história é muito chocante.
R – (Risos).
P/1 – Mas aí você foi tratando os nódulos, o câncer, na gravidez? Como foi? Fiquei curiosa.
R – Então sobre o câncer, eu tive que esperar pela cirurgia acontecer, porque a laparotomia não abre a barriga, é por vídeo. E a cirurgia também iria ser por vídeo. Caso não desse para tirar essa porção de intestino que ele precisava tirar, teria que fazer tipo cesariana. Tanto que eu acabei fazendo depois tipo cesariana, porque tinha bastante nódulo mesmo. Tive que lidar com uma gestação de um mês e pouco - não deu nem dois meses, porque ela nasceu de oito meses - e entender que eu seria mãe de novo com 35 anos. Com duas meninas grandes, mais um bebê e falei, "bom, vou ficar feliz, porque é melhor uma vida do que eu ir embora, né? Tenho que agradecer a Deus por esse milagre que ele me deu", mas tive que mudar toda a minha rotina. Eu já estava me preparando para um dia ser avó e tive que voltar para aquela cabeça de mãe, "eu tenho uma bebê para criar, agora eu tenho uma vida para cuidar". E a chegada dela foi boa para as meninas, eu falo que ela veio para causar, e foi bom porque as meninas cuidaram dela e entenderam que ter um bebê não é fácil. Acho que por isso que elas nem inventaram moda logo cedo (risos). A Jamile chorava de madrugada e às vezes elas ajudavam, e assim, eu ia trabalhar e muitas vezes ficava com elas, elas tinham que dar mamadeira, trocar uma fralda, educar, ajudar na lição, porque aí era outra coisa. Foi diferente de quando elas eram pequenas, que eu tinha a ajuda de um monte de gente. Foi totalmente diferente quando veio a Jamile, que minha mãe já era mais idosa e não dava para ficar tomando conta de criança. Minhas irmãs já estavam com neto e aí ficava difícil ficar dando esse auxílio, então elas foram a minha ajuda. Isso foi bom porque elas mesmas até hoje falam, "não, eu sei bem cuidar de criança desde a adolescência", porque tiveram que cuidar dela, é bem estranho (risos).
P/1 – E como foi ser avó?
R – Ah! Ser avó para mim é maravilhoso. Eu amo aqueles meus pretinhos, eu cuido, eu ajudo. A mesma assistência que eu tive com as meninas eu dou para a Jennifer. Ele veio para mudar muita coisa também, porque é vida, né? Eu já estava trabalhando para ajudar, porque agora tem a jamile e ela é adolescente, e hoje a minha cabeça é, "o meu negócio vai ficar para a Jamile e para os netos", então eu preciso estar bem, porque eu tenho essas crianças para ajudar a criar, para estar ali junto… Ser avó é diferente do amor de mãe. Não sei se é porque as criancinhas vêm e a gente brinca, depois manda para o papai e para a mamãe
(risos), então a gente pode mimar e educação é ela que tem que dar, mas é diferente, é mágico. A gente muda completamente. É mágico, ser avó é tudo.
P/1 – Eu queria te perguntar mais um pouquinho como é empreender na zona norte.
R – Empreender na zona norte é difícil. É difícil porque a gente não tem muita ajuda. Hoje que está chegando uma ajuda para os empreendedores da zona norte. A gente tem um déficit bem grande quem quer ajduar, é bem diferente da zona sul que tem muita gente querendo empreender, aue vai buscar empreendedor e quade pega pela mão. A zona não tem e eu não sei o porquê. Eu acho que talvez porque têm alguns bairros na zona norte que tem ba ser ante epreendedores bem sucedidos. Não tinha esse olhar voltado. Hoje que eu fui psra a Vila Brasilandia, eu consigo entender ate um pouco melhor como que e o bairro, como que é ekpreender lá dentro e é complicado, a gente tem uma certa barreira sim. Eu senti essa dificuldade quando eu mudei para lá, porque assim, eu saí da Casa Verde para a Brasilândia. Antes da pandemia, eu estava na Casa Verde e pós pandemia eu fui para a Brasilândia, porque com o valor do aluguel da Casa Verde, eu pago todas as despesas na Brasilândia. O lugar é menor, mas está dando para de manter. So que eu tenho muitos clientes que não vão até a Brasilândia, tem um certo, "ah, não vou para a Brasilândia que eu vou ser assaltado", e nem é lá dentro da Brasilândia, mas se você for procurar, é por lá. Então tem essa coisa. Eu tenho muito cliente que não vai até lá, eu vou ter que ir até eles. Eles não falam, mas colocam um monte de obstáculos e no final falam, "você pode vir até aqui? Você envia para mim? Eu pago o frete", mas não vão até lá. Mas lá na Casa Verde, tinha dia que eu dizia, "gente, eu não vou estar", porque se não, eu não conseguia trabalhar e a distância é praticamente a mesma, porque o cliente vinha lá da Represa Guarapiranga para a Casa Verde, mas ele não quer ir da Represa Guarapiranga para a Brasilândia, então é difícil empreender na zona norte em alguns bairros. É bem difícil. Em outros bairros em que seria um pouco mais fácil, o valor do aluguel e as suas despesas são muito altos, então não dá para manter. Por exemplo, ir para Santana, não dá. Você pega um espaço em Santa e vai pagar
R$7.000,00 ou R$10.000,00 reais. Não dá. Então se você é pequeno, não empreende lá,
é difícil. Empreender na zona norte é muito complicado.
P/1 – Quais aprendizados você já teve nessa sua vida de empreendedora?
R – Olha, um dos que é que empreender é loucura, mas é uma loucura boa. Isso eu aprendi, que você tem que ser um pouco doido, você não pode ser muito são da cabeça, se não você não empreende. Que você pode contribuir com muitas pessoas, você pode ajudar, você pode não só crescer profissionalmente, mas pessoalmente, você pode se tornar outra pessoa. Isso eu aprendi bastante, entendi, então se você quer fazer bem ao próximo, empreenda, porque você vai descobrir coisas fantásticas e vai conseguir sim ajudar muita gente.
P/1 – Na sua loja, na sua empresa, você teve algum pedido que marcou ou algum cliente? Você tem alguma história para contar?
R – Olha, clientes que marcaram a MS eu tive sim. Tive uma história de um pedido todo pronto e você ter que refazer todo o pedido, e era um cliente muito bom, não posso reclamar. É um cliente muito bom, porque ele continua como cliente da MS ainda, mas ele simplesmente pediu uma coisa, aprovou aquilo e no final cismou que não foi aquilo que ele pediu. O tempo já tinha passado, já chegando o prazo e eu tive que virar a noite refazendo todo o pedido. E outra história também foi lá no início, em que eu virei três dias trabalhando na máquina, sem dormir, porque eu tinha que cumprir um prazo e duas oficinas que seriam parceiras não conseguiram fazer e eu não tinha o que falar para o cliente. Prazo é prazo, era contrato e eu tinha que entregar. Então eu virei tees dias na máquina costurando, só levantava para comer e para ir ao banheiro. Eu não dormi por três dias. E ainda tinha uma final de campeonato no domingo e eu fui para essa final (risos). Essa foi a que mais amrcou. Eu entreguei o pedido do jeitinho que o cliente queria, mas eu me estourei, me estourei. E não tinha tanta tecnologia assim, né? A gente não tinha o Whatsapp, era rufo muito no papel. Então o cliente falava que não era aquilo e não era aquilo. Hoje em dia você tem Whatsapp, está tudo registrado, você encaminha e, "olha, a conversa foi essa". Não se usava tanto e-mail… hoje a fé nte tem tudo quanto é prova, então "fecha, verifica se está correto, dá um okay para mim". Não tinha isso e eu não poderia perdê-lo, cliente sempre tem razão, mesmo que ele não tenha, né? Nós temos que tratar assim. E aí, amanhã ou depois é da MS que ele vai falar. Mesmo ele tendo tido esse erro, se eu não entregasse esse pedido para ele e falasse, "não vou modificar, foi isso que você pediu", amanhã ele não iria me indicar para ninguém e ainda iria falar mal da MS, então o jeito era eu virar e virei as três noites. Esses dois fatos foram os que mais me marcaram. Foi terrível, mas deu certo.
P/1 – Para você, o que é ser uma mulher empreendedora?
R – O que é ser uma mulher empreendedora? É ser plena e completa. A mulher empreendedora é plena, é forte, é completa e sinal de liberdade. Você não está preso a nada. Você é aquilo, é aquilo que você quer, você é batalhadora, tanto quanto qualquer outra que não é empreendedora, então é isso, é ser plena, é ser completa.
P/1 – Você tem algum sonho que você ainda deseja realizar?
R – Tenho. O meu sonho é o meu projeto, o Fênix. Na hora que eu conseguir que a MS consiga ajudar um projeto que é esse e eu me ver ajudando outras mulheres, outras pessoas a conquistarem aquilo que elas querem, aí eu vou estar realizada. A gente tem que dividir o que a gente tem. Não adianta… Você pode acumular riqueza, mas não leva essa riqueza para lugar nenhum, você tem que dividir o que você tem. Então se o que eu tenho é ensinar e conseguir que outras pessoas realizem seus sonhos, eu sou completa. É isso, meu sonho é esse.
P/1 – O que a zona norte representa na sua vida?
R – Minha vida. Nascida e criada na zona norte. Amo a zona norte, ando e me sinto segura na zona norte, e representa toda a minha história, porque tudo que eu fiz foi na zona norte. Já morei na zona sul, já morei na zona oeste, mas eu nasci na zona norte, fui criada na zona norte, casei na zona norte, meu marido é da zona norte, os filhos são da zona norte, minha família vem de lá, meu voleibol vem da zona norte… Então a zona norte é minha vida, é tudo para mim.
P/1 – E o que você acha dessa proposta de registrar a história de mulheres empreendedoras?
R – Eu acho perfeito. Eu acho perfeito, porque vai inspirar outras mulheres. Tem muita mulher com força e que não sabe que tem essa força. Tem muita mulher que ainda tem muito medo e através de relatos e histórias, ela vai se identificar com alguma, porque são várias histórias e isso vai encorajá-la a prosseguir. Tem muita mulher que tem muito projeto, mas não tira do papel por falta de coragem ou por falta de inspiração. Então achei perfeita a ideia e é isso aí, tem que seguir, porque as mulheres precisam.
P/1 – Tem alguma história que você queira deixar registrada e que eu não perguntei e queira contar para gente?
R – Uma história? História eu tenho várias, mas acho que já… A única história que para mim foi marcante foi da minha mãe. Quando ela ficou doente, foram dois acamada, não falava nada com a gente, a gente tinha que trocar fralda, tinha dieta e foi um período complicado, porque eu tinha que me desdobrar no serviço, ajudar a cuidar dela… Eu e minhas irmãs temos uma relação muito boa, graças a Deus. Eu e a Julia trabalhávamos e as outras três não trabalhavam. Uma já era aposentada e duas eram do lar, então as três cuidavam dela, e o meu papel e da minha irmã era trazer o dinheiro para cuidar dela, porque não tinha… O governo não dava o que era necessário para dieta, fralda. Um mês tinha fralda no posto e só voltava ter daqui a quatro meses. E como é que você fica com um paciente, uma pessoa acamada em casa sem fralda, sem nada? E é tudo muito caro para o idoso, tudo muito caro. Fralda geriárica é cara. Para você ter uma noção, na época dela com a dieta que a gente tinha que instalar, um frasco da dieta que daria para um dia era R$80,00. Então todo dia era isso no mínimo de dieta para ela, até que a gente conseguiu uma nutricionista e ela deu uma refeita para gente fazer a própria sopa dela, mas a gente tinha que comprar tudo, então meu papel e da minha irmã era trazer o dinheiro para dar um conforto para a minha mãe.
Ela tinha a cama dela alugada porque precisava, não dava para ser uma cama normal, tinha que ser uma cama hospitalar. E tudo que precisava a gente dava e ainda se desdobrava para cuidar de, então foi bem difícil essa fase da minha mãe. Foi bem difícil. Até o dia que não teve jeito. Internou e não voltou mais. Esse é um fato bem marcante. E é isso. Tirando os fatos que eu contei, acho que esse é… Eu tenho que agradecer às minhas irmãs que me ajudaram muito com isso. Ninguém se ausentou do problema. Os meninos sim, mas as meninas não. Por isso que eu falo, mulher é tudo no mundo, a base familiar é a mulher, não costuma ser o homem, não. As minhas irmãs estavam ali lado a lado. Nós estávamos bem estressadas. A gente teve uma briga só nessa fase. A gente nunca tinha brigado na vida e por conta de uma fofoca de uma pessoa que… Um desentendimento do que uma falou e a outra entendeu errado e teve uma briga. Meio que separou, rachou, sabe? Então foi uma fase terrível, mas eu fui buscar e não aceitei. A gente não pode brigar. Nunca brigamos e depois de velha brigar é até feio. Depois da morte da minha mãe, a minha irmã teve um infarto de
tanta saudade da minha mãe e quase perdeu as pernas. Foi punk também. Faz pouco tempo, faz um ano isso. Meu irmão faleceu junto e virou tudo aquilo, mas hoje graças a Deus ela está bem, está andando, fazendo as coisas dela e está lá cheia de _______[02:49:16] pelo corpo, mas está vivendo, mas basicamente é isso.
P/1 – O que você achou de ter contado a sua história hoje?
R – O que eu achei? Ah, maravilhoso. A gente não se olha, a gente olha, ajuda e sabe das histórias das pessoas, mas não temos noção do que é a história da gente. Nunca tem ninguém para parar para escutar. Têm pessoas que estão ali, sabem de um fato que ocorreu com você e sabem daquela história. Outro fato que ocorreu, estão outras pessoas sabem daquela história, mas você nunca para pra falar da sua trajetória, sua história, sua vida. E isso é legal. A gente começa a lembrar de algumas coisas que já tínhamos esquecido e estava lá adormecido. Estava lá no subconsciente da gente guardadinho. Mas eu adorei.Recolher