Plano Anual de Atividades 2013
Projeto Nestlé - Ouvir o outro compartilhando valores – Pronac 128976
Depoimento de Lourival Fernandes da Cruz
Entrevistado por Tereza Ruiz
São José do Rio Pardo 28/08/14
Entrevista NCV_HV_57
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
P/1 – Primeiro, Lourival, eu vou pedir pra você falar pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento. Pode falar.
R – Lourival Fernandes da Cruz. Nasci em 12 de abril de 1984 em Guaxupé, Minas Gerais.
P/1 – Agora o nome completo dos seus pais, se você souber o local e a data de nascimento também.
R – Messias Fernandes da Cruz, meu pai, e minha mãe é Maria Isabel da Cruz, também em Guaxupé, Minas Gerais.
P/1 – O que os seus pais fazem ou faziam profissionalmente?
R – A minha mãe é dona de casa, o meu pai já é falecido.
P/1 – E como o que ele trabalhava?
R – Era agricultor.
P/1 – De que cultura assim? O que ele cultivava?
R – Trabalhava em café.
P/1 – Trabalhava com café aqui na região mesmo?
R – Não. Em Minas Gerais.
P/1 – Minas Gerais. E ele tinha uma propriedade dele ou trabalhava com...
R – Sim. A propriedade era do meu avô e ele trabalhava na propriedade.
P/1 – Qual que é o nome dessa propriedade, você sabe?
R – Era Fazenda Paulicéia.
P/1 – É de vocês ainda?
R – Não.
P/1 – Já foi vendida.
R – Já foi vendido. Quando o meu pai faleceu, aí a gente veio pra Rio Pardo.
P/1 – Você sabe qual que é a origem da sua família? Assim, se vieram de outros países, avô, bisavô.
R – Sim. O meu bisavô acho que veio da Espanha. Era espanhol.
P/1 – Por parte de pai ou por parte de mãe?
R – Parte de pai.
P/1 – E você sabe por que ele veio pro Brasil?
R – Não. Não sei.
P/1 – Nunca escutou a história?
R – Não.
P/1 – E como é que você descreveria seus pais assim de jeito, Lourival? De personalidade como é que o seu pai era, como é que a sua mãe era?
R – O...
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Projeto Nestlé - Ouvir o outro compartilhando valores – Pronac 128976
Depoimento de Lourival Fernandes da Cruz
Entrevistado por Tereza Ruiz
São José do Rio Pardo 28/08/14
Entrevista NCV_HV_57
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
P/1 – Primeiro, Lourival, eu vou pedir pra você falar pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento. Pode falar.
R – Lourival Fernandes da Cruz. Nasci em 12 de abril de 1984 em Guaxupé, Minas Gerais.
P/1 – Agora o nome completo dos seus pais, se você souber o local e a data de nascimento também.
R – Messias Fernandes da Cruz, meu pai, e minha mãe é Maria Isabel da Cruz, também em Guaxupé, Minas Gerais.
P/1 – O que os seus pais fazem ou faziam profissionalmente?
R – A minha mãe é dona de casa, o meu pai já é falecido.
P/1 – E como o que ele trabalhava?
R – Era agricultor.
P/1 – De que cultura assim? O que ele cultivava?
R – Trabalhava em café.
P/1 – Trabalhava com café aqui na região mesmo?
R – Não. Em Minas Gerais.
P/1 – Minas Gerais. E ele tinha uma propriedade dele ou trabalhava com...
R – Sim. A propriedade era do meu avô e ele trabalhava na propriedade.
P/1 – Qual que é o nome dessa propriedade, você sabe?
R – Era Fazenda Paulicéia.
P/1 – É de vocês ainda?
R – Não.
P/1 – Já foi vendida.
R – Já foi vendido. Quando o meu pai faleceu, aí a gente veio pra Rio Pardo.
P/1 – Você sabe qual que é a origem da sua família? Assim, se vieram de outros países, avô, bisavô.
R – Sim. O meu bisavô acho que veio da Espanha. Era espanhol.
P/1 – Por parte de pai ou por parte de mãe?
R – Parte de pai.
P/1 – E você sabe por que ele veio pro Brasil?
R – Não. Não sei.
P/1 – Nunca escutou a história?
R – Não.
P/1 – E como é que você descreveria seus pais assim de jeito, Lourival? De personalidade como é que o seu pai era, como é que a sua mãe era?
R – O meu pai eu não tive muito contato, quando ele faleceu eu tinha quatro anos de idade, então tenho poucas lembranças do meu pai. Aí a gente veio pra Rio Pardo e fomos criados com os meus avôs maternos. Então do meu pai eu lembro muito pouco.
P/1 – E a sua mãe como é que ela é de jeito, de personalidade?
R – Muito calma. Muito guerreira.
P/1 – É uma pessoa tranquila.
R – Sim. Tranquila.
P/1 – E você tem irmãos?
R – Sim. Hoje somos quatro irmãos. Éramos cinco, perdemos o mais velho aqui em acidente.
P/1 – Qual que é o nome dos seus irmãos?
R – Messias Fernandes da Cruz Filho, Flávio Augusto, Marcos Antônio, eu e Renan Fernandes.
P/1 – E todos trabalham também no campo? Todos são agricultores?
R – Não. Só eu.
P/1 – Com o que os outros trabalham?
R – O mais velho trabalha na Goodyear em Americana. O Marcos trabalha na Nestlé, eu sou agricultor e o Renan trabalha aqui na Sementes Rio Pardo.
P/1 – Então só você que seguiu, e o seu irmão também de alguma maneira, mas não é produtor rural, trabalha aqui na...
R – Não. Só eu mesmo.
P/1 – Conta um pouquinho pra gente como é que era a casa em que você passou a infância. Assim, descreve mesmo como era a casa, como é que era a região.
R – Em Minas, apesar de que a propriedade era do meu vô, mas... Apesar de a propriedade ser do meu avô, mas a gente vivia numa condição muito simples, muito humilde. A casa não tinha energia, não tinha água encanada, não tinha nem banheiro dentro de casa. Uma infância muito humilde mesmo. Aí quando o meu pai faleceu, que eu tenho um pouco mais de lembrança, foi quando a gente veio pra Rio Pardo e começamos a ter uma condição de vida um pouco melhor, que onde é a fazenda que o meu vô morava já tinha energia, já tinha água encanada, banheiro. Aí foi que as coisas começaram a melhorar pra família.
P/1 – Quando vocês vieram aqui pra Rio Pardo seu avô comprou umas terras aqui também ou já tinha?
R – Lá era meu vô paterno. Eles continuaram lá, depois vieram a falecer. Aí a gente veio morar com o meu avô, porque quando a gente morava era a minha, tinha 30 anos e tinha cinco filhos. Então o mais velho tinha 13 anos e o mais novo tinha dois anos. Então o meu vô não tinha condições de cuidar da gente, então a gente veio pra morar com o meu avô. Minha mãe começou a trabalhar na fazenda e o meu irmão com 13 anos de idade já registrou, trabalhava registrado na fazenda.
P/1 – Aí na fazenda dos seus avós maternos, é isso?
R – Não. Aí aqui a gente era empregado, era funcionário.
P/1 – Então vocês vieram pra cá, mudaram-se pra uma fazenda, foi isso?
R – Isso. Sim. Meu vô era funcionário de uma fazenda e a gente veio morar com eles. Minha vó cuidava da gente, a minha mãe foi pra trabalhar na roça também e o meu irmão de 13 anos de idade.
P/1 – Aqui qual que era a fazenda que vocês vieram?
R – Fazenda Santa Cecília.
P/1 – E o que era cultivado?
R – Era café e gado. A minha mãe chegou a apanhar café, trabalhar na lavoura e depois com retiro, quando passou a ser mulher aí ela começou a trabalhar no retiro, tirar leite e tudo.
P/1 – E essa Fazenda Santa Cecília como é que ela era? Que lembranças você tem da casa em que vocês viviam e da fazenda mesmo?
R – As melhores possíveis. Tinha de tudo. Quando a gente era criança tinha escola até o prezinho se não é até o primeiro ano tinha já na escola. Tinha campo pra molecada brincar, a minha mãe trabalhava, começou a ter mais condições. A melhor parte assim da minha vida foi lá.
P/1 – Nessa fase assim de infância do que você brincava, com quem que você brincava?
R – Brincadeira simples. Soltar pipa, bolinha de gude, jogar bola. Esse tipo de coisa.
P/1 – Tinha uma preferida? Uma brincadeira preferida?
R – Jogar bola.
P/1 – E aí onde que vocês jogavam bola?
R – Tinha um campo. Na fazenda tinha um campo onde domingo tinha o time da fazenda, que disputava com outras fazendas e a gente brincava durante a semana ou aos domingos.
P/1 – Você torce pra algum time?
R – São Paulo.
P/1 – E você lembra assim quando que você se tornou são-paulino, quando você decidiu que você ia torcer pro São Paulo?
R – Acho que meu tio era São Paulinho, então desde 93 quando o São Paulo foi campeão da Libertadores é que eu lembro assim mais do São Paulo, que vim a começar a torcer.
P/1 – E além das brincadeiras assim tinha brinquedo na época? Vocês tinham brinquedos?
R – Não. Não tinha. (interrupção)
P/1 – Você tava falando das brincadeiras de infância, daí te perguntei e o brinquedo, você tava falando que não tinha, mas nem fazia assim?
R – Sim. A gente fazia brinquedo. Não tinha brinquedos assim comprados, não. A gente mesmo fazia.
P/1 – E aí o que vocês faziam?
R – Fazia carrinho com lata de óleo. Esses tipos de brinquedos. Carrinho de madeira. Era mais gostoso.
P/1 – Que mais? Você se lembra de mais algum brinquedo?
R – Soltar pipa, que a gente mesmo que fazia pipa. Essas coisas. Papa-vento.
P/1 – Como é que é?
R – Aqueles papa-ventos. Fazia de bambu e ficava correndo pra fazer rodar. Brinquedo simples.
P/1 – Faziam você e seus irmãos?
R – Sim.
P/1 – E você lembra nessa época também assim como é que eram as refeições na sua casa, quem que cozinhava, o que vocês comiam?
R – Ah, sim. A minha vó e a minha mãe que faziam as refeições em casa. Mas era muito boa. Quando a gente veio pra essa fazenda as condições melhoraram, então sempre tinha leite porque minha mãe às vezes trabalhava no retiro e a fazenda também dava leite pra quem trabalhava lá. Refeição assim nunca faltou, não. Sempre eram boas refeições.
P/1 – E o que vocês comiam assim?
R – Porque também a gente quando veio aí criava porco, tinha frango caipira, tinha bastante coisa. Sempre comia arroz, feijão, bife, ovo nunca faltava.
P/1 – E vocês tinham o hábito de comer também legumes e verduras?
R – Sim. Sempre. Porque tinha horta, né, nunca faltava alface, rúcula, almeirão, essas coisas sempre tinha, couve. Suco também sempre tinha, goiaba, maracujá, laranja e mexerica, porque tinha pomar na fazenda, então eles deixavam pegar. Sempre teve.
P/1 – Comiam bem então.
R – Comia bem. Graças a Deus.
P/1 – E os momentos da refeição, vocês comiam juntos? Tinha o hábito da família comer junto? Como é que era?
R – Não muito por... Sempre a janta sim. O jantar era junto, mas durante o almoço não porque às vezes era escola, às vezes horários diferentes os irmãos por serem de idade diferente. Então minha mãe deixava pronto ou quando minha vó tava ela já fazia, então não dava muito... O almoço não era... Só aos domingos e aos sábados que almoçava junto, mas mais era a hora da janta.
P/1 – E você falou que o seu irmão mais velho logo que vocês mudaram ele já foi registrado e começou a trabalhar na fazenda também, né?
R – Sim.
P/1 – E vocês também ajudavam? Você no caso ajudava também em alguma coisa assim dos afazeres da fazenda?
R – Na fazenda não, porque não podia, só podia se fosse registrado e naquela época não tinha idade. Aí a gente trabalhava no sítio, nos sítios vizinhos que tinham safra da cebola. Então a gente ia ao sítio vizinho e trabalhava ou até a hora do almoço, depois ia pra escola. Ou quando trabalhava de amanhã ia depois do horário. Aí a gente trabalhava pra ajudar em casa.
P/1 – E aí como é que era esse, desde que idade que você começou a trabalhar no campo e que trabalho você fazia?
R – Desde os sete, oito anos de idade aí a gente ia. Às vezes ia meu irmão que era um pouco mais velho que eu. A gente cortava cebola, cortava beterraba.
P/1 – Ajudava mais na colheita assim?
R – Sim. Sempre colheita. Nada de serviço pesado, não. Era mais a parte de colheita.
P/1 – E aí recebia um pagamento por isso?
R – Recebia por semana, aí a gente ajudava em casa, ajudava a minha mãe.
P/1 – Dava todo o dinheiro pra ela?
R – Sim. Aí ela comprava roupa, as coisas.
P/1 – E aí você mencionou que tinha escola também nessa segunda...
R – Sim.
P/1 – Queria que você contasse um pouco assim quais são as primeiras lembranças que você tem da escola, como é que era essa primeira escola que você frequentou.
R – A primeira foi no prezinho mesmo. A gente chamava de prezinho, nem sei se é isso que fala. Na própria fazenda já tinha. Fiz dois anos de prezinho depois fui pra outra escola pra fazer o primeiro ano que era numa fazenda vizinha, que aí já tinha da primeira até a quinta série. Foi que eu fiz.
P/1 – E como é que eram essas escolas? Eram escolas rurais então.
R – Sim. Rurais.
P/1 – Aí como é que elas eram, a estrutura delas?
R – Eram muito boas. Ainda tem até hoje. As duas escolas que eu estudei foram rurais e até hoje ainda são muito prestigiadas. São escolas muito boas. Funcionam até hoje.
P/1 – E a estrutura delas? Elas são grandes? É uma sala, tem várias salas? Conta um pouco como é que é a estrutura delas?
R – Todas as duas são grandes, porque tinha muita criança na região aqui. É uma região que ainda na época tinha muita fazenda com bastante casa, então o pessoal não ia a cidade, ia nessas escolas, então as duas escolas são grandes.
P/1 – E as salas eram juntas assim? Era misturado ou não? Era separado?
R – Não. Era separado por série e às vezes tinha até mais salas da mesma série. Tinha com duas salas tendo o primeiro ano, duas salas tendo o segundo ano, porque eram bastantes crianças.
P/1 – Você se lembra do nome dessas escolas? Elas tinham nome?
R – Era Mário de Souza e Silvia Portugal Gouveia de Silos. São as duas.
P/1 – Toda a sua educação você cursou nessas escolas rurais?
R – Sim.
P/1 – E teve algum professor assim marcante? Alguém que você gostasse mais, que tenha ficado marcado?
R – Eu me lembro de uma professora que eu tinha no segundo ano, chamava dona Dora. Ela era muito bacana, o jeito dela ensinar ela fazia qualquer pessoa entender assim, de um jeito diferente, mas comunicativo. Eu lembro bastante dela.
P/1 – Ficou marcado.
R – Sim.
P/1 – E você lembra se quando você era criança você tinha um sonho de ser alguma coisa quando crescesse? Você falar assim: “Quero ser tal coisa quando eu crescer”. Essas coisas de criança, tinha alguma coisa assim?
R – Ah, molecada sempre quer jogar bola, né? Ou jogador de bola, essas coisas. Mais era jogador de bola mesmo.
P/1 – Jogador de futebol. É bem comum, né, menino.
R – Acho que toda criança quer ser jogador de bola.
P/1 – E aí dessa fase de infância ainda assim tem alguma história que você lembre que tenha ficado marcada, um episódio que você viveu, uma situação, uma coisa que você sempre lembre, que tenha ficado na memória?
R – Muita arte. Quando eu morava na fazenda, na Santa Cecília, eu lembro uma vez que deu um rolo. Eu coloquei fogo no pasto. A gente morava entre a casa e o campo e da minha casa até no campo eu tinha que passar no meio de um pasto onde ficavam as vacas, quando elas não estavam tirando leite iam pro pasto, aí eu coloquei fogo.
P/1 – Como que você colocou fogo?
R – Eu achei uma caixa de fósforos porque no campo tinha um boteco, um barzinho onde vendia essas coisas, aí eu achei uma caixa de fósforos, tava vindo, vi que o mato tava seco, coloquei fogo. Fiz um fogo muito grande, sorte que tinha muita gente jogando bola no campo, aí todo mundo cortou galho de árvore e veio jogando água, tudo. Eu lembro que apanhei muito.
P/1 – Como vocês fizeram pra segurar o fogo?
R – Eu não, né? Moleque, já corri embora chorando, mas o pessoal cortava galho de árvores e veio batendo o fogo, veio jogando água em volta no lugar que não tinha chegado até que ele chegou ali, foi apagando porque molhando, aí apagou o fogo. Mas eu apanhei muito, deu muito rolo.
P/1 – Um perigo, né? Mas alguma história assim você se lembra dessa fase?
R – Ah, fazia muita arte. Criança quando era muita arte assim, que hoje... Na época era muito rígido meu avô, então parecia ser arte... Hoje eu vejo que eram artes inocentes em visto do que se faz hoje, mas era arte... Achava ninho de galinha, quebrava os ovos quando era do vizinho. Virava antena de televisão e saia correndo. Desligava o relógio da força. Essas coisas. Ir nadar no açude que era perigoso, mas sem permissão. Essas coisas.
P/1 – Coisa de criança.
R – Soltar passarinho dos vizinhos.
P/1 – Tirava da gaiola você diz?
R – Abria a gaiola, deixava a portinha aberta. Esse tipo de arte.
P/1 – Você e os seus irmãos dormiam no mesmo quarto? Como é que era essa...
R – Sim. No mesmo quarto. A gente dormia três numa cama de casal e dois numa cama de solteiro, a gente que era cinco.
P/1 – E os seus avós e sua mãe dormiam em outros quartos?
R – Sim. A minha mãe dormia num quartinho pequeno numa cama de solteiro e a gente dormia assim, três numa cama de casal, dois numa cama de solteiro.
P/1 – E os seus avós, porque o seu avô fez assim um pouco o papel do seu pai, foi isso?
R – Sim.
P/1 – E como é que era ele? Como é que eles chamavam, sua vó e o seu avô, e como é que eles eram?
R – A minha vó é falecida, chamava Ana Maria de Jesus. Foi uma segunda mãe também que participou, foi bastante mãe. E meu vô ainda é vivo, mora com a gente, vai fazer 90 anos mês que vem. Tá fortão ainda. O meu vô foi como se fosse um pai mesmo na educação. Bastante bravo.
P/1 – E como é que ele era assim, era bravo?
R – Ele não era muito de conversar. Era muito sério, né? Às vezes nem precisava bater, nada, só o jeito que ele olhava pra gente a gente já entendia. Mas foi uma ótima pessoa. Ensinou muito do que eu sou hoje.
P/1 – E na passagem assim dessa fase de infância pra adolescência, juventude, adolescência, eu queria saber o que mudou na sua vida, se você passou a fazer coisas diferentes, se teve novas amizades ou se fazia alguma coisa pra se divertir, se tinha festa na região. Como é que foi sua adolescência e juventude?
R – Aí na fazenda eu morei até os 17 anos de idade. Até os 17 anos de idade as diversões eram por ali mesmo porque a fazenda era muito grande, então quando chegava final de semana a gente nem tinha vontade de vir pra cidade, essas coisas não. Acabava se divertindo lá. Tem um lugar perto que chama Sítio Novo que é um lugar que já é asfaltado, as ruas são asfaltadas, tem escola, tem quadra. Então o pessoal ia ao Sítio Novo. Ficava uns cinco quilômetros mais ou menos, a gente ia pra lá. Mas na maioria das vezes era na fazenda mesmo, no sábado e domingo. Depois que vendeu a fazenda que aí eu tive que vir pra cidade.
P/1 – Mas tinha festa na região? Mesmo sendo na fazenda ou numa fazenda vizinha.
R – Tinha. Tinha essas épocas de festa junina, quando não fazia bailinho na fazenda, tinha esses tipos de diversão assim.
P/1 – E como é que eram essas festas? Como é que era a festa junina e como é que eram os bailinhos?
R – Ah, era bem tranquilo, né? Diferente de hoje. Não tinha nenhum problema, naquela época não ouvia falar em droga, nada. Era muito tranquilo, não tinha briga. Eu mesmo não me lembro de nenhuma briga. Tinha bastante amizade. Naquela época acho que tinha muito mais amizade do que hoje.
P/1 – Mas a festa junina, por exemplo, acontecia onde? Era a céu aberto?
R – Fazia, na verdade eram terços. Na época, aqui se faz muito é terço. Então de São João, São Pedro, Santo Antônio. Quando uma pessoa era devota de São Pedro fazia na casa daquela pessoa. Geralmente as pessoas levavam alguma coisa de casa, ou quando uma pessoa tinha mais condições não precisava levar. Então fazia o terço depois tinha pipoca, quentão, chocolate quente, bolo de fubá, essas coisas. Então durante esse mês de junho era quase todo final de semana tinha terço em algum lugar. Era nossa diversão.
P/1 – Terço você quer dizer o que com...
R – Terço eles vão e fazem uma reza. Eles rezam, são devotos daquele santo, e rezam o terço para aquele santo aí depois faz tipo uma festa junina. Não dança quadrilha, não. É só solta foguete, o pessoal fica conversando até tarde e comendo.
P/1 – E enfeitava também? Tinha música?
R – Enfeitava. O terço a maioria do terço era cantado, né? Aí fazia aquelas bandeiras com a imagem do santo e tudo enfeitado, depois erguia a bandeira e soltava os fogos.
P/1 – E o terço era cantado, que tipo de... Era música religiosa, mas você lembra como é que era?
R – Não. Não lembro.
P/1 – É que eu nunca vi isso.
R – Não?
P/1 – Não.
R – Aqui mesmo fizemos o terço esses dias, esses tempos atrás, o pessoal aqui da Sementes Rio Pardo. Ainda faz muito terço aqui ainda na região.
P/1 – Aí reúne as pessoas, canta pro santo...
R – Sim. Reza um terço mesmo, católico, reza um terço e canta. Quando é de Santo Antônio as mulheres adoram ficar passando debaixo pra casar.
P/1 – Passa debaixo da bandeira?
R – É.
P/1 – E você não se lembra de nenhuma música?
R – Não. Vai que eu lembro, mas não vou cantar.
P/1 – Nem do que diz assim, dos dizeres? Não precisa cantar, não, pode só falar. Não?
R – Não.
P/1 – E fora a parte cantada assim que é pro santo, tinha música assim pra dançar? Nas festas mesmo, junina.
R – Não. Aí era o terço, que era um terço católico, e tinha os cantos que eram em homenagem ao santo, e depois o pessoal ficava trocando ideia de namorinho, comia, só.
P/1 – E os bailes? Como é que eram esses bailes na fazenda?
R – Ah, sim. Aí fazia, falava que era brincadeira, chamava. Aí colocava um som lá e armava uma tenda e o pessoal ia lá dançar.
P/1 – Armava uma tenda, é isso?
R – É. Ou fazia em garagem. Fazia um bailinho.
P/1 – E aí o que tocava?
R – Música da época mesmo. Muita música lenta, o pessoal falava, aquelas músicas românticas antigas.
P/1 – Você lembra assim de alguma?
R – Não. Não muito.
P/1 – Você gostava de música?
R – Gosto.
P/1 – E o que você gostava de ouvir?
R – Gosto de um pouco de cada. Sertanejo, gosto de uns rocks antigos. Esse tipo.
P/1 – Você tem algum cantor assim ou uma dupla favorita, uma canção?
R – Gosto de Zezé de Camargo e Luciano, eu gosto. Gosto de Djavan. Internacional eu gosto de Queen.
P/1 – E você tem alguma canção preferida?
R – Oceano, Djavan.
P/1 – Teve alguma história assim com Oceano? Faz parte de alguma história assim da sua vida?
R – Não. Eu lembro muito da minha infância. Na época eu acho que tocou muito essa música, foi quando a gente teve o primeiro contato com televisão e aí tava passando uma novela, chamava Top Model, aí tocava essa música. Aí eu lembro assim. Mas gosto muito da música também, mas toda vez que toca eu lembro um pouco sim da minha infância.
P/1 – Você tinha televisão em casa desde sempre?
R – Quando a gente foi pra fazenda meu vô tinha uma preto e branco. Aí depois estragou, aí não teve mais. Foi ter já tinha uns 15 anos de idade que eu e o meu irmão compramos cortando cebola assim no sítio vizinho, aí foi juntando dinheiro e comprou uma televisão, uma parabólica.
P/1 – E aí você lembra o que vocês assistiam na televisão, nessa que vocês compraram?
R – Assistia de tudo, né? Novela, filme. Ficava até tarde assistindo televisão. Tudo novidade.
P/1 – Foi a primeira coisa assim maior que vocês compraram?
R – Sim. Foi a primeira. Foi a primeira coisa.
P/1 – Com o salário de vocês mesmos, né?
R – Sim.
P/1 – Foi a televisão. E aí nessa fase ainda de adolescência, nessas festas, tudo, tem alguma... Nesse lado mais amoroso assim, alguém que você tenha conhecido, uma primeira paixão? Alguém importante assim.
R – Teve. Comecei cedo. Aos 12 anos eu tive uma primeira namoradinha.
P/1 – E aí como é que vocês se conheceram?
R – Na verdade ela não morava na fazenda. Eu fui a uma fazenda onde morava o meu tio, que eu a conheci. Acho que foi a minha primeira namoradinha, toda vez quando eu ia pra lá a gente ficava. Mas depois nos separamos, fomos tomando rumo diferente, meu tio mudou da fazenda aí não tive mais contato.
P/1 – Era distante?
R – Era uns 50 quilômetros daqui.
P/1 – E quanto tempo vocês namoraram?
R – Não é que namorava, é que eu sempre a via na época de férias de escola, férias de junho, férias de dezembro. Uns dois anos assim.
P/1 – E depois dela teve alguém assim que tenha sido mais marcante, mais importante?
R – Na época da fazenda?
P/1 – É. Na época ainda de juventude assim.
R – Namorinho curto. Não teve...
P/1 – Ninguém mais marcante.
R – Não. Assim não.
P/1 – E aí conta então um pouco, você falou que você teve que sair da fazenda aos 17, é isso?
R – Isso. Aos 17 anos aí vendeu a fazenda e o cara que tinha comprado não trabalhava com pessoal, ele trabalhava só com mão de obra contratada que ia, colhia e saía. Não tinha colonos, não queria gente que morasse lá, aí todo mundo teve que ir embora.
P/1 – E aí como é que foi esse momento pra você? Como é que vocês fizeram, você e a sua família se organizaram pra ir embora? Pra onde vocês foram?
R – Foi muito difícil porque nesse meio tempo o meu vô tinha falecido, o paterno. Como as terras lá eram dele, então nós herdamos um pedaço de terra lá em Minas, mas do qual a gente não tinha condição de cuidar. A gente precisava mudar da fazenda, mas não tinha lugar pra ficar. Uma que a gente não conhecia ninguém na cidade, a gente não era daqui, então não conseguia ninguém pra ser fiador pra gente poder alugar uma casa. Então isso foi muito difícil e a gente tava tentando vender lá em Minas pra poder conseguir comprar uma casa, mas aí não consegui vender lá, demorou esse tempo. Só que aí o meu irmão que já morava em Americana, tinha uma condição um pouco melhor, conseguimos alugar uma casa na cidade sem fiador, mas tivemos que pagar à vista seis meses assim, à vista pra poder morar. Aí nós mudamos, alugamos uma casa e mudamos pra cidade. Fomos os últimos a mudar da fazenda, já não morava ninguém lá mais. Era muito triste que aquelas casas tudo cheias, uns três meses nós ficamos lá morando sem ninguém, no meio de vaca.
P/1 – E pra onde as pessoas foram indo? Porque deve ter sido horrível, né?
R – Aí foi mudando, foram indo pras outras fazendas, algum lugar que tinha. Mas eu com 17 anos já não queria ficar mais em fazenda, né, eu e o meu irmão. Já queria arrumar um serviço na cidade pra poder melhorar de vida. Aí a gente procurou já vir pra cidade. Não quisemos mudar assim pra outra roça, já queríamos mudar pra cidade mesmo. Aí conseguimos...
P/1 – E aí como é que foi pra vocês? Quando vocês chegaram aqui como é que você se sentiu? Você estranhou? Como é que foi a...
R – Ah, no começo estranha um pouco, né? Porque na roça todo mundo conhece todo mundo, é tudo muito simples. Chega a cidade, as pessoas quase nem falam nem bom dia. É diferente de quando você mora na roça, tudo muito simples. Aí o começo foi um pouco complicado, mas depois começa a se enturmar.
P/1 – E de trabalho, como é que foi assim? Vocês chegaram aqui e como é que você encontrou outro trabalho? Como é que foi?
R – Sim. Aí foi difícil no começo, né? Eu não conhecia ninguém e quando eu vim, eu vim numa idade muito difícil porque tinha 17 anos e era a época do tiro de guerra que você tem que fazer o tiro ou não fazer o tiro. Então até eu conseguir dispensar, eu pedi dispensa, até conseguir a dispensa o pessoal tem medo de te contratar aí depois pega pra fazer o tiro, aí eles não podem te mandar embora porque você tá fazendo o tiro e você não consegue trabalhar porque não dá muito tempo. Então o pessoal não contrata nessa época. Ainda continuei trabalhando na roça. Tinha um amigo meu também que tava assim, a gente dividia gasolina e ia trabalhar na roça, essas coisas.
P/1 – E aí nessa época você fazia colheita ainda? Colheita é o trabalho na roça?
R – Sim. Aí depois que eu fui dispensado do tiro, aí eu consegui arrumar um serviço de garçom. Trabalhava num restaurante perto da minha casa. Aí eu consegui. Foi quando minha vida começou a mudar, melhorar um pouco.
P/1 – Como é que era esse trabalho de garçom? Onde você trabalhava? Como é que foi a experiência pra você?
R – No começo difícil de novo porque de repente você não tinha muita comunicação, né? Aí depois no restaurante você tem que ser comunicativo, foi um pouco difícil, eu era um pouco tímido. Aí começou, a dona de lá teve muita paciência comigo, aí é que as coisas começaram a dar certo. Fui gostando do serviço também, conhecendo pessoas e era muito bom. O horário era muito bom, eu entrava as nove, saía às duas e meia, então eu tinha muito tempo. Era muito bom. No começo eu entrei ganhando meio salário, depois eu já comecei a ganhar um salário quando eu fiz 18 anos. Aí trabalhei três anos lá.
P/1 – Bastante tempo. E aí quando é que você resolveu sair e o que você foi fazer?
R – Trabalhei três anos, aí saí. Eu e um amigo meu fomos montar uma loja de roupa, aí não deu certo.
P/1 – Como é que foi essa experiência? Conta pra gente como é que vocês decidiram? Como é que vocês foram montar a loja?
R – Não tinha ideia nenhuma sobre roupa. Deu uma loucura, fomos montar uma loja de roupa, eu tinha um Fusca, vendi o Fusca. Ó, comprei um Fusca. Aí vendi o Fusca, juntamos dinheiro, fomos montar uma loja de roupa. Deu certo, vendia pra caramba, mas o pessoal não pagava. Ficamos um ano com a loja. Viu que não tava dando certo ainda conseguimos vender. Aí vendemos a loja. Voltei pro restaurante. Chamaram-me de volta, voltei pro restaurante. Aí eu voltei como caixa, já não era garçom mais. Fiquei um ano como caixa no restaurante. Depois trabalhando um ano lá, a dona que era a proprietária lá, ela já era bem de idade, ela já não... Bem de idade, não. Ela tava cansada, não queria, tinha uns problemas familiares que tinham acontecido e ela queria parar. Então ela pegou, ia passar pra outra filha dela tocar aí eu não quis ficar. Tava querendo sair, já tinha ficado mais velho, aquele serviço do restaurante era bom, mas pra uma pessoa mais jovem que tá trabalhando e ainda estudando. Mas pra mim já tava querendo ganhar mais. Então eu peguei, queria sair, aí foi quando eu conheci o Paulinho, que é aqui da Sementes Rio Pardo. Ele frequentava o restaurante e eu falei pra ele que eu ia sair, que eu tava procurando emprego, se ele soubesse de alguma coisa que era pra ele me avisar. Eu sempre tive muita amizade com ele, lá no restaurante eu fiz muitas amizades, graças a Deus eu tive muitas propostas de emprego, mas eu já sentia vontade de ter um negócio pra mim, plantar, fazer alguma coisa pra mim. Não trabalhar de funcionário, nunca gostei. Desde pequeno eu sempre fui de vender, fazia pipa pros outros mais vendia, sabe? Eu sempre gostei assim. Aí falei pra ele que eu queria sair do restaurante, se ele soubesse de alguma coisa. Passou uma semana mais ou menos ele pegou e voltou lá no restaurante, falou que queria fazer uma reunião, queria conversar comigo. Aí a gente foi, conversou, ele falou que tava com uma ideia de trabalhar com alimento minimamente processado. O forte ia ser alho descascado. Trabalhar com alho descascado. Sabe, ao invés de vender o alho, nós vendíamos o alho pra restaurante ele já descascado. Aí fomos. Deu certo, a gente conversou, falamos que íamos fazer, a gente ia ser sócio, eu não ia ser funcionário. Fizemos financiamento no banco, compramos as máquinas, tudo, com tempo de carência pra gente começar a trabalhar e a gente começou a fazer alho descascado. Alugamos um sítio e fizemos um lugar pra trabalhar, compramos, e começamos a trabalhar e começou a dar certo. Começou a vender porque vendia bem, o pessoal não gostava de descascar alho na mão. Começou a vender, depois de uns sete, oito meses que a gente tava trabalhando começou a faltar alho no mercado. Porque o Brasil não é suficiente, não consegue produzir o tanto de alho, a demanda é maior do que se produz aqui. Então o alho vem da China e vem da Argentina. Então o alho que você trabalha com alho pra fazer processado é aquele alho que já foi pro mercado, a dona de casa não o comprou por às vezes estar faltando um dente na cabeça, ou por alguns dentes chochos. Aquele alho ele volta, então ele debulha aí você compra aquele alho debulhado, que é aquele alho que o mercado já... Mas ele tá perfeito, mas é com a cabeça desmanchada, a dona de casa já não compra. Então a gente compra aquele alho. Com a falta que teve de alho, esse alho indústria começou a não ter, porque o alho ia pro mercado, não tinha alho, não tinha opção, a dona de casa comprava aquele alho aí começou a faltar o alho indústria. A gente já tinha bastante cliente, tinha um cliente que fazia pão de alho, que a gente tinha uma meta de vender 500, a gente começou que a gente queria vender meia tonelada de alho por mês e a gente arrumou um cliente que queria meia tonelada por semana. A gente começou a atender só ele e depois faltou o alho, aí a gente começou a patinar de novo. Aí procuramos outro tipo de coisa pra poder manter a empresa, começamos a trabalhar com couve-flor pré-congelado, porque aqui a região tem muito essas partes de hortifruti, tem muito. Aí a gente trabalhou com cenoura descascada pra restaurante, batata descascada, a gente tinha uma câmara fria. Então vendia assim, batata já descascada embalada a vácuo, a gente já tava ficando legal. Aí não deu certo.
P/1 – Por quê?
R – Não dava muito certo vender assim. A gente começou a colocar em supermercado também, mas às vezes nem o supermercado aqui tinha preparo pra isso porque tem que ficar a cinco graus, sabe? Então o cara não queria ter prateleira já refrigerada. Foi muito difícil. Aí começamos a mexer com alho de novo, deu uma melhorada no alho, mas depois em 2011 tivemos outra crise do alho, que aí faltou alho demais no mercado mesmo. E quando se perde alho uma vez num ano, o próximo ano você vai ficar sem alho de novo porque o alho que você planta é o bulbo, então foi uma grande perda de alho na China que teve, acho que foi por chuva, então aí o próximo alho que eles plantam, o pouco que eles têm eles plantam, aí vão fazer semente. Então se um ano você perde, você vai ficar uns três anos sem alho. Aí a gente não aguentou. Paramos. Não tinha parado ainda, foi quando eu conheci o João Roque, que é o da Nestlé, porque ele sabia dessa empresa. Eu tinha um pouco de amizade com ele, a gente fazia salsa também, então às vezes eu ligava pra ele perguntando quem tinha salsa que tava colhendo ou alguma área que a Nestlé já não tava colhendo mais que aí a gente buscava antes da pessoa matar a salsa ou passar a grade assim. A gente pegava, comprava, né? Foi quando eu conheci o João, eu tinha já um talão de produtor, porque eu vendia os alhos tudo como um produtor, aí o João perguntou pra mim, já que eu tinha o sítio, tudo, e tinha o talão de nota, porque eu não plantava na Nestlé. Acho que na época eles estavam com uma demanda muito grande de cenoura. Foi quando ele me chamou, se eu não queria, e a empresa já não tava muito legal, não tava dando certo por essa falta do alho. Nosso foco era o alho, todo nosso maquinário era pra alho e tava faltando alho. Então ele fez essa proposta e a gente fez uma parceria, eu me cadastrei na Nestlé, tudo. Eu fiz uma parceria com um cara que eu conhecia no campo, que ele já tinha tudo os maquinários pra poder plantar, tudo, mas ele tava sem condição financeira. A gente pegou e fiz uma proposta pra ele, ele entrava com a mão de obra, a terra, o que ele tinha no sítio, eu entrava com todo o insumo e a garantia de venda com a Nestlé. Fizemos uma parceria desse jeito e foi quando eu comecei com a Nestlé.
P/1 – Isso no mesmo sítio em que vocês estavam ou não? Você mudou?
R – Não. Aí mudamos o sítio.
P/1 – E isso foi que ano?
R – Foi em 2010. Dez, 2011 que comecei.
P/1 – E aí você começou a plantar cenoura?
R – Isso. Salsa e cenoura. Comecei com dois hectares.
P/1 – Hoje em dia você planta quantos hectares?
R – Hoje eu planto pra Nestlé, eu devo plantar... Hoje se a gente for lá no campo eu tenho quatro, cinco, seis, sete, oito, nove, eu devo ter uns 13 hectares hoje plantados.
P/1 – Aumentou bastante.
R – Mas no ano eu planto pra Nestlé eu devo... Porque tem rotação de cultura, né, no ano inteiro. Mas devo plantar no ano uns 35 hectares. No ano.
P/1 – Aumentou bastante então.
R – Pra Nestlé eu planto isso.
P/1 – Porque você fornece pra outros lugares também.
R – Sim. Eu planto, planto pro mercado também. De dois hectares eu devo plantar uns 35 a 40 hectares no ano pra Nestlé. Cresci um pouquinho.
P/1 – Oi?
R – Cresceu um pouquinho.
P/1 – Cresceu bastante. Queria que você contasse um pouco assim, falasse pra gente como é que é essa parceria da Nestlé com a ESALQ e contigo, né, que é produtor rural. Como é que funciona isso, como é que é a parceria mesmo.
R – Sim. Porque na verdade eu comecei a plantar, não vou mentir, foi mais por causa de dinheiro, foi uma válvula de escape ali. De planta eu não tinha noção nenhuma, mas aí o João falou... O cara que eu fiz a parceria já tinha o know-how, conhecia um pouco assim de campo, mas mais é a parte não assim pra plantar pra empresa que é diferente, um pouco diferente, né? Mas o João falou que não, que ia dar o apoio, que ele sempre ia estar presente. Conhecendo um pouco assim de o cara não queria plantar. Porque não entende muito, não sabe como é que é fornecer pra empresa, mas aí o João falou que dava o apoio, o pessoal da Sementes Rio Pardo que vende pra Nestlé também, eles têm o pessoal de campo que foi dando a orientação. Aí a gente começou a plantar. A parceria com o João e com a ESALQ foi muito boa porque eu não tinha muita noção, vivi sempre na roça assim, mas uma coisa é você trabalhar sendo funcionário, outra coisa é você trabalhar naquilo que é seu, né? Eu não tinha muita noção, mas aí a Nestlé também dá muita palestra, tem alguns cursos, você elimina algumas partes de erro no campo, porque às vezes um herbicida que você vai passar que pode matar a salsa, mas eles já têm vários testes. Então quando você vai plantar eles já te passam mais ou menos a planilha com aquilo que você pode usar. Não só o que é determinado por lei que você pode usar na cultura, mas sim o que vai fazer um mal, causar um fito na planta, você usar um produto que vai queimá-la. (interrupção)
P/1 – Então só retomando, Lourival, você tava falando um pouquinho da parceria com a Nestlé, queria que você falasse pra gente qual que você acha que é a importância dessa parceria pro produtor rural assim, com a Nestlé e com a ESALQ.
R – Sim. O bom da parceria com a Nestlé é o acompanhamento que eles fazem, tem o acompanhamento de campo, igual eu te falei, e a garantia do contrato, de você poder plantar e saber que aquela planta já está vendida. O que você tem que fazer, fazer com que a planta seja o melhor possível e produção... Porque é diferente de quando você planta pro mercado. Eu planto, 80% do que eu planto é pra Nestlé, mas nesses 20% que a gente planta um pouco pro mercado às vezes a gente encontra essa dificuldade, que às vezes você colhe uma planta e chega na hora de vender ela não tem um preço. Ou às vezes acaba vendendo pra pessoas que você nem conhece, ainda que acaba em recebendo. Isso a gente ouve muito, acontece muito, eu já diminuí bastante do que eu plantava pro mercado em função disso. E o bom da Nestlé é isso, além de ter o acompanhamento e a garantia de venda, paga certinho, dali 30 dias o dinheiro já tá na conta, não tem riscos.
P/1 – E esse acompanhamento e esses treinamentos que você já tinha falado, né, que às vezes tem palestra, treinamento e tem esse acompanhamento no campo mesmo, você acha que você aprendeu alguma coisa? Se você aprendeu, o que você aprendeu nesse treinamento e no acompanhamento?
R – Sim. Aprendi bastante sobre as boas práticas agrícolas que antes a gente... Eu não porque eu já comecei assim com a parceria da Nestlé, mas senti dificuldade com os parceiros que eu plantava, porque já vinha de pouco conhecimento, então não tinha muito conhecimento assim sobre as boas práticas agrícolas. Fazer curva de nível pra poder recuperar a água que você tá jogando fora, o excesso da água pra ela voltar pra dentro do açude. Você poder usar EPI mesmo sabendo que é um ganho pro produtor e pra sua saúde, mas mesmo assim o pessoal não gosta de usar e a Nestlé exige isso, que você use o EPI. Que você faça a tríplice lavagem, quando você usa um produto você tem que lavar a embalagem, devolver a embalagem, o pessoal já não devolvia a embalagem, às vezes queimava na própria propriedade. Esses tipos de coisas e uns cursos que ia fazendo sobre pulverização, regular o pulverizador. Às vezes você tava trabalhando errado, jogava um tipo de veneno, de defensivo agrícola, às vezes em uma quantidade de água, você jogava com mais água, não regulava os bicos, tinha bico jogando mais do que o outro. Então sempre tem curso nessas funções, ensinando a regular pulverizadores, esse tipo de coisa que a gente não tinha muita noção e nem fazia, né? Queimava as embalagens tudo na propriedade mesmo. Hoje a gente sabe que você tem que devolver, uma que é lei e o pessoal ainda recicla, isso acaba retornando.
P/1 – E você acha que todas essas melhorias ou esse aprendizado assim tem algum impacto na qualidade do que você produz e na produtividade?
R – Sim. Porque você recuperava a água, às vezes essa água ia embora, você jogava na sua casa depois e... Você jogava na plantação, não fazia curva, a água ia embora pra outro lugar, depois essa água acabava te fazendo falta. Então você acaba ganhando. E a Nestlé também se você não atende essas normas ela vai te eliminando como produtor e quanto mais você tá dentro dessas boas práticas agrícolas, mais você vai somando ponto e o ano que vem se você quiser aumentar ela vai te dar um... Se você precisa plantar mais salsa ela vai dar salsa pra quem está fazendo boas práticas agrícolas ou pra quem não tá fazendo? Então quanto mais você tá dentro das boas práticas, mais área você vai ganhando, né? Um pouco acho que foi isso que eu aumentei um pouco de planta, que eu tento fazer assim.
P/1 – Então o seu caso você acha que aumentou a produtividade e a qualidade do seu produto?
R – Sim. Por causa dessa parceria com a ESALQ, igual eu te falei, então tem muita doença que aparece eles já têm a resposta. Até quando eu comecei a plantar logo eles deram um livro que eles fizeram de todos os experimentos que já tinha feito até hoje, já com foto ilustrativa pra você perceber. Porque às vezes não dá tempo de um cara visitar sua roça ou campo, então tem nessa apostila. Hoje acho que eu já nem tenho mais porque você já tá acostumado, mas você vinha, você podia você mesmo identificar a doença, saber o que você tinha que usar naquele momento, que era tudo que a ESALQ já fazia. O quanto de água você podia irrigar pra poder ter mais qualidade, uma planta mais viçosa. A salsa mesmo vai muita água, então quanto mais água você coloca nela ela responde muito mais rápido. Então eles te falam o quanto de água que você tinha... Vinha explicando quanto de água você tinha que jogar, manter a umidade, pulverizações, respeitar a carência de colheita. Às vezes se eu usasse um produto hoje e colher amanhã que não podia, você tem que respeitar a carência. Esse tipo de coisa.
P/1 – O que seria respeitar a carência?
R – Respeitar a carência, às vezes você vai usar um produto, um defensivo agrícola que é químico, mas ele tem uma carência de colheita. Geralmente quando você planta pro mercado o pessoal não respeita muito isso. Às vezes o produto lá tá escrito que você pode aplicar, mas tem que esperar uma semana, sete dias pra poder colher, certo? Então você tem que fazer esse tipo de acompanhamento. Se eu to com um problema na minha salsa eu tenho que comunicar a fábrica, vai que ele vai colher a semana que vem eu tenho que aplicar um produto o qual eu não posso aplicar. Geralmente pro mercado o pessoal não faz isso, mas a Nestlé como faz a análise não tem como nem você querer enganar. Às vezes eu to com uma praga, uma infestação de um inseto, por exemplo, que na fábrica não pode ir que eles vão achar lá como corpo estranho e eu não posso aplicar. Então eu tenho que comunicar, ou estender a colheita ou pensar em outra forma de fazer. Então você tem que respeitar a carência, fazer aqueles produtos, pra salsa a gente não tem muito produto registrado, mas a gente segue mais ou menos o que usa na cenoura, que é mais ou menos da mesma família. Esse tipo de coisa.
P/1 – Tá certo.
R – Respeitar a carência.
P/1 – Tá certo. Eu vou encaminhar então pras nossas...
R – Você entendeu o que é respeitar a carência?
P/1 – Entendi. Eu entendi assim, você aplica o produto e aí tem um tempo para aquele produto não ser mais prejudicial à saúde.
R – Sim. Isso.
P/1 – É isso que é a carência.
R – Isso.
P/1 – Aí você só pode colher depois que aquilo já se desfez na natureza, né? É isso, né?
R – Isso. É isso aí.
P/1 – Aí tem que respeitar esse prazo, porque senão ele é perigoso.
R – Que é o que determina de um produto hoje que é orgânico ou não é isso, você respeita a carência. O pessoal fala: “Isso aqui usou algum tipo de químico”. Mas se você tá dentro da carência não importa.
P/1 – Tem menos risco pra saúde.
R – Se você tá respeitando a carência.
P/1 – Tá certo. Eu vou encaminhar pras perguntas finais já então, são três perguntas assim. Antes de fazer essas perguntas finais queria saber se você tem filhos.
R – Não.
P/1 – Não. E se tem alguma coisa que a gente não perguntou que você gostaria de falar. Qualquer coisa. Se tem alguma coisa que eu não tenha perguntado que você gostaria de acrescentar.
R – Não. Acho que não. Tudo certo.
P/1 – Falou tudo que queria. Tá bom. Então a penúltima pergunta é: quais são seus sonhos hoje? Na vida mesmo.
R – Ah, que eu te falo?
P/1 – Ué, quais são seus sonhos.
R – Crescer mais nesse ramo da agricultura. Crescer mais com a parceria da Nestlé. Ser um produtor altamente sustentável.
P/1 – Tá certo. Agora é a penúltima: qual que foi o maior desafio que você já enfrentou na sua vida e como é que você fez pra superar?
R – Qual foi o...?
P/1 – Maior desafio assim que você acha que você enfrentou até hoje na sua vida e como é que você fez pra lidar, pra superar, pra lidar com ele.
R – Eu acho que profissional foi esse de quando a empresa do alho além de ter fechado ainda deixou uma dívida. Esse foi o maior desafio porque ainda eu ia começar numa... Além de estar saindo de uma área que a gente não tinha muito conhecimento, ainda faltou o alho. E depois você iniciar numa área fazendo uma parceria com uma multinacional e você também não tinha muito conhecimento daquilo, ter que acreditar no que as pessoas estavam te propondo, comprar a ideia e fazer aquilo acontecer. Ou aceitar ou não, voltar a trabalhar como funcionário. Não que seja algum demérito, mas nunca gostei. Ou investir de cabeça, acreditar. Eu acho que isso foi o maior desafio profissional, porque deu um pouco de medo. Graças a Deus está dando certo.
P/1 – Tá certo. E por fim então como é que foi contar sua história? Como é que foi dar esse depoimento pra gente aqui?
R – Eu gostei. Foi menos do que eu achei... Um pouco porque eu sou um pouco tímido, por isso um pouco que tava meio com medo, mas achei legal. Fiquei à vontade.
P/1 – Tá certo.
R – É difícil assim um pouco falar da gente mesmo, mas foi legal. Gostei.
P/1 – Tá bom.
R – Uma experiência a mais.
P/1 – Então a gente encerra aqui, eu agradeço. Muito obrigada.
FINAL DA ENTREVISTA
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