A casa da Laranjeira velha era tão velha, que podia assustar os que não a conheciam.
Era uma casa pelada, pelada de móveis e utensílios domésticos.
Na sala, uma estante improvisada, composta por prateleiras de tábuas velhas e sustentadas por grandes blocos de barro. Em cima, ...Continuar leitura
A casa da Laranjeira velha era tão velha, que podia assustar os que não a conheciam.
Era uma casa pelada, pelada de móveis e utensílios domésticos.
Na sala, uma estante improvisada, composta por prateleiras de tábuas velhas e sustentadas por grandes blocos de barro. Em cima, alguns vasos e plantas para não passar a impressão de feia e vazia.
Nos quartos, camas com colchões de palha sobre o estrado de mola e armários simples, onde guardavam-se cobertores, travesseiros, roupas e lençóis de cama, feitos com tecido de algodão.
O banheiro, era um quartinho com uma cortina estampada fazendo o papel de porta, os banhos eram de bacia e as necessidades fisiológicas eram todas depositadas no penico, que à noite, moravam embaixo das camas.
Na cozinha, um fogão de lenha que nunca adormecia, de tanto fumaçar noite e dia, pintava as paredes e o telhado sem precisar das mãos de um pintor, no lugar deste, se valia da lenha queimando em brasa dentro de si.
Havia também, uma mesa, a madeira extremamente velha e macia!
Possuía muitos sulcos e era também muito robusta, acompanhava-lhe dois ou três tamboretes que de tanto lhes sentarem, afrouxaram-se das pernas e toda vez que me acomodava, beliscava-me as coxas.
Um pendurador de panelas erguia-se sobre a parede e nele minha mãe pendurava as panelas tão ariadas que mais pareciam espelhos! Também um pote enorme, encostado num canto com água coada e fervida e coberto com um pano de prato branquinho feito algodão para matar a nossa sede.
A porta da cozinha raramente era aberta, pois o capim que crescia nos fundos do quintal era imenso e alcançava mais de um metro.
Alguns bois pastavam sobre o mesmo, ajudando assim, a fazer o trabalho que o meu pai não fazia.
O maior medo de todos era quando as cobras resolviam passear no telhado da cozinha e mansamente vinham descendo parede abaixo, já bem à tardezinha.
A vigília era constante, sempre algum adulto ficava a expiar e algumas tochas feitas de panos velhos, embebidas em querosene, ficavam à postos, esperando pelo fogo que as acenderia com a missão de afugentar as rastejantes.
À tarde, depois do almoço, apreciávamos o cantos dos pássaros, uma sinfonia belíssima, encantadora e gratuita.
Um parecia dizer:
Quebrei três potes, quebrei três potes e outro, gritava, Sui, Sui, Sui!
Mandacarus por todo lado, com seus afiados espinhos que mamãe utilizava como alfinetes, para marcar a bainha das roupas a serem ajustadas na máquina de pedalar.
Apesar de tantos espinhos, flores exuberantes e frutos deliciosos eram apreciados pelos passarinhos.
Lá no fundo, ouvia-se a máquina de sisal de meu avô desbravando as fibras das Agaves.
Um barulhinho gostoso, suave, que o vento levava misturado com o remexer das folhas dos galhos das cajazeiras, perfumando toda a Laranjeira.
Quando a noite caía os grilos e sapos assumiam a sinfonia e a lua cercada de estrelas, iluminavam todo o terreiro.
Dava para ver os meus bois de barro secando na mureta.
De tanto balançar na rede o sono logo vinha e mesmo com medo das cobras indesejadas, éramos crianças e como anjos dormíamos.
Sabíamos que nossos protetores estavam sempre de vigia.Recolher