Plano Anual de Atividades 2013
Projeto Nestlé - Ouvir o Outro – Compartilhando Valores – Pronac 128976
Depoimento de Rosa Maria Rodrigues da Silva
Entrevistada por Tereza Ruiz
Caçapava, 14 de agosto de 2014
Realização Museu da Pessoa
NCV_HV048_Rosa Maria Rodrigues da Silva
Transcrito por Karina Medici Barrella
MW Transcrições
P/1 – Primeiro, Rosa, vou pedir pra você dizer pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Meu nome é Rosa Maria Rodrigues da Silva. Eu nasci em nove de dez de 51, na cidade de São Lourenço, Minas Gerais.
P/1 – Agora o nome completo e, se você souber, a data e local de nascimento do seu pai e da sua mãe.
R – O nome do meu pai é Alberto Rodrigues, minha mãe, Maria Helena Rodrigues.
P/1 – O local de nascimento deles você sabe?
R – Da minha mãe eu acho que é Itamonte, do meu pai acho que é Pouso Alegre, se não me falha a memória (risos), porque já faleceu faz tempo, é mais ou menos isso, eles são da região de Minas.
P/1 – E o que seus pais faziam, Rosa, profissionalmente?
R – Lá em São Lourenço o meu pai chegou a trabalhar no hotel. Eu não sei dizer pra você se foi na cozinha, porque ele cozinhava muito bem, até as misturas simples que ele fazia eram maravilhosas. Você via pela técnica que ele fazia, rápida, eu só não sei dizer se ele era cozinheiro, o que ele era. E a minha mãe era dona de casa, do lar. E meu pai, além de ter trabalhado em hotel lá em São Lourenço, quando nós mudamos pra Cruzeiro – eu vim de São Lourenço com um ano – eu fui criada em Cruzeiro e lá, que eu me lembro, ele trabalhava na Vigor, trabalhou muitos anos na Vigor. Aí teve aquela fase da indenização, tudo, aí ele foi ser comerciante.
P/1 – Ele trabalhava na Vigor fazendo o quê, você sabe?
R – Acho que ele trabalhava na parte de produção.
P/1 – E quando ele foi ser comerciante ele trabalhava com que tipo de comércio?
R – Era um bar. Com o dinheiro da indenização...
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Projeto Nestlé - Ouvir o Outro – Compartilhando Valores – Pronac 128976
Depoimento de Rosa Maria Rodrigues da Silva
Entrevistada por Tereza Ruiz
Caçapava, 14 de agosto de 2014
Realização Museu da Pessoa
NCV_HV048_Rosa Maria Rodrigues da Silva
Transcrito por Karina Medici Barrella
MW Transcrições
P/1 – Primeiro, Rosa, vou pedir pra você dizer pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Meu nome é Rosa Maria Rodrigues da Silva. Eu nasci em nove de dez de 51, na cidade de São Lourenço, Minas Gerais.
P/1 – Agora o nome completo e, se você souber, a data e local de nascimento do seu pai e da sua mãe.
R – O nome do meu pai é Alberto Rodrigues, minha mãe, Maria Helena Rodrigues.
P/1 – O local de nascimento deles você sabe?
R – Da minha mãe eu acho que é Itamonte, do meu pai acho que é Pouso Alegre, se não me falha a memória (risos), porque já faleceu faz tempo, é mais ou menos isso, eles são da região de Minas.
P/1 – E o que seus pais faziam, Rosa, profissionalmente?
R – Lá em São Lourenço o meu pai chegou a trabalhar no hotel. Eu não sei dizer pra você se foi na cozinha, porque ele cozinhava muito bem, até as misturas simples que ele fazia eram maravilhosas. Você via pela técnica que ele fazia, rápida, eu só não sei dizer se ele era cozinheiro, o que ele era. E a minha mãe era dona de casa, do lar. E meu pai, além de ter trabalhado em hotel lá em São Lourenço, quando nós mudamos pra Cruzeiro – eu vim de São Lourenço com um ano – eu fui criada em Cruzeiro e lá, que eu me lembro, ele trabalhava na Vigor, trabalhou muitos anos na Vigor. Aí teve aquela fase da indenização, tudo, aí ele foi ser comerciante.
P/1 – Ele trabalhava na Vigor fazendo o quê, você sabe?
R – Acho que ele trabalhava na parte de produção.
P/1 – E quando ele foi ser comerciante ele trabalhava com que tipo de comércio?
R – Era um bar. Com o dinheiro da indenização ele investiu num bar e fez a vida no bar até morrer.
P/1 – Essa indenização a que você está se referindo é que indenização?
R – Da Vigor, porque foi na época que indenizou vários funcionários, não sei se ia fechar na época, houve aquilo lá, que ele era empregado antigo. E com a indenização ele investiu no bar, porque lá em Cruzeiro tem pouca fábrica, então a Vigor ou outra fábrica lá que mantinha a cidade. Ele começou e até morrer ele ficou como comerciante.
P/1 – Era dele o bar.
R – Era dele.
P/1 – Tinha um nome?
R – Bar Rodrigues, que era de Cruzeiro.
P/1 – Sobrenome da família.
R – Era.
P/1 – E como é que eles eram, Rosa? O seu pai e a sua mãe, de temperamento, de personalidade, como você descreveria eles?
R – A minha mãe eu convivi até pouco, quando ela morreu eu estava com nove anos, então, perdi minha mãe com nove anos. Ela era uma pessoa simples, vaidosa. Ela era dinâmica assim, pelo conhecimento que ela tinha, que ela não tinha escola completa, mas tinha facilidade enorme de aprender, então ela costurava muito bem. Ela costurava pra gente, ou então pro vizinho. E naquela época era uma coisa assim, hoje se encontra tudo pronto, naquela época ela fazia até sutiã na máquina, aquelas calças difíceis, que andava com aqueles reloginhos; eu aprendi corte e costura e não aprendi a fazer essa calça. Então ela era inteligente na medida do conhecimento dela. Eu lembro dela costurando, eu perdi ela muito cedo. O meu pai morreu quando eu já era casada. Minha mãe morreu de eclâmpsia, no nascimento do meu irmão; meu pai foi acidente, tinha uma saúde de ferro, mas morreu num acidente na Dutra, faz uns 30 e poucos anos que ele morreu.
P/1 – Como seu pai era de temperamento? Como pessoa?
R – Ele era uma pessoa alegre, rígido, mas era uma pessoa muito alegre, tinha facilidadede comunicação com todo mundo. Trabalhador, batalhador, ele inclusive ajudou a criar os irmãos. E uma pessoa que fazia de tudo um pouco. Na época que ele foi indenizado lá da Vigor, antes de comprar o bar, ele trabalhava de pedreiro, de encanador, ele tinha facilidade de aprendizado. Tinha pouca escolaridade também, mas dentro do conhecimento dele eu acho que até ele fez muito. Quer dizer, ele se virou, era uma pessoa que se virava. E um pai muito amoroso, uma das coisas que a gente guarda, que na época que minha mãe morreu, eu tinha nove anos e naquela época, geralmente quando o homem ficava viúvo, como ele tinha que sair pra trabalhar, tivemos até o exemplo de uma família que aí distribuía os filhos, porque não tinha como, ele trabalhava e ia cuidar do filhos como? Então, eu sei que na época, na morte da minha mãe, eu escutei isso, gravou muito, que as pessoas já estavam escolhendo com quem ficar. “Eu fico com esse” “Eu fico com aquele” “Eu fico com o neném”, que minha mãe morreu no mesmo dia que teve a criança. Eu só ouvi uma coisa, eu escutei dele, ele falou assim: “Não, os meus filhos, nem que seja para eu fechá-los em casa e sair pra trabalhar, meus filhos eu não dou pra ninguém. Eu vou fazer tudo o que for possível, mas só sai morto ou casado” (risos), naquela época ele falava. Era um pai que voltava do serviço, ele não era capaz de passar em algum lugar que comprasse alguma coisa para ele comer se não fosse pra levar pra família, então eu tive uma imagem muito bonita. A única coisa é que ele era meio bravo, meio rígido praquela época. E ele era um pai muito amoroso, eu tenho uma imagem muito, uma pessoa muito honesta. Da minha infância eu tenho uma imagem muito bonita. E ele com a minha mãe viviam muito bem, não vi nada que percebessem. Eles trabalhava juntos, um pedia a opinião do outro, então, dentro mesmo das nossas dificuldades, era um pobre feliz. Não tinha, com muito sacrifício ele comprou o terreno, construiu a casa, a gente morava numa casa menor, depois construiu uma maior. A maior nós é que ajudávamos, porque ele podia pagar o compadre que era pedreiro, mas os ajudantes não poderia, então era a minha mãe e nós que ajudávamos. Carregava areia pra dentro, tijolo, subir em andaime. Eu mesma, com mais ou menos sete anos que eu lembro, de pegar tijolo que jogava e eu pegava no andaime. Eu adorava porque era até meio aventureira, eu gostava de subir no andaime, naquela época não tinha esse negócio de criança que não podia fazer isso, não podia fazer aquilo, era de acordo com a necessidade. E eu adorava esse tipo de serviço.
P/1 – Vocês ajudaram a construir a casa?
R – Construir a casa. Então nós ajudamos a construir a casa maior, ele pagava só o compadre dele, que não tinha como. E ele chegava do serviço fazia a parte dele, porque é o que a gente tinha.
P/1 – Quantos irmãos você tem, Rosa?
R – Tenho quatro irmãos, cinco comigo.
P/1 – Como é o nome dos seus irmãos e o que eles fazem?
R – Eles moram tudo em Cruzeiro. O meu irmão mais velho é Sílvio Batista Rodrigues, ele já está aposentado da antiga fábrica de vagões lá em Cruzeiro, ele foi formado do Senai e do Senai ele ficou trabalhando na fábrica até aposentar. A minha segunda irmã é Maria Lúcia Guazeli, ela é viúva, tem quatro filhos e mais os netos e ela é do lar. Tenho a minha irmã Maria Izilda Rodrigues, que ela era Tecnóloga, mas está aposentada também, atualmente ela está até morando comigo, mas somos todos de Cruzeiro, que nós viemos pra cá. E o meu irmão João Bosco Rodrigues, é o meu irmão caçula, que a minha mãe deixou. São os quatro, cinco comigo.
P/1 – E essa casa que você passou a infância, Rosa, conta um pouco pra gente como é que era a casa, como era o bairro, a região?
R – Na época era um bairro muito bom. A gente tinha quintal, meu pai plantava, a gente colhia da horta, fruta a gente colhia do pé. Tanto é que eu carrego essa coisa da infância, porque ele tinha um pé de uva, isso era fato na vida dele, então até hoje, na minha casa eu tenho um pé de uva, eu tenho a jabuticabeira, tenho pé de mamão, tenho minha hortinha, dentro do pedaço que eu posso plantar. Porque isso eu trouxe dele, de você chegar lá e plantar, colher o que ele plantava. Era de subir em árvore. Eu fui criança de jogar bolinha de gude, malha que eu falo, peteca; brincava na rua, naquela época a gente chamava de bet, queimada, brincadeira de roda, então tinha convivência com as crianças da rua, dos vizinhos. E ele sempre foi assim, via pedaço de terra e plantava, porque antes os terrenos eram grandes, então a gente tinha, e cada um tinha que plantar o seu pé de milho e cuidar; a gente plantava. Os filhos, ele punha pra plantar e falava: “Vai cuidar do seu pé de milho”, acho que ele queria passar pra gente isso, o plantar, a importância de se plantar. E a gente se sentia dona daqui, ficava vigiando: “O meu está mais bonito do que o seu” (risos). Então ele fazia isso, a gente participava, né? Ele foi um homem muito batalhador.
P/1 – E a casa de vocês? Descreve um pouco pra mim como era a casa antes da reforma e depois, como foi essa mudança.
R – Existia um terreno com uma casa menor, depois nós fomos construindo essa outra que eu lembro da construção. Então ela foi construída e nós ajudamos, como eu falei, como seria assim, existia o pedreiro, nós éramos os serventes. E tinha dia que ele ainda falava assim: “Olha, vamos colocar esse tanto de terra lá pra dentro e depois eu vou com vocês lá pra comprar uma bala ou doce”, mas precisava por. A gente ia na brincadeira. E a gente valorizou muito a casa. Agora hoje ninguém está morando ela, mas a construção, cada pedaço dela teve pedaço nosso lá.
P/1 – E como a casa ficou? Descreve ela pra gente?
R – Cômodos, você diz?
P/1 – É.
R – Ela tinha três quartos, sala e a cozinha de início. Depois ele foi construindo o outro espaço, aí tinha um banheiro que era mais nos fundos, depois fez uma área do lado e depois era o quintal. Tanque era pra fora na época. Nós construímos assim. E de tijolo. E o quarto da frente tinha assoalho, o resto era tijolo; do tempo que a gente lavava a casa, jogava água, que móveis eram poucos. Tinha o essencial, o que era? Um guarda-roupa pra família inteira, que ficava no quarto da frente, dele, e uma mesa na sala, com as cadeiras, o radinho, isso eu tenho de infância. Num quarto dormia meu irmão e no outro dormia nós, meninas. Mas era assim, era uma cama e eu tinha um caixinha que eu guardava a roupa. E o que mais? Ele também tinha mania de criar, ele criava leitão. Até quando nascia ele punha no colo da gente (risos), punha o leitãozinho pra gente assim. Nós já criamos um bezerro na mamadeira e a gente participava junto com ele. E a gente tinha um cachorrinho chamado Peri que também, como eu falei pra você, dentro do conhecimento dele, até que fazia muito, ele adestrou esse cãozinho e brincava até de boneca com ele: “Você fica aí e não sai”. Amarrava fitinha na orelhinha dele, mandava deitar e punha aquele bico vermelho da época na boca e ele aceitava. Mandava sentar pra comer, mandava deitar, isso é o meu pai que ensinou. Ela tinha uma certa coisa com criação. Pra você ter ideia, até um frango que criou em casa, ele andava atrás do meu pai e ele não teve coragem de matar pra comer, acho que o frango morreu de velho.
P/1 – Tinha nome?
R – Não lembro se tinha nome. Ele tinha muito contato com animal. Passarinho, ele gostava muito de passarinho.
P/1 – Gostava de natureza.
R – Gostava. Ele era natureza pura.
P/1 – E as refeições na sua casa, Rosa? Como eram, quem que cozinhava, o que vocês comiam?
R – A minha mãe cozinhava no tempo de criança, né? Por sinal a gente se lembra, era muito gostosa a comida dela. Aí tinha dia assim, por exemplo, a gente era pobre, tinha casinha com dificuldade, que foi construída, não era cheia de móveis, mas a parte de vestimenta e alimentação era boa porque a minha mãe costurava. Aí quando você via que ela ia na cidade, eu digo cidade porque a gente morava num bairro distante, era 40 minutos, quase uma hora a pé, que a gente ia. Quando ela ia na cidade, chegava em casa e desenhava o modelo que ela via lá, chegava em casa e costurava. Era assim, a roupinha ela costurava, a gente andava até bem vestido, eu punha fita de cor no cabelo, ela cuidava muito do meu cabelo, que era longo. Então ela cuidava, era uma pessoa bem vaidosa. Cozinhar ela gostava, fazia tudo muito gostoso, um arroz doce, a comida. Como eu falei pra você, meu pai criava porco, então ele fazia as reservas; não tinha geladeira mas era o tempo que se colocava numa lata a gordura e os pedaços de carne cozidos, guardados, essa era a nossa geladeira na época. E cozinhava, fazia muita coisa gostosa, bolo. E arroz, feijão, tinha verdura, legumes que a gente plantava na época. E a carne do que ele criava, que tinha. Leite, na época que ele trabalhava na Vigor, ele tinha direito ao leite. Leite condensado, coisa que hoje a gente não compra tanto, a gente tinha com fartura o leite condensado, leite em pó. A alimentação a gente tem bastante lembrança boa. Era um pobre bem alimentado. Lógico que às vezes não tinha grandes calçados, mas pro básico a gente era bem cuidado. A escola primária era na rua de trás da minha casa, antes; naquela época, pra entrar no ginásio eu tinha que fazer o curso de admissão, então, o quinto ano que a gente fazia inteiro só que só tinha na cidade, aí eu andava de 40 minutos a uma hora a pé, pra ir no centro pra fazer esse, tipo um vestibulinho, que a gente chama agora. Às vezes eu cortava caminho pela linha, a gente ia a pé, normal pra gente, porque não tinha condução como tem ônibus, a gente andava muito a pé.
P/1 – Pela linha você diz linha de trem?
R – A gente cortava caminho pela linha, é. Tinha rua paralela, mas a gente ia pela linha (risos).
P/1 – Pela linha de trem.
R – Trem.
P/1 – Pelo trilho.
R – A gente ia ao lado, onde a gente andava, mas a gente cortava caminho pela linha do trem.
P/1 – Era mais rápido, é isso?
R – Pra gente ficava mais perto, era mais uma reta, não sei, a gente punha na cabeça que era mais fácil.
P/1 – Você falou um pouco do que vocês comiam. E o momento da refeição, Rosa? Vocês sentavam juntos? Como eram os momentos de refeição na sua casa?
R – Sentava junto. Minha mãe não trabalhava fora, trabalhava em casa, então no momento que estava junto, era na mesa, todos juntos.
P/1 – E depois que sua mãe faleceu quem passou a cozinhar pra vocês?
R – Depois que minha mãe faleceu as minhas tias passaram a cuidar da gente durante um ano, mais ou menos. Que o meu pai, na verdade, perdeu a mãe em um mês e a esposa no começo do outro mês, foi uma perda assim, né? Então minhas tias que eram solteiras que ajudaram, moravam na mesma rua de casa. Uma cuidava do meu irmão que era menor, que ficou recém-nascido e a outra tia tomava conta da gente nesse um ano. Depois disso meu pai casou pela segunda vez. A esposa dele tinha três filhas e ele tinha cinco, aí uniram os dois. Casaram, então ele casou pela segunda vez depois que ficou viúvo.
P/1 – Você mencionou essa escola que ficava próxima, a primeira escola que você frequentou. Quais são as primeiras lembranças que você tem da escola, como era essa escola?
R – Essa escola, o que eu vou lembrar dessa escola? Ah, foi uma infância muito boa da escola. Lembro das professoras, que naquela época também, como a gente comenta agora, a gente tinha um respeito tão grande com os professores, da época que o professor entrava na sala, quando o outro professor entrava todo mundo levantava, sentava na hora que mandava. E tinha como referência, até toda criança perguntava: “O que você vai ser quando crescer?” “Eu vou ser professor”, porque tinha uma admiração muito grande com professor, um respeito, né? Coisa que hoje...
P/1 – Você teve algum professor marcante?
R – Eu tinha a dona Lola que foi a professora, acho que do primeiro ano, e tinha a dona, acho que Zélia, do quarto ano, que foi uma professora que me marcou muito na minha vida. E tem outra que nem foi minha professora, foi professora do meu irmão mais velho, que através dele a gente tinha uma admiração muito grande com ela. E mesmo adulto, enquanto ela viveu todo ano, no Dia dos Professores, ele ia lá fazer homenagem a ela. Isso lembro assim, até, depois de casada mesmo, que eu sabia que ela estava viva, então quando eu estava lá em Cruzeiro eu ia junto com ele lá pra fazer homenagem. Era emocionante, né?
P/1 – E por que essas professoras te marcaram?
R – Eu achava que essa do meu irmão era uma professora muito carinhosa. E outra coisa que marcou é que assim, naquela época, ela dava aula pro meu irmão e era uma sala só, e tinha os horários das séries. E foi a professora do primeiro ano dele. Eu me lembro que o marido dela trazia ela de charrete e todos ficavam, até eu mesmo quando aconteceu de eu ir lá, eu via essa professora descer da charrete, todo mundo esperando o marido dar um beijinho nela, sabe? E entrar. E ela é uma professora que todo mundo falava bem dela por causa do jeito dela, carinhoso. E tinha um respeito grande com ela. São as professoras que eu me lembro, da infância, que mais marcou.
P/1 – E essa escola, como era? Era uma escolinha pequena? Era uma única sala, era uma escola rural?
R – A minha escola?
P/1 – Isso.
R – A minha escola já era uma escola que foi construída na época. Antes dessa escola que eu estudei era uma outra escola, era uma salinha que era perto de casa, mas não na rua atrás de casa, a gente andava um pouquinho, que eu não estudava. Depois passou a construir essa escola atrás da minha casa, aí que eu estudei do primeiro até o quarto ano, foi uma escola construída pelo município.
P/1 – E aí as salas já eram separadas?
R – Eram separadas, tinha primeiro, segundo, terceiro ano, quarto ano, era do primeiro ao quarto ano que tinha, não tinha pré na escola, né, na minha época não, depois que existiu, era do primeiro ao quarto ano.
P/1 – E nessa fase de infância, você mencionou que tinha admiração pelos professores, que as pessoas queriam ser professoras, você também? Você lembra o que você queria ser quando crescesse?
R – Eu não lembro se eu falava que eu iria ser professora, eu não. Eu lembro que a maioria falava. Eu já tive uma referência de ser enfermeira, fazer Enfermagem. Não sei se chegaria até enfermeira, eu queria, porque eu admirei uma vizinha minha, ela era enfermeira. E naquela época eu acho que ela era formada em Itajubá, não sei, que era escola famosa da época, de Enfermagem, tinha alguma coisa assim. E ela era formada nisso e eu lembro que uma vez o meu irmão foi mordido de cão e ela foi dar as vacinas nele, então eu acompanhava. Eu admirava essa vizinha, tinha uma referência boa dessa moça. Então eu dizia: “Quando eu crescer eu vou ser enfermeira”, coloquei isso na minha cabeça: “Vou ver enfermeira”. E foi que aí quando eu estudei, quando eu tive oportunidade eu fiz o curso técnico de enfermagem e depois, quando deu oportunidade, aí eu fiz a faculdade. Porque quando eu fiz a faculdade pra ser enfermeira eu já estava casada, tanto o técnico, como a Enfermagem eu já estava casada.
P/1 – Mas você queria desde pequenininha?
R – De pequenininha ser enfermeira, botei na cabeça. Pelo menos chegar até o técnico está bom. Mas não, mas eu gostava muito de estudar. Aí quando surgiu a oportunidade de eu fazer a faculdade, aí eu fiz também. Porque quando eu terminei o Técnico de Enfermagem passou dois anos e veio o concurso do estado pra Visitador Sanitário do Estado. Quando eu olhei eu falei: “É bastante matéria de enfermagem, né?”, onde eu fiz o concurso, passei em terceiro lugar e fui chamada. Aí trabalhei no Centro de Saúde daqui de Caçapava por 15 anos, trabalhei como visitadora sanitária. E nessa época que eu estava no Estado, em vez de ser oito horas de trabalho, passou a ser seis. Aí eu aproveitei e fiz vestibular, passei. Eu trabalhava, eu fiz a faculdade de manhã e já ia direto pro serviço à tarde. Então foi uma oportunidade que surgiu e eu acabei fazendo a faculdade. Mas já trabalhando, já casada, que eu aproveitei a oportunidade e fiz.
P/1 – Vou te perguntar um pouco mais depois sobre o curso e a faculdade, só voltar na infância. Queria te perguntar dessa fase de infância ainda, se tem alguma história que tenha te marcado, uma coisa que tenha ficado na sua memória. Uma história mais marcante mesmo, uma experiência, um episódio?
R – O que marcou?
P/1 – É, aquelas coisas que ficam pro resto da vida, sabe?
R – Uma das coisas que marcou muito foi a perda da minha mãe, que é a primeira perda próxima que eu tive. De repente sua mãe está ali de manhã, aí à tarde já não está mais e de repente: “Sua mãe morreu”. Nunca mais vou ver minha mãe? Então levou anos para eu recuperar essa perda, isso foi uma das coisas. Porque a gente tinha uma imagem, uma vivência feliz da infância, da minha mãe, do meu pai, da minha casa, das brincadeiras que tinha. Então foi uma fase feliz. De dificuldades? Teve, mas feliz, entendeu? Então uma das coisas é a perda que foi a primeira perda próxima, sem ser a da minha avó que foi um mês antes, a mãe do meu pai. Então teve a perda da minha mãe. E dentro dessa fase eu tive uma convivência muito boa com meus avós, mais com a avó materna, que é aquela avó que chegava. Ela era assim, ela morava na roça lá em Itamonte, em Minas e quando ela vinha passear em casa, ela vinha e ficava um mês, e mal ela chegava a gente perguntava pra ela: “Vó, quando você vai embora?”, aí a minha mãe dava bronca, ela falava assim: “Sua avó nem bem chegou e você perguntando se vai embora”, eu falava: “Não, eu quero saber se vai dar tempo dela fazer uma boneca de pano pra gente”. Coitada, mal chegava e a gente queria que ela fizesse essa boneca de pano, só que a gente queria grande porque a gente não queria comprar bonecas, né? Então ela sentava e lá fazia aquelas bruxas de pano grande pra gente abraçar a pegar mesmo. Isso ela levava a gente pra passear, levava nas casas das amigas que era mais retirado, a gente adorava ir. Quando ela ia buscar lenha, isso depois, quando ela veio de uma vez pra Cruzeiro; ela morava em Itamonte e depois mamãe trouxe pra morar pra Cruzeiro, construiu dois cômodos lá pra ela e ela veio pra morar. Quando ela já morava em Cruzeiro, aí ela ia lenhar, porque ela tinha os costumes lá da roça, fogão de lenha, tudo, e a gente ia com ela. Mas a gente ia lá, arrumava o feixinho de lenha pra trazer um feixinho de lenha junto com ela, mas enquanto ela estava lá buscando lenha a gente estava no ribeirão brincando na água e caçando camarão de peneira. A gente ficava, ao mesmo tempo que ajudava ela a trabalhar a gente brincava, eu e meus irmãos, que a gente tinha esse costume de fazer. Eu lembro de uma convivência muito boa com a avó, tem saudades até hoje. Até quando, na dinâmica que o pessoal do Nutrir fez com a gente, então falei: “Nossa, mas relembrou muito a parte da minha avó, aquelas brincadeiras”, e falou muito de vó, aquela convivência com os avós, até me matou a saudade. A gente tinha uma convivência muito boa com a minha avó. O que eu lembro da infância é essa convivência boa com ela.
P/1 – Você sabe qual é a origem da sua família, Rosa? De onde eles vieram, se são imigrantes, se é uma origem portuguesa?
R – Não são imigrantes, não. Eles falavam muito da parte de Minas, mas eu não me lembro de imigrantes.
P/1 – Deve ser antiga.
R – Ah, espera aí. Eu só ouvi falar, mas o marido da minha avó materna, parece que ele era filho de português. Mas eu não sei muito a história porque eu não cheguei a conhecê-lo, entendeu? Só que eu me lembro que falou diferente é dele, que era filho de português. Eu não sei nada dele.
P/1 – Tudo bem. Nessa parte você contou um pouquinho dessa coisa da admissão, que você fazia essas caminhadas super longas pra chegar até a escola. E depois dessa fase de admissão onde você foi estudar?
R – Olha, eu comecei a estudar, eu fiz o quinto ano, mas eu não pude fazer o ginásio na época porque meu pai não tinha condições de sustentar os filhos na segunda fase. Aí nós tivemos o básico e eu fiz que queria, queria estudar, então eu parei nessa época. Depois, quando eu estava na minha juventude tinha um cursinho de admissão perto da minha casa, eu estudava à noite, estava trabalhando. Eu comecei a fazer pra fazer esse vestibulinho pra entrar na parte do ginásio. Aí meu pai, como tinha o comércio e tinha uma irmã pequena, aí então minha madrasta falou: “Não, você não pode mais, porque você tem que olhar ela porque eu tenho que ir pro bar com seu pai”. Nossa, aquilo lá pra mim foi muito triste porque eu queria, queria, queria. Saí. Mas depois eu tentei novamente, aí eu peguei e consegui entrar no ginásio e fiz, terminei o ginásio e consegui fazer, aí o meu irmão ajudou, porque ele trabalhava na fábrica, que eu falei que era formado no Senai, aí falou assim: “Pode ir que eu ajudo”, aí eu peguei e fiz a parte do ginásio. Quando eu me casei, eu casei com 23 anos, eu tinha terminado o ginásio nessa época, porque eu tinha tentado duas vezes e não conseguia, mas a minha vontade era estudar.
P/1 – E esse tempo que você ficou sem conseguir terminar o ginásio, você precisou parar, você trabalhava, você ajudava em casa, o que você fazia?
R – Só ajudava em casa, eu não trabalhava fora, trabalhava só em casa e meu pai ficava com a minha madrasta no bar. Tinha uma irmã mais velha que ajudava também no bar e eu ficava por conta da casa, ajudar o meu irmão, tinha a irmã da minha madrasta que é quase da minha idade, fazia o serviço da casa. Depois que eu consegui fazer o ginásio. Aí eu casei e fui fazer o curso técnico, meu marido pagou pra mim, eu estudei lá no Idesa, em Taubaté, é o curso Técnico em Enfermagem, me formei. Aí depois disso que eu fui trabalhar no Centro de Saúde de Caçapava.
P/1 – E Rosa, essa mudança da infância pra adolescência, que é um pouco nessa parte da admissão, você precisou largar, mudou alguma coisa na sua vida em termos de amigos, de lazer? Você saía, vocês tinham festas? Saía pra se divertir? O que você fazia?
R – A gente fazia, ou era coisa da família, que a gente comemorava Natal, os aniversários quando podia comemorava, às vezes não, que não tinha festa pra todo mundo. Natal sim, meu pai tinha uma coisa de juntar a família inteira pra festa de Natal. E o que a gente tinha de lazer? A gente ia passear no centro da cidade, na praça, que a gente ia, mas não tinha grandes coisas porque a gente não podia pagar pra ir. Mas eu passei mesmo no bairro e no centro da cidade, na praça que a gente tinha o costume de ir aos domingos e ir à missa, catecismo que a gente frequentava. Era mais isso, não tinha grandes coisas não.
P/1 – E antes de você conhecer seu marido teve algum outro primeiro amor, alguma paixão nessa fase de adolescência, juventude?
R – Teve um mas não foi bem um namoro, eu tinha 15 anos, foi mais paquera que a gente fala, mas não cheguei a namoro, namoro. Namoro mesmo, de verdade, eu tive com o meu marido mesmo, que foi namoro firme, dele ir lá pedir pro meu pai o consentimento, de ficar noiva. Foi assim, sério mesmo foi com meu marido, o resto foi só paquerinha mesmo, não teve namoro em casa, de pedir, sério foi só ele mesmo.
P/1 – E você e seu marido se conheceram como?
R – Eu indo pra aula de corte e costura. Uma das coisas que eu não comentei, o meu pai era assim, que antes preparava a gente para o casamento, cuidar da casa, educar filhos, tudo. Então você aprendia a fazer o serviço de casa e uma das coisas que ele fazia com as mulheres é dar uma máquina de costura, gostasse ou não você ia pro corte e costura. Eu não era muito de costura, não, eu gostava de outras coisas. Então indo para o corte e costura eu conheci o meu marido. Aí eu ia todo dia, nos dias das aulas a gente ia. Passei a encontrar no caminho e começamos a namorar.
P/1 – Mas como você viu ele a primeira vez, você se lembra? Ele trabalhava no caminho, morava no caminho?
R – A primeira vez que eu vi ele morava na rua debaixo da minha casa. Eu nunca tinha visto ele na casa da mãe dele. Quando eu vi a primeira vez eu me encantei, mas eu falei: “Nossa, mas ele tem jeito assim, ele não vai nem olhar pra menina de bairro”. Eu parei na esquina, aí eu nunca tinha visto, achava que era um primo dos que eu conhecia da casa, mas eu nunca tinha visto. Aí tá, nisso eu parei na esquina, ele também parou na outra esquina conversando com o amigo, e esse amigo comentou com ele que tinha três meninas que ele queria namorar, uma era eu, eu nem sabia que ele estava me paquerando. E ele olhou. Era eu e mais duas lá que ele citou.
TROCA DE FITA
P/1 – Só retomando, Rosa. Você estava contando que você estava na esquina, se você puder retomar.
R – Isso. Então eu vi ele saindo, eu admirei. O que eu marquei foi a roupa dele também, depois você vai entender. Eu olhei, estava até com dó de subir pra minha casa, eu falei: “Nossa, aquilo lá mexeu comigo”, como dizem, mexe com os flexos. Aí eu peguei a parei com dó de subir e vi ele conversando com esse amigo. E esse amigo dele que comentou que uma das meninas que ele comentou com ele era eu. Mas nunca cheguei a conversar com ele. Aí subi. Passou um tempo, estou nessas idas minhas para o curso de corte e costura, aí quando teve um dia eu peguei e vi de novo, sabe? Aí eu peguei e vi ele de novo, falei: “Nossa”, me chamou a atenção. Nisso, uma das idas minhas eu encontrei com ele. Ele olhou pra mim, olhei pra ele e uma das vezes que ele parou pra gente conversar, que aí já estava olhando um pro outro e parou pra conversar, e eu segui meu corte e costura. Aí na volta ele foi me buscar. E nesse dia que ele foi me buscar ele estava com a mesma camisa que eu vi, que me marcou, entendeu? Aí meu coração acelerou. Eu falei: “Nossa, eu pensava que ele nunca iria olhar pra mim e de repente estou lá namorando com ele”. E fomos, namoramos cinco anos e meio entre namoro e noivado e me casei.
P/1 – Como foi o namoro de vocês? O que vocês faziam juntos? Conta um pouco pra gente.
R – É aquele sistema de namorar em casa, ter horário pra namorar, pra entrar e pra sair. Meu pai era um ótimo pai, mas era rígido nessas coisas. E a gente podia sair aos domingos. Namorava, se não em engano era assim, no meio de semana, deixava numa terça, sábado e domingo. Aí com o passar dos anos do namoro, aí ele veio pra Caçapava pra trabalhar, aí era só namorávamos de sábado e domingo. Mas meu pai de início assim, namorava em casa, lá na sala, e pra sair tinha que carregar um junto, não podia sair sozinho, só depois de noivo que ele deixou sair sozinho. Aí quando eu estava noiva achou: “Agora não tem mais perigo, né?”, porque naquela época era assim, tinha que casar virgem, né? E o medo de não casar virgem. Então é vigiado mesmo. Depois de noivar que ele soltou um pouquinho, que saía pra praça, ia no cinema. E os passeios que surgiam, que a gente ia fazer. Depois de noiva que ele me levou pra conhecer a praia e até um fato importante é assim, como meu pai era rígido nessas coisas, então eu deixei pra falar na última hora, que ele queria me levar pra praia, mas ia com a família também, não ia só comigo. Eu: “Ai meu Deus, meu pai não vai deixar, não vai deixar”. Eu arrumei a mala, aí quando estava chegando poucas horas pra ir, pra sair, aí que eu entrei e disse: “Pai, o Vicente vai pra praia, mas vai a mãe, vai o outro sobrinho, vai a irmã. O senhor deixa eu ir com ele?”, mas falei a família inteira e depois eu (risos). Ele falou: “Ah, eu vou pensar”. Eu disse: “Ai meu Deus do céu, está dando a hora e ele não vai deixar. Vão passar aqui e eu não vou”. Minha mala já estava arrumada. Aí daqui a pouco eu volto: “Pai, o senhor já pensou? Pai, eu tenho que dar resposta logo” “Ah tá bom, então vai, pode ir”. Mas a mala minha já estava arrumada. Não passou muito tempo, eles passaram pra me pegar. Mas era o medo dele não deixar. E até aquela época que a gente estava namorando eu não conhecia o mar. A minha família já tinha ido, minha madrasta com as filhas, com os outros, com meu pai, e eu não conhecia o mar. Conhecia ali a região ali perto, só de Cruzeiro. Nossa, foi um passeio maravilhoso, foi emocionante.
P/1 – Como foi ver o mar pela primeira vez?
R – Nossa, pra mim assim, a gente pensava de um jeito e depois é outro. Eu achei emocionante, não sei nem descrever totalmente, aquilo pra mim era novidade. No caminho que nós passamos, que nós fomos pra Caraguá e depois pra Ubatuba eu já fui vendo, né? Aí foi uma sensação maravilhosa de olhar aquela imensidão, mexe muito com a gente.
P/1 – Pra que praia vocês foram?
R – Nós fomos em Ubatuba. Ficamos uma semana lá, pertinho, a primeira praia que eu conheci assim de perto que nós pudemos ficar foi no Perequê. Depois cada dia em uma, ia na Praia Grande, no Tenório, Enseada. Nós conhecemos cada dia uma, foi uma semana assim, maravilhosa mesmo, né? E pela sensação de liberdade também, porque só eu e a família dele, mas a mãe dele também não deixou de me vigiar, lógico, eu não podia, e a responsabilidade que ela ia levar, né? Mas foi muito bom, porque meu casamento foi um casamento muito feliz.
P/1 – Quando é que vocês decidiram que iam se casar? Conta pra mim como foi o pedido de casamento.
R – Então, como eu falei a você, namoramos cinco anos e meio e casamos. Depois de casada, eu casei e estava estudando em Taubaté, que eu fiz a transferência para fazer o curso técnico e ele pagou a escola pra mim. Então ele, como eu ia dizer, depois de três meses de casada eu engravidei do meu primeiro filho, nasceu no Natal e eu tive três filhos. Então três meses de casada eu engravidei.
P/1 – Deixa eu só te interromper um pouquinho Rosa, só pra voltar um pouco. Antes de você me contar dessa fase de casada eu queria saber como foi o seu casamento, o casamento mesmo, a cerimônia, o pedido de casamento. Vocês casaram na igreja? Como foi o dia do seu casamento?
R – Desde o noivado você quer saber?
P/1 – É, me conta como foi o noivado, depois o dia do casamento.
R – O noivado, ele que escolheu a aliança e por sinal quando ele mostrou eu achei maravilhosa. Tanto eu achei bonita que até hoje eu tenho a aliança, não tive coragem de desmanchar o desenho dela pra fazer o anel. O que eu fiz? Eu uni as duas alianças, pus tipo uma vírgula com as pedrinhas, uni as duas alianças e fiz um anel, não desmanchou o formato dela, o desenho, que ela era toda cestavada, achei maravilhosa. Ele que escolheu, me mostrou, foi uma sensação muito boa. Aí foi lá fazer o pedido pro meu pai que ia ficar noiva, aí meu pai já perguntou o prazo de casar (risos). Então depois do noivado ele pediu o consentimento do meu pai e nós saímos para uma festa, na época era uma festa muito famosa lá em Cruzeiro, Festa de Santa Cruz. Fomos passear, fomos na festa só nós dois, ninguém acompanhando. E foi assim, ficamos noivos, eu não lembro se chegou a ser dois anos de noivado, aí depois ele já marcou a data do casamento e casamos.
P/1 – Como foi o dia?
R – Foi a festa em casa, casei no civil e na igreja. Foi naquela época que a festa era feita em casa, porque não podia pagar clube. Foi feita uma festa em casa, teve uma pessoa que foi lá fazer os salgados em casa e a festa foi na minha casa. Foi boa, não foi exatamente como eu queria, porque assim, meu pai também não podia também, minha irmã casou e foi com o vestido dela que eu me casei, então não foi bem o que eu queria, não. Essa parte não foi maravilha, porque eu queria escolher o meu, do meu jeito. E na época eu acabei casando de chapéu, eu nem trouxe a foto do casamento porque essa partezinha não me agrada muito não. Aí eu peguei, estava aquela coisa de escolher o chapéu porque da minha irmã é aquele véu comprido, eu falo: “Ai meu Deus do céu, vai ser casamento com missa presente, eu com aquele véu, acho que vai dificultar”, na hora eu ia ficar nervosa, tudo, casei com o chapéu, mas não sei se era bem do jeito que eu queria. Mas assim, eu digo assim, a festa foi igual meu pai fez pras outras irmãs, só o vestido que eu não estava gostando não, acho que não era bem o que eu queria, não. Mas foi bem, porque eu me casei e vim pra Caçapava. O resto correu tudo bem.
P/1 – Vocês vieram viver em Caçapava assim que você se casou, foi isso?
R – Foi, eu casei e vim no mesmo dia.
P/1 – Porque ele morava aqui.
R – Ele trabalhava aqui. Ele morava lá e trabalhava aqui. Acabou morando aqui por causa do serviço, final de semana que ele ia pra lá. Aí eu casei e já vim no mesmo dia pra cá e passamos a lua de mel em Campos de Jordão.
P/1 – Como foi a lua de mel?
R – Nossa, foi muito boa. Nunca tinha ficado em hotel, a primeira sensação foi boa. Ficamos num hotel, cheio de amor, cheio de esperança. Eu amava muito ele, acho que ainda, não é porque ele morreu, não, acho que ainda amo, tanto é que eu não casei porque eu não senti necessidade de casar. Mas vivemos um casamento muito feliz mesmo. Foi um bom pai, um ótimo marido, pelo contrário, eu falo que o meu casamento, ele só me fez crescer. Você vê, dando incentivo pra escola, para eu estudar.
CORTE
P/1 – Você estava dizendo que ele te incentivou a estudar.
R – Ah sim! Ele incentivou. Quando eu terminei o técnico ele que pagou pra mim, porque eu não trabalhava ainda porque eu estava fazendo o curso técnico, trabalhava em casa. Aí ele pagou o curso técnico e queria até pagar a faculdade pra mim, eu falei: “Não, agora eu vou trabalhar, aí agora se der para eu fazer a faculdade eu vou, mas você já fez até aqui pra mim”, porque ele sustentava a casa, pagava escola pra mim, que eu não pude fazer antes. Aí deu o negócio do concurso que eu fiz, acabei trabalhando e depois, com o dinheiro do meu trabalho, eu paguei a faculdade. Mas não porque ele não quisesse, porque antes era integral o curso de Enfermagem, o superior era integral. Eu falei: “Ah não, eu vou ter que continuar estudando e você pagando?” Eu não fui por isso, mas depois, quando eu comecei a trabalhar eu fiz o vestibular, fiz a faculdade e paguei. A gente repartia as despesas, porque eu acabei tendo três filhos.
P/1 – Ia te perguntar isso agora. Você falou que com três meses estava grávida.
R – Três meses que eu me casei eu engravidei.
P/1 – E como foi essa gravidez?
R – Foi tranquila, tranquilíssima, sabe por quê? Eu acho que aquela empolgação de eu estar estudando, eu achava que eu não podia sentir nada, que nada atrapalhasse meu estudo, que eu estava tão empenhada a fazer Enfermagem, era isso que eu queria, então que nada ia atrapalhar. Então eu viajava de ônibus todos os dias daqui pra Taubaté, é pertinho na verdade, mas para uma grávida, que era um ônibus todo apertado, que ia gente em pé até no corredor, era assim. Passei a gravidez que não tive nada, absolutamente nada.
P/1 – Como foi seu parto?
R – Meu parto acabou sendo cesárea. Porque eu não sentia as contrações. Se perguntarem pra mim como é contração de parto eu não sei. Foi tentado, eu queria normal, quis até o último instante normal, mas por fim eu estava indo ao médico um dia sim, um dia não porque não dava sinal. Aí teve um dia que ele pegou nessas idas toda semana e depois um dia sim, um dia não e falou assim: “Vamos pro hospital amanhã”, aí eu fui sem saber o que ia ser. Ele examinou tudo: “Vamos pro hospital amanhã”. Ele fez tipo indução, ficou no soro o dia todo, no Natal eu fui cedo pro hospital a pé, porque eu não estava sentindo nada: “Ah não, vamos a pé”. Passei numa banca de revista, comprei uma revista, aquela Pais e Filhos, levei: “Eu vou lendo, não estou sentindo contração nenhuma, eu vou ficar lá no hospital não sei até que horas”. Porque não falou se ia ser normal ou cesárea, mandou ir e eu fui. Eu fiquei o dia todo do Natal, quando foi seis horas da tarde do Natal ele veio, examinou e falou: “Não, vamos fazer cesárea”, aí já pôs oxigênio, disse que já era pro neném, e eu nada de dor. Eu li a revista, dormia e acordava, dormia e acordava e nada, mesmo com a indução, foi onde foi cesárea. Eu não tive contração e ele fez cesárea, não por escolha (risos).
P/1 – Queria normal, né?
R – Queria normal.
P/1 – E é menino ou menina seu primeiro filho?
R – Menino.
P/1 – Você lembra como foi a sensação de vê-lo pela primeira vez?
R – Deixa eu ver.
P/1 – Quando nasceu.
R – Na hora eu não vi porque naquela época era anestesia geral, então eu fui ver basicamente no outro dia. Eu fui ver no outro dia, eu olhei, mas quando está cheia de dor, tudo, eu falei assim: “Meu Deus do céu, o neném está aqui, é meu, não é meu”. Aí depois que a moça trouxe pra amamentar, que eu vi pela primeira vez, tudo, com dificuldade, eu falei: “Nossa, será que eu vou ter leite?”, porque eu tinha o seio muito pequeno, “Eu não vou ter leite”. Mas coloquei para amamentar e amamentei com dificuldade. Tá bem. Eu achava na hora, porque o efeito da anestesia geral que é um de um jeito, não é como agora, eu achava que eu tinha que sentir uma sensação maior do que eu senti, entendeu? Eu achava que tinha que ser mais, que ser mãe é isso, é aquilo, porque eu não vi na hora que eles tiraram porque eu estava anestesiada. Naquela época eu fiquei cinco dias no hospital e acho que eu tive uma depressão. Porque numa certa hora do dia eu chorava, chorava, chorava, não sabia o porquê. Eu tive alta, fui pra casa, aí eu não estava me sentindo bem, tive que voltar pra tomar soro, tudo lá, porque a minha pressão foi lá embaixo. Eu olhava assim no berço e parecia que eu não tinha forças nem pra cuidar dele. Eu falei: “Meu Deus do céu, mas dizem que ser mãe é uma coisa tão boa, por que eu estou sentindo isso?”. É porque eu estava mal. Eu pesava apenas 45 quilos. Engravidei e voltei na mesma quantidade, não aumentou nem um, dois quilos. Eu não tinha forças porque eu não estava passando bem, então eu tinha obrigação de sentir uma coisa maior. Até eu ficar maior nessa fase, que por dias eu fiquei tomando soro e voltei, aí na hora que eu saí desse retorno a minha sogra estava lá em casa com o neném. Eu fui lá pra tomar o soro que a minha pressão estava lá embaixo, o médico mandou voltar. Voltei. Quando eu saí do hospital, aí eu resolvi passar na igreja; quando eu passei na igreja, ia ter um casamento. Eu estava rezando, agradecendo que eu estava meio sofrida porque eu estava sentindo fraqueza. Aí nisso tocou justamente a música que tocou no meu casamento, abri a boca chorar, né? Porque me lembrou, a gente fica super sensível. Devido a situação. Mas depois não, eu voltei já revitalizada, que coisa maravilhosa! Amamentei. E foi só a sensação do momento mesmo.
P/1 – Qual era a música?
R – Magnífica. (cantando) “Magnífica, magnífica”. Essa que tocou na entrada do meu casamento. Falei: “Nossa, que coincidência, né? Eu saindo do hospital, vim agradecer a Deus e meu filho está lá e tocando justamente essa música do meu casamento”, que do meu casamento só tenho lembranças boas, graças a Deus. Então foi, agora, depois de seis anos que eu tive a segunda, foi preparada, eu queria e estava torcendo pra ser menina. Dele eu fiquei feliz porque eu queria menino, naquela época não tinha ultrassom, né? Depois: “Se for menino eu escolho o nome”, até pus o nome de Marcelo que é o nome que eu queria, se fosse menina seria ele. Aí a segunda, depois de seis anos que eu planejei tê-la, porque vai passar muito tempo, vamos resolver depois não ter mais, né? Aí resolvi ter, foi planejado. Queria novamente normal, mas não teve jeito. Daí o médico: “Não, uma vez pra mim cesárea, sempre cesárea”, e eu na minha cabeça queria normal. Mas foi até bom porque eu estava com placenta prévia, na hora do parto é que ele viu, então na situação dela não poderia ser normal, ainda dá graças a Deus, né? Aí ele pegou, fez umas contas lá e falou que era menina. Aí eu fui feliz da vida. É outro tipo de sensação, porque aí eu vi quando ela nasceu, que ela chegou, falou que era menina. E eu trabalhando, trabalhei até na hora de ir pro hospital, bati cartão. Primeiro eu fui no hospital e ele falou: “Vamos agora ou à tarde?” “Não, já que tem que ser vamos agora”. Aí eu voltei, bati cartão e fui pro hospital. A cesárea não deu complicação, foi só na hora mesmo que ele descobriu e ainda perguntou se eu tive hemorragia. “Não doutor, só venho no senhor, não tenho nada”, trabalhei sem sintomas nenhum, trabalhei até na hora de ir pro hospital. Amamentei, a que mais amamentei, até um ano e dois meses e trabalhando. Aí tirava o horário de amamentação. Foi feliz, não teve nenhuma complicação.
P/1 – Qual é o nome dela?
R – Camila. Inclusive eu pus o nome de Camila porque essa revista Pais e Filhos, quando eu vim do meu filho, que eu estava lá esperando pra dar hora, tinha uma criança linda, inclusive era moreninha mesmo, cabelo pretinho, estava toda de rosa e estava com o nome de Camila. Eu adorei o nome e falei assim: “Se for menina é outro nome, pra Camila”. Como foi o segundo ele deixou para eu escolher mesmo: “Não, você escolhe”, aí pus Camila. Lembrando disso aí. A terceira que ele escolheu o nome. “Não, agora você vai escolher, seja o que for você vai escolher o nome”. A terceira veio assim, sem eu planejar, veio. Ele falou assim: “Está na hora da gente planejar o terceiro”, porque na cabeça dele, ele queria três. Eu falei: “Não, dois é o suficiente. Se for três só se for pra você ter”, na brincadeira. E não é que nesse mês mesmo eu engravidei dela? Porque eu amamentava, então falhava a menstruação e você não tinha muito controle. Aí aconteceu de eu engravidar justamente nesse mês porque eu estava amamentando; não vinha porque pra mim era normal, porque estava amamentando, por fim, foi ver eu estava grávida da terceira. Até o médico nem dava pra fazer a conta direito porque eu não sabia a data da menstruação pra dar pra ele, então ele foi fazendo exames pra ver, né? E foi assim sem planejar, mas foi a melhor coisa do mundo, que eu tenho uma filha que me deu muito prazer. Eu não planejei, mas Deus planejou. E é uma das coisas assim, eu falo: “Eu não planejei você, mas quem planejou você pra mim foi Deus”, eu fiquei muito feliz pela escolha. Foi a melhor cesárea que eu tive, em termos de recuperação, foi tudo bem.
P/1 – E o nome dela?
R – Luciana, que ele escolheu, que ele adorava aquela música “Luciana”, da Evinha. Adorava, até eu adoro essa música até hoje, canto pra ela.
P/1 – Qual que é a música?
R – É Luciana. (cantando) “Luciana, Luciana... Os olhos de menina, que é dos olhos de mar”. Ele adorava essa música, então ele colocou o nome porque ele adorava essa música, homenagem.
P/1 – Rosa, quero voltar um pouquinho pra questão da sua vida profissional. Quando você começa, você vai fez o Técnico de Enfermagem e depois você começou a trabalhar, né?
R – Isso.
P/1 – Queria saber como foi essa experiência como técnica de enfermagem, concurso, e depois como foi sua primeira experiência de trabalho.
R – Eu falei pra você, depois que eu me formei no técnico, acho que passou mais ou menos uns dois anos que foi o concurso. Eu fiz, passei no concurso do Estado em terceiro lugar pra vaga aqui em Caçapava e fui chamada. Aí, ali no Estado a vaga era de Visitador Sanitário. O visitador, basicamente era um trabalho voltado na enfermagem mesmo, trabalhava com doentes. No Centro de Saúde eu trabalhei com vacinação, com hansenianos, tuberculosos, as doenças da vigilância epidemiológica. E a gente fazia um trabalho de atendimento ali e o visitador ia em busca de pacientes que estavam em tratamento e estavam em falta, a gente ia até pra zona rural atrás, levava medicação, fazia curativo, estava dentro da minha função. Só que lá no Estado eu não estava como técnica, eu estava como visitador que era função do Estado. Trabalhei 15 anos no Centro de Saúde, foi uma fase maravilhosa que eu tive o primeiro emprego meu, sensação foi muito boa e ali a gente trabalhava muito em equipe, sentia como se fosse uma casa. Trabalhava com crianças desnutridas, vacinação e prevenção também trabalhava; trabalhava com a parte de ambulatório e foi assim, trabalhava muito em equipe, entre médico e os demais profissionais. Ia pra roça vacinar, ia com o exército nas campanhas pra fazer vacinação. E trabalhei mais ou menos nessa fase de Centro de Saúde 15 anos, que hoje é o atual Postão. Quem inaugurou o Postão fui eu e os meus demais colegas, que era aqui na avenida, aqui em Caçapava, nós mudamos lá, que é onde trabalhou o INPS, Centro de Saúde e Prefeitura juntos, uniu os três trabalhando.
P/1 – E nessa fase do Centro de Saúde você se lembra de alguma ou algumas histórias ou experiências que você tenha vivido nessa experiência profissional e que tenha te marcado? Contato com as pessoas, algum paciente?
R – Sim. Eu tinha bastante contato com esses pacientes de hanseníase que eu trabalhei basicamente entre o tratamento deles que a gente acompanhava com o médico, mais os curativos dos sequelados de hanseníase. E acabei assim, eles contando as histórias deles, como era no começo da doença, do tratamento de hanseníase, como eles eram tratados e como era o tratamento atual. Então acabava sabendo a história deles que eles contavam espontaneamente, a gente se envolvia nisso.
P/1 – E tem algum que tenha te marcado, mais especialmente? Algum desses pacientes, alguma história que ainda você se lembra?
R – Eu tenho de uma paciente que eu fazia curativo nela direto, um dos curativos mais difíceis, né? Ela contou uma história da vida dela pra mim, isso me marcou, a história da vida dela. Dois pacientes que me marcaram. Ela até contou que na época, quando foi descoberta a doença nela, que era o caso que eles isolavam, você já ouviu falar no Santo Angelo?
P/1 – Não.
R – Não? O Santo Angelo, não sei se é em Mogi ou se é em São Paulo mesmo, que tem como se fosse uma cidade que acolhia os hanseníanos. Por quê? Porque naquela época ela contava que não havia o tratamento pra controlar doença, e era uma doença que passa, então ela foi caçada, separada da filha porque não podia conviver com família, porque ela estava com doença e tinha que ser separada pra isolar doença. Então foi uma fase muito triste da vida dela. E ela contou que teve gente que era caçado, os policiais iam atrás e pegavam, arrancavam da família pra ir lá. E esse lugar virou uma cidade, tem pessoas que viveram 20 anos lá e nunca mais saíram. Até que saiu, que foi a descoberta do tratamento, onde ela saiu desse lugar. Então disse que o marido dela se separou dela, que não queria mais saber, e ela tinha uma filha pequena. E ela conta, isso é informação dela, que ela via de um dia disse que ia enterrar ele. E não é que ele morreu na frente dela? E ela tratou, ela tinha as sequelas que eu fazia o curativo dela, mas a doença sarou. Antes eram 15, 20 anos pra tratar e hoje em dois anos você cura a pior forma. Em dois anos ou tem seis meses pelo tratamento. Então eu vivi essa parte, até dessa mudança do tratamento com eles. A gente tinha contato direto, né? Então ela falou: “Não falei pra você? Lembra da história que eu contei pra você? Que ele me desprezou com a filha, não quis saber de medo de pegar? Eu não falei que ia enterrar ele? Pois é”. Quando ele morreu mandaram chamar ela, e ela foi (risos). E o outro paciente contava que na época os pacientes que iam lá pro hospital Santo Angelo, eu não sei se eles faziam experiências com medicação, não me lembro bem a história disso, mas disse que tinha pacientes que não aceitavam, tinha pacientes que se suicidavam, sabe? Ele foi um paciente da vivência do Santo Angelo também. A gente acabava sabendo das histórias deles. E eu gostava muito dessa área, sabe? Tanto é que quando eu fui fazer a faculdade essa parte que eu vivi no Centro de Saúde, nossa, eu tirei de letra, porque eu tinha a parte prática, né? Na faculdade ia aprofundar mais, mas aí essa parte que eu tinha a vivência aqui, e fazia muito curso de capacitação também pros funcionários, reciclagem. Então no Centro de Saúde se fazia muito isso com vacina, com as doenças que tomava conta, fazia tratamento e a gente vivenciou, então eu tinha uma experiência muito boa do Centro de Saúde. Inclusive meus colegas me ajudaram muito quando eu fui fazer a faculdade; enquanto eu não chegava, eles adiantavam o serviço pra mim, pra não ter reclamação, e guardava o lanche, porque eu vinha direto da faculdade pro serviço, não passava nem em casa pra almoçar. Chegava lá tinha um lanche reservado. Tem colegas que eu estou convivendo até hoje devido a isso. Alguns já mudaram. E faziam isso pra me ajudar, até eu me formar.
P/1 – E quando você saiu do Centro de Saúde você foi trabalhar onde, Rosa?
R – Eu tinha feito concurso pra, antes de fazer concurso pra São José eu estava trabalhando no Centro de Saúde e no Hospital Psiquiátrico, como enfermeira mesmo, que eu tinha feito a faculdade já, mas estava trabalhando no Centro de Saúde, até fazer o concurso pra enfermeira. Antes disso eu fui trabalhar no hospital psiquiátrico em São José, trabalhei dois anos lá, lá no Hospital Francisca Júlia, foi meu primeiro emprego como enfermeira.
P/1 – E como foi essa experiência dentro de um hospital psiquiátrico?
R – Olha, a experiência foi boa. Na minha cabeça, de imediato, eu não tinha essa vontade de enfrentar um hospital psiquiátrico, entendeu? Porque eu não falei que eu tinha uma vivência meio assim, que me marcou, eu esqueci de contar. Na época que minha mãe estava grávida desse último irmão eu tinha um tio que era psiquiátrico, até arrumar internação pra ele foi uma fase triste porque nós tivemos que dormir na casa de vizinho porque meu tio estava naquela fase de violência. Então minha mãe grávida ficava com minha irmã menor trancada no quarto à noite pra dormir enquanto não arrumava internação pra ele, meu pai ficava no outro quarto com ele pra não ter perigo. E de dia a gente entrava em casa pra almoçar e depois que voltava da escola, na hora que meu pai ficava perto, de medo dele atacar. Então na minha cabeça história de psiquiatria não foi muito boa porque eu morria de medo dele. Até quando a minha mãe morreu, um pouco antes ele foi internado, ele veio a saber depois. Então eu tinha isso comigo, eu tinha meio que um bloqueio com Psiquiatria. Mas incrível, eu falei que não e o primeiro emprego como enfermeira eu fui chamada para trabalhar em hospital psiquiátrico e fui. Mas me dei bem, me dei muito bem. Assim, até eu conhecer bem os pacientes, a rotina, tudo, eu acho que eu aprendi muito lá. Gozado que lá eu me sentia mais protegida do que aqui fora, do hospital, que lá assim, depois você estudando, você aprendendo algumas técnicas, porque com o meu tio era outra vida, outra vivência. Aprendi algumas técnicas e foi tirando o medo. E eu me sentia tão protegida que até os próprios pacientes bons protegiam a gente. Quando eles estavam controlados, eles mesmos ajudavam: “Olha, aquele paciente ali está agitado, hein?” “Tudo bem”, eu olhava e era verdade. Eu chamava o médico, dava a medicação controlada, eu não fui ataca nenhuma vez lá, trabalhei dois anos; pelo contrário, me sentia muito bem protegida. Então a minha imagem mudou, foi muito boa.
P/1 – Você teve algum paciente marcante nessa fase, no hospital psiquiátrico?
R – Marcante, marcante assim, tive um. Um não, entre os outros que mais marcou, né? É um paciente que era considerado QI baixo, mas eu acho que não tinha muito QI baixo não, sabe? Ele morava lá, ele era filho único e a mãe colocou lá porque não tinha condições de ficar com ele. E uma das coisas que eu peguei dele, achando interessante, ele olhava assim e falava: “São cinco horas”, mas como, não tem relógio, não tinha relógio perto dele, ele olhava assim e falava. E eu falava: “Mas como você sabe?” “Ah, eu sei”, mas não falava o segredo. Aí eu fui prestando atenção nele. Teve um dia que ele falou assim: “Abre lá que minha mãe está lá na recepção”. Eu falei: “Mas como você sabe?”, não tinha jeito de enxergar pra ver, porque o caminho que ela tomava não dava para os pacientes verem. “Pode abrir que a minha mãe está lá. Hoje é quinta-feira, dia tal, tal”, falava a data, sabia que a mãe dele estava lá pra visita. Ele falava o dia, tudo, sem ver folhinha, sem nada. Isso não é QI baixo, né? Aí daqui a pouco chegava gente lá, chamava ele pelo nome: “Sua mãe está aí” “Eu não falei? Eu não falei pra você que ela estava aí?”. Então ele me marcava, sabe? Me marcou por isso. Como ele sabia? Que a professora muitas vezes disse: “Preste bem atenção quando o paciente falar, que tem hora que ele tem momentos, percepções que a genten não tem. Quando ele falar, dependendo do que ele falar, vocês acreditem porque é isso mesmo. Tem os de QI baixo e os de QI alto, que às vezes eles têm soluções que a gente não tem”. Tanto esse paciente como a professora de Psiquiatria me ensinaram muito. E devido a ter o problema eu me voltei muito pra isso, mas foi bom porque eu tirei esse bloqueio com paciente psiquiátrico, foi uma vivência muito boa, eu aprendi muito ali. Foi o meu primeiro emprego como enfermeira, não como técnica. Trabalhei dois anos, que aí eu tinha feito concurso pra prefeitura e me chamou, aí eu não aguentava, fiquei alguns meses nos dois, da prefeitura e lá no hospital psiquiátrico, que lá eu fazia seis horas e lá na prefeitura eu saía de lá uma hora e entrava duas horas no hospital psiquiátrico, mas não aguentei, eu tive que deixar, deixei por isso.
P/1 – E na prefeitura qual era o cargo? Qual era o concurso da prefeitura?
R – Era de enfermeira mesmo, entrei como enfermeira. Fui chamada e fiquei 16 anos trabalhando lá pela prefeitura de São José dos Campos. Trabalhei de início quatro meses ali na Avenida Industrial, substituindo na maternidade que me chamaram na hora. Na hora que eu fui admitida lá no RH falou assim: “Você não quer substituir lá na Vila Industrial? A enfermeira da Obstetrícia vai sair de licença”. Eu pensei: “Não tem como eu falar não. De cara eu nem conhecia o hospital, já ia, desconhecido por desconhecido eu ia enfrentar”. Eu falei assim: “Eu admitida vou falar não? Não, tudo bem”, fui. Aí fiquei quatro meses ali substituindo na maternidade, trabalhei em todos os setores ali e depois assumi a maternidade; quatro meses depois eu fui pra minha vaga, que era na UPA do Alto da Ponte, lá em São José, que a minha vaga era pra lá, eu só fiquei quatro meses na Vila Industrial pra poder substituir. Fiquei quatro meses lá e os outros anos na UPA do Alto da Ponte, como enfermeira supervisora lá.
P/1 – E como foi essa transição, Rosa, toda essa carreira como enfermeira, pra vir trabalhar aqui na Casa de Acolhimento. Como você chegou até aqui?
R – Aqui, como eu falei pra você, eu fui lá pro Alto da Ponte, aposentei, foi em outubro, eu já tinha tempo total de funcionalismo, com 31, 32 anos. Só que aqui era do Estado e lá era da Prefeitura. Eu aposentei, falei: “Vamos parar um pouco, chega, né?”. Eu fiquei indo e vindo de Caçapava lá, tudo. “Agora está na hora de eu aposentar” e aposentei, pedi a aposentadoria. Fazia três meses que eu estava aposentada, eu fui chamada para fazer aqui na Casa de Acolhimento como comissionada. Eu peguei, na hora que eu recebi a proposta eu falei: “Nossa, mas eu me aposentei faz só três meses, nem senti a aposentadoria” “Vamos lá pra você conhecer”, a pessoa que me convidou, “Vamos lá para você conhecer, quem sabe você gosta, vamos lá, colabora”. Como eu já trabalhei com a pessoa que me convidou, que ela conhecia meu trabalho no Centro de Saúde, eu vim pela confiança, que na minha cabeça eu não tinha planejado, pra falar a verdade eu nem tinha conhecimento da casa, porque a minha vida estava mais em São José dos Campos. Eu vim experimentar. Eu falei: “Nossa, mas eu tenho experiência com hospital, na supervisão de hospital, com acolhimento eu nunca trabalhei, eu não sei se vou me dar bem”. Eu falei: “Mas o que faz o coordenador lá?” “Ah, isso, isso”, foi citando as coisas que faz. “Tudo bem, então vamos, vamos experimentar”. Eu vim pelo voto de confiança, não pelo dinheiro.
P/1 – E em que ano foi isso?
R – Que eu fui admitida aqui? Aqui fez um ano e meio, foi em 2013, dia 24 de janeiro de 2013 que eu fui admitida aqui como coordenadora.
P/1 – E explica um pouco pra gente qual é o trabalho da Casa de Acolhimento e qual é a sua função aqui?
R – Aqui a minha função é como coordenadora, eu tenho que fazer a parte administrativa, todinha, desde o que você está vendo aqui de suprir as necessidades materiais, que tem todo um fluxo, um processo, tudo, tem que suprir a casa, desde roupa pras crianças, abastecer a casa com mantimentos, remédios, então eu tenho que administrar tudo isso. Você faz a parte de planejamento da semana, as atividades das crianças, é um pouquinho só diferente do hospital, que a supervisora faz desde escala mensal, escala diária, a parte de medicação, aqui as educadoras que dão a medicação, mas eu tenho que suprir a medicação. Está faltando medicação eu tenho que providenciar, se não tem do SUS eu tenho que ver a farmácia que é credenciada para não deixar faltar. Dou as orientações do que um faz, do que o outro faz. O que mais? Nós temos uma médica que atende às quintas-feiras aqui e eu tenho que ver a receita e já tenho que providenciar a medicação pra não deixar faltar nada. E tudo isso, é como se fosse a dona de casa que você comanda tudo, comanda dos suprimentos, desde não deixar faltar roupa pras crianças; encaminhamentos que a gente faz das atividades deles, que eles frequentam jiu-jitsu, capoeira, tem uns que frequentam cursinho de fuxico, de feltro; tem a programação dos passeios, esse é o serviço social que faz, aí eu tenho que programar qual educador vai, providenciar o lanche; orientar os educadores; observar o tratamento, corrigir o que está errado. É tipo uma orientação geral.
P/1 – E como está sendo pra você, como é essa experiência do contato com essas crianças e esses adolescentes?
R – Olha, é assim, tem um lado gratificante, tem um lado que você se preocupa bastante. Porque é assim, a criança é um tipo de problema, o adolescente é outro tipo de problema. Tem horas que o educador vai educar, o que ele não dá conta eu tenho que dar conta, entendeu? Eu tenho tanto que olhar do lado educador, do lado da criança, tipo assim, como a gente educa o filho, né? Então o que a educadora não dá conta, ela traz aqui na minha sala. “Olha, está acontecendo isso, isso e isso”. O que é para mim eu resolvo, o que não é eu passo pro Serviço Social e a psicóloga que faz a parte deles. Então assim, é o dia a dia, um dia está calmo, outro dia não. Tem dia que as crianças lutam pra não ir na escola, aí você tem que ir lá trabalhar: “Porque não, não pode”, aquela coisa toda. Se der problema na escola a gente tem que ir lá ver, ou eu comunicar o Serviço Social pra ir lá nas reuniões. Tem dias que dão trabalho, outros não. Tem coisa que é difícil, não vou falar que é facinho, não é.
P/1 – Tem uma situação que você lembra que seja uma situação que tenha sido especialmente difícil no tempo que você está aqui? Ou que tenha sido um aprendizado que tenha te marcado por alguma razão? Com as crianças e com os jovens?
R – Com adolescente, às vezes tem uns que aceitam estar aqui, outros não. Tem uns que, às vezes, já teve tentativa de sair sem permissão, porque tem uns que é permitido sair porque estão trabalhando esse lado deles, e já teve caso de sair sem permissão. Isso causa um problema sério, aí tem que fazer todo trabalho de comunicação. Tem uns que são educados, outros não, te respondem. Você trabalha de enfrentar isso sem deixar você ficar nervosa, às vezes é difícil. Há momentos difíceis, que a gente tem que trabalhar a gente mesmo pra poder enfrentar isso, né? Não é um serviço que, de repente, aqui você fecha a porta acabou o problema, não. Aqui fica assim, uma semana eu fico de plantão à distância e outra semana é o Robson; se surgir algum problema aqui, se eu não conseguir resolver por telefone eu tenho que vir aqui, já teve vez de eu vir dez horas, ou ver que os adolescentes criaram um certo tipo de problema, então eu tenho que vir aqui pra resolver. O que os educadores não conseguem resolver eles me acionam, pode estar onde estiver, eu ando com celular, em casa já teve de eu estar deitada e ter que vir, eu tenho que resolver, eu não posso deixar eles assim. A responsabilidade é grande, bastante. Tem os momentos gratificantes? Tem, nossa. As crianças, as pequenininhas, são como os filhos da gente, é o trabalho de criança normal, a diferença é que eles estão aqui não é porque eles querem, ele foram colocados aqui até resolver o problema deles. É lógico, essa parte afetiva não consegue cobrir, por mais que a gente faça, agrade, dê carinho, dê atenção, está faltando não a parte material, que até outro dia mesmo uma falou assim: “Aqui tem tudo, mas está faltando uma coisa, a mãe”, que mesmo que seja qual for a família que eles têm, eles querem estar com a família. E às vezes essas situações são difíceis da gente enfrentar. Teve momentos bons? Tem, a gente ri com os pequenos, a gente brinca com eles também. Corrige, tem horas que tem que corrigir mesmo porque não quer ir pra escola e tem que ir pra escola. Briga com outro? Os filhos da gente brigam um com o outro, não brigam? Só que a gente tem que controlar. Só que na minha casa são três e aqui são 27, contando com os bebês. Então é assim, teve um momento no ano passado que eles fizeram uma festa surpresa para mim de aniversário. Me chamaram para um problema, eu acabei de chegar em casa, mas eles entraram em contato com meus filhos e prepararam a surpresa. Eu acabei de chegar do serviço, estava tudo bem, ligaram: “Rosa, você precisa vir aqui agora” “Mas o que houve?” “Nossa, tem um problema que você tem que vir, não adianta falar por telefone, você tem que vir” “Mas eu acabei de sair agora”, peguei e saí do jeito que eu estava, falei: “Tá bom, estou indo aí”. Cheguei lá, tudo quieto, aí a educadora vem encontrar comigo: “Mas fala pra mim, adianta para eu saber como vou agir?” “Não, não, vem cá para você ver. Vamos lá, vamos lá”. Quando eu chego lá estava todo mundo no escuro, cantando, aquela sala inteirinha, prepararam dança pra mim, as meninas, prepararam dancinha, a festa, tudo, fizeram surpresa pra mim. Nossa, eu abri a boca pra chorar. Deram presente, flores, eu não estava esperando, mas de jeito nenhum. Ficaram tudo quietinho preparando, dançava. “Nossa, quando alguém dançou pra mim assim?”. Foi maravilhoso, tive essa troca, foi muito gostoso. E assim, uma das coisas boas que eu me lembro daqui. E os problemas vão existir, lógico que sempre vão existir, a gente tem retaguarda para na hora que eu vejo além do meu alcance eu tenho os meus superiores que a gente busca e não está sozinho. É difícil? É difícil, lógico, como eu falei, eles são acolhidos aqui, mas não estão porque eles escolheram ficar aqui, né? Então a gente enfrenta as situações psicológicas.
P/1 – Faz o melhor possível.
R – Faz. O que dá pra gente fazer a gente faz. Às vezes é difícil? É difícil, mas a gente busca. Às vezes é calmo, às vezes não é. Mas foi mais um aprendizado que não estava nem planejado na minha vida e me buscaram pra vivenciar. Uma vez o padre veio e falou assim: “O serviço é um serviço difícil? É. Mas isso aqui não é um serviço, isso aqui é uma missão, viu?”. Então, às vezes eu encaro como uma missão, que não é por dinheiro que eu estou aqui, porque eu já estava aposentada. E lógico, até o que eu ganho como aposentada eu ganho mais do que eu ganho aqui, então não é o dinheiro que me prende aqui. Há situações que às vezes: “Ah meu Deus, será que vale? Vale, não vale”, mas quando eu penso na missão do padre eu falo: “Não, acho que é uma missão e eu devo seguir”, a gente vai até onde der para aguentar e eu puder fazer eu faço, e faço com o máximo que estiver dentro das minha condições. Então eu tento, não estava planejado mas surgiu na minha e mais uma que eu aprendi, como todas as outra coisas que eu aprendi”.
P/1 – Rosa, dentro aqui da casa eu queria falar um pouco sobre o Programa Nutrir. Mas antes de entrar nessa questão do Nutrir eu queria saber, você é avó já?
R – Se eu sou avó? Sou. Tenho dois netos. Eles estão em uma das fotografias.
P/1 – Me conta o nome dos seus netos e como é ser avó?
R – Nossa Senhora! Como eu tenho imagem boa da minha avó eu quero ser uma avó do tipo que mais ou menos eu tive. Eu procuro fazer o máximo pros meus netos. Eu tenho uma neta de 15 anos, a Marcela, e tenho um neto de um ano e meio, o extremo, né? É o Murilo Vicente, Vicente é o nome do avô. Murilo Vicente é o netinho que está morando comigo, a minha neta também mora comigo. Nossa, eu faço o máximo que eu posso como avó; lógico que assim, às vezes quando eu não quero presenciar a educação, às vezes até saio, é aquela mania de avó: “Ah, coitadinho. Vê o que ele está chorando”, isso, às vezes, eu faço sim. Mas se ela está corrigindo eu não me intrometo, nunca me intrometi. Mesmo a minha neta sendo criada em casa, se meu filho punha às vezes lá de, como diz, reflexão, punha lá, ela chamava e eu falava: “Mas por que você está aí?” “Ah, meu pai me colocou aqui” “Mas por quê? O que você fez?” “Ah, isso aqui. Tira eu daqui” “Não, não posso, quem vai tirar é seu pai”, e saía de perto porque meu coração estava moído, mas não tirava a autoridade dele. Mas amo, amo demais, o que eu puder fazer eu faço. A sensação é muito boa, até melhor do que de mãe, pra falar a verdade, tem hora, porque você não está com aquela responsabilidade, você tem que educar. Eu deixo pra minha filha, ela que eduque, mas não desmancho a educação. Mas muito boa, chego em casa, já tem que pegar, já vem ao meu encontro, aí quer que eu pegue de qualquer maneira e vou brincar. Mexe lá na pia, lá nas minhas panelas, ele deixa o brinquedo e vai brincar com minhas panelas. Deixa ele arrumar do jeito dele (risos) e brinca, tenho a maior paciência com eles.
P/1 – Que bom.
R – Muito lindo, porque eu tenho uma imagem muito linda da minha avó, então quero ser essa avó. E de sogra também, a minha sogra foi uma segunda mãe que eu tive, viu? Não cheguei a comentar, mas Deus me tirou a minha cedo, mas colocou uma na minha vida de casada, maravilhosa. Não falava nem que era sogra, falava mãe do meu esposo, minha segunda mãe. Minha sogra e meu sogro, os outros geralmente não tem uma imagem assim, eu não falo mal de sogra, eu não falo isso da minha sogra, que a imagem que eu tive delas é muito linda. Foi uma segunda mãe minha que inclusive, quando eu tive os meus três filhos, os três filhos ela acompanhou. Sem eu pedir, ela veio de Cruzeiro e ficou na minha casa até eu ficar boa, porque eu não tinha mãe para eu ficar, né? Então ela veio, ficou, me deu toda assistência, a experiência dela de mãe, até quando meu primeiro filho que eu falei que não passei bem, quando escutei a voz dela chegando abri a boca pra chorar, sentia aquele apoio de mãe, né? Eu me senti até melhor e me recuperei mais rápido (risos).
P/1 – Qual era o nome dela?
R – Dona Cecília. Meu sogro é José Ferreira. Belezinha. É o tipo que vinha na minha casa todo mês visitar a gente e eu adorava uma caipirinha, eu gosto até hoje, ele fazia uma caipirinha que era uma delícia. Aí ele chegava, quando ele vinha eu já deixava o limãozinho para ele fazer. Quando ele sabia que eu ia, ele já preparava para mim (risos), tinha todo esse carinho. Então eu tive muita sorte com a família do meu marido, é uma segunda família que eu tive. Até hoje, a minha cunhada é irmã, não é cunhada; o vínculo não cortou, o fato de eu estar viúva eu continuo na mesma rotina, ela fica na casa da minha família e eu fico na casa dela. Ai de mim se não ficar, entendeu? Que tem essa convivência de anos mesmo.
P/1 – Faz muitos anos que você é viúva?
R – Vai fazer 15 anos agora em outubro que ele morreu. Eu estava indo trabalhar, não tinha chegado ainda no serviço, ele foi me levar até a rodoviária pra pegar o ônibus seis horas da manhã e voltou. Nele voltar, ele chegou, começou a trocar roupa e morreu. E foi me levar a pé. Sem reclamar nada, sem sentir nada. Aí eu não tinha chegado no serviço e estava todo mundo sabendo, eu não. Só cheguei lá e recebi a notícia que eu tinha que voltar imediatamente pra casa. Por coincidência meu filho estava fora tocando, que ele tem uma banda, então ele estava tocando em Paraisópolis. Aí eu falei: “Nossa, é alguma coisa com meu filho. O único que está fora de casa que eu sei é ele, que não tinha chegado ainda”. A minha cabeça estava no meu filho. Quando a ambulância falou que ia me trazer, eu falei: “O negócio é pior do que eu pensava. Pra ambulância me trazer aqui é porque o negócio não é bom”. Aí a auxiliar de enfermagem disse: “Eu vou acompanhando você”, pois não tive coragem mais de perguntar pra ela, o que houve. Aí vim calada. Quando eu cheguei na minha casa que falaram: “O Marcelo levou o Vicente pro Pronto Socorro”, aí que eu fiquei sabendo. Foi assim, de repente, do nada. Eu saí pra trabalhar, voltei, ele tinha morrido. Não sei se foi infarto ou se foi aneurisma, mas assim. Ele chegou, começou a trocar a roupa, até meu filho chegou, ele não tinha costume de trancar a porta, estava travada, porque sabia que meu filho, esse dia ele travou. Aí meu filho bateu, aí a minha irmã foi abrir a porta. Ele chega, de costume ele ia cumprimentar meu marido: “Bença pai, cheguei!”. Ele achou estranho a forma que ele estava deitado na cama, chegou perto e viu. Levou, tudo, mas já estava morto. Morreu sem ninguém ver. Foi assim, de repente.
P/1 – Não deu tempo de socorrer ele.
R – Não deu. E ele não tinha reclamado nada, nada mesmo pra mim. A única vez que marcou foi assim, que no dia de manhã que eu levantei pra trabalhar, não sei o que me deu uns cinco minutos, eu falei assim: “Ah, hoje eu vou mais tarde”. Era um domingo. Fiquei sentada na beira da cama e falei: “Acho que eu vou mais tarde, vou dormir mais um pouquinho. Eu aviso lá que vou chegar mais tarde”. Ele pegou e ainda falou assim: “O que você resolveu? Você vai agora, vai depois?” “Ah, vou embora agora de uma vez, de todo jeito eu tenho que ir hoje mesmo, não tem jeito. Você me leva”. Aí fui. Me levou, fomos conversando pelo caminho, aí quando chegou na hora de se despedir de mim lá, ele parou no meio do caminho, coisa que ele não fazia, parou no meio do caminho, deu tchau, eu dei tchau, aí depois até na hora que ele virou eu fiquei olhando. Essa é a última imagem que eu tive. E foi assim, de repente, do nada.
P/1 – Foi jovem, né?
R – Foi. Ele morreu com 52 anos, mais ou menos. Não fazia tratamento de nada, foi assim, no repente. Magro, não tinha problema nenhum. Eu achava, o único problema que ele teve e tratou foi de úlcera, mas tratou, tudo, até a minha imagem, futuramente, se fosse esse problema que ele fosse, né? Mas não foi.
P/1 – Está certo. Eu vou voltar agora mais pra questão da vida profissional e pro programa Nutrir pra fechar, a gente fecha falando um pouco do Nutrir. Queria saber como é que o programa atua aqui dentro da Casa de Acolhimento? Quais são as atividades com a Nestlé, como é essa parceria?
R – Olha, todos os meses eles vêm, acho que cada mês é um tema que eles utilizam. Alguns eu acompanhei e outros não porque é final de semana. Acho que cada mês é um tema que eles usam, trabalham com as crianças. Teve uma vez que eu lembro que eles trabalharam com as plantinhas. Depois uma vez eles foram lá na Nestlé fazer trabalho com barro. Essa última vez eles fizeram pipa, iam fazer festa junina com eles. O que mais? Assim que eu vi, mas eu sei que todo mês eles vêm e apresentam um trabalho. Quem tratava direto com eles é o Serviço Social, fala: “O Projeto Nutrir vem”, aí vem as moças da cozinha, aquelas senhoras da cozinha, fazem a comida, o lanche pra eles.
CORTE
P/1 – Estava contando da visita da equipe, das moças da cozinha.
R – Isso. Eles vêm, fazem a comida, preparam, servem para eles. E quando as crianças sabem que o Projeto Nutrir vem, eles ficam desde amanhã, uns acordam cedo, ficam ansiosos, adoram. Toda vez que eles vieram, cada vez eles fazem um tipo de brincadeira, de temas. E o dia que fizeram da pipa, nossa, adoraram a da pipa que fizeram com eles. Como eu disse para você, eu só não fiquei a manhã inteira porque por coincidência teve uma vez que eu vim pra ficar, aí eu tive que levar duas crianças no pronto socorro, só tinha duas educadoras, até atrapalhou um pouco, as educadoras não puderam acompanhar direto porque acabou ficando uma educadora, eu com a outra educadora, fiquei com uma criança no hospital e com a outra. A manhã inteira eu fiquei, aí cheguei, foi eu almoçar, daqui a pouco outro passou mal e eu tive que ir, então não deu pra acompanhar direto. Acho que foi até esse dia da pipa que eles estavam falando, adoraram, sabe? É um trabalho muito bonito e a gente gosta. Tanto as crianças gostam, como a gente também. E agora também, na última vez na reunião, vieram fazer o que podem fazer pra melhorar, a contribuição que eles vão dar. Eles deram sugestões, a gente também deu as nossas sugestões. Eles vieram, andaram pela casa para verificar as melhorias que podem ser feitas, a gente até agradeceu muito.
P/1 – E que tipo de melhorias, Rosa?
R – Uma das coisas é que naquela dinâmica que nós fizemos, nós falamos das partes positivas, negativas, do que a gente achou, que eles pediram opinião do trabalho deles.
P/1 – Que dinâmica foi essa?
R – Eles fizeram, como diz assim, acho que veio um pessoal de São Paulo pra fazer, não é bem uma palestra que não ficaram ali, eles fizeram uma dinâmica. Nós brincamos de roda, de correr, falou do tempo dos avós, falaram de experiência deles. Foi uma coisa gostosa, eu encarei como uma dinâmica. Depois apresentaram todos os trabalhos realizados aqui, que eles fizeram, gravaram, mostraram o trabalho desde o ano passado, como alguns eu acompanhei e outros não, mostraram todo o trabalho. E depois nós sugerimos para eles se era possível fazer um cardápio pra gente aqui, diante do que a gente tem aqui, se poderia fazer, que uma das coisas que eles pediram opinião pedimos isso. Então dentro disso, essa reunião, eles aproveitaram essa sugestão, deram a sugestão deles, de poder melhorar, e uma das coisas que eles falaram eu anotei até no caderno aqui. Eles sugeriram ajuda, se precisava de alguma coisa pra cozinha, por exemplo fogão, geladeira. Eu falei, nossa, essa semana eu já tinha dado pra diretora da cidadania que pediu o que precisava comprar pra cozinha. Então eu falei o que estava ruim, o fogão, geladeira, microondas, forno elétrico, o liquidificador, espremedor de frutas pedi pra comprar. E diz ela que ia vir uma verba, que daria para comprar e ia comprar. Então se não desse o pessoal ofereceu que poderia até comprar essas coisas. Eu entrei em contato com a diretora pra ver o que ela iria comprar ou não pra eles comprarem. Eles ofereceram fazer um trabalho de grafite na parede lá com motivo de criança, extensão do muro – porque as crianças jogam bola, cai no vizinho, cai na rua; eu entendi como extensão do muro fazer a tela. Nós ganhamos slackline de doação, falta o suporte, eles ofereceram, se for possível, vão fazer o suporte do slackline. Eles falaram também de uma palestra pra direção profissional, se não me engano pra três adolescentes de 15, 16 anos que nós temos aqui; ofereceram essa palestra, a gente vai mandar. Que mais? A horta suspensa aqui no corredor, deram a ideia de fazer, nós adoramos essa ideia de fazer tipo assim, de temperos, pros adolescentes cuidarem. O cardápio que estava dentro disso. No refeitório eu sugeri se eles poderiam fazer um tema, uma pintura, alguma coisa com motivo de criança para tornar o ambiente mais alegre na hora da refeição. O que mais que eu me lembro? Depois da reunião eu falei sobre essa extensão do muro do lado pra não ter perigo deles subirem pro telhado. O parquinho nós temos um parquinho já comprado, esperando a grama pegar pra fazer.
P/1 – Queria entender um pouco, você falou quando eles vêm, por exemplo, o pessoal na cozinha pra fazer refeição. Nessas orientações mais na área de alimentação, nutrição, você acha que teve algum aprendizado por parte da equipe mesmo, da Casa de Acolhimento, da equipe da cozinha, ou por parte das crianças e jovens acolhidos?
R – Um aprendizado?
P/1 – Essa parte mais de alimentação, de nutrição. Tem uma troca nesse sentido? Você acha que teve alguma mudança?
R – Eu acho que sempre tem, só que assim, até quando nós falamos dentro do que a gente faz aqui, tem aceitação de uma coisa e de outras não. Nós falamos por exemplo assim, tem gente que não gosta de verdura, mas a gente introduz a verdura, nem que seja uma folhinha pra incentivar, a gente não vai obrigar a comer. Umas aceitam, outras não. Mas a gente faz assim, bolo de cenoura eles gostam, com chocolate. Às vezes coloca cenoura no meio da torta, eles comem. Até nós sugerimos aqui, eles não comem assim, mas se por no meio da torta eles comem, entendeu? Pelo menos das coisas que eles fizeram eles comeram bem, aceitaram, eu não vi reclamação. O que houve, quando nós falamos da parte negativa que ela pediu, é que teve umas vezes que é organização no horário de dar o café da manhã. A gente não sabia se eram eles que iam dar, se a gente, mas isso foi contornado, já foi resolvido. Foi mais dessa parte que eles falaram, que os educadores sentiram e falaram, já foi até corrigido. Mas eu não vi partes.
P/1 – Tem uma aceitação boa.
R – Teve sim, inclusive até a outra vez que eles vieram não foi nem almoço, eles trouxeram outras coisas variadas, inclusive fizeram parece que cachorro quente, de manhã acho que teve sanduíche com presunto e mussarela e fizeram pipoca, milho verde, foi agora acho que no mês de festa junina. Foi milho verde que eles fizeram, tudo isso aí. Só que a programação deles era para ser até melhor, não fizeram não por culpa deles, é que eles iam ocupar aquela área ali embaixo pra fazer, só que não foi passada a informação, tive que ficar 20 dias sem pisar naquele lado, as crianças ficaram só desse lado pra grama pegar. Então eles foram prejudicados, mas não por culpa deles, porque até eles vieram pra fazer uma coisa até maior, diz que deu pra fazer o que tinha que fazer. Porque aí o contato não era eu, direto, agora eles fizeram comigo. Eu falei: “Nós temos o quintal aí, mas só que não pode ser ocupado por 20 dias”. Prejudicou, mas não que eles montaram, foi devido a estrutura no momento que estava.
P/1 – E Rosa, qual é a importância que você acha que tem essa parceria entre uma empresa como a Nestlé e a Casa de Acolhimento em um programa como o Nutrir? Você acha que isso traz alguma coisa de bom, que é importante, por quê?
R – Nossa, eu acho que é sempre importante. Tudo o que vem como aprendizado é excelente, é uma contribuição. E pras crianças, nossa, nem fale. Quando você fala que alguém vem pra fazer alguma coisa eles ficam empolgados, alegres. Inclusive quando eles deram a hortinha, os pequenininhos, quando eu vi tinha um cantinho lá que era deles, que era no baixo. “O que vocês estão fazendo aí? Mexendo com água?” “Não tia, nós estamos cuidando da nossa plantinha”. Eu fui ver e, realmente, estava num cantinho e todos os dias eles iam molhar, os pequenininhos. Até onde deu eles cuidaram, não sobreviveu porque a gente não tem uma horta adequada, na outra não tinha horta, mas enquanto estava aquela plantinha, você vê, é um aprendizado grande que eles tiveram. Eles cuidaram, uma lição tirou daí, né? E quando eles vêm e fazem eles comentam o que foi feito com eles. Eu acho que tudo o que vem é bom para o aprendizado, uma contribuição, como agora também eles vão dar também essa contribuição. Você vê, eu não ia poder chamar alguém, de ter essa ideia de grafitar ali, só se vem de doação. “Ah, eu posso fazer isso”, a gente faz o que é pra fazer, mas essas coisas não. Já vieram fazer. Esse alongamento do muro que vão fazer, ótimo, excelente, uma coisa que de imediato a gente não ia fazer. Eles já subiram no muro pra pegar a bola do outro lado, você vê o risco que se corre e a preocupação também. Eu acho que só contribui, que cada vez eles vêm com uma coisa pra passar pras crianças. Estava bonito, as coisas que eu não acompanhei e que eu vi que eles fizeram, todo o trabalho que eles fizeram durante esses anos todos. Teve festa junina que eles já fizeram, foi legal, foi muito bom. A gente só tem que agradecer.
P/1 – Eu vou encaminhar agora, Rosa, pras perguntas finais, são duas perguntas finais de fechamento. Antes de perguntar eu queria saber se tem alguma coisa que a gente não tenha perguntado e que você gostaria de deixar registrado?
R – Que eu me lembro no momento, não.
P/1 – Falou de bastante coisa, né?
R – Eu sei que eu me lembrei assim e à medida que a gente vai lembrando a gente vai passando. Inclusive outra coisa que eu pedi pra eles, eu falei depois, é o bebedouro, que a gente precisava de um bebedouro, eles anotaram tudo pra depois eles darem o retorno pra gente, do que vai ser possível de fazer ou não fazer. A gente só tem que agradecer, não tem nada, isso está sendo muito bom pra gente, pras crianças, principalmente pras crianças, que aqui está em função das crianças, tudo é envolvido pra elas. E pra gente é excelente, os educadores estão apoiando. O que eu falei pra você é só isso, o negócio da organização, porque teve um dia aí, mas no mais não teve, perfeito o trabalho deles, muito empenho deles aí.
P/1 – Eu vou fazer as perguntas finais agora. A primeira é: Quais são seus sonhos hoje?
R – Meus sonhos? Nossa. Meu Deus, tem hora que a gente pensa tanta coisa, né? Fora do serviço, no serviço?
P/1 – De qualquer tipo.
R – Vou falar, eu tive uns planos para quando aposentasse. Eu adoro música, inclusive meu filho já faz parte de uma banda, ele é músico e dá aula no Projeto Guri. A gente incentiva muito o lado de música dele, ele se formou engenheiro, mas acabou trabalhando com música. Eu tinha em mente que toda vida eu lidei com música, aprendi um pouco de violão, aprendi um pouco de piano, só que eu não pude continuar porque quando eu comprei o piano, aí eu tinha que escolher, ou faculdade ou piano, porque não podia conciliar ter casa, serviço. Meu sonho era continuar meu piano pro meu bel prazer, não pra fazer nenhum concerto, não, que não tem como eu fazer isso agora. Continuar minha música, aprender uma língua, que eu sempre acabei cedendo pros meus filhos, tinha que escolher pra mim ou para meus filhos. Aprender uma língua, que eu sempre tive vontade. Viagens, adoro viajar. Mesmo trabalhando eu viajo, dentro do possível todo ano eu vou em excursão e faço minhas viagens pelo Sul, vou lá pro lado de Goiás, pro lado de Minas, todo ano eu faço isso. Só que meu sonho é um dia ir a Portugal. Eu estou trabalhando a minha cabeça por causa do avião (risos), que eu já viajei de avião uma hora só, mas só Deus, segurando a mão da minha filha na subida e na descida, segurei meu neto aqui na mão até. E uma hora só, mas na minha cabeça pra 12 horas de viagem que é o meu sonho, porque eu sou muito devota de Nossa Senhora de Fátima, eu sou católica, não fervorosa, mas eu tenho a minha fé. Eu tenho vontade de ir lá no local de Fátima, eu sou devota dela. Nossa Senhora, como Nossa de Fátima, que Nossa Senhora a gente sabe que é uma só, ela representa várias. Meu sonho que eu não realizei ainda é isso aí, de ir e ter tempo pra continuar minha música, que eu ia fazer agora e não fiz, agora mudou meu rumo, né? E a língua, que eu não realizei que eu tinha muita vontade de estudar uma língua, quero estudar uma língua, nem que seja espanhol. Eu tinha muita facilidade pra língua, tinha um incentivo da minha professora e tudo, mas não pude, não foi possível. Mas o piano eu queria continuar porque eu tenho piano em casa, quero ver se meu neto toca, que meu filho partiu pra bateria; aprendeu piano um pouco, mas quis fazer bateria e hoje ele está fazendo percussão. Quem sabe esse meu netinho? A minha neta não quis saber nada de tocar o piano e o meu netinho, quem sabe, é a esperança, meu sonho que um dia ele venha a tocar também, se ele tiver vontade, lógico. E sonho de viajar, conhecer outros lugares que eu adoro estrada, avião não tanto, ainda ou treinar. Mar não, eu já ganhei uma viagem de cruzeiro e desisti, não tive coragem. Enquanto eu estiver assim eu não vou aproveitar o passeio, né? Mas assim, de estar na estrada eu adoro, não importa se é 14 ou 12 horas de viagem, eu adoro. Sempre que posso eu viajo, mesmo trabalhando, sempre que dá eu faço, mas eu queria fazer mais. Consegui fazer a faculdade dos meus três filhos, se eu fiz eles vão fazer. Consegui, mesmo viúva eu consegui, trabalhando, consegui sustentar a faculdade deles. E me realizei nessa parte, graças a Deus, porque como eu tive dificuldade pra terminar os estudos, eu graças a Deus, com eles não teve. E graças eu ter estudado, porque eu não parei, eu insisti, aí eu consegui (risos).
P/1 – Tá certo. E por fim, como é que foi contar a sua história, Rosa?
R – Como foi? Gratificante. Porque às vezes a gente conta parte da história numa conversa, hoje eu fiz uma retomada aqui, né? Uma retomada, desde infância, nós passamos por todas as etapas. As alegrias, as tristezas, foi muito bom. Porque começou ontem, ontem eu mexendo nas fotos mexeu muito com meu emocional, viu? Eu comecei a pegar: “Que foto que eu pego?”, cada foto que eu via, é relembrar, até mexeu um pouquinho com o meu emocional. Mas foi bom.
P/1 – Muito obrigada.
R – Eu que agradeço muito.
CORTE NO ÁUDIO
P/1 – Se você puder contar pra gente, Rosa, essa história com Nossa Senhora de Fátima.
R – Eu sou devota de Nossa Senhora de Fátima. Um dos motivos que me levou, que me tocou, porque quando eu era criança, com mais ou menos sete anos, na época a minha mãe era viva ainda, Nossa Senhora de Fátima veio pro Brasil e ela estava em missões, tinha aqueles padres missionários que acompanhavam. A vez que ela foi em Cruzeiro ela visitando uma escola que eu estudava, no meio de toda multidão que estava lá no momento, aí o andor de Nossa Senhora de Fátima acompanhava os pombinhos, então, aí eles saíam, voavam, tudo. E numa dessas ele veio e assentou na minha cabeça. E eu no meio da criançada, não estava nem na frente, estava assim. Só que ele não saía da minha cabeça de jeito nenhum, por mais que você fizesse assim com a cabeça. Aí o padre me chamou e falou assim: “Vai lá no andor pra ele sair, porque ele não vai sair”. Eu fui no andor, aí quando eu cheguei ele saiu e ficou no andor de Nossa Senhora de Fátima. E aquilo me emocionou mesmo como criança. A minha mãe ficou preocupada, será alguma coisa, uma mensagem? Será que ela vai morrer? Os vizinhos ficaram falando. Será que ela vai morrer? Será que alguma coisa que Nossa Senhora de Fátima quer falar pra gente? Ela ficou preocupada. Mas isso me marcou, tanto me marcou que toda vez que eu falo Nossa Senhora, eu falo: “A minha Nossa Senhora é Nossa Senhora de Fátima”. Porque eu lembro desse fato, eu sou muito devota dela, inclusive todas as nossas senhoras que eu tenho em casa foi que me deram de presente, inclusive eu mandei fazer uma gruta no quintal de casa junto de uma fonte que dá na janela do meu quarto, eu coloquei Nossa Senhora na frente e Nossa Senhora na frente da minha varanda também, que eu coloquei o oratório, eu fiz com pedra e tudo, sabe? E coloquei a Nossa Senhora de Fátima.
P/1 – Está certo, obrigada. Pode complementar!
R – Outra coisa que eu lembrei, o meu sonho é ir a Portugal porque eu quero ver Nossa Senhora de Fátima lá, sei que ela está em todo lugar, mas eu quero lá, porque a história dela começou lá, né? Tá bom.
P/1 – Tá ótimo! Obrigada, viu?
R – De nada.
FINAL DA ENTREVISTA
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