Projeto Conte Sua História
Realização: Instituto Museu da Pessoa
Entrevista de Lays Lugão de Carvalho
Entrevistada por Fernanda Micoski da Costa e Larissa Carvalho Guilhoto
São Paulo, 06 de setembro de 2022
Código: PCSH_HV1244
Transcrito por Waleska Praxedes
Revisado por: Isaura maria Ribeiro...Continuar leitura
Projeto Conte Sua História
Realização: Instituto Museu da Pessoa
Entrevista de Lays Lugão de Carvalho
Entrevistada por Fernanda Micoski da Costa e Larissa Carvalho Guilhoto
São Paulo, 06 de setembro de 2022
Código: PCSH_HV1244
Transcrito por Waleska Praxedes
Revisado por: Isaura maria Ribeiro Bonavita
P/1 – Lays? Conta um pouquinho do seu nome inteiro pra gente.
R – É Lays Lugão de Carvalho.
P/1 – Da onde é? Lugão é da sua mãe?
R – Lugão é da família do meu pai.
P/1 – Do seu pai?
R – Descendente de suíço
P/1 – E qual o nome...
R – Qual o nome o que? Do pai?
P/1 – Nome do seu pai.
R - Genésio Gomes Lugão.
P/1 – E o nome da sua mãe?
R – Odila Brum Lugão. O Brum já é de origem portuguesa.
P/1 – Legal
P/1 – E seus avós? Eles eram de Portugal?
R – É os avós, meus bisa, né, porque meus avós tá mais brasileiro, mas os da parte do meu pai vieram da Suíça e da minha mãe são portugueses, vieram de Portugal, claro.
P/1 – E a senhora nasceu em qual cidade?
R - Eu nasci na cidade de Carangola, Minas Gerais, mas eu fui com 3 anos para uma fazenda no Estado de São Paulo, fiquei até meus dezesseis anos. Fui criada, infância, adolescência, nessa fazenda linda, construída por escravos que ainda é lindíssima até hoje tem cento e sessenta anos, tá? Hoje ela é um lugar turístico, onde as pessoas vão visitar e colher informações dos escravos.
P/1 – A senhora nasceu em qual ano?
R – Eu nasci em 1932. Tô longe.
P/1 – A senhora tem irmãos?
R – Sim, todos falecidos. Só estou eu. A família tá acabando, é lógico.
P/1 – Eles são mais novos ou
mais velhos que a senhora?
R– Meus dois irmãos mais velhos, a minha irmã mais nova e uma outra irmã, todos falecidos,
tá só
eu.
P/1 – E me conta um pouco da sua infância na fazenda. A senhora tem umas primeiras memórias de criança lá?
R - A fazenda era muito bonita, é ainda grande, era quase uma fábrica, tinha de tudo. Fazia cachaça, tinha o dia dos biscoitos, tinha um dia de matar porco, ela é toda excêntrica. Tinha o quarto de ferragem,
um quarto do meu avô que fazia o fumo, Ele
colhia, secava e
fazia aqueles rolos, assim... Então, cada cômodo e a sede da fazenda eram muito bem organizados e vinham muitos turistas do Rio de Janeiro, pra tomar ares de montanha. Minha mãe com a equipe que trabalhava, atendia muito bem, a noite tinha sarau de piano, música, tinha também jogos. Aquele tempo era vispa, hoje é bingo, é tudo diferente. Tem uma excentricidade: a fazenda era toda feita de tábuas e aí, a noite, quando jogava vispa, caia aqueles grãozinhos de milho nas gretas né, de manhã as crianças, como diversão, ia lá tirando aqueles milhos das gretas para poder limpar a casa, né? Então isso aí é umas coisas muito assim. Tinha um quarto de oração, Claudia, que era muito interessante. Juntava todos os empregados, os filhos e tal, e ia pra lá pra gente rezar, mas era uma oração toda, muito sem espiritualidade. Minha mãe dirigia a oração e ainda brincava com eles, zangava no meio da oração: “Tira o cachorro daqui, tira essa criança daqui”. Era muito diferente e tinha também sabe o que? que eu achava muito interessante: toda a vida da fazenda era muito excêntrica.
Aqui, Renata, saiu do lugar.
P/1 –E?
R - Peraí, Claudia, saiu aqui! Tem que ter cuidado! Pronto, voltou! Então, a gente tinha um passeio assim, parecia um spa, hoje, a gente pode falar isso. De manhã levantava aquela lauta mesa de biscoito, coisa tudo feita na fazenda, depois ia passear, fazer uma caminhada, depois voltava, sentava na varanda e vinha as frutas e ali a gente ficava tricotando, fazendo crochê e
tricotando com a língua também, né? Era muito interessante e muito bonita a vida, né, sabe.
A gente tinha as tias, as primas que vinham do Rio de Janeiro, porque o Bananal é mais próximo do Rio do que de São Paulo, apesar de ser Estado de São Paulo, sabe?. O pessoal ia muito do Rio a fazenda. A Rio - São Paulo passava na porta da fazenda, aí passava e parava muita gente para olhar, pra ir lá visitar, sabe? Depois fez a Presidente Dutra e mudou a direção da fazenda, tá. Passei minha infância lá e com 16 anos eu saí e voltei pra Minas Gerais. Vim para Caratinga.
P/1– Nessa fazenda morava você, seus irmãos, seus pais…
R - Isso e mais o meu avô, os irmãos, os filhos, o meu avô com os filhos adultos e cada um tinha uma função na fazenda. Meu avô era escriturário. Ele tinha o escritório dele.
Tem até hoje lá um cofre grande, ali ele sentava, fazia a escrita toda, naquele livro grande que era. Ele também cuidava do armazém. O armazém vendia os alimentos pros empregados, no sábado. Sabe? Ele tinha também uma preferência: fazer um painel na parede do armazém com aquelas artistas antigas, Claudia. Aquelas artistas de Hollywood. Ele achava aquelas pernas bonitas. Achava aquilo lindo. Eu me lembro tanto disso.
P/1 – Esse seu avô era paterno ou materno?
R - Era paterno. Não sei da onde ele aprendeu tanto!
Porque ele veio com os pais e não tinha muita escola. Mas, ele escrevia muito bem, ele lia o jornal todo dia. Quando eu vinha da escola, eu trazia o jornal. Ele tinha uma cultura já pré-estabelecida pela família que ele trouxe lá da Suíça e dos irmãos. Então foi uma vida muito interessante e muito boa, muito agradável e muito rica. E eu estudava em colégios internos, em Resende,
Agulhas Negras.
Aí, na hora que preparava as minhas malas pra poder levar para o colégio, era tão… eu chorava muito.
Imagina, não queria ir, né?
Sabia que ia ficar lá, uma vida tão diferente! Minha mãe chorava também, mas olha, a educação da época, chorava, mas mandava, senão como é que eu podia estudar na fazenda, né? Já tinha acabado o primário, então tinha que estudar um pouco mais e aí, eu ia prá lá. Ela resistia as minhas lágrimas e as dela também, mas a gente ia, tá? Era uma visão necessária.
P/2 – Com quantos anos a senhora começou a ir pro colégio interno?
R – Ah, eu já tinha uns doze anos, eu fiz naquele tempo, não era vestibular não, era [Renata, a filha, diz: “Admissão”]. Admissão que a gente fazia, era o vestibular, aí era aprovada e depois ia seguindo. Aí então a gente estudava. As irmãs eram alemãs e quando elas davam aula, eu não sabia se era português, se era francês, se era alemão, era uma embrulhada! Difícil! complicado! A congregação era Ursulinas, elas eram muito preparadas! Eu tive uma base boa, graças a Deus! Está me valendo até hoje.
P/2 – Uma perguntinha, voltando um pouco. Quando você estava descrevendo o que fazia na fazenda, você falou:
tricot, crochet.
Com quem você aprendeu a tricotar?
R –Tudo com as tias. Elas todas sabiam, era comum fazer tricot. Eu faço até hoje, sabe? Crochet, bordados, era quase diversão da época, era terapia, ninguém falava terapia, mas era comum, todo mundo tinha que aprender, era natural, sabe?
Então era bem interessante,
hoje posso dizer, era altamente terapêutico, relaxante né? E as crianças como eu, ficava querendo fazer só aquilo. Elas não “flexionavam” uma maneira mais agradável, aquela agulha fina, aquela lã, custava crescer o tricot. Hoje é tudo diferente! Aquela agulha grossa, sai tudo grande, mas na época não havia tanta flexibilidade assim, tantas variedades também, então a gente usava né? Era muito interessante, os passeios a cavalo, a gente ia longe, gostoso, né? Era uma vida, foi uma vida muito boa e trás só boas recordações, tá? Ó deixa eu contar pra vocês, vocês nunca viram isso! A gente fala “bate” o feijão, então faz uma roda de... enorme de folhas de feijão e aí, a gente ia a cavalo em cima pra poder amassar, tirar os caroços, tirar o feijão e os empregados ficavam separando um pouquinho, ali era um passeio lindo, bonito,
sabe? Então era tudo diferente, coisas muito agradáveis. [ Renata, a filha, diz: “Depois fazia fogueira”]. Tinha, na época de São João.
Fazia aquelas festas e tinha fogueira. Aos sábados, tinha o baile do meu avô, que ele promovia na casa dele.
Um baile, todos os sábados. Ele fazia o quentão, era uma cortesia que ele dava pros empregados. E ele, e ali as danças, quer dizer os sanfoneiros, tudo ali e a gente no meio daquela brincadeira. Muito, muito gostoso a infância na
Fazenda dos Coqueiros.
P/1– Qual lembrança a senhora tem dos seus irmãos, durante a infância? A senhora brincava com os irmãos, mas com as irmãs?
R - A gente brincava muito. Brincava na rede, a Claudia se sentava na rede e eles iam embaixo empurrar a gente pra cair. Eles eram o tubarão. Um dia caí e bati a cabeça, na pedra, tudo pedra, aquelas pedras enormes, feitas pelos escravos. Então fiquei de castigo durante um mês, não podia mais sentar na rede porque eu tinha me machucado, fizeram muita bagunça, mas era... nossa! Era muito agradável! Nossa inesquecível!
Os irmãos, ir brincar… Meu pai era um pai assim bravo e tal, mas ele ajoelhava no chão e fazia pra gente subir em cima dele e ele caminhava com a gente, brincava conosco. Olha que lindo! Hoje eu dou muito valor a isso que não sei se não era tão comum, mas hoje a gente vê muito pouco, né? Mas era uma educação muito participativa, sabe? E tinha as “bravezas”, é claro né?
P/1– E nessa época da infância, a sua mãe
trabalhava na fazenda também?
R - É, toda a vida na fazenda. Ela fazia os doces, os biscoitos, era uma energia enorme!
Ela era elétrica, nunca vi tanta coisa, mas tudo rendia, era como se fosse uma fábrica, sabe? Era muito interessante, muitos empregados e todos ali com a gente, ali naquele “day”. A noite punha uma prancha de metal no chão assim, na cozinha, que era de pedra e a gente ficava em volta, sentadinha, escutando as histórias dos empregados,
histórias horríveis, Claudia, tudo de medo. Dali pra sair ir a cama era uma dificuldade. Contavam casos de assombração, era praxe imagina...hoje eu vejo as crianças vendo esses filmes tão pavorosos, elas nem ligam e nós também tinha um pouquinho de medo, mas a gente acostumava com aquilo, esperava as histórias, sabe, era uma brincadeira interessante, também, né?
E aí?
P/1 – É... Sofia?
P/2 – Não, e aí quando você começou a ir para o colégio interno. Como você se sentiu nesse colégio?
R - Ah, eu sofria, menina, porque tudo era tão diferente, tudo muito metododizado, tudo muito (humanizado?). A Fazenda era tão livre!
A gente tinha tudo tão solto!
Mas, apesar de tudo, a gente sempre encontrava um caminho, havia muita “rezação”. Só que era gostoso.
Vou contar para vocês: na época da Páscoa, a gente ia para a escola militar lá em Resende e os cadetes que seguravam a bandejinha da hóstia.
Aqui, a gente ficava encantada com aqueles moços bonitos! A gente era
muito meninas, mas era bonito e ali
eles compartilhavam a missa com a gente.
Mas, era muita oração!
Oração de manhã, oração de tarde e tal, e a parte do estudo era muito complexa, tanto que, quando foi no terceiro ano, eu tomei uma bomba geral: inglês, francês, latim, tomei em tudo que era língua.
Eu não consegui, mas depois eu repeti e deu certo.
Aí,
foi uma dificuldade muito grande porque era caro o colégio na época, né? Tinha que pagar, era um colégio que não era, mas a gente, mas passou a vida eu sei tudo valeu.
[Renata, a filha, fala: “Conta como tomavam o banho.”].
R – Esse foi em outro colégio que eu passei por um tempo, em Barra Mansa,
tomava banho de camisola.
A gente não podia expor nosso corpo, nem pra gente mesmo! Olha gente que preconceito! Que coisa horrível! Mas a gente não podia ficar sem roupa perto da coleguinha, o banheiro era aberto e a gente tomava banho ali, olha que coisa mais antiga, né?
Mas…
Tinha alguma, opa, desculpa, desculpa.
R – Isso era a vida, né? A gente achava ruim, mas tinha que fazer. E hoje eu vejo: Que puxa, que diferença! Não fazia tanto mal, assim não! A gente vai entrando na outra vida, isso não prejudicou em nada, nem reprimiu nossa sexualidade nada não, sabe? Tudo, eu acho, tudo é hábito, tudo é costume e a gente tem que aceitar as coisas e tentar se adaptar. Foi o que eu fiz e, tô aí.
P/1 – Tinha alguma matéria que a senhora se interessava mais
durante os estudos no colégio interno?
R – Sim, eu sempre gostei mais da parte da economia doméstica,
também gostava. Tinha a parte de...não era de pediatria, não! [ Renata, a filha, fala:” Puericultura” ]. Puericultura, que falava sobre criança. Eu também já gostava muito, sabe? Foram as minhas notas melhores, mas as línguas eu tropeçava muito, eu achava bem complicado, era muito latim, português, inglês. Inglês não! Inglês era
um... era mais francês, depois, mais tarde, eu passei a estudar o inglês. A língua mais predominante era o francês, era importante. Todas as pessoas finas tinham que saber o francês. Tudo muda, né? Bem.
P/1 – Os irmãos da senhora também iam para o colégio interno?
R - Não, não. Os meninos estudavam num colégio agrícola. Escola agrícola que havia numa cidade lá perto, em Pinheiral. Eles estudavam já voltado mais para a agricultura, né? Meu irmão aprendeu a criar abelhas, fazia mel. Fazia não! Cuidava das abelhas para poder produzir o mel, ele aprendeu, então ele já tinha outra visão. Então os irmãos, né? A minha irmã mais nova, ela depois quando eu saí, nós saímos da fazenda, ela foi para o Rio. Ela estudou em outros colégios no Rio de Janeiro, de freira, mas no Rio era tudo diferente, mas assim e depois,
agora prosseguindo a minha vida, com 16 anos, eu fui para Caratinga, Minas. Aí, chegando em Caratinga eu fiz o curso normal,
acabei o ginásio, não o ginásio eu já tinha acabado, eu fiz o curso normal, de professora, mais tarde eu fiz pedagogia, mas aí nesse período, eu me casei. Meu marido era farmacêutico e um mineiro muito conservador, né? Eu meio livre, de outra cidade, custamos a nos adaptar, mas tivemos quatro filhos: um filho, o mais novo e três filhas. Que deu bastante trabalho para o pai porque eram muito bonitas e ele tinha que segurar dali e daqui, mas tudo deu certo. Hoje todas casadas e tudo bem! Tá?
Bom, nesse período que eu me formei,
fundei uma escola especial na minha cidade. Ninguém na cidade sabia, nem sabia o que era a palavra excepcional. Ninguém sabia o que era isso e tal e eu lembro que fui falar sobre isso no Rotary e um senhor falou: “Ah, Dona Lays eu sou um excepcional!”.
Eu falei: “Ué, por que? "Eu nunca ouvi falar nisso! Eu só tenho um filho único, sadio, sarado, eu nunca ouvi falar um filho doente!”
Aí, ele… Era tão desconhecido, ninguém sabia e essas crianças ficavam nos seus lares e eu então tomei conhecimento e reuni um grupo pra mostrar pra sociedade que
havia uma necessidade de criar algo pra eles e assim foi uma reunião muito interessante.
tem um caso muito diferente
de um menino daqueles que já é maiorzinho e ele cantava Ele tinha uma paralisia facial e ele cantava direitinho e então ele cantou. Era perto do dia das professoras, olha que ironia! Ele cantou: “Parabéns, parabéns professora, hoje é, hoje é, o seu dia!” E aí, eu falei: “Gente!” Aquilo emocionou demais a todos!
Um menino, que nunca teve uma professora cantando, homenageando!
Olha o desejo ardente dele com esse canto, né? Ali foi um alerta e aí apareceram pessoas para me ajudar e nós fundamos a Escola Especial. Muito trabalho! Muito difícil! Não tinha dinheiro, não tinha nada e a coisa acontecia. Ai eu fui, morando, alugamos uma casinha. Não sei
como,
da onde saía o dinheiro.
O meu marido era simples e eu também, mas saia, acontecia. Eu acho que a força do desejo ajuda tudo. Aí depois, quando já tava, mais ou menos, as crianças, chegavam lá pra eu educá-las.
Eram uns bichinhos, sem sociabilidade, nunca tinham saído de casa, era uma coisa complicada. Eles se agrediam, um tropeçava no outro, não sabia o que ia fazer e a gente devagarinho foi socializando, foi cuidando deles e eles tornaram possível de ser educados e aí nós começamos a fazer curso, a estudar e pensar como é que nós vamos tratá–los e as portas foram abrindo.
Depois o outro passo muito grande foi criar a Apae [Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais]. Estávamos com uma estrutura pequena, a escolinha de Dona Lays, a gente tinha que fazer uma ligação com a associação brasileira da Apae, né?
Pra gente conseguir verbas. Aí nós começamos a elaborar aqueles processos, tudo muito difícil!
Tinha uma filha que trabalhava comigo, que me ajudava e nós fizemos um processo para pedir que o Estado pagasse pelo menos duas professoras. Ai, mandamos
aquele processo todo lá pra Belo Horizonte, meninas!
E ficou e ficou parado. Cadê? Aí fui lá! Cheguei lá na secretaria: “Eu vim saber qual a resposta que o secretário vai dar ao nosso pedido.”
Aí veio uma pessoa e falou: “Ah, o secretário mandou falar que não pode não, que vai onerar o Estado”. Vai onerar o Estado de Minas Gerais
duas professoras? Aí, voltei triste, reuni as pessoas que estavam comigo e tinha um jornalista. Eu falei: “Ah, como é que vamos fazer?” Ai ele foi lá. “Vou dar uma ideia: Vamos escrever uma carta para o nosso jornal!” Tinha um jornalzinho da cidade e publicar essa carta. Aí o que é que ele fez? Falou: “Lays, então você escreve a carta!”
Eu falei: “Mas eu? Escrever uma carta para o secretário? Eu, uma professora tão simples?” Tinha traquejo nenhum. Ele: “Não, é você!” “Mas você é jornalista.” “Não, não,
você é que vai escrever com o coração!” Mas foi esperado por Deus, menina! Aí eu escrevi uma carta.
Hoje eu leio e falo: “Meu Deus! Tão bonita! Não sei como que ela saiu!” Eu peguei um texto, mesmo, do Secretário de Educação da época,
esse que valida as palavras que ele usou e fui descrevendo. Resultado: a carta foi publicada, sabe quando?
No domingo! Quarta-feira me telefonaram de Belo Horizonte, o convênio foi assinado. Gente! Foi aquele sucesso! Tá vendo! Então as coisas
aconteciam como milagres, sabe?
Então isso aí, por isso eu quero,
gosto de contar isso, porque, quando a gente quer, de coração, sem objetivar lucro, sem botar empecilho, as coisas vão acontecendo. E assim aconteceu. Como é que eu ia fazer com o nome? Tinha que dar um nome, na escola, antes da APAE tinha que ter um nome, aí escolheram lá uma família, que eu nem conhecia, maior “chiquê” da cidade, toda elitizada e eu pus lá e chamei a família pra vêr. A escolinha tava num lugar feio, assim, meio do mato, uma coisa triste. Como é que essas
pessoas vão chegar aqui? Foi o dono, um senhor mais velho, a filha, a outra filha casada com um médico, foram lá, todos assim. Ah meu Deus! Olharam, falaram nada e voltaram. Ah, vão mandar tirar o nome! Eles não vão deixar, né, nessa simplicidade toda. Você acredita que ele me mandou chamar e falou: “Olha, eu vou doar esse terreno ao lado da minha casa, mais de mil e tantos metros e vou construir a sua escola.” Ah, não tô acreditando, gente! Isso é milagre de Deus e aconteceu e foi feito. Hoje ela já tem outros “ramo”, hoje ela é um grande polo educacional dentro da cidade de Caratinga que ajuda outras cidades. A semente foi bem plantada,
meninas. Só você vendo! Graças a Deus!
P/1 – Em qual ano a senhora ajudou? Ou criou a escola.
R– Em 1972
que eu comecei. Quantos anos tem isso, né? [Renata, a filha responde: “Vai fazer quarenta”]. Vai fazer quarenta anos, é? Mas aí, bom
e nesse período, agora, depois que isso aconteceu, é um tal de me homenagear, Claudia, que eu falei: “Meu Deus!” Eu fiz tudo com a intenção, nem sei por que, mas, ah, tem uma história que eu conto o por que do meu interesse.
Eu tive uma irmã especial e ela dava trabalho demais. Eu vi a minha mãe sofrer, não havia ninguém que soubesse qual a doença dela. Ela gritava a noite inteira, doente, gritando, acordava todo mundo, aquela coisa, a família sofria com aquela doença. Levava no médico, o médico olhava, não sabia nada
o que era aquilo. Depois com meus estudos, minha experiência, aí eu fiquei sabendo que ela tinha Síndrome de Rett, sabe?
Dava muito trabalho e aí eu escutava muito minha mãe falar: “Meu Deus! Ninguém me ajuda, ninguém faz nada!” Ela levava em curandeiros, pedia para o meu pai para levar em tudo o que achava de milagre. Difícil locomover, ela era uma pessoa difícil. Eles iam nessa busca, né, mas: nada! Depois, no fim, meus pais morreram, ela terminou a vida comigo. Ela tinha preferência pela minha pessoa, já era uma determinação de Deus, para que eu fizesse algo pelos outros. Era impossível eu deixar outras pessoas sofrerem aquilo que eu via dentro do mundo mais moderno que já saía das divulgações como faz. E eu fui em busca. Muitos cursos, São Paulo, Rio, Belo Horizonte, vira daqui, dali, cada um ia pra um lado, mandava uma professora e assim nós fomos especializando e desenvolvendo o nosso trabalho, que hoje tem muita gente, hoje é outra coisa, mas tudo há uma missão, eu sempre escrevo
e falo que basta a gente saber e compreender os sinais que vêm pra gente, quando a gente tá atenta. Por que é que eu me preocupava tanto com ela? Por que ela tinha tantos irmãos e só ficava comigo? Em volta, nas refeições na fazenda, aquela mesa grande, ela ficava atrás da minha cadeira. Ela não ficava atrás da outra irmã. Ela não ficava atrás dos irmãos. Ela ficava atrás da minha cadeira. Toda a vida houve uma preferência e isso era muito, já era uma determinação pra mim. Eu tenho
afinidade, onde eu estiver,
se tiver uma pessoa especial, ele fica do meu lado. Se vou numa festa e tiver alguém, pode saber que ele vai sentar do meu lado. Eu já sei! Então é isso.
A gente tem as determinações na vida. Muito bom, a gente procurar, vocês que são novas, ficar ligadas, a antena ligada. Para que eu vou fazer isso? Pra que que eu vou fazer? Vou ajudar a quem? Então isso é muito importante, tá meninas? Vocês são novas. Bem...
P/1 – E?
R– Continua? Ou você?
P/1 – Vamos só voltar um pouquinho. A senhora conheceu seu marido como?
R– Ah, ele tinha farmácia. Eu saia do colégio, menina, e ia passear na frente da farmácia prá lá, prá cá. De vez em quando inventava uma mentirinha, né? Naquele tempo o namoro era escondido. Eu ia lá e falava assim: “Eu tô com a garganta doendo tem um Fimatosan?”. Aquele remédio mais bobo do mundo! Aí, então tá, aí dava, aquilo era jeito de conversar. Depois, naquele tempo, não podia namorar, era tudo escondido e meu pai ficou sabendo e foi conversar com ele, fez ele conversar e conversou com ele e falou: “Qual o seu interesse com a minha filha?” “ Ah, eu quero me casar com ela.” Aí foi aquele susto! Ficamos noivos, não podia pegar na mão, não podia ficar perto. Na frente, né? Aí depois, casamos, ele era, assim, um mineiro muito tradicional como eu falei, mas era uma pessoa boa, muito trabalhador. E valeu. Agora ele nunca permitia, era sempre as coisas difíceis. Eu passei num concurso para professora, ele não deixou. Ele falou: “Não! Minha mulher não precisa trabalhar! Ela tem filhos para cuidar!” Mas os filhos cresceram, tem uma moça que trabalha aqui em casa. “Não você vai ficar em casa. Você quer bater perna, né?” Aquela história antiga e aí eu não trabalhei no Estado, aí fui procurar outro caminho, fui dar aula particular em casa e criando esse ambiente próprio das crianças especiais que fez essa história toda que eu acabei de contar. Os caminhos às vezes negam algo, mas abre outro meninas, sabe? Então isso que a gente tem que ficar atento. “Xi, Meu Deus, mas eu perdi esse emprego?” Mas daqui a pouco aparece outro. Sabe? A gente tem que ter. Eu gosto de contar história, pra animar vocês que são jovens. Sabe? Tem que ter atenção. Tem a historinha do Paulo Coelho que é inesquecível, né? Aquele primeiro livro dele, o Alquimista, ele fala: “Veja os sinais, todo mundo tem um script e eles estão aí.`` É difícil a gente descobrir. Aí fiquei lá em Caratinga, lá os filhos já cresceram e tal. Começaram a abrir o mundo, foram fazer vestibular em outra cidade.
Uma delas passou no vestibular em Vitória e começou a ir pra Vitória, aí outra quis ir
e outra quis ir, aí eu também quis ir.
A escola já estava muito bem organizada, já tinha muita gente que sabia, uma equipe muito preparada. Eu falei: “Já tá na hora de eu deixar!”
Não havia mais motivo para ficar ali na cidade, todos, né?
Os meus pais já tinham falecido, então eu fui pra Vitória no Espírito Santo. Outra aventura, menina! Uma cidade diferente, tal. Bom, eu tenho que fazer alguma coisa, não vou ficar aqui a toa. Os meninos estão grandes, aí procurei um caminho, achei um médico que tava com vontade de abrir uma clínica que não tinha em Vitória. Eu abri muitos caminhos, menina! Ai eu ele ficou conhecendo. Vamos
reunir uma equipe e abrir uma clínica. Ele era fisiatra, havia uma fonoaudióloga lá do Espírito Santo, havia uma psicóloga do Rio de Janeira, havia uma fisioterapeuta de Petrópolis e eu pedagoga. Nessa época eu não tinha feito minha pós-graduação. Fiz no Espírito Santo, depois eu fiz pós graduação em educação especial que eu fiquei psicopedagoga clínica, é a minha profissão, né? E aí,
reunimos, começamos o nosso trabalho ali, ele “plagiava” uma clínica do Rio de Janeiro, esse médico. A gente estudava e atendia e cada um, ali, meio perdido, mas fizemos. Foi uma coisa muito interessante, não havia outra. A nossa foi pioneira. Mas aconteceu um fato: o médico foi fazer um curso de psicologia no Rio de Janeiro, um curso que eu acho que nem usa mais. Um curso forte que ele veio de lá todo desorientado, não quis mais trabalhar. Ele era casado com uma médica, uma pediatra e ele chegou lá na clínica. Ele andava com a roupa direitinho de médico, tal, jaleco. Chegou ele lá de camiseta, sandália de dedo. “Oh doutor, tá cheio de gente esperando.” “Eu não “tô” na minha, eu não quero trabalhar hoje!” Resultado: mudou todo o estilo, ficou descompensado completamente.. Aí, a esposa dele, falou: “Não espera! Ah, não quero, não tenho competência, não.”
Ai não peguei, não, mas fui acompanhei, outro médico pegou e acompanhou. Devido a nossa experiência, conhecendo bastante o trabalho, depois resolvemos abrir o nosso espaço, eu e o pai de uma criança especial. Esse pai tinha posses, o terreno era dele e ele construiu uma clínica pra nós. Um negócio muito bonito, muito arborizado, um espaço físico bonito e eu era a terapeuta e arranjamos a equipe toda outra vez. Aí, nesse período, eu atendia adultos e crianças, a predominância era criança, aí sabe, quantas, eu resolvi fazer uma ousadia. Como o espaço era muito grande e bonito, como nós trabalhávamos para estimular essas crianças que tinham limitações, eu falei: “Então nós vamos estimular essas crianças normais e eles vão ficar ótimo.” Aí reunimos
umas 15 crianças normais,
crianças de menos de 5 anos e os pais aceitaram a proposta, por causa do lugar muito bonito, muito arrumado, chamado Espaço Aberto. Por que, Espaço Aberto? Os muros eram todos vazados, dava pra enxergar um pouquinho lá dentro, pra desmistificar aquela coisa de escola de especial que era toda fechada, escondida, não! A gente abriu. O nome é Espaço Aberto. Bom, aí eu coloquei as crianças ali. Eles não ficavam na mesma sala, mas nos pátios, nas festas, na piscina, ficavam tudo junto. Então essas crianças foram estimuladas, a mente delas. Como eu tinha técnicas para estimular as crianças com problema, eu usei a mesma técnica para elas. Elas tinham aula de inglês, aula de música e a metodologia era toda solta. Então as crianças a gente ensinava,
fazia aquelas rodinhas no meio da grama, pra ler seus livrinhos e a gente ali junto e estimulava muito tudo o que eles quisessem.
A gente não, não havia esse negócio: “Não vai, não! Você não sabe! Você não pode!” Isso aí não se usava. A gente permitia, mas monitorava, “Pode” ir.”
Mas você fica do lado. Elas subiam lá nos brinquedos, subiam em tudo e a gente tá ali do lado, então era uma maneira.
Os cartazes eram todos baixinhos, em vez de colocar lá em cima, igual as escolas colocam para criança não estragar. Na minha tinha que ficar embaixo. Eles escreviam nos cartazes, tudo era permitido. Era uma maneira diferente. Então essas crianças, inclusive meu neto. Agora vou esnobar, ele já tá adulto, né? É cirurgião plástico em São Paulo, na USP, eu falo com ele: “Tá vendo, foi aluno da vovó, o que
que virou.” Então dessa turma tem 4 ou 5 [ Renata fala: “Tem mais.” ] de médicos. Não que o médico seja melhor, mas é mais difícil você entrar numa faculdade e eles conseguiram devido essa liberdade, essa coisa solta, de aprender a questionar com coragem.
Então eu acho que
isso aí,
foi um trabalho magnífico! Pena que não perdurou. Tem coisa que é difícil às vezes. Não havia professores que entendiam dessa metodologia e a gente tinha um pouco de dificuldade. Mas valeu a pena e eu tenho tudo registrado, e eu tenho a oportunidade de passar ainda pra quem quer ouvir essa metodologia por que eu acho que ela vale. Isso aí, não é coisa empírica,
tudo
eu tirei de autores. Essa metodologia é de um americano da
Filadélfia, chamado Green Domma. Ele vinha para o Rio de Janeiro todo ano, dava aula pra gente. Nós aprendíamos e íamos passando, sabe? Era um trabalho muito importante, então, com isso a gente foi estudando e aí a gente fez o, foi um
trabalho... Essas crianças, hoje adultos,
mesmo os especiais, a gente encontra. Teve muito autista e nós trabalhamos dentro daquilo que a gente podia na época, sabe? Mas era difícil! Tinham dificuldades.
Era cada caso tão complexo, sabe?
Tinha casos graves, mas parece que a gente vai sendo ajudado quando a gente quer, e estudava, aí a gente já tinha bastante estudo, eu tinha pessoas cultas que vinham ajudar, né? Aí depois o que aconteceu?
Fiquei idosa, né? Falei, agora... Senti que as coisas, tudo tem um tempo. Até isso é bom a gente perceber. Tudo tem um tempo para acabar e já senti que as coisas já não “tava” caminhando, “tava” amarrada e falei: “Ah, Deus, meu tempo aqui acabou!” Aí a minha sócia quis pegar. "Então você fica,
eu vou sair”. E saí. A família temerosa achou que eu ia sofrer, aqueles meus hábitos, né? Eu falei: “Não!” Aí aparece sempre um chamado e me chamaram pra trabalhar em outra clínica com a fisioterapeuta que tinha sido a minha funcionária. Como sabia que eu estava aposentada dali, me chamou e nós começamos a trabalhar. Mas, depois estava muito complicado o trabalho porque eu já
estava mais velha e os casos muito graves de idosos também, e meus filhos acharam que: “Mãe... pega outra coisa, isso aí tá muito pesado pra você.”. Assim, em termos emocionais, sabe, Aí o que eu fiz? Parei e nisso me aparece outro chamado.
A Universidade Federal do Espírito Santo me chamou para eu dar aula. Tinha um médico que dava aula de cognitivo “pra” pessoas, para idosas e me chamaram para eu substituir esse médico que ia sair. Eu falei: “Ora! Eu vou.” Cheguei lá e hoje, já tem mais de dez anos [“Vinte e dois anos.” alguém fala] que eu dou aula nesse núcleo lá da Universidade, por que toda universidade pública, né,
federal, ela tem que ter um núcleo para atender idosos e ela tem, se chama Unapi [Universidade Aberta à Pessoa Idosa] então ali, eu já tenho o meu período. Quando entrou essa mudança tecnológica, da informática, eu fiquei meio perdida: “Ah, Meu Deus, e agora?.” Mas sempre aparece um jeito, ai,
minha filha Renata que vocês viram aqui, ficou caminhando junto comigo e agora com as aulas online eu preparo e ela ajuda a digitar e mandar
e me ajuda na hora. Então a gente continua dando aula desse jeito, tudo tem jeito quando
você quer e aí, o que acontece? Meu pensamento:
quando eu não aguentar mais dar aula, já tem ela preparada, mais do que preparada, por que ela já tem cursos enormes, para continuar esse trabalho, né? Então as portas vão se abrindo. Hoje eu
trabalho como voluntária, é um trabalho, eu não cobro mais nada.
Tem outro grupinho, esse é um grupinho que eu adoro! São simples, são empregadas domésticas que tiveram um AVC {Acidente Vascular Cerebral], umas sequelas assim,
então elas
vão... Isso é da prefeitura, elas vão pra lá para eu trabalhar. A gente canta, a gente conversa, a gente ensina, mas são delicadas. Trás tudo o que tem na casa delas.
Uma trás pra mim um bibelô, trás um pedaço de pudim, de qualquer coisa, a outra traz uma comidinha, uma batata, uma coisa. Eu acho que é uma delicadeza tão grande que o meu recebimento é muito mais do que se fosse dinheiro! Por essa gentileza, esse agrado, isso me satisfaz muito e me agrada, eu vou fazendo, tá meninas? Eu acho que a gente, eu gosto de contar meus casos para dizer que a gente tem que ser exemplo para os outros, não desistir. Eu não paro de trabalhar por que eu acho, eu também faço minha ginástica todos os dias. Eu criei uma ginástica baseada nos trabalhos que eu fiz para as crianças e eu faço para adultos, pra poder trabalhar os neurônios e aí eu ensino pra elas, faço também pra mostrar que é possível envelhecer bem, com saúde e com alegria, sem ser essa coisa de estar excluída, tá fora do mundo. Isso, não!
A como a gente tá sempre aqui, junto. Agora eu vou contar só um casinho extra. Tem 6 anos, hoje, esse ano, né Renata. É hoje, né? É hoje! Que nós recebemos. Minha filha escreveu a minha vida.
Um texto pequeno para um concurso do Bradesco [Banco Brasileiro de Desconto], em São Paulo. Ela ganhou e eles mandaram a minha passagem para Vitória, mandaram para a minha filha, lá em João Pessoa.
Fomos para São Paulo e ela ganhou em primeiro lugar da história e foi tão lindo! Nós assistimos, foi um congresso de terceira idade, né?
Teve várias apresentações, super interessante, uma coisa que valeu muito, nos gratificou muito de ter visto isso. Agora tem que contar também as partes alegres, né meninas? E os passeios? Quando
eu era mais jovem, meus filhos pequenos, eu fazia uma excursão na Ilha de Bananal. Eu e o marido e uma equipe de parentes dele. Nós íamos lá e ficávamos quase um mês na Ilha do Bananal, no Rio Araguaia, em volta ali, pescando, conversando, brincando. Era uma coisa linda, era um relaxamento
maravilhoso. Uma coisa assim... Tem gente que fala: “Não, no meio do mato, não!” Não era agradabilíssimo, era muito bom! Era o passeio que nós fazíamos. Fiz algumas vezes com ele junto e foi muito bom, e depois quando eu fiz sessenta anos eu tive a vaidade de me presentear.
Vendi meu carro, juntei mais um dinheirinho, e fui para a Índia e fiquei dois meses rodando ali. Fui pro centro, fui pra Délhi, depois do centro, depois fui para o norte da Índia, Rishikesh, onde os Beatles estiveram, depois fui pra Nepal e de lá tive em Londres em uma semana, tive em Amsterdã.
Foi um passeio geral, tive uma ideia muito boa, do que é, muitas coisas interessantes, um passeio muito diferente. Vi o Taj Mahal, aquela coisa maravilhosa, bonita, como é que eles conseguem! A Índia deveria ter sido um país muito rico, muito rico e muito criativo. Os palácios são lindíssimos, hoje tá pobre, né? Tudo muda, e aquele pessoal com aquela crença, naquelas religiões deles, entram no Ganges, toma aquele banho, mistura aquilo tudo e todo mundo e as mulheres vestem a mesma roupa. Os homens tiram aquelas tanguinhas e tudo tão sarado, tudo
tão bonito!
E a noite você ouve aquela música, assim longe no seu ouvido, aquilo perdura no nosso ouvido até hoje. O som, assim quando eu vejo um som assim... Muito interessante e depois o Nepal e aquelas, como é que chama Renata, aquelas geleiras? Do Himalaia. Todo pessoal subindo, escalando aquilo ali.
Foi muito interessante o passeio e valeu na minha vida guardar um pouquinho de coisas diferentes, depois não tive muito. Os meus passeios eram aqui por perto mesmo, né? Filha morando lá no Nordeste, a gente vai de vez em quando, a outra em São Paulo, também... e vão virando, a outra tá aqui perto, o filho, então e todos. Eu tive muita sorte na minha vida. Tenho
todos eles muito bem sucedidos. Meus filhos se misturaram com crianças especiais. Todos, iam à escola, conversavam, meus netos, todos são pessoas super fortes. Não teve esse medo, vai pegar, vai imitar, não teve nada disso! Aquilo era natural, sabe? E as crianças ficavam ali. Tudo e todas são fortes!
São pessoas corajosas, tanto os netos, agora estão chegando os bisnetos, tudo inteligente e bacana. Então, eu agradeço muito a Deus por ter uma vida muito gostosa.
Meus filhos são super queridos, sabe? Então, nada a reclamar da vida, filhinha, só as coisas que eu ganhei! Tanta homenagem! Mas a homenagem não me envaidece. Agradeço. O que manda, encorajar todos vocês e todas as pessoas que eu quero ouvir para poder imitar e ficar forte também, sabe, e pode, quando a gente vê falar como o nosso cérebro é capaz, toda a nossa história de vida e todo nosso estudo, por que a gente é assim, por que a gente vai perdendo, que que é? Eu estudo bastante, eu estudo, vivencio e prático e não é só falar não, tá menina? Cedinho, eu tenho muita sorte que eu moro em frente a praia, só atravessar ali, eu tô lá, fazendo a minha ginástica. E no fim de semana eu faço um esporte bem original, eu faço stand up.
Em cima daquela prancha. eu estou ali equilibrando, isso também trabalha o equilíbrio a coragem, que desafia, “Olha, eu consegui entrar, nem me molhei, pronto!”
Essas pequenas coisas, nós temos que fazer desafios na vida para a gente trabalhar nosso cérebro, nossa inteligência e preservar. Os médicos hoje estão batendo, estão falando muito sobre a questão de valorizar os idosos, como interdição. Ficou
velho, ficou bobinho, não sabe nada! Não, hoje eles estão sarados, tão sábios, aproveitando.
Mesmo que eu perca um pouco na informática, mas a história de vida, como você falou, a história de vida ajuda a outra pessoa também a ter coragem. Como é que ela conseguiu com essa idade? Eu já vou fazer noventa e nove anos, dia 12 de novembro, agora próximo, então, tô bem, faço tudo que os outros fazem, dirijo, e tal.
Fiquei meio isolada por causa da pandemia, mas também consegui vencer, tô aqui, sarada. É isso a minha vida, menina. O que vocês estão achando?
P/1 – Eu gostaria que a senhora falasse um pouquinho mais dessas sensações durante a pandemia. Como a senhora lidou com esse momento?
R - É eu fiquei, a princípio assustada, porque quando saiu a primeira onda
assim que a doença era para matar velho e os filhos começaram a super proteção. “Oh mãe não sai.” O neto telefonava de São Paulo; “Vovó, não
sai! Não fica com empregada em casa não!
Ela vai trazer bactéria.”
Aí aquilo me inibiu um pouquinho, depois devagarinho comecei a andar embaixo aqui no meu prédio, depois contratei um personal trainer cedinho, quando não tinha ninguém pra me dar uma aula, pra eu não perder meus movimentos, depois devagarinho, aí veio a vacina e eu fui... eu uso muito. Achei que a internet valeu muito nessa comunicação devido a gente ficar mais à toa. Também tive oportunidade de ler muitos livros, estudar com muito mais detalhe e eu fiquei mais calma, diminuiu um pouco os meus trabalhos então com isso eu tive tempo de ler bastante e preparar as minhas aulas. Eu faço palestra no You Tube. Lá você acha uma porção de coisas minhas. O que eu quero é ajudar. Hoje o meu objetivo é qual? Olha a
gente tem que ter um objetivo na vida, ensinar o que sabe. Usa as palavrinhas lindas do Cortella, ele fala: “Ensinar o que sabe, exercitar o que fala.”
Não é só falar e não fazer não, né? E questionar o que não sabe. Não sabe? Então você pergunta. Como é que é isso? Por que é isso? Por que hoje, cada termo que aparece, eu fico: “Meu Deus, o que é isso, nem terminei um, já
tem outro! Plataforma... Qual plataforma? O que é isso?”
E depois a gente vai sabendo, tem bastante dificuldade, a gente custa um pouco, mas tem que querer, tem que se esforçar, se não
quer ficar excluída.
Senão você fica a parte, minha filha.
O idoso fica parado no canto, lá, não compartilha, mas a gente compartilhando eles dão atenção, respondem, né? Então graças a Deus, a epidemia pra mim, triste muitas perdas, a gente via fulano, mas um amigo morreu, fulano, médico, amigo, aqui da cidade perto, Campinas, um moço novo, então isso aí. É lógico, a televisão é muito dramática, eu tenho evitado um pouco, mas tem coisas boas também. Agora, tenho oportunidade de ouvir muitas palestras no You Tube, então isso aí deu tempo. Eu acho que, apesar de tudo, na vida tem dois lados, um favorável e um desfavorável, a gente equilibra. Esse equilíbrio é o ponto principal da vida, né? Se eu ficar só, cair
na depressão eu vou morrer. Vou morrer mesmo. Eu sei que vou, estou perto, mas o que a gente vai fazer? A gente tem que ajudar quem pode. As vezes amiga minha tá tão tristinha.
Acabei de ver
uma que quebrou a perna agora ai eu falei: “Quer? Precisou de mim, me telefona. Vou lá, passo umas horinhas com você pra gente brincar um pouco.” Ah, tá! Então essa troca e não contar só com os filhos porque os filhos também tem suas atividades, seus deveres. Meu filho é médico: “Mãe, agora eu não posso atender, tô com um cliente aqui, tá?” E assim é isso. A gente tem essa busca de saber viver, não é fácil não, tá menina, mas a gente consegue, basta querer. Vocês que tão aí no trabalho, vocês devem saber muita história bonita dos outros. O trabalho de vocês é muito importante. Perdure isso, ajude no que vocês puderem, que as recompensas virão mais tarde, tá?
Que mais vocês querem aí?
Eu acho que falei bastante. Agora, essa, tô cheia de troféu ali, aqui atrás, para vocês verem. Não sei se tá dando para ver e aí se vocês quiserem depois publicar. Ah,
teve um que eu ganhei da maçonaria. Um troféu muito especial, porque a maçonaria me ajudou muito na escola e o troféu foi uma pá de pedreiro, um negócio muito simbólico pra eles. Ai eu não sei onde que ele tá, aí meus filhos: ‘Mamãe procura, mamãe, ele é importante!”
Tenho foto dele. Houve muitos momentos também agradáveis, de reconhecimento, sabe? Embora quando a gente faz as coisas, não pensa nisso, mas não deixa de ser agradável, os cumprimentos, os abraços.
Isso é muito bom! Graças a Deus! Espero que vocês também recebam todas essas alegrias. Tá meninas. E aí? Tem mais alguma coisa?
P/2 – Eu queria perguntar, na verdade, como você chegou no stand up paddle, que você falou que você faz todo o fim de semana. Como você começou?
R - Quando meu marido faleceu, sabe Sofia, eu estava meio tristinha e meu filho: “Mamãe, vamos ali na praia que eu vou. Nós vamos
fazer um esporte diferente”.
Aí eu subi na prancha tal e fui e o professor lá do esporte: “ Nossa! Ela tem jeito." Eu achei que realmente é bem desafiador, sabe, mas cria um prazer na gente por que, você consegue! "Olha, andei e nem me molhei!” Ali, fiquei em pé esse tempo todo! É lógico que eu escolho o dia que não tem muito vento, não tem onda onde eu faço, porque as ondas balançam muito a prancha. Eu ainda não tenho esse domínio.
Mas também, quando tem o vento, como outro dia, também não pude, têm tudo isso. Mas de qualquer maneira eu ainda consegui semana passada, e fiz uma hora. As vezes meu filho vem… “Ai mãe vamos fazer junto!” Ele vai mais longe, que eu confio, tá, mas qualquer coisa, apesar se eu cair eu sei subir, ele treinou comigo.
Esbarrou a prancha dele em mim. “Ô meu filho, você me derrubou!” “Não mãe! Tô fazendo você treinar!” “Seu porcaria! Tá abusando da mamãe!” Mas, eles são muito gentis comigo, meus filhos, sabe? Graças a Deus! Minha filha, que
mora em Ubatuba, sempre telefona;”Mãe vê essa reportagem.”
Ela que deu o meu mail para vocês, a Fabíola. Então ela:
“Mãe vê isso!” Cada uma manda uma coisa que viu para eu ler e passar para as amigas. Eu acho muito importante gente, essa parte cognitiva que eu trabalho, por que o esporte é uma coisa externa, todo mundo tá vendo, precisa, mas o cognitivo a gente escuta a pessoa falar assim: “Eu, estudar com essa idade? Deus me livre, não quero nada, já sei chega!” Não sabe a importância que é.
Nosso cérebro atrofia se ele não tiver um desafio toda hora. Como é que isso aí, essa palavra nova, nós vamos perdendo nossas habilidades. Aí, depois você fica doente, o Alzheimer tem muito. Os médicos, os neurologistas dizem: “É uma doença evitável”, se você pensar nisso desde de nova, igual vocês estão cuidando, não vão ter! Agora se você ficou mais velha, aposentou, ficou lá no sofá o dia inteiro, vendo aquela televisão e cochilando, você sabe que você vai ter Alzheimer. O teu corpo vai indo e ele cansa, então a gente tem que saber. Agora é muito importante saber por que é que a gente deve fazer o exercício e é isso que eu tenho passado nas minhas lives. Mando pra eles, meus escritos, eu mando para o pessoal, tem que fazer, porque o ser humano foi feito pra mexer e não pode ficar parado. Parado mexe com as mãos, com os pés, com o corpo, com a cabeça, com tudo. Sabe? Então. A gente tem que
fazer e todas as partes do nosso corpo tem meios para
estimular. Então, isso é conselho, hein? Meninas!
P/1 – E conta um pouquinho pra gente qual é o objeto das palestras que
a senhora dá. A senhora falou que tem palestras no Youtube, oficinas.
R - Lays Lugão, nós fizemos, a Renata e eu, fizemos,
acho que tem um ano, né Renata? [Renata, a filha, fala: “Tem dois anos”]
a gente fez em Poços de Caldas, nove palestras, para uma turma grande, mais de duzentas pessoas assistindo. Eu passo a minha experiência, sabe? O que eu sou, o que é, é bem prática, tem embasamento teórico. [ Renata, a filha fala: “Para um grupo de idosos, né, mãe?”]. Esse congresso de idosos é muito bem organizado, ele tem palestrantes, a noite tem bailes gostosos para alegrar, tem caminhada de dia. São lugares, assim, interessantes que a gente vai e eles me convidam para fazer palestra. Vou fazer em Águas de Lindóia, em 9 de março, acho que é mais ou menos. Aí eu passo a minha experiência pra elas e eu sempre falo: “Quem entende de velho é velho, quem entende de idoso é idoso!” Então a
gente sabe o que a gente sente, por mais que vocês sabem, vai ler em um livro, vai ler, teoricamente,
não sente.
A gente sente, então a gente passa aquilo com toda a coragem para as pessoas e no You Tube, tem Lays Lugão, tem várias. Essa que eu falo, a última, como é que foi Renata aquela que do “conhecer para...? [“Envelhecer consciente", a pessoa do lado fala]. Não… envelhecer consciente é uma, mas tem a outra: vencer pra, daqui a pouco eu lembro o nome dela e eu falo. Então tem, vocês acham, lá. Tem também um movimento que está muito em moda agora, não sei se vocês já ouviram #STOPEDADISMO (Movimento contra o idadismo) é um movimento que está vindo lá de Portugal, da Espanha, da Itália, aqui no Brasil, pessoal se organizando para justamente valorizar a pessoa idosa, tirar aquele mito que velho não vale nada, velho vai morrer pra que vai gastar então, ele é doente... não! Ele pode ter uma doença
como você pode ter, mas você não vai morrer de velho, ninguém morre de velho, morre de um problema de coração, então estão combatendo essas coisas, eu faço parte desse blog, que faço isso, falo sobre isso pra ajudar as pessoas também, têm várias palestras então para poder combater e ajudar as pessoas. Isso é bem interessante, a gente aprender isso, ensinar, pra pessoas também quebrar, por que era assim, coisa antiga, né e a ciência avança. A ciência avançou tanto que hoje a gente tá vivendo cem anos, fácil, tá a toa, tá conseguindo muita gente. Agora o que a gente quer ser? Viver cem, noventa anos, mas com lucidez, independência, com autonomia.
Não adianta você viver lá em cima da cama. Minha tia está vivendo a não sei quantos anos em cima da cama, dando trabalho, dando confusão. A gente está ajudando a ter esse desenvolvimento pra enquanto puder. Lógico, um dia vou ficar doente, um dia eu vou morrer mesmo, mas quanto mais a gente puder evitar sintomas de velhice melhor.
Vão aparecer e a gente vai combater. É uma auto avaliação, Claudia. Você pensa assim: antigamente eu encostava a mão no meu pé, hoje não estou conseguindo, aí você começa a fazer o exercício no primeiro, no segundo dia, daqui um dia você está igual, o corpo obedece, não tem idade, tem é persistência e trabalho, sabe? Então a pessoa se acomoda:
"Ah, eu sou assim porque sou velha.” Não, não é não, você é assim, por que você quer ficar. Tá, você quer ficar velha, então você fica, por que eu não quero! Então é isso aí que a gente tem que combater e vocês que estão na mídia, podem ajudar. Precisar fazer uma palestra a gente faz para mostrar pra vocês, para quem quiser, tá? Por que vale para quem estuda, a vantagem é que eu conto a verdade, eu estou aqui, sabe?
Em pé, todos os dias eu estou lá na praia fazendo ginástica, às 7 horas da manhã você me encontra lá, quando ou então no mar. Agora a gente não está fazendo o mar, porque no mar agora é difícil eu usar a máscara. Então parou, mas aí eu faço sozinha, com grupos menores e tal, mas a quadra a gente faz direitinho, tudo distante, tudo com máscara, direitinho, cada um cuidando da outra sempre, a professora, excelente, ali a gente faz muito bem, isso é ótimo! É isso meninas, mas e aí o que mais?
P/1 – A senhora disse que leu bastante durante a pandemia. O que a senhora gosta mais de ler?
R - Eu leio livros específicos de envelhecimento, muito técnico, pouca coisa, e quando eu saio um pouquinho eu vou lá para o lado da psicologia. Vivo pra lá e pra cá, eu meu trabalho é todo da parte humana, desenvolvimento do cérebro, aprendizagem, sabe então, eu acho que isso aí é muito importante e quando a gente envelhece a gente começa a ter sintomas também da.... a gente vai perdendo a parte, isso ai, é meio complicado, mas eu vou falar . A parte ontogenética que é humana, a gente vai entrando na filogênese que é parte dos animais. É muito feio falar isso, mas é verdade. Você vai tendo dificuldade nos dedos da mão, vai ficando duro, envelhecido, dedos do pé, um vai subindo sobre o outro, tanto sabe disso que você começa a trabalhar, abre, faz toda hora ginástica, entendeu? Sabe que as suas costas vai envergando, vira levanta, ... fica ereta, sabe? Então é isso que a gente tem que fazer, combater essas tendências. O corpo vai melhorando enquanto ele segurar, daí quando adoecer mesmo, aí não adianta e pronto, a hora chegou, né, meninas?
Vocês estão muito lindinhas!
P/1 – E
quais seriam os sonhos da senhora para o futuro? Algum projeto que a senhora tem em mente?
R - Sim , meu projeto continua sendo esse: ensinar o que eu sei, cada vez mais, se possível da ginástica até a parte cognitiva, sabe? E explicando o por que sabe? Que a gente tem que passar para as amigas, o social também, é muito importante sabe, Claudia? Passar o filme que está passando, discutir, agora a gente está mais distante, mas tem muito filme bom para
ver.” Ah, vi esse filme, ah o que você achou dele? Isso vamos ver, um ponto que você não entende. Tem ponto que a gente não entende nada. É por que? Um filme enjoado, umas mães tratam mal os filhos. Laís aquilo era mais uma instância de veraneio, de gente rica e essas senhoras coitadas, pobres, aproveitavam estes momentos para poder ganhar dinheiro, então soltava filhos ali, então os filhos aprontavam.” Aí ela falou assim: “Você não percebeu a diferença de um meio rico e social e a pobreza que era ali, por isso acontecia aquilo tudo?”
Ah, não tinha percebido isso não. Quer dizer, ela apontou a importância daquele filme e eu estava vendo somente aquilo direto, ali na minha frente, então às vezes a necessidade, né? Igual o Coringa, foi tão debatido, então a gente precisa ajudar as pessoas e também se ajudar. Muitas vezes também preciso de uma fala do outro. Ajuda muito, o convívio social. Até fofoca, gente, faz bem. A gente conversar com o outro, trocar né? Tem um grupinho que eu tomo banho de mar com eles, são simples, de empregada doméstica, mas dá cada receita de cozinha que vale! Eu sempre falo: “Oh, meu Deus, aprendi muito hoje!” Pronto, a gente tira proveito daquilo que tá ali para oferecer, isso é a vida, né! Vai trocando, né? Agora, sozinha a gente não dá conta, não! O isolamento é muito perigoso. Saia da solidão, vai para a multidão. Tá, aprenda essa! Então. Aprender para florescer. Você aprende e você então vai executar por que você viu aquilo, né?
Então tá? Tá valendo? A minha vida valeu alguma coisa?
P/1 – A senhora gostaria de acrescentar alguma coisa? Marcante na sua história de vida.
R – Eu quero acrescentar o seguinte. Estimular a escrever história. Cada um escrever sua história. É altamente estimulante, quando eu comecei a escrever a minha história que eu tive a oportunidade, agora na pandemia eu achei muito gostoso, lembrar aquilo tudo. Além de trabalhar, o ato de escrever também te estimula. Comecei a digitar, eu digitava mal, agora o que que eu vou fazer com isso? Eu não sei, mas foi muito bom. E houve também uma realização pessoal:
“Eu fiz isso tudo, mas como é que consegui isso?” E a gente vai descobrindo coisas que não sabia da própria pessoa. Eu descobri minhas falhas na escola, colocava uma força, foi quando eu descobri que eu sou disléxica, com oitenta anos! Mas depois eu li que a inteligência fica preservada, a criatividade também. Ah, por isso é que eu sou criativa, invento cada dia uma coisa. Então vale, sabe? Eu fiz tanto curso de dislexia, eu via no outro e não via em mim. Olha que coisa, né? Como é necessário a gente parar e pensar na própria pessoa? Terapia eu acho muito importante, também. Psicóloga, hoje, são válidas pra gente, né muito importante. Então tá meninas.
[Renata a filha fala: “Conta sobre seus hobbies também de desenhar?”]
R – Ah, é verdade, meus desenhos, eu faço uns labirintos e depois eu faço uns risquinhos e minha habilidade manual e as vezes fica bonito. Vou mostrar para vocês, mostra ai, Renata. Essa é a mandala? Aí, meninas? Tá vendo?
P/1 – Bem legal!
R : Olha lá, os detalhes, os tracinhos, né? Isso aqui...
P/1 – Lindo!
P/1 – O que desperta na senhora esses desenhos?
R – Muita criatividade, qual caneta você vai por ali para combinar e também o ato de escrever e riscar você vai ficar com a mão bem firme, porque se não você faz uma linha retinha e na minha idade é comum uma pessoa tremer né? Então eu consigo? Nem eu, até
quando falo com as minhas alunas que querem fazer, não pensam na beleza, não. Pensa no ato de fazer. Eu às vezes pego um para fazer e a minha filha: “Para mamãe chega!” “Então tá, deixa eu acabar aqui, depois eu levanto.” É terapêutico, é agradável, então isso
faz bem pra gente. Tem que procurar um hobby. Eu faço tricot também, eu gosto e tenho o computador também. Computador as vezes eu fuço um pouquinho, mas eu tô nele. Às vezes eu pego uma série de filmes que
atrapalha muito, mas também é importante, então, tudo um pouquinho, nada igual. Todo dia, do mesmo jeito, não dá certo, nosso cérebro reclama, ele quer novidade, então um dia o risquinho, um dia é o computador, um dia é conversar. A vida tem que ser variável, senão nosso cérebro não resolve e quanto mais desafio, hoje vou passar nessa rua, eu nunca passei, mas a onde que vou sair? Esses desafios ajudam também o cotidiano.
É necessário só para ajudar as coisas na vida, mas para o cérebro, nada! E a televisão idem. Quando você olha pra televisão, sem prestar atenção, não adianta nada. Você tem que ter um recurso para ler, para saber o nome do artista e contar para sua amiga. Então, isso aí, já ajuda um pouco. Então tá meninas…
P/1 – Tá ótimo Lays. Quer acrescentar algo Sofia?
P/2 – Muito obrigada pela sua disponibilidade.
R – Eu agradeço, se vocês quiserem alguma foto, manda ou não precisa?
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