P1 – Bom dia, Roberto.
R – Bom dia.
P1 – Eu gostaria que você nos dissesse seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Roberto Oliveira de Lima, nasci em São Paulo, em 1º de abril de 1951.
P1 – Qual o nome dos seus pais?
R – Fausto Walter d...Continuar leitura
P1 – Bom dia, Roberto.
R – Bom dia.
P1 – Eu gostaria que você nos dissesse seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Roberto Oliveira de Lima, nasci em São Paulo, em 1º de abril de 1951.
P1 – Qual o nome dos seus pais?
R – Fausto Walter de Lima e Maria Emília Canto Oliveira de Lima.
P1 – Qual a origem da sua família?
R – Meu pai tem origem no interior de São Paulo, nasceu em Franca, filho de um advogado lá do interior. Veio para São Paulo muito cedo, com 12 anos. Se formou em Engenharia Química pela Poli e depois foi ser pesquisador na área de energia nuclear. Fez uma carreira acadêmica muito bonita. Minha mãe criava os filhos enquanto meu pai podia trabalhar. Ela fez a escola de Pedagogia, mas realmente nunca trabalhou.
P1 – Nunca exerceu. Como que era, você nasceu em São Paulo e morou em São Paulo?
R – A vida toda. Morei um tempo na França, por dois anos, no começo dos anos 1980.
P1 – Na sua infância como que era a rua e o bairro onde você morava?
R – Era um bairro novo, eu morava no Sumaré. E quando meu pai construiu a casa, ainda era uma rua sem asfalto, o que hoje é pouco comum em São Paulo. Mas então, eu tive o privilégio de ter as brincadeiras de rua ainda, de empinar papagaio, jogar futebol no campinho, de ver a rua ser asfaltada e aí criar a oportunidade de andar de carrinho de rolimã. Estudava em escolas próximas e às vezes não tão próximas. Estudei no Colégio Batista Brasileiro que ficava nas Perdizes. Às vezes ia de ônibus e às vezes 40 minutos a pé, o que eu gostava muito de fazer de manhã. Foi uma infância muito agradável. Eu frequentava dois clubes: o Palmeiras e o Pinheiros. Joguei basquete, nadei um pouco e acho que me diverti muito na minha infância.
P1 – Fala um pouquinho das escolas que você frequentou.
R – Olha, eu comecei no Externato Nossa Senhora de Lourdes, que era um colégio de classe alta nos Jardins, na Rua Bela Cintra. Isso logo nos primeiros anos do ensino primário. Mais tarde, talvez mais próximo da revolução de 1964, meu pai, que era professor da Universidade de São Paulo, perdeu uma série de privilégios. Professor até aquele momento era uma coisa, ganhava bem, não pagava imposto de renda, viajava o tempo todo, tinha acesso a tudo... E as coisas mudaram, a profissão de professor perdeu muito do seu encanto, do seu atrativo. E nós saímos daquele colégio e fomos para um colégio próximo de casa, que era um colégio público, na Avenida Doutor Arnaldo, ligado à Igreja Nossa Senhora de Fátima. Isso era muito interessante, porque nós tínhamos muita proximidade com os padres e o que era também uma fonte de cultura para a gente. E depois de lá, quando terminei o primário, fui para o Colégio Batista Brasileiro, onde eu fiquei até a terceira série do ginásio. E depois do Batista Brasileiro eu fui para o Colégio Paes Leme, onde terminei o ginásio e fiz o colegial. Acho que aí acabou minha infância.
P1 – Tem alguma lembrança marcante dessa fase, dessa época?
R – Não, acho que são todas marcantes. Cada uma dessas fases... Por exemplo, minha saída do Batista Brasileiro foi porque eu repeti de ano, foi um ano de muita vagabundagem. E aquilo me marcou muito. Acho que foi talvez a primeira vez que alguma coisa não deu certo para mim. E quando eu fui pro Paes Leme, eu falei: “isso não acontece mais”. E dali para frente eu era o primeiro aluno da classe todo ano, e quando entrei na Getúlio Vargas, entrei em nono lugar. Acho que realmente aquilo foi marcante. De resto, o convívio com os amigos, a liberdade que a gente tinha e hoje tem mais sentido ainda, quando eu percebo da dificuldade que jovens e adolescentes têm de aproveitar aquilo que nós aproveitamos, que eram as brincadeiras de rua, poder andar livremente numa cidade que naquele momento não tinha problemas de segurança. Então, me sinto um privilegiado.
P1 – Você acredita que os seus estudos, nessa fase, influenciaram alguma decisão na sua escolha profissional?
R – Não. Acho que de certa forma os estudos me prepararam para depois ter várias alternativas profissionais. Eu, quando terminei o colegial e decidi fazer Administração, foi uma coisa assim não foi muito pensada. Foi uma coisa natural, que eu gostava, me interessava por aquilo. Mas não acho que o estudo que eu fiz na época de primário e colégio tenham influenciado diretamente. Acho que era mais uma vontade própria de querer ir para essa área de Administração. Eu fiz os quatro primeiros anos de Administração Pública e eu tinha vontade muito grande de trabalhar na área pública. Tinha um tio que tinha sido Ministro do Tribunal de Contas, foi Secretário de Educação, trabalhou em empresas públicas, como Centrais Elétricas de São Paulo. Meu pai, como professor e pesquisador na Universidade de São Paulo, esteve sempre na área pública. Então, eu tinha uma atração por aquilo e meus primeiros estágios na Getúlio Vargas foram em áreas públicas, o que me causou um certo desencanto. Eu tinha uma dificuldade de me adaptar àquilo. E comecei a sentir a necessidade de ir para a iniciativa privada, onde existia muito mais uma preocupação com eficiência, com lucro, com tudo isso. Gostava muito da área de pesquisa operacional. E pesquisa operacional, a essência daquilo, é a otimização das coisas, portanto dos recursos ou da busca por uma melhoria. Então eu achei que não era na administração pública que eu poderia me desenvolver e talvez dar minha melhor contribuição. O que eu percebo é que depois de praticamente 32 anos de carreira, acho que eu fiz uma boa escolha. Me arrependo de, não me arrependo de nada, na verdade eu sinto não ter podido contribuir mais na área pública. Mas a minha carreira ainda não está acabada. Quem sabe? Mas acho que contribui muito naquilo que eu fiz, por onde eu passei. Eu entrei numa empresa, a Accor em 1982, depois de ter dois anos de França, ter trabalhado na Rhodia, na Saint Laurent, que eram grandes empresas já estruturadas. E quando eu fui para Accor era uma empresa começando, com 150 funcionários, 70 milhões de faturamento. E eu encontrei um presidente daquela empresa que era um sonhador, uma pessoa extremamente ativa, inteligente. E tinha um sonho muito grande: construir uma grande empresa. 17 anos depois, quando eu saí de lá, nós tínhamos um grupo com 18 mil funcionários, com dois bilhões de reais de faturamento, com 13 divisões, criando empregos para todo o Brasil. E isso através, com uma vontade de crescer. Compramos 21 empresas nesses 17 anos, todas elas aproveitando as pessoas que vinham dessas empresas. Então, eu acho que eu acabei criando de certa forma uma riqueza para pessoas, acionistas, com a minha colaboração. Depois sair de lá era muito difícil, né, porque aquilo eu fiz, uma parte muito forte. 17 anos não é qualquer coisa. E por ser uma empresa francesa e eu ter optado por estudar na França, quando muita gente ia para os Estados Unidos, uma coisa que talvez venha até pelo meu pai, que fez muitos trabalhos na França, eu tinha essa atração pela cultura francesa. Então, aquilo me dava muita satisfação de estar lá, né? E chegou uma hora em que eu achei que tinha cumprido a minha missão e tinha que dar espaço para outras pessoas, e vim então para o Grupo Credicard, a convite do Álvaro de Souza, a quem eu tinha conhecido num processo de aquisição de duas empresas do CitiBank. Quando eu estava na Accor, nós compramos duas empresas, uma aqui outra na Argentina que o Citi estava vendendo, começo dos anos 1990. E dez anos depois quando o Álvaro precisou de alguém para assumir a direção do Grupo Credicard, ele lembrou de mim, me chamou e acho que eu fiz uma excelente mudança. Fiz uma grande escolha. Trabalhar no Citi foi uma grande oportunidade. Uma organização que mesmo no período em que eu estive lá passou por grandes dificuldades com questões de ______ nos Estados Unidos, tudo isso. Mas que mostrou a força de uma organização quando ela é bem estruturada, quando ela valoriza as questões da qualidade dos recursos humanos que ela contrata, da formação e do treinamento, dos sistemas de controle. Então, realmente para mim foi aprendizado muito grande. Os bancos são um exemplo de eficiência, né? Acho que é a indústria que talvez mais tenha se desenvolvido a nível internacional. Quando você verifica o número de transações que são feitas por segundo no mundo todo, a movimentação de recursos que se faz, o nível de eficiência que essa indústria adquiriu é fantástico. Então eu gostei muito. E na experiência específica do Grupo Credicard, eu já tinha a experiência de ter trabalhado com três grupos acionistas, quando eu trabalhava na Accor. A Accor tinha a Brascan e o Grupo Espírito Santo como co-acionistas aqui no Brasil. E era um convívio interessante poder entender qual era o objetivo de cada um dentro da empresa. Quando eu vim aqui para o Grupo Credicard, eu acho que até tenha sido uma das razões pela qual o Álvaro me chamou, a Credicard tinha três acionistas: o Itaú, o Unibanco e o Citibank, que era o administrador. E poder trabalhar com esses três grupos também foi uma oportunidade muito forte. E vivi um momento mágico, né, no Grupo Credicard, um pouco posterior à criação da Redecard - que foi um sucesso muito grande - mas na minha gestão, a gente teve oportunidade de criar uma outra empresa, que foi a Orbital, que também superou todas as nossas expectativas em termos de desenvolvimento e crescimento. E três empresas que eu considero assim excelentes, não sou só eu que considero, o próprio mercado considera excelentes. Acho que eu estou falando demais, vou deixar você fazer mais perguntas, se não eu não paro.
P1 – Não, imagina. Antes até da gente continuar, eu quero muito ouvir essa história de Credicard, da Redecard, mas eu queria voltar um pouquinho, que você contasse para gente sobre a tua primeira experiência profissional e quando ela se deu. Porque você na verdade se formou em Administração de Empresas, quando você começou o seu trabalho, como começou a sua trajetória profissional e aonde?
R – Na verdade, me formei em Administração Pública e depois voltei para a Getúlio Vargas para fazer o Ceag, para então ter o currículo completo de empresas e depois fui para França para fazer uma complementação em finanças e planejamento estratégico. Acho que eu devo ter estudado aí, na soma, uns dez anos de curso superior.
P1 – Na França, em que ano você foi?
R – Eu fui em 1980 e voltei em 1981. Bom, filho de professor não tinha jeito. Eu tinha que valorizar o lado acadêmico e sempre gostei muito de estudar. Sempre gostei muito de estar no meio acadêmico. Então, eu tive uma formação que eu acho que foi muito boa, porque o curso de Administração Pública da Getúlio Vargas é um negócio fantástico. Ele tem algumas coisas que são mais fortes do que na área de empresas, como as áreas de sociologia, ciência política e tudo isso, que hoje são cada vez mais necessárias para qualquer um que queira administrar uma organização. Pelo papel social que as organizações têm é inevitável que você reflita sobre isso. Então, eu acho que em termos acadêmicos, eu fiz aquilo que queria fazer. Talvez até um dia eu volte, do outro lado da mesa, devolver um pouco daquilo que a escola me deu um dia. Minha carreira profissional, como começou? Eu brinquei com vocês dizendo que comecei vendendo propaganda. Eu tinha acabado de entrar na escola, de 1973, provavelmente isso é em 1971, primeiro ano de escola, onde eu queria não depender da mesada do meu pai e precisava gerar algum dinheirinho. Ao mesmo tempo não podia ter um emprego em tempo integral, porque tinha escola de manhã. Então eu fui fazer essas coisas de vender propaganda de jornal, depois surgiu um negócio que era uma campanha educativa de trânsito, que vendia uns folhetos. Então, eu saia batendo de bar, em cabeleireiro, em coisas desse tipo para vender esse negócio. Não posso dizer que tenha sido uma má experiência, porque tentar vender alguma coisa por mais difícil que seja é uma experiência que todo mundo tem que passar. Depois a coisa ficou um pouco mais formal, quando eu fui para Independence Credit para fazer vendas de fundos de investimentos, investimentos no mercado financeiro. Lá eu fiquei um ano, vendi aquilo para todos os membros da minha família, pros tios, pros primos, para todo mundo. Aprendi alguma coisa do mercado financeiro, aprendi que no trabalho você tem que chegar na hora, fazer sua agenda, se determinar a cumprir certos objetivos, que a coisa depende muito mais de você que dos outros. Quando chegou no terceiro ano da escola, eu tinha por obrigação de currículo de estar fazendo estágio. E como eu estava fazendo Administração Pública, eu queria área pública e fui para Centrais Elétricas de São Paulo. E lá, encontrei profissionais de primeira categoria. Era muito interessante ver, talvez por força da atividade – era uma atividade de produção e distribuição de energia elétrica – contava com muitos engenheiros, profissionais de muito boa formação. O que era interessante, é que eles vinham de várias origens: tinha gente do Rio de Janeiro, de Minas Gerais no serviço que eu trabalhava que era o serviço de _______ tarifados. E o meu orientador de estágio era um professor da Getúlio Vargas que gostava muito da área de pesquisa operacional, que era o que eu gostava. Então a gente acabou desenvolvendo alguns trabalhos muito interessantes ali. Fiquei um ano na Cesp, ainda como estagiário, quando surgiu oportunidade que a Burroughs -
chamava na época Burroughs, hoje é a Unisys, grande concorrente da IBM, fabricante de computadores - eles abriram oportunidade de um concurso para quem quisesse fazer um programa de trainee, por mais um ano. E é um negócio altamente concorrido, porque nós tínhamos aí 460 pessoas que concorriam a 14 vagas. E depois eles ofereciam 60 dias de treinamento durante o período de férias, o que para mim seria ótimo, porque poderia fazer aquele treinamento durante as férias todas, período integral e depois um ano de estágio. Quem me alertou sobre isso foi um professor da Getúlio Vargas também, o Gilberto de Araújo Guimarães, que era o Diretor de, ele trabalhava na Burroughs na época e estava saindo para ir pro Grupo Saint-Gobain. Eu acabei entrando na Burroughs, fiz um ano de estágio, aprendi. Ali eu ganhei uma profissão que foi na área de sistemas. E quando eu saí de lá o Gilberto, que tinha ido para Saint-Gobain me convidou para trabalhar com ele. Então, a Saint-Gobain tinha a Metalúrgica Barbará, a Brasilit e a Santa Marina. E ele contratou três pessoas que tinham passado por esse processo de estágio na Burroughs, duas, uma para cuidar da Barbará, um para cuidar da Santa Marina e um terceiro que já estava na Saint-Gobain para cuidar da Brasilit. Eu fui cuidar da Barbará, indústria metalúrgica. Então ali eu comecei a aprender, porque tinha que andar na fábrica, tinha que ir para Barra Mansa, passava lá de segunda a sexta. Tinha um sistema que estava começando a desenvolver de controle de almoxarifado, controle de produção e ali eu comecei na verdade minha carreira na área de sistemas. Fiquei lá por três anos, quando recebi um convite da Rhodia. E na área de sistema a questão da tecnologia usada era muito importante. E a IBM tinha uma participação de mercado muito maior que a Burroughs, portanto aprender IBM era uma necessidade para quem quisesse ficar nessa profissão. Fui para Rhodia, que era talvez um dos grandes empregadores naquela época, isso em 1977, a Rhodia era ______. E trabalhava em Santo André. Entrava no _____ às sete e vinte da manhã, tomava o trem às seis e meia na estação da Água Branca, descia na estação de Santo André, andava um pouquinho. Então eu fiquei lá, na área de processamento de dados por dois anos, quando me convidaram para fazer parte de um grupo de trabalho que ia fazer uma reestruturação da diretoria financeira da Rhodia, com apoio de uma consultoria internacional. Então fui para lá, trabalhei nesse processo e quando terminou, me propuseram para ficar na diretoria financeira, para cuidar de toda área de sistemas e informação na diretoria financeira. Aí eu estava terminando o Ceag, surgiu a oportunidade de ir para França, no Instituto _________, para fazer essa complementação de créditos. A Rhodia topou, manteve meu vínculo trabalhista, manteve o salário, pagou a viagem e tal. Eu fui com a família, já tinha um filho pequeno, de dois anos, e passei um tempo lá que foi maravilhoso. Não só pela oportunidade de trabalhar naquela que era a melhor escola de gestão da Europa na época, que era o terceiro ciclo da ________, de aprender bem a língua, conviver com pessoas muito interessantes, meu vizinho do lado era japonês, o de baixo era filho de um médico americano, um americano também muito divertido. No meu andar tinham vários iranianos, porque foi a época do Khomeini, então várias famílias abastadas do Irã mandaram seus filhos para a Europa. Então, era um primeiro contato para gente de uma cultura até então desconhecida. Foi um período muito rico e acho que fez a diferença na minha vida profissional. Você quando passa um tempo fora, adquire uma confiança muito grande. Primeiro em se comunicar com culturas diferentes, línguas diferentes. E aí quando eu voltei fiquei na Rhodia por mais oito ou nove meses, foi quando a Rhodia foi nacionalizada na França. A estrutura de administração mudou e aí foi quando eu recebi o convite de ir para Accor. Nos primeiros momentos, eu achei que tinha sido um erro, porque saí de uma empresa maravilhosa, estruturada, para ir para uma empresa que estava no começo. O que mais me chocou foi, nessa empresa, perceber que eu tinha mudado muito no ambiente, em termos de pessoas. Por ser uma empresa que no começo contratava pessoas mais operacionais, mais simples e tudo isso. Mas, o que foi fantástico foi exatamente a partir desse sonho, dessa visão, da vontade que o Firmin tinha de construir um grande grupo, a oportunidade que a gente teve de atrair cada vez mais talentos de primeira qualidade, pessoas com boa formação, para fazer o desenvolvimento que o grupo teve. A partir daí, bom, eu entrei lá como Diretor Tesoureiro, depois assumi toda área financeira, depois toda área administrativa e financeira, assumi a área de tecnologia, assumia área de planejamento estratégico - que era muito atuante, porque a gente fazia muitas aquisições. E eu pessoalmente liderava o grupo, para fazer 21 aquisições é uma grande experiência. Você poder entender uma empresa que pode ser comprada e que às vezes tem necessidade de ser comprada porque está passando por dificuldades. Você atribuir um valor aquilo, quanto vale uma organização, né? E depois fazer a operação de negociação, conseguir comprar nos termos em que você queria, conseguir obter a aprovação dos acionistas. Mas depois o mais fantástico era fazer a integração das equipes. E você, em determinados momentos, perceber que da empresa comprada você muitas vezes tem pessoas que podem te ajudar a reforçar o time e que às vezes você tem que colocar pessoas que já estavam com você já em causa. Fazer as trocas. Então, ali foram 17 anos que passaram muito rapidamente, eu não vi passar. E 17 anos de muita construção, muita coisa, muita realização. Muita satisfação para todos: pros funcionários, pros acionistas, pros clientes. Realmente foi uma coisa fantástica. E aí chegamos ao Credicard em maio de 1999.
P1 – E qual foi seu maior desafio quando você chegou na Credicard?
R – Veja, acho que, a Credicard na verdade, o grupo que respondia a esse conselho de administração que eu presidia, eram duas empresas a Credicard e a Redecard e tinha dentro da Credicard um embrião para se criar uma empresa de prestação de serviços, que depois a gente criou muito rapidamente. Mas, a Credicard, em si, tinha passado por problema muito sério em 1998: perdas de crédito, perdas de fraude, que tinha provocado uma surpresa no resultado, porque isso foi detectado no final do ano. E, portanto havia uma descrença muito grande dos próprios acionistas na capacidade da empresa se recuperar, o que se refletia no moral da tropa. Então, acho que o primeiro grande desafio foi realmente entender qual era a dinâmica daquele time que estava ali, saber se era um time que a gente podia contar para realmente fazer o _______. E a resposta foi muito positiva, a gente tinha gente de primeira qualidade. Eu praticamente não trouxe ninguém, de fora, foi mais uma questão de realocar pessoas. Acho que esse foi o grande desafio. O que nós temos que fazer? A gente sabia o que tinha que fazer, quanto que tinha que cortar da empresa, quanto que tinha que recuperar. Nós tínhamos que tomar decisões muito difíceis, como se separar de clientes. Quando eu cheguei a empresa tinha cinco milhões e 500 mil clientes, a gente teve que simplesmente cortar dois milhões de clientes, coisa que é muito difícil de fazer. Mas eram clientes que muito provavelmente não trariam o resultado positivo para empresa, o que a gente tinha que fazer. E eu que vinha de uma experiência da Accor, que era presidida por um, a gente chamava o Firmin de vendedor-presidente, então, cortar clientes para mim era um drama. Talvez esse tenha sido a parte mais difícil da história. Em alguns momento ter que admitir que a gente tinha que perder participação de mercado para recuperar a empresa financeiramente. Então, a administração desses dilemas, eu acho que era a questão mais difícil, mas nós fizemos tudo com muita coragem. Atacamos nas coisas que tinha que ser atacadas e no final do ano de 1999, a Credicard que tinha apresentado um prejuízo enorme em 1998, no final de 1999 já estava apresentando lucro. Em paralelo, a Redecard que tinha sido criada em 1996, era uma empresa que começou bem feita, nasceu em berço esplêndido. Primeiro, ela tinha uma origem muito boa da Credicard, na sua época boa. Em 1996 a Credicard estava no seu máximo em termos de velocidade de crescimento, logo depois do plano real, população com poder aquisitivo aumentado, todo mundo querendo crédito. Então, era um momento fantástico em 1996 quando a Redecard foi criada. E ela foi criada dentro um espírito muito interessante que era transformar uma área que era quase que um ___ office da Credicard, que era o relacionamento com os estabelecimento, que era uma função necessária para que os cartões funcionassem, transformar aquilo num ____ business, né, uma empresa com seu objetivo próprio. Isso foi feito, o Álvaro chamou o ____ Sales, para presidir essa empresa no começo e a empresa foi um sucesso. Então, quando você me fala de um grande desafio, como você faz para conviver uma empresa que está no auge do seu crescimento, que tinha começado dois ou três anos antes da crise da Redecard, produzindo resultados fantásticos, com equipes querendo cada vez mais liberdade para empreender, compensação e tudo isso e uma outra que estava passando por um processo de _____ terrível e no meio do caminho a idéia de se criar a empresa de prestação de serviço. Da mesma forma que foi criada a Redecard, aproveitando uma grande expertise que ela tinha de relacionamento com estabelecimentos, criar uma empresa especializada nisso, a idéia era pegar toda área de processamento da Credicard, controle de rede de telecomunicações, área de call center, que era imensa, talvez a grande empregadora da Redecard, transformar tudo isso numa empresa. E o projeto era, transformando numa empresa, eu vou captar novos clientes no mercado para processar cartões. Com esse aumento de volume, eu vou ganhar escala e vou baixar o custo de processamento para própria Redecard. E esse talvez, existia então dentro da Credicard o lado que estava sofrendo que era o lado que tratava com clientes e que tinha perdido milhões e milhões em crédito e estava tentando se recuperar, a Redecard que ia maravilhosamente bem e o pessoal de serviço que queria se ver livre daquele convívio com a Credicard o mais depressa possível, para ter uma experiência de sucesso como teve a Redecard. Acho que no final das contas, o grande desafio era esse: como você faz para conviver três organizações, que tiveram a mesma origem, que estavam sob a minha responsabilidade, mas em momentos muito diferentes na sua dinâmica, do seu convívio com pessoas e tudo isso. Acho que esse foi o grande segredo e principalmente mostrar que isso era possível e reconquistar a confiança dos acionistas. Porque uma das possibilidades, naquele momento, eram os acionistas, e isso foi colocado entre maio e junho, se colocou a possibilidade de se dividir o portfólio de clientes da Credicard em três e cada um levar um pedaço. Era o espólio da Credicard. Aquilo me chocava. Tinha acabado de sair de uma empresa depois de 17 anos para vir para cá e dividir a empresa e acabar com ela? Então, como fazer tudo isso num curto espaço de tempo, com três empresas que embora tivessem uma origem comum, uma cultura comum, viviam três momentos diferentes: uma querendo existir, uma querendo crescer porque tinha toda possibilidade e aquela ali querendo sobreviver. Então, acho que foi um momento muito bom e a gente conquistou muito rapidamente a confiança dos acionistas. E aí a palavra chave é resultado, quando você começa a pagar dívida ninguém pergunta mais nada. E a gente sabia disso, se nós dermos resultados, nós vamos ter paz para fazer o que nós quisermos e as idéias de divisão podem ser afastadas. Então, acho que o grande segredo ali foi esse: saber fazer conviver essas três diferentes empresas, em diferentes momentos, ao mesmo tempo. E eu acho que o Grupo no final de dois, três anos era um sucesso para onde a gente olhava. Só tínhamos alegria. Era um negócio fantástico. A Redecard que desde o seu nascimento só produzia resultados fantásticos, acho que muito pela firmeza na gestão, tanto o Lívio quanto o Fleuri, pessoas determinadas. Olhavam para a conta de resultados, eram implacáveis na busca pelos resultados. Mas, ao mesmo tempo a empresa tinha no seu DNA a vontade de ser uma empresa perfeita, uma empresa eficiente e ser reconhecida por isso. E a Redecard já no terceiro ano de existência foi colocada entre os 100 melhores lugares para se trabalhar no Brasil, numa pesquisa da Revista Exame. Isso acabou se transformando num objetivo tanto para a Credicard quanto para a Orbital, que tinha sido criada nesse processo de cisão para criação da prestadora de serviço. Nós criamos a Orbital em maio de 2000. Foi um momento fantástico, né, porque nós tínhamos que tirar de dentro da Credicard 5600 pessoas e deixar na Credicard, que foi a origem de tudo, 360. Ou 600 e depois baixamos para 360. Então, a origem de tudo ia virar uma empresa, assim, muito pequena, especializada, e as outras duas iam crescer. Poucas vezes se viu, eu tinha vivido uma experiência de empresas que a gente comprava e, portanto, crescia pela soma e no caso da Credicard, se crescia pela divisão. A Credicard dava oportunidade de se criar outras empresas muito eficientes, a partir das competências que ela tinha. Então foi um processo fantástico de criação de outras riquezas para os acionistas a partir da criação de outras empresas. Foi acho que um caso aí que um dia será estudado. Então, a Redecard era um exemplo de eficiência, que de certa forma estimulava os funcionários da Credicard não só a recuperar a empresa, mas também a colocar no mesmo nível. E da Orbital também, que era uma empresa que convivia com problemas de outra ordem, não só da gestão fina das funções de crédito ou de relações como tinha a Credicard, mas que tinha problemas de gestão do contingente de 8000 pessoas, por exemplo. Um call center, com turn over elevado, quer dizer era uma coisa de tratamento de massa. Dificuldades completamente diferentes uma das outras. Mas as três empresas tinham o mesmo objetivo que era não só dar lucros, mas também de serem consideradas ótimas empresas para se trabalhar. A Credicard, acho que já em 2003, também já foi colocada como uma das melhores empresas para se trabalhar no Brasil. Nesse momento, a Redecard já estava entre as dez empresas melhores para se trabalhar no Brasil e a Orbital entrou na lista também em 2004, entre as 100. E depois foi se aproximando das primeiras nos anos seguintes. 2003 acho que a Orbital, então quer dizer foi criada em 2000 e em 2003 já estava na lista das melhores empresas para trabalhar. E a Credicard também. Isso pode parecer assim “ah, ganhamos o prêmio”, mas é muito mais que um prêmio. Talvez era, ser colocado nessa lista era a confirmação de uma coisa que se vivia dentro da empresa. Realmente as três eram os melhores lugares para se trabalhar que a gente conhecia. Então, desafios próprios de uma empresa, de um grupo de três empresas, pertencentes aos três mesmos acionistas com momentos diferentes na sua história, com performances diferentes e conseguir fazer com que tudo isso se desenvolvesse de forma homogênea, equilibrada e com relações muito boas entre as pessoas nas três empresas. Acho que foi um sucesso. Credicard é uma coisa que poucas vezes se vai ver no mundo empresarial. Uma empresa que... A Redecard então chegou a ser a quarta melhor empresa para se trabalhar no Brasil, os resultados registrados, batia recorde a cada ano em termos de resultados de volumes e resultados líquidos e pagamento de dividendos aos acionistas. Portanto era assim aquilo que todo mundo esperava. O final da história vocês conhecem.
P2 – Quando você chegou em 1999, olhando para a Redecard, o que você acha ali que tinha de mais marcante, dentro da Redecard, uma empresa que já tinha três anos de vida?
R – Acho que era uma empresa extremamente focada no resultado final. Acho que isso vem um pouco do fato dela ter três acionistas do setor financeiro, onde a questão do resultado é fundamental, do controle. Mas o mais marcante da Redecard era ter o resultado, não era o resultado a qualquer preço. Era o resultado dentro de uma empresa que deveria ser saudável nas suas relações. Ela tinha uma agressividade muito grande nas negociações, nas sua atuação no mercado. Ela considerava a competição com a Visanet um elemento de motivação muito forte. Quer dizer, ganhar da Visanet era um objetivo muito forte. Era uma empresa que se movia com base em todos os critérios que se quer ver numa empresa: ser bem sucedida no mercado, ganhar market share, de produzir resultados financeiros, mas principalmente e aí é um grande resultado do (Irélio?) que tinha essa visão de que a questão de recursos humanos deveria ser uma questão prioritária na empresa. E levou isso ao extremo, quer dizer a empresa será eficiente em função da qualidade dos seus recursos humanos e da qualidade do ambiente que se conseguiria criar. Então, isso acho que serviu até de inspiração para gente resolver uma série de problemas que nós tínhamos na Orbital, que era uma empresa que pela sua dimensão tinha que conviver com engenheiros de telecomunicação com três níveis de pós-graduação, ao mesmo tempo em que você tinha que conviver com uma massa de atendentes em call center, com remuneração baixa, com experiência muito baixa, em início de carreira. Era muito difícil administrar a estrutura de recursos humanos da Orbital. Mas a Redecard serviu muito de inspiração para isso. O que mais chamava a atenção na Redecard era isso, era uma empresa equilibrada. Não era lucro a qualquer preço, não era market share a qualquer preço, era market share com rentabilidade, mas principalmente pela criação de um ambiente interno muito eficiente, com pessoas extremamente agressivas. Algumas deixaram a empresa em momentos importantes, criando oportunidades para que outras os viessem substituir, já dentro de uma nova idéia de que o trabalho de equipe era fundamental, que as estrelas são necessárias, mas desde que saibam trabalhar em equipe. Então, a empresa soube melhorar sua cultura com o tempo. Tanto é que hoje ela tem o privilégio de ter na sua presidência uma pessoa que se formou praticamente dentro da empresa. Que começou nos primórdios da Credicard e depois com a formação da Redecard pessoas de fora vieram para gerir, mas foi uma empresa que manteve no seu DNA tudo aquilo que tinha de bom nessa história vencedora do grupo Credicard em trinta anos. Tanto é que foi muito fácil essa decisão de ter uma pessoa que veio dos quadros anteriores para presidir a empresa hoje.
P2 – Você poderia falar para gente um pouquinho sobre o que é o negócio Redecard?
R – O que é o negócio Redecard? O negócio Redecard, ele tem uma característica técnica muito importante, que é colocar à disposição dos portadores de cartão uma rede que tem que funcionar 24 horas por dia, sete dias por semana, teoricamente em 100% das localidades do Brasil onde possa haver uma transação comercial. Esse é o objetivo, os 100%. É que talvez 100% não seja possível, existe aí uma seletividade em que estabelecimentos ela deve estar. Isso é o que ela deve dar como serviço para a sociedade. Está no seu objeto social, dizer “eu tenho condições de permitir que qualquer pessoa que queira fazer uma transação de compra ou transferência de recursos eletrônicos, tal, eu coloco uma rede à disposição”. Esse é um pressuposto básico. Para fazer isso aí a necessidade é imensa de manter relações com esses estabelecimentos. E aí a diferença é muito grande, você fala com o Pão de Açúcar, como também fala com o armarinho. E ter essa sabedoria de poder negociar com elementos tão diferentes, né? Mas, ela é talvez um negócio novo, um negócio que foi criado depois da criação da indústria de cartões de crédito como um spin off, uma especialização de uma das funções da indústria de cartões de crédito e que tem como pressuposto básico fazer todo o resto funcionar. Sem a função da Redecard, o mercado de cartões de crédito não existiria na dimensão que ele existe. Ela é uma empresa também que permitiu, ela e outras empresas no mercado de _____, permitiu um ganho de escala brutal. E hoje eu vivo essa experiência na Vivo, onde cada empresa de telefonia celular monta sua própria rede de captura de ligações e de processamento. Você imagina quanto tem de ineficiência nesses investimentos, que são sempre superiores a alguns, passa da casa de bilhão de dólares por ano. E a Redecard, a Visanet e as outras empresas de _____ disseram: “não, nós vamos ter redes compartilhadas que servem a vários emissores de cartões, como Credicard, como Citibank, Itaú, Unibanco, Caixa Econômica Federal e todos outros que você puder citar”. Se cada um tivesse que montar sua rede de _____, no mínimo o balcão das lojas não teria mais espaço e teria que ter só POS. Então, é uma atividade que se desenvolve viabilizando um negócio imenso, que é o mercado de cartão de crédito, que cresce ainda à taxa de dois dígitos, mas que faz isso com uma eficiência brutal. Quer dizer com busca de redução de custos, de compartilhamento, com busca de escala muito grande.
P2 – Você vivenciou dentro desse período situações na Redecard em que foram necessárias tomadas de decisões que envolviam pessoas? E se você vivenciou, que valores percebeu que foram levados em conta nesses momentos?
R – Acho que até eu já citei isso um pouco. Em alguns momentos, algumas pessoas deixaram a empresa, pessoas que nós considerávamos fundamentais. Pessoas de uma competência profissional, técnica e empresarial indubitável. Pessoas de uma capacidade de contribuição enorme mas que, e portanto a empresa nunca pensou que pudesse dispor dessas pessoas, eram vitais para o funcionamento da máquina, mas que a gente percebia que com a evolução da cultura da Redecard para uma empresa que por mais que buscasse a eficiência queria fazer isso num clima saudável, de um trabalho de equipe, de um trabalho compartilhado, dentro do respeito da contribuição de cada um. Em determinados momentos alguns estilos começaram a parecer inadequados a esse desenvolvimento. E o que acabou acontecendo é que naturalmente algumas pessoas saíram, e por mais que a gente considerasse “é uma perda muito grande”, os próprios acionistas questionando “não, vocês não podem deixar sair”, “não podem perder tal funcionário”, com coragem a gente dizer: “Não. Nós podemos perder essa pessoa. Faz parte do processo de renovação tanto da empresa quanto para ele. É pessoa que pode buscar outros horizontes”. E a gente aceitar o fato de que em alguns momentos a gente teve que prescindir de algumas pessoas para que o mecanismo pudesse ser renovado. Então, talvez tenha sido, essa é uma das coisas em que a gente sempre aprende. Cada caso é diferente, por serem pessoas. Não que a gente se torne mais frio quanto a isso, mas a gente entende que um organismo não pode viver em função de uma, duas ou três pessoas. Ele próprio acaba atraindo os semelhantes, ele próprio acaba criando condições para que as pessoas que não se adaptam saírem. Entender esse fato, acho que foi um processo muito importante na gestão da Redecard.
P2 – Você permaneceu na Redecard de 1999 a...
R – Até 2005. Foram seis anos, felizes!
P2 – E quais foram os aprendizados que você levou para a sua vida pessoal e profissional desse período.
R – São de várias ordens, né? O primeiro deles é aquele que é a conclusão no final de que é possível ter uma empresa muito lucrativa, mas que, sobretudo ela será tão mais lucrativas e perene quanto mais felizes forem as pessoas dentro da própria organização. Quando eu deixei o Grupo Credicard, eu estava acumulando a presidência da Credicard, da empresa Credicard que nós tínhamos transformado em Banco. E como vocês sabem, houve uma decisão no final de 2004, dos acionistas, de fazerem aquela divisão do portfólio da Credicard. Então Itaú e Citi compraram a parte do Unibanco, resolveram então cindir a empresa em dois e cada um levar um pedaço da empresa. Um pedaço eram clientes, pessoas, ativos, tudo. Meio a meio, e aquilo por mais violento que pudesse parecer - e era para as pessoas que estavam na Credicard, aquela empresa estava entre as dez melhores para as trabalhar do Brasil, era uma empresa que pagava dividendos no primeiro dia do mês seguinte, uma empresa que conquistava clientes numa velocidade maior do que clientes grandes como Bradesco, Banco do Brasil, Itaú, coisa assim. Quer dizer, era uma máquina perfeita. Então, foi um choque para gente ter que fazer aquilo. Mas nós entendemos perfeitamente que o próprio crescimento da Credicard ia se transformar num incômodo para os próprios acionistas, que finalmente eram concorrentes entre si. E que aquilo era uma decisão empresarial. Então tem um aprendizado aí também. Em certos momentos não é a melhor solução que prevalece, mas a solução do possível. E você tem que aceitar certas realidades. Então, no momento em que nós aceitamos essa decisão dos acionistas, o aprendizado daqueles seis meses foi fantástico. Porque poderia ter todo tipo de atitude, até eu mesmo que tinha um amor muito grande por aquela empresa, mas o que a gente leva é que uma vez tomada a decisão, a gente tem que fazer tudo para que dê certo. Qualquer que seja. Por melhor que seja para nós mesmos pessoalmente. Eu que tinha vindo para administrar um grupo de três empresas estava vendo a Orbital sendo comprada pelo Itaú, obviamente seria gerida pelo Itaú, a Credicard sendo dividida em dois, já não era mais o mesmo grupo. Então aquilo para mim significava claramente a minha saída da empresa. Eu já sabia disso de antemão. Mas naqueles seis meses entre a decisão e o momento em que se iniciou o processo de cisão da empresa, nós fizemos tudo para aquilo dar certo. Principalmente baseado naquela filosofia de que a Credicard já tinha conseguido criar duas outras empresas muito bem sucedidas, sucessos empresariais e o que nós íamos fazer com a divisão da Credicard era talvez criar mais duas empresas bem sucedidas. Eu queria muito é que as pessoas quando saíssem da Credicard para serem incorporadas às equipes do Citibank e do Itaú, é que elas levassem essa cultura até talvez para influenciarem essas duas outras organizações, que eram infinitas vezes maiores do que a Credicard. Mas eu acho também que eles tinham um aprendizado com a Credicard. Eu acho que isso foi muito bem sucedido e a maior surpresa foi que em 2005, a Credicard, uma empresa já dividida, as pessoas sabendo que ela ia acabar, foi a terceira melhor do Brasil para se trabalhar. Sucesso total. Então, o grande aprendizado é que você é capaz daquilo que você quer. Quando você acha que tem que fazer e conta com pessoas determinadas, as coisas acontecem.
P2 – O que na sua opinião, como você percebe o mercado de cartões de crédito.
R – Olha, eu acho que ainda é um mercado que tem um potencial de crescimento muito grande. Que passará por mudanças brutais em termos de tecnologia. Acho que aí a atividade que eu desenvolvo hoje vai estar muito próxima do mercado de cartões de crédito, no que diz respeito à realização da transação eletrônica, que hoje é movimentada através de um cartão magnético que você tem que ter, quando mais para frente você não precisará ter nada. Bastará ter um número na cabeça e algumas senhas para você fazer as transações que quiser fazer. Com o uso de Internet, com uso de celulares, com outros meios de comunicação. Então, acho que no aspecto técnico, o mercado vai mudar muito. O que vai ser preservado como uma atividade fundamental dentro da atividade de cartão de crédito é o, como o próprio nome diz, o expertise em crédito. Aí é que mora o segredo, aí é que mora a oportunidade de se acertar ou errar muito. E não é só na atividade da emissora de cartão de crédito, mas também na atividade de _____, como na Redecard, onde a questão de estabelecer relações de extrema confiança, mas com toda segurança para que elas se passem da forma prevista e evitem fraude, evitem qualquer distorção no processo, isso vai ser um expertise fundamental para as empresas, acima de tudo. As questões da tecnologia que hoje estão muito presentes, estão muito na essência, se a gente pega o negócio da Redecard, implantar POS em cada estabelecimento comercial é aquilo que todo mundo acorda de manhã “quantos estabelecimentos eu vou filiar hoje?”, “quanto cada um desses estabelecimentos vai gerar de transações?” Isso é o fundamental, isso emprega muita gente dentro da empresa, isso exige muita coisa. Essas questões eu acho que vão mudar muito. Essas questões mais operacionais. O conhecimento de como administrar essas transações todas, que são internacionais, passam da casa de bilhões e bilhões de dólares, como fazer essas transações com segurança é o grande segredo daqui para frente. E do lado da emissora de cartões, é como dar crédito sem correr riscos maiores do que a empresa pode suportar, essa é a essência do negócio hoje e continuará sendo. Esses são os limites do crescimento desse negócio. No caso do Brasil, acho que o crescimento não parou. Vai continuar em dois dígitos por muito tempo. Tem uma população imensa para ser atingida. E aí o que precisa é saber como trabalhar não só com a população de baixa renda, mas com a população que está na economia informal, que no Brasil é uma população muito grande. E que a implantação do cartão de crédito nessa população informal, tanto na pessoa física quanto na pessoa jurídica, pode ser até um estímulo para aumentar a formalização da economia na medida que todas as transações são registradas eletronicamente. Permite acompanhamento, permite _______, mas principalmente permite uma redução do custo das transações por serem eletrônicas. Então, acho que continua sendo um mercado de alta competição. Isso do ponto de vista do mercado. Do ponto de vista das empresas, dos investidores desse mercado, que são os grandes bancos, a tendência muito forte é que a relação através do cartão de crédito substitua a relação que deu origem aos bancos de consumo, que era uma relação através da conta corrente. Ninguém entrava no banco sem que o gerente dissesse em primeiro lugar: “vamos abrir uma conta, depois a gente vê o resto”, não é verdade? (risos) “Você que crédito imobiliário, quer isso, aquilo, primeiro vamos abrir uma conta”. Eu acho que vai ser cada vez mais frequente o fato da pessoa ter um cartão de crédito com o banco e não precisar ter uma conta bancária. Porque ele não precisa mais da conta bancária. Ninguém vai a uma agência mais, todo mundo faz tudo a partir da Internet, do telefone etc. Se você puder fazer transações de transferência de recursos, pagamentos com cartão de crédito, mesmo que não tenha POS, se eu quero mandar dinheiro para você, eu mando dinheiro para sua conta de cartão. Passo no supermercado aqui ao lado, passo meu cartão e digo que é uma transferência financeira e mando para você. Eu posso fazer no supermercado do lado ou posso fazer em Paris, se eu estiver em Paris. Porque lá também tem um POS que captura transações de um cartão brasileiro. Então eu acho que o cartão de crédito deverá ser o centro das relações dos bancos de consumo daqui para frente, pela suas característica de baixo custo, transações eletrônicas em 99% dos casos, de segurança, de possibilidade de _______. Ou seja, um cheque você não sabe onde vai parar, dá para um, vai pro outro, pro outro. O cartão, cada transação tem que ser registrada. Pro próprio Banco Central, esse é um instrumento fantástico de controle de coisas como lavagem de dinheiro, circulação de recursos. É o sistema brasileiro de pagamentos para baixas transações e é internacional. Hoje ninguém se preocupa, por exemplo, se está pagando um jantar em Nova York, não está pensando que está fazendo uma operação de câmbio. Milhões e milhões de operações de câmbio são feitas hoje, sem a burocracia que exige fazer uma operação de câmbio, fazer uma TIR no banco ou qualquer coisa assim. Então esse mercado desmistificou uma série de processos que são extremamente complexos nos bancos. E na relação da própria pessoa física com o próprio banco, com o cartão de crédito hoje, você resolve grande parte dos seus problemas e resolverá muito mais na hora em que for permitida transferência de recursos entre portadores de cartão e não só entre o portador de cartão e um estabelecimento comercial ou de serviços. Então, acho que aí, esse é o grande futuro pro mercado de cartões de crédito: é substituir o cheque.
P2 – Como você percebe a Redecard neste mercado daqui a dez anos?
R – Olha, ela é um dos grandes players desse mercado no Brasil. Eu estou afastado da empresa há um ano e pouco, mas imagino que ela tenha mantido toda a sua ambição de crescimento e desenvolvimento. Acho que ela tem que estar extremamente atenta para as novas oportunidades que surgem e não subestimar algumas dessas oportunidades. E tem que estar atenta às mudanças tecnológicas que virão. É uma empresa que já está comemorando os seus dez anos, dez anos de muito sucesso. Sucesso é muito bom, mas é perigoso. A gente não pode sentar no sucesso. É uma empresa que tem que estar se colocando em causa a todo momento, tem que estar se questionando, tem que estar se colocando novos desafios. Exatamente porque ela merece novos desafios. Pode subir a barra a qualquer momento, que ela vai pular acima da barra. Ela tem gente para isso, ela tem DNA para isso, tem história para isso. Então é uma empresa que não pode se acomodar de maneira nenhuma.
P2 – E qual a sua opinião sobre a Redecard estar comemorando os dez anos de empresa, colhendo depoimentos de funcionários, ex-funcionários, pessoas que trabalharam diretamente com a Redecard.
R – Bom, eu não estaria aqui se não estivesse valorizando muito isso. Primeiro é minha obrigação por tudo que eu passei de bom aqui, pelas amizades que fiz, pelo que a gente conseguiu fazer juntos. Mas não me surpreende que a Redecard esteja fazendo isso, porque é uma empresa que valoriza essas coisas, valoriza exatamente o fato de uma organização ser composta de pessoas. Ela quer registrar essa história. Acho que a diretoria toda da Redecard e as pessoas que tomaram essa iniciativa estão de parabéns. Mas se viesse de uma outra empresa talvez me surpreendesse mais do que aqui. Eu tinha certeza de que aqui não passaria em branco. A diretoria da Redecard não deixaria uma coisa como essa, dez anos, sem uma grande comemoração. O ser humano vive de celebrações, vive de comemorações desde o tempo em que se reunia em torno da fogueira. Não é verdade? Então, precisa disso, precisa ter os grandes momentos de celebração, de registro, de marcar sua história. É uma organização de muito sucesso, dá emprego para muita gente, fez a felicidade de muita gente, ela criou oportunidade para muitos outros negócios. Ela tem papel importantíssimo na sociedade e isso precisa ser registrado.
P1 – Roberto, qual o seu maior sonho?
R – Meu maior sonho? É hoje, na empresa em que eu trabalho, é atingir o que eu já consegui atingir em outras organizações em que eu passei. Que é ter uma empresa altamente lucrativa, dar aos acionistas os resultados que eles merecem, mas que seja, sobretudo, acima de tudo uma empresa de pessoas felizes.
P2 – Bom, para finalizar eu gostaria de saber o que você achou de ter participado dessa entrevista com a gente?
R – É uma satisfação muito grande, até com um pouco de emoção. Mas para mim é extremamente importante saber que eu fiz parte dessa história durante um momento importante da vida da Redecard. E que não devo ter feito uma parte ruim senão, não teriam me chamado. Acho que o fato de eu estar aqui é exatamente por isso. Se eu passei por aqui e deixei algumas lembranças e as pessoas pensaram nisso, e quiseram que eu fizesse parte desse filme, ou dessa história, ou desse livro, isso para mim é um reconhecimento muito grande. E o fato de eu estar aqui num dia com a agenda extremamente apertada e tudo isso é também uma demonstração da importância que eu dou para essa organização.
P2 – Nós gostaríamos de agradecer a sua disponibilidade e a sua presença. Obrigada, Roberto.
R – Prazer imenso.Recolher