Memória Companhia Vale do Rio Doce
Depoimento de Olímpio Pires Guerra
Entrevistado por Arnaldo Marques e Marina Gomes
Rio de Janeiro, 25/6/2003
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista nº CVRD_HV139
Transcrito por Maria da Conceição Amaral da Silva
Revisado por Genivaldo Cavalcanti Filho
P/...Continuar leitura
Memória Companhia Vale do Rio Doce
Depoimento de Olímpio Pires Guerra
Entrevistado por Arnaldo Marques e Marina Gomes
Rio de Janeiro, 25/6/2003
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista nº CVRD_HV139
Transcrito por Maria da Conceição Amaral da Silva
Revisado por Genivaldo Cavalcanti Filho
P/1 – Senhor Olímpio, boa tarde.
R – Boa tarde, Arnaldo.
P/1 – Eu gostaria de pedir de novo que o senhor dissesse o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Olímpio Pires Guerra. Nasci em Santa Maria do Itabira, em dez de junho de 1933.
P/1 – Santa Maria do Itabira é perto de Itabira?
R – É. Quando eu nasci, Santa Maria pertencia a Itabira. Era um distrito de Itabira, a 28 quilômetros, então é questão de vinte minutos de Itabira a Santa Maria.
P/1 – Sua família, seus avós, eles eram da região?
R – É, os meus avós eram de Santa Maria. Nasceram em Santa Maria. Os meus pais também nasceram em Santa Maria. E quando… Em 1942, meu pai mudou-se para Itabira, justamente no início da Vale do Rio Doce. A Vale foi criada em julho de 42 e nós mudamos para Itabira em outubro de 42.
P/1 – O senhor passou os seus primeiros nove anos de vida em Santa Maria?
R – Em Santa Maria. Eu estudei o primeiro, o segundo e o terceiro anos no grupo escolar em Santa Maria de Itabira. Foi quando mudamos em 42 para Itabira e continuei os meus estudos no Grupo Coronel José Batista, em Itabira.
P/1 – Seus avós, eles eram vivos nessa época? O senhor teve convivência com eles?
R – Tive muita convivência com meus avós. E meu avô, um era fazendeiro…
P/1 – Paterno ou materno?
R – Paterno. E o materno morava na cidade de Santa Maria. Meus avós, os paternos, moravam na fazenda, então eu tive uma convivência boa. Eles
faleceram depois de 50. Minha avó materna faleceu primeiro, em 48, e os outros faleceram depois de 50, então eu tive uma convivência boa com eles.
P/1 – E como era a infância em Santa Maria? Nessa época quantos habitantes tinha, o senhor lembra?
R – Santa Maria devia ter naquela época em torno de três a quatro mil habitantes. Era uma cidade pequena, onde a gente tinha pouco o que fazer. Era brincadeira de sempre, jogar bola. Depois da aula era jogar bola e pescar. Santa Maria tem dois rios, então a gente pescava muito, pegava passarinho. Foi uma infância gostosa.
Hoje, quando eu olho para trás, me dá uma saudade muito grande daquele tempo onde as coisas eram mais difíceis por um lado, mas mais fáceis. Uma vida mais tranquila, uma tranquilidade que hoje não existe mais.
Santa Maria foi uma cidade que eu tive esse período até 42; moramos um pouco na roça, na fazenda e mudamos para Santa Maria quando eu tinha cinco para seis anos. Fiquei até os nove anos, quando eu fui para Itabira. Mas foi uma infância boa, como infância de menino de quase toda cidade pequena. Aquela vida tranquila de passar o dia quase que em um campo de futebol, que é minha paixão até hoje.
P/1 – E o senhor morava na roça, o senhor morava na fazenda do seu avô?
R – Não, na fazenda do meu pai. Meu pai tinha uma fazenda e ele mudou-se para Santa Maria para instalar-se no comércio. O comércio de Santa Maria, uma cidade de três, quatro mil habitantes era um comércio fraco. Quando a Vale foi para Itabira, em 42, ele vislumbrou uma situação melhor e foi justamente nesse período da chegada da Vale, quando Itabira estava em uma movimentação muito grande com a chegada da Vale do Rio Doce.
P/1 – Era comércio de que, que o seu pai tinha?
R – Armarinhos, tecidos. Então foi, [se] instalou em Itabira. Ficou no comércio até 1946, quando terminou a guerra e ele quebrou. Depois da guerra houve uma verdadeira quebradeira no país e ele foi um dos que foi... O comércio caiu. E depois de velho eu o assisti falar uma vez o seguinte: “A melhor coisa que aconteceu na minha vida foi eu ter quebrado, porque cada filho procurou um rumo.” Porque todos estavam em volta dele. Cada um teve que procurar um rumo e todos venceram na vida, então foi uma coisa que me emocionou de vê-lo chegar e falar assim, [que] quebrou mas estava feliz de ver os filhos bem.
P/1 – O senhor mudou para Itabira com nove anos.
R – Com nove anos.
P/1 – Como foi essa mudança?
R – Olha, eu costumo lembrar; foi assim e agora, quando eu estava vindo, estava me lembrando. Às vezes é como se passasse um filme na vida da gente. Eu estava me lembrando de chegar em Itabira - era uma tarde de 1942 - na carroceria de um caminhão. A mudança chegando e a gente chegando. E tudo de novo. Itabira, uma cidade muito maior, aquela expectativa. O que é que vai ser, né? Foi uma mudança muito grande na na vida de todos nós. Uma mudança para melhor e que hoje… Hoje a gente vê com saudade aquele período.
P/1 – O senhor foi estudar onde em Itabira quando o senhor foi para lá?
R – Eu fui estudar no Grupo Coronel José Batista até 45. Foi quando eu saí do grupo. Aí eu fui para um colégio, em 46 eu fui para o Ginásio Sul-Americano.
P/1 – Era muito diferente o ensino em Itabira de Santa Maria?
R – Era. Itabira já era uma cidade com uma condição de vida muito melhor. Itabira, naquela época, para você ter uma ideia tinham dois colégios. Tinha o Colégio Nossa Senhora das Dores, que era de irmãs de caridade. Era feminino, era internato. E o Colégio Sul-Americano também, que tinha interno. Todos os dois tinham internato e também externato. E era um ensino muito bom.
Naquela região do Vale do Rio Doce todo não tinha colégio, tanto é que as pessoas de Vitória… Tinha muita gente de Vitória que estudava em Itabira, tanto no Ginásio Sul Americano como no Colégio Nossa Senhora das Dores. Eram colégios bons e foi uma base muito boa que nós tivemos.
P/1 – E o senhor tinha turminha nessa época de…
R – Ah, tinha. Turma a gente tinha. Tinha aquela turma dos seus amigos de grupo, depois de ginásio que você… Onde você tinha as suas rodas de futebol, de briga. Vai ter briga da rua de baixo, da parte de baixo contra a parte de cima. Então tinha todo esse… Essas fases de vida. E a gente tinha as namoradas. O grupo era sempre o mesmo, até que não misturava.
P/1 – E era muito comum antigamente aqui o comerciante morar no mesmo edifício da sua loja. O seu pai era assim?
R – Não, não. O meu pai morava retirado. Ele morava a uns trezentos metros da loja e quando nós chegamos em Itabira, naquele período de 42, existia uma dificuldade muito grande até de casa para morar. Com a ida da Vale do Rio Doce foi um número de pessoas muito grande que foram para Itabira, inclusive do Rio. Tinha gente do Rio, de Vitória, de Belo Horizonte. Todos iam para lá. O emprego, naquela época, era muito difícil e a Vale era um novo horizonte que surgiu, então todo mundo, o sonho do itabirano e daquele povo da região era trabalhar na Vale do Rio Doce.
Meu pai encontrou até dificuldade. E [com] o dinheiro que ele tinha ele comprou, ele montou uma loja. Então nós alugamos nossa casa e nós fomos para Itabira.
P/1 – E o senhor tinha treze anos quando o seu pai quebrou, né?
R – Sim.
P/1 – Como foi isso? Como foi vivenciar isso?
R – Foi uma situação muito difícil que nós enfrentamos. Nesse período que ele quebrou, ele voltou para Santa Maria. Ficou sem emprego, abriu uma pensão em Santa Maria.
Eu, cada filho, procurou um rumo. Nessa época, nós éramos três maiores. Maior assim: eu tinha quinze anos, o outro tinha dezesseis, o outro tinha dezessete; era uma escadinha. Um foi ser garçom em Belo Horizonte, o outro foi trabalhar em uma carvoeira do tio em… Hoje Ipatinga, naquela época era um lugarejo. E eu fiquei em Itabira trabalhando em um comércio pequenininho, até que passado um ano, mais ou menos, eu fui para Santa Maria porque não tinha emprego.
Em 1950 voltei para Itabira para trabalhar em um armazém de seu Juquinha Cabral, onde eu trabalhei durante cinco anos. Meu pai continuou em Itabira, em Santa Maria. Em 1951 ele arrumou um emprego em Itabira, veio para Itabira, então a família, aqueles que estavam em Belo Horizonte, que estavam em Ipatinga, voltou todo mundo para Itabira novamente e já em uma situação bem melhor. Todos empregados, inclusive meu pai. Foi, vamos dizer assim, um recomeço de vida.
P/1 – Com dezessete anos o senhor morou um ano sozinho em Itabira?
R – Morei um ano sozinho em Itabira. Morava em um… Não vou dizer uma pensão, era mais uma… Morava em uma casa de família. Tinha o sujeito, o proprietário era amigo. Ele me alugou um cômodo para morar na casa dele. Eu morei um ano lá, na casa desse amigo.
P/1 – Como era ser adolescente em Itabira nessa época, começo dos anos 50?
R – Era um período bom, Itabira vivia uma fase boa. Em 50 Itabira já estava em uma fase de crescimento da Vale do Rio Doce. A Vale estava, nesse período, mecanizando as suas minas e existia bastante empreiteiro tirando minério na Cauê. Depois veio a fase Conceição, Dois Córregos, então existia muito emprego.
A gente tinha uma turma grande e já foi um período melhor porque tinha a turma de serviço, tinha a turma do futebol e foi uma fase muito boa. São momentos que a gente sempre olha para trás e dá uma saudade muito grande.
P/1 – Tinha cinema, tinha baile, tinha clube?
R – Tinha cinema. Baile, naquela época, era diferente. Hoje eu vejo, às vezes as pessoas sai meia-noite para ir para o baile. Naquela época, o baile começava [às] oito horas da noite, meia-noite, no máximo, terminava. Bons bailes.
Itabira tinha três clubes. O Valério tinha dois: tinha o Valério Campestre e o Valério Pará. E tinha o Clube Atlético Itabirano, que era no centro, então você era difícil final de semana que não tinha um baile. E o baile era, tinha uma característica diferente do que é hoje. Você [se] preparava, sonhava com aquele baile às vezes uma semana, um mês inteiro. Como deram… Aquelas festas tradicionais, você [se] preparava, fazia até um terno. Você tinha que estar engravatado, como não é hoje. A mulher se preparava e o rapaz também se preparava. Hoje não, às vezes a mulher [se] prepara e o rapaz vai lá de tênis, de jeans, totalmente diferente daquilo que foi. Foi uma fase que eu…[Uma fase] muito boa da minha vida. Essa juventude, até 57, por aí, que eu… Depois dessa fase eu comecei já a pensar em uma vida diferente, mas até 57 tudo era festa.
P/1 – O senhor falou bastante do jogo de futebol. O senhor jogava onde?
R – Eu joguei primeiro… Joguei no Juvenil do Valério. Juvenil, naquela época, é o Junior hoje. Depois eu… Itabira tinha dois clubes, chegou a ter três. Com o advento Vale do Rio Doce foi criado em Itabira o Valério Doce. O Valério é de 22 de novembro de 42. Nessa época, criou-se o Botafogo, porque havia um grupo que tinha ido do Rio, que era botafoguense, então criaram em Itabira o Botafogo. E tinha o Atlético Itabirano, que era o clube tradicional da cidade. Existia uma rivalidade muito grande Valério e Atlético.
Eu joguei no Valério algum… Um período bom, até 52, por aí. De 50 a 52, depois eu fui para o Atlético. Quando eu podia dizer que estava iniciando a minha carreira eu parei. Eu parei, fui cuidar… Não tinha condições de ser jogador e proprietário de firma, então preferi optar pelo segundo. Eu não deixei o lado de gostar de futebol e depois fui dirigente. Vivi uma outra fase, né?
P/1 – O senhor jogava em que posição?
R – Ponta direita.
P/1 – E era bom?
R – Eu não vou dizer que era bom também, porque eu parei, né? (risos)
P/1 – Certo.
R – Mas não era dos piores, não. Sempre fui titular, tanto do Juvenil, do Valério, quanto do Atlético. E os dois tinham clubes bons, tanto o Valério quanto o Atlético. O Valério, depois, transformou-se [em] profissional.
P/1 – O senhor falou do Valério, falou do Botafogo, que vieram pessoas do Rio, propriamente da Vale, que foram para lá.
R – Sim, da Vale.
P/1 – Como foi a chegada desses forasteiros em uma cidade tradicional mineira? Havia muita rivalidade? Houve um estranhamento? Como o senhor viu isso como adolescente da época?
R – Não, a gente via sempre. Chega em uma cidade – Itabira devia ter quinze mil habitantes nessa época – chega ali um grupo de rapazes solteiros, as moças tendem a ir para esse lado. Surgiu uma rivalidade, sim. Na cidade existiu uma certa rivalidade, mas acho que era até benéfica. Não foi aquela rivalidade de briga. Talvez por… Foi para aquele momento do itabirano ter vislumbrado a possibilidade de trabalhar na Vale, aquele jovem. E muitos, muitos trabalharam, foram para a Vale, então essa rivalidade foi desaparecendo com o tempo. Mas foi uma fase de muito entusiasmo na cidade. E essa… Às vezes, as moças que levaram essa vantagem porque arrumaram mais namorado, né?
P/1 – (risos)
R – Tiveram mais facilidade de arrumar namorado. (risos)
P/1 – (risos) E a Vale em Itabira tinha aquela visão de que paga os melhores salários? O funcionário da Vale em Itabira tinha uma valorização?
R – E como tinha. Porque o que acontece? Naquela época, você tinha… O emprego era ser bancário ou trabalhar no comércio. Quando veio a Vale mudou tudo. A Vale foi uma… Eu falo que a Vale trouxe grandes benefícios para a cidade, mas trouxe também, por outro lado, um certo… Não vou dizer prejuízo. Eu falo, eu costumo dizer… Às vezes, nas reuniões, eu falo assim: “A Vale conseguiu matar liderança.” Matar não por culpa dela. Aquele sonho da pessoa de que poderia… Itabira era uma cidade [em] que existia duas fábricas de tecido naquela época. Era uma cidade progressista, que as pessoas pararam e viram só o sonho de trabalhar na Vale. Se não tivesse a Vale eles teriam ido montar seu negócio e poderiam ter virado outros empresários.
Naquela época, todo mundo sonhava em ser funcionário da Vale, que era o grande negócio. O salário da Vale era muito maior de que um banco ou do comércio. E até as fábricas de tecido sofreram as consequências naturais do que é o progresso, porque a Vale [foi] chegando e pagando, tendo condições de pagar mais.
P/1 – O senhor falou que a sua vida teve um corte aos 24 anos, que foi em 57. Mas nesse período anterior, com dezoito ou dezenove anos, o senhor trabalhava onde? Ou o senhor não trabalhava?
R – Olha, em 1950 eu tinha dezessete anos. Eu vim de Santa Maria para trabalhar em Itabira. Fui trabalhar em um armazém que hoje seria uma mercearia, do Juquinha Cabral. Essa mercearia fornecia para os empreiteiros da Vale do Rio Doce,
ela tinha um movimento muito grande. Eu vim e trabalhei com ele ali de 50 até 55, mas sempre sonhava de ter o meu negócio próprio. Eu penso, eu queria ser um empresário. Meu sonho era aquele. Quando o sonho do itabirano era entrar na Vale, não, o meu sonho era de ser um empresário.
E sempre falando com o Juquinha, a pessoa que eu me tornei um grande amigo, uma pessoa admirável que me ensinou muito na vida. Eu sempre falava: “Juquinha, eu vou sair, porque eu quero montar o meu negócio.” “Não sai, não. Não sai, não porque eu preciso de você.” E fui ficando, até que chegou 1955 [e] eu disse assim: “Agora não dá mais. Eu tenho que cuidar da minha vida, senão eu vou ser balconista a vida toda.”
Foi quando eu saí em 1955, e nesse período o meu pai era contador. Eu fui trabalhar, aprender a fazer contabilidade com ele. Falei assim: “Quero aprender para poder… [Para] quando eu tiver meu próprio negócio eu saber o que eu vou fazer.” Fiquei com ele até um ano. Aconteceu um fato: meu irmão era funcionário de um posto de gasolina, uma casa de peça e achou uma proposta para ir para a Vale do Rio Doce. Convidaram ele para ir para a Vale, ele chegou, só que ele teve uma dificuldade, ele precisava de por um outro no seu lugar, aí ele me chamou. Falou: “Olha, eu preciso de você me ajudar.” Eu falei: “O que é que foi?” “Você ir trabalhar no meu lugar porque eu preciso de ir para a Vale, senão amanhã eu não acho esse lugar.” Aí eu fui para o lugar dele. Isso em 1956, em meados de 56. E lá foi a minha sorte, porque eu fiquei [de] 56 para 57, [em] 58 acabei comprando o negócio do proprietário e aí comecei a minha vida. Uma nova fase, de 58 eu comecei uma nova fase na minha vida.
P/1 – Como estava Itabira nessa época?
R – Itabira viveu uma fase… Era uma fase, como eu disse, a década de 50 foi um crescimento da Vale. E ela veio aí, 50, 60, então Itabira tinha… E aí veio, estavam construindo o asfalto em 60, princípio de 60. Estavam construindo o asfalto em Itabira, ligando a [Rodovia] 262 a Belo Horizonte, então a movimentação em Itabira era muito grande, de empreiteiros da Vale e empreiteiros da construção da rodovia. Começando justamente no comércio nessa época eu peguei uma época muito boa.
P/1 – E o senhor vendia o quê?
R – Olha, eu comecei com um posto de gasolina e uma casa de peça, depois passei a vender pneus. Depois montei uma recapagem. Depois eu comprei outro, eu comprei mais dois postos de gasolina. Montei uma concessionária da General Motors. Fiquei nesse negócio de 59 até 91.
P/1 – Como se chamava seu primeiro posto?
R – Pires e Alvarenga.
P/1 – O Alvarenga vem de onde?
R – O Alvarenga vem da minha primeira esposa. Quando eu estava… Meu sogro era médico, quando eu era funcionário dessa firma e fiquei noivo. Conversando com o proprietário da firma que eu trabalhava, ele disse assim: “Ah, eu vou vender isso.” Ele entrou na política e resolveu: “Vou vender o meu negócio.” Aí eu mais meus irmãos: “Vamos comprar isso?” “Vamos.” Só que nós éramos três em uma situação financeira mais ou menos igual.
Cheguei em casa noivando, falei com meu sogro: “Olha, eu estou… Vamos ver se compramos a firma do Zito Matoso, o posto.” Ele falou assim: “Olha, se você quiser eu entro como sócio.” Ele era um médico em uma situação financeira melhor e arrumou um irmão dele que era dentista [como] sócio, então nós fizemos uma sociedade, os três. Era eu, Pires, e os dois Alvarenga. Ficamos até 91. Meu sogro, antes… Quando chegou 80 e poucos, por aí, eu comprei a parte deles também.
P/1 -
E o senhor se casou quando?
R – Eu casei… Eu costumava brincar com a minha esposa que eu casei por necessidade, porque eu não tinha tempo para noivar. Quando eu comprei o posto... Compramos em 58, eu já era noivo. [Em] outubro de 58 nós compramos a firma. E eu trabalhava [das] seis horas da manhã até as dez da noite. Eu falei com ela: “Vamos casar que nós resolvemos o problema, né?” (risos)
Casei no dia sete de fevereiro de 59. Casei e vivi com a minha esposa, ela veio a falecer coincidentemente hoje, faz dezoito anos. [No] dia 25 de julho de 85 ela faleceu. Vivi 26 anos... Eu costumo dizer que eu vivi 26 anos de lua de mel.
P/1 – Que bom.
R – Foi um período muito bom da vida e aproveitei bem. Às vezes eu olho para trás e falo assim: “Como Deus foi bom comigo, né?”
P/1 – Com certeza. E o senhor entra na política quando?
R – Eu entrei na política quase que por um acaso. E costumo dizer que nada acontece por um acaso. Na hora que eu olho para trás, eu às vezes vejo que as coisas vão encaixando. Eu sempre fui procurado… Eu fazia parte do Valério, da diretoria do Valério; fazia parte da Associação Comercial e sempre me procuravam para ser candidato a prefeito. E eu: “Não, eu não mexo com política.” E minha esposa, quando às vezes eu chegava em casa e falava com minha esposa assim: “Eles estão me procurando para ser candidato a prefeito.” “Se você for candidato a prefeito nós vamos separar.” Ela sempre brincava comigo isso.
Ela veio a falecer. E quando a minha esposa faleceu eu comecei a analisar a vida um pouco diferente. Eu disse: “Gente, Deus já foi muito bom comigo, já me deu muito mais do que eu esperava, ou até o que eu acho que eu merecia, então eu vou fazer o seguinte: eu vou pôr uma mala no porta-mala do carro com a minha roupa e se amanhã eu quiser ir para Belo Horizonte eu vou. Se de Belo Horizonte eu achar que eu devo ir para o Rio eu vou. Vou passar meus negócios para a frente e vou viver uma outra vida.” Só que isso é muito bom você falar e um mês, dois meses. Depois você vê que não é nada disso.
Aí o que é que aconteceu? Nesse período eu fui eleito presidente do Valério Doce e fui eleito presidente da Associação Comercial de Itabira também. E quando eu fui eleito presidente da Associação Comercial, você acaba se envolvendo na política local. Você começa a enfrentar vereador, começa a enfrentar prefeito. Você começa a tomar decisões.
A Associação Comercial de Itabira ainda é atuante, mas naquela época ainda era mais atuante. E aconteceu que nós tínhamos uma preocupação com Itabira. O que será de Itabira quando acabar o minério? Essa é uma preocupação que existe em Itabira, então falei assim: “Ora, vamos começar a fazer um movimento dentro da Associação, pensando no futuro de Itabira. Itabira vai ser o que nós quisermos. Nós é que vamos ditar o que Itabira vai ser.”
Dentro da Associação Comercial nós tínhamos um projeto, Itabira 2025. Era quando a Associação Comercial de Itabira faria cem anos e quando previa-se que o minério de Itabira acabaria. E esse projeto foi… Entrou a comunidade, o empresariado local, a Vale do Rio Doce entrou. E me parece - me parece não, nós marcamos uma viagem ao Paraná. Dos empresários da Associação Comercial com a Vale, com os vereadores, o prefeito, ao Paraná para que a gente vislumbrasse alguma coisa que pudéssemos fazer em Itabira. Eu [era] presidente da Associação e chegamos a ir a Curitiba, Toledo, Foz do Iguaçu, Cascavel, conhecendo aquela cidade para ver se dentro do projeto lançava alguma coisa logo em Itabira. E como presidente da Associação Comercial eu tomei uma frente muito grande desse movimento.
Eu costumo brincar que foi crescendo o movimento, você vê a Associação Comercial, que nós chegamos…
Voltando um pouquinho, nós voltamos à conclusão que se Itabira quisesse mudar nós tínhamos que assumir a prefeitura, para fazer que Vale, Prefeitura e o empresariado participassem com um movimento diferente. E a hora que eu assustei, eu era o candidato a prefeito. Eu não queria de jeito nenhum. “Ah, mas você está fazendo isso. Você está querendo jogar os outros no fogo e você não quer?” Aí que eu costumo dizer: “A hora que eu assustei...” Deu cinco minutos de bobeira. Eu falei assim: “Eu vou pensar.” A hora que eu falei que ia pensar eu já era candidato a prefeito.
P/1 – Que partido lhe convidou?
R – Eu não era filiado a partido nenhum. Eu nunca tinha participado da vida política. Isso foi final de 91, a eleição era [em] 92. Aí me perguntaram: “Qual o partido que você vai filiar?” Disse: “Para mim partido é tudo igual, o que faz a diferença dos partidos são as pessoas. Os partidos são as pessoas, o partido é bom.” Porque às vezes não adianta falar: “O partido tal em tal lugar é bom.” Se na outra cidade ele não tem gente boa ele não é bom, então para mim qualquer um é a mesma coisa.
Os partidos têm donos. O PMDB já tinha dono, o PSDB já tinha dono. O PFL já tinha dono, o PT já tinha dono. Não existia o PDT em Itabira. “Pode ser o PDT?” Eu disse: “Para mim não tem diferença, não.” Então [me] filiei ao PDT em fevereiro de 92, faço parte até hoje do PDT. E às vezes… Um dia eu falei isso até com o Brizola, virei para o Brizola e falei assim: “Olha, eu estou no PDT como poderia estar em qualquer partido.” Ele: “Opa.” Ele assustou. “Por quê?” Eu contei a história. Realmente eu poderia estar em qualquer partido.
Foi em 92 que eu comecei a minha vida política.
Eu me candidatei a prefeito em 92. Foi uma luta do empresariado e até a própria Vale teve uma participação na minha eleição. Nessa época, tinha em Itabira o superintendente que eu tornei-me um grande amigo dele: Ricardo Dequech. Foi uma pessoa que fez uma força muito grande para que eu pudesse ser candidato a prefeito. E foi um braço direito até na minha candidatura. Talvez, se ele não tivesse empenhado tanto, eu não teria sido candidato.
P/1 – Quais eram os principais pontos dessa plataforma - eu imagino que era a sua plataforma -, Itabira 2025? Quais eram os principais pontos?
R – A plataforma era a industrialização de Itabira. Foi um trabalho que nós fizemos, porque na política às vezes você sonha muito, depois você vai ver que as coisas não funcionam como você imagina. Nós fizemos um trabalho todo voltado para a industrialização. Tinha um Distrito Industrial Número Um lá que estava fechado. Começamos a investir no distrito, facilitar. A cidade tem uma arrecadação muito boa do royalty, com apoio da própria Vale, conseguimos levar indústrias para Itabira. Chegamos até… Quando eu saí da prefeitura, em 1996, nós já tínhamos criado 2400 empregos diretos. O Distrito Industrial Número Um estava cheio e fizemos dois, em uma parceria Vale e prefeitura. Fizemos dois, só que aí não… Como diz o outro, eu saí [e] a história virou outra.
P/1 – Normalmente, quando um político assume a administração ele encontra surpresas, né? Que ele não… Que a imprensa às vezes não divulga, que na hora que ele assume... O ar teve alguma surpresa quando assumiu em 93?
R – Tive surpresas. Surpresas agradáveis, né? (risos) E na época isso foi até muito comentado. Porque até a imprensa mineira… Eu, dentro da prefeitura… Às vezes eu já tinha [ideia], já não era muita surpresa porque dentro das minhas brigas como presidente da Associação Comercial a gente já tinha vislumbrado isso. A Prefeitura tinha, como eu disse, uma receita muito boa. As obras eram superfaturadas e aquilo estava trazendo um prejuízo sério.
Quando eu entrei, [no] princípio de 93, eu fui vendo. Quando eu cheguei, em um determinado momento eu encontrei um grupo… O prefeito tinha construído três grupos. Um grupo tinha… Aí nós mandamos fazer o levantamento em dólares. Naquela época, a inflação era muito alta; não havia muita maneira de você, em cruzeiros, saber se era superfaturada ou não. Um grupo tinha ficado em 65 mil dólares, o outro tinha ficado em oitenta e o outro tinha ficado em 120 mil dólares. Igualzinho, a planta era a mesma, aí eu resolvi a fazer um levantamento daquilo. Contratei uma auditoria e constatamos que em um ano Itabira foi lesada em dez milhões de dólares. Em um ano.
O que é que eu fiz? Eu cheguei e entreguei aquela auditoria para a Câmara. Eles acharam que aquilo era demais, chegaram para entregar para a promotoria. Lamentavelmente, até hoje não aconteceu nada. Isso foi só em um ano. E acredito que nos quatro anos aquilo tenha sido muito pior.
Essa foi uma surpresa. E eu entrei na prefeitura, Arnaldo, em uma situação, como eu disse a você. Eu estava, na minha vida… Eu tinha perdido a minha esposa, achei que o mundo para mim já tinha… Não vou dizer terminado. Mas quando eu fui
candidato eu fui de uma maneira contra, não era o meu desejo. Eu dizia para a turma assim: “Eu vou ser candidato a prefeito, desde que seja à minha maneira. Eu não aceito interferência. Eu vou administrar a cidade da minha maneira. Se vocês quiserem, pensem bem, porque depois vai ser tarde.”
Na hora que eles falaram que aceitaram eu fiz uma declaração que registrei em cartório, doando meu salário de prefeito durante os quatro anos. Meu salário foi doado para entidades da cidade. Eu não quis fazer daquilo um meio de vida, então a política… Eu entrei com um idealismo. Eu entrei achando que eu estava cumprindo até uma missão.
Quando eu fui para a Prefeitura, que eu vi aquele rombo na prefeitura [de] superfaturamento eu assustei. Assustei e acreditava que a Justiça iria tomar providência. Eu fui ao Tribunal de Contas, fui ao Ministério Público. Eu fui a tudo. Tomou. Cassaram o prefeito, seus direitos políticos, mas ele entrou com recurso. Daí a dois anos ele estava [se] candidatando a deputado estadual, ganhando.
Qual é a impressão que fica? Se eu dei uma denúncia que tornou pública, se ele não foi punido, é sinal que tudo é mentira. Eu falo que o mal da política é que você nivela por baixo e não por cima. Essa é o grande mal da política. Quando você é político, chegam perto de você e falam assim: “Todo político é safado.” Você entrou no meio, quando, na realidade, existe muito safado mas existe muita gente boa. Você não nivela com aqueles por baixo. Você é candidato a deputado, a prefeito e aí entra um candidato que não tem a menor possibilidade, não tem nada que… Um safado, um doido; te chama de safado, vagabundo e você se iguala com ele. Lamentavelmente, esse é o grande mal da política.
P/2 -
Seu Olímpio, como foi a disputa, como foi a campanha?
R – Uma campanha muito dura. Nós éramos três… Éramos cinco candidatos. Itabira devia ter naquela época em torno, quase coisa de 46 mil votos apurados. Tinha o candidato do prefeito, tinha um candidato do PT, eu. Tinha um candidato que era o ex-presidente do Sindicato Metabase e tinha um irresponsável lá que candidatou,
então [eram] esses cinco. Quando eu entrei na campanha eu tinha dois por cento nas pesquisas. Você vê, em quarenta e poucos mil votos eu ganhei a eleição com 172 mil votos. Foi uma eleição muito disputada.
P/2 -
E a que o senhor atribui essa ascensão?
R – Foi uma determinação. Primeiro eu acho o seguinte: eu sou uma pessoa determinada. Se eu entro em uma coisa, eu entro para fazer bem feito. E eu não entro para perder, eu entro para ganhar. Eu vejo sempre a possibilidade. E o grupo era um grupo muito forte. Um grupo que tinha um desejo forte, então aquilo foi… Não foi, vamos dizer assim… Nós estamos falando aqui de Olímpio Pires Guerra, lá em Itabira eles me chamam de Li. Não foi o Li somente, foi o grupo todo que lutou para o mesmo ideal e isso fez que a gente ganhasse a eleição.
P/1 – O senhor tinha oposição dentro da Associação Comercial, não?
R – Não, não. A Associação estava unânime, estava lutando. A Associação Comercial foi o fator preponderante para a minha vitória porque quando eu me candidatei eu pedi uma licença. E aquele vice que entrou, ele trabalhava com tanto entusiasmo, como se fosse ele o candidato. E o grupo todo. Toda a diretoria, todo o empresariado, foi uma luta sim.
Veja o seguinte: o prefeito tinha o grupo dele. O PT era mais assim, vamos dizer, trabalhador. Tinha o presidente do sindicato, que era também (riso) do trabalhador. E eu do empresariado. Era uma luta aí mais ou menos desse tipo. Foi uma campanha muito, muito dura. E foi assim, veja que naquela época a apuração demorava três, quatro dias. Eu comecei a apuração do… No domingo mesmo que começou a apuração eu estava perdendo. Cheguei a… Na segunda-feira eu tinha mil e tantos votos contra.
P/1 – Menos.
R – Estava perdendo por mil e tantos votos de diferença. Na terça-feira de manhã eu comecei a passar na frente. Terminou na quarta-feira a apuração e aí eu cheguei a por uma frente maior, foi caindo, até ficar nos 172 votos.
P/1 – O senhor acha que o apoio que teve da Vale o ajudou ou o prejudicou perante o eleitorado?
R – Ajudou. A Vale, dentro daquele… Não foi um apoio assim aberto, mas tinha o Dequech, que era o superintendente, e muitos funcionários, gerentes da Vale, todos estavam juntos, então ele foi fundamental. Quando você ganha uma eleição por 172 votos em um eleitorado de 45 mil votos… Eu falo que nunca vi tanta gente dizer que: “Eu fui o responsável por você ter ganho a eleição.” Eu acho que eu mesmo tive pouco voto. Porque na realidade todo mundo chega falando assim, eu vi candidato a vereador que teve duzentos votos falar assim: “Se eu não fosse candidato você não ganharia.” Mas a realidade [é] que a Vale foi importante na minha eleição.
P/1 – E como foi a sua relação enquanto prefeito com a Vale?
R – A minha relação com a Vale foi excelente porque era presidente da Vale naquela época o Wilson Bruno. Depois passou para o Schettini.
Eu tinha um irmão que foi colega do Wilson aqui na Vale, eles trabalharam juntos, então eu, o Wander Jeveaux. O Wander era o vice-presidente da Vale, então tinha esse relacionamento muito bom.
Saiu o Wilson e entrou o Francisco Schettino, que era uma pessoa que trabalhou na Vale, um engenheiro da Vale. Eu tive um conhecimento muito grande com ele, era uma pessoa até ligado assim, vamos dizer. O meu cunhado era assessor dele na Vale aqui no Rio, então minha ligação com a Vale, com o Schettino era muito… E com o Ricardo Dequech, que era o superintendente, então a minha ligação com a Vale foi ótima naquele período.
Nós… Uma parte da minha administração, eu tenho até que creditar o sucesso dela [a] essa parceria com a Vale. Nós fizemos uma parceria… Não era uma parceria “ver o que é que a Vale vai fazer”. Nós fizemos uma parceria voltada para o desenvolvimento do município. “Nós queremos que a Vale dê isso assim e assim.” Não. “Nós queremos que a Vale participe do desenvolvimento da cidade.” Essa era uma mentalidade que nós tínhamos e que funcionou durante uns quatro anos.
P/1 – Como é que isso se materializou? Quer dizer, como é que sua relação e essa cooperação se materializou no seu governo?
R – Ora, o que é que acontecia? Se eu… Eu trocava muita opinião com o Dequech. Às vezes o Dequech, chegava a tardinha ele me ligava: “Li, vai lá para casa vamos comer uma carne, um churrasco lá?” “Vamos.” E ali a gente trocava ideia. “Vamos fazer isso, vamos fazer aquilo.”
Eu tinha funcionários da Vale trabalhando comigo na prefeitura, pessoas que eu achei que eram importantes para a minha administração e que foram realmente importantes. A Vale cedeu durante um ano, o primeiro período. Aquele período, por exemplo… Eu me lembro de um funcionário da Vale que foi muito importante. Todos foram, mas esse, talvez por aquele momento que a prefeitura estava vivendo desse superfaturamento, ele foi o secretário de administração, onde toda concorrência passava na mão dele. Era o Fabrício Denis. O Dequech me cedeu esses funcionários.
[Ele] trabalhou durante um ano e ali a gente trocava, trocamos essas ideias. A gente vai fazer uma obra; pegava às vezes o Grupo Vale para nos dar uma… Ser parceiro naquilo, parceiro mais nas ideias. Se íamos fazer o Distrito Industrial Número 2, a Vale entrou com recurso para fazer esse Distrito 2. Eu não queria, eu falei assim: “Eu não quero da Vale que ela me dê dinheiro para hospital. Eu não quero que ela me dê dinheiro para estrada. Eu quero que ela me dê dinheiro para desenvolvimento.” Desenvolvimento é o quê? O fator de desenvolvimento é o Distrito Industrial. Então vamos deslanchar esse Distrito Industrial para que a gente de Itabira possa viver independente. Eu queria a Vale como parceira e tivemos, durante esses quatro anos.
P/1 – O senhor pegou o início do governo Itamar, não é, quando o senhor assumiu?
R – Não, o Itamar…
P/1 – 93.
R – Foi, como é?
P/1 – Governo Federal.
R – É, era o governo, era o Itamar.
P/1 – Itamar, em 93?
R – Foi Itamar sim. Durante dois anos.
P/1 – Depois FHC.
R – Mais de dois anos. O Itamar entrou… Como é que foi? O Itamar entrou porque o Collor foi cassado, então não foi questão de dois anos. Depois entrou o Fernando Henrique. O Fernando Henrique foi que eu fiquei, peguei dois anos.
P/1 – E como o senhor diz a Vale cedeu alguns funcionários. Pelo fato dela ser estatal na época, o senhor acha que facilitava esse tipo de intercâmbio?
R – Eu vejo assim, é questão de relacionamento, sabe? De comprometimento. Por o Dequech ter sido uma pessoa, um superintendente... Dele ter essa ligação, nós temos essa ligação muito forte e ele ter trabalhado para que eu fosse candidato a prefeito. Aí entra o Schettino, que era meu amigo, então as coisas ficaram muito mais fáceis.
Eu vejo a questão da Vale privatizada assim: trouxe problema para Itabira a privatização? Não deixa de trazer. A privatização trouxe problemas que… Diferentes, até. Mas o relacionamento, se ele for bom, eu acho que a Vale vai querer o bem da cidade. Ela deve querer. Se ela queria há vinte anos, há dez anos, há cinco anos
ela quer hoje porque ela faz parte da cidade. Ela está integrada na cidade. Então eu acho que esse depende muito do relacionamento Vale [e] Prefeitura.
P/1 – O senhor falou que foi presidente do Valério Doce, né?
R – Sim.
P/1 – Que é ligado à Vale, pelo menos de fundação. E a sua família tem uma série de ligações com a Vale também, né? Fala um pouquinho disso, do seu…
R – Ora, eu tenho algumas coisas que aconteceram na minha vida. Eu fui diretor do Valério Doce de 1963 a 90. São 27 anos. A Vale, funcionário…. Naquela época o diretor do Valério, o presidente do Valério era nomeado pela companhia. Ele não… O presidente do Valério não era eleito. O superintendente indicava: “Fulano vai ser o presidente.” Normalmente era engenheiro da Vale para ser o presidente. Mas com esses todos eu tinha ligação boa, então eu entrava e saía.
Nesse 90 eu não fui direto, então eu tive essa ligação muito forte com essas pessoas que estavam [lá] e sempre [que] eu saía vinha um: “Ah, você tem que me ajudar.” Aí eu voltava. Quando chegou nesse período que o Dequech foi para Itabira, a Vale resolveu a entregar o Valério para a comunidade. Como eu tinha uma ligação muito forte, eu fui o primeiro presidente eleito do Valério. Fui eleito em 90, meu mandato ia até final de 93. Como eu [me] candidatei a prefeito e ganhei, eu renunciei.
Eu tive a minha ligação com o Valério, é uma ligação fortíssima porque quem viveu praticamente trinta anos... De 63 a 92, foram trinta anos. E como prefeito eu passei a ajudar o Valério financeiramente, porque o Valério sofreu um baque muito grande nesse desligamento da Vale.
Como que funcionava o Valério? Todo funcionário da Vale era sócio do Valério, descontado em folha. E aquilo que o Valério arrecadava de sócio ela dava do mesmo montante. Se ele arrecadava, suponhamos, cinquenta mil reais de associado, ela dava outros cinquenta mil. Pagava todo transporte do Valério, dava todos os funcionários para o Valério. Então quando veio isso foi aquele baque que o Valério sofreu.
Primeiro foi a questão de sócio. A Vale entrou em um processo de enxugamento, então de seis mil sócios que o Valério tinha ele passou para dois. Ainda cortou a subvenção que dava, depois cortou os empregados, então o Valério passou a se ver por conta própria e vivendo dificuldades. Mas esse relacionamento... Minha ligação com o futebol foi muito grande durante trinta anos. Meus irmãos... Eu disse no princípio que o Élcio Pires Guerra, que é meu irmão, era funcionário da Vale em Itabira e foi transferido aqui para o Rio. Disse que ele tinha, trabalhava junto com o Wander Jeveaux, o Wilson Brumer. Depois ele foi ser até diretor da Fundação Vale do Rio Doce. E tinha o outro mais velho, Darci, que era funcionário da Acesita; a Vale compra a Acesita, ele vai para a Vale. Então fica com esses dois irmãos na Vale, eu por fora. Depois o Élcio… Os dois aposentaram e hoje continua a minha ligação. A Vale continua, tem o diretor da Vale. O Élcio Martins Guerra, que é diretor da Vale. Então a minha ligação com a Vale foi sempre muito próxima.
P/1 – A comunidade de Itabira acabou se amalgamando à Vale, não? Quer dizer, ao longo das décadas muitos itabiranos foram trabalhar na Vale do Rio Doce?
R – Ficou, como eu disse. Era o sonho do itabirano trabalhar na Vale. Era o emprego, a Vale sempre com os salários altos. Com uma tranquilidade, uma estabilidade que tinha a Vale, então o itabirano tinha um sonho de trabalhar na Vale. E isso foi ligando muito a Vale à Itabira. Às vezes, quando falam na privatização da Vale do Rio Doce, vem até um certo ciúme do itabirano porque a Vale deixou… Porque a Vale, até princípio de… Até 80, vamos dizer assim, a Vale era Itabira. Era a Vitória-Minas e Itabira. Aí depois veio Carajás, veio São Luís, veio o Brasil todo. Então Itabira não ficou sendo a… Porque o itabirano enxergava a Vale como uma parte da cidade. Essa era e é até hoje a visão, só que com ela privatizada mudou um pouco.
P/1 – O senhor falou de problemas, que a privatização da Vale trouxe vários problemas para Itabira. Que problemas foram esses?
R – O problema maior é a questão de salário. Eu tive até uma discussão com o presidente da Vale porque eu estou aqui falando bem da Vale, mas se eu tiver de falar mal eu vou falar. Eu acho que uma das coisas que me dá tranquilidade é eu não ter rabo preso com ninguém, e a coisa que eu gosto é deitar e dormir.
O que aconteceu? A Vale, no enxugamento dela… E é normal, cada um sabe onde é que dói a sua barriga. A Vale tinha salários ótimos. Vou dar um exemplo, foi uma vez que eu tive uma discussão com o presidente da Vale sobre isso. Um operador de máquina ganhava 1400 reais. [Com] a Vale privatizada, aquele mesmo operador ganha quinhentos hoje. Ele foi demitido ou entrou em um acordo, a Vale terceirizou, então o poder aquisitivo da cidade foi lá em baixo. Esse foi o maior problema da cidade.
P/1 – O senhor acha que houve outros? A privatização trouxe outros problemas?
R – Não, não vejo outros problemas. Não vejo assim. Vejo esse problema do poder aquisitivo que não é um problema [da] Vale, é problema do país. O desemprego está aí. A Vale tem que aproveitar, ela vai ter que fazer; se ela acha quem trabalha por quinhentos ou seiscentos ela vai pagar.
P/1 – E instituições como o Valério Doce? Quer dizer, a Vale ela mantinha ou ajudava manter outras instituições que, com a privatização, saiu dessa manutenção? Ou não? Em Itabira?
R – Não, não. Não vejo. Só se for assim…
P/1 – Escolas, hospitais?
R – A Vale, por exemplo, eu vou dar… Eu acho que por um dever de justiça eu não posso deixar de fazer isso. Quando eu assumi a prefeitura de Itabira, quando eu ganhei a eleição, Itabira passava por um momento muito difícil no ensino superior. Isso [em] 92. Não houve nem… A faculdade de Itabira fechava-se; não houve nem vestibular nesse período. Então um dos primeiros problemas que eu enfrentei antes de ganhar a eleição [foi]: como nós vamos resolver o problema da faculdade? Aí entrou o Dequech. O Dequech, o Bispo, o Domário.
Eu assumi. Cheguei assim: “Nós temos que resolver esse problema.” A faculdade tinha 113 alunos. Fizemos diversas reuniões. Chegamos à conclusão que devíamos criar uma fundação para tomar conta do ensino superior. Como? Vamos ver e nomear. Eu, como prefeito, nomeei o meu secretário de Educação para resolver. O Bispo ficou à frente, o Dequech nomeou outra pessoa e chegamos à conclusão que nós tínhamos que criar essa fundação, mas se precisava de dinheiro até para bancar a dispensa daqueles funcionários da Fidic, da qual a Vale tinha uma ligação também muito forte.
Na época foi combinado o seguinte: a Vale entra com 215 mil dólares e a prefeitura com 215, para fazer um fundo para resolver esse problema. E foi criada então a FUNCESI, que é hoje um dos maior orgulho de Itabira. Ela tem mais de dois mil alunos hoje. E eu tinha feito uma negociação com a Vale do Rio Doce com o Schettino, o Dequech comprando o escritório do Areão, uma área da Vale. Uma área muito grande, isso na época gerou uma polêmica. Porque um grupo achou, os adversários – geralmente os adversários políticos – achavam que a Vale tinha obrigação de dar aquilo para a cidade. E nós compramos aquilo por, em dinheiro da época, um milhão de reais. Barato. Dessa área do escritório do Areão, tinha uma área [de] mais ou menos uns quarenta mil metros. Então o que é que eu fiz? Eu doei uma parte dessa área para a faculdade. Ali foram construídos, hoje já tem cinco prédios, já vão partindo para o sexto. E foi a solução do ensino.
Então a Vale tem uma participação muito grande nessa parte do ensino lá, mas ela sempre participava assim: assumir ela não assumia. Sempre, se chamasse a Vale por exemplo, nessa época da FUNCESI: “Vamos participar?” “Vamos participar.” Ela era… Participava da FIDE [Fundação Itabirana Difusora de Ensino], que era uma outra escola que tinha lá, ela participou. Ela que ajudou a criar.
A Vale esteve sempre participando desses movimentos de Itabira.
P/1 – E quais são os maiores problemas que o senhor enfrentou na prefeitura?
R – Você fala de problemas de…
P/1 – Políticos. Problemas administrativos, enfim. Enquanto prefeito.
R – Como eu disse no princípio, eu não aceitei imposição de ninguém. E me lembro, o meu grupo que era da Associação Comercial, logo que eu ganhei houve aquela expectativa: quem vai ser o secretariado. E eu não falava, aí me chamaram em uma reunião da Associação Comercial: “Nós estamos sentindo que você até hoje não anunciou o nome do secretariado. Você deve estar meio perdido e nós temos aqui uma relação de nomes para te passar.” Eu falei assim: “Vocês lembram quando eu disse para vocês que era à minha maneira? Fique com essa relação, guarde ela porque eu já tenho meus nomes. O dia que eu tiver, achar que deva ser comunicado vocês vão ficar sabendo.” Foi aquele clima, de aquele susto. Eu disse assim: “Vocês tem mais alguma coisa para falar?” Então eu fui mostrar, eu impus uma condição porque eu não queria ser candidato a prefeito. Então eu escolhi e dentro dos meu secretariado eu peguei aquelas pessoas que tinham… [Que] a Vale tinha preparado. A Vale tinha investido fortuna nessas pessoas e alguns se aposentaram, outros entraram em acordo com a Vale, mas eram pessoas capazes, então eu peguei aquele grupo que não tinha comprometimento. Eram técnicos, não eram políticos. E trouxe para o meu governo.
Eu peguei um rapaz de 23 anos [e] falei assim: “Você vai ser o meu secretário de Desenvolvimento Econômico.” Foi aquele susto. Menino, foi a minha revelação. Para vocês terem uma ideia o menino, quando o Fernando Henrique ganhou a eleição, ele acabou fazendo uma ligação com o Paulo Haddad – tinha 25 anos. Ele foi convidado para o BNDES e não quis. Depois ele foi ser secretário do Itamar no governo de Minas. Foi secretário de Planejamento, secretário de Administração. E ele me falou um dia assim: “O seu secretariado é melhor que o do Itamar, do governador do Estado. São mais competentes que o do Itamar.” Porque eu tinha escolhido a dedo, então eu não tinha grandes problemas. Meu problema maior, às vezes, era com meu grupo que não concordava que aquilo… Que eu tinha que fazer política. E eu achava que tinha entrado com um propósito, que era de diversificar a economia do município, então eu fazia tudo aquilo que eu tinha, aquele compromisso que eu tinha assumido publicamente eu fazia.
Não tive grandes compromissos, brigas políticas, a não ser quando veio a denúncia do governo. Aí nasceu, do governo passado… Aquele que eu tinha sucedido, nasceu uma rivalidade, uma briga. Mas não me trouxe grandes problemas, tanto é que eu tinha em… O meu candidato perdeu a eleição. Política é um negócio que a gente às vezes não…
P/1 – O senhor atribui a que, isso? Essa derrota do seu candidato?
R – Eu atribuo o seguinte: esse Jackson, que foi o prefeito que foi me suceder, ele já tinha sido candidato duas vezes. Era a terceira vez. Ele era aquela… Passou a ser uma esperança do povo itabirano também. Mas eu tinha, meu candidato tinha... [No] dia 26 de setembro 96 - nós estávamos a uma semana da eleição - meu candidato tinha 20%. Tenho essa pesquisa guardada comigo. Meu candidato tinha 20% de aceitação e eu tinha 88% de aprovação, então o povo estava satisfeito. Tanto é que depois disso eu me candidatei a deputado federal e ganhei com uma votação história em Itabira. Por que? O povo acreditava no meu governo, mas não acreditava no meu sucessor.
P/1 – O senhor não conseguiu transferir, né?
R – Não consegui. Voto você não transfere. E eu tinha um excelente candidato, uma excelente pessoa, mas ele não conseguiu transmitir isso para o...
P/1 – Será que é porque ele era técnico e não político?
R – Não, ele não era muito técnico. Ele tinha um defeito assim: a pessoa o via como um sujeito meio metido, quando na realidade ele não era. Ele era desligado. Se ele estava conversando aqui ele chegava, fumava um cigarro, punha o cigarro... Ficava olhando para cima. Ele era… Gostava da política, mas não tinha… Você não sabe o que o eleitor quer, às vezes.
P/1 – Qual era a origem dele? Era vereador?
R – Médico.
P/1 – Seu Olímpio, como prefeito ainda, qual era a sua relação com o funcionalismo? Já que o senhor se mostra famoso pela pontualidade e devia ser rigoroso também com seus funcionários. Como era a sua relação com o funcionalismo da Prefeitura de Itabira?
R – O meu relacionamento com o funcionalismo foi excelente. E até hoje, quando eu encontro com um funcionário e vejo diversas pessoas até que eram contra mim politicamente dizer: “O melhor prefeito que teve para o funcionalismo foi você, porque na sua época trabalhava-se. Não tinha negócio de corredor, não. Você deu tudo que nós tínhamos direito e cobrou também.” Eu fazia isso. Eu dava e cobrava.
Eu não… Eu me lembro, eu tive diversos assessores de secretário porque eu adotei uma postura na prefeitura. Eu nomeei os meus secretários, então eu dizia para o secretário assim: “Você nomeia quem você quiser para seu assessor.” Aí que eu... Você falou em problemas; às vezes eu cheguei a ter problemas com meus companheiros por causa disso, eles achavam que eu tinha que colocar político. E eu falava: “Não. Eu não quero indicar para o secretário fulano para trabalhar, porque na hora que eu for cobrar dele ele vai dizer: ‘A coisa não está andando bem porque você colocou fulano, que não trabalha.’” Então o secretário colocava quem ele queria. E eu cobrava dele. Eu me lembro de uma funcionária que trabalhou comigo quando o Secretário da Saúde virou para mim e falou assim: “Ela foi contra a gente na campanha.” Eu disse: “Não me interessa. Ela é boa funcionária?” “É.” “Então ela vai trabalhar.” Quando chegou a eleição para prefeito, quatro anos depois, ela chegou e foi lá falar comigo que estava pedindo demissão porque ela não… Eu tinha sido tão leal com ela que ela não podia exercer um cargo de confiança trabalhando contra o meu candidato. Eu disse: “Maria – chama Maria do Carmo – Maria, você está saindo porque você quer. Porque por mim, se você não fizer política dentro do serviço, você vai continuar.” Ela falou: “Não, eu acho que o senhor foi tão leal que eu não tenho o direito de fazer isso com o senhor.” Então ela pediu demissão.
Dois anos depois eu fui candidato a deputado. Ela chegou perto de mim e falou assim: “Onde o senhor puser o pé eu ponho atrás. O senhor foi o prefeito que eu sonhei. Eu briguei pelo que está aí e briguei com ele para sair. Porque eu imaginei que ele ia fazer igual o senhor fez, e ele não fez.”
Eu tenho diversos casos, o testemunho de funcionários da prefeitura onde eles me apontam como aquele que mais, vamos dizer, beneficiou, o que mais olhou para o funcionário. Mas eu cobrava muito. Na minha época, eu não admitia que funcionário ficasse no corredor batendo papo. Se fosse para bater papo vai para a sala dele, fosse para lá, mas no corredor não. Porque a condição…
P/1 – Quantos funcionários o senhor tinha?
R – A folha da Prefeitura tinha 1680 funcionários com mais 110, 120 terceirizados. Só a Prefeitura. Depois tinha o SAE, que é o Serviço Autônomo de Água e Esgoto, que tinha os seus 250. E tinha a Itaurb, que é a firma que cuida dessa parte de limpeza, que tinha seiscentos e tantos. Esse era o número de funcionários.
P/1 – E o senhor saiu da prefeitura com grande aprovação popular. Na época não havia reeleição, né?
R – Não.
P/1 – Foi a última eleição…
R – Foi a última eleição.
P/1 - Sem reeleição, a de 96. E o senhor nesses dois anos que ficou sem mandato, o que é que o senhor fez?
R – Olha, eu praticamente fiquei à toa, porque tem uma passagem que eu… Às vezes nem tudo são flores na vida, né?
Quando eu saí da… Quando eu fui para a prefeitura eu falei que eu fiquei à frente da firma Pires e Alvarenga até 91. E em 91 eu passei a minha firma para o meu irmão. Dei para ele 50% da firma e falei assim: “Olha, eu não quero trabalhar mais. Eu quero fazer o que eu quero na minha vida” e acho que eu já tinha feito a minha parte. Dei para ele. Quando eu saí, deixei uma firma assim… Foi de 59, outubro de 58 ao final de 91. Quando eu voltei para a minha firma, estava quebrada. Tinha deixado a firma em uma situação excelente - não era boa, [era] excelente e ele, lamentavelmente… Não foi desonestidade nem nada, ele não soube administrar aquilo. E eu confiei nele.
Na hora que eu voltei achei a firma em uma situação difícil. E quando eu saí da prefeitura… Eu falo que as coisas... Às vezes, Deus encaminha a gente. As coisas vão ser, eu tenho… Eu sou uma pessoa… Você me perguntou: “Qual é a sua religião?” Falou: “Católico e acredito muito em Deus.” Não sou daquele de ir para a igreja ficar batendo no peito, de ficar. Sou uma pessoa religiosa e acredito muito em Deus.
Quando aconteceu isso, esse meu irmão mais velho, o Darci, eu falei sobre ele. Ele virou para assim: “Você o que é? Eu sei viver a minha vida.” Eu [estava] tranquilo, tanto é que eu doei o meu salário durante quatro anos. Agora eu perdi a minha firma e perdi tudo o que eu tinha porque eu era avalista e tudo que eu tinha eu tive que pagar. E não deu para pagar. Aí eu falei assim: “O que é que a política me fez, né? Entrei para a política e acabei perdendo tudo.” Aconteceu o que aconteceu. Ele virou para mim e falou assim: “A única coisa que você tem hoje é voto. Pela administração que você fez, [se] candidata a deputado que você ganha.” Daí eu comecei a trabalhar para ser deputado, até por necessidade de vida. Porque naquela altura eu tinha uma… Era aposentado, são cinco salários mínimos. Então fui, comecei uma nova fase na minha vida.
Eu costumo dizer que a minha vida na política foi uma missão. Ela não foi nunca uma profissão, ela foi por idealismo. Quando eu entrei para prefeito eu fui empurrado; como deputado, quando eu voltei, que eu achei assim: “Agora eu vou ficar fazendo o que eu quero. Não vou, meus negócios estão aí.” Eu tinha três negócios: eu tinha um hotel, uma locadora e tinha uma concessionária. Com dois sócios. E todos os três negócios estavam [por] água abaixo. Então eu acho que porque Deus… Aí eu vejo as coisas de uma maneira diferente, porque Deus queria que eu continuasse na política. A única maneira dele me fazer continuar na política – eu não tinha terminado a minha missão ainda – era essa maneira. Então eu vejo que eu fui levado. Tem uma mão que parece que me leva para isso. E eu tenho um compromisso de fazer as coisas com muita seriedade, eu vejo que não é por acaso que eu estou na política.
P/1 – Como no Brasil a gente não tem o voto distrital, o senhor concorria com todos os outros candidatos a deputados do Estado?
R – Do Estado, é.
P/1 – Por uma cidade que é grande, mas não é também dos maiores colégios eleitorais. Como é que foi essa campanha? O senhor fez campanha em outras regiões de Minas?
R – Eu fiz campanha só na minha região. A minha administração, como eu disse, eu saí com 90% de aceitação. A minha administração foi tão boa que ela chamou atenção na região. Até hoje eu… No aeroporto ainda encontrei com uma pessoa da Vale que está aí. Parece que a Vale está discutindo acordo salarial. Funcionários da Vale de Carajás e um de Miami. Um deles ficou e falou assim: “Esse é o maior prefeito de Itabira de todos os tempos.” A minha administração chamou a atenção porque ela foi, realmente… Eu tenho consciência do que foi. A minha grande virtude como prefeito foi de escolher a minha equipe, porque você não administra nada sozinho. Então eu tive o privilégio de ter, e tive o privilégio… Às vezes eu briguei contra a privatização da Vale, mas eu usufruí muito da privatização da Vale porque ela dispensou técnicos. Dispensou, ao invés de entrar em acordo, o que eu pude aproveitar na minha administração da prefeitura. Foram suporte para mim, para que eu fizesse uma excelente administração, porque eram pessoas competentes que estavam preparadas, a Vale investiu fortuna neles.
P/1 – E como foi a campanha? O senhor correu a região?
R – Corri a região. Eu saía de casa [às] seis horas da manhã, chegava [às] dez, onze horas da noite. No dia seguinte, [às] seis horas estava saindo outra vez.
P/1 – Como é que o senhor fazia? Tinha carro de som? O senhor ia com motorista?
R – Não, eu tinha motorista. Tinha um carro e toda essa estrutura que eu tinha na prefeitura, dessas pessoas [com] que eu trabalhava, que [se] engajaram na minha campanha e falaram que era importante para Itabira a minha eleição. E trabalharam. Cada um tinha seu parente, tinha um amigo na região que me indicava. Eu ia. Então eu andei muito, mas muito mesmo. Foram uns quatro meses de pé na tábua, né?
P/1 – Como é a imprensa de Itabira? Itabira tem jornal diário?
R – Itabira tem um jornal diário. Itabira talvez seja a cidade que tenha o maior número de jornal por habitante. Eu não sei, na minha época tinha dezessete ou dezoito. Não é fácil você conviver com dezessete jornais. E hoje chegou uma época que me falaram que tinha 25, está só aumentando. Porque tem muito jornal em Itabira que sai de acordo com a necessidade do dono. Se ele precisa de dinheiro ele solta o jornal naquele mês. Se ele não precisa ele deixa para soltar no mês que vem. Mas tem jornais bons lá.
Tem hoje duas revistas. Uma revista já tem dez anos. Eu considero uma revista de nível, uma delas de nível muito bom. Para o interior eu acredito que seja das melhores. Essa já está com mais de dez anos que ela sai. Então tem uma imprensa boa, né?
P/1 – Rádio, né?
R – Rádio. Na época que eu fui prefeito eu consegui levar uma televisão para Itabira. Eu fui até o Ministro de Comunicações naquela época, Hugo Napoleão, e usei com ele uma chantagem no bom sentido. Nós temos lá a Fundação Carlos Drummond de Andrade e eu falei com ele que nós precisávamos de uma televisão para divulgar mais ainda. Com essa maneira acabamos conseguindo uma televisão. Tem uma televisão.
Se não me engano tem cinco rádios legalizadas. Fora as piratas, que deve ter umas dez.
P/1 – Qual era a sua relação com a imprensa?
R – Boa. Não tenho, eu sempre tive uma relação de… Eu não sou daqueles de… Eu dou para eles o que é deles e…
P/1 – Eles não faziam campanha contra o senhor?
R – Claro que tem nesses jornais... Tem [jornais] da oposição. Tem aqueles da oposição que fala, mas eu uso o seguinte: eu não respondo nada que fala ao meu respeito. Nem bem nem mal. Quem quiser me julgar que julgue. Se ele está falando mal de mim ele está perdendo tempo porque eu não leio.
Raramente eu leio um jornal de Itabira. Raramente. Não leio porque quando eu entrei na Prefeitura eu me preparei para isso. Eu falei assim: “Política, infelizmente, como eu disse, você nivela por baixo.” Você tem que ter um ouvido para entrar e outro para sair, porque senão você vai ficar doido.
P/1 – (riso)
R – Então eu falei assim: “O que é que eu vou fazer? Eu não vou ouvir rádio e nem vou ler jornal porque aí eu não tenho raiva deles. Eu nem sei o que é que estão falando.” Um dia chega, há pouco tempo chegou um jornalista ele falou assim: “Eu queria fazer uma entrevista com o senhor e, mas eu sou do contra. Eu sempre tive contrário do senhor, mas agora eu quero ver se o senhor pode me dar uma entrevista.” Eu falei assim: “Ora, se eu tenho tempo eu dou, se não tiver não dou. Ser contra ou a favor para mim não faz diferença, não. Eu dou entrevista do mesmo jeito. Agora você escrever contra mim você está perdendo o seu tempo. Você querer me atingir? A não ser que você esteja querendo atingir o povo lá, mas eu não. Se me perguntar o que você escreveu no seu jornal contra mim eu não sei.”
Outra coisa que eu adotei. Chegava na prefeitura, se o funcionário: “Ah, porque o jornal está falando...” “Vocês estão proibidos de trazer o que o jornal falou. Eu não vou administrar uma cidade pelo que o jornal fala. Não vou administrar uma cidade pelo que o rádio fala. Fica para vocês e não me tragam esse problema.” E assim eu convivi bem com eles.
P/1 – Como foi sua eleição para a Câmara Federal? O senhor teve uma boa votação?
R – Tive uma votação boa. Eu tive 42 mil… Não sei se são 711 votos. 130.410 em Itabira, o restante fora. Foi uma votação muito boa. E uma campanha difícil. [Em] uma campanha a deputado, como você disse, você não disputa com o… O seu adversário está dentro do seu partido, ele não está no outro partido. Porque você tem que ter mais voto que o seu adversário, que o seu companheiro. Não é que você vai assim: “Ah, o meu adversário é o PT ou o PSDB.” O meu adversário é do PDT, ele está dentro do PDT. Eu tenho que ter mais voto que ele. Então é difícil e você não sabe quem é. Você está enfrentando candidato do triângulo, do sul de Minas. De Belo Horizonte. Você está enfrentando e não sabe o que o sujeito tem de voto, né? Eu chego assim: “Eu tenho que ter é muito, porque ele pode ter mais do que eu.”
Agora mesmo que eu estava vindo, o PDT tinha um deputado. E ele veio no avião agora comigo. Ele foi a pessoa que fez força para que eu me candidatasse a deputado federal. Falei assim: “Ah, eu talvez candidate a deputado estadual.” “Não, candidata a federal. Você tem potencial.” Ele achava que eu não me elegeria, mas ele precisava de mim para arrumar voto para ele se eleger, por causa da legenda. E ele chegava perto de mim e falava: “Olímpio, como é que está a campanha?” Eu falava: “A minha campanha está mais ou menos.” Eu nunca falava como ela estava porque o meu adversário era ele. Eu sabia que era ele. Quando foi a véspera da eleição ele falou comigo: “Olha, eu estou sabendo que você está muito forte.” Falei assim: “Tomara que seja verdade o que você está falando.” Porque o seu adversário às vezes é seu amigo.
P/1 – E ele se elegeu ou não?
R – Não, ele não se elegeu.
P/1 – Naquela época não? Elegeu o senhor?
R – Eu que elegi. (risos)
P/1 – E como foi Brasília? Como é que foi?
R – Em Brasília foi... Brasília é uma expectativa diferente, é uma… Quando eu ganhei para deputado, fui eleito deputado, você assume. A hora que eu cheguei em Brasília, eu cheguei [e] falei assim: “E agora?” A hora que você olha lá na Câmara você está lá, Delfim Netto, Kandir, Miro Teixeira, Eliseu Rezende - todos aqueles que você via nas manchetes como ministros [são] seus colegas. Como é que eu vou competir com um homem que tem feito… Vou dar um exemplo do meu partido,
que é o Miro Teixeira. Tinha 28 anos de mandato. Você entra com um… No primeiro mandato eu falei assim: “Eu tenho que aprender a andar nisso tudo aqui.” É até uma deslealdade você competir com essas pessoas, então você encontra uma série de dificuldades. Não é fácil.
Você vai no Ministério falar com o ministro, o ministro não sabe quem é você. “Ah, o deputado Olímpio Pires está aí? Quem é Olímpio Pires?” Nós éramos 513, somos… Até hoje são 513 deputados.
Até que você aprenda a andar dentro da Câmara, a Câmara é um mundo. O meu gabinete era dos mais perto do plenário, [a] quinhentos metros do plenário. Aquilo é uma cidade. Durante as quartas-feiras devem passar na Câmara quarenta mil pessoas. E você ter que conhecer funcionário, conhecer ministério. Aquilo são dois anos de aprendizado. Você apanha, você vai aprender apanhando, mas eu sempre tinha uma facilidade de fazer amigos. E fui procurando dentro dos… Primeiro ganhar a confiança até dos meus companheiros de partido, depois dos funcionários da Câmara, depois dos funcionários do Ministério. Então eu, no segundo ano, já transitava bem na Câmara, [no] terceiro ano.
Foi um período diferente. Você fala assim: “Prefeito ou deputado?” É totalmente diferente. O prefeito, você convive direto com os problemas. Você resolve o problema da pessoa. Deputado você não resolve o problema, você está lá para fiscalizar e votar leis. O eleitor não entende isso, ele acha que você está lá para resolver o problema dele. Lá você não tem jeito, então tem essa diferença, que o prefeito convive com o problema e com a solução e o deputado não. Mas foi muito bom. Foi um período de aprendizado muito grande e de relacionamento que fiz. Valeu.
P/1 – O senhor teve algum projeto seu ou que o senhor se engajou que considera mais importante? Que marcou mais?
R – Ora, às vezes a pessoa fala em um projeto, um projeto se você conseguir... Eu vou dar um exemplo para você: eu entrei na Câmara em 99. Em 2000, eu entrei com um projeto onde o ano 2002 fosse declarado o ano Carlos Drummond de Andrade. E para eu fazer que fosse aprovado para 2002, eu consegui aprová-lo em fevereiro de 2002 - dois anos correndo.
Eu tenho outro projeto que eu entrei que era se… Está andando por lá. Pode ser que daqui a uns cinco, dez anos ele apareça por aí. Ou às vezes morre lá, porque são inúmeros projetos que tem lá. Aquele, dois assim. Um, que os carros fossem obrigados a fazer uma propaganda que acima de oitenta [quilômetros por hora] você corria risco de vida. Se você fuma, você hoje encontra em qualquer lugar: “É proibido fumar. O cigarro, você está com risco de morte.” Tem tudo. Então por que de um carro… Se nós temos uma velocidade permitida a oitenta, o carro faz a propaganda [com] oitenta, cem, 120... Um carro faz uma propaganda de duzentos, então que ele fosse obrigado a ter uma propaganda que acima daquela velocidade limite você estava correndo risco de vida. Mas é um projeto que mexe com grupos, né?
Outro projeto que eu tenho lá também… Eu tenho uns quatro ou cinco projetos lá, mas os dois que eu estou me lembrando agora… O outro é que você, quando vendesse um refrigerante pet, [com] embalagem de plástico, você fosse obrigado a recolher a embalagem. Porque onde é que nós vamos parar com esses plásticos? São projetos que estão, esses dois, mas eu tenho mais dois. Consegui aprovar esses dois, o Carlos Drummond de Andrade que foi uma luta.
Então um projeto… Às vezes você vê o sujeito em uma campanha assim: “Eu vou fazer um projeto de tal, desse jeito.” Ele não sabe a dificuldade que é um projeto. Vou te dar um exemplo desse projeto da área de mineração, que é a Parapanema, da qual o Dequech, que eu tanto falei dele aí, tinha interesse. Era para minerar em áreas indígenas. Um dia o Dequech me procurou para ver se eu ajudava a agilizar esse projeto. A hora que eu vi esse projeto, tem onze anos que ele está lá. A hora que ele chega em um determinado ponto, se tira ele de pauta. Aí ele volta, fica ali uns seis meses, um ano, vai. O projeto, às vezes, ele depende... Ele tem que passar por no mínimo três comissões, então qualquer uma que barrar ali ele não anda.
Outra vez eu peguei um projeto que o royalty que a Vale paga. Como é o pagamento do royalty? 65% é do município, 23% é do estado, 12% é do DNPM [Departamento Nacional de Produção Mineral]. O grupo do DNPM entrou lá querendo passar o município para 60, eles para 20 e o estado para 20. Eu embananei esse projeto um ano, até que eles me procuraram para entrar em um acordo. Eu falei assim: “Desde que o município não perca, porque eu estou aqui para defender o interesse do meu município.” Aí que ele começou a caminhar, também deve estar parado por lá até hoje - mas os municípios continuando com 65%. Você enfrenta dificuldades inúmeras na Câmara e que você só vai aprender com os anos, né?
P/1 – E o senhor falou agora essa questão da Vale, dos royalties. O senhor, enquanto deputado, qual a relação [que teve] com a Vale nesse período? Não só a sua relação com a Vale, mas de projeto, de coisas que envolvessem a Vale do Rio Doce?
R – Eu tive uma ocasião que a Vale tinha um projeto que… A questão de Carajás. A Vale estava tendo problemas com um projeto que ia ser votado. A Vale tinha pago, feito uma indenização daquela área, e os garimpeiros queriam retomar aquela área.
Foi a única vez que eu fui procurado pela Vale. Eu disse que eu tenho um sobrinho que é um diretor, o Élcio Pires. Ele me ligou, falou assim: “O presidente da Vale está viajando e esse projeto vai entrar em pauta. Nós gostaríamos que o presidente da Vale estivesse aí para dar uma opinião, uma participação, finalmente. Será que você consegue parar isso aí?” Perfeitamente. Fui até a mesa e pedi que aguardasse. Foi essa a única ligação que eu tive com a Vale.
O presidente da Vale na época era o Jorio [Dauster], então foi isso. Depois eu tive, acabei tendo um pequeno atrito com ele, que até chegou a estremecer o nosso relacionamento, mas eu disse para ele um dia: “Jorio, você é pago para defender os interesses da Vale. Eu sou eleito para defender os interesses de Itabira. Nós podemos ter uma convivência muito boa, mas vai chegar uma hora que os nossos interesses não são os mesmos.”
P/1 – Então o atrito não foi pessoal. Foi um atrito em tornos de questões da Vale?
R – Em questões da Vale em Itabira. Ele estava em uma reunião em uma comissão na Câmara. A Associação Comercial tinha me procurado porque a Vale tinha feito um compromisso com a cidade, com a Associação Comercial e por questão de terceirização de mão de obra ela levou um grupo de Carajás [e] terceirizou. Tinha duas firmas de Carajás que eram ligados de funcionário da Vale para tocar o serviço em Itabira e isso estava prejudicando as firmas de Itabira. E eles me pediram que eu intercedesse junto disso.
Eu fui conversar com o Jorio e expliquei para ele. Ele me disse que poderia ficar tranquilo, que ele iria resolver esse problema. Depois eu encontro com ele, ele me disse o seguinte: “Ah, isso não é do jeito que você falou.” E me respondeu de uma maneira meio ríspida. Eu disse: “Não, é pior do que você está imaginando então.” Aí houve esse estremecimento, foi quando eu disse para ele: “Jorio, você é pago para defender os interesses da Vale, eu respeito. Agora eu sou eleito para defender os interesses de Itabira e não vou abrir mão disso. Não é Vale, não é ninguém. Eu tenho um compromisso comigo mesmo.” Aí depois entrou o Mozart, que era diretor, e tinha um outro que estava como superintendente, como diretor da área de Itabira - eu não estou me lembrando quem é -, chamando uma reunião. Eu disse para ele assim: “Olha, eu estou… Brigo pela Vale e brigo contra também, se for preciso. Eu tenho um compromisso comigo que se eu achar que está errado eu vou, não vou.” Foi um momento assim, mas terminou tudo bem.
P/1 – O senhor mudou para Brasília quando foi candidato? Desculpe, deputado.
R – Eu morava em Brasília. Eu tinha apartamento em Brasília. Eu ficava em Brasília normalmente terça, quarta, quinta. Nos primeiros dois anos eu levei minha esposa. Mas ela era funcionária da Prefeitura, ela tinha tirado uma licença. Ela trabalhou comigo lá na Câmara. Foi muito importante a participação dela lá.
Ela teve que voltar porque não compensava mais a licença; [por] uma questão de aposentadoria ela perde aquele período que tirou de licença. Ela voltou, então eu passei a ir às vezes segunda-feira à tardinha ou terça-feira de manhã e voltar na quinta ou sexta-feira. Foram dois anos de caminhada para lá e para cá.
P/1 – E como é de Itabira para Brasília em termos de vida pessoal? Como é que é a vida na Capital?
R – Olha, as pessoas falam muito de Brasília. Eu gostei de Brasília. Achei Brasília uma cidade boa. Tem esse período que nós estamos vivendo agora - [em] junho, julho, agosto, Brasília é difícil. O clima é muito seco, mas é uma cidade boa e eu não tive dificuldade de [me] adaptar a Brasília, não. Gosto demais de Itabira, não deixo Itabira por nada, mas não tive dificuldade de adaptar, não.
P/1 – Suas bases, como é que ficaram lá em Itabira? Procuravam muito o senhor? Faziam muitas demandas?
R – Ora, a vida de deputado é muito difícil. Como eu disse, você é procurado demais. E [pra] duas coisas que você é procurado, a grande maioria: bolsa de estudo e emprego. Duas coisas que não existem. Às vezes você conseguia um emprego para um, você ficava feliz da vida: “Consegui resolver o problema.” Aí você arrumava briga.
P/1 – (riso)
R – Você conseguiu para um e deixou cem do outro lado sem emprego. “Por que ele e não eu?” Assim era bolsa de estudo.
Às vezes… Como eu disse, eu tinha uma ligação muito grande com a FUNCESI. Às vezes eles falavam… Ajudei demais a FUNCESI lá em Brasília. Meu trabalho, uma parte grande dele foi voltado para legalização de cursos da faculdade. E às vezes eu falava assim: “Vou arrumar uma bolsa para você. Nós temos...” A FUNCESI tem lá tantas bolsas de estudo que ela dá por ano, então para entrar uma é preciso que saia uma. Até no limite dela, né? Aí: “Ah, tem uma agora.” Você arrumava e pedia para ela. No fim, você pedia para a pessoa assim: “Pelo amor de Deus, não fala que fui eu que arrumei, não.” Passava a ser até um problema para você, então você enfrenta essa dificuldade.
Eu fui muito procurado, eu era um porta-voz da FUNCESI em Brasília. Eu estava constantemente no Ministério da Educação procurando… Você vê o seguinte, em meus quatro anos em Brasília, nós entramos com o pedido de cinco cursos lá: Turismo, Direito, Ciências Biológicas, Sistema de Informação e tem um outro que eu não me lembro qual. Esses quatro nós conseguimos com dois anos, o que é muito difícil você conseguir. Antes, a Faculdade de Itabira gastou dezoito anos para conseguir dois cursos, Administração e um outro. Foram dois. Mas por que? Era o meu trabalho nesse dia a dia lá, de ir ao Ministério. Você vai conhecendo as pessoas.
“Ah, como é que está agarrado no papel aí?” “Passei por cima, para frente e tal.” Com jeitinho você vai conseguir. Para a FIDE… Nós conseguimos um trabalho nosso lá. Desde o dia que entramos, em 99, começamos… Conseguimos dois milhões e quatrocentos [mil] para que ela pudesse fazer novos cursos, reformar a escola. Foi um trabalho que eu falo assim: “Eu tenho consciência de que produzi naquele período que estive em Brasília.”
P/1 – E o seu mandato terminou em janeiro deste ano?
R – Terminou em janeiro, dia trinta.
P/1 – E o senhor já vinha desenvolvendo alguma atividade paralela antes de janeiro?
R – Não, não. Eu estou aposentado e vivo da política.
Eu fiz uma ligação relativamente boa com o Aécio. O Aécio foi candidato a governador, a presidente da Câmara. Conheci o Aécio… Era às vezes de avião, um “Bom dia”, “Boa tarde”, “Como é que vai?” Um dia chega o Danilo de Castro, que é muito amigo do Aécio, virou para mim e falou assim… Eu fazia parte da comissão, da CPI da Nike. O Danilo chega e fala assim: “O Aécio vai ser candidato a presidente da Câmara. Está querendo ser.” O Aécio do PMDB e eu do PDT, partido contrário. Eu falei assim: “Danilo, se o Aécio for candidato eu voto nele.”
Na reunião seguinte encontro com o Danilo e falou assim: “Eu falei com o Aécio. O Aécio quer conversar com você.” Virei para o Danilo, falei assim: “Danilo, fala com o Aécio que não perca tempo comigo não. Meu voto ele já conseguiu, ele vai tentar os outros que o meu já é certo. E o Aécio está aí.” Aí o Aécio definiu que seria candidato.
Um dia, um jornalista me pega no corredor e falou: “Deputado, dizem que o senhor vai votar no Aécio para presidente da Câmara.” “Vou, ué.” “O senhor está traindo o seu partido.” Eu falei assim: “Eu posso estar traindo o meu partido, mas não estou traindo o meu Estado. Porque o Aécio é de Minas e eu tenho compromisso com o meu partido, mas eu tenho compromisso com o meu Estado. Então eu vou votar.”
Eu tinha ido almoçar em casa. O telefone tocou: era o Miro Teixeira. “Li, você vai votar no Aécio?” “Vou sim, Miro.” “Definiu?” “Defini.” “Então faz o seguinte: fale que o partido te liberou para votar no Aécio.” “Perfeitamente, Miro. Não tem problema, não.” Ele viu a minha determinação.
Acabei ficando amigo do Aécio. O Aécio é candidato a presidente da República, é candidato a governador. Ele já era presidente da Câmara. Um dia ele me chamou e falou assim: “Eu vou ser candidato a governador.” Eu falei: “Aécio, eu já votei em você como presidente da Câmara. Se você for candidato a presidente da República eu voto em você, se você for candidato a governador eu voto em você.” Acabou que ele foi ser candidato a governador e eu acabei assumindo. Assumi esse compromisso comigo mesmo, nem [foi] com ele. Ele foi em Itabira e eu tive um… Eu fui o deputado, durante os quatro anos, de maior presença na Câmara. Eu tive cinco faltas durante os 4 anos. Faltas assim: uma morreu, duas morreram, dois primos que eu fui no enterro. Uma o Itamar Franco ia em Itabira, [era] aniversário de Carlos Drummond de Andrade. E duas… Eu fazia parte da Comissão da Nike, estava presente em uma reunião em Goiânia, e a outra estava presente em uma reunião em Manaus, [em] que eles contam a presença da Câmara. Na realidade, eu tive três falhas durante os quatro anos, então eu fui o deputado de maior presença. Eu tive 98 e tanto [por cento] de presença durante os quatro anos, porque era compromisso para mim estar ali. Meu compromisso era aquele, de estar participando.
O Aécio vai a Itabira e no comício que fez em Itabira ele falou que… Falando sobre a minha pessoa ele disse que estava feliz de estar ali com uma pessoa que tinha compromisso com o país, que era aquele deputado que não faltava e estava presente em todas, participava de todas as reuniões e participava de todos os problemas.
Perdi a eleição para deputado. Teve candidato do meu partido que teve mais voto do que eu. O Aécio, eu não tinha encontrado com ele. Em final do mês de novembro... Princípio de novembro, dia doze ou treze, mais ou menos, eu chego na liderança do partido; o Miro Teixeira vira para mim e fala assim: “Li, vamos ali na presidência?” Eu já tinha pedido e não tinha encontrado com o Aécio. Eu disse assim: “Vamos.” E saí andando com o Miro Teixeira. Quando eu cheguei, o Aécio estava assim... Eu fui lá cumprimentar o Aécio. Falei assim: “Aécio, meus parabéns.” “Pôxa Li, eu estou chateado com a sua derrota.” E o Miro veio atrás. Eu saí, fui cumprimentar outras pessoas, aí o Miro me chamou: “Li, volta aqui. Vê o que é que o Aécio está falando.” Eu disse: “O que é que o Aécio está falando?” O Aécio falou assim: “Não, eu estou falando que eu preciso conversar com você depois.” O Aécio já tinha sido eleito governador do Estado.
Quando nós voltamos o Miro disse assim: “Ele não falou com você o que ele falou comigo, que ele estava sentido porque quem perdeu não foi você, não. Não foi Itabira que perdeu. Quem perdeu foi o país, que perdeu um deputado feito você.” E que ele… Eu falei assim: “Mas você, uma pessoa dessa perto de você não vai aproveitar seu governo.” “Não, vou aproveitar. Eu preciso dele.” E foi aí que ele falou. Então o Aécio tem um compromisso comigo. Eu disse: “Não Miro, eu não estou preocupado com isso. Eu acho que as coisas tem que acontecer naturalmente.” E de vez em quando o Miro fala assim: “Ah, e o Aécio?” “Não, eu não tenho encontrado com ele.”
O nosso mandato terminou [no] dia 31 de janeiro. [No] dia quatro de janeiro eu recebo um telefonema do Danilo de Castro, que é o Secretário de Governo, me chamando em Belo Horizonte. Ele falou: “O Aécio mandou que você escolhesse o lugar aqui para você. Ele tem um compromisso com você.” “Danilo, qualquer lugar para mim. Vocês é que vão falar aonde eu… Eu quero um lugar que eu possa trabalhar. Não quero um lugar para ficar recebendo sem trabalhar.” Aí ele falou assim: “Tem uma subsecretaria, tem isso, tem aquilo.” Ele falou assim: “Tem o MGS, que é uma firma que terceiriza mão de obra para o Estado. Ela tem 5800 funcionários, uma firma até [com] uma situação boa.” Eu disse: “Dá para trabalhar?” Ele falou assim: “Dá.” “Então pode ser lá. Vocês é que sabem.”
Eu estou lá com… Mais por um… Uma questão de não sei se amizade ou lealdade do Aécio comigo, né?
P/1 – E como é que está, essa empresa a sede é em Belo Horizonte?
R – É em Belo Horizonte.
P/1 – E aí pela primeira vez o senhor mora em Belo Horizonte?
R – Moro de segunda a sexta-feira em Belo Horizonte. Na sexta-feira, às sete e meia, oito horas da noite eu estou em casa. Estou em Itabira.
P/1 – Sua esposa está em Belo Horizonte?
R – Não, minha esposa está em Itabira. Ela trabalha, ela é funcionária da prefeitura. Às vezes,
[na] quarta-feira eu dou uma chegada em casa. Ou às vezes ela vem a Itabira na quarta-feira porque trabalha na parte da manhã. Então vamos adotando uma nova vida.
A gente… Eu acho que o bom da vida é que a gente está sempre recomeçando. Não são os setenta [anos] meus que eu falo… Às vezes eu falo com os funcionários da MGS, tenho hoje um grande relacionamento com boa parte deles. Eu falo assim: “Não vou dizer a vocês que a minha condição física é a mesma de vinte, trinta anos, mas a minha disposição é a mesma e com muito mais experiência.” E é isso que eu procuro fazer.
P/1 – Como é Belo Horizonte? Agora saindo de Brasília indo para Belo Horizonte, que tal a capital mineira?
R – Eu gosto muito de Belo, eu me adapto com qualquer lugar. Eu falei que Brasília é bom. Belo Horizonte também eu tenho… Em Belo Horizonte eu vivo o seguinte: eu saio às oito horas para o serviço. Chego em casa sempre de seis e meia para sete, faço uma caminhada e vou dormir. Tenho uma vida relativamente voltada para o serviço, mas gosto de Belo Horizonte.
P/1 – O senhor mora onde em Belo Horizonte?
R – Moro na Rua Alagoas, esquina com a Brasil. Eu moro ali na Savassi, naquela confusão. Mas nem... (risos) Mas na parte boa, gostosa. Perto até, coincidentemente, do serviço. Eu estou a quatro quarteirões do serviço.
P/1 – A MGS é onde?
R – É na Savassi... Na Praça da Savassi mesmo, ali no fundo, no miolo ali.
P/1 – Esquina de Getúlio Vargas com Cristóvão Colombo?
R – Getúlio Vargas com Cristóvão Colombo. Ali naquela... (risos) Naquela esquina ali.
P/1 – E nas suas horas de lazer, o que o senhor faz? Futebol?
R – A minha paixão é futebol. Eu costumo… Às vezes a minha mulher costuma brincar comigo: “Eu acho que você gosta mais de futebol do que de mim.” Eu falei assim: “Se você quiser eu vou deixar de futebol e vou ver outras coisas, né?” (risos)
P/1 – (riso)
R – Mas futebol eu gosto muito. Eu, às vezes… Hoje você tem televisão, você tem futebol segunda, terça, quarta, quinta, sábado o dia todo, domingo o dia todo, então eu… É claro que na vida política você passa a não fazer o que você quer. Você segue, hoje tem uma festa que você tem que ir. Tem um casamento, você tem que ir. Se tem um aniversário você tem que ir. Sempre tem uma coisa para fazer, você não... Mas a minha distração mesmo é futebol. Eu gosto muito de um futebol. Gosto muito do esporte em geral.
P/1 – Qual seu time de coração?
R
- Atlético.
P/1 – Atlético Mineiro.
R – Atlético e Valério, né? Eu sou, como presidente e diretor do Valério durante trinta anos, eu tenho... Às vezes eu enfrentava a situação difícil de jogar Valério com Atlético, né? E vou te contar uma situação: em 1966 para 67, deve ser um desses dois anos, disputava o Valério para não ser rebaixado e o Atlético para ser campeão. Se o Valério perdesse, ele seria rebaixado. Se Atlético perdesse, ele não seria o campeão. Eu tive que torcer contra o Atlético, né? (risos) Porque a minha situação…
P/1 – Era bem pior, né?
R – Era bem pior.
P/1 – É melhor vice-campeão do que ser rebaixado.
R – Do que rebaixado. (risos) Mas eu tendo… Eu sou uma pessoa muito ligada à família. Eu me preocupo muito com a minha família. Eu falei, eu me casei pela segunda vez pela Cândida, uma pessoa maravilhosa. Fiquei viúvo treze anos e achei que não me casava. Então quando eu falo, quando eu disse que às vezes as coisas encaminham para a vida da gente, eu já achava que não me casava mais.
Quando eu entrei na prefeitura, em 92, tinha sete anos que eu era viúvo. Perdi minha esposa em 85. Fui para a prefeitura, encontrei a Cândida dentro da prefeitura. Ela era funcionária da prefeitura.
Eu tive um casamento com a minha primeira esposa, a Frida. Vivi casado com ela 26 anos. Foi um casamento assim, eu costumava dizer o seguinte: “Eu não tenho um pai e uma mãe. Eu tenho dois pais e duas mães, dada a minha convivência com meus sogros.” E eu vivi 26 anos de lua de mel. Desses 26 anos nós não tínhamos filho e uma vida maravilhosa, mas quis o destino que ela falecesse. Então eu falei assim: “Olha, eu já tive direito a tudo que era bom. Se eu casar, bem, se eu não casar, não....” Que às vezes a pessoa fica viúvo e procura uma outra mulher, procura aquela que faleceu. Eu falei assim: “Eu não vou achar outra Frida, então eu não quero casar procurando Frida. Se eu tiver de me casar, bem, se não tiver, fica.” E achei a Cândida. Uma pessoa que tem sido uma companheira leal, uma pessoa que... Então eu falo que Deus é muito bom comigo. Quando eu falo que tive os meus problemas ele, por outro lado, foi me levando de uma maneira, me dando coisas fantásticas. E a Cândida é uma delas.
Ela é uma pessoa tão boa que ela convive tão bem com a família. Eu tenho uma ligação, eu falei que eu convivo bem com a família. Eu tenho uma ligação muito grande com os familiares da minha primeira esposa, eu vou lá. Eu não passo quinze dias sem ir na casa deles. Vou lá, entro; não tenho que bater campainha, não tem que chamar ninguém. Eu entro na casa, vou na cozinha, tiro café, tomo. E eles vivem, que meu sogro – que até já faleceu – ele falava: “Você precisa casar. Você precisa casar.” Eu falava: “Doutor Mauro, se tiver que acontecer vai acontecer.” E aconteceu.
E eles convivem bem. Não tem esse negócio de ter ciúme que eu estou lá. A minha... Eu tenho um concunhado que é funcionário da Vale aqui - Marcos Roger, ele trabalha na parte de Recursos Humanos. A mulher dele é irmã da minha primeira esposa. Ela foi criada por mim e pela minha primeira esposa. Nós morávamos na casa junto, ela tem uma amizade comigo tão grande como se fosse o pai dela. Ontem mesmo eu falei com ela. Ela me liga, eu ligo. O Roger liga, eu ligo. Então é uma coisa tão forte que eu tinha medo de [que] se eu casasse não desse certo, que viesse o ciúme. E não, deu certíssimo.
Essa ligação minha com a família é muito grande - com os meus irmãos, com os meus cunhados, tanto de um lado como de outro. Às vezes, esse relacionamento... “Ah, vamos para a fazenda, vamos para o sítio fazer um churrasco. Vamos para casa.” Então a minha distração é futebol e estar perto da família.
P/1 – Quais são seus planos para o futuro?
R – A minha esposa atual, ela fala comigo o seguinte: “Um mês para você é tão longe. Você não pensa daqui...” A hora que eu falo para ela assim: “Vamos fazer uma viagem daqui a um mês. Deixa para a gente pensar nisso mais na véspera?” E a frase que eu ouço mais: “Você vai ser candidato a prefeito de Itabira?” Eu falo assim: “As coisas têm que acontecer naturalmente.” Magalhães Pinto dizia que política é como nuvem, ela passa. Não adianta, eu não quero ter o sofrimento antes da hora, como não quero ter o prazer antes da hora, então eu deixo que as coisas aconteçam naturalmente. Se você falar assim: “Você é candidato a prefeito de Itabira?” Eu falo assim: “Sou e não sou.” Para mim, ser candidato existe uma série de problemas.
P/1 – É uma resposta mineira essa, né?
R – É mineira.
P/1 – (risos)
R – Político mineiro. (risos)
P/1 – É uma resposta mineira essa: sou e não sou?
R – E por que eu digo para você? Eu fui prefeito em uma condição toda diferente. Eu tenho consciência que eu fiz uma excelente administração. Será que eu vou repetir aquela administração? Será que eu vou ter a mesma equipe comigo trabalhando? Será que eu terei que fazer composições contrárias aos meus princípios para poder ganhar uma eleição? Esse é um problema. Eu não farei composição com pessoas que não sejam de minha confiança. Eu não entro em uma…
Como eu disse, acho que a minha questão é uma missão. Eu não entro em uma eleição para chegar e falar assim: “Eu tenho que ganhar de qualquer jeito.” Porque dizem que na política vale tudo, só não vale perder e eu não penso assim. Pode valer quase tudo, mas entre eu perder e fazer uma composição para ganhar que seja contra os meus princípios, eu prefiro perder. Mas entrando da minha maneira. Eu tenho uma série de porquês, mas existe um outro: porque o atual prefeito é meu companheiro e vai querer a reeleição dele, é natural, então eu prefiro não pensar nisso.
Eu falo o seguinte… Essa semana passada um jornalista fez essa pergunta para mim. Eu não vou responder o que eu falei com ele aqui, mas eu virei para ele e falei assim: “Me falta aquele entusiasmo para ser.”
P/1 – Uma pergunta que parece parecida, mas não é: quais são seus sonhos?
R – Olha, um homem de setenta anos que viveu e que viveu muita coisa boa. Eu falo que Deus me deu muito mais do que eu merecia. E às vezes eu tenho um amigo que eu pergunto a ele assim: “Danilo, como é que vai?” ele fala assim: “Não está como eu queria, mas está muito melhor do que eu mereço.” (riso) Então eu acho que ele me deu muita coisa boa. Também me deu o lado ruim, que não são só flores. Você enfrenta as dificuldades.
Eu não tenho grandes sonhos, não. Na política, por eu pensar dessa maneira que eu estou aqui, o que tenho, o meu sonho é viver uma velhice com saúde e tranquilidade. Esse é o meu sonho. Junto com os meus, com meus verdadeiros amigos e a minha família. Esse é meu grande sonho.
Ilusão, eu disse para você… Eu falei assim: quando eu tinha tudo – eu tinha uma vida tranquila, que eu lutei por ela durante quarenta anos, trinta e muitos anos – eu dei 50% dela para um irmão e falei: “Não quero nem saber do resto.” Os meus salários como prefeito eu doei durante quatro anos. Então não tem, nunca tive ambição de dinheiro. Eu procuro na minha vida é fazer o bem, esse é meu grande desejo. É não fazer mal a ninguém.
Você pode ter certeza de uma coisa: eu não vou dizer que eu não tenha errado nesse período. Eu devo ter errado e muito. mas sempre errei em uma certeza de estar fazendo o melhor. E meu sonho é que eu continue a fazer isso.
P/1 – Marina, tem alguma pergunta, alguma questão, várias?
P/2 -
Queria perguntar sobre o Projeto Vale Memória…
P/1 – É a última. Pode, não, por favor.
P/2 -
Eu queria saber o que o senhor achou de ter participado de um projeto como esse da Vale do Rio Doce, o Projeto Vale Memória, que ouve funcionários desde diretores a funcionários operacionais. Pessoas da comunidade, pessoas que tiveram alguma relação com a companhia.
R – Eu acho isso fantástico. Uma das coisas que eu saí da Prefeitura de Itabira e que lamento não ter feito, porque Itabira tem uma história muito grande... Itabira tem uma memória muito grande. E quando eu cheguei na prefeitura, talvez você não tenha noção de todos os problemas; você começa a enfrentar um e outro e vai desviando. Quando cheguei no último ano eu falei assim: “Gente, por que é que eu não contratei uma equipe para levantar a memória de Itabira?” Porque a memória de uma cidade feito Itabira, cada dia ela morre um pouco. Porque morre uma pessoa de cem anos, morreu uma parte da história. E você não a escreve em um, dois anos. Você tinha que contratar uma equipe para fazer um levantamento e vir levantando tudo.
É o que vocês estão fazendo. Vocês estão levantando a história da Vale há quanto tempo? E vão levar um outro tanto para a frente, mas o importante é que a Vale vai ficar marcada por essa história.
Cada um tem uma coisa para falar. Eu cheguei a Itabira em 1942. Vamos fazer um pequeno relato aqui do que aconteceu? Há dois anos aconteceu uma sessão solene da Câmara em homenagem a Vale do Rio Doce. E como é isso? Cada partido indica uma pessoa para falar em nome do partido. Eu fui indicado para falar em nome do PDT.
Eu digo: “O que eu vou falar da Vale? Eu vou contar a história da Vale que eu conheço, porque todo mundo vai querer pegar a Vale hoje. Em Carajás, a Vale de Itabira, a Vale do Maranhão, a Vale do Espírito Santo, a Vale do país. Até do exterior.” Eu comecei a contar a história de 1942, quando a Vale puxava minério de carroça. Quando os caminhões que transportavam pegavam cinco toneladas. Hoje tem caminhão que pega 150 toneladas. Cinco toneladas e transportava aquilo de minério [por] trinta quilômetros. A Vale que o doutor Pedro Martins Guerra emprestou dinheiro, porque a Vale quando começou não tinha crédito na cidade.
Eu comecei a contar uma história diferente e me lembro que quando eu terminei de falar diversos diretores - foi o presidente, o funcionário da Vale que estava lá presente -, vieram me parabenizar por aquela história. E me lembro que chegou um cônsul da Itália, que está naquela fotografia que está ali. Chegou perto de mim e disse assim: “Essa história que o senhor contou está em algum livro?” Eu falei assim: “Ela está aqui na minha cabeça.”
O que vocês estão fazendo é isso, levantando essa história. Essa história bonita que é a da Vale do Rio Doce. Vocês estão de parabéns e isso vai marcar a Vale para sempre, senão daqui a uns anos morrem essas pessoas que fizeram parte da história da Vale e não tem quem contar. Às vezes um pedaço, um detalhe pequeno que foi importante hoje não é importante mais para a Vale, mas foi muito importante para que ela pudesse crescer, então esse projeto é fantástico.
P/1 – A
gente gostaria de agradecer a sua entrevista. Foi ótima. Muito obrigado, foi muito...
R – Eu é que agradeço essa oportunidade e de poder contar alguma coisa da minha história. Eu acho que [em] alguma coisa ela pode acrescentar para a Vale.
P/1 – Com certeza.
R – Muito obrigado.
P/1 – Obrigado.Recolher