"A irmã do Luciano e da Mariana". Era dessa forma que os professores do Colégio chamavam aquela menina e assim por muito tempo me identifiquei. Nunca fui a melhor aluna. Minto, até a 4ª série (agora seria o 5º ano) eu era uma das melhores alunas, a partir da 5ª série, ou seja, quando entrei no Fundamental II, comecei a ser cada vez mais a “irmã” do Luciano e da Mariana e cada vez menos a Paula. Foi impressionante o quanto isso me abalou.
O mais curioso é que tenho outra irmã, também mais velha, a Alessandra, mas não era a ela que meus professores se referiam. O Lu e a Mari foram bem marcantes para eles e eu entendo, pois foram sempre muito inteligentes e participativos. Certamente era o que esperavam de mim - e era o que queriam dizer com “irmã do Luciano e da Mariana”.
Venho de uma família de classe média, pais advogados. Meu pai veio do interior, trabalhou desde criança e hoje tem doutorado em Direito. Minha mãe é filha de comerciante português, estudou muito e se formou na Universidade de São Paulo. Tenho consciência dos privilégios que tive na infância: livros, CDs, televisão em casa, revistas e jornais. Apesar disso, na escola, um colégio extremamente tradicional da cidade de São Paulo, nunca me senti à altura daquilo que esperavam de mim. Essas expectativas não eram ditas com todas as letras. Nenhum professor jamais me disse: “porque você não é inteligente como seus irmãos?”, mas sempre que um professor novo entrava na sala, olhava para nós e logo dizia: “você é a irmã do Luciano” ou “você é a irmã da Mariana”. Isso se seguiu até o terceiro ano do Ensino Médio, quando finalmente fui para a faculdade - e confesso que minha escolha foi por um curso que eu pudesse ser somente a Paula e não a irmã de alguém. Estudei Letras por um tempo.
Depois de muitos anos desses acontecimentos, quando já estava estudando pedagogia, fui entender que as comparações que me fizeram me foram muito prejudiciais....
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"A irmã do Luciano e da Mariana". Era dessa forma que os professores do Colégio chamavam aquela menina e assim por muito tempo me identifiquei. Nunca fui a melhor aluna. Minto, até a 4ª série (agora seria o 5º ano) eu era uma das melhores alunas, a partir da 5ª série, ou seja, quando entrei no Fundamental II, comecei a ser cada vez mais a “irmã” do Luciano e da Mariana e cada vez menos a Paula. Foi impressionante o quanto isso me abalou.
O mais curioso é que tenho outra irmã, também mais velha, a Alessandra, mas não era a ela que meus professores se referiam. O Lu e a Mari foram bem marcantes para eles e eu entendo, pois foram sempre muito inteligentes e participativos. Certamente era o que esperavam de mim - e era o que queriam dizer com “irmã do Luciano e da Mariana”.
Venho de uma família de classe média, pais advogados. Meu pai veio do interior, trabalhou desde criança e hoje tem doutorado em Direito. Minha mãe é filha de comerciante português, estudou muito e se formou na Universidade de São Paulo. Tenho consciência dos privilégios que tive na infância: livros, CDs, televisão em casa, revistas e jornais. Apesar disso, na escola, um colégio extremamente tradicional da cidade de São Paulo, nunca me senti à altura daquilo que esperavam de mim. Essas expectativas não eram ditas com todas as letras. Nenhum professor jamais me disse: “porque você não é inteligente como seus irmãos?”, mas sempre que um professor novo entrava na sala, olhava para nós e logo dizia: “você é a irmã do Luciano” ou “você é a irmã da Mariana”. Isso se seguiu até o terceiro ano do Ensino Médio, quando finalmente fui para a faculdade - e confesso que minha escolha foi por um curso que eu pudesse ser somente a Paula e não a irmã de alguém. Estudei Letras por um tempo.
Depois de muitos anos desses acontecimentos, quando já estava estudando pedagogia, fui entender que as comparações que me fizeram me foram muito prejudiciais. Não se deve comparar nenhum ser humano a outro, muito menos esperando que este seja tão bom quanto o outro. Quisera eu ser tão inteligente quanto o meu irmão, falecido em 2015. Quisera eu ser tão esperta quanto minha irmã Mariana. Quisera eu. E durante muito tempo quis.
Hoje não mais. Hoje entendo a importância do Lu em minha vida - e queria que ele soubesse disso. Hoje entendo a importância da Mari, da Alê, dos meus pais e meus avós. Entendo que cada pessoa que admiro e admirei tem seu motivo e impacto, mas fico feliz em ser quem sou: pedagoga, militante pela infância e extremamente apaixonada pelas vidas ao meu redor.
Escrevo essa memória pensando que é uma das que marcaram minha trajetória educacional por muito tempo e faço um apelo à todos os educadores do mundo: cada criança, cada ser que está na sua sala de aula é único. Pense nisso antes de chamá-lo de “irmão” de alguém ou por algum apelido. Valorize as pessoas ao seu redor, valorize as crianças, valorize os sujeitos - se valorize. Quem é você?
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