Entrevista de Aprigio Antero
Entrevistado por Wesley Cunha dos Santos e Maria da Consolação Soares
Rio Doce, 06 de março de 2023
Projeto Memórias do Rio Doce
MRD_HV008
0:22
P1 - Qual o seu nome?
R - Aprigio Antero.
P1 - Quando o senhor nasceu?
R - 10 de janeiro de 1927.
P1 - O senhor nasceu onde?
R - Nasci num lugar chamado Porto de Junco, aqui para cima de Santana um bocadinho.
0:53
P1 - O senhor lembra o nome dos seus pais?
R - Era Anastácio.
P1 - E a sua mãe?
R - Ana Lisirina
P1 - O que eles faziam?
R - Meu pai? Meu pai era lavrador, trabalhava em roça.
P1 - O senhor tinha quantos irmãos?
R - Eu tinha 14 irmãos
P1 - O senhor lembra o nome deles?
R - O nome deles? Tinha 4 irmãos meus que não era do mesmo pai não. Meu pai era casado 2 vezes. O mais velho chamava José, José Amaro, eles tratavam ele de Duca e as outras 3 era moça, Angelina, Lilia e Dono Dinda, dos primeiro irmãos. Agora do segundo matrimônio era Joaquim, Marina, Raimunda, Celira, Maria, outra vez, era duas Maria e a Nicete e eu, João, que vê, e Gabriela, acho que é só, deu os 14, era 14.
2:29
P1 - A já deu bastante!
R - Será que está faltando algum?
P1 - Mas não tem problema não! O senhor sabe como os pais do senhor se conheceu, como seu pai conheceu sua mãe? Seu pai já contou como que ele conheceu sua mãe?
R - Não, eu perdi o meu pai primeiro, estava com 14 anos quando perdi o meu pai. Aí fiquei labutando com o pessoal, tomando conta da casa, pelejando, os irmãos meu era assim, meio simples. Eu não tenho leitura não, mas era mais espero que eles, aí ficou eu tomando conta da casa. Aí depois quando eu estava com uma idade mais de 14 anos, quando tava mais novo fiquei tomando conta da casa, quando fiz 14 fui trabalhar. Eu comecei a trabalhar puxando carga para Rio Doce, com tropa, todo dia, 6 dias, dava 6 viagens para Rio Doce na semana. Aí depois mudei trabalho, passei a trabalhar de carpinteiro, pedreiro, fui mudando, fui largado o serviço de tropa para o...
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Entrevistado por Wesley Cunha dos Santos e Maria da Consolação Soares
Rio Doce, 06 de março de 2023
Projeto Memórias do Rio Doce
MRD_HV008
0:22
P1 - Qual o seu nome?
R - Aprigio Antero.
P1 - Quando o senhor nasceu?
R - 10 de janeiro de 1927.
P1 - O senhor nasceu onde?
R - Nasci num lugar chamado Porto de Junco, aqui para cima de Santana um bocadinho.
0:53
P1 - O senhor lembra o nome dos seus pais?
R - Era Anastácio.
P1 - E a sua mãe?
R - Ana Lisirina
P1 - O que eles faziam?
R - Meu pai? Meu pai era lavrador, trabalhava em roça.
P1 - O senhor tinha quantos irmãos?
R - Eu tinha 14 irmãos
P1 - O senhor lembra o nome deles?
R - O nome deles? Tinha 4 irmãos meus que não era do mesmo pai não. Meu pai era casado 2 vezes. O mais velho chamava José, José Amaro, eles tratavam ele de Duca e as outras 3 era moça, Angelina, Lilia e Dono Dinda, dos primeiro irmãos. Agora do segundo matrimônio era Joaquim, Marina, Raimunda, Celira, Maria, outra vez, era duas Maria e a Nicete e eu, João, que vê, e Gabriela, acho que é só, deu os 14, era 14.
2:29
P1 - A já deu bastante!
R - Será que está faltando algum?
P1 - Mas não tem problema não! O senhor sabe como os pais do senhor se conheceu, como seu pai conheceu sua mãe? Seu pai já contou como que ele conheceu sua mãe?
R - Não, eu perdi o meu pai primeiro, estava com 14 anos quando perdi o meu pai. Aí fiquei labutando com o pessoal, tomando conta da casa, pelejando, os irmãos meu era assim, meio simples. Eu não tenho leitura não, mas era mais espero que eles, aí ficou eu tomando conta da casa. Aí depois quando eu estava com uma idade mais de 14 anos, quando tava mais novo fiquei tomando conta da casa, quando fiz 14 fui trabalhar. Eu comecei a trabalhar puxando carga para Rio Doce, com tropa, todo dia, 6 dias, dava 6 viagens para Rio Doce na semana. Aí depois mudei trabalho, passei a trabalhar de carpinteiro, pedreiro, fui mudando, fui largado o serviço de tropa para o lado. Aí eu fui terminar meu serviço de coisa aqui nessa igreja, parei de trabalhar, o último serviço que eu fiz foi aqui na igreja.
4:03
P1 - Mas o senhor fala trabalhar de tropa, como é que era isso?
R - Meu pai? Com tropa? É burro, carregando carga para o Rio Doce.
P1 - E o que o senhor levava nessas cargas para lá?
R - E eu que levava.
P1 - Mas o que o senhor levava?
R - Levava milho, feijão, café.
4:25
P1 - Da infância do senhor, seu Aprígio, senhor ficou com alguma lembrança da sua infância, alguma brincadeira que o senhor fazia?
R - Como é que?
P1 - O senhor lembra da sua infância, quando o senhor era criança? O que o senhor fazia quando era criança?
R - O que eu fazia? Eu trabalhava na roça quando era mais novo, depois que eu fui crescendo fui mudando de serviço. Agora terminei o serviço, não faço mais nada mesmo. Trabalhei muito, essa igreja aqui eu ajudei botar telhado nela lá em cima, batendo a laje, uma laje corrida assim, ficava com a mão tudo doendo de tanto segurar, firmar nesse cimento. E por aí nós vai minha fiá, pelejando, trabalhando, até pouco tempo eu tava trabalhando. E sai daqui, trabalhava lá em baixo no Catarina de Souza. Você conhece Catarina de Souza? Saia a pé daqui todo dia, para trabalhar lá.
P1 - E é longe?
R - É longe, e para baixo do sem peixe.
P1 - Então é longe.
R - Só sei que eu trabalhei demais, andei muito. E aqui tem a história também de Santa Santana aqui. Você já ouviu contar? Não!
P1 - Não! Pode contar para a gente.
R - Vou contar para vocês a história de Santa Santana. Ela apareceu aqui na beira do rio. E não fui eu que vi não, aí foi os outros mais velhos que eu, eu vi os outros contar. Ela apareceu aqui na beira do rio, encontraram ela aí, aí pelejaram para tirar ela de lá, ela não quis sair de jeito nenhum. Aí eles inventaram uma moda, rezava, ela ficou quieta no mesmo lugar, não mudava não, foi numa troca de pedra. Aí diz que depois inventaram uma marujada, que hoje é o congado que eles falam, para tirar ela de lá. Depois começaram a bater aqueles instrumentos, ela arredou. Aí eles veio batendo, ela veio acompanhando até aqui em cima, chegou aí fizeram uma casinha para ela ali, ficou aí. Aí depois o padre construiu uma igreja, a igreja foi feita para ela, deu uma quebrada aí, quebrou. Aí o padre construiu outra igreja, aí ficou até quando padre Sebastião chegou aí, não achou a outra também e fez essa. Mas história dela é que foi achada aqui na beira do rio.
7:00
P1 - Seu Aprígio, o senhor é casado?
R - Se eu sou casado? Sou, uai!
P1 - Como senhor conheceu a sua esposa?
R - É Maria de Lourdes Antero.
P1 - E como o senhor conheceu ela?
R - Ela é daqui mesmo, ela chegou da Piedade. O pai dela morava em Piedade aí mudaram para aqui, daí eu conheci ela e casamos.
P1 - E o senhor teve quantos filhos?
R - 4.
P1 - Como é que chama seus filhos?
R - Maria, Maria Vera, Ana Maria, Vera Lúcia e Zé Efigenio.
P1 - Então 4 filhos. Quantos netos?
R - Neto eu tenho… iii, neto eu tenho um punhado (risos).
P1 - Já tem bisneto?
R - Meus netos eu tenho que pensar para contar eles.
P1 - São muitos?
R - Tem!
P1 - Bisneto! Já tem tataraneto?
R - Tem tataraneto. Tataraneto acho que é 4, 4 né Mari? Mari tá dormindo lá. Mas tataraneto acho é 4.
8:22
P1 - Seu Aprígio, o senhor falou que trabalhou aqui na construção da igreja, trabalhou aqui quanto tempo?
R - Aqui na igreja trabalhei um ano e quatro meses.
P1 - E a igreja tava assim grande?
R - Nessa igreja aí, trabalhei um ano e quatro meses nela. Saí do chão, furamos um buraco no chão, ela tem 6 metros de fundura no chão. Aí depois eu parei, depois dela que eu parei de trabalhar, agora minha vida é andar por esse mundo afora trabalhando de carpinteiro, Sobrado, Santa Cruz, trabalhei num monte de lugar aí. Aí depois eu parei. Me deu um problema nesse braço meu aqui, não deu para trabalhar mais não.
9:10
P1 - Conta para a gente como que foi trabalhar na construção da igreja aqui? Trabalhar aqui na igreja, o que o senhor fazia?
R – Eu trabalhava na parte de carpinteiro, fazendo forma. Aí quando acabei de fazer a forma, fui mexer com concreto.
P1 - E como que era trabalhar aqui, era bom?
R - Se era bom? Serviço não presta não, boba. A gente precisa trabalhar, né! Mas o serviço brabo, serviço bruto trabalhar de carpinteiro, eu pegava aqueles bitelos de pau para subir no andaime, uma altura assim, para colocar lá em cima. Isso acabou comigo, hoje, que hoje eu não valo nada por conta disso, pegava muito peso, aproveitava da força, pegava peso de mais. Aí foi isso que atrapalhou o meu corpo.
10:06
P1 - Tela alguma lembrança do serviço aqui, aconteceu alguma coisa diferente? Aqui o serviço tinha muita segurança, como é que era o serviço aqui?
R - Tinha nada! Cinto de segurança nosso era Deus.
P1 - Mas ninguém nunca machucou, não?
R - Está fazendo uma casa ali, essa casa do padre ali. Aí peguei um serrote para cortar umas tábuas, tapar, aí o cabo quebrou no meio comigo lá em cima, quebrou, eu tava mais novo, tinha esperteza, aí não cheguei cair no chão não, aquela montoeira de tábua vindo em cima de mim, eu peguei no outro cabo fique penduro nele, quando acabou de cair no chão, eu pulei cá em baixo.
10:56
P1 - Seu Aprígio, fala para nós como era a festa de Santana quando o senhor era mais novo?
R - A festa de Santana quando eu era mais novo, a festa aqui era 8 dias de festa, não tinha carro para puxar pessoa, vinha tudo com carro de boi, tropa, carregando o pessoal para cá, ficava aquela quantidade de gente aí, aquelas barracas tudo de folha, tudo era folha as barracas. Aí ficava ali. Acabava um estoque que eles faziam, voltava, fazia outro. Aí ia até 8 dias, depois dos 8 dias o pessoal ia embora. Na cidade tinha um homem que chamava Bastos, ele puxava… 2, 10 dias festa, todo dia vinha de São Silvério. Aí acabava a festa, ele juntava aquele trem tudo, tinha uma barraca que tinha uns 15 m de comprimento, a barraca dele, tudo que você procurava na barraca dele você achava.
12:09
P1 - Isso mais ou menos em que ano?
R - Em que ano esse trem? Era mais ou menos em 35, 37, mais ou menos, foi nessa época assim.
P1 - E o senhor acha que o que mudou mais aqui em Santana?
R - A boba.
P1 - Não tinha carro, nessa época não tinha carro.
R - Não, não tinha não, a gente andava só em tropa mesmo. Depois que veio aparecer tinha carro de boi, depois o carro de boi acabou, apareceu os caminhões pegando carga. Aí acabou, não tem carro de boi mais. Ninguém! Você não acha mais Carro de Boi aqui nessa nossa direção mais, acabou tudo, agora é tudo no caminhão.
13:07
P1 - Mas nessa época que o senhor falou, como que era a festa de Santana, tinha missa, procissão, como é que era?
R - Se era o quê? Ah era! O pessoal cozinhava na festa aí, dava muita comida para o pessoal comer, mas era ‘pagado’, era ‘pagado’. Mudou muito agora. A senhora lembra de um padre que.. A senhora lembra do Padre João? Capaz de você não ter conhecido mesmo não. Pois é, aquele padre que chegou aqui e acabou de arrumar o resto das coisas aqui, que ele foi… cavucou nessa rua aqui, a rua era apertada, ele trabalhava na rua aqui, punha a máquina, limpava que abria a rua aqui um bocadinho, para o pessoal trabalhar. Ele tava fazendo um serviço muito bonito, mas depois ele ficou muito nervoso aí, que ele gostava de chamar todo mundo para trabalhar, ele não excluia ninguém, de Edmilson aí…Até tinha dia que estava celebrando missa, acabava a missa, ele ficava gritando o pessoal para ajudar carregar tijolo para fazer uma caixa d'água ali, até seu Pereira, seu Antônio Pereira, Damantino, ele ficava chamando eles para carregar tijolo aí. Com pouco tempo, coitado, antes de acabar o serviço dele, queimou.
14:46
P1 - E depois dele quem que veio?
R - Depois dele veio…. e veio muito padre aqui depois dele,... não parou. Depois dele esteve aqui padre João, Padre Macaia, Padre João Macaia, Padre Zé Vicente, não, esse aí foi antes dele. Padre Zé Vicente, teve muito padre aqui em Santana, mas quem parou mais aqui mesmo, é padre Sebastião.
P1 - Quantos anos Padre Sebastião ficou aqui?
R - Padre Sebastião deve ter ficado aqui quase uns 40 anos, ficou bastante tempo.
15:25
P3 - Você lembra dele?
R - Que vê, ele chegou aqui, deixa eu ver, ele chegou aqui em 1970, que ele chegou por aqui. E morreu em 2009, quantos anos?
P1 - 39 anos.
R - Quase 40 mesmo.
15:50
P3 - E o senhor lembra dele?
R - Muita gente não gostava dele não, mas eu gostava demais dele, era muito bom! Trabalhei muito para eles aqui, também dei muito dia de serviço para a igreja, ele ficava alegre também, que tava gastando demais. Dinheiro eu não podia dar, mas o meu dia de serviço eu dava, toda semana eu largava dois dias de serviço, outra semana largava um, que eu não podia largar tudo.
16:33
P1 - Senhor Aprígio, como que era Santana quando padre Sebastião chegou?
R - Aqui era tudo cheio de casinha de sapê, aí ele chegou nervoso, porque só tinha umas três casas aí, a casa da santa que tinha aqui, outra que tinha ali em cima, e uma lá em cima lá, tinha três casas só aqui boa, o resto era tudo barraquinho de sapê, cobertinho de sapê. Aí ele chegou ficou bravo aí, não queria mais aquelas casinhas mais não, tinha que consertar esse lugar aqui. Aí queria casa boa! Ninguém aguentou fazer casa boa, foi pelejando, foi pelejando, até acabou com as casas de sapê mesmo. Ele acabou com as casas de sapê.
17:19
P1 - A Igreja aqui recebia muito devoto nessa época?
R - Recebia muita gente? Vinha! Vinha muita gente. Toda vida a festa de Santana aqui vinha muita gente, ‘boba’.
P1 Sempre veio, né? E essa caminhada de Santana que tem agora?
R A caminhada?
P1 - Começou com quem?
R - Começou com quem é? Começou com os meninos, toda vez tinha essa caminhada, eles faziam na semana da festa. Até Doutor Pereira que levava para o Rio Doce, Doutor Pereira levava para tirar a poeira, ficar uns dias lá. Aí na véspera da festa trazia ela de caminhada, vinha aquela porção de gente rezando, pulando a marujada, até chegar aqui. Mas todo ano ela ia na rua, todo ano, nunca falhou.
18:30
P3 - E a marujada o que o senhor lembra?
R - A marujada? A marujada era muito boa no princípio, mas depois foi mudando, foi ficando ruim, no princípio era o Luiz que tomava conta dela. Eu também gostava de pular no meio, hoje em dia ninguém gosta. Aí nós fazia uma festa bonita para danar, mas depois foi avacalhando o trem tudo, foi atrapalhando e não tava dando certo mais não. Aí eu larguei muita gente. Tem só dois aqui que ainda não largou ainda, tá pelejando aqui, mas o resto tudo, uns morreram, os outros largaram.
19:18
P1 - Então essa marujada já existia desde quando encontrou a santa?
R - A Marujada é, desde que a santa apareceu, que inventou a marujada, desde essa época, toda vida.
P1 - Conta para a gente senhor Aprígio, o que o senhor gostaria de ter feito na vida que o senhor não fez ainda?
R - Eu não tô entendendo direito, eu tô surdo para danar! (risos) Se tem alguma coisa? Se tem alguma coisa que eu fiz? Que eu não fiz? Vai ser difícil, eu não tô aguentando fazer mais, ué! Eu tenho vontade de fazer um serviço para mim mesmo, para eu ter a minha casa lá, mas tá meio difícil para mim, porque eu não tô aguentando fazer mais.
P1 - Mas o senhor já fez muito já trabalhou muito. Hoje o que o senhor faz?
R - Hoje eu fico mexendo com aquele meu boteco lá, pelejando para a modo não ficar à toa, se eu ficar à toa eu vou viver mais pouco. (risos)
21:11
P1 - E o senhor abre o boteco todo dia?
R Todo dia! Tem dia que eu vou dormir lá para 1 hora, 2 horas da manhã.
P1 - E o que o senhor vende lá no boteco?
R - Eu vendo de tudo um ‘bocadinho’.
P1 - Refrigerante.
R - Refrigerante, cerveja, alimento. Mas vende pouco, boba. To querendo parar também, tô vendendo muito pouco, porque o pessoal do lugar aqui não compra na mão da gente, eles vão buscar lá em São Silvério, todo dia o caminhão do homem tá aí trazendo carga para eles aqui. E eu compro também da mão dele, aí fica sem jeito de vender.
22:03
P3 - E faz tempo que você tem esse seu bar?
R - Se tem muito tempo? Tem uns 40 anos que eu mexo com esse ‘trem’ ué. Quando você tava dando aula aí eu já mexia com boteco.
P1 - Mas não era lá na sua casa, era?
R - Era.
P1 - Senhor trabalhou em outro lugar.
R - Trabalhei para Ricardo também, ali muito tempo. Depois eu comprei a mercearia dele.
P1 - Então o senhor comprou a mercearia do Ricardo?
R - Mas antes do Ricardo eu já tinha venda já. Depois eu comprei aquela mercearia dele.
P1 - Que tem embaixo, né?
R - É
22:48
P1 - Senhor Aprígio, o senhor trouxe o estojinho de injeção, o senhor trabalhava aqui com o pessoal, ajudava?
R - Aquilo ali a caixinha de injeção. Aqui no princípio tinha umas febres bravas, o trem era bravo, todo dia adoecia gente de febre aqui. Aí você vinha buscar remédio para um, chegava em casa tinha outro doente. Você chegava em casa minha filha, cansado da rua, chegava, buscava remédio para os meninos. Chegava tinha que andar… Você já foi na pedra Dourada, não? Aqui embaixo. Tinha que ir lá, de Santa Cruz tinha que ir lá para chamar um homem para aplicar injeção. Quando não era ele, que às vezes ele estava viajando, tinha que ir atrás do seu Chico Carvalho, pai de Fernandes. Outra hora Doutor Pereira. Aí quando você não encontrava nenhum desses daí, você tinha que ir lá na usina do funil, chamar um tal de Candinho que tinha lá. Aí eu levei, foi até essa menina aí, levei para consultar, aí me deram lá 12 injeções, uma caixa de injeção com 12. Eu falei hoje… eu tô cansado de andar. Aí comprei aparelho, esse aparelho que está aí, comprei as agulhas, tudo direitinho, hoje eu mesmo vou aplicar a injeção. Aí cheguei em casa, aí Lourdes falou assim, “você não vai atrás do seu Totó não?” “Hoje eu não vou não mais!” “Por quê?” “Eu não vou não porque eu tô cansado de andar”. “E o remédio da menina?” O remédio eu vou aplicar, uai!” “Você não vai aplicar remédio não! Vai não!” “Eu vou, vou, não tem jeito não!” Aí eu acabei de almoçar, arrumei o aparelho, coloquei para ferver, desinfetei direitinho, quebrei a injeção, “traz a menina aí!” Aí chegou. “Segura ela!” “Não vou segurar não”. “Vai segurar sim, como é que eu vou arrumar?” Ala segurou a menina eu fui no bracinho dela, um bracinho fininho, coitadinha. Meti a agulha no braço dela aí. Continuei minha filha, mas que coisa mais terrível. Tinha que trabalhar, tinha que sair para aplicar injeção nos outros, eu não podia negar de ir, que eu sabia aplicar. Aí depois a mãe dela também aprendeu, aí favoreceu para mim, ela aplicava, nós que aplicava no pessoal tudo, não tinha mais ninguém. Seu Domingos adoidou. Você não conheceu ele, era farmacêutico, eu perguntei para ele como que arruma para aplicar injeção, de lá mesmo ele ensinou. Aí eu fui e apliquei. Graças a Deus nunca inflamou uma injeção no braço de ninguém, até eu parar. Depois eu não podia aplicar mais, porque não pode.
26:21
P1 - Aqui embaixo onde era o posto de saúde?
R - Não, lá em casa mesmo.
P1 - Pois é! Mas depois fez o posto.
R - Depois fez o posto
P1 - do lado da igreja…
R - Fez o posto, já não tava podendo aplicar mais, era só enfermeiro.
P1 - E vinha a médico atender aqui?
R - Vinha bobo. Tinha uns quatro médicos atendendo aqui.
P1 - Toda semana?
R - Tinha um rapaz altão de São Silvério, atendeu aqui bastante tempo. Teve mais uns outros aí. Depois tiraram eles daí.
P1 - E tinha uma funcionária da saúde aí?
R - Tinha!
P1 - Como é que ela chamava?
R - …
P1 - Depois que ela foi embora, quem ficou lá?
R - Depois que ela foi embora ficou Vitorino.
P1 - Aí depois desativou o posto?
R - Aí acabou, fechou! Agora ele vem aqui algum dia.
P1 - E como é o atendimento eles buscam aqui?
R - O médico Rodrigo tá vindo aqui.
P1 - Mas tá vindo aqui ou vocês estão indo lá?
R - Não, ele vem no posto.
P1 - Vem ainda?
R - Tem os dias marcado também, não é todo dia não.
28:00
P1 - Outra coisa senhor Aprígio, o senhor trouxe um relógio ali que a gente vai fotografar. O que o senhor conta do relógio para gente?
R - Esse relógio quando eu comprei eu estava com 20 anos. Aí eu comprei dois relógios, um para mim e outro para um irmão meu. Aí o irmão meu acabou com o dele e o meu tá aí até hoje.
P1 - Mas o senhor tem alguma lembrança desse relógio?
R - Eu guardei ele, não tô andando com ele mais.
P1 - Mas o senhor comprou ele numa data especial?
R - Comprei! Se ele liga? Ah não, eu comprei e paguei na hora, não foi dia do pagamento não, foi um pagamento só.
P1 - Senhor era casado nessa época já? Já tinha os filhos?
R - Como é que é? Não ele tá guardado lá em casa. Não mexo com ele mais não. Era solteiro.
P1 - Então tem muito tempo?
R - Tem muito tempo, eu comprei ele em 1947, que eu comprei o relógio. E eu casei em 1952.
30:12
P1 - Você lembra do dia do seu casamento?
R - O dia do meu casamento não foi bom não, porque eu saí daqui de baixo de uma chuvada medonha, tava chovendo muito e tava muito ruim. Aí cheguei no Rio Doce, o pessoal do Rio Doce não era muito bom não. Você mora lá? Mas to falando. Não nasceu um para me levar para casar em São Silvério, não achou um para me levar lá em São Silvério. Aí compadre Mika… Você é amiga do compadre Mika? Compadre Mika, coitado, ele fazia tudo para mim, viu! Aí cheguei lá, ele foi falar comigo, “o compadre, o padre deixou você casar lá em São Silvério.” Aí eu caço um daqui, caço um dalí. Aí o compadre Mika, fala assim, “o compadre, pede para o seu Augusto Pereira o caminhão, que ele vai falar para o senhor que não tem chofer, aí o senhor fala para ele que ele arruma o caminhão que o senhor arruma o chofer”. Eu fui lá na casa do seu Augusto, a senhora lembra o seu Augusto? Ai conversei com o senhor Augusto, “não tem chofer!” Falei, “senhor Augusto, arruma o caminhão para mim que eu arrumo o chofer”. “Não pode, não pode, você volta outro dia e casa”. Ai cheguei cá e falei para o compadre Mika, falei pra ele, “o compadre, o homem disse que não tem chofer, rapaz, eu falei para ele que ele arrumava o caminhão que arrumava o chofer, ele falou que não pode, para eu voltar outro dia para casar.” “Ô compadre, dá uma licencinha”. Foi lá na casa de Dunga, chamou Dunga, Dunga falou, “não!”... Tira o caminho lá que eu vou levar o compadre lá! Aí o Dunga foi lá tirar, quando ele puxou o caminhão, o caminhão quebrou uma peça, aquele carango velho. Aí quebrou uma peça. Aí voltou, “a Mika, não tem jeito não, o caminhão quebrou uma peça”. Aí ele foi e falou comigo, “ô compadre, ô Dunga, leva o rapaz lá, eu pago a sua viagem, leva ele lá em São Silvério”. Aí Dunga chegou ali onde era a casa de Rafael, aí virou ali, eu tava ali, fui no cartório de Antônio Batista, aí ele falou assim, “ô filho, entra aqui, vamo embora!” Aí eu fui e entrei no caminhão mais ele. Foi só eu mais Lourdes… só os padrinhos que foram. Aí nós chegamos lá em São Silvério, lá na igreja, aí Dunga veio, bateu na minhas costas assim, só você mesmo para colocar o meu caminhão no barro hoje, “por mim seu caminhão não rodava no barro, pro mim ele tava na garagem até agora”. “Então você não me deve obrigação não?” Falei, nenhuma! Uai, eu tinha que falar assim mesmo, não era? Ele não queria me levar, uai! Você não me deve obrigação nenhuma. Agora ele vai me largar aqui a pé, eu desço com o meu pessoal aqui para a tapera… já tava com a minha mente feita. Aí ele voltou com muita raiva, me apanhou, aí chegou me largou ali em cima da ponte, largou eu em cima daquela ponte ali, ele foi virando para trás, “ô Dunga, espera aí, deixa eu te pagar, “que pagar, o quê”. Ele virou o carro, foi cobrar de compadre Mika, compadre Mika pagou ele. Na minha mão não quis receber de jeito nenhum. Ele é vivo ainda Solzinha? Dunga?
P1 - Até pouco tempo sim!
R - Deve estar bem velho, deve estar muito velho também.
P1 - Tava!
35:14
P1 - Senhor Aprígio, não tinha Padre lá em Rio Doce naquela época?
R - Não
P1 - Quem fez seu casamento?
R - O que me casou foi um padre que… Padre José de São Silvério. O outro era Padre João, que morava lá no Rio Doce, ele estava para casa da mãe dele.
P1 - O senhor marcou no dia que ele viajou.
R - É!
P1 - O senhor viveu casado quantos anos?
R - 37 anos.
P1 - Então tem quanto tempo que o senhor viúvo?
R - Viúvo? Foi em 89, Lourdes morreu em 89.
P1 - Muito tempo, né?
R - Tem muito tempo, tem mais de 30 anos já.
36:35
P3 - E como era a sua rotina quando você era casado?
R - O que que eu fazia?
P1 - Como que era sua vida depois de casado, o que que o senhor fazia?
R - Trabalhava, sempre trabalhei. Depois de casado? Trabalhava em roça, trabalhava em carpinteiro, carpintaria. Era carpinteiro.
P1 - Quem te ensinou trabalhar de carpinteiro?
R - Toda a vida eu trabalhei em roça, mas tinha aquelas folgas minhas, eu trabalhava de carpinteiro, pegava serviço dos outros para fazer. Aí fui mudando, fui mudando, até que chegou no fim, parei de trabalhar.
P1 - Mas quem te ensinou a trabalhar?
R - Quem me ensinou? Quem me ensinou foi a minha inteligência. Sempre que trabalhava com algum carpinteiro, ia espiando o que ele estava fazendo. Menino pequeno, pegava o machado para ficar cortando no pau, lavando pau, aí aprendi a trabalhar.
P1 - O senhor plantou roça durante quanto tempo.
R - Plantei roça desde 8 anos, até a idade… Quer ver quando eu parei de trabalhar na roça, saí da roça foi em 1996.
P1 - E era perto aqui que o senhor plantava?
R - Não, não!
P1 - Onde era?
R - Nem sei mais não.
P1 - Faz tempo né? Mas o que que o senhor costumava plantar?
R - O que eu plantava? Plantava milho, plantava feijão, plantava arroz.
P1 - Arroz era aqui para baixo.
R - É! Plantava nessa baixada aqui embaixo, dava muito arroz, até na época que você chegou aqui dava arroz aqui ainda né.
39:05
P1 - E agora eles plantam por aqui ainda?
R - Não, agora não tem plantio de nada mais aqui em Santana. Ninguém, acabou tudo, só mexe com pasto.
P3 - E quando você não estava trabalhando, o que você fazia para se divertir?
R - Agora depois de velho? Não, uai! Quando eu não tava trabalhando… Eu sempre trabalhei, toda a vida.
P2 - Antigamente tinha alguma diversão? Vocês tinha alguma diversão, final de semana?
R - Como é que é?
P2 - O senhor trabalhava durante a semana, né? No final de semana tinha alguma diversão?
R - Não, não!
P1 - O senhor já jogou bola, já jogou futebol?
R - Não, nunca gostei de jogo de bola.
P1 - E para o forró, gostava?
R - Daí eu gostava.
P1 - E dançava muito?
R - Daí eu não largava não! Eu fui em forró longe daqui, fui lá para o Rosário, lá para cima do Rosário, duas vezes, no forró. Nós pegava a máquina aqui, eu e Evaristo, que mudou um pessoal que morou aqui, mudou lá para….. aí eles faziam forró lá, chamava nós, nós ia lá. Duas vezes nós foi em forro lá… Não tinha? Ali nós entrava ali.
P1 - Forró bom aqui era onde?
R - Tinha, tinha, tinha bom! Aqui também tinha bom forró… Nós andava aí fora tudo. Só uma coisa que eu não gostei, eu ia muito em churrasco para comer, mas eu não comia, minha vida era só…. Fazia festa de política aí no Rio Doce, não tinha aquele jardim ali não, eles faziam fogueira. Eles colocavam som lá, eu tô lá no salão dançando. Eu nunca gostei de churrasco também.
P1 - O senhor dança forró ainda?
R - Agora não danço mais não. Depois que eu desequilibrei esse braço meu, não teve mais jeito não, parei.
41:54
P1 - Que mais o senhor gostava de fazer? Além de dançar forró, o que mais o senhor gostava de fazer?
R - A boba, nunca achei nada ruim de eu fazer. Tudo que dava para mexer com aquilo, era alegre, não tinha tristeza com nada não, tudo eu gostei. Gostava de trabalhar, nunca gostei de ficar à toa. Fico atoa agora, que não tem jeito de eu trabalhar mais. Mas vivi muito satisfeito com a minha vida que Deus deu.
P1 - E hoje o que que o senhor gostaria de falar para as pessoas, os jovens de hoje, para os seus netos, seus bisnetos, o que o senhor conversa com eles?
R - Tá muito ruim para eu escutar. Se eu conto história? Se eu bebo? De neto eu não conto nada não. Se eu falo com eles? Falo uai.
P1 - O senhor acha que a vida hoje tá melhor do que antes?
R - É engraçado boba, a vida tá melhor do que era, mas ao mesmo tempo que tá melhor do que era, tá pior. Porque antigamente parece que a pessoa tinha mais regalia, para andar, para conversar. Hoje o trem tá muito difícil, minha filha, hoje mudou muito. Aqui em Santana mesmo, não é mais aquela Santana era quando você dava aula aqui não, mudou muito.
44:08
P1 - E o que que mudou?
R - O que mudou, a gente nem pode falar, essa maconha, esse trem brabo. Isso aí boba, aqui não tinha isso não. E aqui agora tá cheio, tem um rapaz aí, que ensinou a menina daqui fumar maconha, que cruz credo. Eu cá nem conheço não, graças a Deus, não conheço, não sei o que que é isso e nem quero saber. Mas eu vejo.
P1 - Mas aqui tá tranquilo, não tem briga, não tem violência?
R - Não, não, brigar não briga não,
44:53
P1 - O que o senhor achou hoje seu Aprígio de estar contando a sua história para nós, o senhor gostou de conversar com a gente?
R - Hein? Tá bom uai!
P1 - Então pense mais alguma coisa que o senhor gostaria de contar e não deu tempo ainda?
R - Só vou contar mais um caso de Santana. Tinha uma mulher em São Silvério, ela levava nossa Senhora de Santana para lá, levava ela para São Silvério, ela vinha no outro dia da festa dela, no outro dia, ela não dormia lá não. Ela vinha embora para cá, e a mulher… de madrugada ela saía, “Nossa Senhora de Santana passou aqui agora mesmo, ó o rastrinho dela aqui.” Ela vinha mais o homem, o velho dela chamava Dudu, aí eles vinham aqui até chegar em Santana. Chegasse eles iam no pé de Nossa Senhora de Santana, se tivesse sujo de poeira, “os pés de nossa Senhora de Santana está sujo de poeira”. Eu era menino e via ela contando esses casos aqui, “o pezinho dela tá sujo de poeira”.
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