Entrevista de Maria Geralda Oliveira da Silva
Entrevistada por Cátia Silvia e Vanessa Aparecida Isaias
Mariana, 04 de março de 2023
Projeto Memórias do Rio Doce
MRD_HV015
0:21
P1 - Oi Maria! Bom dia!
R - Bom dia Vanessa!
P1 - Queria te agradecer estar aqui conosco, fazendo parte desse projeto, você é muito importante. Maria, gostaria que você falasse seu nome completo, onde você nasceu, qual a data?
R - Meu nome é Maria Geralda Oliveira da Silva, nasci em Paracatu, a data é 19/05/1975.
0:58
P1 - Maria você fala o nome dos seus pais?
R - Meu pai é José Patrocínio de Oliveira e minha mãe Maria da Conceição de Oliveira.
P1 - E dos seus avós, se você lembrar.
R - Então, os meus avós por parte de pai, é José Barbosa de Oliveira e Efigênia Lúcia Gonçalves. Por parte de mãe, meus avós são, João Tito Isaías e Ermelinda Isaías.
P1 - Maria seus avós moravam onde?
R - Paracatu de Baixo.
P1 - Seus pais também?
R - Também!
P1 - Toda vida você morou lá?
R - Nasci, criei e morei. E moro ainda.
1:44
P1 - Seus pais trabalhavam com o quê?
R - Meu pai sempre trabalhou em fazenda, mexendo com criação de cabra. Só de planta
P1 - Onde vocês moravam? Sempre moraram no mesmo lugar, seus pais, seus avós, você?
R - Sim! Na mesma comunidade.
P1 - Você tem irmãos? Quantos?
R - Tenho, antes nós éramos 11, mas hoje, graças a Deus, nós estamos aí em cinco.
P1 - Você tem convívio com eles, contato com todos eles?
R - Tenho! Tenho!
2:35
P3 - Voltando um pouco, você falou que sempre morou na mesma casa, na mesma comunidade. Como que era essa casa da sua infância? Você pode descrever para gente?
R - Então, a casa da minha infância é a casa dos meus pais, onde a gente nasceu, onde a gente criou, junto com todos os irmãos, era na casa do meu pai. Então, a casa dos meus pais, quando os meus pais casaram, então, a casa onde eu nasci, a casa era de pau a pique, coberta de sapé. E com o passar dos anos, aí teve os outros...
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Entrevistada por Cátia Silvia e Vanessa Aparecida Isaias
Mariana, 04 de março de 2023
Projeto Memórias do Rio Doce
MRD_HV015
0:21
P1 - Oi Maria! Bom dia!
R - Bom dia Vanessa!
P1 - Queria te agradecer estar aqui conosco, fazendo parte desse projeto, você é muito importante. Maria, gostaria que você falasse seu nome completo, onde você nasceu, qual a data?
R - Meu nome é Maria Geralda Oliveira da Silva, nasci em Paracatu, a data é 19/05/1975.
0:58
P1 - Maria você fala o nome dos seus pais?
R - Meu pai é José Patrocínio de Oliveira e minha mãe Maria da Conceição de Oliveira.
P1 - E dos seus avós, se você lembrar.
R - Então, os meus avós por parte de pai, é José Barbosa de Oliveira e Efigênia Lúcia Gonçalves. Por parte de mãe, meus avós são, João Tito Isaías e Ermelinda Isaías.
P1 - Maria seus avós moravam onde?
R - Paracatu de Baixo.
P1 - Seus pais também?
R - Também!
P1 - Toda vida você morou lá?
R - Nasci, criei e morei. E moro ainda.
1:44
P1 - Seus pais trabalhavam com o quê?
R - Meu pai sempre trabalhou em fazenda, mexendo com criação de cabra. Só de planta
P1 - Onde vocês moravam? Sempre moraram no mesmo lugar, seus pais, seus avós, você?
R - Sim! Na mesma comunidade.
P1 - Você tem irmãos? Quantos?
R - Tenho, antes nós éramos 11, mas hoje, graças a Deus, nós estamos aí em cinco.
P1 - Você tem convívio com eles, contato com todos eles?
R - Tenho! Tenho!
2:35
P3 - Voltando um pouco, você falou que sempre morou na mesma casa, na mesma comunidade. Como que era essa casa da sua infância? Você pode descrever para gente?
R - Então, a casa da minha infância é a casa dos meus pais, onde a gente nasceu, onde a gente criou, junto com todos os irmãos, era na casa do meu pai. Então, a casa dos meus pais, quando os meus pais casaram, então, a casa onde eu nasci, a casa era de pau a pique, coberta de sapé. E com o passar dos anos, aí teve os outros irmãos, aí chegou a gente também. E depois meu pai construiu uma casa, ele mesmo que passou a fazer as telhas, que ele sabia fazer telha também. E aí que construiu uma outra casa, e aí foi feita de tijolo, coberta de telha, essas telhas colonial. Mas eu nasci na casa do meu pai, que eu nasci era de pau a pique, coberta de sapé, onde eu e meus irmãos fomos criados nessa casa, depois a gente já grande, jovem, meu pai fez a outra casa, de tijolo, com telha colonial, que até então foi feita pelas mãos dele mesmo.
4:04
P1 - Maria, quando vocês eram crianças, vocês brincavam? Você lembra de alguma coisa, de alguma brincadeira que vocês gostavam, com seus irmãos, com o pessoal da comunidade?
R - Então, nessa época a brincadeira era, a gente brincava de bola, de queimada, para entender melhor. Era batendo uma peteca, pulando uma corda, essas que eram as brincadeiras. Brincando de roda, essa que era brincadeira das criançadas na minha época.
P3 - E na roda vocês cantavam alguma música?
R - Sim! Sim, cantava muita música, cantava Tororó, um monte de coisa.
4:56
P1 - Maria, alguma lembrança te marcou na juventude, na infância?
R - Como assim?
R - Das brincadeiras, do convívio, do contato com o seu pai, de alguma forma boa, ou… Que te marcou!
R - Porque antes era tudo mais tranquilo e hoje a realidade é outra, então às vezes eu mesmo fico pensando, como era antes, tudo mais tranquilo, e hoje tudo diferente. Antes não existia luz, não tinha luz elétrica, a luz que tinha era dos vagalumes, a gente saía na rua, só vê as luzinhas brilhando, mas era vagalume. A gente ia na igreja, tinha reza, a gente ia para a igreja, ia e voltava. Então, assim, fazia serenata, usava muito fazer serenata também, serenata, os meninos aí, os mais velhos, pegava ali o violão, e ia sentar, ou na beira, em frente à igreja, ia tocar um violão, ia fazer serenata. Acostumava também fazer alguns bailezinhos, forrozinho, em casa de famílias mesmo. Então, assim, tinha muita coisa que hoje não existe mais, não existe mais, porque não fazem, porque não existe mais. Na nossa comunidade tinha muitas atividades, mas hoje muitas coisas ficaram para trás.
6:54
P1 - Quais as atividades que você e seus irmãos, seus pais, participavam na comunidade?
R - Olha, a gente participava muito era de igreja. Meu pai, ele foi presidente da Conferência de São Vicente, ele ajudou a fundar essa conferência. Também nós temos a folia de reis, que foi criada lá também na nossa comunidade. Que meu pai quando era criança, ele acompanhava os mais velhos, que não eram do tempo da gente. Acompanhava os mais velhos, então ajudava a carregar bolsa, ajudava a carregar instrumentos, a bandeira. E com os mais velhos ele aprendeu. Quando ele estava com 20 anos, aí ele assumiu como responsável, o capitão da folia. E vem trazendo até aqui.
7:49
P1 - Maria, você pode falar um pouco mais sobre a folia? E a sua participação na igreja?
R - Então, desde criança que a gente participa na igreja, rezando, ajudando limpar, colocando uma flor no altar, ajudando em coroação. A minha vida inteira ajudei a cuidar da igreja. E da folia eu nasci dentro dela! Então a vida inteira eu tive esse cuidado de fazer um presépio na igreja, tinha as rezas lá do Menino Jesus, festa, que era um cuidado que meu pai tinha. Então, eu sempre atuei, cresci e vim aprendendo, e não tem como desistir, e já vão levando. Meu pai faz um ano que faleceu e a gente vai levando. Porque é uma coisa que ele aprendeu com outros grupos e foi pedido para ele não deixar, ele foi nomeado para assumir a responsabilidade dessa folia estava com 20 anos. E no mesmo ano que ele foi nomeado para ser o capitão da folia, ele casou com a minha mãe. E não foi nada impedido, e ele seguiu. E aí Folia de Reis é uma coisa que não é só dentro da comunidade, ela faz uma rota, que a gente antes não falava rota, a gente fala cortejo. Então, as nossas Folia, o cortejo das nossas folias e visitar todas as comunidades vizinhas, portanto esse cortejo sempre foi a pé, não tinha carro, nessa época não existia carro. Pegava os instrumentos ali, a bandeira e ia visitar, dormia onde dava, era na igreja, era na porta da igreja, onde abria dormia dentro da igreja, onde não abria dormia na porta da igreja, encostava em qualquer cantinho, dormia e seguia no outro dia. Então, começava ali no dia 25, dia 25 é Natal, a tardezinha, meu pai gostava de sair no dia 25 mesmo, à tarde, saia e ele ficava ali uns três, quatro dias sem vim em casa, depois ele retornava no dia 5, ou às vezes ia direto e só voltava no dia 5, para o encerramento ser no dia 6 de janeiro, que é o dia de Santos Reis, que a gente comemora até hoje. Então, assim, a folia, ela é uma cultura da Comunidade, no meio de todas ela é a principal. E o meu pai ajudou a construir tudo, o meu pai foi um homem que ele ajudou a construir nessa parte religiosa, essa parte meu pai ajudou. Ele tinha, ele já tinha uma vocação para isso, porque além da folia, além da folia tinha a conferência de São Vicente de Paula lá, que também ele ajudou a fundar, ele era o presidente. Portanto ele tinha livros dos primeiros nomes da conferência de São Vicente. Ajudou na construção da igreja! Então, meu pai era um homem que ele gostava dessas coisas, gostava e fazia acontecer. É isso aí!
11:29
P1 - Maria, você está falando um pouco da igreja, de tudo o que aconteceu, você quer falar para a gente sobre a festa de menino Jesus também? Que é uma coisa que marcou muito a nossa comunidade, marca até hoje, é uma referência para a gente, principalmente a gente que acompanha muito a igreja. A gente vê o seu esforço para não deixar acabar, os almoços que seu pai fazia, você fala um pouco pra gente?
R - Então, esse almoço que a gente faz quando a gente realiza a festa do Menino Jesus, então, isso aí que o meu pai, ele entendeu que pelas rotas que ele fazia nas visitas das comunidades vizinhas, levando a bandeira do Menino Jesus, levando os cânticos. Ele percebeu que era preciso fazer uma festa, e começou então a se programar as festas, mas fazendo um almoço, porque onde… em todos os lugares das comunidades vizinhas que a folia passava, eram bem recebidos, então ali eles cantavam, agradecia e já deixava um convite. Então, quando chegava a época do mês de setembro, que foi o mês que meu pai escolheu, com mês da Bíblia, porque às vezes as pessoas acham que deveriam ser dezembro, mas dezembro já é Natal, já é uma festa. Então, ele preferiu que fizesse essa festa no mês de setembro, então ele escolheu esse mês de setembro para fazer a festa. E fazia esse almoço, um almoço de confraternização, para que os colegas, os amigos, das comunidades vizinhas pudessem vim participar da festa que a gente fazia, com levantamento de mastro, procissão da Bandeira, nós tinha ali boi da manta quando tudo começou. Então a gente tinha apresentação das folias de Reis, não só nós, nós trazia de outras comunidades. E com isso a gente fazia o almoço no domingo. Fazia o almoço, porque aí todo mundo podia vim sem preocupação, que as coisas sempre eram mais difíceis, não é igual hoje, então as pessoas já vinham e sabia, eu vou a festa do Menino Jesus em Paracatu, porque nós temos almoço. Então, não precisava se preocupar que pudesse passar talvez fome, que tinha lá o almoço já garantido. Por isso que meu pai sempre teve esse cuidado, de fazer o almoço. Que a gente continua fazendo a mesma coisa.
14:12
P3 - Você lembra da primeira vez que você participou dessa festa?
R - Então, a primeira vez que fiz a festa, que fez o almoço, sempre foi na casa do meu pai o almoço, sempre foi na casa dele. Então, assim, a casa nesse dia era da comunidade, era dos visitantes, então o meu pai já dava esse recado para todos nós, “a festa do menino Jesus vai acontecer, o almoço é aqui, aqui eu vou receber todo mundo, não tem ninguém diferente, nem das comunidades vizinhas e nem da própria comunidade”. Então, esse dia a casa era nossa, sabe? Então, esse dia a casa era de todos, que ali aparecia. Então, fazia o almoço, todo mundo almoçava. E além do almoço, meu pai sempre gostou de atividade que trazia alegria para o povo. Ele gostava ali de uma dança da folia, ele gostava sempre de congado, ele gostava de convidar as outras folias, como de Pedras, mesmo Cuiabá cansou de trazer a folia deles também, que eles tinham. Então, as demais sempre apareciam lá para tocar esse dia com a gente, a gente abria espaço para que essas outras tocassem, para depois a gente fazer apresentação com a nossa, que a do meu pai. Então, meu pai sempre gostou de atividade, tinha banda, meu pai gostava de levar. Na sexta-feira meu pai gostava de colocar som na praça, aí a gente rezava, tinha novena do Menino Jesus, fazia novena do Menino Jesus, na sexta-feira da festa nós tinha ali, som na praça, gostava de fazer fogueira. No sábado era levantamento do mastro, … da Bandeira, ali nós tinha boi da Manta, Folia tocava. Meu pai sempre gostou de pau de sebo, que eu não sei se vocês sabem o que que é. Meu pai sempre gostava de fazer o pau de sebo para as pessoas, a criançada subir lá tentar pegar o dinheiro, colocava lá aquele dinheirinho lá, chamava atenção de todo mundo, todo mundo gostava de ir lá pegar o dinheirinho, sabe? Então, assim, no domingo a gente tinha também banda. Nós tinha banda para dançar também, dança, banda para dançar, e nós tinha banda para trocar na procissão. Essa festa do Menino Jesus, ela sempre trouxe essas atividades lá. Meu pai sempre gostou dessas coisas. Que era assim nossa festa lá, comida não faltava, era um banquete.
17:14
P1 - Maria, referente à escola, você frequentou a escola até qual série, qual idade?
R - Então, na época eu estudei lá, a nossa escola era muito simples, então lá só tinha até a quarta série. Eu tô falando enquanto nós criança, mais jovem. Então, lá só tinha até a quarta série, estudou até quarta série, não tinha como, ou tinha que ir para o Aforquini, estudar, ou vim para Mariana.
P1 - Até a quarta série você lembra da sua professora quem foi?
R - Então, uma das minhas professoras, elas estão viva ainda, que é dona Laura. Tem sim, uma das minhas professoras. Então, naquela época, a gente estudava, os professores podiam, tinham direito de chamar atenção, por de castigo, ou às vezes dá uma… É diferente de hoje, pegava duro, mas também, naquela época todos os jovens trabalhavam, todo mundo trabalhava, a criançada, todo mundo trabalhava. Todo mundo tinha aquele horário ali de ir para aula, mas todo mundo trabalhava, todo mundo pegava duro. Os pais não iam para roça sozinhos, todo mundo ia, trabalhava. Que a vida naquela época era dura também, então todo mundo trabalhava.
18:46
P1 - Maria, você continua a estudar ou você parou na quarta série mesmo?
R - Então, na época que eu parei de estudar, na quarta série, é porque não tinha outro jeito. Porque quando eu formei a quarta série, na época, eu lembro que nós era uma turma boa da comunidade, só que os nossos pais não tinham dinheiro nem para pagar o certificado para a gente, da quarta série. Então, a gente formou a quarta série ali, parava no tempo, não tinha mais como seguir, tinha que ficar com a quarta série, porque para estudar em outro lugar tinha que ser Furquini, para ir para Furquini tinha que ir a pé, não tinha carro, não tinha nada para levar. Então, a maior parte da minha idade, na época, tinha que estudar e parar na quarta série, porque não tinha, realmente, não tinha como continuar.
P1 - E depois de um certo tempo você voltou a estudar?
R - Então, aí né, jamais madura, aí eu casei tive os meus filhos, depois perdi o meu marido. Então, só que eu tinha ideia de fazer algum curso, de querer ser alguma coisa, para conseguir uma renda melhor. Então, eu tentei, fui a luta, trabalhava e estudava. Fui estudar em Águas Claras, e lá eu consegui fazer o terceiro ano, concluir o terceiro ano, com muita dificuldade, porque tinha que trabalhar também. Então a gente trabalhava e estudava, às vezes eu deixava algum recadinho para os meninos, escrevia só no papel, que às vezes eles estavam para a aula, deixava só o bilhete, chegava, tomava um banho e ia pra aula. Só chegava, tomava banho e ia para aula. Que aí eu fui estudar em Águas Claras, lá em Águas Claras conclui o terceiro ano.
20:38
P1 - Você tem alguma lembrança dessa época que você estudou em Águas Claras, de alguma amizade?
R - Sim! Tenho muitas lembranças!
P1 - Quais as dificuldades de ir de Paracatu até Águas Claras?
R - No último ano, que foi em 2015, que era o ano da formação, depois de tudo pronto, depois de tudo organizado, aí chega aí o rompimento da barragem, para estragar tudo. Então, assim, a gente veio para Mariana, no caminho já da formação, que é Dezembro, faltava alguns trabalhos para entregar, para encerrar. E aí ficou difícil, ficou complicado, que a gente teve que vim para Mariana, foi morar em hotel. Então, assim, aí ficou muito difícil, só que a gente foi sim, a gente voltou para poder pegar certificado. Mas a gente já não foi mais com aquela vocação que tinha, a gente foi, para não deixar os colegas de escola, ficar sozinhos, então a gente foi, mas não teve como. Que eu lembro ainda, que a professora pediu para cada um de nós escolher uma música lá na quadra, escolher uma música lá, depois que a gente foi para a igreja, o certificado bonitinho, a gente foi né, para poder, que ia ter um jantar para todo mundo. Aí pediu para cada um escolher uma música, aí eu lembro que eu escolhi aquela música de Gusttavo Lima, sabe? Ouro, aquela música. Aí cantaram lá, cada um escolheu uma música. Aí eu escolhi essa música aí, foi duro, eu nem sei porque também na época, sempre passa pela minha cabeça, a música que veio na minha mente foi essa. Então, assim, o que atrapalhou muito, porque a minha esperança era de continuar estudar, não era de parar. Só que depois disso para cá, não tive mais vontade de querer continuar estudando. Vou levando aí do jeito que dá! Mas estudar mesmo eu parei. Mas a esperança era de ser alguém, de ter um estudo, de conseguir uma coisa melhor. Até então, a gente já carrega aí essa cultura que é da folia nas costas, a gente poder entender melhor, descobrir outras coisas. Que no meio disso tudo, a gente sabe que existe muito vestígio, então é bom a gente saber para passar para o futuro, para as pessoas, para os que também estão chegando. A gente ficou parado, vamos seguir!!
23:41
P1 - Maria, na juventude, você tinha muitos amigos, você tem contato com eles ainda? Vocês faziam o quê?
R - Então, na época, a gente sempre teve amigos, a gente sempre teve amigos na comunidade, que até então a gente não tinha muito assim o que a gente vê hoje, porque era mais cada um na sua, todo mundo trabalhava, todo mundo tinha uma atividade para fazer. Então, assim, era raro, era como um dia de domingo, a gente só via os amigos, amigas, só dia de domingo. De domingo ia todo mundo para porta da igreja, lá as meninas iam bater peteca, a gente ia pular corda, os meninos também iam, entrava na roda para brincar. Sempre teve futebol, sempre quando falava que os mais velhos iam para o campo, aí todo mundo, a juventude, todo mundo ia para o campo, para assistir o jogo, para gritar. Então, era uma festa, era desse jeito. No mais cada um na sua, a gente sempre teve amigos. Porque até então, na época, minha juventude, a gente não tinha tempo, igual hoje a gente vê, nossos jovens hoje tem muito tempo. E naquela época nós não tinha tempo, até então a gente tinha que trabalhar, então todo mundo não tinha muito tempo.
25:13
P1 - Maria, você falou que você trabalhava muito na juventude. Você trabalhava com o quê?
R - Muito bem Vanessa, o tempo que a gente acompanhava os pais da gente, era para capinar, era para plantar, é levando o almoço. E além disso, a gente quando chegava em casa, a gente tinha que moer uma cana, a gente tinha que buscar uma água, a gente tinha que picar uma lenha para pôr para dentro, porque até então, naquela época da minha juventude, nós não existia, ninguém tinha água encanada dentro de casa, não existia isso na minha comunidade, Paracatu. Tinha os poços nascentes, como na casa do meu pai mesmo tinha um, a gente ia lá, enfiava o balde dentro do poço, levava, punha para esquentar a água, era para tudo. Então, assim, não tinha essa facilidade que hoje tem, então quando chegava em casa tinha muito serviço para fazer, era moer uma cana, era picar uma lenha para por dentro de casa, era para pôr um feijão para cozinhar, era para se organizar para o outro dia, sabe? Eu vou para escola esse tempo, mas depois desse tempo eu tenho que ir para o trabalho. E na mesma época todo mundo trabalhava, hoje não, hoje o jovem talvez, dependendo da idade ele não pode trabalhar. Mas trabalhar não faz mal a ninguém, talvez se tivesse esse ensino, que tinha antes, talvez os nossos jovens não tinha tanto tempo para telefone, para computador. Às vezes telefone, computador, eles esquecem. Às vezes de está fazendo um trabalho, não é todo mundo, mas...
27:02
P1 - você falou que já foi casada, você se casou com quem? Por quanto tempo? Quando vocês casaram, teve festa?
R - Então, eu casei, meu marido era Gabriel da Silva, casei foi com ele, ele era da família de Júlia, lá da minha comunidade mesmo. Nós casamos, foi 12 de novembro, que nós casou, 12 de novembro de 94, que eu casei.
P1 - Teve festa?
R - Na época a festa era simples. Como? Mas era um lanche, quando eu casei, foi até um lanche, foi dado um lanche, muita rosquinha, muito… essas coisas, muito lanche! Muito lanche! Era muito café! Teve assim, na festa, um forrozinho, que teve, na época, quem foram os meus padrinhos do meu marido, levou um rapaz aqui de Mariana para tocar para gente, e aí ele foi, levou esse rapaz, esse rapaz tocou lá no meu casamento, lá em Paracatu. Eu casei no civil em Mossorota e casei na igreja em Paracatu mesmo. E após o casamento nós fomos para a casa do meu cunhado, onde foi dado todo o lanche, onde teve um forrozinho, onde esse rapaz cantou. Eu lembro que nesse dia, você sabe qual a música que cantou ainda, Goiania, você sabe? Eu não esqueço, de vez em quando eu falo para os meus meninos lá em casa, no dia do meu casamento, tocou essa música, Goiânia. Além dela cantou um monte de forrozinho, mas essa música é uma música que eu fiquei guardado, sabe? Comigo! Que essa música, foi a primeira música na hora que a gente chegou da igreja, que esse sanfoneiro cantou, tocou e cantou. E a noite inteira foi um forrozinho, porque na época tudo era simples. Mas era tudo feito com muito carinho.
29:27
P1 - Maria, você fala um pouquinho dos seus filhos? Você chegou a falar que você era casada, têm filhos. Quantos são?
R - Eu tenho 6 filhos, o mais velho é Eberton, tem Roberta, tem a Kátia, tem a Nádia e tem o Nilson.
P1 - Eles moram com você?
R - Moram! Mora comigo! A Junia casou, já vai fazer dois anos que ela casou, casou em 2018.
30:03
P3 - E como você se sentiu quando você virou mãe?
R - Então, pra mim foi tudo, porque a gente quando passa a ser mãe, a gente vem a entender o que que é a palavra mãe, descobrimos cuidado, o carinho, o amor, que uma mãe tem por um filho, sabe? Se um filho pensasse bem o que é uma mãe, valorizava muito, noites de sonos. Além disso, para ser uma mãe, tem que carregar nove meses na barriga. E nem toda mãe é igual, porque tem mãe, esses nove meses, ela sofre, ela sofre, só para carregar na barriga, depois sofre para dar à luz, depois sofre para poder criar bebezinho. E ali vai continuando. Depois forma homem, mulher, sabe? Então, assim, tem os filhos que não, que eu até agradeço a Deus pelos meus filhos, que não me traz problema. Mas às vezes eu olho assim algumas mães, fico pensando, tem muita mãe que sofre pelos seus filhos, não é no meu caso, mas a gente por ser mãe. Então assim, eu tenho pena de muitas mães que sofrem pelos filhos dela. Eu não, eu só tenho que agradecer a Deus pelos meus filhos! Não me dão trabalho, sem exagero, mas não me dão trabalho. De vez em quando eu puxo a orelha, eu sou assim mesmo .
32:00
P3 - E como que era a rotina sua quando seu primeiro filho nasceu, seus filhos nasceram?
R - Então, na época, foi Eberton, meu filho mais velho, quando ele nasceu, eu fui morar numa casinha que era do meu sogro mesmo, aí depois… O meu marido sempre foi um homem muito trabalhador, foi um homem duro, sempre se preocupou, foi um homem muito bom! Só que aí ele falou, “a gente vai ter que arrumar um cantinho nosso mesmo, que aqui…” Meu sogro, a família do meu marido, são pessoas, para mim, sabe, foram pessoas boas, foi uma família que eu encontrei, não tem como falar da família do meu marido, porque para mim, encontrei uma nova família. E aí o meu pai, o meu pai, o meu sogro, juntou todo mundo lá e foi fazer uma casinha. O meu sogro escolheu um espaço lá, e falou assim, “esse lote aqui é para o Gabriel, e aqui vamos fazer a casa”. Na época também, a casa na época era também de pau a pique. E aí a primeira casa que eu morei nela foi de pau a pique, só que aí o meu marido já comprou telha… foi coberta de telha… E aí o meu pai, o meu marido, meu sogro, juntou todo mundo! Meu cunhado, meus irmãos, juntou todo mundo lá e fez a casa. Aí eu vim morar, já saí da casa do meu sogro e já vim morar na minha casa mesmo. E lá na minha casa… a Roberta já nasceu nessa casa, já não foi na casa do meu sogro mais, foi na minha casa mesmo. Mas também foi na casa de pau a pique, a diferença que era coberta de telha… E depois, passado o tempo, a gente desmanchou e fez uma casa mesmo de… já de tijolo, telha colonial. E por aí foi.
34:10
P3 - Você falou dessa construção, que os seus cunhados foram. Você lembra mais ou menos como foi o processo?
R - Nessa época, a maioria das casas eram feitas dessa forma, na época, a maioria delas. Que até então, a minha comunidade lá, nas primeiras casas, quase todas, dos mais novos era de pau a pique, de sapê, de amianto, aí foi modificando, tirando o sapê, colocando a telha amianto, mas a maioria de pau a pique, barro. Então quando falava assim, vamos fazer a casa de fulano, aí juntava todo mundo lá. E nós já tinha um senhor, um fazendeiro que morava próximo a nossa comunidade lá, que ele, a madeira, o cipó, o sapê, a areia, a terra, isso tudo ele dava, a gente só ia buscar, arrumava o carro de boi e ia buscar. E ali construía, juntava todo mundo, “hoje nós vamos fazer a casa de fulano. Vamos juntar aí!” Aí juntava aquela turma toda. Tinha… a casa de pau a pique, precisa de bambu, de cipó, na época, então assim, juntava todo mundo lá, para tecer, uns colocar a madeira, outros para tecer o bambu. E ali deixava. E depois tudo trançado de bambu, aí juntava um dia de domingo todo mundo lá e ia fazer a massa no pé, amassar o barro com o pé, para depois barrear, que todo mundo enfiava a mão lá e barreava era com a mão, era com a mão que barreava as casas.
36:06
P1 - Maria, qual sua relação com a comunidade, você tem amigos?
R - Você fala hoje?
P1 - Ou antes.
R - Olha, pra mim… a comunidade pra mim sempre foi a mesma, sempre foi a mesma. Claro, existem algumas diferenças, mas não pra, assim, não para assustar. Que a gente também não é perfeito, a gente também tem as diferenças da gente. Mas eu sempre gostei de respeitar todo mundo.
P1 - Quais as transformações que você viu com luz, asfalto, carros chegando?
R - Então, nessa época, o carro, transporte que tinha era um ônibus, ele passava no trevo, todo mundo tinha que sair lá da comunidade para vim até o trevo para tomar um ônibus, ou ir para Lavras Véia, tomar o trem. O único transporte que a gente tinha, era o trem que passava em Lavras Véia, perto de Mossorota, a gente fazia essa caminhada toda para poder… se quisesse vim até Mariana, ou vim para Mossorota, ou ia para Furquini, que era os dois lugares mais perto que passava. E também, depois passou a ter um ônibus, que fazia uma única rota, que ele vinha, me parece, de Cláudio Manoel. Então, esse ônibus, ele era o único ônibus, que passava de manhã e voltava à tarde. E que a comunidade vizinha, todo mundo que tivesse necessidade de vim em Mariana, tinha que tomar esse ônibus. E era assim.
38:00
P1 - Hoje, como era a vida na comunidade, a gente sabe que não tem muita gente lá mais. Mas como é em torno com as pessoas?
R - Então, hoje… Hoje nós estamos vivendo uma nova história, de diferença, de distância, porque hoje a gente não é mais o mesmo. Hoje cada um mora para um lado, hoje eu não sei por qual o motivo, mas que além desse impacto da lama, ter afetado, perda de casa. As pessoas ficaram muito separadas, muito distanciada uma da outra. Hoje ninguém liga ninguém mais, hoje tem pessoas que parece que nem conhece a gente mais. E assim que todo mundo lá vai vivendo, cada um na sua, ninguém liga ninguém mais, ninguém se preocupa com ninguém mais. Talvez, tem pessoas que anda não se preocupando nem com eles mesmo. A gente vê isso nas pessoas. Então, hoje o povo tá vivendo, tá vivendo, né! Mas eu acho que a maior parte, a maior parte, parece que perdeu totalmente a esperança, porque… eu to falando da minha comunidade, Paracatu, o povo ficou muito distante um do outro, uma diferença muito grande, ninguém liga mais ninguém, ninguém convive com mais ninguém. Acabou! Parece que a lama levou toda a história, todo o pensamento, toda a amizade, tudo que era de bom em relação a respeito um pelo outro. Hoje… a história nossa hoje é uma nova história.
40:10
P1 - Maria, você falou que com o seu pai frequentava muito a igreja, qual o seu vínculo com a igreja hoje?
R - Então, desde criança eu sempre gostava de ir na igreja, eu já tinha isto, parece que eu já tinha até um dom, de gostar de ir para a igreja, porque lá as pessoas mais velhas ia para a igreja, às vezes, “Maria, caça um flor ai para mim”. É o modo que as pessoas falava, “vai buscar, vai procurar uma flor, pede para fulano uma flor aí para nós por no altar”. E eu sempre gostava daquilo. Às vezes eu ia na casa de alguém, “me dá uma flor, uma rosinha, que é para por na igreja”. Ou ia, fulana tem rosa, vou lá pedir á fulano. Eu ia lá, pedia, vinha com a mão cheia de cacho de flor. Chegava cá, ajudava lavar os jarrinhos da igreja. Sempre ajudei as pessoas mais velhas, que às vezes precisava subir lá no altar, “Maria sobe lá pra mim!” Eu subia no altar! Era para descer santo, era para subir santo, era para forrar. Então sempre eu tive esses cuidados com a igreja.
41:20
P1 - E hoje, você é atuante ainda?
R - Então, bem antes da lama, bem, muito mais antes da lama, o por participar muito da igreja, a comunidade resolveu fazer uma votação. E dentro dessa votação, eu até então, tentei desviar muitas pessoas para não votar em mim. Eu tentei impedir, que não votasse em mim, tentei fazer a cabeça de alguns lá na hora, apontando para outras pessoas diferentes. Mas na hora acabou que eles mesmo me enganaram, porque às vezes eu apontava, “vamos votar em fulano”. Tem que votar em fulano, não vota em mim, vamos votar em fulano. E na hora de apurar os votos dentro da igreja, que na época tava lá o padre Juca, na hora de apurar os votos, ninguém votou em ninguém que eu apontei. Eu tentei, mas… que era um bilhete, chegava com o papel e você escrevia pra quem que queria, a nossa votação foi dessa forma lá na igreja. Cada um recebeu antes um papelzinho para escrever o nome, foi escolhido lá, 6 pessoas. E ali, aquele papelzinho, cada um escrevia um nome, enrolava bem enroladinho, para depois por lá, para depois saber quem seria mais votado. E acabou que a comunidade acabou votando em mim para coordenadora da igreja. No dia eu até tentei falar que eu não podia ficar porque eu já ajudava, já fazia parte da igreja, a gente podia nomear outras pessoas. Mas aí a comunidade não aceitou e nem deixou. Nessa época quem celebrava lá era o padre Juca. E aí ficou assim. Ai eu falei, olha, eu não queria ir para a coordenação, eu queria continuar ajudando, conforme eu sempre fazia. Mas aí me colocou. Dessa época para cá eu tentei mudar algumas coisinhas na igreja, tentei fazer algumas coisas diferentes para chamar mais a atenção, para atrair mais as pessoas. E por aí a gente veio. E aí chegou aí o rompimento da barragem, o meu pai também foi um homem que sempre se preocupou com essa parte de cultura. Eu e meu pai falou, a gente não pode deixar a festa acabar por causa desse rompimento da barragem que já levou tudo, vamos fazer a festa do Menino Jesus. Aí quando foi em 2016, não tinha condições nenhuma de fazer a festa lá, a gente escolheu um espaço lá onde a lama não passou, para fazer a festa do Menino Jesus, levantamos o mastro, padre fez celebração, tudo no mesmo lugar. Aí quando foi em 2017, o meu pai falou, vamos fazer a festa do nosso padroeiro, porque nós não podemos, ninguém está falando mais nada, nós não podemos deixar também perdida a festa do padroeiro. “Pai, como que nós vamos fazer festa de padroeiro, se todo mundo tá para aqui, para ali”. “Não, nós vamos, e é você que vai ajudar, é você que vai nos ajudar!” Aí nós fizemos a festa do padroeiro, aí gente já conseguiu fazer na quadra, mesmo em cima da lama, em 2017. Quando foi em 2018, aí de tanta briga, de tanta luta, a gente conseguiu eles tirar os rejeitos de dentro da igreja, para que a missa pudesse ser dentro da igreja. Aí a partir de 2018, aí que voltou a celebração ser dentro da igreja. E por diante, meu pai sempre fazendo essa cobrança. “Maria, não podemos deixar, até que se organiza tudo, não deixe as festas acabar”. Por esse motivo, que o meu pai sempre falava, aí eu venho trazendo aí essa luta, eu brigo com um, eu brigo com outro, brigo modo de falar. Tem que acontecer, como meu pai fazia, não pode deixar, vamos ter que fazer. E aí depois do rompimento da barragem, eu também venho trazendo aí a mesma coisa. Aí já faz um ano que eu perdi meu pai, mas mesmo assim, ele pediu para que a gente não deixasse acabar com a festa do Menino Jesus, nem com a folia de reis, e a gente continua. A folia não foi a lama que fez que a folia parasse e nem a festa acabasse, a gente continua, mesmo com as dificuldades, com os problemas, a gente continuou e a gente ainda vai levando. E é isso aí!
46:14
P3 - Como foi para você, como você se sentiu em 2018 quando você voltou para igreja, para missa?
R - Então, porque lá, a nossa comunidade lá, sempre teve um coral, os jovens da nossa comunidade eram muito participativos, eles participavam da igreja, eles iam para igreja. Se você chegasse lá um dia de domingo e perguntasse assim, cadê os jovens? Que até então, eu aprendi a ficar… até as pessoas da comunidade, “Maria, cadê os seus meninos?” Mas os meus meninos eram jovens. “Seus meninos hoje estão na igreja?” Porque nós tinha Angélica, sabe? Nós tinha Angélica lá, encontro de jovens, ela olhava os meninos lá, mas eu sempre tava lá ajudando. Tinha dia de fazer campanha das missões, os jovens de Mossorota ia, seminarista, nós organizamos os jovens da nossa comunidade para saírem campanha, isso tudo acabou. Então, lá, assim, a minha comunidade lá quase era uma só única religião, católica. Hoje a gente vê que tem muitos desvios, mas antes, se você perguntasse por os nossos jovens, às vezes eu sabia não só dos meus, como dos outros, mas hoje acabou. Nós não sabemos mais onde anda os nossos jovens. Nós tinha um coral enorme na comunidade, também não sabe mais. Não existe mais coral! Não existe mais grupo de jovens. Tudo acabou! A gente nem vê nossos jovens mais. Então, assim, muitas coisas mudaram e acabou. Mas antes, tudo era muito bonito, tudo era muito lindo, todo mundo participava, todo mundo ajudava, todo mundo tinha aquele respeito um pelo outro, mas isso tudo acabou, isso tudo ficou para trás. É isso aí!
48:31
P1 - Maria, conta um pouco para nós como você ajudava os meninos, nosso curso de crisma, do nosso coral, das cantigas da igreja, da coroação?
R - Então, a vida inteira, jovem, eu sempre coroei, sempre gostava de coroação. E depois passei também a ensinar as meninas coroar, entrar na roda para fazer coroação. Então a nossa comunidade tinha coroação das crianças, tinha das jovens, tinha das mães, então era muito bonito. E nós tinha muitos jovens, como era muitos jovens, eu sempre gostei de tá dando um curso de batismo, dando um curso da crisma. Portanto, teve uma época, a gente teve, uma época, acho que 27, 37, eu não sei Vanessa. Você também nessa época se crismou. Que eu dei o curso para essa galera aí, então assim, todo domingo eu ia para a igreja e eu estava lá com os meus jovens, mas também eu era um pouco enjoadinha também, né Vanessa, eu chamava atenção, gostava que prestasse atenção. Mas era para o bem de todos, porque quando chegava no final todo mundo não queria formar, então tinha que prestar atenção. Porque às vezes na roda começava a falar lá e eu chamava a atenção. Mas sempre dei apoio aos meus jovens, sempre respeitei todos, eles todos também me respeitavam muito, sabe? Eu sempre tive esse carinho com os nossos jovens. Que até então eles também tinham carinho com a gente, sabe? Então assim, eu sempre tive esse cuidado, até eu mesmo não sei o por quê. Quando eu ia para igreja tinha aquela turma de jovens, eu gostava, às vezes a gente inventava alguma música lá, né Vanessa? Às vezes inventava alguma música, que até então música, eu aprendi muita música, os mais velhos, as donas mais velhas, música de cantar mesmo na igreja, então eu aprendi muitas coisas. E às vezes costumava, a gente resolvia cantar lá, eu falava como é que era, das mais velhas como é que fazia. Então assim, a nossa comunidade, ela foi criada, foi bem advertida, bem, tinha muita coisa, muita participação, todo mundo entrava na roda, todo mundo participava, então tinha muita coisa, muita coisa. Às vezes fazia joguinho de bingo, ia todo mundo para quadra, homem, mulher, criança, todo mundo. Então assim, era muito divertido. Quadrilha, época de quadrilha, todo mundo… tinha quadrilha dos pais, tinha da escola, tinha dos jovens, era desse jeito. Quando era dos pais, os jovens iam só festejar lá, bater palma para os pais. Teatro, isso tudo fazia lá na nossa comunidade. Nós tinha lá um grupo de jovens que gostava de dançar a música do rodeio. Então, a nossa comunidade tinha muita coisa, muita coisinha. Era legal! Era legal! Nossa comunidade sempre foi, sempre teve um espaço para alguma coisinha.
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P3 - Essas músicas que você falou com os jovens, você lembra de alguma? Você pode cantar um pouco para gente?
R - Assim, agora, eu não vou lembrar não, né Vanessa? Mas Vanessa deve de saber, eu vou falar uma musiquinha aqui que encantou muito lá com os jovens, Vanessa sabe, a Kátia também sabe. Só que eu no momento não tô lembrando. Aquela que fala, deixa-me ser jovem, que eu gostava de cantar lá na igreja, sabe? Deixa-me ser jovem, deixa-me ser jovem, que não me canso de lutar. Vanessa sabe.
52:42
P3 - E essas quadrilhas, você dançava também?
R - Sim, dançava, gostava de entrar na roda para dançar, porque sempre tinha quadrilha dos pais, sabe? Teve uma época que foi tantos pais que entrou na roda para dançar que a quadra não estava cabendo, você lembra Vanessa? Então, como que era o enfeite da quadra, era bambu, era pé de bananeira, casamento da roça. Então, assim, a nossa comunidade tinha muitas atividades que chamava atenção e atraia as comunidades vizinhas e vinha todo mundo para poder participar, para ver. Isso tudo tinha na nossa comunidade, era bem animado.
53:22
P1 - Maria, como que foi contar essa história da sua vida para gente hoje?
R - Se eu fosse contar?
P1 - Como foi contar pra gente hoje?
R - Então, como foi, até então, para você e para a Kátia que é minha filha, que são jovens hoje. Então, isso é para vocês lembrarem, quem era Paracatu? Como foi Paracatu? Como Paracatu está sendo hoje? Como nós enxergamos Paracatu hoje? Como nós enxerga nossos jovens hoje? Como era antes os nossos jovens? Para que isso fique as respostas até guardar isso. E poder contar lá na frente, que às vezes, daqui uns anos eu já estou mais velha, vocês poderem contar essas histórias para outros lá na frente, como era Paracatu, nem todo mundo sabe da história. Eu vejo muito relato hoje da história de nossas comunidade, que às vezes nem tem nada a ver com a história do que era real. Todo mundo carregava lata de água na cabeça, enfiava no balde, punha na cabeça aqui e ía embora. Ia no mato buscar fecho de lenha, punha na cabeça aqui ó, criança no braço aqui, nas cadeiras, e ia embora. Tudo era simples, ninguém reparava ninguém, porque todo mundo era do mesmo jeito. Fazia almoço ali, punha aqui. Lá na minha comunidade, lá a gente trabalhava muito com corda, piteira também, na época. Hoje tem muita gente da comunidade que mexia com piteira, nós fazia as trouxas de piteira, nós saía de Paracatu, ia para Águas Claras, Ponte do Gama, Campinas, Furquim, tudo a pé, batia piteira o dia inteiro, corda. Corda de fazer tapete, punha na água, você preparava tudo bonitinho, fazia, ia lá tirava, batia, punha para secar, fazia as trouxas assim, amarrava num pano, punha na cabeça, todo mundo, 10, 12, 15 mulheres. Saía de Paracatu, vinha pelo trevo, entrava, passava no cras, subia o morro, ganhava a Alda do Furquim e descia em Cachoeira do Brumado. Vendia as cordas e voltava, a pé, na perna. E para conseguir essa renda, tinha que trabalhar duro, não era fácil. E teve muita gente da comunidade, que trabalhou assim. E que tá aí, graças a Deus ainda tem muito que tá vivo aí que pode contar essa história, que sempre trabalhou duro também. E eu na roda, era mais jovem, mas sempre estava na roda com elas, com essas pessoas.
56:36
P1 - Maria, me fala um sonho seu para o Futuro?
R - Eu não entendi!
P1 - Um sonho que você tem?
R - Hoje, Vanessa, se eu for te dizer que hoje, não voltar para o perdido, mas eu sempre fui uma pessoa que tive sonho, eu queria ter um estudo, eu queria fazer uma coisa, mas depois do rompimento da barragem para cá, aí eu fico mais, eu tô mais é na minha, às vezes eu faço uma coisinha e outra, mas… porque hoje eu eu acho difícil, até então. Por causa desse tempo que nós estamos vivendo, dentro desse tempo que nós estamos vivendo, eu me sinto sem saída, enquanto a gente não encontrar um caminho certo novamente ,a morada certa novamente, então a gente fica aí um pouco perdida. Então, não tem como, sabe? Não tem como! Mas já tive sim, eu já tive ideia de querer estudar, de ser alguma coisa. Que até então, quando eu falo isso, muitas pessoas, eu era louca para fazer uma prova, primeiro, para guarda municipal, era o meu sonho! E era para isso que eu fui à luta para estudar, fui para Águas Claras estudar, estava estudando, fazia tudo, fui em Cachoeira do Brumado. Aí cheguei a fazer alguns cursinhos, depois eu resolvi fazer um cursinho para cuidar de idoso, depois resolvi fazer um cursinho para cuidar de pessoas alcoólicas, que bebe, depois eu fiz um cursinho para cuidar de criança. Que até então também não trabalhei em escola. Mas só que depois do rompimento da barragem para cá, aí parece que a gente até parou no tempo, a gente ficou sem saída, num caminho sem saída. Então, até a gente voltar, para retornar, não é que eu deixei se levar, mas não tem como, a gente ficou um pouco, assim, meio perdido, meio sem saída, sabe? Até a gente encontrar o caminho certo, que a gente tá aí esperando, já vai para oito anos, cada um com a sua morada, seu lugar, poder plantar, poder ter sua liberdade. E é isso aí!
59:25
P3 - tem mais alguma coisa que você quer falar?
R - não não tranquilo é isso mesmo!
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